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O PODER LEGISLATIVO E SUA INTERFERÊNCIA NA VIDA COTIDIANA

DA MULHER BIZANTINA.

Alexsandra Gomes.1

Resumo: A “mulher Bizantina” (como objeto de estudo) na maioria das vezes é


um tema falado em sua amplitude e raramente são aprofundados aspectos
específicos, ainda é escassa a documentação que se refere a mulher e quando
citadas são sempre em segundo plano2. Logo, neste artigo será falado sobre a
legislação em relação a mulher, como eram tratadas perante a lei, de que
forma a lei as colocavam em desvantagem se comparadas aos homens e se
eram asseguradas de alguma forma. No geral, com base em fontes sobre a
sociedade em si e no código de Justiniano (corpus juris civilis). A legislação
estará separada por tópicos de acordo com seu nicho.

Palavras chave: mulher; legislação; bizantina;

Introdução: O império Bizantino foi fundado em 330 d.c e terminou em 1453


d.c, totalizando, assim, 11 séculos de poder. Durante esses 11 séculos a
legislação foi tomando forma (e inclusive se tornou um fator influente para a
legislação brasileira e um modelo a ser seguido). Dentro das diversas leis
sobre pontos importantes da sociedade, que visavam o controle social e a
segurança, as mulheres eram citadas em segundo plano, dificilmente vamos
ver leis pensadas exclusivamente para as mulheres, mas em algumas elas são
as protagonistas, como por exemplo a lei presente no código de Justiniano
sobre a herança, e a lei que condenava o aborto. A vida das mulheres era

¹ Graduanda em História pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).


2 Salvas exceções de imperatrizes e mulheres da aristocracia que frequentemente apareciam em

documentações pois eram importantes para os trâmites políticos.

1
totalmente controlada pela legislação, não tinham o direito do livre arbítrio,
ações e desejos básicos do cotidiano eram punidos severamente. Suas
vontades não eram levadas em conta e isso acontecia desde o momento do
seu nascimento até a sua morte. E essa descriminação da mulher era
generalizada na sociedade, eram raras as exceções que se opunham.

“ A leitura atenta dos textos que chegaram até nós


sugere que a sociedade patriarcal de bizâncio nutria
uma atitude ambivalente face à mulher, a qual se
exprime da melhor forma na antítese entre Eva e a
Virgem Maria: incessantemente denegrida, a primeira,
por ter tentado e persuadido Adão a comer da árvore
proibida do conhecimento e, por conseguinte, causa do
pecado original; venerada, a segunda, como pura,
imaculada Mãe de Deus, cujo o filho desceu para
purificar a Humanidade dos seus pecados e ofereceu a
possibilidade da salvação e da vida eterna.” (TALBOLT,
Alice-Mary. 1998. Pág 117).

O casamento:

O casamento era indispensável a uma mulher Bizantina, ela tinha que se


casar para gerar herdeiros. De início a idade mínima para que uma menina
fosse submetida ao casamento era 7 anos, no meio de sua infância, antes
mesmo de seu corpo estar pronto para relações sexuais, depois a idade
mínima passou para 12 anos, vale ressaltar que as leis nem sempre eram
respeitadas e muitas acabavam casando com 5 ou 6 anos. Nos próprios
tribunais eram conservados documentos sobre casamentos que tiveram
resultados trágicos.

“Por volta de 1300, Simonis, filha de Andrônico II tinha 5


anos quando foi desposada pelo soberano do reino da
Sérvia, homem feito. Simonis ficou danificada em
consequência das relações sexuais prematuras que a
impossibilitaram de ser mãe.” (TALBOLT, Alice-Mary.
1998. Pág.121) .

O casamento acontecia através de um acordo entre os pais da noiva e


do noivo, na cerimônia era incluída a arra sponsalicia seria um sinal que a
família do noivo dava a família da noiva para assegurar o casamento e garantir

2
que iria acontecer, esse sinal poderia ser uma quantia em dinheiro, poderia ser
partes de território, entre outras coisas, e era dado a família antes que o
casamento acontecesse. Além disso, a família do noivo ainda prometia o
donatio propter nuptias que era uma doação (em dinheiro, cabeça de gado,
territórios etc.) para que a noiva se casasse com o noivo, essa doação só era
efetivada a partir do momento em que o casamento fosse concretizado.

Essa doações feitas para a família e para a noiva futuramente serviriam


para a herança que ela deixaria para seus filhos, já que durante sua vida ela
tinha controle sobre o valor (mesmo que o marido fosse o responsável por
administrar). A lei garantia que a herança deixada pela mãe seria de igual valor
tanto para o filho quanto para a filha, através disso, muitas mulheres
conseguiram acumular riquezas.

Em caso de viuvez, a lei permitia a segunda núpcias, tanto a mulher


quanto o homem poderiam se casar novamente e fazer todo o processo
habitual. Normalmente eram as mulheres que ficavam viúvas por serem muito
mais novas que seus maridos.

O divórcio era concedido se a mulher cometesse adultério ou se tivesse


comportamentos inconveniente, como por exemplo, se quisesse frequentar o
hipódromo. E da parte dos homens, a mulher poderia pedir o divórcio caso o
marido fosse louco ou impotente. É importante falar que, no início era proibido
o casamento de um funcionário do governo e de uma atriz (profissão que era
atribuída a prostituta) ou camponesa. Quando Justiniano conheceu Teodora (
atriz, dançarina e comediante), os dois se apaixonaram e quiseram se casar,
mas sua tia, a imperatriz Eufemia (esposa de Justino) foi contra o casamento
por achar o passado de Teodora vergonhoso. Quando eufemia morreu, Justino
aceitou mudar a lei para que Justiniano e Teodora se casassem. Foram
coroados imperador e imperatriz, e governavam de igual para igual, o que
permitiu que Teodora defendesse seus ideais dentro das leis.

