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LUCRATIVIDADE E SUSTENTABILIDADEl
RESUMO
{'I Este trabalho foi apresentado no XV ISA World Congress of Sociology 2002, nd Rc-40 - Session: The GiobalFearm Crisis:
Comparative Perspectives, Brisbane, Austrália, realizado de 7 a .13 de julho de 2002. Contou com o apoio financeiro da
FAPESP, instituição à qual a autora agradece.
(2) Prof" da Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA)/UNESP - Botucatu e Pror DI'" colaboradora do Programa de Pós-
Graduação da Faculdade de Engenharia Agricola (FEAGR.I)/UNICArvlP. CP 237, CEP 18603-970, Botucatu - SP, fax 14-
682i5467. E-mail: stella@fca.unesp.brestella@agr.unicamp.br
ST~
JT __
Family agriculture must be the cent ~iallY su;tainable rurality and ag;ifOOd
systems restructuring mode/s. Production decisions by family farmers present
basic differences comparing to capitalistic entrepreneurs, with reflections on
price formation. According to the capitalistic logic, price should include, in
addition to total average production costs , the average expected profit for a
specific activity and land rent. In family agriculture, prices do not necessarily
contain profit and land rent. Moreover, family farmer may not remunerate his
own labor or his "managerial work". As the farmer's prime objective is family
subsistence, accumulation is not its only goal. His sustainability is due more to
his social reproduction, to his cbences ot obtaining enough income to cover
his expenses in the short rua, and to restore the production means in a long run,
tben to increase capital The result is lower production costs and prices. Given
the relevance that family produciion sti/l has in the world eqriculiurnl supply, .
tne: mechanism leads to a decrease in the average production costs and prices
of agricultural products, and a/so to smaller economic needs to maintain family
farmers in lhe production.
Key wortis: social/y susteinebí« agriculture, family reproduction, price for-
mstion.
las, vem capitaneando a história do desenvol- sidades internas de consumo, ao mesmo tem-
po em que estabeleceram programas de sus-
vimento rural no sentido de libertar o homem
do jugo e do medo da falta de alimentos. A tentação de preços agrícolas que evitaram '0 .
rebaixamento da taxa de lucratividade da agri-
base da agricultura capitalista, historicamente
cultura relativamente aos demais "setores" da
advinda de grandes posses territoriais da no-
economia. Enveredando por uma distribuição'
breza medieval, absorveu o campesinato em
a
transformações f, especializações atreladas,
menos concentrada
propriedade familiar,
da terra, e aparelhando
economicamente viável,
em cada país, ao caráter do trabalho familiar,
para ser o suporte. da produção agropecuária,
ao tamanho do estabelecimento eà natureza
esses países estabeleceram a modernidade
da produção.
agrícola na efetivação da agricultura familiar
Do ponto de vista econômico a produção (VEIGA, 1991).
familiar, visualizada como um conjunto, se Embora não se possa dizer o mesmo
contrapõe a outro de empresários capitalistas, em relação aos países subdesenvolvidos, os
no que se refere a elementos básicos e reflexos dessa modernização foram mais ou
limitantes na lógica de tomar decisões para menos intensos conforme a história social e
produzir. Ou seja, existem diferenças básicas política de cada país, e o grau de importância
entre eSS8S dois conjuntos que influenciam o dado aos segmentos patronal e familiar, o que
processo de produção, os custos de produção s8;;luraml?nte levou ao diferencial social entre
e o preço das mercadonas agrícolas, " cujos crescimento da economia e desenvolvimento
desempenhos levam a resultados diversos. econômico.
10
(3) Entende-se o sustentável como um desenvolvimento social e de progresso econômico, mantendo e conservando os recursos naturais,
)s
origem do futuro comum de uma humanidade que pretende tornar os impactos econômicos sobre o meio ambiente coisa do passado.
