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Os pré-socráticos
AS ES COLAS PRÉ-SOCRÁTICAS
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tantes são Pitágoras de Samos, Alcmeão de Crotona, Filolau de Crotona e Ár
quitas de Tarento;
3) Escola Eleata (Magna Grécia), cujos principais representantes são Xenó
fanes de ColoIao, Parmênides de Eleia, Zenão de Ele ia e Melissos de Samos;
4) Escola Atomista (Trácia), cujos principais representantes são Leucipo de
Abdera e Demócrito de Abdera.
Essa classificação apresenta um problema porque nela não há lugar para
dois dos maiores fllósofos pré-socráticos: Empédocles de Agrigento e Anaxágo
ras de Clazómena. Por esse motivo, preferimos propor que a quarta escola re
ceba uma outra denominação. Veremos, a seguir, que as três primeiras escolas
possuem em comum o fato de tratarem a physis como unitária, enquanto os ato
mistas, Empédocles e Anaxágoras concebem a physis como pluralidade. Propo
mos, então:
4) Escola da Pluralidade, cujos principais representantes são os atomistas
Leucipo e Demócrito de Abdera, Empédocles de Agrigento e Anaxágoras de
Clazómena. São os fllósofos que tentaram conciliar Heráclito e Parmênides
para salvar a fllosofia de sua primeira grande crise.
A ESCOLA JÔNICA
TALES DE MILETO
A vida
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palhada na Grécia: por ser um teórico, isto é, um contemplador puro, Tales, ca
minhando com os olhos voltados para o céu, tropeçou numa pedra e caiu num
poço. Consagrou-se, assim, a imagem que, daí por diante, os outros possuem do
ftlósofo como pessoa distraída para as coisas práticas da vida e perdido em pen
samentos abstratos.
No entanto, os relatos sobre Tales nos oferecem uma imagem muito dife
rente desta. Foi um político interessado, procurando unir as cidades da Jônia
numa confederação contra os persas; um hábil engenheiro, pretendendo desviar
o curso de rios para favorecer a navegação e a irrigação; um hábil comerciante.
Tales teria também estudado as causas das inundações do Nilo, desfazendo mi
tos que as narravam. Fez algumas descobertas astronômicas: além da previsão
do eclipse solar, descobriu a constelação da Ursa Menor e aconselhou os nave
gantes a se guiarem por ela. Prodo lhe atribui o "Teorema de Tales" (dois triân
gulos são iguais quando possuem um lado igual compreendido entre dois ângu
los iguais), mas é improvável que tenha sido seu autor. O mais provável é que o
teorema tenha sido inspirado por um fato relatado por Plutarco: Tales desco
briu um método para medir a altura de uma pirâmide colocando a prumo uma
vara no fmal da sombra da pirâmide e, traçando dois triângulos com a linha des
crita pelo raio do sol, mostrou que havia proporção entre a altura da pirâmide
e a da vara ou entre os dois triângulos de suas sombras.
É Aristóteles que consagra Tales como fundador da ftlosofia cosmológica,
tendo sido o primeiro a tratar de modo sistemático e racional o problema da ori
gem, transformação e conservação do mundo. Para Tales, a physis é a água, ou
melhor, a qualidade da água, o úmido.
o pensamento de Tales
A maior parte dos primeiros fIlósofos considerava como os únicos princípios de to
das as coisas os que são da natureza da matéria. Aquilo de que todos os seres são
constituídos e de que primeiro são gerados e em que por fim se dissolvem, tal é
para eles o elemento, o princípio dos seres; e por isso julgam que nada se cria nem
se destrói, como se tal natureza subsistisse para sempre ... Tales, o fundador de tal
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ftlosofia, diz ser a água o princípio e por isso também declarou que a terra está so
bre a água (Aristóteles, Metafisica).
Tales de Mileto, o primeiro a interrogar estes problemas, disse que a água é a ori
gem das coisas e que deus é aquela inteligência que tudo faz da água (Cícero, Da
natureza dos deuses).
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ANAXIMANDRO DE MILETO
A vida
o pensamento de Anaximandro
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reza, nenhuma das qualidades (úmido, seco, quente, frio) percebidas nas coisas,
nenhuma qualidade determinada ou defmida, delimitada. A physis é o ápeiron*.
A physis é o ilimitado, indefinido e indeterminado, o que não sendo nenhuma
das coisas e nenhuma das qualidades dá origem a todas elas.
Três fragmentos, tidos como originais, deixam entrever o que Anaximan
dro entendia pelo ápeiron:
Princípio (arkhé) dos seres... ele disse que era o ilimitado. . . Pois donde a geração é
para os seres, é para onde também a corrupção se gera segundo o necessário; pois
concedem eles mesmos justiça e deferência uns aos outros pela injustiça, segundo
a ordenação do tempo (Simplício, Comentário da Física de Aristóteles).
Esta (a natureza do ilimitado) é sem idade e sem velhice (Hipólito, Refotação das
Heresias).
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Se compararmos ao de Tales, o pensamento de Anaximandro introduz
grandes mudanças teóricas que merecem ser destacadas.
