Você está na página 1de 5

MÁGICA, VIÉS COGNITIVO E SAÚDE MENTAL

O viés cognitivo é um fenômeno psicológico que ocorre quando nossa


percepção da realidade é distorcida devido a processos mentais que envolvem
crenças, expectativas e emoções. Essas distorções cognitivas são muito
comuns e podem levar a julgamentos errôneos, decisões imprudentes e uma
série de outros problemas psicológicos.

A arte mágica, por sua vez, é uma forma de entretenimento que se baseia em
truques e ilusões para enganar a percepção do público. A mágica é
frequentemente usada como uma metáfora para ilustrar os processos mentais
que envolvem o viés cognitivo. Neste artigo, discutiremos como a mágica pode
nos ajudar a entender melhor o viés cognitivo e como isso pode ter
implicações importantes para a prática clínica da psicologia.

O viés cognitivo é um tema de pesquisa importante em muitas áreas da


psicologia, incluindo a psicologia cognitiva, a psicologia social e a psicologia
clínica. O viés cognitivo pode assumir muitas formas diferentes, mas todos
envolvem algum tipo de distorção na percepção da realidade. Por exemplo, o
viés de confirmação ocorre quando procuramos ativamente informações que
confirmem nossas crenças pré-existentes, enquanto ignoramos informações
que as contradizem. Já o viés de ancoragem ocorre quando somos
influenciados por informações iniciais ao tomar decisões, mesmo que essas
informações não sejam relevantes para a situação atual.

A arte mágica pode ser usada como uma metáfora para ilustrar esses
processos cognitivos. Por exemplo, muitos truques de mágica envolvem a
manipulação de nossa atenção e percepção. Um mágico pode nos distrair com
uma mão enquanto realiza uma ação com a outra mão, fazendo com que
percamos de vista o objeto em questão. Isso pode ser usado para ilustrar como
nossa atenção pode ser manipulada e como isso pode levar a erros cognitivos.
Outro exemplo é o truque de mágica conhecido como "carta forçada". Neste
truque, o mágico faz parecer que o espectador escolheu uma carta aleatória
do baralho, quando na verdade a carta foi previamente escolhida pelo mágico.
Isso pode ser usado para ilustrar como nossas escolhas podem ser
influenciadas por sugestões e expectativas pré-existentes.

Esses exemplos mostram como a arte mágica pode nos ajudar a entender
melhor o viés cognitivo e como isso pode ter implicações importantes para a
prática clínica da psicologia.
Os psicólogos podem usar a mágica como uma ferramenta para engajar e
motivar os pacientes em sua própria terapia. Além disso, a mágica pode ser
usada para ensinar aos pacientes sobre os processos cognitivos subjacentes ao
viés cognitivo, o que pode ajudá-los a se tornar mais conscientes de suas
próprias distorções cognitivas.
Além disso, a arte mágica também pode ser usada de forma terapêutica em
conjunto com outras técnicas da psicologia comportamental, como a terapia
cognitivo-comportamental (TCC) e a terapia de exposição. A combinação
dessas abordagens pode levar a resultados mais eficazes e duradouros na
redução de sintomas de ansiedade, fobias e transtornos obsessivo-
compulsivos.

Um exemplo de como a mágica pode ser usada em conjunto com a TCC é o


chamado "efeito revelador", que foi descrito por Goldstein e Hersen em 2004.
Este efeito refere-se ao uso de truques de mágica para ajudar o paciente a
perceber as falhas em sua própria lógica ou raciocínio, o que pode levar a uma
mudança em seus pensamentos e comportamentos disfuncionais.

Por exemplo, um mágico pode realizar um truque que mostra como a mente
humana é facilmente enganada por ilusões de ótica, fazendo o paciente
perceber como ele mesmo pode ser enganado por suas próprias crenças
limitantes. Isso pode levar a uma maior conscientização sobre seus próprios
pensamentos e comportamentos, permitindo que o paciente trabalhe com o
terapeuta para identificar e modificar seus padrões cognitivos negativos.
Outra técnica comum é a exposição graduada, que envolve a exposição do
paciente a situações que causam ansiedade ou medo de forma gradual e
controlada, para que eles possam aprender a lidar com a situação de forma
mais eficaz. A arte mágica pode ser usada para criar simulações dessas
situações, permitindo que o paciente pratique suas habilidades de
enfrentamento em um ambiente seguro e controlado.

