realidade

Edição 449 • março 2023

virtual2
Testamos 20 jogos do PS VR ,
o headset da Sony. Veja também
o que a Apple pode trazer. p. 32

s
ta
is
ev
R
il
as
Br

Ele já foi usado

para gestar
carneiros – e pode,
um dia, salvar
bebês prematuros.
O aparelho
também abre
portas para
a criação de
embriões “do zero”,
a partir de células-
-tronco. Entenda
essas tecnologias
– e o seu lado
controverso. p. 20
POR BRUNO GARATTONI E TIAGO CORDEIRO

r$ 25,00

p. 40 p. 48 p. 54 p. 08
o fungo que Como funCionA A mulher dA o perigo
inspirou THE A doençA dA vidA reAl por dos vírus de
LAST OF US. vACA louCA. trás dA BArBie. lABorAtório.
Br
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is
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s
CARTA AO LEITOR
O mistério do James
Webb: galáxias adultas
num universo bebê
Uma equipe escava um sítio ar-
queológico da Mesopotâmia. Em
meio a vasos de argila e tabletes de
escrita cuneiforme, aparece um
iPhone. Um iPhone de 5 mil anos.
Um time internacional de astrô-
nomos descobriu algo parecido, e
publicou na Nature em fevereiro.
Ao analisar imagens coletadas pelo
telescópio espacial James Webb,
identificaram seis galáxias massi-
vas – que podem abrigar mais de
10 bilhões de estrelas – a uma dis-
tância entre 13,1 e 13,3 bilhões de
anos-luz. Uma dessas galáxias, di-
zem os cientistas, provavelmente
tem 100 bilhões de estrelas (quan-
tidade comparável à da Via Láctea).
É preciso depurar melhor os dados
para ter certeza de que essas galá-
xias são mesmo tão grandes. Mas,
caso sejam de fato, a descoberta
equivale mesmo a encontrar um
iPhone de 5 mil anos.
É que telescópios são máquinas
do tempo. Quanto mais longe eles
enxergam no espaço, mais profun-
damente mergulham no passado.
Quando o James Webb foca num
pedaço do céu e observa as coisas
mais distantes que existem ali, ele
não está vendo um retrato de como
essas coisas são hoje, mas de como
elas eram há muito tempo. Simples-
mente porque a luz que esses objetos
emitem leva bilhões de anos para
chegar até aqui. Uma galáxia a 13,3
bilhões de anos-luz da Terra surge
na lente do telescópio com a forma
que ela tinha há 13,3 bilhões de anos.
Só tem um problema aí. O Big
Bang aconteceu há apenas 13,8 bi-
lhões de anos. Essa é a idade do uni-
verso. E a teoria mais moderna sobre
a evolução cósmica (conhecida pelo
pouco amigável nome de “Lâmbda
- Matéria Escura Fria”) diz que não:
não existiam galáxias de grande por-
te nas primeiras centenas de milhões
de anos após o Big Bang.
editorial
O universo seria simplesmente jo-
vem demais para isso. Não teria havi-
do tempo para a formação de tantas
estrelas, nem para o agrupamento de-
las em estruturas portentosas. E de
fato: quando astrônomos observam
os confins do universo, só detectam
galáxias bebês, pequenas em compa-
ração com as adultas, como a nossa
– que levou 13,8 bilhões de anos para
ficar deste tamanho.
Só que aí vieram as imagens do
James Webb. E elas mostram que,
s
provavelmente, já havia galáxias
ta
adultas quando o próprio universo
ainda usava fraldas. Como elas te-
is
riam aparecido? Ninguém sabe. Ao
ev
que tudo indica, precisamos de teo-
rias mais afinadas.
R
E tudo certo. Conforme novas ob-
servações trazem novos fatos, apri-
il
mora-se a parte teórica. E o
as
progresso segue. Do dia em que Gali-
leu construiu seu primeiro telescó-
Br
pio, em 1609, até a chegada do James
Webb, com seu espelho de 6,5 metros
de diâmetro, instalado a 1,5 milhão
de quilômetros da Terra, o que tive-
mos foi um aperfeiçoamento contí-
nuo dos modelos cosmológicos. Que
venham mais surpresas, então. São
elas que movem a ciência. São elas
que dão graça para a vida.
Alexandre Versignassi
Di r etor De r eDação
AlexAndre.VersignAssi@Abril.com.br
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Br
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CARDÁPIO março de 2023

20 Capa
O ÚTERO ARTIFICIAL
Testado com sucesso em animais, esse
aparelho pode, um dia, ajudar na gestação
de bebês prematuros. E também
abre portas para o desenvolvimento de
embriões feitos com células-tronco. Saiba
como funcionam essas tecnologias –
e entenda o lado controverso delas.

32 Realidade virtual. Agora vai?

Testamos 20 jogos do PS VR2, o headset para
Playstation 5. Veja também o que a Apple
pode trazer de novo para o universo da RV.

40 Muito além dos cogumelos

The Last of Us pôs os fungos em evidência.
Entenda como eles vivem – e por que ainda
são pouco explorados pela ciência.

s
48 A ameaça fantasma
ta Eles não são vírus nem bactérias – sequer
têm material genético. Conheça os príons,
is
que estão por trás da doença da vaca louca.
ev

54 Bonequinha de luxo
R

A vida de Ruth Handler, a empresária

o caos ordenado
dos fungos p.40
que, há 64 anos, inspirou-se num
il

brinquedo erótico para criar a Barbie.

as
Br

12 contatos imediatos 65 manual

Os cientistas que estudam Como fazer os alimentos
ESSENCIAL protocolos para o caso de
aliens enviarem um sinal.
número
incrível ORÁCULO durarem mais?

6 uma imagem... 60 maneire no rodízio

Fazenda agrivoltaica, na Se eu comer sem parar, o
China. Os painéis solares estômago pode explodir?
geram energia – e ajudam
a lavoura a produzir mais.

16 seu passado te condena

Conheça o live action base-
ado em Super Mario Bros.,
que estreou há 30 anos – e
8 ... uma opinião foi uma bomba.
A próxima pande- 61 pá pum
mia poderá vir de 18 para pedir de natal 58 63 só acredito vendo
64
um laboratório. Kits para brincar de edição
de DNA vêm com sementes, mi- 64
pensando bem...
lost in translation
bactérias e células humanas.
lhões
SUPERNOVAS 12 enquanto isso... De barbies

10 a árvore transgênica 14 3 notícias sobre

são venDiDas
por ano. isso
Dá mais De
ÚLTIMA PÁGINA
Empresa dos EUA usa gene de 16 pérolas do streaming 100 bonecas 62 roupa íntima 66 partiu fisioterapia
alga para criar espécie mais por minuto. Quando inventaram Os esportes olímpicos que
eficiente em absorver CO2. 19 você decide p.54 os sutiãs? mais provocam lesões.

Capa | ilustração Felipe Del Rio

ESSENCIAL uma imagem...

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Foto vCg / getty images

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março 2023 super 7

 ESSENCIAL ...uma opinião

na página anterior: Homem dirige trator em Liaocheng, no nordeste da China. Ele

está em uma "fazenda agrivoltaica", que combina placas solares (para a produção de
eletricidade) e lavouras posicionadas entre eles. Os projetos desse tipo vêm ganhando
força – porque a sombra parcial formada pelos painéis é boa para determinados vege-
tais, como tomates e pimentas. Um estudo da Universidade do Arizona estimou que a
produtividade pode ser 200% a 300% maior do que em plantações comuns.

A próxima Ainda não dá para

pandemia
cravar que o Sars-

s
CoV-2 saiu de um.
ta Mas experiências
perigosas, que
is
alteram vírus

poderá
ev

para torná-los
mais agressivos,
R

continuam sendo
feitas. E o motivo
il

vir de um
esconde uma
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verdade sinistra.
Br

laboratório
POR Bruno garattoni

n
Nos últimos dias de fevereiro, o Wall Street Journal fez uma revela-
ção impactante: o US Department of Energy produziu um relatório
confidencial, entregue à Casa Branca e a alguns congressistas, no qual
afirma que a origem mais provável do Sars-CoV-2 é um vazamento
de laboratório, no Instituto de Virologia de Wuhan (WIV). E não,
como sempre afirmou a versão “oficial", animais selvagens vendidos
num mercado dessa cidade. O DoE tem sob sua tutela os principais
laboratórios americanos, como o Lawrence Livermore e o Los Alamos
(que inventaram a bomba atômica), então a notícia fez barulho. Logo
em seguida, o FBI se manifestou, afirmando que o laboratório de
Wuhan é a origem “mais provável" do coronavírus. A hipótese de
que ele tenha surgido no WIV não é nova: ganhou força em 2021,

8 super março 2023

com a revelação de coisas que podem
incriminar o instituto. Explicamos to-
das na reportagem “A origem do vírus",
que você pode ler no site da Super, mas
resumindo: o WIV fazia pesquisas pe-
rigosas, inseriu a proteína spike (a mes-
ma do Sars-CoV-2) num coronavírus
de morcego para que ele se tornasse
capaz de infectar células humanas (1),
e seus cientistas não seguiam normas
internacionais – mexiam com corona-
vírus em laboratórios BSL-2 (nível de
biossegurança 2), o que é inadequado:
somente os BSL-4, que possuem me-
didas extremas de segurança, podem
ser usados para estudar vírus que são
letais e se espalham pelo ar.
Talvez você já saiba disso. O que
você não sabe é que, paralelamente à
polêmica envolvendo o WIV, cientistas
de todo o mundo continuam realizando
experiências arriscadas. Em outubro de
2022, pesquisadores da Universidade
de Boston criaram uma nova variante
do Sars-CoV-2, misturando pedaços
da Ômicron e da variante original, de
Wuhan. Sabe qual foi o resultado? “Em
ratos [da linhagem] K18-hACE2, nos
quais a Ômicron causa infecção leve,
não fatal, a Ômicron com proteína S
Br
provoca doença severa, com taxa de
mortalidade de 80%", afirma o estudo (2).
Oitenta. Por. Cento. A notícia cau-
sou escândalo, e os cientistas saíram
dizendo que a imprensa estava exage-
rando, que em humanos a mortalidade
não necessariamente seria 80%, que a
experiência foi feita num laboratório
seguro etc. Mas as explicações não con-
venceram. E não se trata de um caso
isolado. Em agosto de 2021, pesquisa-
dores italianos colheram anticorpos
de uma pessoa curada da Covid, e pu-
seram em contato com o Sars-CoV-2.
Repetiram isso várias e várias vezes.
“O plasma [sanguíneo] neutralizou to-
talmente o vírus por sete passagens,
mas, após 45 dias [...] houve escape
parcial", relata o estudo(3). Os cientis-
tas continuaram até que, no dia 80,
surgiu “uma variante completamente
resistente". Haviam criado um Sars-
CoV-2 invulnerável aos anticorpos de
quem já teve Covid – ou tomou a vacina.
Pesquisas assim são rotina nos labo-
ratórios. Sabe o Lawrence Livermore,
Fontes (1) A SARS-like cluster of circulating bat coronaviruses shows potential for human emergence. S Zhengli, R Baric e outros, 2015; (2) Role of spike in the pathogenic and
antigenic behavior of SARS-CoV-2 BA.1 Omicron. M Saeed e outros, 2022. (3) SARS-CoV-2 escape from a highly neutralizing COVID-19 convalescent plasma. E Andreano e outros,
2021. (4) The Role of Viral Population Diversity in Adaptation of Bovine Coronavirus to New Host Environments. M Borucki e outros, 2013. (5) Proposed Biosecurity Oversight
Framework for the Future of Science. NSABB, 2023. (6) Charter - National Science Advisory Board for Biosecurity. Disponível em bit.ly/3msPaqk
Os EUA classificam as pesquisas
com vírus como de “uso dual":
uma tecnologia que pode ter
aplicação civil ou militar.
citado no começo deste texto? Em 2013,
seus cientistas alteraram o BCoV, um
coronavírus bovino, para torná-lo
capaz de infectar células humanas(4).
E a coisa não fica só nos coronavírus.
Em outubro de 2022, quando a varío-
la dos macacos assustava o mundo, o
NIAID (Instituto Nacional de Alergia e
Doenças Infecciosas), do governo ame-
s
ricano, anunciou que iria criar uma nova
variante do MPXV, o vírus que causa
essa doença, fundindo uma cepa mais
ta
is
agressiva, de 2003, com a que se espa-
ev
lhava pelo planeta naquele momento.
Se qualquer um desses vírus escapas-
R
se, poderia começar uma nova pande-
mia. E os vazamentos são mais comuns
il
do que se imagina. A ONG americana
as
ProPublica teve acesso aos registros da
Universidade da Carolina do Norte (que
colaborava com o Instituto de Wuhan
antes da pandemia), e descobriu que, en-
tre 2015 e 2020, os laboratórios da insti-
tuição americana tiveram 28 incidentes
de segurança. Num deles, em fevereiro
de 2016, um rato infectado com um co-
ronavírus experimental mordeu uma
cientista. O vírus se mostrou inofensi-
vo; a pesquisadora não adoeceu. Ainda
bem, pois ela não ficou em quarentena: a
única medida de segurança foi pedir que
usasse máscara cirúrgica (não era nem
uma N95) no trabalho durante 10 dias.
Esse tipo de pesquisa, na qual um
vírus é modificado para adquirir novas
capacidades, se chama “ganho de função".
Em 2014, no governo Obama, os EUA
baniram os estudos do tipo, por con-
siderá-los perigosos – mas eles foram
liberados em 2017, na gestão Trump. Em
janeiro deste ano, o National Science Ad-
visory Board for Biosecurity (NSABB),
um grupo de cientistas que aconselha a
Casa Branca, propôs regras mais duras
para as pesquisas com vírus (5), que pas-
sariam a ser fiscalizadas pelo ministério
da saúde dos EUA. O governo Biden
ainda não recebeu a versão final do do-
cumento, mas já afirmou que os estudos
de ganho de função vão continuar. Em
fevereiro, 20 pesquisadores americanos
criaram o projeto Protect Our Future,
para convencer as autoridades a mudar
de ideia. Cinco deles (incluindo o líder,
o biólogo Richard Ebright) eram parte
do grupo que conseguiu parar as expe-
riências de ganho de função em 2014.
Segundo eles, é preciso banir os “es-
tudos irresponsáveis com patógenos",
que não trazem nenhum benefício real.
Você deve estar se perguntando: de
fato, qual a utilidade de criar vírus mais
perigosos? Afinal, se um novo surgir
naturalmente, com certeza ele vai ser
diferente dos inventados em laborató-
rio. Então por que cientistas continuam
fazendo pesquisas do tipo? A resposta
está no estatuto (6) do próprio NSABB.
Nele é dito que o grupo orienta o go-
verno dos EUA sobre “pesquisas de uso
dual". Sabe o que é uso dual? É algo que
tem aplicação civil e militar.
Sim, militar. As pesquisas perigosas
continuam porque, embora os EUA e
mais 184 países tenham assinado um
tratado banindo as armas biológicas, em
1972, o trabalho de laboratório nunca pa-
rou. A diferença é que hoje, oficialmente,
ele é defensivo – o objetivo é prever quais
vírus outros países poderão inventar,
e desenvolver curas. Mas por que isso
seria necessário, se as armas biológicas
foram banidas? Prevenção contra even-
tuais ataques bioterroristas, talvez. Ou
o temor de que, secretamente, algumas
nações continuem tocando projetos do
tipo ofensivo, violando o tratado. Isso
porque, se comparado aos acordos que
proíbem ou regulam armas químicas e
nucleares, o das armas biológicas tem
uma diferença crucial: ele não prevê
nenhum tipo de fiscalização. S
março 2023 super 9
 supernovas
ILUSTRAÇÕES Felipe del rio & tiago araujo
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Br
EUA plantam árvores transgênicas
As árvores, criadas pela empresa americana
Living Carbon, são álamos (uma espécie alta,
de até 30 metros, típica da Europa) que recebe-
ram um gene da alga C. reinhardtii – e, graças
a isso, supostamente têm maior capacidade de
fazer fotossíntese (1). O truque está numa enzi-
ma chamada RuBisCo (ribulose-1,5-bisfosfato
carboxilase oxigenase), que as plantas usam para
capturar o CO2 do ar, produzir glicose e liberar
oxigênio. Normalmente, a RuBisCo erra bastan-
te: em 20% das vezes, ela pega uma molécula
10 super março 2023
DESIGN natalia sayuri lara
s
ta
de oxigênio do ar, e não de CO2. Quando isso
acontece, a planta executa um processo chamado
fotorrespiração, que é bem menos eficiente. As
árvores da Living Carbon, que foram plantadas
no estado americano da Geórgia, não têm esse
problema – e, por isso, crescem 50% mais rápido.
Elas causaram preocupação entre ambientalis-
tas, que temem a propagação descontrolada da
planta transgênica. A empresa diz que suas ár-
vores são fêmeas e não produzem pólen, e por
isso se reproduzem pouco. (Bruno Garattoni)
A
sn. EDIÇÃO Bruno garattoni

19
anos é a idade de
um chinês diagnosti-
cado com Alzheimer
– a pessoa mais
jovem, até hoje, a ter
a doença 2. Ele co-
meçou a apresentar
lapsos de memória
aos 17 anos. Exames
revelaram atrofia
do hipocampo,
região cerebral
ligada à formação
das memórias, e
placas de proteína
beta-amiloide.

s
Essas placas estão
relacionadas ao
ta
Alzheimer, mas não
is
são necessariamente
ev

sua causa (já existem

remédios que as
R

eliminam, mas isso B

não cura ou desace-
il

lera a doença). (BG)

as

gordura aFeta o Controle de Calorias no Cérebro

Br

Estudo em ratos mostra que alimentação ruim desregula o mecanismo do apetite.

Cobras são
capazes de Comer bem não é só uma questão de au-
tocontrole. A ingestão crônica de junk food
dia de má alimentação, os astrócitos (um
tipo de célula cerebral) do complexo dorsal
ouvir sons pode causar alterações anatômicas no cé-
rebro – e afetar um mecanismo que dosa
vagal, uma conexão direta entre o cére-
bro e o intestino, vão ficando mais fracos
Elas não têm a sensação de fome, fazendo com que o (4). Nos ratos que passaram duas semanas
ouvidos, e por isso indivíduo perca a capacidade de parar de comendo muita gordura, eles já estavam
teoricamente não comer. Pelo menos em ratos. Cientistas da bem comprometidos, a ponto de o animal
escutam – só sentem Pennsylvania State University colocaram perder o controle da própria alimentação.
as vibrações do grupos de ratos numa dieta rica em calorias Então os cientistas pegaram outros ratos e
chão. Mas cientistas e gordura durante 1, 3, 5 ou 14 dias (também “desligaram" os astrócitos daquela mesma
da Universidade houve um grupo de controle, que recebeu região cerebral – para reproduzir o efeito
de Queensland, na alimentação normal). Em seguida, todos da gordura. Deu a mesma coisa: quanto
Austrália, mostraram foram sacrificados e submetidos a autópsia, mais fracos os astrócitos, mais dificuldade
que as cobras que revelou o seguinte. A partir do terceiro o animal tinha em parar de comer. (BG)
também detectam
sons "aéreos", que
não alcançam o chão
3. A resposta variou
conforme a espécie: “Tem 50 ou 60 pessoas que voavam comigo, e viram",
pítons se moveram
em direção ao som, afirmou Em um artigo 5 o americano Ryan Graves, que é ex-piloto de caças da Marinha dos EUA – e diz
enquanto taipans e que avistou objetos voadores não-identificados (OVNIs) diversas vezes entre 2014 e 2015, em missões com
víboras-da-morte se um F/A-18. Segundo ele, muitos pilotos presenciaram eventos do tipo, mas ainda temem falar abertamente
afastaram dele. (BG) a respeito, e o Congresso americano deveria investigar o assunto. (BG)
Ilustrações A Felipe Del Rio. B Tiago Araujo. Fonte (1) Enhanced photosynthetic efficiency for increased carbon assimilation and woody biomass production in hybrid poplar INRA 717-1B4.
Y Tao e outros, 2022. Plantio em área florestal realizado em fevereiro de 2023.(2) A 19-Year-Old Adolescent with Probable Alzheimer’s Disease. L Jia e outros, 2023. (3) Sound garden: How
snakes respond to airborne and groundborne sounds. C Zdenek e outros, 2023. (4) Brainstem astrocytes control homeostatic regulation of caloric intake. KN Browning e outros, 2023.
(5) As a US Navy fighter pilot, I witnessed unidentified anomalous phenomena (UAP). Congress must reveal the truth to the American people. R Graves. The Hill, 2023. março 2023 supEr 11
 sn.
J-Hope, do grupo de kpop
BTS, se tornou o novo
embaixador global da
marca Louis Vuitton.
ENQUANTO
ISSO...
Texto Luisa Costa
Ilustração Natalia Sayuri
Cientistas testaram um
gel injetável que conduz
eletricidade – e pode
revolucionar os implantes
médicos A.
Um alemão de 53 anos foi a
terceira pessoa a ficar livre do
HIV, após um transplante de
células-tronco B.
Arqueólogos brasileiros encon-
traram no Paraná as primeiras
pinturas rupestres com
representações de araucárias C.
Cientistas detectaram as
primeiras evidências do uso de
arco e flecha fora da África, em
uma caverna francesa habitada
há 54 mil anos D.
Fontes A Universidade Stanford.
B Universidade de Dusseldorf. C Grupo
Universitário de Pesquisas Espeleológicas
(Gupe). D Universidade de Aix-Marseille.
12 super março 2023
Cientistas estudam regras para Contato Com aliens
s
ta
Se eles existirem, e nos enviarem um sinal, como o mundo deveria reagir?
is
A eventual descoberta de vida
ev
alienígena, por meio de sinais recebidos
de algum ponto do Cosmos, teria conse-
R
quências profundas. Mas como informá-la
à população sem causar pânico ou alimen-
il
tar conspirações? Cientistas da Universida-
as
de de St. Andrews, na Escócia, dizem que
devemos pensar nisso – para que, se um dia
Br
acontecer, o mundo esteja preparado. Eles
criaram o SETI Post Detection Hub, um
grupo internacional inspirado no projeto
SETI [Search for Extraterrestrial Intelligence],
para definir normas em caso de contato.
A Super conversou com John Elliott, seu
diretor, para entender.
Em 2010, o SETI estabeleceu um pro-
tocolo afirmando que uma “detecção
confirmada" de vida extraterrestre
deve ser integralmente divulgada ao
público. Na sua visão, esse é sempre o
melhor caminho?
Sim. A comunidade do SETI sempre acredi-
tou que a transparência é a melhor política.
Dados não-decifrados devem ser libe-
rados? E se os cientistas conseguirem
decodificar os dados, e eles contiverem
algum tipo de ameaça à humanidade?
A decifração é um desafio multifaceta-
do, que terá de ser enfrentado por espe-
cialistas. Principalmente aqueles que se
prepararam para isso, e desenvolveram as
ferramentas e a mentalidade necessárias.
Então, nós vamos divulgar regularmente
nossas descobertas (o que sabemos e o
que não sabemos, em cada momento), mas
eu acho que a decifração tem de ser feita
assim, para evitar interpretações errôneas.
Sempre há conspirações e fake news
sobre eventos importantes. Certa-
mente aconteceria com a descoberta
de vida extraterrestre. Existe algum
jeito de evitar ou reduzir isso?
Um método de atenuar isso é organizar uma
rede de canais confiáveis para a transmissão
de informações, para que os anúncios sejam
feitos por esses portais de mídia.
E se os países não concordarem em
como lidar com a descoberta? Em tese,
a ONU poderia decidir – mas, no pas-
sado, diversos países ignoraram suas
resoluções. O que poderia ser feito para
garantir o cumprimento delas?
A ciência e a análise, como no SETI Post
Detection Hub, serão uma colaboração
internacional, independente de qualquer
governo. Então o nosso trabalho precisa
ser separado de quaisquer questões políti-
cas, como a de decidir se a humanidade irá
responder [a um sinal alienígena]. Garantir
o cumprimento [de acordos] é problemáti-
co, e frequentemente impossível. Talvez a
humanidade vá finalmente se unir, como
uma só voz, quando houver um contato.
(Bruno Garattoni)
 284 milhões de pessoas usam drogas, diz ONU
Número cresceu quase 30% na última década; consumo de opioides dobrou, revela estudo.

