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mais estranhos: “boa administração ou ordem da casa” e “harmonia
das partes de um todo” (boa disposição ou arranjo).
2 Segundo Gide e Rist (cf. Histoire des Doctrines Economiques – depuis les physiocrates
jusqu’a nos jours, Dalloz, 6ª Ed., 2000) Antoine de Montchrétien, autor de um Traité de
l'Économie Politique publicado em 1615 teria sido o primeiro a utilizar a designação Economia
Política.
3 Filosofia Moral era a designação adoptada nos séculos XVII e XVIII para a reflexão acerca da
vida social, abarcando o domínio do que actualmente designamos por Ciências Sociais,
incluindo portanto a Economia.
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No entanto, hoje, é mais vulgar falar simplesmente de Economia
do que de Economia Política, embora o termo Economia Política ainda
seja utilizado muitas vezes para designar um domínio especializado da
Economia (ou correntes de pensamento económico) que tem em conta
as relações de poder e a interdependência entre política e economia.
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ciência (nesse caso escrevemos normalmente economia, como em
“economia portuguesa” ou “economia mundial”)4.
4 É curioso notar que esta ambiguidade da língua portuguesa não existe noutros idiomas,
nomeadamente no inglês, onde Economics designa a disciplina e economy designa o objecto
de estudo.
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impossível, ou seja, o esclarecimento total das questões da
metodologia da Economia; muitas destas questões são controversas e
mantêm-se em aberto. O que se segue é apenas um mapa de viagem.
5 Não é possível datar o “princípio” da Economia, mas por convenção é habitual referir a
origem da Economia enquanto domínio do saber (ou ciência) ao período do Iluminismo, isto é,
ao século XVIII.
6 Mill, John Stuart (1836), “On the Definition of Political Economy and the Method of
Investigation Proper to It” in Hausman, Daniel M. (Ed.), The Philosophy of Economics – An
Anthology, 2nd Ed., Cambridge University Press, 1994.
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A Economia Política de Stuart Mill é portanto, como a de Smith,
uma ciência da riqueza. No entanto, ao acrescentar a referência à
capacidade dos indivíduos de julgar a eficácia relativa dos meios para
alcançar o fim (a riqueza), Mill introduz algo de fundamental à noção
original – o pressuposto da racionalidade (entendida como capacidade
de julgar a eficácia relativa dos meios para a realização de fins ou
objectivos).
7 Para Mill este ser humano que procura exclusivamente a riqueza de forma racional era
evidentemente uma abstracção. Segundo ele “nunca existiu um economista político que fosse
absurdo ao ponto de supor que a humanidade é assim constituída”. Para ele, a aquisição de
riqueza como objectivo único e a racionalidade eram abstracções necessárias como ponto de
partida para a dedução de leis económicas. Sempre que se tornasse manifesto que outras
motivações humanas, como a generosidade, o altruísmo, a honra, ou o despeito, participavam
na determinação da acção, estas e outras motivações deveriam ser tidas em conta pelo
economista.
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fenómenos que espontaneamente tendemos a identificar como
económicos.
8Robbins, Lionel (1935), “An Essay on the Nature and Significance of Economic Science”, in
Hausman, Daniel M. (Ed.), The Philosophy of Economics – An Anthology, 2nd Ed., Cambridge
University Press, 1994.
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quer ao domínio de aplicação, referindo apenas os contextos de
escassez.
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A noção de Economia de Robbins é portanto muito abrangente: a
economia é a ciência da escolha (racional); refere-se a situações em
que a noção de escolha faz sentido – contextos de escassez9.
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mais problemas do que aqueles que resolve. A obtenção de riqueza é o
fim último da acção ou é apenas um meio para realizar outros fins? A
que se destina a riqueza desejada? À satisfação de necessidades e
caprichos individuais? Ao sustento da família? À ajuda a desconhecidos
carenciados? Quando procura riqueza o indivíduo tem em conta custos
que a sua acção pode ter para outros, ou considera apenas as
consequências da acção para si mesmo?
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ser tão complexo que nem o maior computador disponível seria capaz
de obter uma solução em tempo útil. Nesse caso o agente está
condenado a utilizar procedimentos de resolução (heurísticas) que
permitem obter uma solução, embora sem garantia de que esta
solução seja a melhor possível. A racionalidade na perspectiva de
Simon seria limitada pelas capacidades cognitivas dos seres humanos.
11 Como por exemplo quando têm de escolher entre a fruição a curto prazo de um bem e a
fruição a longo prazo de um bem muito superior, ou quando têm que fazer escolhas
envolvendo acções com consequências incertas.
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Haverá alguma razão para a Economia excluir do seu campo,
modalidades bem identificadas de comportamento irracional?
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entanto, na medida em que toda a actividade humana tem de fazer
face à escassez (nem que seja de tempo) não se compreende bem que
aspectos da vida em sociedade ficariam excluídos de um domínio da
Economia concebido nestes termos.
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fazer. Segundo Sedas Nunes13: “Tudo, na verdade, se passa como se o
real que nos envolve e do qual nós mesmos fazemos parte, fosse para
nós um texto que não podemos deixar de constantemente ler – e
portanto de ‘saber’ ler (...) e nós ‘sabemos’ de facto lê-lo; mas de uma
certa maneira”.
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Refere-se apenas à transformação de bens materiais em vida, ou a
fruição de criações artísticas e a participação em rituais religiosos
também pode ser consumo? É a resposta a perguntas como estas o
que designamos por conceptualização. É através do exercício de
conceptualização – estabelecimento de categorias e do seu significado
– que o objecto da Economia, como o de todas as ciências sociais, vai
sendo construído. Este é um processo nunca finalizado porque os
conceitos estão sempre sujeitos a reelaboração. Por isso mesmo,
qualquer tentativa de estabelecer as fronteiras da Economia é um
projecto sem fim.
