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~

230 !!
Rosária Justi
CAPÍTULO 9

PEDROSA, M. A.; DÍAS, M. H. Chemistry textbook approaches to chemical 1


equilibrium and student altemative conceptions. Chemistry Education: 1
Research and Practice in Europe, Athens, 1, 2, p. 227-236, 2000.
l
SOUZA, V. C. A.; JUSTI, R.; FERREIRA, P. F. M. Analogias utilizadas
ji
11
no ensino dos modelos atômicos de Thomson e Bohr: Uma análise crítica
sobre o que os alunos pensam a partir delas. Investigações em Ensino de
Experimentar '•
'

Ciências, Porto Alegre, 11, 1, p. 7-28, 2006. Sem Medo de Errar 1 1

SUCKLING, C. J.; SUCKLING, K. E.; SUCKLING, C. W. Chemistry 1

through models. Cambridge: Cambridge University Press, 1980. Roberto Ribeiro da Silva1
Patrícia Fernandes Lootens Machado 2 !
TABER, K. S. Mediating mental models of metals: acknowledging the 1

Elizabeth Tunes 3 1

priority ofthe leamer's prior leaming. Science Education, 87, p. 732-758,


2003.

TRIELE, R. B.; TREAGUST, D. F. Analogies in chemistry textbooks. Um Pouco da História ...


International Journal of Science Education, London, 17, 6, p. 783-795,
1995. o papel da experimentação no ensino de Ciências é historicamente
reconhecido por filósofos desde o século 18, mas somente nas últimas dé-
VOSNIADOU, S. Mental Models in Conceptual Development. ln:
cadas do século 19 as atividades experimentais foram inseridas nos currícu-
MAGNANI, L.; NERSESSIAN, N. J. (Eds.). Model-Based Reasoning:
los de Ciências da Inglaterra e dos Estados Unidos. A consolidação da
Science, Technology, Values. New York: Kluwer Academic and Plenum
experimentação como estratégia de ensino, no entanto, deu-se de forma
Publishers, 2002. p. 353-368.
significativa nas escolas na segunda metade do século 20.

1 Graduado em Química pela UFMG e doutor em Química pela USP. Profes~or Associa~o do
Instituto de Química da Universidade de Brasília. Foco p'.incipal d~ p~sqmsa: ~ormaçao de
conceitos científicos; Relação teoria-experimento no Ensino de Qmm1ca.bobs1lva@unb.br.
2 Graduada em Química pela UFC, Mestre e Doutora pela UFRGS. Professora ~ssociado ~o
Instituto de Química da Universidade de Brasília. Foco principal de pesqmsa: Relaçao
teoria-experimento no Ensino de Química; Educação Ambiental. plootens@unb.br.
3 Graduada em Psicologia pela UnB, Mestre e Doutora em Psicologia pela USP. Pesquisadora
Associada da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e '.rofes~ora do Centro
Universitário de Brasília_ UNICEUB. Foco principal de pesqmsa: Psicologia do desenvol-
vimento humano. bethtunes@globo.com.
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Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes lootens Machado - Elizabeth Tunes 233
Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar

Em relação ao Brasil, o trabalho de laboratório foi trazido pelos PSCS; Chemical Bonding Approach - CBA; Chemical Education Material
portugueses por uma necessidade do contexto socioeconômico do século 1
Study - CHEMS) e na Inglaterra (Cursos Nufield de Biologia, Física e
19. Ainda no mesmo século, a inserção da experimentação no ensino de 'I\ Química). Esses projetos, que influenciaram a produção de materiais de
Ciências deu-se sob uma abordagem utilitarista, associando o conhecimen- '
ensino de Ciências no Brasil, tinham como pressuposto que o ensino práti-
to teórico às atividades, por exemplo, de extração e transformação de mi- co conduziria os alunos aos fundamentos conceituais. O professor teria o
nérios em metais.
papel de mediador, estjm1,1lªpd9 os_ªl!J!lOS a descobrirem novos conceitos.
Logo no início do século 20, foi recomendado pelos órgãos oficiais O período de 1960 a 1970 foi marcado ta~bém pela criação de
brasileiros que as instituições de ensino abrigassem laboratórios equipados diversos centros de Ciências em alguns Estados brasileiros, a saber: Cecisp
para as aulas de Ciências. Na década de 30, como reflexo do Movimento da (São Paulo), Cecirs (Rio Grande do Sul), Cecimg (Minas Gerais), Cecine
Escola Nova, o ensino de Ciências aproxima-se da proposta do educador (Região Nordeste). Nesses Centros o Ministério da Educação promovia
americano John Dewey, que valorizava o fazer por parte do aluno. Assim, cursos, preparava materiais de laboratório, induzia o desenvolvimento de
o ensino deveria estar associado a uma realidade próxima do aluno, na novos projetos nos currículos, dentre outras atividades.
tentativa de conectar as experiências cotidianas com o pensamento reflexi-
Nos anos de 80 no Brasil o Premen passou a não ser prioritário para
vo. A escola, de uma forma geral, deveria substituir os métodos tradicio-
o Ministério da Educação, tendo sido substituído a partir de 1983 pelo
nais (teórico, livresco, memorizador, estimulando a passividade) por uma
Spec (Subprograma de Educação para Ciência), como parte do PADCT
metodologia ativa, incluindo atividades experimentais.
(Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico). As
Somente a partir do ano de 1946 é que voltam a surgir as primeiras ações desse programa concentraram-se em projetos de formação de recur-
tentativas de mudanças no ensino de Ciências no Brasil com a criação do sos humanos, em razão da grande carência de professores de Ciências
Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (lbecc), da Fundação (Krasilchick, 1987).
11
Brasileira para o Desenvolvimento do Ensino de Ciências (Funbec) e do 1.
Na atualidade os programas institucionais não têm um foco específico '!
Programa de Expansão e Melhoria do Ensino de Ciências(Premen), que li
em atividades experimentais, mas buscam uma melhoria geral no sistema de
duraram até os anos finais da década de 70. O lbecc produzia e adaptava
ensino com ações coordenadas em diversas frentes, abarcando: materiais didá-
materiais americanos, como também elaborava novos materiais para o en-
ticos por meio do Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio
sino de Ciências. Por sua vez, o Funbec era responsável por comercializar
- PNLEM; processo de formação inicial de professores com o Programa
os materiais didáticos, elaborados pelo Ibecc, além de realizar cursos de
Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - Pibid; cursos de especialização
capacitação para professores de Ciências. O Premen tinha como objetivos
para professores dos Ensinos Fundamental e Médio da rede pública, etc.
produzir novos materiais didáticos, preparar novas equipes de professores
e aperfeiçoar o corpo docente das escolas. Paralelamente, a comunidade de ensino de Ciências também tem
desenvolvido estudos que contribuem, de uma maneira geral, para a sua
Na década de 50, em âmbito mundial, foram desenvolvidos grandes
melhoria. Muito desses estudos apontam para uma maior compreensão da
projetos para melhoria do ensino de Ciências nos Estados Unidos (Biological
rel(ls;ão f:l!~~e a natu~eza da ciência e o J>~pel ~ª-~~pt:rimeritação no ensino.
Science Curriculum Study - BSCS; Physical Science Curriculum Study -
Que relação possível seria essa?
234 Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes lootens Machado - Elizabeth Tunes 235
Capítulo 9 _ Experimentar Sem Medo de Errar