usuários De Drogas no munDo Divisão De usuários por sexo

350
85% 15% 73% 27% 70% 30%
300 Homens

250 Mulheres
milHões

200 Opioides em geral Cocaína Cannabis

(inclui medicamentos,
150 heroína e ópio)

100 62% 38% 55% 45% 53% 47% 51% 49%

50

0
Ecstasy e Anfetaminas Opioides farma- Abuso de
2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018

2019

2020*

similares cêuticos (abuso sedativos

de medicamentos)

s
Divisão por Droga**

opioides (uso
ta
principal causa De internações e tratamentos, por país
is
recreativo)
ev

61 milhões

cocaína
R

21 milhões
cannabis
il

Opioides
209 milhões
as

Cannabis
ecstasy Anfetaminas
e similares Cocaína
Br

20 milhões Solventes
anfetaminas e inalantes
34 milhões Outras
Sem dados

% Da população que utiliza caDa substância

anfetamina e ecstasy e
cannabis opioides cocaína metanfetamina similares
África 6,5% 1,2% 0,2% 0,38% 0,26%
América do Norte 16,6% 3,3% 1,95% 3,87% 0,9%
América do Sul 3,6% 0,2% 1,6% 0,8% 0,24%
Ásia 2% 1,1% 0,07% 0,4% 0,33%
Europa 5,4% 0,6% 0,96% 0,5% 0,67%
Oceania 12% 2,4% 2,7% 1,2% 2,17%

Fonte World Drug Report 2022. UNODC (United Nations *Último dado disponível **A soma dá 345 milhões, 21% a mais do que o número total de usuários de drogas
Office on Drugs and Crime). (284 milhões), porque parte das pessoas utiliza mais de uma substância.

Hertz são as frequências do Emergency Alert System, criado em 1997

853 e 960
pelo governo dos EUA para alertar a população – esses sons, dois apitos
razoavelmente agudos, devem ser tocados em rádios e TVs em situações
de emergência, como catástrofes naturais. Eles só podem ser utilizados
nessas situações. Porém, o canal americano Fox Sports admitiu ter tocado
os dois apitos em chamadas do programa "Fox NFL Sunday", que foram
exibidas em 190 retransmissoras espalhadas pelo país. A Fox foi advertida
pelo governo, e multada em US$ 500 mil. (BG)

Ilustração Tiago Araujo. Fonte (3) Satellite Formation Flying for Space Advertising: From Technically Feasible to Economically Viable. D Pritykin e outros, 2022.
março 2023 super 13
 sn.

Mulher
3 notícias sobre
é presa
IA enrolada na Justiça por
A inteligência artificial se espalha por todas as áreas – e arranja problemas. espalhar
doença
nos EUA
A Justiça de Taco-
ma, a 50 km de
Seattle, mandou
prender uma
moradora – que
tem tuberculose
há mais de um
ano e recusa

s
tratamento. Ela
ta foi diagnosticada
e chegou a tomar
is
remédios, mas pa-
ev

rou. Inicialmente,
as autoridades
R

ordenaram o isola-
mento residencial
il

da cidadã. Ela

1. 2. 3.
as

não obedeceu, se
envolveu num aci-
Br

mídia dos eua acusa
chatgpt de pirataria
O Wall Street Journal e a emisso-
ra CNN afirmaram que a OpenAI
usou textos de seus sites e de
outros 18 veículos para treinar
o ChatGPT – a informação teria
sido revelada pelo próprio robô,
em resposta a uma pergunta.
Agora, as empresas jornalísticas
querem ser remuneradas por
isso. O algoritmo foi alimentado
com mais de 45 terabytes de
textos, colhidos na internet sem
autorização dos autores. (BG)
artistas processam cria-
dora do stable Diffusion
A Stability AI, que criou o robô
desenhista Stable Diffusion,
é alvo de dois processos na
Justiça dos EUA: um movido por
artistas e outro pela agência
multinacional Getty Images. Em
ambos os casos, a acusação é a
mesma: o algoritmo foi treinado
usando fotos e ilustrações que
não pertencem à Stability AI.
Os criadores da IA de desenho
Midjourney também estão sendo
processados. (BG)
dente de trânsito e
apple teria usado voz foi a um hospital –
de atores em robô onde se constatou
O sindicato dos atores dos EUA que a tuberculose
diz que a empresa utilizou as
continuava ativa.
vozes de vários profissionais,
que haviam sido contratados A doença, provo-
para gravar audiobooks, para cada pela bactéria
alimentar uma IA de síntese M. tuberculosis, é
vocal – e aí, quando o robô ficou transmitida pelo
pronto, passou a fazer seus
ar. Ela é tratável
audiobooks com ele. Segundo
o sindicato, a Apple admitiu o com antibióticos,
fato e disse que não vai mais mas ainda causa
usar gravações humanas para 1,6 milhão de
treinar robôs. (BG) mortes por ano no
mundo 6. (BG)

Implante chip células

da retina O implante
pretende possui microLEDs
que estimulam
recuperar filme de
neurônios
diretamente a retina.
Ele recebe imagens de
microLED
cm

visão de cegos intermediários uma câmera externa –

:2
ho

e esse sinal, junto com

Dispositivo da empresa
an

nervo óptico a energia necessária

m

Science Eye já foi testado filme de para alimentar o chip,

ta

em coelhos. microLED é transmitido sem fios.

14 super março 2023

 NÃO É BEM
ASSIM...
Notícias que
bombaram por
aí – mas não
são verdade

a notícia

Núcleo da Terra
parou de girar,
diz estudo

s
o que ela Dizia
ta O núcleo do nosso
planeta, 5 mil km
is
abaixo da superfície,
ev

parou de rodar – e
pode começar a girar
na direção oposta,
R

afirmam cientistas
da Universidade
il

de Pequim.
remédio rejuvenesCe o sangue, mostra estudo
as

Tratamento promete evitar doenças – e utiliza droga que já está no mercado. a verDaDe
Br

Não parou, não. Nem

inverteu a direção.
As células do seu sangue, assim como EUA, descobriram que um anti-inflamató- O que aconteceu foi: o
todas as outras, são formadas a partir de rio, hoje usado para tratar artrite, consegue núcleo da Terra estava
células-tronco. Conforme você envelhece, reverter esse processo, e rejuvenescer o girando mais depressa
sangue de ratos (7). Isso acontece porque do que o manto (a
esse processo se torna menos eficiente, e o
segunda camada mais
organismo passa a produzir menos glóbu- as células-tronco se formam na medula externa do planeta,
los vermelhos (que transportam oxigênio) e óssea – e ela vai ficando inflamada ao longo antes da crosta),
linfócitos (células do sistema imunológico). da vida. Os cientistas pretendem testar o desacelerou um
Esse fenômeno se chama envelhecimento tratamento em humanos. “Uma pessoa de pouco, e agora gira na
mesma velocidade do
hematopoiético: ele prejudica os órgãos, 70 anos, com sangue de 40, poderia ter uma
manto. Ou seja, o que
reduz as defesas do organismo e está re- vida mais saudável e possivelmente mais parou foi a chamada
lacionado ao surgimento de câncer. Mas longa", afirmou a geneticista Emmanuelle "rotação diferencial",
cientistas da Universidade Columbia, nos Passegué, autora principal do estudo. (BG) não a rotação em si
9. Os pesquisadores
calculam a velocidade
de giro do núcleo da
Terra observando
buracos negros podem gerar energia escura terremotos que atra-
vessam o centro do
planeta e vão parar do
Esse tipo de energia, que teoricamente compõe 71% do Universo, pode estar se formando em outro lado – as ondas
buracos negros. É o que afirmam físicos de nove países, que estudaram 8 a evolução das "galáxias sísmicas passam pelo
elípticas gigantes". Essas galáxias deixaram de formar estrelas, e sobrou pouco material no centro núcleo do planeta,
delas para ser sugado pelos buracos negros – que, apesar disso, cresceram 7 a 20 vezes mais que o e são desviadas pela
rotação dele (que,
esperado. A explicação pode ser a energia escura, cuja existência foi proposta nos anos 1990 para
assim, pode ser
tentar explicar um enigma: o Universo está se expandindo mais rápido do que deveria (considerando deduzida). (BG)
a atração gravitacional entre tudo o que existe nele, a expansão deveria ser mais lenta). (BG)
Ilustrações Tiago Araujo. Fontes (6) Global Tuberculosis Report 2022. Organização Mundial da Saúde. (7) Stromal niche inflammation mediated by IL-1 signalling is
a targetable driver of haematopoietic ageing. E Passegué e outros, 2023. (8) A Preferential Growth Channel for Supermassive Black Holes in Elliptical Galaxies at z ≲ 2.
D Farrah e outros, 2023. Observational Evidence for Cosmological Coupling of Black Holes and its Implications for an Astrophysical Source of Dark Energy. D Farrah e
outros, 2023. (9) Multidecadal variation of the Earth’s inner-core rotation. Y Yang e X Song, 2023. março 2023 super 15
 sn. playlist
Pelo cano
O ACORDO
INICIAL
Nos anos 1990, não
faltavam propostas de
Hollywood para um filme
do Mario. Quem conseguiu
os direitos foi o britânico
Roland Joffé, dono da
pequena produtora
Lightmotive – e por só US$
2 milhões (US$ 4,5 mi, em
valores atuais). O acordo
dava à Nintendo parte do
controle criativo sobre o
filme (algo que grandes
estúdios não concediam),
além de direitos sobre o
merchandising do longa.
PÉROLAS DO
STREAMING
16 super março 2023
A animação Super Mario Bros. – O Filme estreia em 5 de abril. Mas ela
não é a primeira adaptação do game para o cinema. Conheça a versão live
action que estreou há 30 anos, em 1993 – e foi um fracasso.
Texto Rafael Battaglia • Design Luana Pillmann
QUE ROTEIRO
MARIO? FRANKENSTEIN
Danny DeVito recebeu O script foi refeito várias
convite para interpretar o vezes, mesmo durante
s
encanador – mas recusou. as gravações. A proposta
Dustin Hoffman demons-
trou interesse e Tom
ta
inicial, oferecida ao casal de
diretores Rocky Morton e
is
Hanks chegou bem perto Annabel Jankel, era de uma
de assinar um contrato, história mais madura e
ev
mas os produtores acha- sombria (eles se inspiraram
ram que ambos não se en- em filmes como Blade
R
caixavam no personagem. Runner e Batman). Mas a
O papel ficou com Bob produção ficou com medo
Hoskins (Uma Cilada para de que o filme não agradas-
il
Roger Rabbit). Anos mais se as crianças. Sem avisar os
as
tarde, ele descreveria a diretores, contratou novos
experiência como “o pior escritores para uma versão
Br
trabalho de sua vida”. mais light do roteiro.
filme
Tetris (2023)
Apple TV+
Conta, de forma romanceada,
a história real de Tetris, criado
em 1984 pelo cientista Alexey
Pajitnov, na URSS. O jogo só foi
lançado no bloco soviético, mas
acabou chamando a atenção do
ocidente – e se tornou o segundo
game mais popular de todos
os tempos, com 495 milhões
de cópias vendidas. Estreia dia
30/3 no Apple TV+. (BG)
A VIDA
HISTÓRIA
O asteroide que matou
os dinossauros criou um
universo paralelo, onde
os dinos sobreviveram
– e evoluíram para seres
humanoides. O rei deles,
Koopa, comanda a distó-
pica Dinohattan e quer
dominar a Terra. Para isso,
rapta Daisy, que possui
um artefato-chave para o
seu plano. É aí que entram
os irmãos Mario e Luigi,
encanadores do Brooklyn
que vão ao mundo dos
dinos salvar o dia.
EXTRA?
Distribuído pela Disney, o
filme custou US$ 102 mi-
lhões (em valores atuais),
mas foi um fracasso de
crítica e público: faturou o
equivalente a US$ 43,2 mi.
O resultado fez a Nintendo
ficar quase três décadas
afastada do cinema. Mas,
desde o anúncio do novo
Mario, o live action ganhou
status cult: em 2021, che-
gou a liderar as vendas de
DVD e Blu-Ray da Amazon
(afinal, ele não está em
nenhum streaming).
série
O mundo por Philo-
mena Cunk (2023)
Netflix
Um "mockumentary"
(documentário fictício) que
reconta, com inteligência e
humor, a história da civiliza-
ção. Mistura o estilo do inglês
David Attenborough, dos
documentários da BBC, com
os desvarios de Borat – em
um roteiro bem escrito, que
lembra Monty Python. (BG)
Imagens reprodução/divulgação.
 EDIÇÃO Bruno garattoni

a gênese do horror “Ele abriu a boca

para gritar, mas
Um parasita cerebral se espalha entre as
pessoas, transformando-as em monstros não saiu som
e instalando o caos – enquanto você, com algum. Seu
um revólver e poucas balas, tenta sobre- rosto mutilado
viver. Parece The Last of Us, mas é seu
ancestral: Resident Evil 4, de 2005, que não permitia
influenciou muito os games que vieram nem fazer uma
depois. Agora, vinte anos mais tarde, ele careta de dor",
está de volta – em versão totalmente re-
escreve a historiadora
feita, com gráficos em 4K. (BG)
Lindsay Fitzharris neste
Resident Evil 4 Remake. Lançamento dia livro sobre o surgimento
23/3, para PlayStation, Xbox e PC. US$ 60. da cirurgia plástica, du-
rante a Primeira Guerra
Mundial – quando a
medicina foi obrigada a
inventar novas técnicas,
às vezes mirabolantes,

s
para tentar reconstruir
ta as faces de soldados
desfigurados. (BG)
is
O Restaurador de Rostos.
ev

R$ 55.
R

o NAzismo e As empresAs
il
as

O Fusca, primeiro sucesso da Volkswagen,

foi desenhado por Ferdinand Porsche (da
Br

marca de carros esportivos) a pedido de A China quebrada em três

Adolf Hitler. Neste livro, o historiador Com o final da dinastia Han, no ano 220, o país foi dividido
holandês David de Jong investiga as re- em três reinos, que passaram os 60 anos seguintes lutando
lações da VW e outras grandes empresas entre si. Este game de ação se passa nesse momento histó-
alemãs, como Siemens (siderurgia), Dr. rico, com uma dose de fantasia (os três grupos lutam por
Oetker (alimentos) e Allianz (seguros), um elixir capaz de despertar dragões) misturada a fatos e Elétrons e
com o Terceiro Reich. (BG) personagens reais. (BG)
passarinhos
Bilionários Nazistas. R$ 105 (no Wo Long: Fallen Dynasty. Para PlayStation, Xbox e PC.
Kindle: R$ 45). US$ 60 (grátis no serviço Xbox Game Pass). O que a água, os cam-
pos magnéticos e uma
revoada de pássaros
têm em comum? Todos
os três, como o italiano
filme Documentário Giorgio Parisi mostra
Vortex (2021) The Big Conn (2022) neste livro curto e fácil
MUBI Apple TV+ de ler, são conjuntos for-
O diretor Gaspar Noé é conhe- O advogado Eric C. Conn ficou mados pela interação de
cido pela brutalidade de seus rico e famoso ajudando as pes- muitos elementos indivi-
filmes (como Irreversível, de soas do Kentucky a consegui- duais: “sistemas comple-
2002), que fazem parte de um rem se aposentar por invalidez. xos", cujo estudo rendeu
movimento batizado de "novo Até que um repórter do Wall
extremismo francês". Agora, a Parisi o prêmio Nobel
Street Journal esbarrou no caso
ele usa sua mão pesada para dele e descobriu a verdade: era de Física em 2021. (BG)
mostrar algo especialmente tudo uma enorme fraude, em
assustador: a dissolução que Conn e um juiz desviaram A Maravilha dos
mental de uma pessoa com US$ 550 milhões dos cofres Sistemas Complexos.
Alzheimer. (BG) do governo americano. (BG) R$ 40.

março 2023 super 17

 sn. teCh

Engenharia Empresa vende kits que permitem brincar de

alterar o DNA de plantas, bactérias e até
células humanas – com instruções passo a passo.
genética em casa Texto Bruno Garattoni • Design Luana Pillmann

N. tabacum

Pipeta

s
Vaso ta
is
Seringas
ev

para injeção

Placas
R

de petri
il
as
Br

Tubos para
mistura

O kit tAMBéM iNClui:

sementes, luvas, ágar (para
cultivar as bactérias), água Amostras
purificada e reagentes. de bactéria

A Empresa se chama ODIN (the-odin.com), foi fundada por
uma biofísica da Universidade de Chicago, e é a primeira a
comercializar kits genéticos para leigos. O da foto é o Plant
Genetic Engineering Kit (US$ 149), e vem com todos os
materiais necessários para plantar a Nicotiana tabacum e al-
terar seu DNA: sementes, terra, instrumentos básicos e uma
amostra de bactéria Agrobacterium, que contém três genes
modificados – e você mesmo cultiva, numa placa de petri,
para então injetá-la na planta. A bactéria irá transferir esses
genes para as células da N. tabacum, cujas folhas mudarão de
cor. Já o Genetic Design Starter Kit (US$ 39) vem com uma
amostra da bactéria E. coli e plasmídeos (moléculas de DNA)
com fragmentos genéticos de uma água-viva: ao injetá-los
na bactéria, ela se torna fluorescente, brilhando na cor verde.
A ODIN também oferece o Home Lab Kit (US$ 1.769), que
inclui células humanas da linhagem HEK293 (são células
de rim, muito usadas em experiências de laboratório) mais
os materiais necessários para modificá-las, e o Frog Gene
Therapy Kit (US$ 2.000), com seis sapos, gaiolas, materiais
e instruções para alterá-los geneticamente.

