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O LIVRO DO DEUTERONÔMIO – A REPETIÇÃO DA TORAH PARA AVANCAR NA FÉ


CENTRO CRISTÃO DE ESTUDOS JUDAICOS – CURSO DE APROFUNDAMENTO 2021
P. Fernando Gross – grossfernando@gmail.com

A RAZÃO DA RECORDAÇÃO E DA DRAMATIZAÇÃO DA HISTÓRIA

1. A DRAMATIZAÇÃO DA HISTÓRIA1

Em seus discursos e pronunciamentos aos Hebreus no deserto, Moisés se dirige sobre o


futuro do povo quando ele tiver conquistado a terra de Israel e assim desfrutar das suas colheitas.
Eles deverão então “tomar as primícias de cada fruto do solo que tirares de tua terra que o
SENHOR, teu Deus te dá, as porás no cesto e irás ao lugar que o SENHOR teu Deus tiver
escolhido para ali fazer habitar seu nome” (Dt 26,2). Então quando estiverem no Santuário, eles
apresentarão o cesto ao sacerdote e dirão: “Declaro hoje, ao SENHOR, teu Deus, que entrei na
terra que o SENHOR jurou a nossos pais que nos daria” (Dt 26,3).

No momento em que o sacerdote tomar o cesto, os Hebreus continuarão com a seguinte


declaração: “Arami oved avi...” – Meu pai era um Arameu fugitivo. Ele desceu ao Egito e foi
migrante ali com poucos, mas ali se tornou um povo grande, forte e numeroso. Os egípcios nos
maltrataram, nos afligiram e nos impuseram uma dura servidão. Então clamamos ao SENHOR,
Deus de nossos pais. O SENHOR ouviu nossa voz e viu nossa aflição, nossa produção forçada e
nossa opressão. O SENHOR nos fez sair do Egito com mão forte, com braço estendido, com grande
terror, com sinais e com prodígios. Fez-nos vir para este lugar e esta terra nos deu, terra que
escorre leite e mel. Eis que trago, agora, as primícias dos frutos do solo que me destes, SENHOR”
(Dt 26,5-10).

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FIELDS, Harvey J. La Torah commentée pour notre temps. Paria: Le Passeur Éditeur, 2017, p. 217-228.
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Mas qual seria a finalidade dessa cerimônia? Muitos comentadores notaram que esse texto é
uma das poucas orações que se encontram na Torah. O sentido a lhe ser atribuído provocou debates.

Rashi

Alguns comentadores, como o autor de Sifré e Rachi, compreenderam arami oved avi... como
significando que um Arameu, Labão, por quem Jacó tinha trabalhado durante vinte anos e que era
seu tio, tinha lhe procurado matar. Essa interpretação é aquela dos rabinos que escreveram as
primeiras Haggadot de Páscoa. O neto de Rachi afirma que não se trata de Labão, mas de Abraão
que nasceu e cresceu em Aram-Naharaim.

Ibn Ezra

Outros, como Abraão Ibn Ezra, lembram que não faz sentido identificar Labão ou Abraão como
sendo arami oved ani. Para Ibn Ezra, Moisés faz aqui alusão a Jacó, cuja mãe vinha de Aram-
Naharaim, foi perseguido por Labão, ele fugiu da fome se refugiando no Egito quando sob as ordens
de José, este assegurou a sobrevivência da família de Jacó.

Considerando a diversidade das interpretações de arami oved avi, poderíamos traduzir essas
palavras assim: “Meu pai era um Arameu refugiado (migrante ou perseguido)”. E poderia se referir
a Abraão ou a Jacó. Esse texto poderia igualmente querer nos dizer: “Um Arameu procurou fazer
morrer a meu pai”, o que, em outras palavras significa que Labão procurou destruir a família de
Jacó. A maior parte dos biblistas são da opinião que o Arameu que procurou fugir pode ser Abraão,
ou pode ser Jacó mesmo.