Além disso, a mágica pode ser usada como uma forma de distração e
relaxamento, permitindo que o paciente se afaste dos pensamentos e
sentimentos negativos por um momento e concentre sua atenção em algo
positivo e prazeroso.

A arte mágica tem um grande potencial terapêutico quando combinada com


técnicas da psicologia comportamental. Através da exploração dos
mecanismos cognitivos e emocionais que sustentam a magia, os terapeutas
podem ajudar os pacientes a identificar e modificar padrões disfuncionais de
pensamento e comportamento, além de fornecer uma forma segura e
controlada de exposição a situações de ansiedade. A arte mágica também
pode ser usada como uma forma de distração e relaxamento, ajudando os
pacientes a lidar com o estresse e a ansiedade.

Há algumas pesquisas recentes que têm explorado o potencial da mágica na


psicologia. Uma pesquisa interessante, conduzida por Peter Lamont e Richard
Wiseman, examinou a eficácia da mágica no tratamento de ansiedade em
crianças. Os pesquisadores descobriram que a mágica pode ser uma técnica
útil para reduzir a ansiedade em crianças, uma vez que a ilusão criada pela
mágica pode ajudar a distrair a mente das preocupações e temores.

Outro estudo conduzido por Gustav Kuhn e colegas investigou o uso da mágica
em terapia ocupacional, especificamente no tratamento de pacientes com
acidente vascular cerebral (AVC). Os pesquisadores descobriram que a mágica
pode ajudar a melhorar a motivação dos pacientes, aumentar sua autoestima e
ajudá-los a recuperar habilidades físicas e cognitivas.
Isso sugere que a mágica pode ter um papel importante no tratamento de
distúrbios neurológicos.

Além disso, uma revisão sistemática de 2018 de estudos sobre mágica e saúde
mental descobriu que a mágica pode ter um efeito positivo no bem-estar
psicológico. Os autores da revisão sugerem que a mágica pode ser utilizada
como uma técnica complementar para ajudar pacientes com ansiedade,
depressão e outras condições de saúde mental.

Esses estudos sugerem que a mágica pode ter um papel importante no


tratamento de uma ampla variedade de condições psicológicas e neurológicas.
No entanto, é importante notar que a pesquisa nesta área ainda é limitada e
mais estudos são necessários para avaliar a eficácia da mágica como uma
técnica terapêutica.

Referências:

• Wiseman, R., & Lamont, P. (1999). Magic in theory: An introduction to the


theoretical and psychological elements of conjuring. University of Hertfordshire
Press.
• Kuhn, G., Amlani, A. A., & Rensink, R. A. (2008). Towards a science of magic. Trends
in Cognitive Sciences, 12(9), 349-354.
• Lamont, P., & Wiseman, R. (2006). Magic in therapy: Using magic as a therapeutic
tool with children and adolescents. In J. W. Rhoads (Ed.), The therapeutic use of
stories (pp. 171-192). Binghamton, NY: Haworth Press.
• Kuhn, G., & Tatler, B. W. (2016). Magic and fixation: Now you don't see it, now you
do. Perception, 45(9), 963-975.
• Kuhn, G., & Martinez, L. M. (2018). The psychology of magic and the magic of
psychology. Current Directions in Psychological Science, 27(5), 344-350.
• Kuhn, G., & Land, M. F. (2006). There's more to magic than meets the eye. Current
Biology, 16(22), R950-R951.
• Kuhn, G., & Rensink, R. A. (2002). The vanishing ball illusion: A new perspective on
object permanence. Psychological Science, 13(2), 129-136.
• Kuhn, G., & Tatler, B. W. (2005). Visual momentum: The use of dynamic transitions in
perceptual tasks. Visual Cognition, 12(1), 139-159.
• Goldstein, A. J., & Hersen, M. (2004). Handbook of psychological approaches with
people who have physical disabilities. Routledge.
• Yaniv, I. (2010). Reconsidering the role of explanation in magic. Thinking &
Reasoning.

Você também pode gostar