18 super março 2023 Fotos Reprodução/Divulgação


Com os air-
pods no avião
Os fones sem fio da Apple, e
outros do tipo true wireless, não
funcionam com os sistemas de
entretenimento dos aviões –
que só têm conexão de áudio
com fio. Mas o adaptador AirFly
(US$ 55) resolve: basta conectá-
-lo à saída P2, na telinha da sua
poltrona, e ele transmite o
sinal via Bluetooth (cujo uso é
permitido a bordo). Usa bateria
recarregável, que dura 20h.
EDIÇÃO Bruno garattoni
sem pAssAr cAlor à NoiTe VOCÊ DECIDE
O Sleepme Dock Pro permite ajustar a temperatura
da cama, pois vem com uma manta fria, que você Os projetos mais
coloca sob o lençol. O produto inclui um compressor interessantes
bem silencioso (segundo o fabricante, emite 41 a 46 (e surpreendentes)
decibéis, algo quase inaudível), que resfria água e a do mundo do
bombeia pela manta. Você usa um app para selecionar
crowdfunding
a temperatura da água, de 13 a 46 graus – ou seja, o
produto também aquece a cama no inverno. Custa de
US$ 1.000 a US$ 1.200, dependendo do tamanho da
cama (para casais, US$ 1.600 a US$ 1.800).
Telescópio pequeno
s
indiegogo.com
ta Projeto Dwarf II Smart
is
Telescope
O que é Um telescópio
ev
portátil muito menor do
que os concorrentes: tem o
R
tamanho de um livro grosso.
Vem com um app, para iOS
il
e Android, que movimenta
as
o telescópio para localizar
automaticamente os corpos
celestes – e exibe, em tempo
Br
real, as imagens captadas
por ele. Também tem um
modo diurno, para observar
A roupa escaneadora animais selvagens.
Quanto já arrecadou
O Zozofit (US$ 98) é um macacão cheio de pontinhos que cobrem US$ 2,1 milhões
todo o corpo. Ele vem com um aplicativo que reconhece esse padrão Chance de rolar bbb
de pontos – e o utiliza para escanear, com alta precisão, as medidas
do seu corpo. Por enquanto, só serve para isso. Mas seu potencial
é enorme: se a tecnologia for adotada em sites de e-commerce,
será possível fazer o upload das medições – e os sites selecionarão Capacete dobrável
automaticamente os tamanhos de roupas ideais para você. indiegogo.com
Projeto Fend Super
O que é Um capacete dobrá-
UmA grelhA à provA d’ágUA vel que cabe dentro de uma
mochila. É feito de plástico
Em 1994, o americano Michael Boehm inventou e parece um capacete de
uma grelha inclinada – para que a gordura pudesse ciclismo comum, mas tem
escorrer, deixando as carnes sequinhas. Chamou um truque: suas laterais são
um ex-boxeador para ser seu garoto-propaganda, retráteis (quando fechadas,
e lançou como George Foreman Grill. Ela vendeu ele fica com a metade do
mais de 100 milhões de unidades, mas tem um tamanho). Também tem
problema. É meio difícil de limpar, pois tem partes luz frontal e traseira, ali-
que não podem ser molhadas. A George Foreman mentadas por uma bateria
Submersible (US$ 60) finalmente dá um jeito: seu recarregável.
bloco eletrônico é destacável, e o resto pode ser Já arrecadou US$ 447 mil
lavado na pia ou lava-louças, ou deixado de molho. Chance bbb
março 2023 super 19
 Capa

s
ta
is
ev

O útero
R
il
as
Br

Texto Bruno Garattoni e Tiago Cordeiro

Ilustração Felipe Del Rio
Design Juliana Krauss e Luana Pillmann

20 super março 2023

 s
ta
is
ev

artificial
R
il
as
Br

Já é possível gerar embriões de rato “do zero”,

usando células-tronco. Eles se desenvolvem,
formando coração e cérebro, dentro de uma
máquina. Um aparelho similar já foi usado
para gestar carneiros – e seus criadores
pretendem empregá-lo, no futuro, para salvar
bebês prematuros. Mas essa tecnologia
também tem um lado controverso.

março 2023 super 21

 Centenas de milhões de ratos
são gerados, a cada ano, para virarem
cobaias de laboratório. Eles geralmen-
te custam de US$ 40 a 120 cada um,
dependendo das características, e são
fornecidos por companhias como a

s
Jackson Laboratory, fundada em 1929 e
que hoje emprega 2.900 funcionários,
dedicados a reproduzir, criar e vender
ta
is
camundongos (e outros animais) para
ev

cientistas do mundo inteiro.

Mas os embriões criados em 2021
R

no Instituto de Ciências Weizmann, em

Rehovot, Israel, eram diferentes. Aos
il

cinco dias de vida, quando eles tinham

as

apenas 250 células, foram extraídos de

suas mães – e inseridos em um útero
Br

artificial (1), uma máquina onde se de-

senvolveram por tempo suficiente pa-
ra formar os principais órgãos, como
cérebro e coração.
O teste foi encerrado ali. Mas, em
2022, os cientistas foram (muito) além.
“Nós pensamos: agora que sabemos o
que é necessário para manter um em-
brião natural fora do útero, podemos
finalmente testar se é possível gerar
um embrião [sintético] usando células-
-tronco”, conta o biólogo Jacob Hanna.
Sim, era possível. Eles conseguiram
eliminar a primeira etapa do proces-
so – e criaram embriões de rato “do A taxa de
zero”, fora do corpo, simplesmente sobrevivên-
juntando e manipulando células 2 . cia de bebês
Os embriões sintéticos – que os cien- prematuros
tistas chamam de “embrioides” – foram aumentou
muito nas
inseridos no útero artificial. O aparelho, últimas dé-
resultado de sete anos de desenvolvimen- cadas. Mas,
to, usa ampolas cheias de uma mistura até hoje,
de aminoácidos, hormônios e nutrientes, 1 milhão
mantidas girando constantemente – isso deles morre
a cada ano
evita que o embrião grude nas bordas [ve- no mundo.
ja infográfico na pág. 27]. As ampolas, uma
Fontes (1) Ex utero mouse embryogenesis from pre-gastrulation to late organogenesis. J Hanna e outros, 2021.
(2) Post-gastrulation synthetic embryos generated ex utero from mouse naive ESCs. J Hanna e outros, 2022.
22 super março 2023
 para cada embrião, são monitoradas por um sistema que Suécia, criaram um aparelho capaz
controla pressão, temperatura e concentração de gases (3). de manter vivos, por 12 horas, fetos
“Inventamos uma nova forma de sustentar o cres- de 375 gramas, o equivalente a 21 se-
cimento dos embriões. Antes, não se pesquisava a manas de gestação. Esse é um patamar
criação deles, porque ninguém sabia como garantir crítico: até hoje, bebês nascidos com
seu crescimento”, diz Hanna. menos de 22 semanas são considera-
Ele fundou uma empresa, a Renewal Bio, para dos de difícil sobrevivência (o ideal
explorar essa tecnologia – e já está trabalhando na é que os fetos fiquem na barriga da
criação de embriões humanos sintéticos, com estágio mãe por no mínimo 28 semanas).
de desenvolvimento equivalente ao de 40 a 50 dias A partir dos anos 1960, foram surgindo
de gestação. Segundo Hanna, eles ajudarão a testar uma série de incubadoras artificiais,
novos tratamentos para problemas reprodutivos, e a taxa de sobrevivência dos bebês
como infertilidade, endometriose, perda do bebê prematuros cresceu bastante: de 1990
e pré-eclâmpsia (um tipo perigoso de hipertensão para cá, ela vem aumentando em média
sanguínea durante a gravidez). 2% por ano (5). Mas, mesmo com to-
Os embriões de rato viveram 11 dias no útero ar- dos os avanços, a precocidade continua
tificial (metade dos 19 dias de uma gestação normal sendo um problema. Segundo dados
dessa espécie). Esse é o limite porque, a partir daí, seria da OMS, 15 milhões de bebês, ou 10%
preciso fornecer sangue para que eles continuassem de todos os nascidos no mundo a cada
a se desenvolver – coisa que a máquina israelense ano, são prematuros – e 1 milhão deles
não faz. Mas essa tecnologia já existe. Faz parte de não sobrevive. O nascimento precoce é
um segundo tipo de útero artificial, que foi criado a maior causa de morte entre crianças

s
em 2017 por cientistas americanos – e testado na até 5 anos.
gestação de oito carneiros (4).
Eles foram retirados das barrigas das mães quando
ta Há várias equipes de cientistas ten-
tando criar aparelhos para salvá-las.
is
tinham 105 a 120 dias de vida (ainda longe de com- Além das iniciativas nos EUA e em
ev

pletar a gestação, que é de 142 a 152 dias), e colocados

no aparelho, que reproduz o fluxo sanguíneo e as
R

trocas gasosas de um útero normal. Cinco animais

se desenvolveram totalmente, e de forma saudável
il

[veja infográfico na pág. 24]. O dispositivo, que foi

as

inventado por médicos do Philadelphia Children’s

Hospital, pode um dia ser utilizado em bebês hu-
Br

manos muito prematuros, que não sobreviveriam

nas incubadoras atuais.
Ninguém em sã consciência seria contra. O pro-
pósito da medicina é justamente esse, afinal: tratar
doenças e salvar vidas. Mas, ao ler sobre o útero
artificial e os embriões sintéticos, talvez você tenha
sentido um certo desconforto. Coisas assim lembram
Admirável Mundo Novo, um clássico da ficção científica A vida do feto é
que retrata a chamada gestação extracorpórea, ou
ectogestação: os fetos são criados e se desenvolvem extremamente frágil.
fora do corpo, em laboratórios supervisionados pelo Ele precisa passar no
Estado – e já nascem geneticamente programados
para desempenhar certas funções na sociedade. mínimo 28 semanas
Quase um século após a publicação do livro, de 1931,
não chegamos a isso. Ainda bem. Mas as pesquisas na barriga da mãe. Se
deram um salto nos últimos anos. Conforme a ciência
avança sobre mais aspectos da reprodução humana, sair antes disso, sua
começa a ser possível vislumbrar novos cenários e
possibilidades – incluindo algumas bem perturbadoras.
sobrevivência começa a

a
ficar complicada – com
menos de 22 semanas
de vida, ela se torna
A busca por um útero artificial não é nova. Em
1958, pesquisadores do Instituto Karolinska, na
bem difícil.
Fontes (3) Veja um vídeo dele em youtu.be/pM-Jl7SIOqU. (4) An extra-uterine system to physiologically support the extreme
premature lamb. E Partridge e outros, 2017. (5) A Trend Study of Preterm Infant Mortality Rate in Developed and Developing
Countries over 1990 to 2017. R Sefidkar e outros, 2019. março 2023 super 23
 Israel, também existe uma na Europa:
ela se chama Perinatal Life Support
System (“sistema de suporte vital A gestação
perinatal”), e é liderada pela Univer-
sidade de Tecnologia de Eindhoven, extracorpórea
na Holanda, em parceria com insti-
Cientistas dos EUA criaram um dispositivo que reproduz
tuições da Alemanha e da Itália. O
as condições do útero. Ele foi testado em carneiros – e
projeto (6) começou em 2019, e prevê
talvez possa, um dia, ser usado para salvar bebês humanos.
iniciar os testes em 2024. Ele usa ba-
lões cheios de uma versão artificial PlACA AqueCidA (39,5OOC)
do fluido amniótico (que preenche
Fluido saída de fluido
o útero natural, e é formado princi- amniótico amniótico
palmente por água, nutrientes e sais Filtros

minerais). O cordão umbilical do feto

seria conectado a uma máquina, que Bomba Artéria Veia
manteria o fluxo de nutrientes até ele umbilical umbilical
conseguir desenvolver seus pulmões, Medicamentos e nutrientes
o que ocorre por volta da 26a semana.
É nesse momento que esses órgãos entrada de
começam a produzir surfactante, uma Ar O2 N2 gases saída
mistura de lipídeos e proteínas que Misturador gasoso (ar,
Oxigenador de gases

aumenta a absorção de oxigênio e tam- oxigênio, nitrogênio)

s
sensor de O2/CO2
bém funciona como lubrificante – sem
ela, os alvéolos tendem a “grudar” uns
nos outros durante a expiração, quando
1. Os fetos ta
A experiência utilizou oito, todos prematuros – eles tinham 105 a 120
is
os pulmões esvaziam. dias, bem aquém do período de gestação normal dos carneiros (que é
de 142 a 152 dias). As mães foram anestesiadas, e os fetos retirados.
ev

Os pesquisadores europeus preten-

dem testar seu sistema usando bonecos 2. A transferência
R

ultrarrealistas. Se ele funcionar como Os carneirinhos foram colocados dentro do dispositivo, a Biobag, e
esperado, poderá ser utilizado em be- conectados a um oxigenador: ele fornece oxigênio e nitrogênio, através
il

bês humanos a partir de 2029. Ou seja, do sangue, e retira CO2, reproduzindo a função do cordão umbilical.
as

está atrás do projeto do Philadelphia

3. O crescimento 6
Children’s Hospital, que já testou com
PesO COrPOrAl (kg)
Br

animais vivos. Esse também é o caso
do EVE, ou Ex-Vivo Uterine Envi-
ronment (“ambiente uterino fora do
corpo”), que vem sendo desenvolvido
desde 2013 por cientistas do Japão e da
Austrália. Em 2020, ele foi testado em
fetos de carneiro (essa espécie costuma
ser escolhida porque sua gravidez já
foi muito estudada), que foram man-
tidos no aparelho por cinco dias (7). É
bem menos que o projeto americano,
que alcançou 28 dias – e poderia ter
ido além. Os médicos da Filadélfia
podiam ter concluído a gestação dos
animais, que já estava no fim – mas
optaram por não prosseguir, porque
queriam fazer uma autópsia para ver
se o organismo dos filhotes havia se
desenvolvido normalmente.
Você deve estar pensando: o que isso
tem a ver com engenharia genética,
estilo Admirável Mundo Novo? São só
tecnologias para salvar fetos prema-
turos, certo? Certo. Mas o desenvol-
vimento de úteros artificiais também
é uma peça-chave para a criação ou
Além do oxigênio, os
animais receberam uma
mistura de aminoácidos, 3
carboidratos (glicose)
e lipídeos, injetados na
corrente sanguínea. Os
fetos ganharam peso,
sua pelagem cresceu, e
0
100 125 150
chegaram a abrir os olhos.
IDADe gesTACIonal (dIas)
4. O desfecho
Cada feto ficou na Biobag por 20 a 28 dias, e aí a gestação foi interrom-
pida (segundo os cientistas, seria possível levá-la até o final, mas não
era o objetivo). Os animais foram sacrificados e submetidos a autópsia
– que comprovou o desenvolvimento normal deles.
Feto com 111 dias, há 4 na Biobag Mesmo feto, com 135 dias (28 na Biobag)
5. A ideia
Os pesquisadores, que são do Children’s Hospital da Filadélfia, pretendem
usar a Biobag, um dia, para salvar bebês humanos prematuros. Outra equipe,
da Holanda, está desenvolvendo um sistema similar.

Fonte An extra-uterine system to physiologically support the extreme premature lamb. e Partridge e outros, 2017.
24 super março 2023
 s
ta
is
ev
R
il

As tecno-
as

logias de
gestação
Br

fora do cor-
po são uma
evolução
radical das
incubadoras
– e tentam
reproduzir
as condi-
ções reais
do útero.

Fontes (6) perinatallifesupport.eu (7) Successful use of an artificial placenta–based life support system to treat extremely preterm
ovine fetuses compromised by intrauterine inflammation. H Usuda e outros, 2020.
março 2023 super 25
 manipulação de embriões – porque
permite que eles sejam cultivados
em laboratório por mais tempo. As
pesquisas com úteros e embriões se
complementam; são dois lados da mes-
ma moeda. “Como você vai cultivar um
embrião sintético se não sabe cultivar
um embrião natural?”, diz Jacob Hanna,
do Instituto Weizmann. Ele faz questão
de ressaltar que os embrioides cria-
dos no seu laboratório não são viáveis
(não poderiam dar origem a animais,
porque são primitivos demais), e que
seu objetivo é apenas fazer pesquisas
científicas de forma ética e respeitando
todas as leis.
Em 1978, após o nascimento do
primeiro bebê de proveta (criado por
fertilização in vitro, hoje um procedi-
mento corriqueiro), a inglesa Louise
Brown, o US Department of Health
publicou uma recomendação que se
tornaria norma entre os cientistas:
só é permitido cultivar um embrião
humano em laboratório por 14 dias.
É que no 15o dia começa a acontecer
Br
A ciência já sabe como
gerar embriões sem
precisar de gametas
masculinos ou
femininos. Isso
permitirá estudar
melhor doenças
genéticas e outros
problemas neonatais.
Mas também pode ter
um lado perigoso.
Fontes (8) Self-organization of the human embryo in the absence of maternal tissues. M Zernicka-Goetz e outros, 2016. Self-organization
of the in vitro attached human embryo. A Brivanlou e outros, 2016. (9) ISSCR Guidelines for Stem Cell Research and Clinical Translation:
26 super março 2023 The 2021 update. R Lovell-Badge e outros, 2021.
a “gastrulação”, o processo de diferenciação celular
que dá origem aos órgãos. Por questões morais e de
segurança, o embrião deve ser destruído antes de
iniciar esse processo. Muitos países, como Coreia do
Sul, Canadá e Reino Unido, chegaram a transformar
essa norma em lei. Mas, em junho de 2021, ela caiu.
A International Society for Stem Cell Research
(ISSCR), que reúne pesquisadores de células-tronco
de todo o mundo, decidiu que não haverá mais um
limite de tempo. Agora os estudos com embriões
humanos poderão ultrapassar 14 dias – devendo ser
avaliados, caso a caso, para determinar o ponto em
que cada experimento deverá ser encerrado. Essa
mudança é crucial, porque as regras ditadas pela
ISSCR determinam não só o que é considerado eti-
camente aceitável pelos cientistas, como os limites
práticos nas experiências.
O fim da norma reflete, de certa maneira, um avan-
ço científico que já havia ocorrido. Em 2016, dois
grupos de pesquisadores (8), dos EUA e do Reino
Unido, conseguiram manter embriões humanos vivos
por 13 dias e então encerraram suas experiências,
s
por iniciativa própria, para cumprir a antiga norma.
ta
Era evidente que os cientistas tinham condições de
ir além. E a ISSCR meio que se curvou a essa nova
is
realidade. Mas, em outro aspecto, ela não mudou:
ev
seu regulamento oficial (9) continua enquadrando a
“edição genética herdável, para propósitos reprodu-
R
tivos” na categoria 3A, de procedimentos proibidos.
Ela também inclui a gestação de embriões modifica-
il
dos e a transformação de células-tronco em gametas
as
(óvulos ou espermatozoides) humanos. Tudo isso é
“atualmente proibido”. Ou seja, o regulamento prevê
que essas coisas podem ser liberadas no futuro, caso
os procedimentos se tornem seguros. Além desse
grupo existe uma última categoria, a 3B, de proibição
incondicional. Ela reúne atividades “desprovidas de
motivação científica e/ou eticamente preocupantes”,
como a clonagem humana, a criação de quimeras
(seres híbridos) entre pessoas e animais, ou a gestação
de um embrião humano no útero de outra espécie.
São experimentos assustadores, que um cientista
minimamente responsável jamais faria. Mas e um
cientista irresponsável?
e
Em novembro de 2018, o chinês He Jiankui ganhou
as manchetes ao anunciar que tinha editado o DNA
de dois embriões humanos – e eles haviam sido im-
plantados e gestados, dando origem a duas meninas
gêmeas, Lulu e Nana. Jiankui não era um zé-mané.
Fez doutorado na Universidade Rice, no Texas, atuou
como pesquisador de pós-doutorado na Universidade
Stanford, e estava trabalhando na Universidade de
Ciência e Tecnologia do Sul da China, em Shenzhen.
 O embrião sintético
Cientistas israelenses transformaram células-
-tronco de ratos em embriões – que foram
implantados, e se desenvolveram, numa máquina.

2
Células
transformadas
em iCdx2
3 4
1
Células no
estado normal

Células-tronco Células
transformadas
em iGata4

s
1. As células ta
Os pesquisadores compraram células-tronco embrionárias (ESCs) de ratos.
is
Essas células, que têm a capacidade de formar todos os órgãos e tecidos do or-
ganismo, são clonadas e vendidas por empresas de insumos para laboratório.
ev

2. A transformação
R

Parte das células foi mantida no estado original. Outras foram alteradas
geneticamente, e induzidas a se transformar em células dos tipos iCDx2 e
iGata4 – que formam a tropoectoderme e a endoderme, as duas primeiras
il

estruturas de um embrião.
as

3. A mistura
Br

Os cientistas juntaram os três tipos de célula em ampolas contendo nutrien-

tes, aminoácidos (N-acetil-L-cisteína) e hormônios (insulina, progesterona e
beta-estradiol). No terceiro dia, as ampolas foram colocadas em um agitador;
no quinto, transferidas para o “dispositivo uterino”.

4. A máquina
Ela gira lentamente (para que
os embriões não grudem nas
paredes das ampolas), fornece
oxigênio e CO2 – os embri-
ões precisam de um pouco
dele para se desenvolver – e
mantém o líquido levemente
pressurizado, a 0,1 psi (mesma
pressão do fluido amniótico
numa gravidez normal).

