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Resumo
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Empreendedorismo e Effectuation: um Estudo de Caso sobre o Processo de Decisão
Introdução
Mais que uma descrição do processo racional, o modelo de effectuation também traz
consequências para a dinâmica do desenvolvimento dos empreendimentos. Na medida em que
parceiros são envolvidos no projeto como novos stakeholders, os mesmo passam a compor a
nova configuração de meios disponíveis e formatar os objetivos do negócio (Sarasvathy,
2001; Wiltbank, Dew, Read, & Sarasvathy, 2006). Este processo recursivo entre
envolvimento de stakeholders e a criação de novas redes impulsiona a evolução da empresa e
a criação de novos mercados (Sarasvathy, 2001; Sarasvathy & Dew, 2005).
Este artigo foca neste aspecto dinâmico do processo de effectuation, como uma estratégia
adaptativa onde os meios e recursos disponíveis e o contexto formatam os negócios (Wiltbank
et al., 2006). O objetivo do nosso estudo é identificar como os princípios do effectuation,
perdas toleráveis, parcerias estratégicas e exploração de contingências formatam o processo
de criação de empresas. Mais especificamente, buscamos explorar o papel dos stakeholders na
reformulação dos objetivos estratégicos ao longo do processo de criação.
Para tanto foi desenvolvido a análise do caso da GoBooks, a primeira empresa de aluguel e
venda de livros do Brasil, criada em meados de 2012, por dois estudantes universitários e
inspirada em no modelo de uma empresa norte-americana, a Chegg, que abriu capital em
Novembro de 2013. A contemporaneidade dos acontecimentos permitiu a análise dos
fundamentos da teoria do effectuation e a observação da dinâmica do processo em curso. A
análise dos resultados permitiu estender a compreensão da dinâmica do effectuation mesmo
frente à forte ancoragem do modelo da empresa norte-americana à pouca experiência dos
empreendedores.
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Emprendedorismo: Oportunidade e Incerteza
A pesquisa empreendedorismo deve levar em conta o como, por quem e com que efeitos as
oportunidades são descobertas, serviços e novos produtos são criados, avaliados e explorados
(Shane & Venkataraman, 2000). Empreendedorismo é o mecanismo pelo qual a sociedade
transforma informações técnicas em produtos e serviços, sendo o empreendedor aquele que
consegue identificar uma oportunidade, inovar, quebrar a ordem existente até então e criar um
novo mercado (Schumpeter, 1934).
Para Knight (1921) é a incerteza sobre os eventos futuros que permite aos empreendedores a
possibilidade de auferir lucros, aproveitando os desequilíbrios de mercado. Contudo, há vários
níveis de incerteza, desde a noção de risco, onde se conhece a distribuição dos eventos, até a
incerteza verdadeira, na qual nem se pode estimar a distribuição dos eventos dada a falta de
precedentes (Knight, 1921). A incerteza envolvida no processo de empreender é muitas vezes
identificada como a incerteza verdadeira, pelas suas características de inovação e rompimento
com modelos existentes (Knight, 1921; Schumpeter, 1934). Ao lidar com o fenômeno da
incerteza, o empreendedor utiliza-se de heurística e de lógica indutiva na tomada de decisão,
aspectos que caracterizam a racionalidade limitada dos mesmos (Sarasvathy, 2001; Simon,
1979). Assim, as experiências sobre o passado e crenças acerca do futuro formatam a tomada
de decisão dos empreendedores frente à incerteza. O reconhecimento das oportunidades é
formatado pela interação entre o empreendedor e o contexto em que ele atua (Sarasvathy,
2001). Empreendedores mais experientes tendem a definir mais claramente as oportunidades,
com foco nas áreas em que possuem experiências, enquanto que os empreendedores noviços
olham para as oportunidades com fronteiras menos firmes (Baron & Ensley, 2006). A
diferença entre experientes e novatos também se aplica à forma de utilização de lógica
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preditiva e projeções de mercado, mais comum entre novatos; e a lógica analógica e criação
de cenários alternativos, mais comum entre empreendedores experientes (Dew, Read,
Sarasvathy, & Wiltbank, 2009).