A Mishná descreveu em tons vibrantes a celebração das primícias no Templo de Jerusalém. Em


cada cidade através da Terra de Israel, grupos de orações se reuniam. Eles realizavam as cerimônias
na véspera à tarde e na manhã seguinte, peregrinavam sob o som de uma flauta, seguidos por um boi
com seus chifres adornados de ouro e com uma coroa de ramos de oliveira sobre sua cabeça.
Quando chegavam em Jerusalém, eles enviavam mensageiros aos Templo e preparavam as
oferendas das primícias. Na sua peregrinação pela cidade, os habitantes de Jerusalém os acolhiam
dizendo: “Bem-vindos a Jerusalém!”. Na sua chegada ao Templo, os Levitas entoavam seus
cânticos.

No Templo, com os cestos em mãos, eles deveriam dizer: “Meu pai era um Arameu fugitivo... É por
isto que eu trago as primícias dos frutos da terra que Tu, o Eterno, meu doou”. A longa marcha
para Jerusalém, a parada nas ruas da cidade, a música que acompanhava a sua entrada no Templo e
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a solenidade da declaração que cada um fazia, o cesto em suas mãos, deviam produzir uma forte
impressão sobre os peregrinos e isso se inscrevia para sempre na sua memória (Bikourim 3).

Seria isso que pensava Moisés quando ele definiu o ritual da oferenda das primícias? Teria ele
pensado num acompanhamento musical? Por que afinal era necessário impor tal declaração àquele
que apresentava essa oferta? Por que não poderia haver a possibilidade de se fazer uma oração
espontânea para agradecer a Deus pela abundância da colheita? Por que nessa oração a menção do
passado, dos sofrimentos, da miséria e da opressão?

No Guia dos Perplexos, Moisés Maimônides refletiu sobre essas questões (3, 39). Segundo ele,
oferecer as primícias permite “habituar cada um a se mostrar generoso” e permite também “limitar
nossos desejos, não somente alimentares, mas também da posse da riqueza”. Maimônides considera
que esse ritual é um antídoto ao materialismo e à autossatisfação. “Aqueles que amam as fortunas e
vivem num grande conforto, ele observava, são sempre egocêntricos e arrogantes. Eles são tentados
a abandonar as considerações éticas por causa do excessivo egoísmo”. Levar sua colheita dos
primeiros frutos num cesto e recitar a oração permite “desenvolver o sentimento de humildade”.

Maimônides ainda lembrou que “em períodos de bem-estar, é necessário lembrar as experiências
dolorosas e os momentos de angústia”. Tais recordações nos ajudam a entender que a experiência
humana é um conjunto de sucessos e de fracassos, de alegrias e de desilusões. A história, como a
vida de cada ser humano, é complexa e sempre fonte de frustrações. Esquecendo isso, facilmente
nos tornamos cínicos e nos distanciamos das suas esperanças e dos seus sonhos.

O triunfo da liberdade sobre a opressão é sempre um longo caminho marcado por sofrimentos, de
contratempos e requer um grande compromisso. Jacó sofreu, seus filhos conheceram a fome e a
fuga, seus netos e as gerações seguintes foram oprimidas, martirizadas e conheceram a escravidão
no Egito. Sem uma confiança inquestionável no poder libertador de Deus, os Hebreus não teriam
nunca conhecido a liberdade.

Essa esperança os sustentou através das horas sombrias que eles conheceram. Oferendo suas
primícias com esta declaração que lembrava a sua tumultuada história, o povo sublinhava a
importância de afirmar que nada nos é conquistado para sempre. E Maimônides concluiu que “esse
ritual permite guardar na memória os milagres que Deus nos concede e de manter nossa confiança
nEle”.

Rashbam
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Para Rashbam, esse ritual tem outra dimensão que vai além da recordação do passado e o fato de
que o povo judeu depende dos milagres de Deus. Rashbam notou a importância de que cada
participante, se encontrando no interior do Templo com seu cesto de primícias, participava também
de um gesto pleno de significado – uma confissão altamente pessoal. Se identificando com Abraão,
ele declarava: “Meu pai (Abraão) era um Arameu nômade”. Fazendo assim, ele expressava seu
pensamento profundo e afirmava: “Meu antepassado, não aquele de outra pessoa, mas o meu, era
nômade e meus pais sofreram no Egito, foram libertados e lutaram para conquistar a terra de Israel.
Eles foram vitoriosos e eu trago este cesto graças à ajuda que Deus me concedeu”.