Fazendo 5. O desenvolvimento
duas Os embriões sobreviveram por 11 dias, e começaram a formar coração e
alterações cérebro. Para ir além, e reproduzir uma gestação completa (que, nos ratos,
genéticas dura 19 dias), seria preciso fornecer sangue aos embriões – uma função que
nas células- o dispositivo atual não possui.
-tronco de
ratos, elas dobras neurais (NF) dobras neurais (NF) tubo neural (NT)
passam a se
visão superior

visão lateral

diferenciar
espontane-
amente – e
formam um
embrião. tubo neural (NT) botão caudal coração (H) botão caudal (rabo) (TB)
(rabo) (TB)

Fonte Post-gastrulation synthetic embryos generated ex utero from mouse naive ESCs. J Hanna e
outros, 2022. Cultura realizada com ingredientes descritos em Self-organizing properties of mouse
pluripotent cells initiate morphogenesis upon implantation. I Bedhov e M Zernicka-Goetz, 2014. março 2023 super 27
 Ele recrutou casais em que o marido
era portador do vírus HIV, mas a es-
posa não. Juntou os gametas dos dois,
criou embriões e fez uma alteração no
gene CCR5, reproduzindo uma mutação
natural rara que confere resistência ao
HIV. Em tese, Lulu e Nana nasceram
imunes ao vírus. O jornal estatal chinês
People’s Daily saudou o feito como um
“avanço histórico na aplicação da en-
genharia genética para a prevenção de
doenças”. Só que aquilo causou horror
na comunidade científica, e o governo
chinês rapidamente virou as costas a
Jiankui – que acabou condenado a três
anos de prisão (o motivo foi “edição ile-
gal de embriões humanos com objetivo
de reprodução”).
Em abril de 2022, ele foi solto e anun-
ciou a criação de um novo laboratório,
agora em Pequim. Declarou que seu
objetivo é pesquisar tratamentos gené-

s
ticos para doenças raras, e se recusou a
falar sobre Lulu e Nana. Provavelmente
será vigiado de perto pelas autoridades,
ta
is
e não irá fazer nada parecido. Mas e
ev

se algum outro pesquisador fizer? Ou

se, daqui a alguns anos, procedimen-
R

tos como esse acabarem se tornando

aceitáveis? Afinal, teoricamente não
il

há nada de errado em deixar as pes-

as

soas imunes a doenças. O risco é que

alterações genéticas como essa tenham
Br

efeitos colaterais sérios, só descobertos

anos ou décadas mais tarde.
Além de causar sofrimento às pes-
soas que tiveram o DNA modificado,
isso poderia afetar a humanidade como
um todo: conforme aqueles indivíduos
e seus descendentes fossem tendo fi-
lhos, as alterações iriam se propagando
pela sociedade – e seus efeitos nocivos
também. As pessoas que passaram por A síntese
edição genética e seus descendentes so- de óvulos
freriam forte preconceito, ou coisa pior poderá
(inclusive por isso, os nomes completos permitir, no
e o paradeiro de Lulu e Nana nunca fo- futuro, que
um casal
ram divulgados). Sem falar em cenários formado
mais manjados, e igualmente questio- por duas
náveis, como pais querendo trocar a mulheres
cor dos olhos, aumentar a estatura ou tenha filhos
mudar outras características dos filhos contendo
o DNA de
(leia texto na pág. 31), a divisão entre ambas.
classes sociais geneticamente editadas
e não editadas etc.
Outra hipótese perigosa, porque pro-
mete um grande benefício mas esconde
um risco igualmente alto, seja o uso de
embriões para transplantes. Se você um
Fontes 10 Embryo model completes gastrulation to neurulation and organogenesis. M Zernicka-Goetz e outros, 2022.
11 An in vivo brain–bacteria interface: the developing brain as a key regulator of innate immunity. M Levin e outros, 2020.
28 super março 2023
 dia precisasse de um órgão, seria possí-
vel “ectogestar” um – que viria novinho
e 100% compatível, sem desgaste nem
risco de rejeição. “Há tantas pessoas,
em todo o mundo, que esperam anos
por um transplante de órgão”, justi-
ficou a bióloga polonesa Magdalena
O óvulo Zernicka-Goetz ao jornal da Univer-
sidade de Cambridge, onde ela trabalha.
construído Zernicka e sua equipe, em parceria com
cientistas do Instituto de Tecnologia
Uma experiência feita com ratos
conseguiu produzir óvulos a partir da Califórnia, conseguiram criar em-
de células da pele. Essa tecnologia briões de rato, com coração e cérebro,
poderia ter vários usos, dos legítimos a partir de células-tronco 10 . Como o
aos mais preocupantes, em humanos. Instituto Weizmann. A diferença é que
eles enxergam nisso o caminho para,
um dia, produzir órgãos para trans-
plantes. “O conhecimento obtido pelo
A pele e os óvulos nosso trabalho poderia ser usado para
Em 2022, cientistas da Coreia cultivar órgãos humanos sintéticos, e

1
do Sul e dos EUA usaram salvar vidas”, disse Zernicka. Verdade.
células da pele (fibroblastos),
da orelha de ratas, para gerar
Ao mesmo tempo, não é difícil enxergar

s
óvulos. Eles fizeram isso o problema ético envolvido. Os órgãos
inserindo o material genético
dessas células em óvulos
ta seriam colhidos, transferidos para má-
quinas de suporte nas quais cresceriam
is
“receptores”, cujo DNA havia até a data do transplante, e os embriões
sido removido.
ev

iriam para o lixo. Só que eles, junto com

os órgãos que você quer retirar, também
R

teriam cérebro. A partir de um certo

A implantação nível de desenvolvimento, ele adquire
il

Esses óvulos foram fertiliza- consciência, se torna capaz de processar

as

dos in vitro, usando esperma- sinais de dor – e sofrer. Uma possível

2
tozoides, e implantados em
27 ratas. Uma engravidou, e solução, do ponto de vista puramente
Br

deu à luz três filhotes fême- técnico, seria criar embriões sem cé-
as. Elas nasceram com peso rebro. Em sapos, isso já é possível 11.
abaixo do ideal, mas tiveram Mas nada garante que funciona-
vida normal. Também eram ria com embriões humanos – e
férteis, e tiveram filhotes
sem problemas. provavelmente a técnica daria errado
antes de dar certo, trilhando um ca-
minho cheio de desfechos horríveis.
Dificilmente a sociedade aceitaria.

3
As possibilidades Ela talvez se mostre mais aberta a
Agora, a equipe pretende outra possibilidade: as técnicas de
testar essa técnica em células ectogestação poderiam ser usadas
humanas. Se ela funcionar, para que as mulheres tivessem filhos
poderá ser usada para tratar sem ter de encarar as dificuldades da
a infertilidade (uma mulher
infértil poderia doar fibro- gravidez. Essa ideia era recorrente na
blastos, e receber um óvulo primeira metade do século 20. Em
contendo o seu DNA). Daedalus, romance escrito em 1924 por
J.B.S. Haldane, biólogo e professor da
Universidade Oxford, a humanidade

4
Os riscos domina a ectogestação na década de
Mas também abre cenários 1950 – e, em 2073, mais de 70% dos be-
mais sinistros, como a bês são gestados fora do corpo humano.
reprodução não consensual: Haldane era amigo de Julian Huxley,
alguém poderia coletar um irmão de Aldous Huxley (que escreveu
pedacinho da pele de uma
mulher (uma celebridade, por Admirável Mundo Novo poucos anos de-
exemplo) e tentar fabricar pois). Em Daedalus, ele argumenta que,
óvulos contendo o DNA dela. com o avanço das mulheres no mercado
Fonte Haploidy in somatic cells is induced by mature oocytes in mice.
S Mitalipov e outros, 2022.
março 2023 super 29
 de trabalho, a tarefa de gestar filhos
se mostraria um fardo pouco atrativo,
o que levaria à procura por úteros ar-
tificiais. As mulheres também pode-
riam recorrer a eles por não conseguir
engravidar naturalmente – como já é
feito hoje na cessão temporária de útero,
nome técnico da “barriga de aluguel”.
No futuro, talvez a ciência domine
100% do ciclo reprodutivo humano – e
consiga alcançar a gametogênese, ou seja,
a capacidade de gerar espermatozoides e
óvulos em laboratório. Em 2022, cientis-
tas dos EUA e da Coreia do Sul usaram
uma técnica bem conhecida (a mesma
empregada para produzir a ovelha Dolly,
primeiro animal do mundo a ser clona-
do, em 1996) para alcançar um objetivo
inédito: produzir óvulos em laboratório.
Eles removeram o material genético dos
óvulos de uma rata e o substituíram por
DNA das células da pele de outra. O resul-
tado foi um óvulo sintético, que continha
o material genético da rata doadora [veja
infográfico na pág. 29]. “O trabalho é um
grande passo na direção da gametogênese
Br
Alguns cientistas
pretendem gerar
embriões humanos
com o objetivo de
produzir órgãos para
transplantes. Isso
poderia salvar muitas
vidas. E, ao mesmo
tempo, criar um dilema
ético de proporções
assustadoras.
Fontes 12 Haploidy in somatic cells is induced by mature oocytes in mice. E Kang e outros, 2022. 13 Viable offspring derived from single
unfertilized mammalian oocytes. Y Wei e outros, 2022. 14 Transcriptome profiling reveals signaling conditions dictating human spermato-
30 super março 2023 gonia fate in vitro. K Tan e outros, 2020. 15 Neonatal incubator or artificial womb? Distinguishing ectogestation and ectogenesis using the
metaphysics of pregnancy. E Kingma e S Finn, 2020.
in vitro. Ele é resultado de duas décadas de pesquisas,
iniciadas no final dos anos 1990”, diz o médico Gianpiero
Palermo, pesquisador da Universidade Cornell e um dos
autores do estudo 12 . Os óvulos foram fertilizados e
implantados em ratas. Uma delas engravidou, e deu à luz
três ratinhas. A equipe, que é liderada pelo pesquisador
Shoukhrat Mitalipov, um biólogo conhecido por seus
trabalhos pioneiros com clonagem, quer agora repetir
a experiência – só que gerando óvulos humanos.
A técnica poderia servir para tratar infertilidade e
prevenir doenças genéticas. O problema é que também
seria possível aproveitar o processo para tentar “melho-
rar” o DNA do embrião, uma prática que se aproxima
perigosamente da eugenia. A lei federal americana
proíbe o financiamento público desse tipo de traba-
lho. A pesquisa vem sendo bancada por uma doação
da organização Open Philanthropy, do cofundador do
Facebook Dustin Moskovitz.
Os estudos de geração e edição de óvulos trazem
consigo uma possibilidade nova: no futuro, talvez um
casal homossexual formado por duas mulheres possa
ter filhos contendo o código genético das duas. Em
s
2022, uma equipe de pesquisadores da China e dos
ta
EUA foi além, e criou ratas de laboratório com 100%
de DNA feminino 13 . Algumas espécies, como abelhas,
is
escorpiões, peixes e lagartos, conseguem se repro-
ev
duzir sem precisar de macho: os gametas femininos
já bastam para dar origem ao embrião. É a chamada
R
partenogênese – e os cientistas conseguiram induzi-la,
desabilitando sete trechos do genoma, nos óvulos de
il
ratas. Foi um grande feito científico. Mas o processo é
as
extremamente ineficiente. Os pesquisadores criaram
389 embriões, dos quais 192 se desenvolveram, e foram
implantados em 14 fêmeas. Nasceram apenas três ra-
tinhas, sendo que duas não sobreviveram ao primeiro
dia de vida. A terceira teve problemas de crescimento
(pois não possuía o gene Rasgrf1, que vem dos gametas
masculinos). Dificilmente alguém terá a ousadia, e a
irresponsabilidade, de tentar induzir a partenogêne-
se em humanos. Continuaremos sendo gerados pela
mistura de gametas masculinos e femininos. Mas, no
futuro, esses gametas poderão vir de um laboratório:
além das pesquisas com óvulos, também há cientistas
tentando – e conseguindo – criar espermatozoides
humanos a partir de células-tronco.
Esse objetivo foi alcançado em 2020, pelas mãos
de um grupo de pesquisadores da Universidade da
Califórnia em San Diego 14 . Eles descobriram que se
você inibir uma enzima chamada AKT, as células--
tronco espermatogoniais (produzidas nos testículos)
se transformam em espermatozoides. A ideia é usar
essa técnica para tratar a infertilidade masculina.
Gianpiero Palermo, da Universidade Cornell, também
está pesquisando isso – para criar meios de produzir
espermatozoides fora do corpo. “Nós investigamos a
possibilidade de clonar gametas masculinos, nos casos
em que eles são escassos, e eventualmente fazer um
teste genético anterior à fertilização, para identificar os
gametas mais saudáveis”, diz ele. Isso poderia permitir
No futuro,
se você
precisar de
um órgão,
talvez seja
possível ec-
togestar um
O que já é
– usando
um embrião
geneti-
permitido
camente
idêntico
- e feito
a você.
O Brasil e outros países já
permitem uma modalidade
de seleção genética. Mas com
regras rígidas.
Talvez você conheça al-
gum casal que fez trata-
mento para engravidar. A
fertilização in vitro vem se
tornando cada vez mais co-
mum (em algumas cidades
brasileiras, ela é oferecida
s
pelo SUS, inclusive). Esper-
matozoides do marido são
combinados com óvulos da
ta
is
mulher, gerando alguns
ev
embriões. Nesse momento,
é possível fazer o chamado
R
“diagnóstico pré-implan-
tacional”. Os médicos co-
il
lhem uma amostra muito
as
pequena, de 5 células, de
cada embrião, e procu-
Br
ram genes relacionados a
doenças como hemofilia,
fenilcetonúria, anemia fal-
ciforme e fibrose cística, ou
condições genéticas como
Síndrome de Patau, Síndro-
me de Edwards e Síndrome
de Down. Se o embrião con-
tiver uma delas, é descarta-
do; só embriões “perfeitos”
são implantados na mulher
(costumam ser 2 a 4; por
isso a reprodução assistida
tem maior probabilidade
de resultar em gêmeos).
E fica só nisso. A resolução
2.320/2022, do Conselho
Federal de Medicina, proíbe
todo o resto: “as técnicas
de reprodução assistida não
podem ser aplicadas com
a intenção de selecionar
o sexo ou qualquer outra
característica biológica
da criança, exceto para
evitar doenças”.
que os homens inférteis, 100 milhões em
todo o mundo, tivessem filhos. Mas, no-
vamente, esbarra numa questão: até que
ponto esse “teste genético” poderia ser
aplicado de forma perigosamente pró-
xima da eugenia? Atualmente há regras
rígidas para os testes genéticos permi-
tidos em embriões (leia texto ao lado).
Mas, conforme a ciência for avançando,
certamente haverá pressão para que mais
procedimentos sejam liberados. Coisas
que hoje são inaceitáveis, inviáveis ou
soam totalmente absurdas poderão se
tornar rotina. Já aconteceu antes. Cem
anos atrás, diversas práticas da medicina
atual eram só coisa de ficção.
A tecnologia tem potencial para re-
solver questões válidas, como salvar
bebês prematuros e erradicar doenças
genéticas. E também construir um
futuro apavorante, com a introdução
acidental de mutações incontroláveis e
a formação de um apartheid genético.
Para evitar isso, a humanidade terá de
refletir sobre certos pontos. “Qualquer
discussão ética sobre a ectogestação
precisa incluir considerações sobre a
autonomia e os direitos da mãe. E is-
so adiciona um complicador relevante:
a transição física do feto para o bebê”,
afirmam as filósofas Elselijn Kingma
e Suki Finn, da Universidade de Sou-
thampton, em um artigo sobre o tema 15 .
O nascimento, argumentam elas, é uma
mudança existencial: você deixa de fa-
zer parte de outro organismo e se torna
um ser individual. Mas e com a gravidez
extracorpórea, como ficaria isso? Se até
hoje a sociedade debate as implicações
da cesariana versus parto natural, o que
dizer de um feto que cresceu sem ou-
vir o coração, sentir os movimentos e
receber o afeto da própria mãe? Quais
seriam, ainda que a criança nascesse
fisicamente perfeita, as consequências
psicológicas e sociais disso?
Na mitologia grega, Prometeu rouba
o fogo dos deuses e dá de presente para
a humanidade, representando o poder
do conhecimento e da tecnologia. Zeus
o castiga por isso, amarrando Prometeu
a uma rocha onde ele é visitado, todos
os dias, por uma águia que come seu
fígado (o órgão sempre se regenera, re-
começando o tormento). Que a ciência
reprodutiva, com seu poder de contro-
lar a gênese, se torne um instrumento
para a vida – e não uma expressão da
prepotência humana. S
março 2023 super 31
 teCnologia

A nova geração da

realidade
s
ta
is
ev
R
il
as
Br

Nos próximos meses, a Apple pode apresentar ao

mundo seu capacete de RV. E a Sony está lançando um
headset para o PlayStation 5, o PS VR2, que combina
alto poder gráfico e uma boa biblioteca de games.
Veja por que a realidade virtual pode finalmente
estar se aproximando do mainstream – e confira o
teste de 20 jogos para o PS VR2.

Texto Bruno Garattoni Design Natalia Sayuri Lara

32 super março 2023

 s
ta
is
ev
R
il
as
Br

virtuAl
março 2023 super 33
 “
os segredos botões de controle
Ficam na parte de baixo do
headset, e são dois: o liga-
desliga e o "Exibição transpa-

do headset rente", que usa as câmeras de

posicionamento para mostrar o
ambiente (permitindo que você
veja onde está sem ter que tirar
o capacete da cabeça).
PlayStation VR2 usa
tecnologias presentes
nos sistemas de câmeras de
realidade virtual mais posicionamento
avançados, para PC – e São quatro, que capturam ima-
gens do ambiente e dos controles.
adiciona funções Graças a elas, o headset consegue
“Hiro não está aqui. perto dos 117 milhões de criadas pela Sony. calcular as posições exatas da sua
Está num universo ge- consoles PS4 vendidos. cabeça, mãos e corpo – você pode
rado por computador, A realidade virtual está andar pela sala, e ele sempre sabe
onde você está.
projetado em seus ócu- aprisionada num círcu-
los e injetado nos fones lo vicioso. Pouca gen-
de ouvido. Esse lugar te compra os headsets,
imaginário é conhecido porque eles são caros e área de jogo
O PS VR2 analisa o
como Metaverso", escre- têm poucos jogos e “ex- formato da sua sala e
veu o americano Neil Ste- periências" disponíveis; determina uma área

s
phenson em Snow Crash, como há poucos usuários, segura para jogar, livre
de obstáculos. Se você
de 1992. O livro, que in-
troduziu os termos “me-
a indústria desenvolve
poucos softwares, rea-
ta
estiver prestes a sair dela
durante algum jogo, o
is
taverso" e “avatar", ima- limentando o processo. headset mostra um avi-
ev

gina a realidade virtual Mas isso pode mudar. so, para que você recue.

como uma avenida de 65 Segundo a agência Bloom-

R

mil km de comprimento, berg, que cita fontes inter- Há três formas de jogar:
onde convivem 120 mi- nas da Apple, a empresa
il

lhões de pessoas (metade irá apresentar em junho

as

se conecta usando com- seu headset, que poderá

putadores públicos ou se chamar Reality Pro
Br

do trabalho, e por isso e supostamente com-

seus avatares aparecem bina realidade virtual e
Modo completo Em pé Sentado
em preto-e-branco). O aumentada (veja quadro (roomscale) Você pode mover e girar Requer 1x1 metro de
romance se tornou um na pág. 37). E, na última Permite que você ande o corpo, mas não anda espaço. Ideal para ga-
clássico da ficção cien- semana de fevereiro, a livremente pela sala, (dá um passo ao lado, no mes de corrida, ou jo-
dentro da área segura máximo). É suficiente gos em que os cenários
tífica, e fez previsões Sony lançou o PlaySta- determinada pelo siste- para a grande maioria são estáticos e o perso-
certeiras sobre várias tion VR2, seu sistema de ma (você pode ajustá-la, dos jogos. Requer 1x1 nagem se movimenta
coisas, da arquitetura da realidade virtual para o se quiser). Requer pelo metro de espaço. dentro deles.
internet à tecnologia dos PlayStation 5. Ele tem menos 2x2 metros.
capacetes de RV. Só errou três características que
num ponto: até hoje, 30 talvez possam, finalmen-
anos depois, a realidade te, quebrar as barreiras
os concorrentes

virtual não chegou nem que seguram a RV.

perto de 120 milhões de A primeira é o poder PS VR2 custa
usuários. A Meta (dona gráfico. Os headsets da mais do que
do Facebook) vendeu Meta podem ser usados o Meta Quest
20 milhões de headsets de duas formas: plu- 2, mas tem
da linha Quest – mas gados a um PC ou no telas OLED meta quest 2
o Horizon Worlds, seu modo standalone, sem e resolução
Fabricante: Meta (Facebook)
Plataformas: standalone (funciona so-
metaverso, tem míseros computador. E ambos
mais alta zinho, rodando jogos mais simples) e PC
200 mil usuários. Cin- têm poréns. Para rodar telas: LCD
co milhões de pessoas bem um game de reali- – superando Resolução: 1.832x1.920 pixels por olho,

compraram um PS VR, dade virtual, gerando um os modelos total de 7 megapixels

taxa de atualização: 120 Hertz
o capacete lançado em resultado visualmente mais caros Ângulo de visão: 97 graus
2016 para o PlayStation convincente, a máquina de outras Peso: 503 gramas
Preço: US$ 399 (não lançado no Brasil;
4 – é bastante, mas nada precisa renderizar duas marcas. pode ser encontrado por R$ 3.600)

→
câmeras oculares sistema háptico giroscópios e gatilhos
O headset tem duas câmeras Os controles do PS VR2 possuem Os controles têm giroscópios e acelerômetros
infravermelhas internas, que essa tecnologia, que é capaz de internos, usados para medir os movimentos.
monitoram os movimentos gerar vibrações altamente de- E o sistema de gatilhos adaptáveis inventado pela
dos seus olhos. Essa informa- finidas (como pingos de chuva Sony, já usado nos controles normais do PS5: um
ção é usada nos games (em nas suas mãos, por exemplo). motor elétrico cria resistência aos gatilhos, deixan-
alguns deles, você interage Ela também está presente no do-os mais "duros" em certas situações dos games.
com elementos simplesmente headset – os jogos podem dar
olhando para eles), e também tapinhas bem leves na sua testa.
para controlar a renderização
foveada (veja item abaixo).

s
ta
is
ev

lentes planas renderização foveada

R

O headset usa lentes de Fresnel (tipo inventado no século 19 pelo A fóvea, no meio da retina, é a área do olho humano
físico Augustin-Jean Fresnel), cobertas por ranhuras que guiam mais rica em células fotorreceptoras. Por isso, você só
a luz. Isso evita que a imagem fique distorcida nos cantos (o que enxerga perfeitamente o que está bem no meio do seu
il

aconteceria se o headset usasse lentes esféricas comuns). campo de visão. O headset sabe para onde você está
as

olhando, e concentra o poder gráfico do PlayStation 5

naquela área. O processo acontece em tempo real, e é
Prismas
Br

catadióptricos
100% "transparente": você não nota nada anormal.

