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Universidade de Brasília

Departamento de Matemática
Cálculo 2

Turma J

Professora Gláucia L. Dierings


Módulo 2 - Semana 9

2. Equações Diferenciais Ordinárias Lineares de 2a ordem

Equações Lineares Homogêneas com Coecientes Constantes

Em geral, não é fácil descobrir soluções particulares de uma equação linear homogênea de
segunda ordem. Mas, é sempre possível fazer isso se as funções coecientes na equação

y 00 + p(t)y 0 + q(t)y = 0

forem funções constantes, isto é, se a equação diferencial tiver a forma

ay 00 + by 0 + cy = 0, (1)

onde a, b e c são constantes dadas e a 6= 0.


Antes de encontrar uma maneira geral de resolver uma equação do tipo (1), vamos ver
um exemplo.

Considere a equação
y 00 − y = 0

Note que aqui temos a = 1, b = 0, c = −1 e procuramos uma função com a propriedade de que
a derivada segunda dessa mesma função seja igual a ela mesma.
Pensando nas funções que conhecemos, concluímos que uma função que satisfaz essa
propriedade é a função exponencial y1 (t) = et . Uma outra opção é a função y2 (t) = e−t .
Multiplicando essas duas soluções por constantes, continuamos encontrando soluções. Dessa
forma, as funções c1 y1 (t) = c1 et e c2 y2 (t) = c2 e−t satisfazem a equação diferencial para todos
os valores das constantes c1 e c2 .
A soma dessas duas funções,

y = c1 y1 (t) + c2 y2 (t) = c1 et + c2 e−t

1
também é solução para quaisquer valores de c1 e c2 , pelo Princípio da Superposição. Note
também que as funções y1 (t) = et e y2 (t) = e−t são linearmente independentes, logo y1 e y2
formam um conjunto fundamental de soluções para a equação. Sendo assim, a solução geral
y = c1 et + c2 e−t representa uma família innita de soluções da equação diferencial y 00 − y 0 = 0.
Suponha que queremos encontrar a solução dessa equação que satisfaça também as con-
dições iniciais
y(0) = 2, y 0 (0) = −1

Ou seja, procuramos a solução cujo gráco contém o ponto (0, 2) e tal que o coeciente angular
da reta tangente ao gráco nesse ponto seja −1.
Para isso, primeiro fazemos t = 0 e y = 2 na equação y = c1 et + c2 e−t , encontrando
c1 + c2 = 2. Derivando a equação, obtemos y 0 = c1 et − c2 e−t . Fazendo t = 0 e y 0 = −1, obtemos
c1 − c2 = −1. Resolvendo simultaneamente as duas equações em c1 e c2 encontradas, obtemos
c1 = 1
2
e c2 = 32 . Dessa forma, a solução do problema de valor inicial será

1 3
y = et + e−t
2 2

Vamos voltar agora para a equação mais geral (1),

ay 00 + by 0 + cy = 0,

que tem coecientes constantes reais arbitrários. Nesse caso, também vamos procurar soluções
exponenciais. Suponha que y = ert , onde r é um parâmetro a ser determinado. Segue que
y 0 = rert e y 00 = r2 ert . Substituindo y, y 0 e y 00 na equação geral obtemos

(ar2 + br + c)ert = 0,

ou, como ert 6= 0,


ar2 + br + c = 0 (2)

Essa equação é chamada equação característica da equação diferencial (1). Dessa forma, se
r é uma raiz dessa equação polinomial, então y = ert é solução da equação diferencial.
Como (2) é uma equação de segundo grau com coecientes reais, ela tem duas raízes,

2
digamos r1 e r2 que serão dadas por
√ √
−b + ∆ −b − ∆
r1 = r2 = , (3)
2a 2a

onde ∆ = b2 −4ac. Note que essas raízes podem ser reais e distintas, reais e iguais ou complexas
conjugadas, dependendo do valor do discriminante ∆. Vamos estudar os diferentes casos.