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De que forma os conceitos podem ser elaborados de forma
diferente por diferentes economistas? Tomemos como exemplo o
conceito de relação de trabalho, central para a Economia. Para alguns
economistas, e algumas escolas de pensamento económico, a relação
de trabalho não se distingue de uma qualquer troca de bens e serviços
por dinheiro – o trabalho exercido em troca de um salário é um serviço
prestado em troca de dinheiro como qualquer outro. Já para outros, a
relação de trabalho difere fundamentalmente de uma qualquer outra
troca mercantil. Enquanto o padeiro me cede o seu pão, ou o médico
me examina em troca de dinheiro, sem que tenham de aceitar
indicações ou comandos meus – eles não são meus empregados - o
assalariado não só cede o seu esforço como contrai a obrigação de
obedecer ao comando de quem o contrata (dentro de limites mais ou
menos especificados). A relação de trabalho assalariado envolve uma
cedência de autonomia, uma aceitação da subordinação que as trocas
mercantis dispensam. Partindo do princípio de que esta cedência de
autonomia, embora voluntária, existe muitas vezes porque o
trabalhador assalariado não dispõe de outra alternativa, somos levados
a considerar as razões da situação em que se encontra. Esta via
remete-nos rapidamente para conceitos como o de desigualdade no
acesso ao capital e classe social, entre outros. Estes conceitos são
irrelevantes para quem conceptualize a relação de trabalho como uma
relação mercantil, mas são centrais do outro ponto de vista –
enquanto na primeira perspectiva a relação de trabalho pode ser
incluída na categoria de troca mercantil, na segunda, a relação de
trabalho deve ser conceptualizada separadamente. Enquanto na
primeira alternativa o conceito de classe social é irrelevante, na
segunda é central.
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Neste caso, como em muitos outros, as categorias que são
consideradas, assim como o significado dessas categorias, não são os
mesmos e as diferenças de conceptualização conduzem a diferentes
teorias. O mesmo “texto” é lido a partir de códigos diferentes.
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tipos de diferença, senão essenciais, pelo menos de grau: (1)
enquanto na física e nas ciências da natureza é possível estabelecer
uma separação relativamente clara entre o observador e o observado,
nas ciências sociais o observador está imerso no objecto da
observação – a própria sociedade; (2) a posição que cada
“observador” ocupa na sociedade, pode condicionar a forma como a
observação é feita – aquilo que identifica como constituindo um
problema, a ordenação que faz da prioridade dos problemas a resolver
ou dos objectivos a realizar, o que considera ser um dado imutável, ou
uma variável passível de correcção, pode variar conforme o ângulo de
observação; (3) nos mundos físico e biológico, as ideias que temos
acerca deles, as teorias que a seu respeito construímos, não
modificam o seus mecanismos e o seu funcionamento – os átomos e
as moléculas não lêem tratados e portanto o seu comportamento não
pode mudar quando os tratados são escritos; o mesmo não se passa
no mundo social – as ideias construídas e comunicadas acerca da vida
social, sejam elas científicas ou não, podem influenciar e influenciam o
comportamento dos seres humanos14.
14 É bem possível, por exemplo, que uma teoria que se baseia no pressuposto de que os seres
humanos são sempre egoístas modifique o comportamento dos que nela acreditam. Quem
acredita verdadeiramente na teoria não pode deixar de esperar que todos aqueles com quem
se relaciona seja egoísta e passar a relacionar-se com eles com base nesse pressuposto,
comportando-se como nos comportamos face a um egoísta e não nos comportamos face a um
qualquer ser humano a quem atribuímos uma quota parte normal de generosidade.
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dos outros, as ideias que exprimimos acerca do comportamento
humano podem ser influenciadas pelas concepções que temos acerca
do que é ou deve ser esse comportamento.
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Foi sugerido acima que o objecto das várias ciências sociais é
construído por estas mesmas ciências ao longo do seu processo de
desenvolvimento. Mas as actividades e fenómenos sociais que
interessam a uma disciplina, que integram o seu objecto podem ser, e
são, integrantes também do objecto de outras disciplinas. A produção,
o consumo ou o trabalho, por exemplo, mas mesmo o investimento ou
a inflação são actividades e fenómenos que embora considerados
eminentemente económicos, são susceptíveis de interessar outras
ciências sociais e integrar o seu objecto. Neste sentido, o objecto da
Economia é susceptível de ser abordado não só dos diferentes pontos
de vista que coexistem no interior desta disciplina, como dos diversos
ângulos das diferentes ciências sociais. A pluralidade existe não só no
interior da Economia como na abordagem ao seu objecto.
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individuais não são independentes dos desejos e do nível de satisfação
dos desejos alheios, mas antes dependentes de uma comparação com
outros indivíduos, do mesmo estrato social, ou de estrato “superior”.
Os desejos a que a actividade de consumo dá resposta resultam da
interacção social e obedecem a padrões sociais.
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económica como as actividades e fenómenos que integram o
objecto desta ciência. Uma vez que estas actividades
integram também o objecto de outras ciências sociais,
estudar Economia envolve também o conhecimento da
perspectiva dessas disciplinas acerca deles.
6. Bibliografia
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Hausman, Daniel M. (Ed.), The Philosophy of Economics – An
Anthology, 2nd Ed., Cambridge University Press, 1994.
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