A dinâmica do Effectuation
Na lógica do effectuation, o futuro é incerto e não previsível (Knight, 1921), os objetivos não
são pré-determinados, a seleção dos resultados está imbuída na ação do agente como ator da
mudança no seu em torno . A partir destes pressupostos, o modelo de decisão na lógica do
effectuation define quatro princípios, a saber (Sarasvathy, 2001):
A lógica proposta pelo effectuation traz um paradoxo: por um lado ela evita o processo de
previsão e por outro, transforma o imprevisível moldando a distribuição de com os limites
impostos pelos meios à disposição sujeitos em nossos meios à mão (Sarasvathy & Kotha,
2001). Dentre os meios disponíveis para o empreendedor, três categorias ressaltam: a
identidade (“quem é o empreendedor”), o conhecimento (“o que ele sabe”) e a rede de
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relacionamentos (“quem ele conhece”) (Sarasvathy, 2001). O processo de effectuation se
concentra naquilo que pode ser feito, dados os meios existentes, sendo que os objetivos vão
sendo moldados pelo processo.
Novos
meios
Objetivos
Quem sou eu Compromissos
O que eu posso Contato pessoas
O que eu sei com
fazer? que conheço
Quem eu conheço stakeholders
Meios
Novos
objetivos
Metodologia
Tomando como base o modelo do effectuation, este estudo foca na investigação de como
princípios de perdas toleráveis, parcerias estratégicas e exploração de contingências
formataram o processo de criação de uma empresa de aluguel de livros, a GoBooks, e como o
compromisso com stakeholders atuou na reformulação dos objetivos estratégicos ao longo do
processo de criação. A GoBooks é a primeira empresa de aluguel e venda de livros físicos e
on line do Brasil, criada em meados de 2012, por dois estudantes universitários, Marcus
Teixeira e Vitor Oliveira, e vem apresentando rápido desenvolvimento do seu negócio. A
empresa é estudada no exato contexto de início de atividades e interações empreendedoras
que são teorizadas pelo processo do effectuation, sendo assim considerada bastante
representante dos fenômenos a serem investigados.
Método
Uma das características dos estudos de caso está na utilização de mais de uma fonte para
coleta de dados como entrevistas em profundidade, análise de arquivos e observação direta
(Yin, 2001). O planejamento da coleta de dados baseou-se na revisão da literatura e nos
construtos lá desenvolvidos para a formulação do planejamento e execução da pesquisa,
incluindo um roteiro para entrevistas. Assim, a coleta de dados deu-se pelas seguintes fontes:
A empresa GoBooks, a primeira empresa locadora on line de livros físicos (de papel) do
Brasil, foi a empresa escolhida para este trabalho. Os empreendedores eram colegas na
aceleradora de negócios digitais 21212, o Marcus na área de pesquisa de negócios e o Vitor na
área de desenvolvimento de sistemas como programador.
A ideia de montar uma empresa surgiu na junção do conhecimento do Marcus, que estudava o
mercado americano de educação, com as habilidades de Vitor como programador. O modelo
de negócio dos empreendedores for inspirado no site norte americano de aluguel de livros
Chegg (www.chegg.com), uma empresa que começou suas atividades de aluguel de livros em
2007, passando depois a também vendê-los e ao aluguel de livros digitais. Hoje a Chegg
oferece uma gama de recursos para a aprendizagem, inclusive reforço escolar. Em 2011, 20%
dos estudantes utilizam livros alugados nos Estados Unidos, sendo que e a Chegg faturou
mais de 200 milhões de dólares.
Baseados neste exemplo, os empreendedores decidiram lançar uma “página isca” para
verificar se o modelo teria mercado no Brasil. Em no segundo semestre de 2012 é lançada a
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página na internet “Cansados de usar e comprar livros caros nós temos a solução”, que gerou
10 mil acessos e resultou em três mil estudantes interessados. Animados com os resultados, os
empreendedores resolveram criar a empresa, contando com um aporte inicial da aceleradora
21212 de 50 mil reais.
Para criar o acervo inicial a GoBooks, foi feita uma pesquisa com estudantes das principais
universidades do Rio de Janeiro para saber quais eram os títulos mais utilizados em cada
curso de graduação. Começaram pelo curso de administração na PUC-RJ (Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro) e atualmente já estão atendendo aos cursos de
Administração, Economia, Engenharia e Medicina.
Em menos de um ano a empresa ampliou seus serviços para várias universidades do Rio de
Janeiro, incluindo a Universidade Federal do Rio de Janeiro, as faculdades IBMEC, a
faculdade Candido Mendes, a Universidade Estácio de Sá e a Universidade Estadual do Rio
de Janeiro. Atualmente a empresa busca superar os desafios logísticos para poder expandir
seu negócio, para o ano de 2014 eles esperam alugar três mil livros. Em pouco mais de um
ano os empreendedores saíram do desenvolvimento da ideia, para o aluguel de mil livros no
fim de 2013. No Quadro 1 podemos verificar o histórico dos principais eventos desde a
criação da GoBooks, o que chama a atenção para a velocidade do desenvolvimento do
negócio.