1o caso: ∆ > 0
Nesse caso, as raízes da equação característica (2) são reais e distintas, vamos denotá-las
por r1 e r2 , onde r1 6= r2 . Então, y1 (t) = er1 t e y2 (t) = er2 t são duas soluções linearmente
independentes da equação e, portanto, formam um conjunto fundamental de soluções para a
equação. Logo, temos o seguinte resultado:

Se as raízes r1 e r2 da equação característica ar2 + br + c = 0 forem reais e distintas,


então a solução geral de ay 00 + by 0 + cy = 0 é

y = c1 er1 t + c2 er2 t

Exemplo 1 Encontre a solução geral de y00 + 5y0 + 6y = 0.


Para isso, vamos supor que y = ert . Então, como visto anteriormente, r será raiz da
equação característica r2 + 5r + 6 = 0. Note que

r2 + 5r + 6 = (r + 2)(r + 3) = 0

Assim, os possíveis valores de r são r1 = −2 e r2 = −3. Portanto, a solução geral da equação


será
y = c1 e−2t + c2 e−3t

Exemplo 2 Encontre a solução do problema de valor inicial

y 00 + 5y 0 + 6y = 0, y(0) = 2, y 0 (0) = 3

Como vimos no exemplo anterior, a solução geral da equação será

y = c1 e−2t + c2 e−3t

3
Para satisfazer a primeira condição inicial fazemos t = 0 e y = 2 na solução, obtendo

c1 + c2 = 2

Para usar a segunda condição, primeiro derivamos a solução, onde obtemos

y 0 = −2c1 e−2t − 3c2 e−3t .

Fazendo agora t = 0 e y 0 = 3, obtemos

−2c1 − 3c2 = 3

Dessa forma, precisamos resolver o sistema



c 1 + c 2 = 2

−2c1 − 3c2 = 3

e encontraremos c1 = 9 e c2 = −7. Usando esses valores na solução geral, obtemos a solução


do problema de valor inicial:
y = 9e−2t − 7e−3t

2o caso: ∆ = 0
Nesse caso, as raízes da equação característica (2) são reais e iguais, isto é, r1 = r2 . Vamos
denotar por r o valor comum de r1 e r2 . Das equações (3), temos

b
r=− então 2ar + b = 0 (4)
2a

Sabemos que y1 (t) = ert é uma solução da equação ay 00 + by 0 + cy = 0. Agora vericaremos que
y2 (t) = tert também é uma solução.

ay200 + by20 + cy2 = a(2rert + r2 tert ) + b(ert + rtert ) + ctert

= (2ar + b)ert + (ar2 + br + c)tert

= 0(ert ) + 0(tert ) = 0

Note que o primeiro termo é zero pela equação (4), e o segundo termo é zero pois r é uma raiz da
equação característica. Vamos vericar que y1 (t) = ert e y2 (t) = tert são soluções linearmente

4
independentes:

rt
tert

y1 (t) y2 (t) e
W (y1 , y2 )(t) = = = e2rt 6= 0, ∀t.
y10 (t) y20 (t)
rt rt
re e + rtert

Portanto, y1 e y2 formam um conjunto fundamental de soluções e obtemos a seguinte


solução geral:

Se a equação característica ar2 + br + c = 0 tem apenas uma raiz real r, então a solução
geral de ay 00 + by 0 + cy = 0 é
y = c1 ert + c2 tert

Exemplo 3 Resolva a equação 4y00 + 12y0 + 9y = 0.


A equação característica é 4r2 + 12r + 9 = 0, que pode ser fatorada como

(2r + 3)2 = 0

3
Desse modo, a única raiz é r = − . Portanto, a solução geral será
2

y = c1 e−3t/2 + c2 te−3t/2

3o caso: ∆ < 0
Nesse caso, as raízes da equação característica (2) são números complexos conjugados.
Vamos denotá-los por
r1 = α + iβ r2 = α − iβ,

onde α e β são números reais.