Natureza da Ciência Outra situação que evidencia essa transitoriedade é decorrente do


desenvolvimento de novos equipamentos. Um exemplo disso é que ~té 1.919
Na perspectiva de elucidar fenômenos observáveis, professores, alunos
acreditava-se que todos os átomos dos elementos químicos não r~d1oativos
e pesquisadores envolvidos com as Ciências procuram explicações dentro da-
. h am uma mesma massa·' com o desenvolvimento do espectrometro de
tln
quilo que conhecem e/ou do que já vivenciaram. Dessa forma, apesar de
massa, no entanto, foi possível mostrar que existem átomos de ~~ mesmo
muitas vezes o modo de proceder ter semelhanças, o desenvolvimento indivi-
elemento químico com massas diferentes. A partir daí foi necessano repen-
dual do pensar dentro de um processo investigativo não está limitado a um
sar o conceito de massa atômica.
único caminho (método). As experiências individuais podem contribuir com
olhares diferentes para explicar um mesmo fenômeno, no entanto as observa- De uma forma geral, ao longo da História as teorias foram ~~se~­
ções, os procedimentos experimentais, as comparações com teorias preexistentes volvidas para explicar os fenômenos observados, no entanto na ~1~ncia
fazem parte desse processo, para o qual sempre devem ser bem-vindas novas moderna as teorias d.esenvolv1das tem um e 1evado poder de .prev1sao
• A
. . ·- de
ideias. Um fenômeno, para ser validado cientificamente, entretanto, precisa novos fenômenos, meslllo nunca a.rites o\:i~e.rva.Q2~ Este é o caso de .alguns .
ser amparado em uma teoria que deve ser aceita pela comunidade científica. fenôm~nos decorrentes da Mecânica Quântica, como o ~esenvo~v1mento
Isso nos leva a uma compreensão do que seja a ciência, ou seja, "( ... ) uma dos raios laser. A despeito disso, a relação teoria-expenmento e sempre
forma de ver o mundo e não uma metodologia" (Lopes, 1999). mantida.
~
O conhecimento cien!ffü:o é um conjunto de ideias elaboradas na Qual seria, então, o papel da experimentação no Ensino de Ciências?
tentativa de explicar fenômenos naturais e de laboratório. Essa explicação
é feita pela formulação de conceitos denominados de científicos. Os con-
ceitos científicos são construções abstratas da realidade, não sendo, no en-
0 Papel da Experimentação _
no Ensino de Ciências - a questao
tanto, a própria realidade. Consequentemente, o significado de um concei-
do concreto e do abstrato
to científico pode modificar-se ao longo da História.
A experimentação no ensino pode ser entendida como uma ativi-
Assim sendo, as explicações das Ciências são, efetivamente,~­

--
des transitórias. Essa transitoriedade é evidenciada quando a teoria não
consegue mais explicar novos fenômenos observados, como é o caso do
modelo de átomo proposto pelos gregos, cerca de 400 anos a.C. Esse mo-
dade que permite a articulação entre fenômenos e teorias. Desta forma, o
aprender Ciências deve ser sempre uma relação constante entre o fazer e
o pensar.
delo explicava razoavelmente bem os estados físicos da matéria. Já em As teorias científicas são formuladas, inicialmente, para expli~ar
1800, para entender os pesos equivalentes observados nas transformações determinados fatos e fenômenos do mundo real. Um aspecto dessas teonas
químicas, o conceito de átomo teve de ser ressignificado por Dalton. Para , a sua potencialidade para explicar ienomenos an álogos , isto é , a sua
• " A

compreender a emissão de luz por gases nos tubos de raios catódicos, ao e _ Q uan to maior
· 0 número de "
. 1 enomenos
. , com-
A

capacidade de generalizaçao.
final do século 19, foi necessário, novamente, repensar o conceito de áto- paráveis que uma determinada teoria consegue explicar, maior e o seu
mo, passando este a ser definido como uma partícula divisível. grau de generalização. A capacidade de previsão é também outra caracte-
236 R b Rb .
o erto 1 e1ro da Silva - Patrícia Fernandes lootens Machado _ Elizabeth Tunes Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar 237

rística das teorias científicas, ou seja, que fenômenos podem ser previstos Para testarmos a previsibilidade dessa teoria deveremos ir ao labora-
por ela e que ainda não foram observados. Assim, uma teoria que explica tório preparar soluções com diferentes concentrações e observar os resulta-
um único fenômeno é uma teoria com capacidade de generalização e dos. Novamente com essas ações não estamos provando a veracidade da
previsão restrita. !
teoria, mas apenas testando sua capacidade de previsão. 1

1
Quando os alunos realizam uma atividade experimental e observam A capacidade de generalização e de previsão de uma teoria é gue
1

determinados fenômenos, geralmente solicita-se que os expliquem. A ex- pode dar à experimentação no ensino um caráter investigativ<2,: Então, um
plicação de um fenômeno utilizando-se de uma teoria é o que denomina- 11
experimento simples, em que haja um roteiro contendo apenas materiais e I, ·1
mos de relação teoria-experimento, ou seja, é a relação entre 0
fazer e 0 procedimentos, pode ser transformado numa atividade investigativa se o
1
pensar. Quando fazemos uso de uma teo_ria.pa.~~~~Elic<_t~ um fenômeno não professor conseguir inserir atividades outras que contemplem generaliza- 1
1
l
~igQifica_ q1,1~_estamos provando a veraciclade desta, mas sim testando sua ções e previsões, como visto anteriormente. !

fi!tlliçjQ_~çl-~_.c:le generalização. Por exemplo, ~o ~;~}i~~rmos o acender d; 1

Não é incomum, entre professores, a ideia de que a atividade expe-


uma lâmpada ligada à rede elétrica, aplicando o conceito de elétrons (teo-
rimental tem a função de concretizar para o aluno as formulações teóricas
ria), não estamos provando que esta teoria está correta, mas sim testando
da ciência e que, por isso, facilitaria a aprendizagem. Ou seja, a atividade
sua generalidade, visto que o conceito de elétron foi introduzido, inicial-
experimental é entendida e comumente empregada por professores como
mente, na ciência, para explicar a condução da corrente elétrica por gases
uma estratégia de ensino e visa a melhorar a aprendizagem dos alunos. Será
nos tubos de raios catódicos.
que é possível afirmar que essa atividade efetivamente concretiza a teoria
Daí a importância de se conhecer a história de alguns conceitos, pois científica e tem a função de melhorar a aprendizagem? Seria adequado
I' e isso nos permite identificar a época, o contexto em que esses conceitos adotá-la como uma estratégia de ensino?
f· f!' foram propostos e, principalmente, que fenômenos eles buscavam explicar.
IJ' ~abordagem de aspectos históricos não pode ser restrita a dados bibliográ-
Quando o homem vivia nas cavernas costumava inscrever em suas
paredes cenas de seu mundo concreto. Tentava, desse modo, capturar o
ficos ou a curiosidades exóticas da vida dos cientistas. A ênfase deve ser
mundo concreto que tinha diante de si, mas, ao assim proceder criava outra
posta na história do conceito.
realidade, não reproduzindo o mundo concreto que desejava apreender.
No que tange à capacidade de previsão de uma teoria, consideremos, Em outros termos, ao buscar, desse modo, o mundo concreto, distanciava-
por exemplo, a experiência de se medir a condutividade elétrica de uma se dele. Por quê? Porque, ao desenhar na parede da caverna, por exemplo,
determinada solução contendo íons, utilizando-se de uma lâmpada ligada a um bisão, forçosamente excluía do bisão concreto que via duas de suas
dois eletrodos e a uma pilha. A teoria existente explica que 0 acender da dimensões: a profundidade e o movimento. Logo, tinha diante de si não
lâmpada ocorre, dentre outros fatores, devido à presença imprescindível de um bisão, mas uma imagem dele, uma nova realidade: um bisão desenhado
íons na solução. Se a teoria for adequada para explicar tal fenômeno, en- na parede. Um bisão-ficção, que ele criou, e não o animal concreto que via,
tão, se aumentarmos a quantidade de íons em solução, poderíamos inferir ainda que sua intenção tenha sido o de apreender a concretude do bisão. O
que a luminosidade da lâmpada iria aumentar. animal desenhado na parede da caverna é, pois, abstrato em relação àquele jl
i
ll a
239
238 Roberto R'b . Capitulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar
1 eiro da Silva - Patrícia Fernandes Lootens Machado - Elizabeth Tunes

