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ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENSINO UNIVERSITÁRIO

UNIABEU
CURSO DE PSICOLOGIA

ESTHER TRAJANO MACHADO ALVES PINTO

SER MULHER NEGRA: A EXISTÊNCIA DA MULHER NEGRA ATRAVÉS DE UMA


ANÁLISE HISTORICO-PSICOSSOCIAL

Belford Roxo

2023
ESTHER TRAJANO MACHADO ALVES PINTO

SER MULHER NEGRA: A EXISTÊNCIA DA MULHER NEGRA ATRAVÉS DE UMA


ANÁLISE HISTORICO-PSICOSSOCIAL

Monografia apresentada à Banca


Examinadora como exigência parcial para
obtenção do Título de Graduação em
Psicologia pelo UNIABEU Centro
Universitário.

Orientador/a: Elis Regina de Castro Lopes

Belford Roxo
2023
ESTHER TRAJANO MACHADO ALVES PINTO

GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

SER MULHER NEGRA: A EXISTÊNCIA DA MULHER NEGRA ATRAVÉS DE UMA


ANÁLISE HISTORICO-PSICOSSOCIAL

Monografia apresentada à Banca Examinadora


como exigência parcial para obtenção do Título
de Graduação em Psicologia pelo UNIABEU
Centro Universitário.

Aprovada em _____/_________________de 2023.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________

Orientador/a:
UNIABEU Centro Universitário

__________________________________________________

UNIABEU Centro Universitário

__________________________________________________

UNIABEU Centro Universitário

Belford Roxo

2023
DEDICATÓRIA
AGRADECIMENTOS
RESUMO
SOBRENOME, Nome. Título: subtítulo. 20xx. xxxf. Monografia (Graduação em
Psicologia) – UNIABEU Centro Universitário, Belford Roxo, 2023.

Texto do resumo

Palavras-chave:
ABSTRACT
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO

Resistencia, poder e força são palavras comumente direcionadas e atribuídas


às mulheres negras pela longa jornada de construção, desconstrução e
reconstrução de sua história. Essas palavras formam uma insígnia de elogio,
cortando pela raiz o direito de sermos vulneráveis. Resistir cansa. Para ser forte, é
preciso que haja o descanso. Tenho direito a esse descanso? Sempre me é tirado
quando gritam por aí que tenho que ser forte. O tempo todo? Sim, pois preciso
resistir. Ao que ou a quem? Aos que são diferentes de mim. Aos que tem ao seu
lado a construção de uma sociedade. Ao que é bonito, ao que sempre foi bonito. Ao
que me vê como isso ou só isso, nunca como demais.

É tirado de nós o poder de isenção, na verdade, esse poder é dado ao que é


diferente de mim. Enquanto é lançado sobre mim a responsabilidade de não falhar, é
atribuído a eles a graça dos privilégios. Enquanto essa responsabilidade é lançada
sobre mim, o mundo entende que a mulher negra não pode ser vulnerável. Em
nossa história, não tivemos espaço para falhas. Não tivemos o direito de errar. O
erro poderia nos custar a vida... Ainda pode.

Ser mulher negra no Brasil, é entender que ainda há um enorme caminho a


ser trilhado. Ainda sentimos, no mais íntimo do nosso ser, o racismo instaurado em
nossa sociedade. Convivemos com o medo e a incerteza que a cor da nossa pele
carrega. Nos conectamos com nossa ancestralidade e sentimos juntos e por eles
tudo o que nos foi feito através da construção desta nação. Ser mulher negra no
Brasil transcende a o que é entendido enquanto ser mulher diante de uma
sociedade. Ser mulher negra no Brasil, é sentir. É ser. É precisar ser. É precisar
descansar, ser forte, poder estar sensível a dor, suportar, ser vulnerável. Resistir!

Contrastando dados históricos e através do olhar da psicologia social este


trabalho se propõe a explicar o fenômeno do racismo sofrido por mulheres negras no
Brasil, relatando como uma sociedade racialmente desigual afetou e afeta mulheres
ao longo da construção de nossa nação. Na sociedade atual, o presente trabalho
pretende pontuar questões psicossociais e econômicas da construção da mulher
negra enquanto sujeito.