lU Logo, o processo de transformação transcende os limites geográficos e políticos, e coloca a sobrevivência de todas as espécies como
e seu objetivo maior, sendo o ambientalismo a face política desse processo que representa uma subversão aos valores atuais, recolocando
condição de trabalho, da propriedade fundiária perfeita é regulado pelo sistema geral dos .;-,
e do proprietário, para quem aterra nada mais preços relativos, de tal forma que a procura
representa que um tributo em dinheiro que o pelo lucro estimula a produção e se otimiza, "
monopólio lhe permite arrecadar do capitalista socialmente,. pela competitividade. Ao optar '
industrial, o arrendatário". Dessa forma, a terra, pela maximização do lucro, enquanto racio-
à semelhança do servo da gleba, se liberta das nalidade econômica das empresas, esses au- .\
"amarras" da tradição política e social feudal, tores embutem nos custos totais o lucro con-
e assume gradativamente a sua formatação siderado "normal", ou seja, sem lucros extras,
econômica no capitalismo desenvolvido. uma vez que a concorrência perfeita elimina
Na origem da renda paga pela explo- essa possibilidade. Embora sem referência
ração do solo, a classe social emergente, os explícita, a renda da terra é parte desse lucro...
capita.listas-industriais-arrendatários, se con- Assim, os custos totais de produção incluem.
trapõe na esfera produtiva aos proprietários os custos de produção, o lucro (mais a renda
de terras, e é obrigada a Ihes pagar a renda da terra) e a remuneração a que o empresário
fundiária em suas diversas manítestações". tem direito por ser um trabalhador como os
Essa se destaca do montante da mais va/ía demais. A identidade receita total e custos
extraída do trabalho transfigurada na forma totais viabiliza o empresário capitalista na pro-
de lucro, que paga aos senhores territoriais dução em concorrência perfeita (LEFTWICH, .
para poderem aplicar seu capital na produção 1983). O preço da mercadoria, portanto, não
agrícola. é um valor que deva remunerar as diferentes
classes sociais, mas sim comportar e refletir,
O preço final da mercadoria, no rnerca-
do, tem assim que cobrir, de alguma forma, no mercado, o embate das produtividades dos
as remunerações das três grandes classes diferentes fatores de produção.
sociais existentes no capitalismo: os trabalha- Tudo. se passa como se a empresa
dores, cujos salários fazem parte do preço de capitalista fosse apenas "uma unidade de
custo, o lucro, como a retribuição ao capital produção definida e equipada de meios de
empregado pelos capitalistas-arrendatários, e produção importantes, postos em funciona-
a renda da terra. reservada aos seus donos", mento Dor trabalhadores assalariados" (AMJN
Assim, o preço, ao refletir as relações de pro- & VERGOPOULOS,1977), de tal sorte que,
dução sob o regime capitalista, vai comportar, no nível das aparências, o capitalismo se
além dos custos de produção em que se resume ao conjunto funcional das empresas
encontra a remuneração dos trabalhadores, capitalistas.
as frações correspondentes às remunerações No entanto, sob o ponto de vista do ca-
dos agentes econômicos das outras classes pital como uma relação social, independente-
sociais. mente se a renda da terra é escamoteada no
Na visão dos economistas neoclássi- montante do lucro médio, ou se ela é separa-
coso o processo produtivo sob concorrência da conceitualmente enquanto a fatia reserva- .
(51 A renda da terra se divide em renda absoluta e renda diferencial. A primeira constitui o montante a ser pago ao proprietário pelo uso da terra
enquanto monopólio da propriedade privada. Já a renda diferencial diz respeito ao uso da terra enquanto recurso para a produção econômica,
ou seja, "A renda diferencial que estudamos até agora decorre da produtividade diversa de aplicações iguais de capital em terras de área igual
e fertilidade desigual, de medo que a renda diferencial era determinada pela diferença entre o rendimento do capital empregado na pior terra,
desprovida de renda, I: (I rio capira) empregado em terra melhor" (MARX (b), s.d.: 771) Mais especificamente renda diferencial I se reporta
às diferenças na fertilidace do solo e na localização da propriedade em relação às condições locais de infra-estrutura e mercados de insumos
e produtos, c a renda diferencial II refere-se às diferenças aicançadas na aplicação da tccnologia na produção.