generalizada e mais estável; que sua atenção ~eja voluntariamente dirigida


que pastava nos campos. Num certo sentido podemos afirmar que a ima- r.t.9..o...\v'rôo.,_~~~,...,.,,.-J

gem que se inscreve nas paredes da caverna é uma das primeiras atividades e que sua memória perca o caráter eidético de meras impressões visuais e
humanas de experimentação (Flusser, 1985, 2008). seja voluntariamente dirigida pelo pensamento (Luria, 1979; Vygotsky; Luria,
1996).
O homem, todavia, não parou na criação de imagens na sua incansá-
vel tentativa de apreender o mundo concreto. Inventou a escrita, que é No campo da atividade do pensamento o emprego de imagens e
outra maneira de buscar capturar o mundo que tinha diante de si. Trata-se, palavras também produz profundas transformações e apresenta muitas pe-
agora, não de imagens, mas de texto: linhas escritas em sucessão. Nova- culiaridades, dentre elas o fato de permitir abstrações. Ou seja, elas tor-
mente precisou excluir dimensões do fenômeno concreto. Se, na imagem, nam possível destacar, separar dimensões do fenômeno concreto que o
ele empregou apenas altura e comprimento para representar 0 bisão na homem tem diante de si. A transposição da figura do bisão concreto para
superfície, no texto ele exclui a altura e fica apenas com 0 comprimento, a a parede da caverna, em forma de imagem, implica o reconhecimento de
linha em que escreve a palavra bisão. Assim, o que aparece no texto é 0 partes da figura vista, o destaque e o descarte de algumas delas; a transpo-
mundo sem profundidade, sem altura e sem movimento; é 0 mundo em sição da figura do bisão concreto para o papel, em forma de escrita, envol-
linha - uma nova realidade criada pelo homem na sua incessante tentativa
ve a mesma coisa. Assim, d~~~f!hl1r ~ escrever são atividades que reque-
de captura do mundo que tem diante de si. Num certo sentido podemos
rem, de um lado, a decomposição de um objeto em suas partes e, de outro,
também concluir que a e,scrita é uma segunda espécie de atividade experi-
a combinação de algumas de suas partes, dando origem a algo novo, uma
mental do ser humano. E a esse universo da escrita que pertencem, como
nova síntese. São, portanto, atividades criadoras. O mundo concreto que o
sabemos, os conceitos e as teorias científicas. Assim sendo, conceitos e
homem tem diante de si é uma síntese de múltiplas determinações. Ao
teorias científicas não são o mundo concreto que 0 homem tem diante de si,
desenhar e descrever esse mundo ele subtrai-lhe algumas dimensões, dan-
mas uma nova realidade por ele criada, um novo afastamento daquele mundo
(Flusser, 1985, 2008). do origem a uma nova combinação de elementos, a uma nova síntese, que
não é aquela concretamente presente. Pode até mesmo, pela via dos pro-
Imagens e palavras são ferramentas que o ser humano inventou e
cessos de imaginação, combinar diferentes partes de diferentes objetos
emprega como meios de captura do que tem diante de si. Elas penetram os
concretos, por exemplo, desenhar a cabeça de um bisão no corpo de um
campos das atividades humanas e transformam nossos processos de atenção
canguru (Vigotski, 2009). Em resumo, desenhar e escrever sobre o mundo '
e de percepção, a nossa memória e, particularmente, o nosso pensamento.
concreto possibilitam o desenvolvimento do pensamento analítico, isto é,
A criança muito pequena, que ainda não domina o emprego dessas ferra-
da decomposição do mundo concreto em partes e da criação de novas
mentas, percebe o mundo de um modo completamente diferente do adulto.
sínteses. É nesse sentido que podem ser vistas como atividades de experi-
Ela percebe o mundo de um modo global, holístico. Quando começa a
empregar ferramentas culturais ou signos, tais como imagens e palavras, mentação. A palavra experimentação pode ser entendida como ensaio, como

desencadeiam-se profundas transformações na sua atenção, percepção, análise de propriedades, de teor ou qualidade e de dimensões, todavia são

~em~ria e pensamento. O uso funcional do signo faz com que sua percep- atividades de experimentação diferentes daquelas a que denominamos de
çao vmcule-se à discriminação de indícios essenciais dos objetos, torne-se científicas.
240 241
Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes Lootens Machado - Elizabeth Tunes Capitulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar

1r
Uma pessoa pode, por exemplo, escrever um texto em que fala de Então, as atividades de laboratório meramente reprodutivas e com
ii
homens e mulheres, referindo-se aos primeiros como "aqueles que usam caráter comprobatório são pobres para se alcançar a relação desejada entre !

calças e chapéus" e às mulheres como "as que usam saias e batom". Trata-se a teoria e o mundo concreto que o homem tem diante de si, no ensino de
aqui de uma forma de abstração de primeira ordem, realizada de modo Ciências. A transformação de uma experiência elaborada como
direto das impressões sensíveis da visão de homens e mulheres concretos. comprobatória em uma investigativa, no entanto, não é tarefa fácil, em I•
1

Outra pessoa, por sua vez, pode, em outro texto, referir-se a homens e
razão de diversos obstáculos existentes no uso da experimentação, como
mulheres como XY e XX, respectivamente. Esse é o caso de outro tipo de
abordaremos a seguir. í'
abstração que não é diretamente derivada de impressões sensíveis, mas de-
corrente de uma formulação anterior, de uma teoria, de um modelo. Ou
seja, uma abstração de outra ordem, mediada por outra abstração. Em ou- Obstáculos à Inserção 1 1

tras palavras, um conceito mediado por outro conceito. Chamamos ao con- da Experimentação no Ensino i :
I•
junto desse tipo de abstrações, que não são realizadas de modo direto, mas
1 ·

mediadas, de conhecimento científico (Vigotsky, 2001). Um dos problemas relacionados à qualidade do ensino de Ciências é
a ausência da experimentação. Essa ausência está baseada em crenças fre- 1

Assim, a atividade científica de experimentação tem a peculiaridade


quentemente veiculadas no meio educacional. Dentre elas podemos citar:
de ser realizada tendo por base outros conceitos, ela é teoricamente orien-

~I tada. A atividade científica de observar plantas crescendo numa horta é


bastante diferente daquela realizada por um pequeno agricultor que planta
- a falta de laboratórios nas escolas;

_ a deficiência dos laboratórios, traduzida na ausência de materiais, tais


1 l

hortaliças para vender no mercado. São diferentes os motivos que levam o


~ cientista e o agricultor a observar, são diferentes as ações que um e outro como reagentes e vidrarias.
_/ realizam e são diferentes os objetivos das ações de cada um. _ a inadequação dos espaços disponibilizados para aulas experimentais,
l
Por tudo o que foi exposto, vemos que a atividade científica de que, muitas vezes, são salas comuns que não contam com instalações
! fÍ
i.. ( experimentação não concretiza a teoria. Como toda experimentação, ao mínimas de água, gás, eletricidade, etc.

