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Em um primeiro momento, ao realizar a leitura da reportagem multimídia

“Ameaça, milícia e morte,” fiquei fascinada com o formato proposto pela


Repórter Brasil. A forma como as dimensões audiovisuais, numéricas, textuais
e imagéticas coincidem na reportagem parecem elevar ela a uma nova
categoria de jornalismo. É inevitável pensar quantas daquelas informações
haveriam sido perdidas caso os autores optassem pelo formato jornalístico
“tradicional”. A ideia me inspirou bastante, especialmente pelo fato de suscitar
a possibilidade de um “novo jornalismo” diante de uma realidade altamente
multimídia, conectada e cada vez mais adepta aos formatos audiovisuais.
Alguns outros fatores contribuem ainda mais com essa força, corroborando
para a forma narrativa, como os títulos e subtítulos com um caráter criativo e
“sentimental”, que nos proporcionam uma experiência similar a de estar lendo
um livro de ficção. A forma como os autores se referem ao local também se
assemelha à esse tipo de leitura, fazendo inclusive referências diretas, como
no último capítulo: “De Grande Sertão a Bacurau” ou nos vários momentos em
que o objetivo “Rio São Francisco” é substituído por “Velho Chico”. No mais,
me impressionou a forma como os fatos foram sendo agregados e organizados
ao longo do texto, o que me suscitou a citação promovida pelo capítulo “A
crítica do acontecimento ou o fato em questão”:
“Assiste-se à invenção do que Umberto Eco, a partir de Aristóteles, chama de a
“intriga”, quer dizer, “a procura e o estabelecimento de uma coerência, de uma
unidade em uma diversidade, para nós, caótica. Trata-se de constituir um todo
cujas partes estejam coordenadas”.

Percebe-se ali um esforço para trazer diversos vieses dessa narrativa, seja
histórias pessoais, política, legislação, até mesmo meio ambiente. São
informações variadas que se colocadas de forma displicente não são capazes
de contar uma história. O texto cita a hora da explosão de uma bomba em um
atentado terrorista e como, ao olhar de perto no aqui e agora do acontecimento
tudo parece uma grande névoa e que, portanto, cabe ao jornalismo “doar
sentido” ao ocorrido: “Dessa forma, pistas se desenham, caminhos se abrem,
uma rede se sentidos se institui: uma lógica e uma cronologia se instalam”. Os
fatos instaurados pela reportagem poderiam facilmente ser contados de
maneira separada, poderia ser uma matéria a respeito da ligação entre o
general Mário Araújo e Jair Bolsonaro ou sobre a história de um dos muitos
personagens vítimas dos latifundiários apresentados, mas o formato opta por
unir todas essas histórias em um todo que se potencializa, organizando o real
em uma trágica história que contada através das imagens, vídeos, textos,
gráficos e demais formatos explorados, escancara uma realidade negligenciada
cheia de intempéries.

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