Seguindo a lógica do processo de effectuation, nossa análise buscou identificar os meios que
os empreendedores dispunham, assim como suas aspirações que formataram as decisões. O
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Quadro 2 expõe a identidade, o conhecimento e a rede de relacionamento dos
empreendedores.
Conforme relato dos entrevistados, no início havia a inspiração relativa ao modelo de negócio
a ser adotado, baseado no modelo da empresa americana Chegg. Entretanto não se como as
coisas funcionariam no mercado brasileiro tendo em vista das diferenças existentes entre os
dois mercados americano e brasileiro, então decidem lançar mão de uma página isca na
internet como forma de testar o interesse dos estudantes universitários. Neste processo eles se
valem dos meios disponíveis (habilidades de programação e rede de conhecimento) para
avaliar o potencial do projeto. A página isca traz para os empreendedores a primeira
formatação do que seria o mercado potencial (três mil e-mails de resposta) sem que os
empreendedores tivessem estruturado a empresa.
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Seguindo processo do effectuation os empreendedores, com seus meios limitados, saem
buscando opções cujas perdas são minimizadas e que apresente estratégias possíveis
(Sarasvathy, 2001). Assim, os empreendedores investiram trabalho, alguns recursos
financeiros e tinham o controle do quanto podiam perder. Ao longo do processo, percebe-se a
preferência dos empreendedores por criar mais opções no futuro, até mesmo opções pessoais,
do que maximizar o retorno no presente.
Por fim, destaca-se que a noção de risco e incerteza atrelada ao processo, pode ser vista como
promotora da própria atividade de empreender.
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Parcerias estratégicas
Os primeiros parceiros são a aceleradora 21212, na qual eles “mudam de lado” e passam a ser
empreendedores e investidos. Movidos pela necessidade de acesso ao mercado universitário, a
empresa estabeleceu parcerias com todas as Empresas Júnior das faculdades e universidades
atendidas. Tais parcerias foram usadas para ponto de contato com os estudantes e promoção
da empresa dentro das escolas, os chamados “embaixadores”. As Empresas Júnior também
servem como ponto de devolução dos livros, reduzindo custos para o negócio.
Os parceiros são agregados com premissas de valor ao produto, onde o Post it (adesivo da
empresa 3M) busca promover a “conscientização da conservação do livro” e o Red Bull
(bebida energética) serve para trazer “energia no dia da prova”. Os parceiros foram
aparecendo ao longo do processo tanto por sugestões, estudantes sugerem o Post it, como por
iniciativa das próprias empresas que veem na associação com GoBooks uma forma de se
aproximar do público universitário, caso do cartão Bradesco universitário.
O modelo de negócio inicial de aluguel de livros físicos vem sendo adaptado e remodelado na
medida em que surgem as parcerias. As parcerias que no início procuravam trazer benefícios
aos clientes, agora começavam a desenhar um novo modelo de receita, auxiliando a GoBooks
vislumbrar a possibilidade de redefinir o modelo de negócio. O objetivo agora, a partir das
novas parcerias, é transformar aos poucos a empresa em um HUB acadêmico de serviços em
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educação, possibilitando a mudança do mix de produtos e serviços oferecidos, ensejando a
diminuição da dependência do aluguel de livros como gerador de receitas.
O processo dinâmico e interativo entre meios e objetivos que redesenha o modelo de negócios
inicial mesmo antes que ele tenha sido testado. Nesta dinâmica os meios, como a identidade e
a rede de relacionamentos demonstraram ser importante na redefinição destes objetivos, dada
o nível de maturidade dos empreendedores e o ambiente de trabalho onde eles atuavam.
Discussão e conclusões
O caso da GoBooks mostrou-se bastante profícuo aos objetivos deste estudo, dada o seu
empreendedorismo de inovação e ao estágio de desenvolvimento do projeto, que possibilitou
observar os processos em tempo real.
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paulatinamente superado com a ajuda das alianças estratégicas que visam diminuir a
rivalidade do ambiente e a imitabilidade do negócio.
Dentre as limitações deste estudo está a limitada amostragem e exposição ao evento, que deve
continuar a ser investigado para o caso da GoBooks. Neste sentido, este estudo deixa
caminhos para estudos futuros deste mesmo caso (e outros), na análise da manutenção da
dinâmica do effectuation ao longo do processo de desenvolvimento do empreendimento.
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