Prismas
dióptricos Fóvea
Luz

Prisma
central
Lente Lente de Retina
comum Fresnel

playstation vr2 vive Flow vive xr elite meta quest pro

Fabricante: Sony
Plataforma: PlayStation 5
telas: OLED
Resolução: 2.000x2.040 pixels
por olho, total de 8,16 megapixels
(resolução 4K)
taxa de atualização: 120 Hertz
Ângulo de visão: 110 graus
Peso: 560 gramas
Preço: US$ 549 (no Brasil, R$ 4.499)
Fabricante: HTC Fabricante: HTC Fabricante: Meta
Plataformas: standalone, celular e PC Plataformas: standalone e PC Plataformas: standalone e PC
Telas: LCD Telas: LCD Telas: LCD
Resolução: 1.600x1.600 pixels por Resolução: 1.920x1.920 por olho, Resolução: 1.800x1.920 por olho,
olho, total 5,1 megapixels total 7,3 megapixels total 6,9 megapixels
Taxa de atualização: 75 Hertz Taxa de atualização: 90 Hertz Taxa de atualização: 90 Hertz
Ângulo de visão: 100 graus Ângulo de visão: 110 graus Ângulo de visão: 106 graus
Peso: 189 gramas Peso: 625 gramas Peso: 722 gramas
Preço: US$ 499 (não inclui o Preço: US$ 1.099 Preço: US$ 999
controle, que custa US$ 69)

março 2023 super 35

 Os animais robóticos são o en-
canto da série Horizon. Vê-los
em tamanho natural, frente a
frente, é uma experiência trans-
formadora: eles são gigantes-
cos, muito maiores do que apa-
rentam nos games anteriores
(que não são de realidade vir-
tual). Os controles funcionam
bem – o arco e flecha é rápido
e preciso –, e as sequências de
alpinismo são de tirar o fôlego.
O melhor jogo de ação em RV
até agora (junto com Half-Life:
Alyx, lançado para PC em 2020).
R$ 299,90. Nota: 9
Horizon: Call of The Mountain

s
ta Star Wars: Contos dos
is
Moss Drums Rock Limites da Galáxia
ev

Você controla um ratinho minúsculo, e tem de re- Imagine um Guitar Hero, só que de bateria – e com baque- Você precisa consertar sua nave e eliminar os invasores.
solver puzzles para atravessar cenários complicados. tas virtuais. O game é divertido e usa bem os controles O game tem alguns bugs, mas os cenários são bonitos (a
R

Os gráficos são altamente convincentes: em alguns
momentos, parece que você está vendo hologramas
flutuando na sua frente. R$ 99,50. Nota: 9
Br
do PS VR2. Mas foi criado por um estúdio pequeno, com
pouca grana para licenciar músicas. Por isso, seu reper-
tório só tem títulos bem obscuros. R$ 104,90. Nota: 6,5
il
as
Terra, vista pela janela da nave, é incrível), e os inimigos,
bem renderizados – parecem pessoas de verdade. Devia
ser mais barato, pois tem só 3h. R$ 264,90. Nota: 7

Kayak VR: Mirage No Man's Sky Pavlov

Passeios virtuais de caiaque em que você pode remar, se
deixar levar pela correnteza ou correr contra outras pes-
soas. O visual impressiona (a água e as montanhas são
quase fotorrealistas). Só tem quatro cenários: Austrália,
Costa Rica, Noruega e Antárctica. R$ 122,90. Nota: 8
O game de exploração espacial, lançado em 2016, agora
também pode ser jogado em RV. Os planetas, com plantas
e animais muito exóticos, ficaram mais bonitos e envol-
ventes. Mas isso não muda o fato de que No Man's é lento,
contemplativo – você ama ou odeia. R$ 299,90. Nota: 8
Primeiro shooter multijogador para o PS VR2. Tem dez
mapas, razoáveis, e as armas são ótimas (usam bem os
gatilhos adaptáveis do controle). Permite jogar online
mesmo com quem não tem o headset. Não é nenhum
Warzone, mas quebra o galho. R$ 133,90. Nota: 6,5

imagens, uma para cada
olho, 90 a 120 vezes por
segundo (Hertz). É bem
mais do que os games
convencionais – que
trabalham entre 30 e 60
quadros por segundo (e
não precisam gerar uma
imagem para cada olho).
Isso demanda bastante
poder de processamento.
E requer um PC muito
potente, que pouca gente
tem. Então os donos de
headset acabam usando
o modo standalone, o que
limita bastante as coisas:
os capacetes da Meta têm
poder de processamento
equivalente ao de um ce-
lular. Deixa os jogos com
cara de Nintendo Wii.
Com o PS VR2, é
diferente. Pois ele é um
acessório para o PlaySta-
tion 5, uma máquina com
poder de fogo: é capaz de
executar 10,3 trilhões de
operações por segundo, ou teraflops
(nove vezes mais do que o chip em-
A realidade butido no Meta Quest 2). O PS5 tem
virtual exige fôlego suficiente para rodar jogos de
RV sofisticados. E a Sony já vendeu 30
bastante poder milhões de unidades do console, ou seja,
há uma base de usuários considerável
de processa- – grande o bastante para convencer os
desenvolvedores a fazerem mais jogos.
mento. E o O segundo fator é o preço. Os ca-
PS5 é capaz pacetes de realidade virtual são caros
porque as telinhas que geram as ima-
de fornecê-lo. gens são pequenas, e é difícil espremer
nelas a quantidade necessária de pixels.

36 super março 2023

 um headset
EUA (US$ 549) quanto no Brasil (R$
4.499). Mas custa a metade do preço
de um headset comparável. E tem ca-
racterísticas, como as telas OLED e as

Resident Evil Village: VR
Resident Evil já assusta. Em realidade virtual, então...
O último game da série, de 2021, pode ser totalmente
jogado em RV. Merecia nota 9, mas tem problemas
técnicos (os movimentos das mãos às vezes bugam,
e a câmera dá pulos atordoantes). R$ 184,50. Nota: 7
de r$ 30 mil?
tecnologias dos controles, que os rivais
não oferecem [veja quadro na pág. 34].
O terceiro elemento são os games.
O PS VR2 foi lançado com 30 jogos, o
que é um bom ponto de partida. Nós
Isso é quanto poderá
testamos os 20 mais relevantes, e o
headset, ao longo de um mês. Quando custar o Reality Pro,
você coloca o aparelho na cabeça e o que estaria sendo
desenvolvido pela Apple
liga pela primeira vez, ele escaneia a
sua sala, para mapear o espaço livre – e pode bater outro
e identificar obstáculos. Aí, determina recorde além do preço.
uma “área segura" para você se movi-
mentar. Para explorar todos os recursos
dos games, é preciso ter no mínimo Segundo a agência de notícias
2x2 metros livres. Nos nossos testes, Bloomberg, que cita fontes
embora a sala tivesse esse espaço, o PS internas da Apple, o headset de
VR2 disse que não era suficiente – e eu realidade virtual da empresa deve-

s
teria de jogar parado em pé, sem poder rá custar US$ 3 mil – ou três vezes
ta
andar. Resolvi o problema configuran-
do manualmente a área segura, e incluí
o preço de um iPhone 14 Pro, nos
is
NFL Pro Era EUA. Transpondo esses valores pa-
uns pedacinhos da sala que o headset
ra o Brasil, onde esse smartphone
ev

Game de futebol americano em que você joga como não havia considerado (você aponta os
quarterback: recebe, arma a jogada e passa a bola para joysticks para o chão e “pinta" a área é vendido por R$ 9.499, chega-
-se ao (assustador) valor de R$
R

alguém fazer o touchdown. A qualidade gráfica é ape- que quer demarcar).

nas ok, e o game é espartano – bem abaixo dos jogos
da Electronic Arts (como Madden). R$ 159,90. Nota: 6
Quando você está jogando, e prestes 28.500. Também de acordo com a
il

a colocar um braço ou perna para fora Bloomberg, o aparelho está sendo

as

da área segura, o headset mostra um desenvolvido há mais de sete anos,

alerta visual: ele vai abrindo um buraco, e terá resolução de 4.000x2.000
Br

naquele ponto, sobre a imagem do jogo pixels por olho – com um total
(quanto mais perto você chega de atra- de 16 milhões de pontos, o dobro
vessar a fronteira, maior aquele buraco
de qualquer outro headset (veja
vai ficando). Esse sistema passa bas-
tante segurança, e funcionou de forma quadro na pág. 34). Ele suposta-
Cities VR - Enhanced Edition exemplar nos testes – não esbarrei nem mente poderá ser conectado sem
tropecei em nada durante todo o mês. fios a um iPhone, iPad ou Mac,
SimCity, só que em realidade virtual: você constrói a ci-
dade colocando as estruturas com as mãos. Também dá O headset não é nenhuma pluma: e terá dois modos de operação:
para voar por dentro dela, vendo tudo bem de pertinho, pesa 560 gramas. Mas depois que você além de realidade virtual, também
ao rés do chão. O problema são os controles lentos e pega o jeito (apoiando a parte de trás dele possuirá funções de realidade
frustrantes, que dificultam as coisas. R$ 159,90. Nota: 6 na protuberância occipital, a “ponta" na aumentada – em que o headset
base do crânio), fica confortável. As telas projeta informações sobre objetos
As telas dos melhores Nos jogos OLED são excelentes: geram imagens reais do ambiente (como nos
headsets têm 800 a 900 em RV, o de altíssimo contraste, o que contribui
console (ou óculos Hololens, da Microsoft).
ppi (pontos por polegada), muito para a sensação de imersão – em
o dobro de um iPhone 14, PC) precisa cenas sem luz, você realmente tem a Sua apresentação é esperada para
por exemplo. As lentes renderizar
sensação de estar no escuro. junho, quando a Apple realiza o
duas ima- WWDC (Worldwide Developers
que ampliam essa ima- gens inde-
Todos os capacetes de realidade vir-
gem, fazendo com que tual sofrem de um fenômeno chamado Conference, seu principal evento
pendentes,
ela preencha o seu campo uma para screen door effect: é como se você es- anual). Segundo a Bloomberg, a
de visão, são igualmen- cada olho, tivesse vendo as imagens através de empresa também pretende lançar
te caras – e os headsets e atuali- um mosquiteiro bem fino, cobertas por um modelo menos caro, de US$
também têm uma série de zá-las pelo uma malha de pontinhos (na verdade, 1.500, mas ele só ficará pronto
câmeras e sensores em- menos 90 eles são os espaços entre os pixels, que se em 2024 ou 2025.
butidos. O PS VR2 não vezes por tornam visíveis porque as lentes am-
é nada barato, tanto nos segundo. pliam muito a imagem). Como tem mais
→
março 2023 super 37
 resolução do que os concorrentes, o PS
VR2 reduz muito esse fenômeno (nele
o efeito parece uma textura, levemen-
te áspera, sobre a imagem). Mas não o
elimina. Isso, talvez, só com o headset
da Apple [leia na pág. 37].
O PS VR2 é conectado ao PlaySta-
tion por um único cabo, do tipo USB-C.
Ele é bem grandão, tem 4 metros, e não
atrapalha. O headset usa uma peça de
borracha para impedir a entrada da luz
ambiente. Funciona muito bem, e não
aperta o rosto. As lentes também são
boas, com um porém. A Sony usou um
tipo chamado lente de Fresnel [veja in-
fográfico na pág. 35], que tem uma vanta- Gran Turismo 7
gem e uma desvantagem. A vantagem é
que essas lentes não deformam a ima-
gem nos cantos (não causam o efeito
“olho de peixe" das lentes comuns). A
desvantagem é que elas não conseguem
dar 100% de foco em toda sua área;

s
só no meio. Nos cantos da imagem, os
detalhes mais finos ficam levemente
borrados. O efeito é mais visível com
ta
is
certos elementos, como texto – durante Zombieland: Headshot Fever Jurassic World Aftermath
ev

os jogos, você não nota muito. Depois Zumbis avançam na sua direção, e você tem de atirar Se passa numa estação de pesquisa genética onde os
de alguns dias, o seu cérebro se acos- neles. O jogo é supersimples: você não precisa nem an- dinossauros saíram do controle – e todos os funcio-
R

tuma, e você não percebe mais. dar, basta apertar um botão para ir progredindo pelos nários fugiram, menos você. Os dinos e os cenários
Isso também aconteceu, durante os cenários. Mas é divertido, com personagens engraçados são desenhados no estilo cel shading, que lembra uma
e boas variações de gameplay. R$ 133,90. Nota: 7 história em quadrinhos. R$ 159,90. Nota: 7
il

testes, com o grande bicho-papão da

as

realidade virtual: o enjoo de movimento.

Ele é causado por uma divergência entre
Br

o que os olhos estão vendo e o labirinto

(uma estrutura do ouvido que detecta
movimentos) está sentindo. Quando
você está em um navio, por exemplo,
os seus olhos veem o chão dele para-
do. Mas o labirinto capta o balanço da The Last Clockwinder Thumper
embarcação, que está se mexendo. É Um besouro atravessa cenários futuristas
Você instrui um batalhão de robozinhos, que copiam
esse conflito que – por motivos que a os seus gestos, a resolver uma série de puzzles. A apre- voando em altíssima velocidade, e você de-
ciência ainda não sabe explicar – pode sentação visual é ótima, com gráficos bem bonitos. ve guiá-lo desviando de obstáculos. O visu-
desencadear tontura e enjoo. Mas falta um tutorial mais completo, que realmente al é espetacular, com cenários gigantescos.
A mecânica de jogo começa simples, mas vai ficando
Eu nunca tenho enjoo de movimento. ensine como se joga (a maioria das pessoas vai acabar
desistindo). R$ 133,90. Nota: 6 mais complexa e interessante. R$ 104,90. Nota: 9
Mas, nas primeiras horas de PS VR2,
ele me pegou. O culpado foi o jogo Star
Wars. Ele vem configurado para usar um
tipo de deslocamento chamado “tele-
portação": em vez de usar a alavanca do
joystick para andar pelos cenários do
game (algo necessário, já que eles são
muito maiores do que qualquer sala),
você aponta para onde quer ir e aperta Startenders:
Song in the Smoke: Rekindled Bartending Intergaláctico
um botão. É um método comum em
jogos de RV, porque reduz o risco de Você atravessa matas e cavernas catando pedras e Você trabalha em um bar no espaço, e tem de montar
enjoo. Crente de que nada aconteceria, pedaços de madeira, que usa para fazer tacapes e os drinques pedidos pelos clientes, misturando os in-
desliguei esse modo e usei o movimen- lanças e se defender de animais selvagens. Os gráficos gredientes com rapidez e sem errar. É meio difícil no
são apenas ok; estão alguns degraus abaixo de games começo, mas, depois que você pega o jeito, fica mais
to “livre". Rapidamente fiquei enjoado. como Horizon (leia texto na pág. 36). R$ 159,90. Nota: 6 acessível. E bem divertido. R$ 79,90. Nota: 8
O enjoo se concentrou em dois

38 super março 2023


Existem outros games de
corrida em realidade virtu-
al – mas nenhum tem os
gráficos e a quantidade de
conteúdo de GT7. Todas
as pistas e os mais de 400
carros estão disponíveis em
RV. Você pode jogar usando
o controle do PS5 (fica legal),
mas o ideal é usar volante e
pedais: testamos com um
Logitech G923 (R$ 2.699 em
logitechstore.com.br), com
resultados sensacionais.
O G29, mais acessível (R$
1.799), também é uma boa.
R$ 299,90. Nota: 9
100
novos jogos,
além dos já
lançados,
estão em de-
senvolvimento.
Mas a lista ain-
da não inclui
os títulos mais
importantes.
títulos, Star Wars e Song
in the Smoke. É que os ou-
tros games são mais in-
teligentes: em situações
de movimento brusco,
eles reduzem automa-
ticamente o seu campo
de visão. É só um pou-
quinho, você mal nota –
mas já basta para evitar o
enjoo (pois os seus olhos
passam a ter um ponto
de referência estático,
um contorno parado, em
volta da imagem em mo-
vimento). Alguns games,
como Horizon: Call of the
A biblioteca caro (e ainda não haverá
de lançamen-
usuários de PS VR2 em
to é boa. Mas
o PS VR2 vai
quantidade suficiente
precisar de para que a Sony recupere
mais títulos o valor investido). Esta-
exclusivos, mos falando de jogos em
de alto realidade virtual de fran-
Demeo orçamento, quias como The Last of Us,
para ganhar Spider-Man, God of War,
É um RPG de tabuleiro com cartas, ao estilo Dungeons & mercado. Uncharted. Por enquanto,
Dragons. Vai agradar a quem gosta desse tipo de jogo.
Os tabuleiros são muito elaborados, parecem maquetes
nada disso foi anuncia-
3D. Dá para jogar online com outras pessoas, mesmo virtual, de tamanho ajus- do. Títulos importantes
se elas não tiverem um PS VR2. R$ 214,90. Nota: 7 tável, flutuando a uns 2,5 de terceiros, como a série
metros de distância de de tiro Battlefield e o jogo
você. Até que fica legal da Fórmula 1 (que desde
(especialmente com ga- o ano passado roda em
mes de tiro). Mas óbvio realidade virtual, mas
que, para tirar proveito só no PC), da produtora
do headset, é essencial Electronic Arts, também
ter jogos em RV. Dos 20 seriam vitais – mas não
títulos que nós testamos, estão confirmados.
Tetris Effect: Connected só três são exclusivos O futuro do headset
s
Versão em RV desse game, lançado em 2018. A me- do PS VR2: Horizon, da Sony, e da própria in-
cânica de jogo é a mesma. A diferença é que, aqui, a
"caixa" de Tetris aparece imersa em cenários 3D muito
ta
Gran Turismo 7 e Resi-
dent Evil Village (os dois
dústria de RV, depende
deles. Tomara que acon-
is
envolventes (as fases na Lua e embaixo do mar são
últimos ganharam mo- teçam. Porque a realida-
especialmente impressionantes). R$ 214,90. Nota: 9
ev
dos RV para o capacete de virtual eleva os games
da Sony). Os outros já a outro patamar. Gran
R
existiam em outras pla- Turismo 7, por exemplo,
taformas. Horizon, GT7 é de longe a experiência
il
e Resident Evil têm grá- mais impressionante da
as
ficos sofisticados, que nova geração de consoles.
exploram bem a po- Jogado com um volante,
Br
tência do PlayStation 5. ele se torna tão envol-
Rez Infinite Star Wars, Kayak VR, Moss, vente que você chega a
Thumper e No Man's Sky esquecer que está com o
Tem um modo de jogo em que você mira nos inimigos
simplesmente olhando para eles (não precisa usar a também impressionam capacete de RV.
alavanca do joystick). Isso é legal. Mas não o suficiente pelo visual. Os restantes Um dia, perto do final
para redimir o game, que é um cult – mas tem gráfi- são mais simples – fica de Horizon, o PS VR2 co-
cos datados e inimigos bobinhos. R$ 159,90 Nota: 6 evidente que se trata de meçou a mostrar alertas
conversões de jogos do de que não estava con-
Meta Quest. Mas, no seguindo rastrear a sa-
Mountain, também empregam outras conjunto, o pacote ini- la. Ignorei até que eles
técnicas, como o movimento sincro- cial de títulos é bom. ficaram críticos, a ponto
nizado: para andar, você mantém dois O destino do PS VR2 de o PlayStation inter-
botões apertados e aí mexe os braços, vai depender do que virá romper o jogo. Deve ser
como se estivesse andando mesmo. Is- depois – há 100 títulos um bug, pensei. Não era.
so tranquiliza o labirinto, pois indica em desenvolvimento pa- Ao tirar o headset, vi o
ao corpo que você está se deslocando. ra ele, com lançamento que tinha acontecido. Já
E evita o enjoo. Outra medida eficaz é nos próximos anos. era noite, e a sala estava
colocar um ventilador na sua frente: a O headset vai precisar totalmente escura. Achei
brisa fornece um sinal de movimento de blockbusters exclusi- que estivesse jogando
ao organismo. Após alguns dias fazen- vos, em que os estúdios há uns 40 minutos;
do isso, não tive mais nenhum enjoo da Sony colocam todo percebi, espantado, que
– inclusive nos games que antes eram o seu esforço. Num pri- havia passado as últimas
mais problemáticos. meiro momento, a em- quatro horas ali. Total-
Se você tentar rodar um game nor- presa pode até perder mente fora do mundo –
mal, que não é de RV, o headset entra dinheiro com eles, já que e imerso, como nunca,
no “modo cinemático": exibe um telão o desenvolvimento custa em outra realidade. S
março 2023 super 39
 biologia

O
O Cordyceps de The Last of Us é inspirado em
um parasita real – que não infecta pessoas, mas
transforma insetos em zumbis. Saiba como ele faz
isso, e entenda como vivem os fungos: seres que
desempenham um papel vital na natureza.