,~;_ contrário, ela promove o afastamento do mundo concreto que o homem


tem diante de si. Empregá-la como meio de motivar os alunos e facilitar
_ a não conformidade dos laboratórios para a realização de aulas práticas
.. !.!...,,.. no Ensino Médio, tendo em vista que esses foram projetados usando
/ yr-
~
sua aprendizagem pelo suposto fato de que permite concretizar a teoria
como modelo os laboratórios de universidades;
cr seria, pois, um equívoco. Além disso, como atividade, ela possui uma fina-
lidade em si mesma, a saber, permite, por sua estrutura e dinâmica, a for- - a grade curricular de Ciências, em função do escasso tempo disponível,
mação e o desenvolvimento do pensamento analítico, teoricamente orien- dificulta a inclusão de atividades de laboratório;
tado. Em outras palavras, ela enseja a possibilidade de fragmentação do
- o trânsito dos alunos para o laboratório, especialmente quando há neces-
objeto concreto em partes, o reconhecimento destas e a sua recombinação
de um modo novo. É nisso que reside o seu grande potencial como ativida- sidade de divisão da turma, perturba a rotina da escola e não é bem aceito
de imaginativa criadora, se bem empregada. pela administração.
1 i

111
1

242 Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes lootens Machado - Elizabeth Tunes Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar
243
1

- a organização das atividades na escola não prevê tempo para preparação 4. Os alunos declaram gostar de ir para o laboratório ou de realizar qual- 1

das experiências, organização do laboratório antes e após as aulas experi- quer atividade experimental. Estudos realizados mostram que o interesse
mentais.
1

dos jovens em se deslocar para o laboratório deve-se ao fato de ser esse um


- o desenvolvimento de atividades de laboratório em turno diferente da- espaço que permite uma maior movimentação, contrapondo-se à rigidez
quele das aulas teóricas tem conduzido, em alguns casos, a uma maior da sala de aula, bem como proporciona maior interação social entre eles.
desarticulação da relação teoria-experimento. 5. A existência de metodologia criativa e/ou dinâmica nas aulas experi-
- a escassez de roteiros que contemplem explicitamente a relação teoria- mentais, diferente das teóricas, estimula mais o aprendizado. Essa cren-
experimento. ça resulta da falta de clareza do papel da experimentação no ensino de
Ciências, que conduz a uma classificação equivocada das atividades expe-
Por outro lado, existem crenças que a simples realização de ativida-
rimentais como atividades práticas e das atividades em sala de aula como
des experimentais poderia permitir uma aprendizagem mais profunda por
teóricas, contribuindo também para a disjunção teoria-experimento.
parte do aluno (Silva; Zanon, 2000). Algumas dessas são citadas a seguir.
6. A realização de experiências no ensino básico permite o desenvolvimen-
1. A atividade experimental ser intrinsecamente motivadora. Estudos reve-
to de atitudes cientificas. Esta concepção de experimentação no ensino
lam que a realização de atividades que se resumem a seguir roteiros de
pressupõe a possibilidade de desenvolver nos alunos a ideia da existência
aulas experimentais pré-formatados, que objetiva resultados bem defini-
de um único método geral, infalível e aplicável a qualquer campo da
dos, acaba por transformar a motivação inicialmente apresentada pelos
ciência, dando uma grande ênfase ao conhecimento procedimental e va-
alunos em desinteresse.
lorizando sobremaneira as habilidades de observar, fazer registros e ela-
2. A promoção incondicional da aprendizagem por meio da experimenta- borar relatórios. Como consequênci~ dessa forma de trabalho, pode-se
ção. Tem-se observado que a aprendizagem é pouco efetiva quando o levar os alunos a construírem uma visão de ciência neutra, assertiva,
foco da atividade experimental centraliza-se somente nos aspectos livre de preconceitos, que visa exclusivamente ao bem da humanidade.
macroscópicos, dando-se pouca ou nenhuma atenção à discussão dos A ciência é vista hoje como uma produção social e, portanto, de elabora-
aspectos microscópicos relacionados. Colabora também para a pouca ção coletiva, estando sujeita a conflitos e disputas pelo poder dentro das
aprendizagem a falta de significação da atividade pelo aluno, ou seja, o instituições científicas, luta pelos financiamentos para pesquisa e pela
experimento está fora da zona de interesse e atenção do estudante. apropriação dos resultados. Essas características se opõem drasticamente
3. A realização de experimentos que se limitam à apresentação de fenômenos a uma visão de ciência neutra, objetiva, assertiva e livre de preconceitos.
impactantes, tais como explosões, liberação de gases coloridos ou cheiros Adicionalmente, a imagem estereotipada de cientista afastado do mundo
característicos, resulta em maior interesse em aprender. O efeito impactante, real não atrai os jovens.
que certos fenômenos exercem sobre os estudantes, adquire uma dimensão 7. A experimentação mostra empiricamente como as teorias funcionam.
maior, que acaba por se traduzir em obstáculos, reduzindo o interesse dos Esta crença é talvez a de maior ocorrência no meio educacional, poden- 1

jovens pela aprendizagem dos aspectos microscópicos relacionados. do criar nos alunos a ideia de que as teorias foram elaboradas por mentes 1

,, 1

1
il
1i 111
244 Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes lootens Machado - Elizabeth Tunes 245
Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar

brilhantes, com base na intuição e independente dos fenômenos que vi- Há uma diversidade de espaços, em que atividades experimentais
sam a entender e explicar. Dessa forma, a teoria ganha um status de têm grande chance de serem significativas, isto é, são espaços que fazem
maior relevância e o fenômeno passa a ser uma mera demonstração parte de suas vivências cotidianas, com possibilidades de atenderem a uma
empírica de uma verdade oculta na natureza. gama de interesses presentes na comunidade em que a escola está inserida.
Como vimos anteriormente, para que as atividades experimentais Para dar conta desses novos contextos somente os conteúdos de Quí-
permitam uma melhor apreensão da relação teoria-experimento, elas ne- mica não são suficientes. Faz-se necessária a inserção de conceitos de di-
cessitam ser bem planejadas e conduzidas adequadamente e, para isso, é
versas matérias, tais como a Física, a Biologia, a História, as Artes, entre
fundamental que o professor tenha clareza sobre o papel da experimenta-
outras. Dessa forma, a inclusão da interdisciplinaridade e da contextualização
ção no ensino de Ciências. No sentido de contornar os obstáculos e as
decorre naturalmente do desenvolvimento das atividades nestes contextos.
crenças que limitam o uso mais eficiente das atividades experimentais, abor-
Esse novo olhar sobre as atividades experimentais proporciona uma visão
daremos a seguir algumas orientações mais atuais.
mais ampla dos fenômenos, revelando a complexidade da vida moderna e
possibilitando a diversidade de abordagens. Esses novos contextos podem
Tendências Atuais também promover uma mudança do papel da escola para sociedade.