Em primeiro lugar, a clara identificação entre physis e arkhé como aquilo
que só pode ser alcançado pelo pensamento, pois o princípio não se confunde
com os quatro elementos visíveis e observáveis. Em segundo, e como conse
quência, a concepção do princípio como algo quantitativamente sem limites e
qualitativamente indeterminado para que possa eternamente dar origem a to
das as coisas determinadas do ponto de vista da quantidade e da qualidade. Em
terceiro, a afirmação de que o princípio é eterno - "sem idade e sem velhice",
"imortal e imperecível" - de tal maneira que ele é muito mais do que eram os
antigos deuses, pois estes eram imortais, mas não eram eternos, uma vez que
haviam sido gerados. Em quarto lugar, a clara distinção entre a eternidade do
princípio e a "ordenação do tempo", isto é, a distinção entre a perenidade imor
tal do princípio e o devir ou vir a ser como ordem temporal da geração e cor
rupção das coisas. Em quinto, e mais profundamente, Anaximandro concebe a
ordem do tempo como uma lei necessária - por isso fala em injustiça e repara
ção justa - segundo a qual os elementos se separam do princípio, formam a
multiplicidade das coisas como opostas ou como contrários em luta e depois re
tornam ao princípio, dissolvendo-se nele para pagar o preço da individuação in
justa porque belicosa. Em outras palavras, Anaximandro procura explicar como
do indeterminado e ilimitado surgem as coisas determinadas e limitadas, ou a
origem das coisas individualizadas, de suas diferenças e oposições.
A origem do mundo é, pois, explicada por um processo injusto e culpado
ou pela guerra incessante que fazem entre si os elementos no interior do ápei
ron. A luta dos contrários, isto é, o mundo em que vivemos, fere a justiça (díke)
e esta exige a reparação. Cabe ao tempo reparar a injustiça, obrigando todas as
coisas determinadas e limitadas a retornar ao seio do indeterminado e ilimitado:
a corrupção e a morte das coisas é a expiação da culpa pela separação, individua
ção e guerra dos contrários.
Anaximandro espantava-se com as oposições que constituem o mundo: o
fogo que consome o ar, mas é destruído pela água; a terra seca que luta para não
ser tomada pela água nem pelo fogo; o mar que é úmido, mas que se torna ar
ao evaporar e luta contra ele ao recair como chuva; a sequência eterna das esta
ções do ano; as diferenças entre os animais (alguns estão sempre na água, outros
na terra, outros no ar); as diferenças entre os homens (alguns de cor diferente
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de outros, alguns calmos e serenos, outros coléricos e belicosos); as lutas entre
homens e animais, entre os próprios animais e entre os próprios homens; a luta
dos homens para cultivar a terra, conquistar o mar etc. Essas lutas, decorrentes
da individuação e diferenciação dos seres, do predomínio de uma qualidade so
bre as outras, ao mesmo tempo que cria o kósmos, é uma injustiça que precisa
ser reparada, pois a justiça é a paz e o mundo é guerra dos contrários.
Como surge o mundo? Por um movimento circular turbilhonante que ir
rompe em diversos pontos do ápeiron. Nesse movimento, separam-se do ilimi
tado-indeterminado as duas primeiras determinações ou qualidades: o quente e
o frio dando origem ao fogo e ao ar; em seguida, separam-se o seco e o úmido,
dando origem à terra e à água. Essas determinações combinam-se ao lutar en
tre si e os seres vão sendo formados como resultado dessa luta, quando um dos
contrários domina os outros. O devir é esse movimento ininterrupto da luta en
tre os contrários e terminará quando forem todos reabsorvidos no ápeiron.
Os seres vivos nasceram pela evaporação da água sob a luz e calor do sol
(o úmido e o quente são, pois, os geradores da vida); pouco a pouco, saindo dos
mares e rios, os seres vivos foram se adaptando às regiões secas e a terra passou
a compor parte de suas naturezas; pela respiração, o frio ou o ar também pas
sou a compô-los e os que tiveram uma predominância do frio tomaram-se voa
dores. Em suma, Anaximandro considera a vida numa perspectiva que, nos sé
culos próximos de nós, seria chamada de transformismo.
Atribuem-se ainda a Anaximandro duas ideias muito originais: a primeira
delas, sobre a origem e formação do céu e da terra, e a segunda, sobre a existên
cia de mundos inumeráveis.
A primeira separação do quente e do frio formou um anel luminoso de
chamas que cercou o ar frio, prosseguiu formando novos e menores anéis - os
astros -, dispondo-os para formar o zodíaco. Donde, segundo Hipólito, Anaxi
mandro afirmar que "os corpos celestes são rodas de fogo separadas do fogo
que cerca o mundo, e fechadas em círculos de ar" . Há três rodas ou três anéis:
o anel do Sol, o anel da Lua e o anel das estrelas (aí compreendidos todos os as
tros que não o Sol e a Lua). A terra e o mar formaram-se com a separação do
seco e do úmido, no interior do primeiro círculo de fogo que se destacara: o mar
é o que restou do úmido sob a ação do fogo, e a terra, o que restou do seco sob
a ação do fogo e do úmido. Diferentemente de Tales e da tradição, que acredi
tavam que a Terra estava sustentada por alguma coisa, sendo plana, Anaximan-
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dro descreve a Terra como um cilindro ou disco convexo, solto no espaço, imó
vel, sem possuir um alto e um baixo.
Quanto à afirmação de Anaximandro de que existem mundos inumeráveis,
não se tem certeza se com isto ele afirmava que existem mundos simultâneos for
mados do ápeiron (que, sendo ilimitado, poderia dar origem a inumeráveis mun
dos) ou mundos sucessivos produzidos a cada nova separação no interior do
ápeiron, depois do fim,de cada mundo anterior.
A vida
o pensamento de Anaxímenes
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Do ar dizia que nascem todas as coisas existentes, as que foram e as que serão, os
deuses e as coisas divinas [ ...] Quando o ar está igualmente distribuído é invisível:
manifesta sua existência por meio do frio e do calor, da umidade e do movimen
to. E está sempre em movimento, pois o que muda não poderia mudar se não se
mover (Hipólito, Refutação das Heresias).
HERÁCLITO DE É FESO
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