Rashbam estava certo de que para o peregrino, esse ritual tinha um sentido fundamental que lhe
permitia se identificar aos seus ancestrais e afirmar que os frutos contidos no seu cesto e que a
libertação do Egito não eram a consequência da ação unicamente humana, que a vontade divina
transformou os grãos em frutos e que era Deus quem tinha libertado os escravos.

Rashbam considerava que cada participante desse ritual no Templo chegava à seguinte conclusão:
“Meus antepassados vieram de outro país onde eles foram reduzidos à escravidão e chegaram neste
país bom e próspero. É por isto, que em agradecimento, eu trago essas primícias ao Templo pois eu
percebo que essa abundância não é unicamente fruto de meu trabalho, mas também a consequência
da bênção de Deus” (Comentário sobre o Deuteronômio 26,3-11).

Rabbi Aaron Halevi acreditava que os Hebreus deviam recitar a oração “Meu ancestral era um
Arameu nômade... o Eterno nos libertou do Egito... É por isto que trago esses primeiros frutos...”
pois “o espírito e a imaginação das pessoas são profundamente influenciadas por aquilo que eles
dizem”. Essa oração “ergue o coração e conduz aqueles que a pronunciam a afirmar que tudo aquilo
que eles apreciam é exclusivamente um dom do Deus do universo” (Sefer haHinouk 606).

Contra a pretensão de ....

Rabbi Jacob J. Weinstein comenta também sobre isso: “Nos tempos de prosperidade, era pedido a
casa um de lembrar que seu ancestral era um nômade arameu, um imigrante, um refugiado sem
raízes e sem domicílio fixo. Ele é lembrado que é preciso mais do que trabalho, competências,
ambição e a vontade para se erguer da pobreza para a riqueza. E para isso é necessário igualmente a
ajuda de Deus... A verdadeira piedade, como expressou o filósofo Santayana, é o reconhecimento e
a consideração das verdadeiras fontes da nossa existência” (O lugar do entendimento, p. 136-138).
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O filósofo do século XX Martin Buber considera que essa declaração do Hebreu é única pois ela é
uma expressão pessoal, enunciada com um título individual. Em vez de dizer: “Nossos ancestrais
eram Arameus fugitivos”, se diz: “Meu ancestral...” Isso que temos aqui, disse Buber, é a
emergência simultânea do povo e do indivíduo. O essencial desse ritual permite a identificação do
indivíduo com a história de Israel. Ele o enraíza no passado e ao mesmo tempo convida a identificar
como descendente direto (meu ancestral...) daqueles que foram libertados da escravidão do Egito e
vagaram quarenta anos no deserto antes de entrar na terra de Israel.

Essa identificação não é gratuita. Ela liga de modo deliberado os Hebreus a experiência histórica
deles e a responsabilidade deles de colocar em prática os mandamentos. Cada ano, explica Buber, o
fiel vai até ao Templo e diz: “Eu, como indivíduo, eu afirmo que me considero como uma pessoa
que vem entrar nessa terra e, a cada vez que eu ofereço esses primeiros frutos, eu reconheço o que
eu sou e eu renovo minha pertença de identidade” (Israel e Palestine, Farrar, Strauss and Young,
New York, 1952, p. 3-5).

A interpretação que fez Buber da declaração do fiel como expressão da relação com a história, pode
ser comparado à declaração que é lida na Haggadah de Pessach (Páscoa). Após ter terminado a
narrativa da libertação da escravidão, narrativa que começa assim: “No início nossos ancestrais
eram idólatras...” e compreende um comentário rabínico sobre “meu ancestral era um Arameu
fugitivo”, cada pessoa que está presente ao Seder diz: “A cada geração, cada um deve se considerar
pessoalmente como se tivesse saído do Egito...” A estrutura do Seder e aquela da oração
acompanham a oferta do cesto preenchido com os primeiros frutos e ligam o indivíduo ao povo
judeu.

Tais rituais contradizem ao individualismo e a atitude solitária colocando o indivíduo em companhia


daqueles que partilham as mesmas aspirações éticas, os mesmos heróis e heroínas, as mesmas
tragédias e os mesmos triunfos. Participando do Seder, cada um é reenviado à “casa” , tendo sido
renovado, conectado com a sua história e sua tradição milenares.

E o que se diz sobre aqueles que não nasceram judeus, cujo passado não é o passado judaico e que
se converteram ao judaísmo? É correto que eles digam igualmente “arami oved avi”?