A desigualdade racial no Brasil gerou e continua gerando uma série de


desafios para a construção da identidade da mulher negra. No contexto social, essa
realidade se manifesta na necessidade de desmistificar a ideia construída através da
hierarquização de gênero e raça. O presente trabalho busca analisar, através da
perspectiva da psicologia social, o que é ser mulher negra diante de uma sociedade
que traz consigo um passado escravocrata, pontuando os impactos causadas na
vivência dessas mulheres até os dias atuais e buscando possíveis estratégias no
enfrentamento ao racismo, à violência e a violação de diretos básicos, para a
promoção de uma sociedade racialmente igualitária, pautada na equidade e justiça
social.

Considerando uma análise histórica, a mulher negra, pelo longo dos


anos, têm sido alvo de inúmeras formas de opressão e discriminação, que
perpetuam estruturas sociais que foram enraizadas em estereótipos, desigualdade,
racismo, preconceito e injustiças. A experiência de vida da mulher negra mostra os
sinais mais profundos da desigualdade racial, que se manifesta em vários aspectos,
como facilidade de acesso aos seus direitos básicos, às oportunidades de trabalho,
saúde, segurança, representatividade, entre outras. Para a construção de uma
sociedade justa e inclusive, é de extrema necessidade o entendimento sobre o
enfrentamento ao racismo e a desigualdade de gênero.

O presente trabalho tem como principal objetivo contrastar dados históricos e


através do olhar da psicologia social explicar o fenômeno do racismo sofrido por
mulheres negras no Brasil, relatando como uma sociedade racialmente desigual
afetou e afeta mulheres ao longo da construção de nossa nação. Na sociedade
atual, o presente trabalho pretende pontuar questões psicossociais e econômicas da
construção da mulher negra enquanto sujeito. Serão considerados fatores histórico-
sociais que contribuíram para a construção de uma nação desigual; sinalizando as
consequências negativas que causaram e ainda causam impacto na vida e dia-a-dia
de mulheres negras, no que se refere a condição de vida, sobrevivência e
oportunidades.
Esta pesquisa foi formulada através de dados e conteúdos interdisciplinares,
usando o método qualitativo para a obtenção da base das informações. Foram
considerados estudos acadêmicos, livros e artigos para a compreensão e
estruturação do fenômeno da desigualdade racial no Brasil, suas causas e efeitos na
construção da mulher negra enquanto sujeito; lutas sociais como a antirracista e o
feminismo negro, serão considerados no presente trabalho, na intenção de dar
visibilidade e trazer ao conhecimento o que essas lutas vêm tentando combater.

Espera-se que o presente trabalho auxilie na expansão do conhecimento


sobre os problemas vividos pelas mulheres negras desde a fundação de nossa
sociedade, concedendo recursos para a conscientização e reflexão crítica sobre
essa realidade. Ademais, este trabalho busca evidenciar as diferenças em nome da
valorização da diversidade e a necessidade do engajamento em lutas que tenham
por objetivo a promoção de uma sociedade mais justa.

Por fim, com este trabalho, espera-se que haja mais espaços para dialogar
sobre o tema apresentado; que as discussões acerca da construção da identidade
da mulher negra causem sensibilidade e gerem um despertar no que se refere a
ações que tenham como objetivo criar um despertar para questões da desigualdade
de gênero e raça. Reconhecer que o Brasil é uma país que carrega consigo, ainda
na atualidade, resquícios de uma nação escravocrata, possibilita, de início, a
abertura para a criação de um diálogo sobre o enfrentamento ao racismo e a
consequência dele na vida de tantas mulheres negras.
“Uma mulher negra diz que ela é uma mulher negra.
Uma mulher branca diz que ela é uma mulher.
Um homem branco diz que é uma pessoa. Grada Kilomba”

