Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Introdução
Na aula 01, definimos os três critérios básicos de canonicidade (credenciamento divinas
do autor humano, conteúdo verdadeiro a respeito de Deus e do homem, autoridade dos escritos
reconhecida pelo povo de Deus). No entanto, identificamos que, muitas vezes, o terceiro critério
é mais enfatizado do que os demais, fazendo com que muitas vezes aqueles que deveriam
reconhecer o cânon, coloquem-se em posição de o estabelecer.
Em relação ao Antigo Testamento, apesar do testemunho de Cristo e dos apóstolos com
respeito a um cânon formado pela Lei e os Profetas (dentre estes os Escritos), grupos diferentes
dentro do Cristianismo divergem com respeito a qual seria a lista final de livros canônicos.
Entre os grupos não-cristãos, as diferenças também são encontradas.
Nesta aula, nosso objetivo é falar a respeito do cânon do Antigo Testamento no que
tange a sua extensão.1 Abordaremos a diferença que há na divisão da Bíblia Hebraica para a
ordem de livros adotada pelos protestantes.2 E, por fim, trataremos brevemente a respeito de
livros que foram ou permanecem sobre disputa dentro dos diferentes grupos cristãos.
1
A aula 07 se concentrará na razão para a rejeição de livros não-canônicos.
2
Como os alunos da FITRef terão outras disciplinas relacionadas à exegese bíblica é necessário que
estejam conscientes desta diferença estrutural.
2 © Geimar de Lima
BI 101 – Introdução à Bíblia I – Aula 03
O cânon protestante
A ordem dos livros do Antigo Testamento naquilo que costumeiramente é denominado
de cânon protestante é derivada da versão mais antiga do Antigo Testamento em grego, a
Septuaginta (LXX). Ambos, dentre os livros canônicos,3 adotam uma divisão em 39 livros,4
começando com o livro de Gênesis e terminando com o livro de Malaquias.
Basicamente, os livros estão agrupados em quatro grandes grupos formados a partir das
semelhanças de gênero literário: 1) Pentateuco; 2) Livros Históricos; 3; Livros Poéticos; 4;
Livros Proféticos.5
O Pentateuco é a primeira parte do cânon do Antigo Testamento e foi escrito por Moisés.
Os cinco livros que o compõem (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio) foram
escritos em um espaço de quarenta anos, no contexto da peregrinação do povo hebreu do Egito
para Canaã. De Gênesis a Deuteronômio, Moisés registra a história da formação de um povo
mediante a eleição do patriarca Abraão e o instrui a respeito do relacionamento de exclusividade
que teriam com o Deus que o libertou da escravidão no Egito. Este povo deveria saber quais os
fundamentos deste relacionamento e viver segundo a lei que o regia. Principalmente, por causa
deste último aspecto, muitos, em especial os judeus, se referem à esta porção das Escrituras
como a Lei de Moisés.
A segunda seção do Antigo Testamento contempla os chamados livros históricos.
Formada pelos livros de Josué, Juízes, Rute, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis, 1 e 2 Crônicas, Esdras,
Neemias e Ester, nesta ordem. Contempla cerca de 1000 anos da história de Israel, desde a
morte de Moisés até os anos que seguiram ao retorno do exílio babilônico. Seus temas principais
são a conquista, estabelecimento e razões da perda da terra prometida e a ascensão da monarquia
davídica sobre o povo de Israel.
Os livros geralmente chamados de poéticos compõe o que pode ser identificada como a
terceira seção do canôn do Antigo Testamento. Compostos por Jó, Livro dos Salmos,
Provérbios, Eclesiastes e Cântico dos Cânticos, seu agrupamento se dá porque em sua maioria
estes livros são poesias. Características marcantes deles são a grande quantidade de escritos
cujos autores eram reis de Israel (Davi e Salomão) e a ampla utilização da literatura sapiencial.
3
A versão final da LXX tem o acréscimo dos livros apócrifos.
4
Com a ordem e nomenclatura apresentando poucas diferenças.
5
Alunos da FITRef que cursarem o B.B.S. – Bacharelado em Estudos Bíblicos seguido de um dos
mestrados, cursarão quatro disciplinas distintas que seguem esta divisão: BI 404 Pentateuco, BI 504 Livros
Históricos do AT, BI 604 Livros Poéticos do AT e BI 704 Livros Proféticos do AT.
3 © Geimar de Lima
BI 101 – Introdução à Bíblia I – Aula 03
6
Josefo em Contra Apion afirma: “Pois não temos uma multidão incontável de livros entre nós,
discordando dos outros e contradizendo uns aos outros [como os gregos têm], mas apenas 22 livros, cinco
pertencem a Moisés, contêm sua lei e as tradições da origem da humanidade até a morte dele. Esse intervalo de
tempo foi pouco menor que três mil anos; mas quanto ao tempo da morte de Moisés até o reinado de Artaxerxes,
rei da Pérsia, que reinou depois de Xerxes, os profetas, que vieram depois de Moisés, escreveram o que foi feito
nas respectivas épocas em treze livros. Os outros quatro livros contêm hinos a Deus e preceitos para a conduta
humana". JOSEFO, Flavio. Against Apion. Book I, 8. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/gu002849.pdf
7
Ben Zvi destaca a tradição massorética e, até mesmo, anterior a dos massoretas de copiarem os dozer
profetas em um único rolo: “Entre um dos cinco livros da Torah e outro livro da Torah, quatro linhas, e, de modo
semelhante, entre um profeta e outro profeta; mas, no que tange a um profeta dos doze, três linhas”. [linhas se
referindo ao espaço dentro do mesmo rolo/pergaminho]. ZVI, Ben. Twelve Prophetic Books or ‘The Twelve’: a
4 © Geimar de Lima
BI 101 – Introdução à Bíblia I – Aula 03
Few Preliminary Considerations. In: WATTS, J. W.; HOUSE, Paul R. Forming Prophetic Literature: Essays on
Isaiah and the Twelve in Honour of John D. W. Watts. A&C Black, 1996. p. 103.