(61 Quando os donos dos meios de produção e o proprietário da terra são a mesma pessoa, lucro e renda coincidem, não se •.... destacando as
diferentes formas da mais valia" (MARX (b), s.d.: 921).
os da aos proprietários de terra, o preço final de vez mais, negava (e ainda nega) sua existência
ira mercado dos bens produzidos no capitalismo configurada pelos movimentos reguladores da
ta, devem conter além dos custos de produção, o economia capitalista, ou pela atuação de inte-
tar lucro médio esperado reservado aos ernpre- lectuais que previram a.sua extinção nas déca-
io- sários-capitalistas, as rendas diferenciais i e 11 das pós-Marx, foram a preocupação primeira
IU- (se houver) ea renda absoluta, remunerações de Chayanov" em suas pesquisas na Escola
m- aos proprietários da terra. para a Análise da Organização e Produção
~s, Embora a formação dos preços pela Camponesas. Tanto Lenín" quanto Kautsky'",
na teoria econômica e a suaeteâvação nas ao estudar a diferenciação social dos pe-
cia . trocas comerciais constituam faces de urna quenos agricultores, acabaram postulando o
ro. mesma moeda, as incertezas quanto ao dectínio irremediável e a posterior extinção da
~m produção camponesa. No emparelhamento da
preço recebido pelos agricultores e o preço
da esperado pelo produto à época da tomada de agricultura e da indústria, a preferência lógica
rra
ca,
tn Não é intenção desse texto discutir as configurações e recorres do debate sobre a pequena produção e o campesinato.
lllII
:! . ~) Para finalidades dessa pesquisa basicamente adorou-se a construção teórica de Chayanov. A partir dos seus minuciosos levantamentos
Ta,
empiricos surgiu a "Teoria sobre a Unidade Econômica Camponesa", em que o autor construiu categorias analíticas específicas correspondentes
rta
tOS
às formas particulares de vida dos camponeses.
(9) LENIN, Vladimir 1.Capitalismo eAgriculrura nos Estados Unidos da América: novos dados sobre as leis de desenvolvimento do capitalismo
Da agriculrura. São Paulo: Brasil Debates, 1980. (Coleçào Alicerces). 100p.
as
(J~KAUTSKY, K. A Questão Agrária. São Paulo: Proposta Editorial. 1980.
Logo, o excedente obtido pelo agricultor cam- com salários, e muito menos se preocupar
ponês e sua família não é caracterizado como em obter a taxa média de lucro matara da
lucro, mas somente como uma retribuição do empresa capitalista.
seu trabalho que vai ser gasto no consumo fa- A partir dessa premissa são, logica-
miliar de bens e serviços (CHAYANOV, 1974). mente, encadeados outros princípios, como
Os princípios básicos do comporta- o da diferenciação demográfica. A satisfação
mento social e econômico do campesinato das necessidades familiares e o grau da auto-
foram estabelecidos partindo do pressuposto exploração do trabalho se dá em função do
de que a economia familiar camponesa é um tamanho da família e da proporção entre os
fenômeno em si mesma, e, portanto, ela não é membros que trabalham e os que apenas con-
descapita/izada por ser pequena e tampouco somem. Ou seja, essa relação consumidor/
é pequena por ser descapitalizada. O funda- produtor está intimamente ligada ao ciclo
mental é procurar nas suas relações internas familiar, a fase na qual se encontra a família
e externas quais os mecanismos que fazem (recém-casados, nascimentos, falecimentos).
funcionar a engrenagem do trabalho familiar A família modifica-se ao longo do tempo
na obtenção do produto familiar. A lógica da cunhando uma diferenciação demográfica e
pequena produção camponesa faz com que alterando, portanto, o balanço consumidoresl
ela se movimente em função do trabalho e tra ba Ihad ores.
necessidades de consumo familiares, sendo A produção, produto bruto da unidade
portanto diferente da lógica da circulação do econômica familiar, se apresenta como fruto
capital e acumulação capitalista. da atividade inseparável, indivisível e única da
O ponto central da teoria da unidade família, e a leva a receber, como resultado do
camponesa reside na conceito estabelecido seu trabalho, uma quantidade de bens e ser-
do equilíbrio existente entre o consumo da viços que não pode ser considerada "lucro",
família e a exploração da mão-de-obra fa- "renda" ou "juro" (categorias que expressam
miliar conjunta (auto-exploração), conhecido fenômenos sociais estritamente capitalistas)
como o balanço trabalho-consumo familiar. por dois motivos. Primeiro porque não se
Assim, a unidade camponesa organiza sua pode objetivamente determinar os custos de
produção em função das necessidades de produção dessa unidade camponesa, visto
consumo, e mais, é motivada por uma retribui- não existir salário ou mão-de-obra assala-
ção do seu trabalho que lhe permita equilibrar riada; e segundo, pelas dificuldades em se
suas necessidades com a intensidade desse definir claramente a natureza e a origem de
mesmo trabalho. É nesse equil'brio, dado pela seus rendimentos, uma vez que os "fatores"
satisfação das necessidades de consumo de geradores de renda têm vinculações comple-
bens e serviços pela família ea quantidade de tamente diferentes da exploração capitalista.