1. A CONSTRUÇÃO DO RACISMO NO BRASIL: UMA ANÁLISE HISTÓRICO-


SOCIAL SOBRE A INVISIBILIDADE DA MULHER NEGRA

Brasil, uma sociedade erguida e estruturada no modelo patriarcal 1, tendo


como seus pilares o racismo e o sexismo 2, é lar, desde muito tempo, de milhões de
mulheres negras. Na construção de nossa nação, segundo Albuquerque e Filho
(2006, p. 39), milhões de negros africanos foram arrancados de suas terras,
forçados a deixarem seus costumes e cultura e foram trazidos ao Brasil de forma
precária e desumana, a fim de servir como mão de obra escrava. “nenhuma outra
região americana esteve tão ligada ao continente africano [...]. O dramático
deslocamento forçado, por mais de três séculos, uniu para sempre o Brasil à África”
(Albuquerque e Filho, 2006, p. 39). De início, o maior interesse dos colonizadores
portugueses era nos negros africanos, visando a força e o trabalho que poderia ser
desempenhado, mas nada impediu que mulheres e crianças chegassem ao nosso
solo.

De acordo com Del Priore (2013), no período colonial, as mulheres africanas


eram desonradas e, ao mesmo tempo, pretendidas. A sociedade desenvolvida de
forma machista3 e misógina4 considerava as negras escravizadas como fáceis,
passíveis de violações e investidas sexuais por homens brancos do engenho. Dessa
1
O patriarcalismo é o sistema que designa o poder do gênero masculino enquanto categoria social.
Apresenta-se como uma forma de organização social, na qual as relações são regidas pelos
princípios básicos de que as mulheres estão hierarquicamente subordinadas aos homens
2
O termo "sexismo" representa o conjunto de preconceitos e discriminações que se baseiam no sexo
ou na orientação sexual. Geralmente, a pessoa discriminada é colocada em posição inferior, somente
por causa da sua identidade sexual.
3
O machismo é uma discriminação criada pelo sistema patriarcal, através do pressuposto de que
mulheres são inferiores aos homens
4
Misoginia é uma palavra que tem por definição o ódio às mulheres. 
forma, a imagem da mulher negra e sua identidade foram sucumbidas e, no lugar,
nasceu a ideia e visão de uma identidade completamente atrelada à objetificação e
serventia. Após anos desde a chegada de navios negreiros 5 no Brasil, com o avanço
na construção de nossa nação, as mulheres negras africanas passaram a ganhar
novas atribuições no que se refere a trabalho. Longe da agricultura nos campos,
mas não longe do ideal de serventia, as mulheres negras eram dadas as
sinhazinhas6 com o objetivo de servi-las cuidando de suas casas e seus filhos. Atos
de serviços faziam parte do cotidiano da mulher negra durante todo período colonial.
O dia a dia nessa era, mostrava as mais diversas camadas da hierarquia social da
sociedade. Escravizadas e senhoras dividiam o mesmo espaço, no que se refere às
terras, mas havia o afastamento social, racial e econômico.

No século XIX, nas colônias portuguesas, o conceito de raça estava atrelado


a descendência, a linhagem e também a religião. “Era o chamado ‘estatuto da
pureza de sangue’” (Albuquerque e Filho, 2006, p. 204). Esse conceito trazia uma
ideia de ordem social e compôs a relação entre os portugueses e os povos
africanos. De acordo com os ensinamentos religiosos da época, quem não
praticasse a fé católica era considerado como “gente do sangue sujo e de raça
impura”. A ideia de raça, teve como fundamento explicar sobre a origem e
característica de determinados grupos humanos.

Na visão de Nina Rodrigues (1938), a ideia de raça originou-se através de


uma fundamentação biológica7, dentro do modelo de raça inferior e raça superior,
corroborado por meio de diversas pesquisas e estudos. A “ciência da época” serviu
à um grupo de dominadores (grupo minoritário) causando prejuízo aos dominados
(maioria), em um período em que os negros viviam sob as ordens e autoridade do
dominador. Confirmando a ideia de uma sociedade preconceituosa e desigual em
diversos pontos e dividida em classes sociais, enfatiza a ideia que há diferença, não
somente física e estética, entre negro e brancos. Na visão de Kabengele (2003), o
problema não está na organização dos seres humanos conforme suas variações de
cores ou características físicas, visto que, para ele, a categorização de elementos
5
Navio negreiro era o nome pelo qual ficou conhecido o barco que transportavam os negros
destinados ao trabalho escravo no continente americano entre os séculos XVI e XIX.
6
Popular tratamento dado às filhas dos senhores pelos escravizados.
7
conhecimento sobre o desenvolvimento e funcionamento do organismo humano, considerando as
dimensões biológica, psicológica e sócio cultural.
em grupos semelhantes pode contribuir para a construção do conhecimento e
pensamento científico.