intrincado
s
ta
is
ev
R
il
as
Br

40 super março 2023

reiNo
Texto Leonardo Caparroz
e Rafael Battaglia
Ilustração Tayrine Cruz
Design Juliana Krauss
Edição Bruno Vaiano

dos
s
ta
is
ev
R
il
as
Br

março 2023 super 41


O parasita se instala
no cérebro. Muitos dos
doentes tentam escon-
der as marcas da conta-
minação, numa tentativa
de adiar o (triste) destino.
Outros não pensam duas
vezes: se matam antes que
ele se espalhe – e as coi-
sas piorem de vez.
Em um ou dois dias, as
vítimas perdem a consci-
ência e se tornam agres-
sivas, atacando e conta-
giando qualquer um que
estiver pela frente. Mas
esse estágio não dura para
sempre. Uma hora esses
zumbis sentem que vão
morrer. Então procuram
um lugar úmido e escu-
ro, que servirá de túmulo.
Nesse ambiente, o parasi-
ta continua a crescer, se
alimentando do corpo e
liberando esporos para
infectar os desavisados
que passarem por ali.
Essa é a ameaça que
toma conta do planeta
em The Last of Us, game
lançado em 2013 e que
agora, dez anos depois,
42 super março 2023
virou série da HBO. Na
história, o contrabandista
is
Joel e a jovem Ellie (inter-
ev
pretados por Pedro Pascal
e Bella Ramsey) percor-
R
rem os EUA em meio
ao apocalipse zumbi. A
il
missão de Joel é levar
as
Ellie em segurança até o
outro lado do país, onde o
Br
sangue da menina poderá
ser usado para desenvol-
ver uma cura – ela, por
uma razão desconhecida,
é imune à doença.
A trama pode parecer
similar à de outras histó-
rias do gênero. Mas, lo-
go de cara, The Last of Us
apresenta um elemento
inovador: a infecção que
gerou o apocalipse não
começou com um vírus
– mas sim com um fungo.
O israelense Neil Dru-
ckmann, criador do jogo
e da série, teve essa ideia
enquanto assistia a Plane-
ta Terra (2006), uma série
documental sobre vida
selvagem da BBC. O oi-
tavo episódio mostra um
fungo parasita assumindo
o controle do corpo de uma formiga.
O fungo em questão pertence ao
gênero Cordyceps – ou melhor, Ophio-
cordyceps (o nome mudou após uma
revisão de taxonomia, em 2007). Esse
gênero engloba centenas de espécies, e
ao menos 35 delas são parasitas capazes
de alterar o comportamento de seus
hospedeiros, que são insetos: besouros,
borboletas, percevejos, vespas…
O alvo mais comum são as formigas.
Cada Ophiocordyceps ataca uma espécie
– no caso do Ophiocordyceps unilateralis,
inspiração direta de Druckmann para
The Last of Us, é a formiga-carpinteira
(veja o infográfico ao lado). Tudo co-
meça quando a formiga dá o azar de
caminhar sobre um campo minado de
esporos, a célula reprodutiva dos fun-
s
gos. Eles têm o diâmetro de um fio de
ta
Chytridio- cabelo, ficam espalhados pelo solo da
floresta e germinam pequenas estru-
mycota turas grudentas, que usam para aderir
Um dos cinco
nas suas próximas vítimas.
principais filos
do reino Fungi. Uma vez que o esporo está colado na
Suas mil espécies formiga, ele usa uma combinação de
são, na maioria, enzimas digestivas e força bruta para
aquáticas. Seus penetrar no exoesqueleto (a “casquinha”
esporos têm fla-
do inseto). Uma vez lá dentro, é puro
gelos (“rabinhos”
para locomoção, caos. O fungo se multiplica em célu-
como os esper- las que flutuam pelo corpo da vítima
matozoides). e passam a comandar seus movimen-
tos com pequenos sinais bioquímicos.
Seus músculos se tornam marionetes.
O bichinho abandona os seus afaze-
res e escala uma planta próxima, onde
finca as suas mandíbulas no miolo de
uma folha – fenômeno conhecido como
“aperto da morte”.
A essa altura, 40% do corpo da for-
miga já foi tomado pelo Ophiocordyceps.
Só do corpo: na vida real, o fungo não
ataca o cérebro – o oposto do que acon-
tece com os humanos da série. Os co-
mandos vão direto para as pernas ou
a mandíbula.
A formiga morre ali mesmo, fincada
na planta e consumida pelo fungo, que
usa os nutrientes da carcaça para cres-
cer. Em até dez dias, um talo irrompe da
cabeça do animal: é o chamado “corpo
frutífero” do Ophiocordyceps, que vai
liberar mais de 300 mil esporos lá de
A formiga Como o Ophiocordyceps,
gênero de fungo que
cima, prontos para infec- entre 2,2 milhões e 3,8
inspirou The Last of Us,
-zumbi controla insetos.
tar novas vítimas.
É por isso que a for-
milhões. Não é só a va-
riedade que é grande.
miga caminhou até o alto O tamanho, também: o
de uma planta e fincou- maior organismo vivo
1. se ali: para que o fungo
pudesse espalhar melhor
conhecido é um fungo.
O Armillaria ostoyae vive
Campo minado
A espécie Ophiocor- suas células reprodutivas. entre as raízes de árvores
dyceps unilateralis Dominado pelo parasita, em uma área de 10 mil
ataca formigas-car- o inseto agia para o bem km² (mais de mil campos
pinteiras. A infecção dele. Mais do que isso. de futebol) numa floresta
começa quando o
inseto passa por um
Seu corpo tornou-se do estado do Oregon, no
solo cheio de esporos parte do Ophiocordyceps. norte dos EUA.
(células reprodutivas O fungo não é capaz de Esse modo de vida pa-
do fungo). dizimar uma colônia in- rece exceção, mas é a re-
teira, diga-se. Em compa- gra. Embora nós sejamos
2. ração com o número total
de formigas que vivem
mais íntimos dos fungos
que fazem cerveja e estra-
Show de em um formigueiro (até gam pão, eles vivem, prin-

s
marionetes 500 mil), são poucas as cipalmente, no subsolo,
O esporo adere à
formiga, invade seu
ta
que saem pela floresta e
podem acabar se infec-
onde decompõem matéria
orgânica e desempenham
is
corpo e se multiplica
em células parecidas tando. Elas não levam a um papel vital para a so-
ev

com leveduras de doença de volta para casa. brevivência de quase to-

cerveja, que se Nem atacam suas com- das as espécies de plantas.
espalham pelo inseto
R

panheiras como zumbis. Vamos entender a história

e começam a dar co-
mandos bioquímicos
O modus operandi dessa relação.
il

a seus músculos. do Ophiocordyceps é só

as

uma amostra do que Era tudo mato fungo

3. o reino Fungi reserva. Desvendar a jornada

Br

A variedade é enorme: dos fungos na Terra é

são 150 mil espécies co- difícil principalmente
Cavando a
própria cova nhecidas, mas estima-se porque fósseis são ra-
A formiga-zumbi, que possam existir algo ros. “A estrutura deles
sem vontade própria,
larga seus afazeres,
escala uma árvore e
finca sua mandíbula
no miolo de uma
folha. Lá, ela morre.

4.
Fábrica de Zygomycota
esporos
Em dez dias, um talo Esses fungos não
irrompe da cabeça têm esporos –
da formiga. É o reproduzem-se
corpo frutífero do quando duas hi-
fungo, que vai liberar fas se encontram
esporos lá de cima e se fundem num
da planta – o melhor orgão chamado
ponto de partida para zigosporângio,
eles se espalharem. E que dará origem
o ciclo recomeça. a um novo indi-
víduo. Eles são o
bolor da comida
estragada.

março 2023 super 43

 Anatomia As 150 mil espécies já
descritas são bem variadas.
Mas há características que
de um fungo (quase) todos os membros
desse reino possuem.
Esporocarpo
É o “corpo frutífero”
do fungo, ou seja, o
local onde os esporos são
produzidos e dispersados.
O cogumelo é o tipo mais
famoso dessa estrutura,
mas só 13% das espécies
de fungo geram a famosa
haste com chapeuzinho.
as
Br
Micélio
É o corpo do fungo:
uma rede de bilhões de
hifas interconectadas
e ramificadas, que se
expande no solo (ou
num pãozinho) para se
alimentar. O micélio
cresce desviando de
obstáculos e reage a
ameaças e mudanças de
umidade, por exemplo.
44 super março 2023
se decompõe muito mais
rápido que ossos ou pe-
nas, por exemplo. Nesse
quesito, são criaturas
efêmeras”, explica Ma-
ria Alice Neves, profes-
sora do Laboratório de
Micologia (Micolab) da
Universidade Federal de
Esporos Santa Catarina (UFSC).
São as células reprodu- Micologia é, como você
tivas dos fungos. Eles se
combinam com outros deve estar imaginando,
esporos de genoma o campo da ciência que
idêntico (reprodução estuda fungos. Mykes, em
assexuada) ou diferente grego, significa “fungo”.
(sexuada). Os fungos A hipótese mais aceita
dispersam milhões deles
pelo ar: nós inalamos é a de que o ancestral co-
até dez esporos toda mum de todos os fungos
vez que respiramos. viveu há 1,5 bilhão de
s
anos, na água. As suas
ta células tinham flagelos
– “rabinhos” usados para
is
propulsão, como em um
ev
espermatozoide –, uma ca-
racterística que acabou se
R
perdendo na maior parte
das espécies desse reino.
il
Esses flagelos passa-
ram um bom tempo na-
dando por aí: o primeiro
registro de um fungo ter-
restre data de “só” 635 mi-
lhões de anos atrás, quase
um bilhão de anos após
a origem dessas criatu-
rinhas no mar. Naquela
época, o ambiente ter-
restre era seco, repleto de
rochas e minerais. Poucos
eram os indivíduos que
se aventuravam a viver
ali, caso das cianobacté-
rias (bactérias capazes de
fazer fotossíntese).
A chegada dos fungos
à terra firme foi essencial
Hifas para o próximo grupo
Os tijolos básicos que tentou a vida no seco:
da construção do as plantas, 600 milhões
fungo: tratam-se de de anos atrás. As algas
minúsculos filamentos,
formados por céulas que deram origem aos
cilíndricas que podem vegetais terrestres não
ter mais de um núcleo. tinham raízes, o que as
As hifas liberam as
enzimas digestivas e
absorvem nutrientes.
impedia de extrair nutrientes na su-
perfície. Além disso, não conseguiam Glomero-
armazenar ou transportar água por seus mycota
corpos. Como resolver esse problema? É o filo dos fungos
A saída foi se associar aos primeiros micorrízicos, que
fungos terrestres. Esses pioneiros eram se associam a
plantas. 90% das
capazes de fornecer água e nutrientes espécies vegetais
extraídos das rochas, como fósforo e dependem deles
nitrogênio, importantes para o processo em algum grau
de fotossíntese. Tiravam leite de pedra. para conseguir
Em troca, as plantas os alimentavam água e nutrientes.
fornecendo o carboidrato que pro-
duziam com a energia do Sol. Todos
saíam ganhando.
Fungos podem não gerar a própria
comida, como as plantas – nem caçá-la,
como os animais –, mas compensam
sendo excelentes decompositores. En-
quanto a nossa digestão acontece dentro

s
do corpo, a dos fungos se dá fora: ao
encontrar alimento, eles liberam enzi-
mas, absorvem os nutrientes de que
ta
estão nos dez primeiros que formam cogumelos
is
precisam e deixam o que sobrou para centímetros de solo do em algum momento do
ev

trás, livre para outros organismos. planeta equivale à metade seu ciclo de vida. Essas
De ínicio, os ancestrais dos cogume- da largura da Via Láctea estruturas são o chamado
R

los eram ótimos em tirar o pão de cada (4,5 x 1017 km). “corpo frutífero”: a parte
dia das rochas e usá-lo no escambo com Os fungos, então, são responsável por produ-
il

as plantas. Mas logo a capacidade de ex- responsáveis por uma zir e dispersar esporos,
as

20
trair nutrientes do mundão se expandiu. pulsante vida subterrânea. as células reprodutivas.
Surgiram espécies capazes de decom- O primeiro passo para Há cogumelos de diver-
Br

por celulose e, mais tarde, lignina (uma
substância muito resistente que confere
rigidez à parede celular das plantas).
Foram os fungos que formaram o solo
da Terra, desfazendo rocha e matéria
orgânica ao longo de milhões de anos.
Graças a esses fungos, as plantas mor-
tas passaram a se tornar alimento para
novas plantas e qualquer outro orga-
nismo que quisesse as sobras. Com os
vegetais estabelecidos em solo fértil, se
nutrindo da reciclagem de plantas mais
antigas, a atmosfera ganhou um reforço
de oxigênio – e os animais puderam,
finalmente, sair da água. Valeu, fungos.
Hoje, mais de 90% das espécies vege-
tais dependem de fungos que se associam
a elas, os chamados fungos micorrízicos
– “rízicos” porque ficam nas raízes. Eles
estão por toda a parte: constituem até
metade da massa viva do solo. O com-
primento total das hifas (os filamentos
de células que formam os fungos) que
entender como as coisas
funcionam lá embaixo é
analisar a principal estru-
tura deles (e que, na ver-
dade, é a essência desses
mil fungos seres): o micélio.
formam
cogumelos Uma grande rede
para se
reprodu- Se alguém te pedir para
zir. Mas desenhar um fungo, é
eles são bem provável que você
só uma esboce um cogumelo. A
fração das aparência poderia variar
cerca de
150 mil es- (dos coloridos que apare-
pécies co- cem no Super Mario aos
nhecidas. que boiam no estrogonofe
do quilo). Mas a estrutu-
ra básica não fugiria de
uma haste vertical com
um chapeuzinho no topo.
Você não estaria er-
rado, claro. Existem 20
mil espécies de fungos
sos tamanhos e forma-
tos, alguns até brilham
no escuro. E por serem
facilmente reconhecíveis,
acabaram se tornando si-
nônimo de fungo.
Acontece que esses 20
mil representam só 13%
das espécies já identifi-
cadas. Cogumelos não
são universais. O que
os fungos têm todos em
comum é uma estrutura
oculta que, mesmo naque-
les que possuem cogume-
los, ainda representa a
maior parte do seu corpo:
o micélio, o emaranhado
de hifas que, a partir de
bilhões de conexões entre
si, vão atrás de alimento,
detectam ameaças e cres-
cem sem parar.
 A maior parte do mi-
célio fica escondida no
substrato no qual o fun-
go se instalou. Pode ser
a terra, um pedaço de
madeira, um pão, uma
formiga-zumbi… Uma
vez estabelecido, o mi-
célio começa a se espa-
lhar. Em geral, os fungos
crescem formando uma
esfera no subsolo; ex-
pandem-se para todos
os lados ao mesmo tempo
a partir do epicentro. É
uma maneira eficiente de
encontrar comida, já que
ele não precisa escolher
um único caminho para
seguir (ele segue todos,
para desespero do Waze).
Quando o micélio
encontra uma fonte de
alimento, o padrão de
crescimento muda. Em
poucos dias, a trama de
hifas para de se espalhar e
se concentra em um único
ponto (a comida). O fungo
é uma rede de células que
cresce em volta do rango
em vez de se locomover
46 super março 2023
na direção dele, como fa-
zem os animais. O “corpo”
fúngico não tem forma
fixa: é uma estrutura em
constante atualização, que
ganha formas novas para
alcançar novos objetivos.
“Micélios vivem em
labirintos e evoluíram
para resolver problemas
espaciais e geométricos”,
descreve o cientista bri-
tânico Merlin Sheldrake
no livro A trama da vida:
como os fungos constro-
em o mundo. “Escolher
a forma de distribuir os
seus corpos é uma ques-
tão que eles enfrentam a
cada momento.”
Os fungos podem criar
redes densas, com mais
conexões, para facilitar
o transporte de água,
R
oxigênio e nutrientes.
Mas, na maior parte do
il
tempo, as redes são mais
as
dispersas e finas (até cin-
co vezes menores que um
Br
fio de cabelo), voltadas à
exploração. As hifas que
vão na ponta, abrindo
Basi-
diomycota
O nome vem
do basídio, a
estrutura onde os
esporos deste filo
são produzidos.
Aqui estão as
espécies que for-
mam cogumelos:
os basídios ficam
embaixo do
“chapéu”.
Agradecimentos João Araújo, pesquisador e curador em micologia do Jardim Botânico de Nova York.
caminho, são fortes o suficiente para
perfurar plásticos resistentes (se ti-
vessem a largura de uma mão huma-
na, poderiam levantar um ônibus de
oito toneladas).
É um comportamento único. Enquan-
to a maioria dos organismos multice-
lulares cresce formando camadas e
camadas de células (vide você mesmo,
3,8
com epiderme, derme, as paredes dos
vasos sanguíneos e do intestino etc.), as
hifas vão ficando mais longas. Nas con-
dições certas, um micélio pode crescer
indefinidamente, e um único fragmento
dele é capaz de regenerar o fungo por
milhões de completo. “Eles são potencialmente
espécies imortais”, escreve Sheldrake.
de fungos Para tomar decisões, os fungos são ca-
podem
s
existir, pazes de detectar vários estímulos ao seu
mas nós
só classi-
ta redor. Eles são sensíveis a temperatura,
umidade, texturas, luz e campos elétricos.
is
ficamos Mas, assim como as plantas, são organis-
ev
150 mil até mos descentralizados: não possuem uma
agora.
CPU que organiza as ideias e a tomada
de decisões. Afinal, como eles fazem o
que fazem sem um cérebro?
A resposta curta é: ainda não sabemos
exatamente. Alguns usam impulsos elé-
tricos para compartilhar e processar
informações, numa dinâmica parecida
com a das células nervosas dos animais.
Mas não dá para cravar os detalhes
dessa comunicação.
Para Sheldrake, investigar o compor-
tamento dos fungos nos faz reavaliar
a própria definição de inteligência, que
tradicionalmente é muito “humano-
cêntrica” – gira em torno da maneira
como nosso cérebro resolve as coisas.
“Fungos são organismos que recebem e
processam informações de seu ambien-
te, solucionam problemas, adaptam-se a
novas situações e fazem escolhas”, dis-
se o autor, em uma entrevista à revista
Scientific American. Como dizer que isso
não é um comportamento inteligente?
Fauna, flora e funga
Numa manhã de agosto de 1928, Ale-
xander Fleming acordou frustrado. O
pesquisador escocês, que trabalhava
no laboratório do Hospital St. Mary,
em Londres, investigou por dias uma
cultura de Staphylococcus aureus, bactéria
capaz de gerar infecções graves. Mas
toda a sua pesquisa se perdeu quando
a placa com os micro-organismos foi
tomada por mofo.
Em vez de jogar o acidente no lixo,
Ascomycota
Fleming resolveu analisar o mofo. Ele As 64 mil espécies
deste filo arma-
pertencia à espécie Penicillium notatum zenam os seus
– e, de alguma forma, havia matado as esporos em saqui-
bactérias da placa. Fleming notou que nhos – os ascos.
o fungo secretava uma substância que É o filo de fungos
impedia a produção de moléculas que famosinhos, como
o Ophiocordyceps,
formam a membrana em torno da bacté- a levedura que faz
ria. Sem manutenção, o envoltório delas cerveja e as trufas,
ficava cada vez mais fino – até estourar. uma iguaria
Fleming tinha acabado de descobrir gastronômica.
a penicilina, o primeiro antibiótico da

s
história. Uma década depois, cientistas
de Oxford desenvolveram um método
para cultivar o mofo e obter uma versão
ta
chumbo, mercúrio e até Barreto, presidente da
is
purificada da substância – que entrou materiais radioativos. Sociedade Brasileira
ev

em ação imediatamente, ajudando os O reino Fungi parece de Micologia.

feridos da 2ª Guerra. Desde então, es- ser a resposta para uma Para combater esse pro-
R

tima-se que a penicilina tenha salvado miríade de problemas, blema, em 2017, um gru-
mais de 200 milhões de vidas. mas, infelizmente, a ci- po de cientistas propôs a
il

Esse é o exemplo mais manjado de ência sobre esses seres adoção do termo “funga”
as

como os fungos podem ajudar a resolver ainda engatinha. para se referir ao reino

90
problemas nossos. Não faltam aplica- “Não há uma lista ver- dos fungos. Seria uma
Br

ções. Pesquisas com algumas espécies melha que mostre quais
(inclusive do gênero Ophiocordyceps) fungos estão ameaçados
buscam desenvolver remédios anti- de extinção; eles não
virais e para o tratamento de câncer. aparecem em nenhuma
Outros estudos focam na psilocibina, o política pública de con-
princípio ativo dos cogumelos alucinó- por servação da biodiversi-
genos, e no seu potencial para atenuar cento das dade”, diz Ricardo Dre-
quadros de depressão. espécies chsler-Santos, da UFSC.
Fungos também podem ser alterna- vegetais Esse apagamento se
dependem
tivas sustentáveis. Na indústria têxtil, de fungos manifesta até no lugar
já há empresas que usam micélios para que se que os fungos ocuparam,
fazer um material semelhante ao couro. associam até 1969, na taxonomia:
Na construção civil, há quem pesquise a elas: os eram classificados como
a aplicação prática de tijolos feitos com chamados um puxadinho do reino
“micor-
micélio compactado. O material, leve rízicos”, das plantas. “Histori-
e resistente, pode substituir em parte instalados camente, a micologia é
as produções de aço e cimento, que nas raízes. colocada sob o guar-
são responsáveis por cerca de 10% das da-chuva da botânica
emissões de gás carbônico do mundo. – o que não faz sentido:
A ajuda no combate à crise climática fungos não têm nada a
não para aí. Existem espécies capazes ver com plantas. São,
de decompor poluentes e limpar áre- inclusive, mais próximos
as contaminadas por petróleo, arsênio, dos animais”, diz Robert
forma de popularizar o
assunto, já que combina
com “fauna” e “flora”. E um
passo rumo à indepen-
dência dessas criaturas
no imaginário popular e
nos laboratórios.
Afinal, esse terceiro
reino representa uma
maneira única de orga-
nização da vida – uma
que, justamente por fugir
do óbvio, pode esconder
soluções para problemas
contemporâneos. A pe-
nicilina foi só o começo:
em desafios científicos
e tecnológicos para os
quais os cérebros huma-
nos centralizados ainda
não veem saída, a ordem
caótica dos micélios po-
de fornecer respostas. S

março 2023 super 47

 saúde

qual é a Dos

prÍ- R
ev
is
ta
s

ON
il
as
Br

Texto Maria Clara Rossini Edição Alexandre Versignassi

Ilustração Sharisy Pezzi Design Luana Pillmann

48 super março 2023

 f
Fininho, sem cor e de aparência pouco
apetitosa. Assim era o hambúrguer que
John Gummer, então ministro da Agri-
cultura do Reino Unido, mordeu diante
das câmeras em 1990. “Absolutamente
delicioso”, exclamou após oferecer o
lanche também para sua filha, de quatro
anos de idade. Tirando os nutricionis-

s
tas que poderiam problematizar aquela
ta escolha alimentar para a criança, pouca
gente veria algo de errado na cena.
is
Isso se o país não estivesse passando
ev

por um surto de Encefalopatia Espon-

giforme Bovina (BSE), mais conhecida
R

como doença da vaca louca. Ela é ca-

racterizada pela formação de buracos
il

no cérebro do gado – deixando a massa

as

cinzenta com o aspecto de uma esponja.