trabalho empregada, que se apóia a originali-
Assim, a família é a, principal categoria
dade da teoria chayanoviana. de anáíise para Chayanov, que a considera
Dessa maneira, o momento 08 qual o como um conjunto de produtores e consumi-
camponês pára de trabalhar é aquele em que, dores, ou melhor, uma 'unidade de trabalho e
para ele, ir além siqnifica uma sobrexotoração de consumo. Para ele a conceituação mais
do seu esforço que só l/ai lhe dar insatisfação abranpente é que "A unidade econômica cam-
face às suas necessidadee culturalmente ponesa é uma. empresa na qual empresário e'
definidas, pois, dentro d2 lógica não capitaltsta trabalhador se combinam em uma só pessoa"
camponesa, o principal é obter condições (CHAYANO\/ 1974). Genericamente pode-se ~
para a sua sobrevivência 8 reprodução social, ficar com o conceito de que família e negócio Z
sern a necessidade de se auto-remunerar estão indissoluvelmente associados, ,
de forma .~
}
(lIIPode-se definir sistema de produção como a "combinação coerente, no espaço e no tempo, da força-de-trabalho (familiar, assalariada
e parceria) e dos meios de produção (terra, máquinas e equipamentos, instrumentos de trabalho, benfeitorias, animais, insumos, etc.)
visando à obtenção de diferentes produções animais e vegetais. Na medida em que é o produtor que organiza essa combinação, segundo
uma determinada racionalidade (no caso dos agricultores familiares, visando à reprodução social da família), é possível entender o
papel de cada elemento do sistema e com isso a lógica de seu funcionamento como um todo, bem como, avaliar o grau de coerência ou
contradição do mesmo" (DUFUMIER. 1985). Logo, o sistema de produção é a combinação das produções e dos fatores de produção da
propriedade (conceitos agronômicos e econômicos), englobando os sistemas de cultivo e de pecuária. manejados dentro dos limites de
ocupação espacial da área explorada, dados pelas quantidades disponíveis de terra, mão-de-obra e capital.
Cabe perceber que a todo momento, Fica claro. nessa construção teórica,
no funcionamento do sistema, deve existir um que o funcionamento de' uma exploração
equilíbrio entre as necessidades e os recursos familiar passa necessariamente pela família
disponíveis da família. Esse equilíbrio mostra enquanto elemento básico de gestão finan-
a importância dos mecanismos de regulação, ceira (destinação dos recursos auferidos), e
que garantem a reprodutibilidade do sistema do trabalho total disponível internamente na
e de sua permanência, embora em constante unidade do conjunto familiar. Nesse sentido,
transformação ao longo do tempo. Não é, as decisões sobre a renda líquida obtida com
portanto, uma estrutura fixa. ;: venda da produção, fruto do trabalho da
f,:1mília, pouco tem a ver com a categoria lucro
A família orienta os processos de trans-
puro de uma empresa, resultado da diferença
formação com os recursos em trabalho, meios
entre renda bruta e custo total.
de produção e dinheiro, que reparte segundo
seus objetivos de produção, consurno, auto- O projeto familiar é o centro das de-
familiar, têm que tornar decisões que dão a di- 8 os entornas agroecoiógicos e socloeco-
nâmica do SFEA e vão depender, basicamen- nômicos constituem a base e o limite das
decisões. Todo o sistema de produção está
te, do ciclo de vida da família. As diferenças
entre um agricultor chefE: da família, jovem,
ligado às gestões do trabalho e das finanças,
8 ao projeto familiar conjunto associado ao
maduro ou velho, se refletem na quantidade
ciclo de vida.
de mão-de-obra, no volume de produção
para subsistência, no patrimônio acumulado,
na transmissão hereditária da terra, entre
outros condicionantes, para a maximização 2.3. O Preço recebido pelo agricultor familiar
do bem-estar coletivo.