De acordo com Kabengele (2003), no decorrer do tempo, no que tange o


conceito de raça, europeus pertencentes a raça branca, reproduziram essa
classificação a fim de que houvesse uma hierarquização e, com isso, gerar um valor
entre raças. Nessa ideia foi fundida a construção e estruturação da supremacia
branca. Neste caso, a ideia de que havia uma superioridade natural do homem
branco. Com a evolução nos estudos sobre genética humana, segundo Munanga
(2003, p.2), “a raça não é uma realidade biológica, mas sim apenas um conceito,
aliás, cientificamente inoperante para explicar a diversidade humana e para dividi-la
em raças estancas”, isto é, raças não existem, biológica e cientificamente. Tratando-
se por um viés da biologia, geneticamente, somos todos iguais.

os conceitos e as classificações servem de ferramentas para


operacionalizar o pensamento. É neste sentido que o conceito de
raça e a classificação da diversidade humana em raças teriam
servido. Infelizmente, desembocaram numa operação de
hierarquização que pavimentou o caminho do racialismo. (Munanga,
2003, p. 2)

Guimarães (2005, p.11), comunicando com os estudos levantados por


Munanga, teoriza que:

“Raça” é um conceito que não corresponde a nenhuma realidade


natural. Trata-se, ao contrário, de um conceito que denota tão-
somente uma forma de classificação social, baseada numa atitude
negativa frente a certos grupos sociais, e informada por uma noção
específica de natureza, como algo endodeterminado. A realidade das
raças limita-se, portanto, ao mundo social. Mas, por mais que nos
repugne a empulhação que o conceito de ‘raça’ permite – ou seja,
fazer passar por realidade natural preconceitos, interesses e valores
sociais negativos e nefastos –, tal conceito tem uma realidade social
plena, e o combate ao comportamento social que ele enseja é
impossível de 26 ser travado sem que se lhe reconheça a realidade
social que só o ato de nomear permite.
Guimarães discorre sobre a noção de raça restrita ao mundo social e não ao
biológico. Contudo, mesmo através da visão biológica, no que se refere a
desconstrução de raças, a existência do racismo não pode ser descartada. O
racismo pode ser lido como uma forma específica de naturalizar a vida social e criar
diferenças culturais, sociais ou pessoais. Segundo Guimarães (2012, p, 11), “o

branco sempre simbolizou as virtudes e o bem, enquanto o negro significou o seu


contrário – o sinistro, o mal, os defeitos”. Devido as crenças instauradas pelo
conceito europeu de supremacia da raça branca sobre a negra, a palavra “negro”
começou a ser utilizada para fazer referência a cor de pele de povos africanos. A
partir daí manifesta-se a convicção de que era realmente aceitável a ideia da
hierarquização de raças, pois, de acordo com o autor, a cor preta dos africanos
caracterizava fracasso, enquanto a cor branca simbolizava sucesso, sabedoria e
pureza.

Com o ideal de hierarquização de raça disseminado pelos europeus durante o


Brasil Colonial, na era escravocrata, o pensamento de que a raça branca era
sinônimo de pureza e requinte, enquanto a negra era associada a ideia de serventia,
desonestidade e desonra reforçou o conceito de que a mulher branca representaria
o padrão do que é ser mulher, retirando todo o espaço para a existência e
manifestação do ser da mulher negra. No ano de 1888, mais precisamente na data
de 13 de março, a notícia sobre a abolição da escravatura 8 correu sobre as cidades
e povoados brasileiros. Com festejar, o comunicado sobre o fim do regime
escravocrata e a assinatura da Lei Áurea, foi comemorado por uma enorme
multidão.