Maimônides disse que sim, que é preciso “pronunciar como elas são formuladas na liturgia. Não
mudem nada! Vocês devem fazer a mesma coisa que um Judeu de nascimento reza e recitar as
bênçãos, seja de modo privado como em público quando dirigir a sua oração... A razão para isso é
que Abraão, nosso pai, se dirigiu a toda a humanidade... Não existe diferença alguma entre vocês e
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nós” (Jacob S. Minkin, The World of Moses Maimonides, Thomas Yoseloff, New York, 1957, p.
375-376).

Leibowitz

Comentando os termos de Maimônides, Nehama Leibowitz conclui que esse texto de Maimônides
rejeita toda teoria racial que iria avaliar a qualidade de um indivíduo segundo as suas origens.
Maimônides fundamenta de modo claro e verdadeiro os méritos das pessoas aos olhos de Deus em
função da sua conduta e dos seus atos.

Peli

Pinhas Peli comunga do mesmo ponto de vista e o expande ainda mais quando dizia que ao lembrar
as lutas de Abraão e o sofrimento dos Hebreus sob a escravidão, o peregrino fazia da história dos
Hebreus sua própria história. Através dessa cerimônia, cada um se tornava um participante
consciente e orgulhoso diante dos desafios colocados hoje e seu futuro.

2. BÊNÇÃOS E MALDIÇÕES. QUEM É O RESPONSÁVEL? SÃO ELAS JUSTIFICADAS?

Nos discursos de Moisés aos Hebreus, encontramos uma ideia central que tinha aparecido antes na
Torah. Alguns a consideram como o maior desafio colocado diante dos Hebreus. Está dito que se
eles observarem fielmente as mitzvot, isto é, os “mandamentos”, eles serão abençoados. Mas se eles
não colocarem em prática os mandamentos, eles serão amaldiçoados. A escolha lhes pertence.

Essa representação de bênçãos e maldições se encontra igualmente no Levítico, na Parashat Behar-


Behoukotai. A Torah volta aqui sobre esse tema. Mas desta vez, ele é apresentado como uma
fórmula ritual que deve ser pronunciada na intenção do povo, pelos chefes das tribos e proclamada
pelos Levitas.

O ritual contém doze maldições e depois Moisés lhes assegura que se ao contrário, o povo observar
os mandamentos da Torah serão quatro vezes abençoados. Após especificar essas bênçãos Moisés
ainda acrescenta outras recompensas .
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Moisés em seguida especifica as calamidades que se abaterão sobre o povo em caso de


desobediência, até mesmo com a opressão e o retorno à escravidão no Egito!.

Poderíamos nos perguntar se Moisés pensou sobre as bênçãos e maldições como estão descritas
mesmo? Ele acreditava realmente que a recusa em aplicar os mandamentos iria trazer mesmo tão
assustadoras punições? Em nossa sociedade moderna, qual lição pode ser aprendida a partir dessas
maldições e dessas bênçãos ?

Muitos foram entre os primeiros intérpretes da Torah que sugeriram que Deus recompensa aqueles
que obedecem às mitzvot (preceitos) da Torah. Rabbi Josué de Siknin, em nome do Rabbi Levi,
ensinava que Deus escuta as orações daqueles que praticam os mandamentos e que tal é a sua
recompensa. Outros sugeriram que a recompensa é o sucesso nos negócios. Rabbi Jonathan
considerava que a aplicação das mitzvot tinha por consequência a possibilidade de ter muitos filhos,
a garantia de que a chuva cairia no tempo oportuno e a garantia da vida para além da morte
(ressurreição). Rabbi Abba ben Kahana resumiu a opinião da maioria dos primeiros comentadores e
disse: “Se os Hebreus vivessem de acordo com as leis da Torah, Deus lhes recompensaria lhes
assegurando uma vida no mundo vindouro – uma vida para além da morte”. Mas então “Por que os
homens de bem sofrem e alguns ‘perversos’ parecem escapar de todo sofrimento e de toda
infelicidade? Numerosos rabinos afirmaram que as bênçãos e maldições de Deus lhes espera no
mundo futuro – o olam haba. É lá que nós conheceremos a verdadeira e completa justiça de Deus.

