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Rio de Janeiro, 16 de agosto de 2011

Adgas Publicidade Ltda.


Avenida das Américas, nº 500, bloco 2A, sala 313
Rio de Janeiro – RJ

At.: Sr. Leônidas Moura

Ref.: Aumento de capital social – Adgas Publicidade Ltda.

Prezados Senhores,

Fomos solicitados por V.Sas. a manifestar nossa opinião sobre os aspectos


jurídicos e fiscais relativos a uma projetada operação pela qual Albatroz Participações Ltda.
(“Albatroz”) aumentará seu investimento no capital da Adgas Publicidade Ltda. (“Adgas”),
com a diluição das participações detidas pelos demais sócios desta última.

1. Operação projetada

Adgas é uma sociedade limitada prestadora de serviços de veiculação de


publicidade que, originalmente, tinha como sócios três pessoas físicas – Roberto Furtado
Carvalho Motta (“Roberto”), Pedro Martins Villela (“Pedro”) e João Paulo Brêtas dos Santos
(“João Paulo”) –, titulares de quotas no valor nominal de R$1,00 cada uma.

Em 20.10.2010, a Albatroz também se tornou sócia da Adgas, mediante a


subscrição de 15.555 quotas, no valor nominal de R$38,57 cada uma (portanto, superior ao
das quotas preexistentes, detidas por Roberto, Pedro e João Paulo), o que lhe assegurou
uma participação correspondente a 10% do capital social.1

A operação projetada consiste na realização de novo aumento do capital social da


Adgas, a ser subscrito – mais uma vez – apenas pela Albatroz.

Mais especificamente, pretende-se que:

a) O aumento do capital social seja representado pela emissão de 31.112 novas


quotas, de valor nominal de R$ 25,07 cada uma – portanto, diferente do valor
nominal das demais quotas já emitidas pela sociedade, subscritas tanto pela
própria Albatroz como pelos demais sócios;

b) Albatroz adquira onerosamente dos demais sócios os seus direitos de


subscrição das novas quotas oriundos dos direitos de preferência que lhes são
garantidos pelo §1º do Art. 1.081 do Código Civil2; e, finalmente,

c) Albatroz subscreva isoladamente todas as novas quotas emitidas pela Adgas,


aumentando sua participação para o equivalente a 25% do capital da
sociedade.

Vejamos, a seguir, os principais aspectos jurídicos das operações em comento e


suas implicações fiscais.

2. Emissão de quotas com diferentes valores nominais

O capital de uma sociedade limitada se divide em quotas, distribuídas entre os


sócios conforme suas respectivas contribuições. As quotas, por sua vez, são dotadas de

1No momento da implementação da operação ora examinada, o capital social da Adgas é representado por um
total de 155.555 quotas. Além das 15.555 quotas de titularidade da Albatroz, Roberto detém 56.000 quotas, no
valor nominal de R$1,00 cada uma, representativas de 36% do capital social, e Pedro e João Paulo detêm,
42.000 quotas cada um, no valor nominal de R$1,00 por quota, representativas de 27% do capital social.

2 Os preços devidos pela Albatroz pela aquisição dos direitos de subscrição, fixados de modo a respeitar as

participações de cada sócio no capital – e, consequentemente, sua preferência para acompanhar o aumento –
foram de (a) R$ 120.000,00 para Roberto, (b) R$ 90.000,00 para Pedro; e (c) R$ 90.000,00 para João Paulo.

2
valor nominal, assim entendida a importância (fixa) pela qual o subscritor se obriga a
contribuir para a sociedade, que representará uma parcela igualmente fixa do capital social.

O Direito brasileiro foi categórico ao adotar, em matéria de sociedades limitadas, o


sistema de pluralidade de quotas ou de quotas múltiplas, em que os sócios podem atribuir
a cada quota o valor que lhes convier. É o que resulta expressamente do art. 1.055 do
Código Civil, segundo o qual “o capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais,
cabendo uma ou diversas a cada sócio”.3

Como corolário do referido regime de liberalidade na fixação do valor nominal de


quotas representativas do capital social, na sociedade limitada, o valor do aporte pode ser
dissociado da quantidade de quotas emitidas (com todas as suas possíveis conseqüências,
inclusive políticas, vis à vis o direito de voto atribuído a cada quota).