Segundos os autores, Albuquerque e Filho (2006), após a abolição da


escravatura, questões e lutas sociais começaram a ganhar mais força no Brasil. “ O
fim da escravidão em 1888, e da monarquia em 1889, gerou instabilidade social [...]
Com a abolição a sociedade não podia mais ser definida pela oposição entre
senhores e escravo9”. Com o monopólio e domínio do poder pertencendo a Portugal
8
Compra e venda de escravos; comercialização de pessoas definidas como propriedades;
escravidão. Estado ou condição da pessoa que se submete à vontade de outra, de quem não é livre.
9
Adota-se o conceito de “escravizado(a)”, pois “[...] também se relaciona com o desempobrecido e de
marginalizado. Não podemos dizer que os indivíduos simplesmente nascem, crescem e morrem
desde a fundação e desenvolvimento do Brasil, os europeus sentiram-se ameaçado
com a instabilidade e incertezas que seriam vividas a partir de toda a mudança que
havia sendo presenciada. Com a liberdade, o ex-escravizados, em teoria, já não
estariam mais restritos a um lugar de serventia, ou seja, os europeus perderam,
além da mão de obra para a execução de determinadas atividades, o poder e
posição do mando.

Visando preservar a autoridade dos ex-senhores algumas


providências foram tomadas. A necessidade de aumento dos
contingentes policiais era tema cada vez mais frequente nos editoriais
jornalísticos e debates políticos nos meses que se seguiram a
abolição. Chefes de polícia, delegados, jornalistas e deputados,
dentre outros, imaginavam que a extinção do cativeiro pudesse
despertar “ódios raciais”. Eles temiam que os negros interpretassem o
fim da escravidão como oportunidade para contestar as
desigualdades sociais e para promover vinganças. Muitos
argumentavam que os negros não se adaptariam a uma sociedade
sem rei, feitor e senhor (Albuquerque e Wladmyr, 2006, p. 203)

A mulher negra africana sai do período de escravidão e passa, então, a fazer


parte de um Brasil abolicionista. A ideia de liberdade plena por pouco tempo foi
mantida, visto que os negros estavam livres do trabalho escravo, mas não estavam
libertos da condição social que os mantinha na parte inferior de qualquer régua que
fosse usada para medir a hierarquia através de poder. Segundo Simone Rodrigues
(2012), as mulheres negras eram submetidas a todo o tipo de violência, da física à
violação de seus direitos. A negra africana passou de escrava de um senhor, para
escrava de uma condição. A liberdade forjada só reforçou a opressão que já havia
sendo vivida desde a vinda dessas mulheres para o Brasil. O status de “livre”,
através da perspectiva na mulher negra, numa sociedade recém escravista, foi
percebido como um direito a ser conquistar.

escravos, pobres e marginais sem que haja sistemas de espoliação, exploração, expropriação e
marginalização operando política, econômica, cultural, simbólica e psicologicamente na sociedade.
[...]. Tratar o pobre como categoria nativa é simplesmente remetê-lo ao estado de natureza. Diante
disso se mantém a lógica perversa de manter o escravo, o pobre e o marginal em sua culpa pessoal e
coletiva –imputa-lhe a impotência de mudar sua história social” (FONSECA, 2009, p. 14).
Quando finalmente ocorreu a Abolição no Brasil, as libertas
encontraram outras tantas dificuldades para se inserir na sociedade
em condições mais dignas. Seus problemas iam desde os obstáculos
para passar seus bens para os descendentes até o preconceito
sofrido em virtude de seu sexo e sua “cor”. Em 1890, uma lei proibiu
as mães solteiras de criar seus filhos. (DIAS, 2012, p. 379)

Homens e mulher es negras foram lançados a própria sorte, já que, após a


abolição, nenhuma medida protetória que garantisse o mínimo de direito básico e
adaptação ao novo modelo de vida foi desenvolvida. No que se refere às condições
sociais pós abolição, às mulheres negras estavam completamente sujeitas a trilhar
um caminho de resistência em relação ao modelo de sociedade que havia sido
criado. A mulher sai do período de escravidão tendo sua imagem, seu gênero e a
cor de sua pela atrelados a algo negativo; seu corpo, passível de violação, sua cor
sinalizava que ela era inferior aos brancos e seu gênero trazia consigo a ideia de
serventia. De acordo com Maria Aparecida Papali (2003, p. 155), as mulheres que
não tinham recursos, as solteiras e as pobres foram as que mais sentiram o peso
das mudanças, pois eram vítimas do estigma social que pairava sobre a sociedade.
Inclusive, tratando exclusivamente de mulheres, as condições de vida e
sobrevivência respingava em seus direitos; o ser preta, pobre e solteira era motivo o
suficiente para que o acesso aos direitos da maternidade fosse dificultado, por
exemplo.