A morte vem em alguns meses.
Br

Naquela época, não se sabia se a do-

eles são os únicos agentes
infecciosos que não possuem
material genético. Fazem buracos
no cérebro e provocam algumas
das enfermidades mais raras do
mundo – todas fatais. veja o que
já se sabe sobre os causadores
da doença da vaca louca.
ença podia ser transmitida para hu-
manos por meio do consumo de carne
contaminada. Gummer queria provar
aos britânicos que o alimento era se-
guro – mas a atitude do ministro gerou
mais escândalo do que um presidente
sem máscara durante a pandemia. Seis
anos depois, surgiu o primeiro caso de
encefalopatia espongiforme em huma-
nos causada pela ingestão de carne de
animais infectados. Desde então, 178
britânicos foram vítimas da doença.
Ela não é causada por um vírus,
bactéria ou verme. E sim por príons:
uma das partículas mais misteriosas
que existem. Nem dá para se referir
aos príons como “seres”, já que sequer
têm material genético. São apenas pro-
teínas com uma habilidade simples e
única – mas que as torna letais para
quem entra em contato com elas. Veja
o que já descobrimos sobre esse agente
infeccioso, numa história que envolve
sono, genética… e canibalismo.

março 2023 super 49

As famílias que não dormem
Giuseppe não conseguia mais dormir.
UmA inFeCção difereNTe os príons são os únicos agentes infecciosos que não
possuem material genético. veja como eles atuam.

Por volta dos seus 60 anos de idade,

o italiano passou a sofrer com uma Em condições Em casos Nosso Quando Esses

1 2 3 4 5
normais, nos- raros, as cé- corpo tem príons agregados se
insônia terrível. Não pregava mais o so organismo lulas passam mecanismos encostam acumulam
olho. Suava sem parar na cama, e logo produz uma a produzir para corrigir em proteínas nos tecidos
febres passaram a acompanhar as noites proteína uma versão ou destruír normais, nervosos,
despertas. Um médico o diagnosticou chamada deformada proteínas mudam a impedindo
com malária e receitou um remédio – PrPc. Ela está dessa malfeitas. estrutura sinapses e
relacionada proteína: Mas o príon, delas – causando a
que não fez efeito algum. O italiano às sinapses e o príon. em especial, tornando-as morte dos
morreu pouco tempo depois. proteção dos tem uma novos príons. neurônios.
Giuseppe viveu em Veneza no início neurônios. Proteína forma muito E eles vão se Aos poucos,
príon estável – e
do século 19 (1). Na época, nenhum mé- Proteína
multiplicando, o cérebro
patogênica resistente formando adquire um
dico saberia que ele sofria com Insônia príon celular (PrPsc): a esses agregados aspecto
Familiar Fatal (FFI), já que a doença só (PrPc):
métodos. de proteínas esponjoso.
foi descrita em 1986. A condição estava deformadas.
no DNA da família: um dos seus filhos
tinha morrido ainda adolescente, após
sofrer com alucinações; outros dois
chegaram à vida adulta e espalharam Estrutura Estrutura
o gene para as gerações seguintes, que alfa-hélice folha-beta
posteriormente desenvolveram sintomas

s
da doença e também não resistiram.
A Insônia Familiar Fatal é causada
por príons, e só é transmitida heredi-
ta
is
tariamente. Além de ser extremamente
ev

rara: apenas 30 famílias conhecidas ao

redor do mundo carregam a mutação
R

genética que gera a doença (duas delas,

inclusive, vivem no Brasil) (2).
il

O gene mutado aí é o PRNP. Ele

as

guarda o manual de instruções para

a produção da proteína PrPc. Ela fica
Br

“pendurada” para o lado de fora das célu-

las – nos neurônios, principalmente. Até
o final dos anos 2000 acreditava-se que
a PrPc não tinha funções significativas
para o corpo. Hoje, sabemos que ela está
relacionada à formação de memórias,
sinapses e proteção dos neurônios (3).
Eu, você, todo mundo produz essa
proteína. Mas quem possui uma falha
no PRNP, no manual de produção, aca-
ba tendo problemas. Depois de certa
idade, que varia da adolescência até o
fim da vida, as células passam a produ-
zir outra proteína, a PrPsc (note que a
original se chama PrPc, sem o “s”). Ela
é mais conhecida como príon. Como O surto de
toda proteína, ela é composta por uma vaca louca
no Reino
cadeia de aminoácidos – que, por sua unido, nos
vez, é idêntica à cadeia de aminoáci- anos 1990, foi
dos da PrPc. Elas são, no fundo, duas causado por
versões da mesma proteína. uma ração
A única diferença entre elas é sua que continha
ossos de
estrutura tridimensional (veja no info- ovelhas.
gráfico acima). A PrPc tem um formato
enrolado, como se fosse um fio de cabe-
lo cacheado. Já o príon é a versão com
chapinha: possui estrutu- Os príons se principais sintomas são
ras retas e paralelas entre alojam no a gradativa perda de me-
si. O nome da estrutura tecido nervoso mória e visão, além de
do boi. Cortes
em caracol é alfa-hélice, como ossobuco
alterações no comporta-
enquanto a chapada se (e cérebro) têm mento e na coordenação
chama folha-beta. mais chances motora. Apesar de ser a
Não é o fim do mundo de estarem mais comum entre as do-
produzir uma proteína contaminados. enças priônicas, ela não
errada. Vira e mexe nos- deixa de ser rara: um
sas células fazem isso, e caso a cada um milhão
o próprio organismo de pessoas.
tem um mecanismo para Mamíferos em geral
identificar e destruir ver- podem produzir príons –
sões estranhas. Acontece e é aí que mora boa parte
que a estrutura chapada do problema. Para expli-
dos príons é extrema- car, precisamos voltar no
mente estável: suporta tempo. Mais precisamen-
altas temperaturas e é te, para o século 18.
resistente à protease, que
é o processo de degra- O caso das
dação de proteínas. Por ovelhas loucas
conta disso, o corpo não “Doença convulsiva”,

s
consegue se livrar delas. “doença louca”, “doença
Não é só isso: o prin-
cipal superpoder dos prí-
ta dos tremores”. Esses são
alguns nomes usados por
is
ons é que eles infectam fazendeiros europeus ao
ev

as proteínas normais, as longo dos últimos 300

PrPc. Basta um deles en- conhecidas (veja a tabela na página 53). anos para se referir ao
R

costar em uma PrPc para O que as diferencia são pequenas mu- scrapie, uma enfermidade
transformá-la em príon danças na estrutura do príon causador bem conhecida entre os
il

também. Ninguém sabe da doença, fazendo com que se alojem criadores de ovelhas. Os
as

exatamente como ele faz em partes distintas do cérebro. Não há sintomas incluem altera-
isso – e boa parte das pes- cura ou tratamento para nenhuma delas: ções de comportamento e
Br

quisas sobre o assunto todas as drogas já testadas falharam em coordenação, e terminam

tentam entender esse estudos clínicos. E toda doença priônica com a morte dos animais.
mecanismo em busca é, invariavelmente, fatal. As famílias que O prejuízo econômico
de tratamentos para as já sabem que carregam a mutação no ge- aos produtores é alto, já
doenças priônicas. ne PRNP procuram cuidados paliativos que nunca foi desenvolvi-
À medida que esse quando surgem os sintomas. do um remédio ou vacina
processo de transforma- Só que as doenças genéticas nem para o scrapie.
ção acontece, os príons representam a maioria das vítimas Stanley Prusiner ouviu
formam agregados no de doenças priônicas. Cerca de 80% falar da doença enquanto
exterior dos neurônios, dos casos são chamados esporádicos fazia residência em neu-
substituindo as proteí- ou espontâneos. É quando o corpo co- rologia, nos anos 1970.
nas normais. Como eles meça a produzir príons do nada, sem Achou curioso que os
têm um formato dife- que haja uma mutação geneticamente sintomas em ovinos eram

01
rente, não executam a transmissível no gene PRNP. Aí já viu: semelhantes aos da Do-
função de proteger a cé- basta um príon para causar um efeito ença de Creutzfeldt-Jakob
lula. Fazem o contrário: cascata nas outras proteínas. Não se em humanos – e que, nos
impedem as sinapses, sabe por que nosso corpo faz isso ou dois casos, o organismo
matando os neurônios. quais seriam os fatores de risco en- não produzia uma res-
Sabe o “cérebro-espon- volvidos – mas sabemos que os casos posta imune ao patógeno.
ja”, lá do início do texto? caso a cada espontâneos costumam ocorrer em Na época, o agente in-
Ele fica assim por causa da pessoas com mais de 60 anos. feccioso das doenças já
1 milhão de
morte dos neurônios – e o As vítimas desses casos espontâneos havia sido identificado,
mesmo acontece em hu- pessoas. Essa é geralmente são diagnosticadas com a mas acreditava-se que
manos. A Insônia Familiar a prevalência da Doença de Creutzfeldt-Jakob – um tipo ele era uma espécie de
Fatal é uma das três do- doença priônica de demência descrita em 1922, antes “subvírus” ou “vírus len-
enças priônicas genéticas mais comum. mesmo da descoberta dos príons. Os to”, já que os sintomas se

Fontes (1) Livro “The Family That Couldn’t Sleep: A Medical Mystery”. (2) Artigo “Índice de prevalência e principais manifestações clínicas
iniciais da insônia familiar fatal”. (3) Artigo “Cellular prion protein activates Caspase 3 for apoptotic defense mechanism in astrocytes”. março 2023 super 51
 desenvolvem por meses
até a morte da vítima.
Só tinha um problema:
nenhum pesquisador
havia conseguido isolar
o material genético desse
suposto vírus.
Um vírus nada mais é
do que uma cápsula pro-
teica com material gené-
tico dentro: pode ser uma
molécula de DNA, como o
causador da herpes; ou de
RNA, como o coronaví-
rus. Em ambos os casos,
ele injeta esse material na
célula do hospedeiro para
fazer cópias de si mesmo.
Outros patógenos (bacté-
rias e fungos, por exem-
plo) agem de maneiras
diferentes, mas todos os
causadores de doenças
conhecidos tinham, obri-
gatoriamente, algum tipo
de material genético. Pelo
menos até então.
Prusiner procurou in-
cessantemente pela mo-
lécula genética, mas não
encontrou. Então o mé-
dico propôs que o agente
em comum entre aquelas
doenças era não um ví-
rus, e sim uma proteína
infecciosa (algo até então
inédito). A esse agente,
Prusiner deu o nome de
“príon” (ele achou “proin”,
que junta melhor os ter-
mos protein e infectious,
pouco sonoro) (4). O arti-
go foi publicado em 1982.
A comunidade cientí-
fica ainda estava se acos-
tumando com a proposta
de Prusiner quando, em
1986, alguns bois no Rei-
no Unido começaram a
apresentar sintomas
semelhantes ao scrapie
das ovelhas. Até então
não havia evidências de
que o scrapie pudesse
ser transmitido de ove-
lhas para bovinos – ou
qualquer outro animal.
Mesmo assim, 420 bois
foram diagnosticados
52 super março 2023
O tálamo é
a região do
cérebro que
regula o sono.
Príons que
s
se alojam
lá causam
a insônia
ta
is
Familiar Fatal.
ev
R
com a doença até 1988. Em 1993, duran-
il
te o pico da epidemia, já eram 120 mil.
as
Aqui está o que aconteceu: o gado
britânico estava sendo alimentado com
Br
uma ração proteica feita com ossos de
ovelhas e vacas triturados. Os príons,
como você viu, se alojam nas células do
tecido nervoso – o que inclui a medula
espinhal. Os bois do Reino Unido esta-
vam comendo um banquete de príons
ovinos, o que deu origem ao surto de
Encefalopatia Espongiforme Bovina –
a doença da vaca louca. Conforme bois
foram adoecendo, os ossos de infectados
servidos como ração também se tornaram
vetores da enfermidade. A epidemia se
concentrou no Reino Unido, mas também
respingou em outros países por conta da
exportação da ração (5).
A epidemia de vaca louca já tinha dado
um baita prejuízo econômico, mas nada
preocupante para a saúde humana até
então. Acontece que o gado abatido e
vendido antes de demonstrar sintomas
da doença também carrega príons em
sua carne – principalmente em cortes
com mais nervos, como ossobuco. Era
uma questão de tempo até que a pro-
teína infecciosa de algum boi saltasse
para humanos. E foi o que aconteceu.
O córtex Em 1996, registrou-se a
cerebral é
essencial para primeira morte devido ao
a formação consumo de carne infec-
de memórias. tada. Em humanos, a vaca
Essa região louca causa uma demên-
é danificada cia que acabou batizada
pela Doença de
Creutzfeldt- como Creutzfeldt-Jakob
-Jakob. variante – que, apesar do
nome, é uma doença dis-
tinta da Creutzfeldt-Jakob
genética e da espontânea
(veja a tabela ao lado). No
total, 231 pessoas ao redor
do mundo foram vítimas
da doença.
Após a confirmação de
que os príons poderiam
ser transmitidos de bois
para humanos, diversos
países suspenderam a
importação de carne do
Reino Unido – Japão e
China, por exemplo, só
voltaram a comprar dos
britânicos em 2019 e
2018, respectivamente.
Em fevereiro deste ano,
aliás, foi identificado um
caso de vaca louca em um
animal no interior do Pa-
rá, o que levou a China
a suspender quase ime-
diatamente a importação
de carne brasileira. Mas
pode ficar tranquilo: tes-
tes em um laboratório de
referência, no Canadá, já
confirmaram que se trata
de um caso espontâneo
(da mesma forma que
ocorre em humanos), e
não relacionado à ração.
Então aí está outra for-
ma de adquirir uma do-
ença priônica: ingerindo
carne contaminada. Os
príons produzidos por
231
cada animal não são exata-
mente iguais – mas seme-
lhantes o suficiente para
saltar de uma espécie para
outra de vez em quando.
A última (e mais rara) for-
ma de transmissão é de
pessoas morreram humano para humano.
após comer carne Bom, se as vacas pegam
contaminada com príons comendo outras
príons, desde 1996. vacas… Você já imagina
o que vem por aí.
Fontes (4) Artigo “Historical overview of prion diseases: a view from afar”. (5) Artigo “Trade related
infections: Farther, faster, quieter”; (6) Artigo “Iatrogenic Creutzfeldt-Jakob Disease, Final Assessment”.
 doeNçAs
priôniCas
Há três maneiras de adquiri-las:
espontaneamente, hereditaria-
mente ou por contato com tecido
nervoso contaminado.
esporáDica
Por motivos ainda desconhecidos,
o próprio corpo começa a produzir
o príon espontaneamente.
Doença de Creutzfeldt-Jakob
esporádica (sCJD): É a doença
priônica mais comum. Os sinto-
mas incluem perda de memória
O cerebelo e de visão, além de alterações no
regula os comportamento e coordenação.
movimentos A expectativa de vida é de um
voluntários. A ano após o aparecimento dos
sintomas.
Síndrome de
Gerstmann-
-Sträussler- genética
-Scheinker O indivíduo nasce com uma
afeta essa mutação no gene PRNP, fazendo
s
região. com que as células produzam
ta
príons em vez da proteína normal.
É transmitida hereditariamente.
is
Insônia Familiar Fatal (FFI):
Além de não conseguir dormir,
ev
a vítima sofre com alucinações,
ataques de pânico, entre outros
sintomas. A sobrevida é de um
R
ano.
il
síndrome de gerstmann-
-sträussler-scheinker (gss):
as
Os sintomas estão relacionados
principalmente à coordenação
motora: tremores, dificuldade
Br
para andar e falar, e movimento
involuntário dos olhos. Expecta-
tiva de vida entre dois e dez anos.
Doença de Creutzfeldt-Jakob
familiar (fCJD): Traz os mesmos
sintomas da versão esporádica,
mas é causada por uma mutação
geneticamente transmissível.
Representa a minoria dos casos
de Creutzfeldt-Jakob.
contato com
carne inFectaDa
Ocorre principalmente por meio do
consumo de tecidos nervosos, onde
estão concentrados os príons de
animais doentes.
Doença de Creutzfeldt-Jakob
variante (vCJD): Apesar do
nome, é uma doença diferente
das outras duas. É adquirida
pela ingestão da carne de bois
com a doença da vaca louca.
Inclui sintomas psiquiátricos
(como depressão), mudança de
comportamento e coordenação
motora, até chegar à demência.
A sobrevida é de um ano.
Agradecimento Vilma Regina Martins, pesquisadora do Instituto de Ciências biomédicas da Universidade de São Paulo.
A doença canibal
A população Fore, nativa de Papua-Nova
Guiné, viveu durante anos uma epidemia
de kuru – que, na língua local, significa
“tremer”. A enfermidade foi descri-
ta nos anos 1950 por pesquisadores
europeus, mas é provável que tenha
surgido bem antes. Trata-se de uma
doença neurodegenerativa que afetava
principalmente mulheres e crianças.
Elas sofriam de tremores, perda de
coordenação e, curiosamente, crises
incontroláveis de riso.
Logo se descobriu que o kuru era trans-
mitido por meio de rituais funerários que
envolviam o consumo da carne do faleci-
do. Os homens ficavam com os múscu-
los, enquanto o cérebro era destinado às
crianças e mulheres. O mais provável é
que algum indivíduo tenha desenvolvido
a Creutzfeldt-Jakob espontânea, que daí
foi transmitida para outros membros da
população durante o funeral. Quem comia
os tecidos infectados também morria, e
o ciclo recomeçava.
A tradição foi abandonada. E o kuru
entrou na lista de doenças causadas por
príons após a descoberta de Prusiner.
Em 1997, o neurologista foi laureado
com o Nobel de Medicina.
Os príons ainda guardam um último
superpoder: eles são resistentes aos mé-
todos convencionais de desinfecção. Altas
temperaturas, autoclave, sabão, álcool e
outros compostos químicos geralmente
usados para a esterilização em hospitais
consistem em inviabilizar o material
genético do patógeno – o que não faz
diferença alguma contra os príons. Pelo
menos 220 casos de contaminação liga-
dos a neurocirurgias já foram identifica-
dos ao redor do mundo (6). Já que não há
como saber se algum paciente tem príons
no cérebro (os sintomas podem ainda não
ter se manifestado), recomenda-se que os
equipamentos que entram em contato
com o tecido nervoso sejam descartados.
O objetivo aqui não é dar medo: desde
os anos 1990, médicos, pesquisadores e
produtores de animais vêm aprendendo
a lidar com os riscos de transmissão
de doenças priônicas. Mas a verdade
é que ainda existem mais perguntas
do que respostas sobre esse patóge-
no descoberto há apenas 40 anos. E é
bom que existam – são das respostas
a elas que podem sair tratamentos re-
almente eficazes para quem vive com
doenças neurodegenerativas. S
março 2023 super 53
 perFil

s
ta
is
ev
R
il
as
Br

54 super março 2023

 Texto Alexandre Carvalho Ilustração Taíssa Maia Design Natalia Sayuri Lara Edição Alexandre Versignassi

p o r t r á s d a ev
Barbie
is
ta
s
A boneca de 64 anos nasceu da personalidade visionária de Ruth
R

Handler – empresária que se inspirou num brinquedo erótico

il

para criar um ícone cultural, que vende mais de 50 milhões de

as

unidades por ano. E vai estrear no cinema em julho.