8
Na divisão de 24 livros.
9
Na divisão de 24 livros.
5 © Geimar de Lima
BI 101 – Introdução à Bíblia I – Aula 03
Apócrifos
Na tradição cristã, os livros chamados de Apócrifos são os livros mais disputados com
referência à sua canonicidade ou não. Para o catolicismo, os livros sob esta nomenclatura são
canônicos. Para os protestantes, sustentadores desta terminologia, eles não são. O judaísmo
também rejeita a conanonicidade deste conjunto de livros.
Desde o período da Reforma Protestante do século 16, este termo tem sido aplicado para
se referir aos livros de origem judaica, que fazem parte de uma literatura religiosa, porém que
não são considerados como divinos. Harrison auxilia com o significado do termo “apócrifo”:
“A palavra grega significa “coisas ocultas”, e quando aplicada a livros ela descreve os trabalhos
que autoridades religiosas desejam que sejam escondidos da leitura pública”.10 Apesar da boa
definição de Harrison, é necessário explicar que em tempos antigos, este termo era aplicado a
obras cujo objetivo de seus autores era exclusivamente o desvirtuamento, por isso, do desejo
das autoridades religiosas de as ocultar. No entanto, o Protestantismo não empregou o termo
com o intento de cercear os escritos com ele designados, mas para taxá-los como desprovidos
da autoridade cuja origem é Deus.
O conjunto de apócrifos adotados pela Igreja Católica é composto dos seguintes livros:
Tobias, Judite, Sabedoria de Salomão, Eclesiástico, I e II Macabeus e Baruque.
Pseudoepígrafos
Os pseudoepígrafos são livros religiosos que foram rejeitados tanto pela tradição judaica
quanto pela cristã. São escritos de origem judaica e de caráter religioso, que apesar de não serem
falsos em sua totalidade, eram em essência livros especulativos a respeito de temas religiosos.
Como sinalizado por Geisler e Nix, estes livros foram compostos em um período posterior ao
fechamento dos escritos proféticos (entre 200 a.C e 200 d.C) e eram caracterizados pela
imitação da literatura apocalíptica contida em livros como Ezequiel, Daniel e Zacarias. Tal
imitação levou a simbologia adotada a ganhar significados mágicos.11
10
HARRISON, R. K. Old Testament and New Testament Apocrypha. In: BRUCE, F. F.; PACKER, J. I.;
COMFORT, P.; HENRY, C. F. H. The origin of the Bible. Carol Stream: Tyndale House Publishers, 2012. p. 108.
11
GEISLER, Norman L.; NIX, William E. From God to Us: How we got our Bible. Chicago: Moody
Publishers, 2012. p. 162.
6 © Geimar de Lima
BI 101 – Introdução à Bíblia I – Aula 03
Antilegomena
O termo é aplicado a livros que apesar da canonicidade vindicada, ora ou outra a mesma
é questionada em alguns círculos do judaísmo ou do cristianismo. O significado do termo
basicamente é: “livros contra os quais se fala”. Os rabinos judeus se referem a cinco livros
muitas vezes com este termo: Cântico dos Cânticos, Ester, Ezequiel, Eclesiastes e Provérbios.
Entre os cristãos, no Novo Testamento, questionamentos foram lançados sobre Hebreus, Tiago,
2 e 3 Pedro, Judas, 2 e 3 João e Apocalipse.12
12
Eusébio de Cesaréia em sua História Eclesiástica trata a respeito das “Divinas Escrituras reconhecidas
e as que não são”: “Entre os contestados, mas apesar disso recebidos pela maioria, existe a carta atribuída a
Tiago, a de Judas, a segunda carta de Pedro e as cartas enumeradas como segunda e terceira de João, quer sejam
do evangelista ou de outro, com idêntico nome.” EUSÉBIO DE CESARÉIA. História Eclesiástica. São Paulo:
Paulus, 2000. p. 109.
7 © Geimar de Lima
BI 101 – Introdução à Bíblia I – Aula 03
Bibliografia
EUSÉBIO DE CESARÉIA. História Eclesiástica. São Paulo: Paulus, 2000.
GEISLER, Norman L.; NIX, William E. From God to Us: How we got our Bible. Chicago:
Moody Publishers, 2012.
JOSEFO, Flavio. Against Apion. Book I, 8. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/gu002849.pdf
HARRISON, R. K. Old Testament and New Testament Apocrypha. In: BRUCE, F. F.;
PACKER, J. I.; COMFORT, P.; HENRY, C. F. H. The origin of the Bible. Carol Stream:
Tyndale House Publishers, 2012.
ZVI, Ben. Twelve Prophetic Books or ‘The Twelve’: a Few Preliminary Considerations. In:
WATTS, J. W.; HOUSE, Paul R. Forming Prophetic Literature: Essays on Isaiah and the
Twelve in Honour of John D. W. Watts. A&C Black, 1996.