Teodora co-governante:

3
Teodora defendia o direito das mulheres e usou de sua influência para
elaborar leis que amparassem as mesmas. Primeiro foram criadas leis
referentes à prostituição - fechou bordéis, criou abrigos para as que ficariam
sem lar - e tornou crime a prostituição forçada. Além disso, instituiu leis que
ampliavam os poucos direitos que a mulher tinha (o que contribuiu para a
construção de um respeito social/ coletivo para com a imagem da mulher) são
elas: (1) ampliação dos direitos em caso de divórcio; (2) Direito a propriedade;
(3) Pena de morte em caso de estupro; Também aboliu uma lei que condenava
a mulher a morte caso cometessem adultério, essa movimentação legislativa
de Teodora causou indignação em boa parte da sociedade que considerava a
mulher indigna de direitos e inferiores aos homens. Procópio de Cesarea
considerava tais leis como atentado aos direitos dos maridos.3 Para ele,
Teodora foi o motivo da ruína da sociedade a partir do momento em que se
casou com Justiniano.

“Naquele tempo era um fato que quase todas as


mulheres tinham uns costumes depravados, pois pecavam
contra seus maridos com completa liberdade, sem que esta
ação lhes acarretasse perigo ou dano algum, pois todas
culpadas de adultério ficavam impunes. Foram em seguida
junto à imperatriz e, dando a volta na situação, levaram a
julgamento seus maridos iniciando um processo com
acusações por fatos .” (PROCOPIO DE CESAREA. XVII. Pág
24-25.)

Em processos jurídicos:

De acordo com o código de Justiniano4 a mulher não poderia ser


testemunha de um testamento. Seu testemunho gerava desconfiança e não
tinha peso semelhante ao dos homens. A novella de Leão VI proibia que as
mulheres assistissem a negociações de contratos pois era um ambiente

3PROCOPIO DE CESAREA. Historia Secreta. Introducción…, op. Cit., p. 257-258.


4Código Justiniano, é a obra jurídica composta pelas leis promulgadas desde o tempo de Adriano até
Justiniano, classificadas, revistas e apresentadas por ordem cronológica.

4
masculino. Só podiam testemunhar ocasiões de esferas femininas, como por
exemplo um parto.

Aborto:

Normalmente praticado por escravas que se encontravam em duas


situações: não podiam engravidar porque tinham que servir e em caso de
violência sexual pelo seu senhor, não poderia engravidar dele. Também
praticado por não casadas, e em alguns casos praticado por casadas que só
não tinham vontade de ser mãe, como era o caso de Teodora, que já abortou
diversas vezes. O aborto era condenado pelo direito civil e poderia levar a
morte, visto que, gerar um herdeiro era visto como principal papel da mulher e
ela não teria o direito de se recusar a cumprir. Ele era feito tanto com mágica
(bebidas consagradas etc) quanto colocando objetos pesados sob o ventre.

Adultério:

O adultério também era condenado, além da pena de morte (para a


mulher), as duas partes culpadas tinham seus narizes cortados. O adultério
poderia ser usado como justificativa que o homem dava para pedir o divórcio
da mulher.

Conclusão:

Após a execução deste artigo, que me permitiu melhor conhecimento


sobre as leis que regiam as mulheres, se tornou nitidamente visível a diferença
de tratamento entre homens e mulheres. Trazendo a análise dessa temática no
período em que se passa e usando-a para entender a linha do tempo da
história feminina em geral, podemos perceber que desde os primórdios as
mulheres eram tratadas com falta de respeito, não eram dignas de exercer uma
posição de autoridade, e isso tudo por causa de uma superioridade masculina
advinda de uma cultura cristã que sempre colocou as mulheres como donas de
casa e impossibilitadas de mudar esse rumo pois essa função teria sido

5
escolhida por Deus para o sexo feminino e se recusar a cumprir seria
considerado a rejeição pelo cristianismo, o que iria caracteriza-la como
herética.

Referências bibliográficas:

CAVALLO, Guglielmo (Direção). O Homem Bizantino. Lisboa: Editorial


Presença, 1998, TALBOT, Alice-Marie, Capítulo V: “A Mulher”, os. 115-139.

EDUARDO, José. Corpus juris civilis: Justiniano e o direito brasileiro. 2012.


Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22969/corpus-juris-civilis-justiniano-e-
o-direito-brasileiro

HENRIQUE, Thiago. O código de Justiniano e a sua importância para o direito


brasileiro. Disponível em: https://thiagobo.jusbrasil.com.br/artigos/405074667/o-
codigo-de-justiniano-e-a-sua-importancia-para-o-direito-
brasileiro#:~:text=Curiosamente%20%2D%20e%20para%20o%20espanto,o%2
0dom%C3%ADnio%20de%20seu%20genitor.

MARIA, Aylla. A imperatriz Teodora e a caracterização feminina elaborada por


Procópio de Cesarea em história secreta. Sergipe. 2019.

PROCOPIO DE CESAREA. Historia Secreta. Introducción, traducción y notas


de Juan Signes Codoñer. Madrid: Editorial Gredos, 2000.

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