Assim, duas pessoas que contribuem importâncias idênticas ao capital de uma


mesma sociedade podem subscrever quantidades de quotas diferentes e,
consequentemente, se tornar titulares de participações distintas no capital. Se o valor
nominal atribuído às quotas a serem emitidas for inferior ao valor nominal (médio) das
quotas preexistentes, a operação importará em uma diluição das participações dos demais
sócios no capital, em benefício daquele que subscreve as novas quotas. Por outro lado, se o
valor nominal das novas quotas for superior ao daquelas preexistentes, o subscritor terá sua
nova participação no capital diluída em benefício dos sócios titulares das demais quotas.

Na ausência de qualquer limitação legal ou restrição específica no contrato social,


a liberdade no estabelecimento do valor nominal de quotas a serem emitidas é
incondicionada. Os sócios podem atribuir às novas quotas o valor que entenderem
conveniente, independentemente do valor nominal que já tenha sido atribuído em emissões
anteriores.

3 Cfr. JOSÉ WALDECI LUCENA, Das Sociedades Limitadas (6ª ed.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, 322. Essa
também é a opinião de GUSTAVO TEPEDINO, HELOISA HELENA BARBOZA e MARIA CELINA BODIN MORAES, que, em
obra coletiva, reconhecem que o Código Civil “permite que o capital social das sociedades limitadas seja
dividido em quotas iguais ou desiguais quanto ao valor ou a natureza. (....) Assim, pode a sociedade
apresentar capital dividido em quotas de mesmo valor nominal ou em quotas com valores nominais diversos.”
In Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República (3º vol), Rio de Janeiro: Editora Renovar,
2011, 168.

3
Entendemos, portanto, que, no caso da Adgas – cujo contrato social não prevê
nenhuma restrição – é legítima e absolutamente legal a emissão de quotas, aprovada por
unanimidade dos sócios, com valor nominal distinto daquelas preexistentes, detidas não
apenas pelos demais sócios, como pela própria Albatroz (no caso, R$25,07, ao invés de
R$38,57 ou R$1,00).

Cumpre ainda notar que referida operação não implicará em qualquer tributação
para as partes em presença, especialmente a Adgas.

Caso o preço devido pela Albatroz pela subscrição das novas quotas excedesse o
valor nominal das mesmas, a Adgas seria obrigada a registrar essa diferença como ágio, em
uma conta de reserva de capital. Haveria, então, risco de as autoridades fiscais
considerarem a parcela do preço de subscrição correspondente ao referido ágio como um
rendimento tributável da Adgas, sob o argumento de que a operação (envolvendo uma
sociedade limitada, e não uma sociedade anônima) não estaria abrangida pela isenção
estabelecida pelo art. 38 do Decreto-Lei n.º 1.598/77. 4 Apesar de – em nossa opinião -
referida interpretação literal ser questionável, ela já foi adotada pelo Fisco, por exemplo, na
Solução de Consulta DISIT 8 n.º 195/99.5

No caso concreto, porém, a Adgas não receberá qualquer sobrepreço pelas quotas
emitidas, mas apenas o valor nominal das mesmas. A Albatroz contabilizará o valor pago na
integralização como custo de seu novo investimento (avaliado pelo método da equivalência
patrimonial) e a Adgas limitar-se-á a registrar a totalidade da importância recebida em sua
conta de capital, operação esta insuscetível de qualquer tributação.

4O art. 38 do Decreto-Lei n.º 1.598/77, que assim dispõe: “Não serão computadas na determinação do lucro
real as importâncias, creditadas a reservas de capital, que o contribuinte com a forma de companhia receber
dos subscritores de valores mobiliários de sua emissão a título de: I - ágio na emissão de ações por preço
superior ao valor nominal, ou a parte do preço de emissão de ações sem valor nominal destinadas à formação
de reservas de capital (...).”

5 A Solução de Consulta DISIT 8 n.º 195, de 23 de Junho de 1999, recebeu a seguinte ementa: “ÁGIO NA
EMISSÃO DE QUOTAS. Serão computadas na determinação do lucro real as importâncias creditadas a
reservas de capital, que o contribuinte com a forma de sociedade por quotas de responsabilidade limitada
receber, dos subscritores de quotas de sua emissão, a título de ágio, quando emitidas por preço superior ao
valor nominal.”

4
3. Cessão de direitos de subscrição

O art. 1.081, §1º, do Código Civil estabelece que, na hipótese de aumento do capital
de uma sociedade limitada, os sócios têm preferência para dele participar “na proporção
das quotas de que sejam titulares”.