Os documentos oficiais recentes para o ensino de Ciências (Parâmetros


Curriculares Nacionais - PCN; Orientações Curriculares Nacionais - OCN; As Atividades Experimentais
Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Dentro de um Novo Contexto
Nacionais - PCN +, Programa Nacional de Educação Ambiental) reco-
A seguir são apresentadas sugestões de atividades experimentais
mendam o uso da experimentação, enfatizando a relação teoria-experimen-
que incorporam os seguintes eixos norteadores: o ensinar e o aprender
to, incorporando a interdisciplinaridade e a contextualização.
como processos indissociáveis; a não dissociação teoria-experimento; a
Nesse sentido, há necessidade de se modificar drasticamente o que interdisciplinaridade, a contextualização e a educação ambiental como
entendemos por laboratório, ampliando o conceito de atividades experi- decorrentes dos contextos escolhidos para o desenvolvimento dessas ati-
mentais. Nessa ampliação cabem como atividades experimentais aquelas vidades.
realizadas em espaços tais como a própria sala de aula, o próprio laborató-
rio (quando a escola dispõe), o jardim da escola, a horta, a caixa d'água, a
1) Atividades Demonstrativas-Investigativas
cantina e a cozinha da escola; além dos espaços existentes no seu entorno,
por exemplo parques, praças, jardins e estabelecimentos comerciais (feiras As atividades experimentais que serão aqui denominadas de demons-
livres, supermercados, farmácias, oficinas de marcenaria, metalúrgicas, trativas-investigativas são aquelas em que o professor apresenta, durante as
l ,1
mecânicas, etc.). Também podem se inserir nessas atividades visitas plane- aulas, fenômenos simples a partir dos quais ele poderá introduzir aspectos
jadas a museus, estações de tratamento de água e esgoto, indústrias, etc. teóricos que estejam relacionados ao que foi observado.
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i 111
4
2 6 Robert o Ri beiro d a Si 1v a - Pa t r í eia Fernandes Lo o tens Ma eh a d o - E1i za be t h Tunes
Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar 247

Um aspecto positivo da utilização das atividades demonstrativas- vem ser sempre as mínimas possíveis. Esse aspecto, ao ser considerado no
investigativas é que elas podem ser inseridas nas aulas teóricas, à medida
planejamento da experiência, se encaixa em uma perspectiva de Educação
que o professor desenvolve o programa de ensino de uma determinada
Ambiental (Silva; Machado, 2008).
série. Essa estratégia pode minimizar a desarticulação entre as aulas teóri-
cas e aulas de laboratório, realizadas em horários distintos e sem um plane- Uma forma de conduzir uma experiência demonstrativa-investigativa,
jamento comum. que pode alcançar resultados mais efetivos no processo ensino-aprendiza-
gem, inicia-se pela[2rmulação de uma pergunta que desperte a curiosjf:!E- F/
As atividades experimentais demonstrativas-investigativas podem
de e o interesse dos alunos.
possibilitar: maior participação e interação dos alunos entre si e com os
professores em sala; melhor compreensão por parte dos alunos da relação O passo seguinte, durante a realização da atividade, é a destinação,
teoria-experimento; o levantamento de concepções prévias dos alunos; a pelo professor, dos três níveis do conhecimento químico, isto é, a observa- t" /!</
formulação de questões que gerem conflitos cognitivos em sala de aula a ção macroscópica, a interpretação microscópica e a expressãopv
partir das concepções prévias; o desenvolvimento de habilidades cognitivas representacional. A observação macroscópica consiste em descrever aquilo
por meio da formulação e teste de hipóteses; a valorização de um ensino que é visualizado durante a realização do experimento. Já na interpretação
por investigação; a aprendizagem de valores e atitudes além dos conteúdos, microscópica deve-se recorrer a teorias científicas disponíveis que expli-
entre outros. quem o(s) fenômeno(s) estudado(s). Por sua vez, na expressão
É recomendável que as possíveis atividades experimentais demons- representacional é recomendado empregar a linguagem química, física ou
trativas-investigativas sejam conduzidas na perspectiva de exr~riências aber- matemática (fórmulas, equações, modelos representacionais, gráficos, etc.)
tas. Entende-se por experiências abertas aquelas em que os fenômenos são para representar o fenômeno em questão.
observados e os alunos conseguem, sob orientação, relacioná-los com uma
Durante o desenvolvimento da experiência, após a observação
teoria (relação teoria-experimento), não havendo necessidade de se alcan-
macroscópica feita pelos alunos, o professor pode solicitar-lhes que formu-
çar resultados quantitativos próximos de valores tabelados encontrados em
lem possíveis explicações para o fenômeno observado. Nesse momento é
livros didáticos. Faz-se necessário alertar que essas atividades não podem
possível identificar as concepções prévias dos estudantes, permitindo ao
ser dsenvolvidas com o objetivo de "comprovar na prática como a teoria
professor introduzir a interpretação microscópica (o conteúdo teórico pla-
funciona".
nejado para aquela aula), levando em consideração as ideias prévias dos
Uma característica que deve ser considerada para este tipo de ativi- alunos. O mais importante é estar atento àquelas concepções ou explicações
dade' é a opção por experiências que não gerem resíduos e, quando isso não formuladas pelos estudantes, que diferem muito do conhecimento científi-
for possível, em razão do conteúdo abordado, que os resíduos produzidos co aceito. Dessa forma, o professor poderá, de forma dialógica, formular
possam ser reaproveitados ou descartados na rede de esgoto (pia) ou lixo questões desafiadoras que possibilitem aos alunos exercitarem suas habili-
comum, atendendo à legislação vigente (Machado; Mól, 2008a, b ). Tam- dades argumentativas, visando à reformulação de suas ideias prévias. Um
bém é importante lembrar que as quantidades de reagentes utilizadas de- aspecto que pode auxiliar os alunos na compreensão da interpretação mi-
248 Ro ber 1o Ri be i r o d a Si 1va - Pa t ri eia f er na nd e s lo o1 e ns Ma eh a d o - E1i z a be t h Tu n'e s Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar
249

croscópica é a in_serçjjq_<!:e aspectos histó_r_fc_os relacionados à atividade ex- a produção de corrente elétrica por reações de oxidação-redução, explican-
perimental, visto que pode haver um p~r~elismo entre as ideias dos alunos do o que ocorre em cada um dos eletrodos (catodo e anodo) no interior da
~-~'l~-~las _vig~!1_t_f!~ 11:'1:. época em que () E(J_~~eit()_foi _f()f!P._!!!ad_o.. batata (solução eletrolítica) e o fluxo de corrente elétrica. Ao fazer a inter-
pretação microscópica, esse experimento possibilita a inserção de aspectos
Somente após o esclarecimento das dúvidas dos alunos sobre os 1

