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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

Professor Marcelo Lopes Vieira

1 Introdução às Equações Diferenciais

Uma equação diferencial é uma relação entre uma função y(t) do tempo t e suas derivadas.
A varı́avel y é conhecida como variável dependente e a variável t é denominada variável
independente.
Observação .1 A notação da derivada para uma variável dependente y em função de uma
variável independente t, em geral, é dada por dy
dt
, y 0 (t), ou ainda por, ẏ(t).

São exemplos de equações diferenciais:


dy
= 3y 2 sen(t + y)
dt
e
d3 y −y d2 y
= e + t +
dt3 dt2
Uma solução de uma equação diferencial é uma função contı́nua y(t) que satisfaça a
relação entre a função e suas derivadas na equação. A existência desta solução é garantida, sob
algumas condições, por teoremas de existência e unicidade.
Exemplo .1 A função
1
y(t) = 2sen(t) − cos(2t)
3
é solução da equação diferencial
d2 y
+ y = cos(2t).
dt2
De fato,

d2 1
+ 2sen(t) − 13 cos(2t)

2
2sen(t) − 3
cos(2t) =
dt
d
2cos(t) + 23 sen(2t) + 2sen(t) − 31 cos(2t) =

=
dt

= −2sen(t) + 43 cos(2t) + 2sen(t) − 31 cos(2t) =




= cos(2t)

As soluções das equações diferencias são divididas em duas classes: explı́citas e implı́citas.
Diremos que a solução de uma equação diferencial é explicita quando sua variável independente
pode ser determinada em função apenas das variáveis dependentes. Caso contrário, diremos
que a solução é implı́cita. Em geral, dada uma equação diferencial, existem infinitas soluções
que a satisfazem.
As equações diferenciais aparecem em muitas áreas da ciência de forma natural, pois des-
crevem algum processo fı́sico denominado modelo matemático do processo.

1
2

1.1 Classificação de Equações Diferenciais

Equações Diferenciais Ordinárias São equações que dependem apenas de uma variável in-
dependente.

Equações Diferenciais Parciais São equações que dependem de duas ou mais variaveis in-
dependentes, por consequência, suas derivadas são parciais.

Sistema de Equações Diferenciais O número de funções desconhecidas determina o tipo de


equação diferencial que temos. Se existem duas ou mais variáveis dependentes, precisamos
de um sistema de equações diferenciais, que pode ser parciais ou ordinárias. Por Exemplo,
o sistema abaixo representa uma modelagem ecológica presa-predador.

dx
 dt = ax − αxy



 dy

 = −cy + γxy
dt
Ordem A ordem de uma equação diferencial é a maior ordem da derivada que aparece na
equação. Por exemplo, a equação
dy
= 3y 2 sen(t + y)
dt
é de primeira ordem e a equação

d3 y −y d2 y
= e + t +
dt3 dt2
é de terceira ordem.

Equações Lineares e Não Lineares Uma equação diferencial é dita linear se é da forma

a0 (t)y (n) + a1 (t)y (n−1) + ... + an (t)y = g(t)

. Por outro lado, uma equação diferencial que não se encaixe neste formato é dita não-
linear. Por ex, a equação diferencial

y 000 + 2et y 00 + y 0 = t4

é uma equação linear, porém a equação diferencial

y 000 + 2et y 00 + yy 0 = t4

é não-linear por causa do termo yy 0 .

Exemplo .2 Classifique as equações diferencias abaixo:

d2 y dy
1. t2 2
+ t + 2y = sent é uma equação diferencial ordinária, linear e de segunda ordem.
dt dt
d2 y dy
2. (1 + y 2 ) 2 + t + y = et é uma equação diferencial ordinária, não-linear e de segunda
dt dt
ordem.
3

3. t2 y 0 + y = sect é uma equação diferencial ordinária, linear e de primeira ordem.


du d2 u
4. = K 2 é uma equação diferencial parcial, linear e de segunda ordem.
dt dx

Exemplo .3 Verifique se a função y = 3t + t2 é solução da equação ty 0 − y = t2 .

y 0 = 3 + 2t. Logo,

ty 0 − y = t (3 + 2t) − 3t + t2


= t2 ,

ou seja, y(t) é solução da equação diferencial acima.

Plano de Fase. Plano de Fase ou Campo de Direções é uma ferramenta valiosa no estudo
das soluções de equações diferenciais que consiste em um plano cartesiano onde são traçadas as
trajetórias das soluções de uma equção ordinária que se inicia em algum ponto. Estas trajetórias
são obtidas através do campo vetorial gerado pelos vetores tangentes a cada ponto da trajetória.
Esta ferramenta se mostra muito eficaz pelo simples fato de não necessitar da solução da EDO
para esboçá-lo, fazendo deste artifı́cio uma das bases para o estudo das EDO’s não-lineares.
Um exemplo simples é o plano de fase da EDO ty 0 − y = t2 , onde esboçamos algumas
trajetórias que representam algumas soluções desta equação diferencial.