Referido direito de subscrição, decorrente da preferência para participar no


aumento de capital, é passível de cessão a terceiros, conforme reconhecido pela própria lei,
eis que “à cessão do direito de preferência, aplica-se o disposto no caput do art. 1.057” (art.
1.081, §1º, do Código Civil). O regime jurídico da cessão de direito de subscrição é, pois, o
mesmo do da cessão de quotas.

Sendo assim, na omissão do contrato, o sócio pode ceder o direito de subscrição,


“total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente de audiência dos outros, ou
a estranho, se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social”.

De mais a mais, “a cessão terá eficácia quanto à sociedade e terceiros (...) a partir
da averbação do respectivo instrumento, subscrito pelos sócios anuentes” (art. 1.057).

Trata-se precisamente do que se pretende no caso concreto: (a) Roberto, Pedro e


João Paulo terão direito de subscrever aumento de capital da Adgas, decorrente de suas
preferências para participarem no projetado aumento de capital, na proporção de suas
participações nas quotas da sociedade; e (b) referidos direitos serão cedidos por cada um
deles à Albatroz contra o recebimento de um preço.

Como todos os sócios aprovarão a operação e o aumento de capital ocorrerá em ato


imediatamente subsequente, a cessão dos referidos direitos não será averbada no registro
de comércio (a Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro), eis que já possui a desejada
eficácia entre as partes (os sócios), sendo indiferente a produção de seus efeitos perante
terceiros.

Dúvidas não há, portanto, que também essa etapa da operação – a cessão onerosa
dos direitos de subscrição decorrentes da preferência para participação no aumento de
capital – atende perfeitamente a legislação societária em vigor.

5
Do ponto de vista fiscal, o preço pago pela Albatroz na aquisição dos direitos de
subscrição também deverá integrar o custo da nova participação societária na Adgas
(avaliada pelo método da equivalência patrimonial).

Já com relação aos sócios cedentes (Roberto, Pedro e João Paulo), o ganho obtido
por cada um deles na alienação do direito de subscrição – correspondente à diferença entre
o preço recebido e o custo daquele direito – encontra-se sujeito a tributação pelo imposto
de renda das pessoas físicas (“IRPF”) à alíquota de 15% (art. 117 e 142 do Regulamento do
Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto n.º 3.000/99 – “RIR/99”).

Como o custo de tal direito de subscrição é zero, o ganho apurado por cada um dos
sócios cedentes corresponderá à totalidade do preço recebido e deverá ser integralmente
oferecido à tributação6. O recolhimento do imposto de renda deverá ser feito até o último
dia útil do mês subsequente ao auferimento do ganho por cada cedente.

4. Conclusões

Em face das considerações precedentes, somos da opinião de que:

a) Tanto a emissão de quotas da Adgas com valor nominal diverso daquelas


quotas já existentes como a cessão pelos sócios de direitos de subscrição
decorrentes da preferência para acompanhar proporcionalmente o novo
aumento de capital são operações societárias legítimas, realizadas por meio de
atos jurídicos típicos, e atendem a todos os requisitos da legislação em vigor;

b) O custo do novo investimento da Albatroz na Adgas (avaliado pelo método da


equivalência patrimonial) considerará o valor de integralização das novas
quotas e também o preço de aquisição dos direitos de subscrição;

c) Os valores recebidos pela Adgas na emissão das novas quotas (com valor
nominal diverso daquele atribuído às quotas preexistentes), contabilizado

6 O ganho de capital é tributado pela pessoa física em separado em relação aos rendimentos do exercício, não

integrando a base de cálculo do imposto na declaração de ajuste anual do contribuinte (art. 117, §2º, do
RIR/99).

6
integralmente na conta de capital social, não é computado pela empresa na
determinação do seu lucro tributável; e

d) O preço recebido por cada sócio pessoa física na alienação dos direitos de
subscrição da Adgas será considerado na apuração de ganho de capital,
tributável pelo IRPF à alíquota de 15%, o qual deverá ser recolhido até o
último dia útil do mês subsequente ao recebimento do preço.

Permanecemos à inteira disposição de V.Sas. para eventuais esclarecimentos que


se façam necessário.

Atenciosamente,

Hermano Notaroberto Barbosa João Felipe Viegas Figueira de Mello

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