'i
históricos sobre a origem das pilhas, que se iniciou com as experiências de
fenômenos observados e os conceitos teóricos que os explicam é que se
Galvani sobre a estrutura nervosa de rãs dissecadas, observando a ocorrên-
recomenda a introdução da expressão representacional como uma síntese
cia de contrações musculares. Esse fato foi inicialmente, atribuído por
do que foi observado e explicado, empregando a linguagem científica.
Galvani à eletricidade animal. Na mesma ocasião, Volta reexamina o expe-
Finalmente, cabe ao professor promover o fechamento da aula, que rimento e propõe uma nova explicação. A teoria proposta por Volta possi-
consiste em responder à pergunta formulada inicialmente. A inclusão da interface bilitou o desenvolvimento das primeiras pilhas voltaicas.
ciência-tenologia-sociedade-ambiente - CTSA (implicações sociais, culturais,
A expressão representacional para essa experiência consiste em es-
políticas, econômicas, tecnológicas, ambientais, etc.), relacionada ao expe-
crever as equações químicas de oxidação e redução, que descrevem o fenô-
rimento desenvolvido, poderá ser abordada como parte da pergunta inicial.
meno observado.
Cabe destacar que, nessa proposta, mais importante do que fazer o
O fechamento dessa atividade corresponde a retomar a questão posta
experimento é a discussão com os alunos dos três níveis do conhecimento
no início, evidenciando-se que os conceitos que explicam a pilha de batata
químico, relacionando-os entre si e não isoladamente, e a inclusão nessa
são os mesmos que possibilitaram o desenvolvimento das pilhas comerciais.
discussão da interface CTSA. São esses aspectos que dão ao experimento
demonstrativo um caráter investigativo. A inteiface CTSA a ser explorada, nesse caso, poderia ser uma dis-
cussão sobre as pilhas comerciais, seus custos, suas limitações, sua compo-
Na perspectiva de avaliar a aprendizagem, uma possibilidade seria
sição, as implicações socioambientais resultantes da disposição final ina-
solicitar aos alunos que analisem situações análogas de sua vivência (quan-
dequada em lixões, etc. Normalmente essas questões não fazem parte da
do possível) e que podem ser explicadas utilizando-se os conceitos aprendi-
maioria dos livros didáticos, necessitando, portanto, da disponibilização il
dos durante a atividade demonstrativa-investigativa. 1'

para os alunos de matérias jornalísticas, recortes de textos e de livros


Tomemos como exemplo a experiência da pilha de batata. Uma per- paradidáticos, vídeos, entre outros.
<. gunta possível, para despertar o interesse e a curiosidade dos alunos, seria:
Uma forma de avaliação desta atividade seria, por exemplo, solici-
~b, "É possível acionar uma calculadora sem utilizar uma pilha comercial?"
tar aos alunos que explicassem o funcionamento das pilhas comerciais,
Nesse experimento, a observação macroscópica refere-se ao funcio- utilizando os conceitos básicos aprendidos na construção e operação da
namento de uma calculadora simples a partir da montagem do circuito pilha de batata. Isso porque qualquer pilha pode ser explicada pelos mes-
envolvendo batatas, pedaços de folhas de zinco (usados em calhas de telha- mos princípios, a saber, uma reação de oxidação e redução, sendo uma
dos de residências), lâmina de cobre e conectores elétricos (fios e jacarés). substância oxidada enquanto outra é reduzida e a corrente elétrica produzi-
A interpretação microscópica seria relacionar o fenômeno visualizado com da, podendo ser utilizada para fazer funcionar um aparelho.
25
º Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes lootens Machado - Elizabeth Tunes Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar
251

A experiência da pilha de batata requer materiais de baixo custo, que espaço no qual as modalidades didáticas mais comuns podem ser realiza-
podem ser reutilizados em várias turmas e durante longo tempo. Além das, a saber: a aula expositiva comum, discussões em grupo, seminários,
disso, proporciona condições seguras de realização e impacto ambiental atividades lúdicas, projeção de filmes e vídeos e, como vimos, a realização
insignificante, visto que gera como resíduo apenas as batatas, que podem de experimentação demonstrativa-investigativa. O custo da montagem de
ser depositadas no lixo comum. Esta atividade ainda pode ser ampliada uma sala ambiente de Química é significativamente menor que o de cons-
pelos alunos investigando a generalização do fenômeno e a previsão da truir e equipar um laboratório.
teoria por meio do teste com outros tipos de legumes, frutas e metais.
Todos esses testes podem ser feitos em casa pelos alunos sem a ocorrência
2) Experiências Investigativas
de riscos e, posteriormente, podem ser levados para a sala de aula, suscitan-
do uma discussão sobre os resultados obtidos. As experiências investigativas, de um modo geral, requerem que a
Este experimento é extremamente rico de possibilidades de análise e escola disponha de um laboratório. As atividades experimentais investigativas
discussão, o que não necessariamente ocorre com outros experimentos. buscam a solução de uma questão que será respondida pela realização de

Atividades que envolvem experimentos mais simples devem também ser uma ou mais experiências, que podem envolver as seguintes etapas:

realizadas numa perspectiva investigativa, adotando uma estratégia análo- a) Propondo um Problema
ga àquela sugerida para a pilha de batata.
Analogamente ao que foi sugerido nas experiências demonstrativas-
Podemos citar como possíveis atividades demonstrativas-investigativas investigativas, essa atividade inicia-se também com a formulação de uma
as seguintes experiências: o aquecimento de uma bexiga (balão de aniver- pergunta que estimule a curiosidade dos estudantes (Carvalho, 2004).
sário) acoplada a uma garrafa plástica (espaços vazios em gases); a dilata-
ção da coluna líquida em um termômetro de álcool (espaços vazios em b) Identificando e Explorando Ideias dos Estudantes
líquidos); a flutuação do gelo na água (densidade); a flutuação/afundamen- Após a proposição do problema o professor deve solicitar aos alunos
to de uma tampa de caneta esferográfica em álcool 92,8 INPM e 46,5 que levantem hipóteses para solucioná-lo. Em seguida o professor deve
INPM (densidade); a flutuação de um clipe em um copo de água (tensão analisar e discutir as hipóteses, privilegiando aquelas passíveis de realiza-
superficial); as mudanças de cor no galinho da chuva (equilíbrio químico); ção no laboratório, em razão, por exemplo, da disponibilidade de materiais
testes de acidez e alcalinidade utilizando soluções indicadoras (equilíbrio e reagentes.
químico), entre outros.
Nessa etapa podem emergir concepções prévias dos estudantes rela-
Pelo exposto podemos constatar que é possível privilegiar a relação cionadas ao problema formulado e que devem ser analisadas e discutidas de
teoria-experimento nas aulas de Química, mesmo não dispondo de um la- forma coletiva. Cabe ao professor incentivar a reformulação de possíveis
boratório específico. Resultados satisfatórios podem ser alcançados quando ideias que se tomem obstáculos ao planejamento e, consequentemente, à
a sala de aula é transformada em sala ambiente. A sala ambiente é um resolução do problema.
].'i2 R b R. b . d S· 253
o erto t eiro a tiva - Patrícia Fernandes Loolens Machado - Elizabeth Tunes Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar

e) Elaborando Possíveis Planos de Ação f) Respondendo à Pergunta Inicial

Após a discussão sobre as ideias levantadas pelos alunos, o professor Nessa etapa deve-se propor que os alunos respondam ao problema
deve solicitar-lhes um plano de ações, visando à montagem do experimen- inicial, analisando a validade ou não das hipóteses levantadas, dos métodos
to ou dos experimentos, que permitirão testar as hipóteses selecionadas. utilizados e das implicações decorrentes.