Figura 1: plano de fase da EDO ty 0 − y = t2

2 Equações Diferenciais Ordinárias de Primeira Ordem

Em geral, uma equação diferencial ordinária de primeira ordem é representada por


dy
= f (t, y) (1)
dt
4

onde f é uma função nas variáveis t e y.


Nosso problema consiste em: Dada f (t, y), encontre funções y(t) que satisfaçam (1).

O que garante a existência de tais soluções é o teorema da existência e unicidade de soluções


para equações diferenciais de primeira ordem, que sob certas condições asseguram a existência
de um intervalo que tal solução está definida. Agora, vamos estudar algumas técnicas para
estabelecer tais soluções.

2.1 EDO’s de Primeira Ordem Separáveis

Uma EDO de primeira ordem que pode ser escrita na forma

dy g(t)
= (2)
dt f (y)

onde g e f são contı́nuas nas variáveis t e y, respectivamente, é chamada de EDO separável.


As E.D.O.’s separáveis de primeira ordem mais simples que temos seriam da forma
dy
= f (t). (3)
dt
onde g é uma função integravel na variável t.
A equação (3) é facilmente resolvida utilizando o Teorema Fundamenta do Cálculo e sua
solução seria
Z
y(t) = g(t)dt + C. (4)
R
onde C representa um constante de integração arbitrária e g(t)dt é a primitiva de g(t).

dy
Exemplo .4 Enontre a solução da equação diferencial = t cos t2 .
dt
Pela equação (4) e o método da substituição para integrais a solução desta EDO é (fazendo
u = t2 temos dt = 2t):

Z
y(t) = t cos t2 dt + C
Z
= cos udu + C

= senu + C

= sen t2


Assim, y(t) = sent2 é solução deste EDO.

Com iremos ver mais a frente, este método é impossı́vel de ser aplicado na maioria das vezes.

Exemplo .5 Considere a equação


dy t2
= 2 (5)
dt y
5

dy
Figura 2: Plano fase da equação = t cos t2 .
dt

que é claramente separável. Podemos encontrar a sua solução da seguinte forma:

dy t2
= 2
dt y
dy
y2 = t2
dt
d y 3 (t)
 
= t2
dt 3
y 3 (t) t3
= +C
3 3
√3 3
y(t) = t +C

Exemplo .6 Considere a equação

dy t2
= (6)
dt 1 − y2
6

dy t2
Figura 3: Plano fase da equação = 2.
dt y

dy t2
=
dt 1 − y2
dy
(1 − y 2 ) = t2
dt
y 3 (t)
 
d
y(t) − = t2
dt 3
y 3 (t) t3
y(t) − = +C
3 3

3y(t) − y 3 (t) − t3 = C

é a solução da EDO separável (6). Esta solução está descrita na forma implı́cita.

Exemplo .7 Considere o PVI

dy 3t2 + 4t + 2
= , y(0) = −1 (7)
dt 2(y − 1)
7

dy t2
Figura 4: Plano fase da equação = .
dt 1 − y2

dy 3t2 + 4t + 2
=
dt 2(y − 1)
dy
(2(y − 1)) = 3t2 + 4t + 2
dt
d
y(t)2 − 2y(t) = 3t2 + 4t + 2

dt

y(t)2 − 2y(t) = t3 + 2t2 + 2t + c

Pela condição inicial y(0) = −1, temos que 1 + 2 = 0 + 0 + 0 + c ⇒ c = 3. Assim,

y(t)2 − 2y(t) = t3 + 2t2 + 2t + 3

é solução do PVI (7). Pela fórmula de Báskara temos que


p
2 ± 4 + 4(t3 + 2t2 + 2t + 3)
y(t) = = 1 ± t3 + 2t2 + 2t + 4.
2
Existem duas soluções, mas apenas uma satisfaz a condição inicial, que é

y(t) = 1 − t3 + 2t2 + 2t + 4.

O intervalo de t para o qual esta solução é válida é tal que t3 + 2t2 + 2t + 4 ≥ 0. A única
raiz rela desta equação é t = −2. Se t ≥ −2 então t3 + 2t2 + 2t + 4 ≥ 0. Assim, a solução do
PVI (7) enunciada de forma completa é

y(t) = 1 − t3 + 2t2 + 2t + 4, t ≥ −2.
8

3t2 + 4t + 2
Figura 5: Plano fase da equação .
2(y − 1)