Rashi propôs uma leitura diferente daquela feita pelos rabinos. Considerando importante o duplo
uso do verbo “escutar” presente na Torah: “Escuta Israel!...Escutarás a voz do SENHOR teu
Deus...” (Dt 27,9-10) e explica que essa menção dupla tem um objetivo educativo. A Torah tenta
ajudar as pessoas a compreender que o caminho que conduz à colocação na prática dos
mandamentos pode ser difícil, particularmente no início. Essa é a razão pela qual as bênçãos são
prometidas para todos os que cumprirem os mandamentos. Eles são portanto encorajados a dar o
primeiro passo em colocar em prática os mandamentos. E quando já estiverem comprometidos nesse
sentido descobrirão o prazer que existe nisso e estarão mais inclinados a aceitar os mandamentos
divinos.

Rabbi Simon ben Azzai parece confirmar isso quando dizia que uma mitzvá conduz a outra mitzvá.
Tanto Rachi como ben Azzai consideram a lista das bênçãos e maldições como uma pedagogia, um
meio para nos convidar à aplicação dos mandamentos da Torah.

O rabino Abraham Joshua Heschel considera essa passagem de outro modo diferente. Ele nos
chama a atenção dizendo que o objetivo da Torah não é o de “nos oferecer equações simples de
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recompensas e de punições, mas de ampliar nossa consciência sobre o mundo”. A Torah tem por
objetivo alargar o horizonte de nossa consciência e de nos fazer tomar consciência da parceria que
nos liga a Deus quando se trata do bem e do mal e quando somos confrontados com os enigmas da
existência. Para ele é evidente que a questão fundamental é: “O que nos pede Deus?”

Heschel responde que Deus nos pede de agir e que isso constitui uma mitzvá. “É através dos atos
que nos tornamos conscientes do que a vida é realmente, que é através dos nossos atos que nós
podemos machucar e ferir, destruir e devastar, que nós temos a capacidade de sentir a alegria e de
partilhá-la com os outros. A ação é um teste, um julgamento e um risco. Aquilo que cumprimos
pode parecer insignificante, mas as consequências são imensas. A falta de conduta de um indivíduo
pode ter consequências desastrosas para um país. O sol se põe, mas as consequências de um ato
ainda estão acontecendo.

As consequências de nossas ações podem ser graves, às vezes desconhecidas ou terem até mesmo
longa duração. Elas podem gerar as bênçãos ou as maldições, as felicidades ou os desesperos. Mas
elas são os vetores através dos quais nós celebramos ou rejeitamos nossa parceria com Deus. Trata-
se portanto do futuro da nossa espécie e das espécies que habitam no mundo.

Estamos em cima de uma lâmina de barbear, de uma navalha. É fácil de fazer o mal, de machucar,
de desprezar, de destruir... a vida”. Por essa razão nós nos devemos considerar como “em parte
culpados e em parte cheios de méritos”. Se nós cumprimos um ato positivo, fazemos pender a
balança em direção à bênção. Uma transgressão, e a balança pende em direção às maldições. “Tudo
está no equilíbrio, desde o indivíduo até ao mundo inteiro. A ação de uma pessoa pode decidir sobre
o futuro do mundo”.

Heschel coloca sobre cada um de nós a responsabilidade pelas recompensas e pelas sanções, pelas
bênçãos e pelas maldições. A longa lista de maldições mencionadas na Torah não são advertências,
mas sim convites para o nosso agir, ou a garantia para uma existência feliz para além da morte. As
bênçãos e as maldições, dizia Heschel, são as rigorosas consequências das escolhas que nós
fazemos.

O futuro não é a consequência de um destino cego: ele depende daqueles e das escolhas deles. Pode-
se dizer que na época de Moisés, Deus esperava a resposta deles. E pode-se dizer hoje que Deus
também espera a nossa resposta...

Para continuar a reflexão...


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1. “Tu és o Filho de Deus, Tu és o Rei de Israel”, exclamou Natanael no Evangelho de


João em Jo 1,49. Também um cristão é chamado a assumir essa história de Israel,
com os seus ancestrais, com suas alianças e fracassos?
2. Existe na sua opinião, relação direta com as consequências positivas (outro termo
para “bênçãos”) na aplicação dos mandamentos?
3. Que outras questões você faz diante dos textos propostos? Perguntas abrem
caminhos...

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