As expressões correspondentes para y são

y1 (t) = e(α+iβ)t , y2 (t) = e(α−iβ)t

Vamos analisar o signicado dessas expressões, denindo a função exponencial complexa. Para
isso, vamos utilizar a Fórmula de Euler, que é um método baseado em séries innitas.

5
Sabemos que a série de Taylor para et em torno de t = 0 é

X tn
, −∞ < t < ∞
n=0
n!

Se supormos que podemos substituir t por it nessa equação, teremos


∞ ∞ ∞
X (it)n X t2n
n
X
n−1 t2n−1
= (−1) +i (−1) ,
n=0
n! n=0
(2n)! n=0
(2n − 1)!

onde separamos a soma em suas partes real e imaginária, usando o fato que i2 = −1, i3 =
−i, i4 = i e assim por diante. Note que a primeira série nessa equação é precisamente a série
de Taylor para cos t em torno de t = 0 e a segunda é a série de Taylor para sen t em t = 0.
Dessa forma,
eit = cos t + i sen t,

que é conhecida como a Fórmula de Euler.


Como queremos que as propriedades usuais da função exponencial continuem válidas para
expoentes complexos, substituindo t por βt na Fórmula de Euler, obteremos

e(α+iβ)t = eαt eiβt = eαt (cos βt + i sen βt) = eαt cos βt + ieαt sen βt

Assim, podemos escrever a solução da equação diferencial nesse caso como

y = C1 er1 t + C2 er2 t = C1 e(α+iβ)t + C2 e(α−iβ)t

= C1 (eαt (cos βt + i sen βt) + C2 eαt (cos βt − i sen βt)

= eαt [(C1 + C2 ) cos βt + i(C1 − C2 ) sen βt]

= eαt (c1 cos βt + c2 sen βt)

onde c1 = C1 + C2 e c2 = i(C1 − C2 ). Isso nos dá todas as soluções (reais ou complexas) da


equação diferencial. As soluções serão reais quando as constantes c1 e c2 forem reais. Pelo
exercício 6c da lista de exercícios da semana 8, as funções eαt cos βt e eαt sen βt, com β 6= 0,
são linearmente independentes.
Portanto, podemos resumir essa discussão no seguinte resultado:

6
Se as raízes da equação característica ar2 + br + c = 0 forem os números complexos
r1 = α + iβ e r2 = α − iβ, , então a solução geral de ay 00 + by 0 + cy = 0 é

y = eαt (c1 cos βt + c2 sen βt)

Exemplo 4 Encontre a solução geral de y00 + y0 + y = 0.


A equação característica é
r2 + r + 1 = 0

e suas raízes são √ √ √


−1 ± 1−4 1 −1 · 3 1 3
r= =− ± =− ±i
2 2 2 2 2

Logo, α = −1/2 e β = 3/2, de modo que a solução geral é

√ √
y = e−t/2 [c1 cos( 3t/2) + c2 sen ( 3t/2)]

Exemplo 5 Encontre a solução do problema de valor inicial

16y 00 − 8y 0 + 145y = 0, y(0) = −2, y 0 (0) = 1

A equação característica é 16r2 − 8r + 145 = 0 e suas raízes são r = 1/4 ± 3i. Portanto,
a solução geral da equação diferencial é

y = et/4 (c1 cos 3t + c2 sen 3t) = c1 et/4 cos 3t + c2 et/4 sen 3t

Para usar a primeira condição inicial fazemos t = 0 na solução e obtemos y(0) = c1 = −2. Para
a segunda condição inicial precisamos derivar a solução, obtendo

1 1
y 0 = c1 et/4 cos 3t − 3c1 et/4 sen 3t + c2 et/4 sen 3t + 3c2 et/4 cos 3t
4 4

Desse modo, encontramos


1
y 0 (0) = c1 + 3c2 = 1,
4
de onde obtemos c2 = 1/2. Usando os valores encontrados de c1 e c2 obtemos como solução do
P.V.I.:
1
y = −2et/4 cos 3t + et/4 sen 3t
2
7

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