d) Experimentando o que foi Planejado Uma recomendação é que os experimentos sejam simples, de fácil
realização e que não envolvam etapas longas e tediosas, bem como se evite
Essa etapa merece especial atenção por parte do professor, pois não
0 uso de equipamentos complexos, cuja montagem consome a maior parte
se restringe à capacidade de selecionar e manusear vidrarias, aparelhagens do tempo destinado à realização da experiência.
e/ou reagentes, atendendo orientações de roteiros disponíveis em livros ou
Como exemplos de atividades que podem ser conduzidas na aborda-
na Internet.
gem aqui proposta destacam-se: o teste de acidez e alcalinidade com solu-
No caso de haver mais de uma hipótese a ser testada por grupos ção de repolho roxo; a cromatografia com a tinta de caneta hidrocor em
distintos de alunos, o professor deverá acompanhar os trabalhos, fornecen- giz; propriedades de polímeros superabsorventes em fraldas descartáveis; a
do estímulo e orientações. Deve ser salientado que experimentos que não oxidação de metais na criação de quadros artísticos; estudo de propriedades
confirmam uma dada hipótese, necessariamente não estão errados, visto de materiais e conversão de energia na luminária tipo lava-luz; estudo de
que diferentes testes fazem parte do processo de construção da ciência. combustão e teste de chama com latas de refrigerante; determinação do
teor de oxigênio no ar com seringa e bucha de aço, entre outras. Todos
Nessa etapa o professor deve ressaltar que a coleta dos dados seja
esses experimentos, bem como outros do mesmo tipo, são encontrados na
realizada conforme combinado e registrado de forma organizada, para que
seção Experimentação no Ensino da revista Química Nova na Escola.
possam ser analisados posteriormente.

e) Analisando os Dados que Foram Anotados


3) Simulações em Computadores
Nessa etapa deve-se orientar os alunos para que os dados sejam or-
Experiências de elevado custo, que apresentam periculosidade,
ganizados em tabelas e/ou gráficos. A partir desse ponto podem ser realiza-
toxicidade e que demandam muito tempo para sua realização devem ser
das as discussões em torno dos mesmos, observando se são pertinentes para
evitadas, no entanto podem ser encontradas simulações em computadores
responder à questão proposta no início da atividade experimental.
capazes de reproduzir esse tipo de experimento, permitindo que se explore
Destaca-se que essa é uma parte fundamental do trabalho, visto que conteúdos sem a exposição dos participantes a riscos intrínsecos de deter-
os resultados obtidos poderão ser expressos usando a linguagem científica minadas substâncias e materiais.
(Matemática, Química, etc.), permitindo uma generalização para as expli- Faz-se necessário que o professor promova uma adaptação do uso
cações formuladas. Sem dúvida essa é a etapa mais difícil para os alunos, das simulações aos objetivos que deseja alcançar. Para isso, sugere-se que
havendo a necessidade de interferência do professor para que se estabeleça seja seguido o mesmo planejamento adotado no item 2 para Experiências
a relação teoria-experimento. lnvestigativas.
254 255
Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes Lootens Machado - Elizabeth Tunes Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar

Outra possibilidade são os softwares gratuitos como o Carbópolis e a) propor questões para os alunos antes da exibição;
aqueles constantes na Rede Internacional Virtual de Educação - Rived. O
-----
software Carbópolis (Eichler; Del Pino, 2000) traz simulações temáticas que
permitem um debate sobre questões relacionadas à poluição ambiental, ca-
b) planejar a interrupção da projeção para discussão de aspectos exibidos;

c) planejar a reexibição de partes do vídeo/filme, destacando aspectos


bendo ao estudante a resolução do problema colocado no início do progra- prioritários que deverão ser registrados pelos alunos;
ma. Já o programa Rived (Brasil) oportuniza a experimentação de fenômenos
d) promover um debate, analisando as questões propostas antes da exibição.
físicos, químicos e outros por meio de simulação e animação, e apresenta
uma sequência de atividades multimídia interativas, acompanhadas de guias Para elaborar esse planejamento faz-se necessário que o professor,
do professor. Exemplos de temas encontrados no Rived são: adubos, chuva além de conhecer o conteúdo do filme, o assista de forma mais crítica para
ácida, alimentos, fusão nuclear, radioatividade, medicamentos, etc. prever possíveis questões que poderão ser levantadas pelos alunos, bem
como para formular as perguntas iniciais. Também deve conferir o funcio-
namento dos equipamentos, estimar o tempo que será gasto na atividade,
4) Vídeos e Filmes
verificar o espaço físico da sala, considerando iluminação e acomodação
Outra estratégia que pode ser utilizada como atividade experimental dos alunos.
é o uso de vídeos e filmes, por permitir uma abordagem contextualizada e
A TV Escola (Brasil) do Ministério da Educação dispõe de um acer-
interdisciplinar de uma determinada realidade. Vídeos e filmes possibilita-
vo de filmes apropriados para o ensino de Ciências e que podem ser utiliza-
ram a observação de fenômenos que demandam um tempo mais longo para
dos para introduzir, motivar, ilustrar ou concluir um trabalho de ensino-
ocorrer, principalmente aqueles relacionados a alterações no meio ambien-
aprendizagem.
te. Também favorecem a visualização de processos que ocorrem em reali-
dades distantes da comunidade em que a escola está inserida, por exemplo,
a obtenção industrial de metais, plásticos, tecidos, etc. 5) Horta na Escola
Estudos mostram que as narrativas fílmicas despertam interesses,
A horta, inserida no ambiente escolar como uma atividade experi-
informam e estimulam a curiosidade. Além disso, a retenção do conheci-
mental, possibilita o desenvolvimento de uma série de atividades de Ciên-
mento veiculado pode ser maior quando se utiliza mais de um de nossos
sentidos simultaneamente, neste caso, visão e audição. A utilização de ape- cias Naturais, bem como de Educação Ambiental, abordando a relação
nas um desses sentidos, como a fala de um professor (audição), ou a ob- teoria-experimento de forma contextualizada. Além disso, uma horta en-
servação de uma imagem estática (visão), não são tão eficientes no proces- volve tratamento de problemas reais, que se originam, se desenvolvem e se
so ensino-aprendizagem. reformulam naturalmente, reproduzindo situações reais e, portanto, com-
plexas.
A exibição de vídeos e filmes não pode ser encarada como uma
atividade de lazer ou em substituição a uma aula teórica para suprir a au- A horta pode funcionar como um eixo organizador, pois permite
sência de professor. Assim, há necessidade de um planejamento que pode estudar sistematicamente ciclos, processos, dinâmica de fenômenos natu-
envolver as seguintes etapas: rais e relações entre componentes de um sistema. Em uma horta, entende-se

-Ui
256 R0 b 257
erto R.1 beiro
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da Silva - Patrícia Fernandes Lootens Machado _ Elizabeth Tunes Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar

por sistema seus diversos componentes inter-relacionados, a saber: solo, a) Primeiramente, o professor ou o grupo de professores que participam do
água, vegetais, micro-organismos, insetos, animais subterrâneos, etc. A projeto devem agendar com a empresa ou instituição uma visita
complexidade destas relações possibilita ao professor a abordagem do in- objetivando um primeiro contato, familiarização com o ambiente e pla-
tercâmbio de matéria e energia (Kaufman; Serafini, 1998). nejamento da atividade a ser desenvolvida.