Face ao comportamento do agricultor
o grupo farniüar tom que tornar, cons-
familiar em relação à gestão do seu próprio
tanternents, declsões estratéqicas, táticas
negócio, e a influência da família, pode-se
e técnicas. As cecisôes estratégicas dizem
descortinar importâncias no que tange à
respeito à continuidade 8-: projeto 'fsmiliar. Im- participação. dos diferentes componentes
plica considerar a raclonalídade dos agricul- que formam o preço de mercado, ou o preço
tores que formulam suas decisões em partes, recebido pelo agricultor.
e vai determinar o desenho dos sistemas de
O conjunto de agricultores com formato
produção.
de produtores mercantis, ou seja, aqueles
Após o estabelecimento do projeto ge- com aigum grau de inserção no mercado, está
ral estratégico sobre o sistema de produção é mais propenso, no seu processo decisório, a
que ocorrem as decisões táticas, levando-se aceitar parcelas variadas sobre a remunera-
em conta as restrições existentes com relação ção dos meios em~regados na produção e no
à constelação de "fatores d\~ produçâo". Para IJSO 02 terra na forma de renda. Ou seja, para
a realização concreta das operações r,·;!cas- () agriçultuf familiar tanto o lucro esperado
sita-se, em f;':lguida, das dEC;~/)'3S de caráter cuanto :\ rendimento da terra não são elemen-
mais técnico, portanto de urn coniunto rj,:; dR- tos definídores stiictu sensu na formação do
cisões mais detalhadas, em Q'.i8 se destacam preço recebido, e, portanto, na sua decisão
o conhecimento acumulado e as práticas dos de produzir.
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mINo livro 3, em parte dedicado ao movimento capitalista na agricultura e à formação do preço da, mercadorias, incluindo preço de custo,
lucro médio e renda da terra, encontram-se passagens sobre a pequena produção e as implicações com o lucro e a renda (MARX, (b) s.d.,
Capítulo XLVII: Gênese da Renda Fundiária Capitalista).
113)Ver item "A Parceria e a Pequena Propriedade Camponesa", MARX (b), s.d.
privada da terra. Num certo sentido, o pen- na produção. Dentro desses parâmetros, o
samento marxista sobre a economia campo- sistema camponês agrícola é uma unidade
nesa, dentro de uma abordagem determlnista de trabalho e consumo, e não uma unidade
(absoluta) da história, pode-se resumir na capitalista.
seguinte frase (pág. 931): "A pequena pro-
priedade fundiária gera uma classe até certo
ponto à margem da sociedade e que combina 3. O LUCRO NA. CONTRAMÃO DA
toda a crueza das formas sociais primitivas PRODUÇÃO AGRíCOLA SUSTENTÁVEL
com todos os sofrimentos e todas as misérias
dos países civilizados". o lucro como a transformação da mais
liar "...tem motivações muito específicas para ser sustentável nos seus três eixos básicos:
a atividade econômica, bem como uma. con- ambiental, econômico e social. Dito de outra
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--"'--"---~----_._-"'~--"-"""'-"'-----~-"-~_."~-'''--
~;ad':'::_.(;f 1;:: .Fi\CECI\~,(';;!Upinas, v. 14, n. 2 ..p. 157 17i.}l!J.lde::. 2005
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., M.S.CARMO
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·.AGRlCULTURA FAMILIAR: LUCRATI""lDADE E SUSTENTABILlDADE 169
siderar que esses mais se aproximem de um ô 'fêlmfi;:õ; i;, k~~Flr às g""raçôes vindouras
desenvolvimento rural sustentávei err, relação (;ondiç3{;·s para tarnném se reproduzi-
aos agricultores empresários capitafislas, rem GDmO [igricultofr3s farniliarr::s.
visto que:
Para que os agricultores possam se
- como o lucro não é condição básica para inserir num quadro de sustentabiudade arn-
as decisões de produzir, e o preço rece- bientai e econômica, é necessário adequar
bido pelo agricultor não necessariamente a ofeit" h!(;n();'~)flk;8 às r88.Ís condições pro-
contém essa fração, ocorre maior esta- dutivas desses agricultores. A potenciaHdade
biiidade econômica já que a produção técnica dos 8gric<.iitüres familiares, em seus
pode continuar em prazo mais longo, diferentes matizes, coloca a necessidade de
mesmo sem atingir, no mercado, o preço políticas diferenciadas, concebidas em um
esperado. O agricultor famiiiai' produz processo int~jiatiVG junto aos agricultores nas
com a expectativa de urna remuneração ~;uas· ,egioes ~,roj\.í10raS, num enfoque de
que íne permita soorevíver e constituir um sistemas Gg:iiÍ rios.