Mães “solteiras pobres”, libertas ou sem recursos mesclavam-se num


enunciado que parecia conter todas as informações necessárias,
dispensando maiores argumentações, ou seja, tais mães não
estariam nos “casos de serem tutoras, não teriam recursos para criar
e educar seus filhos”. (PAPALI, 2003:155)

Gênero, classe e cor eram fatores utilizados para classificar a condição de


vida, o acesso, o poder, o ser livre, o ter e a vivência plena, com direitos básicos. A
invisibilidade social da mulher negra, pós abolição, perdurou pelo logo dos anos e o
estigma foi perpetuado devido ao preconceito gerado em torno do ser mulher, preta
e pobre; a mulher negra traz consigo a ideia de uma luta constante por notoriedade,
na tentativa de (sobre)viver em uma sociedade enraizada no ideal de poder ao
branco e subordinação ao homem. “As insígnias de ex-escravos os acompanhariam
estreitando seus caminhos e até mesmo colocando obstáculos materiais e
simbólicos, na tentativa de dificultar ou impedir a construção e consolidação da
liberdade” (D’Arc de Oliveira, 2015. p.64).

No período pós abolição, a classe social, de gênero e raça continuaram sendo


fatores decisivos para que os sujeitos que compunham a sociedade fossem
classificados. Nessa relação e classificação, a história da mulher negra aponta uma
desvalorização. “a historiografia oitocentista negligenciou o papel desempenhado
pela mulher de modo geral e pela escrava em particular, reproduzindo a ideologia
dominante eivada de mitos e preconceitos que só a discriminam.” (MONTEIRO,
1989, p. 93). Desde a chega dos navios negreiros no Brasil, até o fim do regime
escravocrata, a vida de mulheres negras sinalizam luta constante. Vivendo a
margem da sociedade, sendo vítimas do apagamento e esquecimento, tendo sua
vivência tratada como invisível, a negra africana encontrava-se em um local de
completa negligência e abandono, vivendo sem grandes escolhas ou oportunidades.
De acordo com Maria da Penha Silva (2010, p.), a condição de vida de um indivíduo
da sociedade era determinada a partir de uma estrutura social. Havia uma relação
entre gênero durante e após a escravidão. Esse período foi regido pelas mais
diversas formas de violência, no que se refere a mulher preta no período Colonial, é
notável a presença

da violência simbólica10, quando é considerado a dominação masculina sobre a


feminina. No decorrer na história, o poder estava sempre atrelado aos homens.

Inseridos nesse contexto estão às mulheres negras escravas,


que sem dúvida estavam colocadas em um nível social
inferior, tanto por ser mulher, como por ser negra e, também
escrava. Ser mulher, e ser escrava dentro de uma sociedade
extremamente preconceituosa, opressora e sexista, é reunir

10
“A violência simbólica é uma violência que se exerce com a cumplicidade tácita daqueles que a
sofrem e também, frequentemente, daqueles que a exercem na medida em que uns e outros são
inconscientes de a exercer ou a sofrer” (Bourdieu, 1996, p. 16).
todos os elementos favoráveis a exploração, tanto econômica
quanto sexual, e também ser o alvo de humilhações da
sociedade nos seus diferentes seguimentos. (Bordieu, 2012,
p. 7-8).