b) Após esse acerto inicial, deve-se tomar o evento institucionalizado na


Há uma multiplicidade de conteúdos que podem ser abordados a
escola, por meio da elaboração de um ofício padrão, de forma a facilitar
partir de uma horta, como exemplos, citamos: sol (orientação, energia,
a marcação das visitas.
fotossíntese, etc.); solo (fertilidade, declive, gênese de rochas e minerais,
composição, propriedades físicas, erosão eólica e hídrica, etc.); água (fun- c) Em seguida os professores devem elaborar um questionário deixando
bastante claro o que os alunos devem observar na empresa, conforme
ção, propriedades, nutrientes dissolvidos, etc.); sementes (reprodução, ger-
sugerido a seguir.
minação etc.); animais (predadores, consumidores, decompositores, etc.).
Os temas e conteúdos aqui sugeridos vão muito além dos conteúdos apenas d) Apesar de todos irem juntos, a classe deve ser subdividida em grupos de,
de Química, necessitando da colaboração e participação planejada de pro- no máximo, cinco alunos, de forma que todos possam acompanhar o
fessores de outros componentes curriculares. conjunto de etapas do processo, mas que cada grupo fique encarregado
de explorar, levantar dados e apresentar suas observações sobre uma
determinada etapa.
6) Visitas Planejadas
e) Como metodologia para observação de cada etapa, que ficará a cargo de
Outro tipo de atividade experimental de significativo valor pedagó- um determinado grupo de alunos, o questionário deve englobar quatro
questões básicas: Com o que se produz? Quem produz? Como se pro-
gico são as visitas planejadas a empresas (metalúrgicas, siderúrgicas,
duz? Para que ou para quem se produz? (Lufti, 1988, 2005).
cimenteiras, metalmecânicas, de alimentos, tecelagem, etc.) ou instituições
(feiras livres, supermercados, farmácias, oficinas de marcenaria, museus, Com o primeiro questionamento objetiva-se um levantamento das
estações de tratamento de água, esgoto, etc.), que têm suas atividades rela- instalações e dos equipamentos utilizados no processo produtivo. Já a se-
cionadas aos conteúdos abordados em uma determiºnada s,ene.
· A v1s1ta
· · per- gunda pergunta, ou seja, "Quem produz?", refere-se às características da
mão de obra, isto é, faixa etária, sexo, nível de instrução, habilitações
mite o levantamento da aplicação do conhecimento, criando a oportunida-
técnicas exigidas. Também nessa pergunta faz~se um levantamento das con-
de de explorar e aprofundar o conteúdo químico e desenvolver o senso
dições de trabalho dos operários (luminosidade, temperatura, nível de ruí-
crítico dos alunos. As visitas, no entanto, não podem se transformar numa
do, ventilação, exaustão, pó em suspensão, vapores irritantes e tóxicos,
atividade de passeio ou de simples curiosidade do professor e dos alunos. bem como situações de risco a que estão expostos esses indivíduos, em
Faz-se necessário um planejamento anterior, no objetivo de orientar as ati- relação à existência de normas de segurança no maquinário, ao uso de
vidades dos alunos durante a visitação. Este planejamento pode envolver as equipamentos de proteção coletiva e individual, à existência de uma comis-
seguintes etapas: são de prevenção de acidentes e saúde do trabalhador, etc.). O questionamento
258
Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes lootens Machado - Elizabeth Tunes 259
Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar

sobre "Como se produz?" está relacionado ao processo de transformação


os saberes populares e os saberes formais ensinados na escola. Esses estu-
das matérias-primas no produto final. Nele deseja-se investigar os proces-
dos trazem para dentro da sala de aula debates sobre práticas artesanais, tais
sos físicos e químicos envolvidos na produção e as consequências ambientais
como: a produção de queijo, rapadura, cachaça, cerâmica, tecelagem, cal-
a eles associadas. Com esse questionamento objetiva-se saber se há geração
çados, bijuterias, práticas de tingimento de fi!;,ras naturais, práticas agríco-
de resíduos, se estes recebem tratamento, quais tratamentos, como são
las, medicinais, elaboração de pratos regionais, etc. Essas práticas podem
monitorados, se há reaproveitamento dos resíduos e como eles retornam ao
ser passadas de uma geração para outra, tendo muitas vezes um caráter
meio ambiente. Isso tudo se resume na existência de programas de qualida-
de, segurança e meio ambiente. A pergunta "Para que ou para quem se milenar.

produz?" está interessada em investigar qual a produção diária ou mensal De um modo geral, o estudo desse tipo de ambiente social pode ser
daquela empresa, quem são os compradores, como é feito o escoamento da conduzido apoiando-se nas sugestões para as visitas planejadas, ou seja,
produção, a que regiões atende, como é feito o controle de qualidade dos "Com o que se produz?"; "Quem produz?"; "Como produz?" e "Para que
bens produzidos, quais as estratégias para comercializar os produtos, se ou para quem se produz?" Estas perguntas terão características próprias e
existe uma política para determinação do preço dos produtos. as respostas podem trazer consigo informações de como um dado saber é
f) Finda a visita os alunos deverão elaborar um relatório, culminando em uma transmitido ao longo da História. Este tipo de atividade experimental deve
apresentação. O relatório deverá ser elaborado por cada grupo e conter uma ser realizado na perspectiva de inserção do conhecimento popular na escola
análise dos dados e do material coletado. Em seguida todos os grupos, coor- e de sua valorização como saber, evitando-se sua desqualificação quando
denados pelo professor, farão um estudo coletivo, objetivando uma análise comparado às modernas tecnologias de produção.
crítica da visita. Depois poderão preparar uma apresentação para a própria Como exemplo,s desse tipo de atividade experimental sugerimos a
turma ou para a escola, utilizando diferentes formas de comunicação, tais leitura dos estudos sobre a produção de cachaça e o tingimento de fibras
como: seminários, apresentação de painéis, dramatização, debates, etc.
por artesãs, descritos em artigos nos números 18 (Pinheiro; Leal; Araújo,
As sugestões aqui apresentadas podem variar dependendo do porte 2003) e 30 (Gondim; Mol, 2008) da revista Química Nova na Escola,
ou tipo de empresa, da duração da visita, dos objetivos da visitação, da respectivamente.
possibilidade de disponibilização de informações técnicas, enfim, das
especificidades do local a ser visitado.
Finalizando ...

7) Estudos de Espaços Sociais Neste texto vários aspectos importantes relativos à experimentação
e Resgate de Saberes Populares no ensino foram abordados. Gostaríamos de destacar dois que julgamos
1\
mais relevantes: o primeiro deles é a modificação substancial do que se
O estudo exploratório de espaços sociais, na perspectiva de resgate entende por laboratório, em razão da ampliação do conceito de atividades
dos saberes populares, permite aos professores e alunos a inserção de um experimentais. O segundo aspecto diz respeito à finalidade da experimen-
dado contexto social no processo ensino-aprendizagem, inter-relacionando tação no ensino de Ciências: ela permite, por sua estrutura e dinâmica, a
li
li
2ó0 Roberto Ribeiro da Silva - Patrícia Fernandes lootens Machado - Elizabeth Tunes
Capítulo 9 - Experimentar Sem Medo de Errar
261

formação e o desenvolvimento do pensamento analítico, teoricamente orienta-


LOPES, A. R. C. Conhecimento escolar: ciência e cotidiano. Rio de Janei-
do, o que possibilita a fragmentação de um fenômeno em partes, o reco-
ro: Eduerj. 1999. p. 109.
nhecimento destas e a sua recombinação de um modo novo. É nisso que
reside o seu grande potencial como atividade imaginativa criadora, se bem LUFTI M. Cotidiano e educação em Química: os aditivos de alimentos
empregada. como ~ropostas para o ensino de química no 2º grau. ljuí: Liv. Unijuí
Editora. 1988. p.156.
Eis o desafio: vamos experimentar sem medo de errar.
. Os ferrados e os cromados. Produção social e apropriação priva- 1

-d_a_d_o-conhecimento químico. 2. ed. rev. Ijuí: Ed. Unijuí, 2005. (Coleção 11

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