patrimônio. As não necessárias rernune-
Há que se considerar que a adjetivação
ração do capital f) do trabalho tamüiar
sustentável do desenvolvrrnento e da agricul-
fazem parte das decisões estratégicas
tura nao S~ H::stóinge simplesmente às alte-
do funcionamento do SFEA;
rações na base técnica, mas traz consigo a
- as propriedades familiares, por apresen- necessidade de políticas que possarn, de fato,
tarem menor escala produtiva, pressu-
promover o acesso democrático aos meios de
põem urna melhor distríbuição da terra produção e à desconcsntração da renda. Mais
e outros meios de produção. Ademais,
vontade pcAíUt;él no trato dessas interfaces é
por associar negócio e famHia, produção
também funcarr ental para que maior produ-
e consumo, o trabalho toma-se intensivo,
tividade aqropecuária em bases sustentáveis
e não é desprezível a capacidade dessas
refiita menores custos de produção e maior
unidades, ao'. inÍensificar sua produção,
estabilidade sociêJi dos agricultores familiares.
de absorver contingentes de mão-de-
A agricultura familiar tem que ser vista
obra, /10je, marginalizâdos no próprio
não no que ela tem de tradicional, mas sim de
campo e nas periferias das cidades;
uma maneira moderna de desenvolvimento do
- ambientalmente as propriedades fami-
meio rural, e mais, como o lócus de estraté-
liares têm maior diversidade produtiva
gias de reprodução social, com o que se rom-
e menor relação capital-trabalho, o que
pe a fatalidade histórica da associação entre
se expressa numa menor agressão ao
o desenvolvimento do capitalismo no campo
ambiente. Cabe lembrar ainda que, a
t a grande empresa patronal. Os elementos
manutenção das qualidades do solo em
conceituais da agricultura familiar tornam
termos de conservação e fertilidade im-
perceptível o entendimento da permanência
plica investimentos e, portanto, se privar
do pequeno agricuitor famiiiar no processo de
de parcelas do lucro atual em benefício
produção agrícola, entendimento esse ressal-
das gerações futuras. O que se de um
tado quando se pensa na concretização da
lado afasta o empresário-arrendatário
utopia da sustentabilidade na agricultura.
desse objetivo, de outro aproxima o
agricultor familiar por sua própria dinâ- O modo de produção capitalista não
mica de preservar o patrimônio para a destruiu as relações familiares na produção
continuidade da família. p, terra para ele agrícola, conforme preconizaram os intelec-
não é um objeto de lucro, mas sim parte tuais do inicio do século passado. Os descen-
do patrimônio que lhe permite viver com dentes dos camponeses produtores indepen-
---------------------------._-----------------------
Cadernos da FACECA, Campinas. v. 14. fi. 2. p. 157-] 7 i,ju!.ldn 2005
170 M.S.CARMO
LEN IN, Vladimir I. Capitalismo e Agricultura nos VEIGA, J.E. O desenvolvimento agrícola: uma
Estados Unidos da América: novos dados sobre visão histórica. São Paulo: Edusp/Hucitec, 1991 .
. as leis de desenvolvimento do capitalismo na
219p. (Estudos rurais, na 11).
agricultura. São Paulo: Brasil Debates, 1980.
(Coleção Alicerces), 100p. WANDERLEY, M. de N. B. Raízes Históricas
MARX, Karl (a) O capital: Crítica da economia do Campesinato Brasileiro. In: XX ENCONTRO
política. Livro terceiro, VaI. IV. Rio de Janeiro: ANUAL DA ANPOCS. Caxambú, 1996. 32p.
Civilização Brasileira; s.d., 374 p
(mimeo)
MARX, Karl (b) O capital: Crítica da economia
política. Livro terceiro, VaI. VI. Ric- de Janeiro: WOLF, E. R. Sociedades Camponesas. Rio de
Civilização Brasileira, s.d., 705-1079p. Janeiro: Zahar, 1970.