No tange a questão de gênero 11, de acordo com Guimarães (2016), após o


processo de abolição, houve a tentativa de reflexão em torno da sociedade como um
todo, porém, no fim, resultou na criação de justificativas para a desigualdade social e
de gênero entre dominantes e dominados “os primeiros reivindicando para si a
igualdade cidadã e os direitos políticos, enquanto aos segundos ficavam reservadas
as posições subalternas.” (Guimarães, 2016, p. 51). Esse tipo de desigualdade
gerou às mulheres ex-escravizadas barreiras para que fosse superado a pobreza, o
machismo e o preconceito racial. Diante de uma sociedade completamente
dominada pelo homem, branco e poderoso -no que se refere a capital e posse-, a
preocupação era a seguinte: “qual é o espaça da mulher negra?”. A expressão
classe perigosa é utilizada por Sidney Chalhoub (1996) para qualificar a situação
das negras pobres e “livres” . A cor da pele, durante todo o período de escravidão e
no pós-abolição traz consigo um determinante de apagamento ou valorização. A
invisibilidade da mulher negra nos confirma a ideia de apagamento e invalidação.

(Papali, 2003) Não havia outro caminho a ser trilhado pela mulher negra no
período de escravidão e no pós-abolicionista a não ser o caminho de resistência.
Após livres, as mulheres negras continuaram sendo discriminadas e vivendo sub a
ótica do preconceito e da desigualdade de gênero e raça. O sistema não foi feito
para assegurar e viabilizar o cumprimento de seus direitos; o mínimo de
sobrevivência era negado. Entretanto, para garantir seu sustento e, pelo menos,
tentar dignificar a si e aos seus filhos, a mulher negra encontra meios de trabalho,
ainda que, na visão da sociedade, classificados como subempregos. Os efeitos da
escravidão se perpetuaram durante toda a construção do Brasil, a partir do Brasil
colonial. As mulheres continuaram a ser sujeitadas à uma sociedade machista e
preconceituosa, contudo, encontraram um meio de se opor a situação na qual eram

11
[...] faz-se referência às atividades culturalmente atribuídas às mulheres – como cuidar da casa e
dos filhos – e aos homens – como sustentar financeiramente a família.
submetidas socialmente. A luta por seus direitos e pela justiça, pelo avanço no que
se refere a questões econômicas, sociais e morais seguiram firmemente.

2. A INTERCECIONALIDADE ENTRE GÊNERO E RAÇA NA CONSTRUÇÃO


DA IDENTIDADE DA MULHER NEGRA

Aqui eu vou falar sobre aspectos raciais e de gênero que fazem com que o
acesso aos direitos básicos seja dificultado e falarei também sobre questões
profissionais e econômicas.
3. Vou escrever sobre as lutas de enfrentamento ao racismo e sexismo e
vou falar sobre como a Psicologia Social pode operar e contribuir contra
o racismo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS

BOURDIE, Pierre. A dominação Masculina. 11° ed. Tradução Maria Helena Kuhner.
Rio de janeiro: Bertrand Brasil, 2012.

GUIMARÃES, A. S. Classes, raças e democracia. São Paulo: Fundação de Apoio à


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GUIMARÃES, Antonio Sérgio Alfredo. Identidades Negras no Brasil: Ideologias e


Retóricas. In: SALLUM JÚNIO, Brasilio(Org.). Identidades. Editora da Universidade
de São Paulo, 2016.

OLIVEIRA, Joana D’Arc de. Da senzala pra onde? Negros e negras no pós-abolição
em São Carlos, SP, (1880-1910). Tese (doutorado) – Instituto de Arquitetura e
Urbanismo, USP São Carlos, 2015.

PAPALI, Maria Aparecida. Escravos, Libertos e Órfãos: a construção da liberdade


em Taubaté (1871-1895). São Paulo: Annablume, 2003.

PRIORE, Mary Del. A mulher na história do Brasil. São Paulo: Contexto, 1994.
SILVA, Maria da Penha. Mulheres negras: Sua participação histórica na sociedade
escravista. Cadernos Imbondeiro. João Pessoa, v.1, n.1, 2010.

MUNANGA, K. Mestiçagem e experiências interculturais no Brasil. In: SCHAWARCZ,


Lilia Moritz, REIS, Letícia de Souza (Orgs.) Negras Imagens. São Paulo: Ed. USP:
Estação Ciência, 1996 a.

Teorias sobre o racismo. HASENBALG, Carlos A.; MUNANGA, Kabengele;


CHWARCZ, Lília Moritz. O anti-racismo no Brasil. In: Estratégias e Políticas de
Combate a Discriminação Racial. São Paulo: Ed. USP: Estação Ciência, 1996c.

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