Exemplo .8 Vamos solucionar a equação


dy 4t − t3
= (8)
dt 4 + y3
e encontrar a solução que passa pelo ponto (0, 1).
Solução:

dy 4t − t3
=
dt 4 + y3
dy
= 4t − t3
(4 + y 3 )
dt
 4 
d y (t)
+ 4y(t) = 4t − t3
dt 4
y 4 (t) t4
+ 4y(t) = 2t2 − + C
4 4

y 4 (t) + 16y(t) − 8t2 + t4 = C

Exemplo .9 Resolva a equação


dy y − 4t
= (9)
dt t−y
Vamos dividir, primieiramente, numerador e denominador pela variável t. Assim,
y
dy −4
= t y. (10)
dt 1−
t
y
Agora, façamos a mudança de variável u = . Daı́,
t
9

du 1 dy y
= − 2
dt t dt t
du y 1 dy
+ 2 =
dt t t dt
du y dy
t + =
dt t dt
du dy
t +u =
dt dt

Desta forma, a equação (10) fica


du u−4
u+t = . (11)
dt 1−u
Manipulando algebricamente,

du u−4
t = −u
dt 1−u
u − 4 u − u2
= −
1−u 1−u
u − 4 − u + u2
=
1−u
u2 − 4
=
1−u

Daı́,

1 − u du 1
2
= (∗) rascunho
u − 4 dt t
 
d 1 u − 2 1 2 1
ln − ln u − 4 =
dt 4 u+2 2 t

1 u − 2 1 2
ln − ln u − 4 = ln t + C
4 u + 2 2
y
− 2
1 t 1  y 2
− ln

ln y − 4 = ln t + C
4 + 2 2 t
t
10

(*) Rascunho

1−u 1−u
Z Z
du = du
u2 − 4 (u − 2)(u + 2)
Z Z
1 u
= du − du
(u − 2)(u + 2) (u − 2)(u + 2)
| {z } | {z }
I II

Solução de I:


1 A B 1 Au + Bu − 2B + 2A  A+B = 0
= + ⇒ = ⇒
(u − 2)(u + 2) u−2 u+2 (u + 2) (u + 2)
2A − 2B = 1

1 −1
⇒A= e B= .
4 4
Logo,

1 1/4 1/4
= −
(u − 2)(u + 2) u−2 u+2
Assim,

1 u − 2
Z Z Z
1 1/4 1/4
du = du − du = ln
(u − 2)(u + 2) u−2 u+2 4 u + 2

Solução de II:

dv
v = u2 − 4 ⇒ dv = 2udu ⇒ = udu.
2
Daı́,
Z Z Z
u u 1 1 1 1
du = 2
du = dv = ln |v| = ln |u2 − 4|
(u − 2)(u + 2) u −4 2 v 2 2

Solução Geral:

1−u u − 2 1
Z
du = ln − ln |u2 − 4|
u2 − 4 u + 2 2
11

3 Exercı́cios
1. Classifique quanto à ordem e linearidade as seguintes EDO’s abaixo:

dy
(a) − 2y = 4 − t
dt
(b) y 0 + 2ty = 0
(c) y 0 + 3y = t + e−2t
(d) ty 0 + 2y = sent
dy 2
(e) − et y = 0
dt
(f) 2xy 0 − 4x = 4y − 2yy 0
dy
(g) − 2ty = t
dt
1
(h) y 0 + y = 3 cos 2t t > 0
t
(i) (e seny − 2ysent) dt + (et cos y − 2 cos t) dy = 0
t

dy 1
(j) +y =
dt 1 + t2
dy
(k) − y cos t = 0
dt
(l) (t ln y + ty) dt + (y ln t + ty) dy = 0, t > 0 y > 0
dy √
(m) − ysent t = 0
dt
dy 4t − t3
(n) =
dt 4 + y3
dy t2
(o) =
dt y
dy cos2 t
(p) =
dt sen2 y
dy t − e−t
(q) =
dt y + ey
(r) y 0 + y = 5sen2t
dy t2
(s) =
dt 1 + y2
(t) (1 + t2 )y 0 + 4ty = (1 + t2 )−2
dy t2 + ty + y 2
(u) =
dt t2
dy 4y − 3t
(v) =
dt 2t − y

2. Apresente a solução geral das seguintes EDO’s abaixo:

(a) y 0 + 2ty = 0
dy 2
(b) − et y = 0
dt
12

dy
(c) − 2ty = t
dt
dy
(d) − y cos t = 0
dt
dy 4t − t3
(e) =
dt 4 + y3
dy t2
(f) =
dt 1 + y2

3. Encontre a solução geral dos seguintes problemas de valor inicial abaixo:

dy
(
2 + ty = 2
(a) dt
y(0) = 1
( dy √
+ y 1 + t2 = 0
(b) dt √
y(0) = 5

sen2tdt + cos 3ydy = 0
(c)
y(π/2) = π/3

4. Resolva o problema de valor inicial

1 + 3t2
y0 = , y(0) = 1
3y 2 − 6y
e determine o intervalo de validade da solução.

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