Br

Uma máquina de refrigerantes
real, mas feita para o tamanho de
crianças. Um carrinho movido a gás que
chegava a 35 km/h. Ursinhos de pelúcia
Teddy Bear, batizados em homenagem ao
presidente dos EUA Theodore (“Teddy”)
outra criação de sua equipe, baseada nu-
ma inspiração sua. Ela levou à feira duas
dezenas de bonecas fashionistas, de 29,2
centímetros, à imagem e semelhança de
garotas saindo da adolescência para a
vida adulta. Cada uma com um figurino
causa da filha mais velha
de Ruth, Barbara. Tinham
certeza de que as mães
não aprovariam uma bo-
neca com seios para suas
crianças (impressão que

U
O lança-
Roosevelt (1858–1919) – que, numa ati-
mento na
vidade de caça, se recusara a atirar em Feira de
um urso acuado. Essas eram algumas das Brinquedos
atrações na edição de 1959 da tradicional de Nova
Feira de Brinquedos de Nova York, um York foi um
evento em que os fabricantes exibem fracasso. Os
novidades com a esperança de emplacar lojistas se
seus produtos nas prateleiras das lojas – e espantaram
que existe até hoje. com aquela
A Mattel, fundada em 1944, chamou boneca com
seios.
atenção do jornal New York Times por um
foguete de plástico que conseguia subir
60 metros pelos ares. E havia contexto
para isso: a corrida espacial dominava
o noticiário na época.
Mas as expectativas de Ruth Handler,
vice-presidente da empresa, estavam em
diferente: de um vestido de noiva a um
maiô com estampa de zebra e óculos
escuros. Uma ousadia. As bonecas que
predominavam no mercado eram as de
bebês – reproduzindo o espírito conser-
vador dos anos 1950, quando as meninas
se viam encorajadas a ser donas de ca-
sa e criar filhos. Mas as esperanças da
executiva foram frustradas naquele dia.
Lou Kieso, comprador da Sears, então
a loja de departamentos mais importante
dos EUA, não gostou do que viu e foi
embora sem fazer nenhum pedido – as-
sim como metade dos executivos que
passaram pelo estande. Aqueles homens
ficaram escandalizados com a silhueta
da Barbie – que ganhara esse nome por
se confirmaria em uma
pesquisa encomendada
pela empresa antes de
iniciar a publicidade do
brinquedo na televisão).
“A Mattel chamou a
boneca de Teenage Fashion
Model Barbie Doll (tradução
mais precisa: ‘Barbie, a
Modelo Adolescente'). Era
uma tentativa de aplacar
sua sexualidade e invocar,
para os pais, a ideia de que
muitas garotas gostariam
de ser tratadas como uma
modelo”, explica a historia-
dora Robin Gerber, autora

março 2023 super 55

 A Mattel
vendeu 350 mil
Barbies já no
ano de lança-
mento. Logo
a invenção de
Ruth a tornaria
multimilionária.

s
ta
is
ev
R
il
as
Br

56 super março 2023

de Barbie e o Império da Mattel. “Mas ne-
30,8
nhuma quantidade de redatores publi-
citários conseguiria disfarçar as propor-
ções da Barbie, calculadas como tendo 99
centímetros de busto se em uma mulher
adulta [o que exigiria um sutiã tamanho GG].”
Ruth saiu arrasada do evento e ter-
minou a noite chorando num quarto de
hotel. Ela ainda não sabia, claro, mas
o fracasso no showroom era apenas a
reação imediata de um mercado con-
servador – nada ligado ao que se passa
na cabeça das meninas.
Inspiração erótica
Em 1956, enquanto passava férias na
Europa, Ruth Handler encontrou uma
boneca na Suíça que não se parecia com
nada do que ela já tinha visto. Lilli era
vendida com diferentes roupas. As que
ela viu tinham um figurino de moda
europeia e um traje completo de esqui.
302.500
As bonecas reproduziam a imagem de
uma adulta: tinham lábios vermelhos em
um biquinho provocante, seios fartos
e cintura fina. Para Ruth, um modelo
similar, menos caricato, poderia atrair
as meninas como “a mulher que elas
gostariam de ser quando crescessem”.
O que a executiva não sabia: o públi-
co consumidor de Lilli, no início, não
eram crianças ou adolescentes. Ela foi
criada para ser um brinquedo erótico. Era
Br
vendida em bares, tabacarias e sex-shops.
“Homens ganhavam de presente em des-
pedidas de solteiro”, afirma Robin Gerber.
A personagem nasceu em uma HQ cheia
de diálogos sugestivos. Perseguia homens
ricos fazendo poses provocantes em rou-
pas que mais mostravam do que cobriam
o corpo. Levou um tempo até que essa
história fosse esquecida e o comércio da
boneca se estendesse às meninas.
Ainda ignorando as origens devassas
do brinquedo, Ruth de cara identificou
um erro estratégico, que ela poderia cor-
rigir em sua versão americana: eles não
vendiam as roupas separadamente. Se a
garotinha quisesse cinco figurinos di-
ferentes, seus pais precisariam comprar
cinco bonecas. Seria mais eficiente ven-
der roupas e acessórios à parte – opção
que também se tornaria uma fonte de
faturamento para o fabricante.
Maquiador de Hitchcock
colaborou no look
De volta aos EUA, Ruth estava decidida
a criar sua versão melhorada da boneca
europeia. Cercou-se, então,
dos melhores profissio-
nais e supervisionou cada
detalhe da criação.
Para suavizar o rosto
sexualizado de Lilli, con-
tratou Bud Westmore,
maquiador do cinema, que
dólares, trabalhava nos programas
em valores
de TV de Alfred Hitchcock.
de hoje,
foi o preço
Para melhorar as chan-
original da ces de que a operação
Barbie, em fosse lucrativa, a Mattel
1959. mandou produzir as bo-
necas no Japão – o país
era a China da época, com
vasta estrutura fabril e
mão de obra ainda barata.
Foi uma boa ideia, embora
falhas de comunicação ti-
vessem provocado alguns
erros: os japoneses não
s
entenderam quando o de-
ta
signer Jack Ryan insistiu
para que a boneca viesse
is
sem mamilos. O próprio
ev
Ryan lixou os bicos dos
seios das primeiras Bar-
R
bies com seu canivete.
dólares Outra obsessão de
foi o valor
il
Ruth era com a sofis-
mais alto
as
pago pela
ticação das roupas da
boneca,
boneca. Mas a fixação
um modelo com os detalhes, como
criado pelo zíperes, colchetes, botões
designer de e bainhas, reduziam a lu-
joias Stefa- cratividade com os pre-
no Canturi, ços da matéria-prima. A
em 2010. solução, novamente, foi
economizar na mão de
obra. Mais uma vez, os
produtos foram parar na
Ásia, onde costureiras ja-
ponesas trabalhavam em
home office e ganhavam
por peça produzida, sem
58
salário fixo.
A construção da
personalidade
Na década de 1950, as
empresas de brinquedos
compravam tempo na TV
milhões de
Barbies são
apenas nas dez semanas
vendidas, anteriores ao Natal, perí-
em média, odo que concentrava 80%
a cada ano, de suas vendas. A Mattel,
por todo o então, fez diferente. Com-
mundo. binou um contrato de 12
meses com o maior programa infantil da
época, O Clube do Mickey, na expectati-
va de tornar o negócio menos sazonal e
estimular seu comércio o ano todo. O
primeiro produto da empresa promovido
dessa forma foi uma submetralhadora de
brinquedo. Deu tão certo que a Mattel
teve dificuldades para atender aos pedidos
dos lojistas.
Com a Barbie saindo do forno, a ideia
era lançá-la com uma série de comerciais
também. Mas antes Ruth encomendou
um estudo de modo a saber como ven-
der sua imagem. Ela contratou, então,
o psicólogo e consultor de empresas
Ernest Dichter.
Considerado um gênio do marketing,
ele usava as ideias de Sigmund Freud para
desenvolver a noção de que os produtos
tinham personalidade. (O que os mar-
queteiros de hoje chamam de branding.)
Analisando a Barbie, Dichter entrevis-
tou 191 meninas e 45 mães. Estas torce-
ram o nariz para a boneca com corpo de
mulher, mas as meninas a adoraram. Elas
diziam que Barbie era alguém que elas
almejavam ser quando fossem adultas.
O psicólogo, então, sugeriu que a
Mattel passasse uma mensagem que
convencesse as mães de que a boneca
ajudaria as filhas a se vestir melhor e
ter uma referência positiva, de jovem ao
mesmo tempo glamourosa e envolvida
com esportes e estudos.
Seguindo essa linha, o comercial de
lançamento da Barbie estreou na TV
em março de 1959, mostrando-a como
uma garota saudável que nadava, jogava
tênis, ia a festas e gostava de roupas
bonitas. A agência de publicidade até
encomendou uma canção-tema para ser
cantada pela estrela pop Connie Francis:
“Um dia vou ser igualzinha a você/ Até
lá já sei o que vou fazer/ Barbie, linda
Barbie, vou fazer de conta que sou você”.
Quando as férias de verão chegaram, os
telefones da Mattel não pararam de tocar.
“A demanda disparou como um foguete
por causa do comercial na televisão, do
tempo livre para brincar nas férias e da
novidade que era aquela boneca, fazendo
garotinhas infernizarem os pais para ga-
nhar uma Barbie”, conta Gerber.
Ainda em 1959 a Mattel venderia 350
mil unidades de sua invenção. E Barbie
logo se tornaria a boneca mais bem-su-
cedida da história – hoje, a média anual
de vendas é de 58 milhões de unidades,
mais de 100 por minuto.
março 2023 super 57
 s
ta
is
ev
R
il
as
Br

Enquanto
enfrentava um
processo por
fraude, Ruth
lançou próteses
de seios para
mulheres que
tiveram câncer –
como ela.

58 super março 2023

 Nomes do panteão da
moda, como Gucci, Ver-
sace e Givenchy, fariam
criações específicas para
a boneca. E sua presença
como ícone cultural se-
guiria intacta por gera-
ções. Tanto que, em julho
agora, a Barbie vai ganhar
um filme próprio em li-
ve-action, estrelado por
Margot Robbie. O teaser
do filme, aliás, mostra de
forma figurada o que você
leu aqui. É uma paródia do
início de 2001 – Uma Odis-
seia no Espaço (1968). Na
obra de Stanley Kubrick,
um monolito estimula, em
macacos, um salto para a
humanidade, quando eles
descobrem que podem
usar ossos como armas.
No teaser de Barbie (2023),
ela é o monolito: a bone-
ca com corpo de mulher
adulta surge provocando
a reação violenta de crian-
cinhas, que quebram suas
bonecas tradicionais, com
corpinho de bebê, diante
da evoluída similar adulta.
O império
No começo da Mattel, em
1944, os brinquedos eram
produzidos artesanal-
mente, em uma garagem,
com moldes criados por
Elliot Handler, o marido
de Ruth (e presidente de
fachada da empresa, já
que era ela quem manda-
va de fato). Quinze anos
depois, com o sucesso da
boneca, sua esposa co-
mandava 1.200 funcioná-
rios e administrava cinco
fábricas em Los Angeles.
Em 1960, apenas um ano
após a criação da Barbie,
a companhia foi listada na
Bolsa de Valores de Nova
York. E o casal Handler se
tornou multimilionário.
Em 1961, a Mattel lan-
çou o “namorado da Barbie”,
Ken (nome do filho caçula
de Ruth), também com sua
linha de roupas e acessórios. E, em 1965,
1965
a companhia entrou no ranking Fortune
500, que relaciona as maiores empresas
americanas. Nessa década, uma pesquisa
apontou que 93% das meninas conheciam
o nome Barbie, algo do qual nenhuma
concorrente chegava sequer perto.
Os anos 1960 foram o céu para Ruth
Handler. Em nove anos, Barbie rendeu, foi quando
a Barbie
em valores de hoje, o equivalente a US$
astronauta
4 bilhões em vendas no varejo. Só o que foi lançada,
não acompanhou tanto crescimento foram quatro anos
os conhecimentos de gestão da executiva. antes de
Ruth era uma empreendedora que agia por um humano
impulso e intuição, mas não tinha edu- pisar na
cação formal para os negócios. Quando lua.
aquilo que tinha começado como uma
pequena empresa virou um império, ela
se perdeu. E isso quase lhe custou a prisão.
A queda
No início dos anos 1970, a contabilidade
s
da Mattel começou a se tornar tão cria-
1997
tiva quanto sua produção de brinquedos.
A década começou com uma fábrica me-
ta
is
xicana destruída por um incêndio e uma
ev
greve que prejudicou o suprimento de
brinquedos. Seymour Rosenberg, então
R
diretor financeiro, fez o que podia (e
o que não podia) para esconder esses
il
prejuízos dos acionistas até 1973. O ano em
as
Ou seja: a companhia estava men- que “Barbie
tindo em seus balanços para que suas Girl”, do
Br
ações na bolsa não caíssem (o que re- grupo
mete ao caso da Americanas, que acu- dinamar-
mulou inconsistências nos lançamentos quês Aqua,
se tornou
contábeis até explodir na admissão de um hit nas
um rombo de R$ 20 bilhões). A fraude paradas
na Mattel incluía assinaturas de clientes musicais.
forjadas e faturas falsas.
Ruth era tão envolvida com tudo o
que dizia respeito a seus negócios que…
era muito improvável que não soubesse
do que estava se passando (apesar de a
executiva nunca ter admitido, até o fim
da vida). Era óbvio o bastante para que
a Justiça americana mergulhasse nas
200
contas da Mattel e abrisse um inquérito
envolvendo os principais executivos da
empresa. Uma ação que teve efeito ime-
diato sobre o destino de Ruth Handler.
Diante das evidências, os bancos ame-
açaram cortar o crédito da companhia se
ela não deixasse sua direção. Resultado: carreiras
em 27 de março de 1973, o vice-presi- já teve a
dente executivo Arthur Spear assumiu boneca em
o posto máximo, deixando Ruth como suas mais
figurante no conselho de administração variadas
– os executivos, ao vê-la num corredor, versões.
davam meia-volta. Tanta humilhação
levou, em 1974, a inventora da Barbie
a se desligar totalmente da companhia
que tinha criado.
Para piorar, o andamento do pro-
cesso contra ela apontava para uma
condenação – que realmente veio, em
1978, mas bem menos terrível do que
anos atrás das grades.
Um juiz mais benevolente que a mé-
dia aceitou um acordo pelo qual Ruth
Handler pagaria uma multa de US$ 261
mil em dinheiro de hoje e ficaria em
liberdade condicional por cinco anos,
cumprindo uma sentença de 500 horas
de serviço comunitário a cada ano. Ela já
era uma sexagenária, então, e, para piorar,
vivia com o temor da volta de um câncer
de mama, que a obrigara a se submeter a
uma mastectomia oito anos antes. Mas
foi justamente sua atitude em relação à
retirada do seio que a reergueu.
A segunda encarnação de Ruth
Inconformada com as próteses externas
de seio disponíveis nos anos 1970 – que
ela definia como “caroços em forma de
ovo” –, Ruth buscou forças para achar
uma solução que recuperasse a autoes-
tima de mulheres que passaram pela re-
tirada das mamas. Uniu-se a um escultor
da Califórnia, Peyton Massey, conhecido
pela excelência em fazer próteses de seios,
nariz, mãos e pernas personalizadas. E
transformou aquele negócio modesto em
um empreendimento.
Ao longo dos anos em que lidava com
advogados para se defender no caso de
fraude na Mattel, Ruth desenvolveu
uma empresa capaz de produzir en-
chimentos de sutiã convincentes – em
uma grande diversidade de tamanhos
e formatos. Assim, uma mulher sem-
pre conseguiria encontrar um que lhe
parecesse natural. Batizou seu produto
de Nearly Me (“quase eu”).
O novo negócio fortaleceu o estado
de espírito de Ruth, que recebia cartas
de mulheres agradecidas (até a primeira-
-dama Betty Ford, esposa do presidente
Gerald Ford, aderiu ao produto) e ainda
voltava a comandar um negócio.
Foi uma de suas poucas alegrias antes
de morrer, aos 85 anos, em 2002. Oito
anos antes, sofrera a perda de seu filho
Ken, vítima da aids. “Completei um ciclo.
Desde criar a primeira boneca com seios
a atender às necessidades de mulheres
de verdade por seios.” S
março 2023 super 59
oráCulo
ILUSTRAÇÕES lAUrA AThAyde DESIGN lUANA pillmANN
11.130
MORTes por câncer do estômago.
É a estimativa para 2023 nos EUA
segundo a American Cancer
Society. Os homens vão morrer
mais: 6.690 óbitos.

s
ta
is
ev
R
il
as
Br

Dá para romper, sim. Em 1984, uma mulher chegou

a um pronto-socorro no Reino Unido após ter se em-

se eu Comer
panturrado com 2 quilos de carne, meio quilo de queijo,
dois ovos, 1 quilo de cenouras, dez pêssegos, quatro peras,
duas maçãs, quatro bananas, 1 quilo de ameixas, um de
uvas, dois copos de leite, entre outros acepipes. Foram

sem parar,
quase 9 quilos de comida. E nosso estômago costuma
aguentar, no máximo, 4 litros de alimentos, então o dela
não suportou tanto exagero e se abriu. Ela faleceu (1).
Mas esses casos são raríssimos. Quando o órgão incha

o estômago
além de um certo ponto – digamos que você tenha repe-
tido a feijoada –, os receptores de estiramento na parede
do estômago mandam um sinal para o cérebro. Este, por
sua vez, emite um comunicado de que é hora de parar.

pode explodir?
Essa sensação de saciedade é o melhor antídoto contra
o exagero. Mas os alertas podem ser mais agressivos.
Se a pressão no estômago aumentar demais, o indivíduo
sentirá náuseas e dor, o que o fará parar. Se ficar mais
grave, 90% das pessoas acabam vomitando.
 EDIÇÃO alexandre carvalho

por que gostamos de dormir

com o travesseiro geladinho?
Porque isso tem o efeito de uma canção de ninar para adultos. De noite,
a glândula pineal, no cérebro, começa a liberar melatonina. Esse hormônio
é responsável por diminuir a temperatura e o metabolismo do corpo. E é um
indutor do sono. Acontece que ambientes frescos promovem uma maior pro-
dução de melatonina – então ficamos na situação perfeita para dormir gostoso.
Não à toa, especialistas sugerem que a temperatura ideal no quarto fique entre
15 °C e 22 °C. Se o travesseiro estiver frio, ele ajuda a enganar o hipotálamo, o
termostato do corpo. É a mesma lógica de usar uma compressa fria na testa
para baixar a febre. Existem travesseiros projetados para se manterem frescos
por mais tempo. São os cooling pillows (no Brasil, você os encontra com vários
nomes, como “travesseiros térmicos”). Feitos a partir de diversos materiais
(algodão, látex, gel…), eles supostamente facilitam a evaporação do nosso
suor – que pode aumentar a temperatura do travesseiro. (2)

s
PÁ PUM Além dos cachorros, outros animais usam a cauda para se comunicar?
ta comer – e em interações com humanos, princi-
is
Existe uma lista extensa de animais que re-
velam informações ou transmitem mensagens a palmente quando já estão familiarizados com a
ev

partir da movimentação de suas caudas. Alguns pessoa. Sim, do jeitinho que seu cachorro faz. Há
casos são mais parecidos com os nossos amigos também fenômenos bem diferentes desses – e
R

Quanto sódio existe

num miojo sabor de quatro patas; em outros, menos. Esquilos não tão comparáveis com os cachorros. As cau-
“galinha caipira”? usam suas caudas para comunicar a outros das das aves cumprem papéis importantes para
il

esquilos que um predador está por perto, e eles a comunicação reprodutiva. Os pavões abrem
as

1.410 mg (é muito: a
fazem isso chicoteando o rabo em movimentos suas penas coloridas para demonstrar saúde
OMS recomenda que o
longos. Para garantir que a comunicação vai fun- e atrair as fêmeas da espécie. Pesquisadores
Br

consumo total de sódio

não passe de 2.000 mg cionar, geralmente associam outros chamados,
por dia). (3) como assobios. Dependendo da combinação
de sons e movimentos de cauda, o alerta pode
tem a ver querer dizer que os predadores estão vindo pelo
céu ou pelo chão mesmo. Já entre os porcos, as
acreditam que a cauda também é importante
para a comunicação na água. As baleias jubarte
batem suas caudas (e nadadeiras) na superfície
do oceano para conversar umas com as outras.
Quando elas saltam para fora da água e viram

250 mil
lobos é a estimativa
caudas funcionam como indicadores comporta-
mentais. Estudos mostraram que eles abanam
o rabo em situações positivas, como brincar e
de costas para fazer um splash estrondoso com
a cauda, querem transmitir mensagens para
grupos distantes. (4)
máxima de quantos
deles ainda existem na
natureza. A maioria são Quem já foi a um restaurante chique (ou viu um em uma cena de
lobos-cinzentos. (5)
por que é preciso
cozinhar as lagostas filme) talvez tenha estranhado o tanque de lagostas vivas. É comum
ainda vivas? que esses crustáceos sejam cozidos vivos, então eles são mantidos lá
outro DaDo pelo estabelecimento. Mas dizer que você precisa cozinhar a lagosta viva
relevante sem e inteira não é verdade. Só não pode demorar muito para prepará-la
nenHuma ligação depois de morta. E é por uma questão sanitária. Lagostas e mariscos
podem conter bactérias do gênero Vibrio, que se espalham rapidamente

250 mil
projéteis de artilharia,
pelo corpo do bicho logo que ele morre – e as toxinas que elas liberam
não desaparecem completamente com o cozimento. Depois do óbito,
se não for cozida ou congelada rapidamente, a carne da lagosta já é
por mês, foi o que a um risco à saúde. Alguém contaminado com essas bactérias pode ter
Ucrânia pediu à UE, no diarreia, cólicas abdominais, náusea, vômito, febre e calafrios. Colocar
começo de março, para a lagosta viva na panela é um jeito de consumi-la fresca sem o risco de
combater a Rússia. contrair essa intoxicação alimentar.

Reportagem Alexandre Versignassi, Alexandre Carvalho, Leonardo Caparroz, Luisa Costa, Maria Clara Rossini e Rafael Battaglia. Fontes (1) Gulp: Adventures on the Alimentary Canal,
livro da divulgadora científica Mary Roach. (2) Dalva Poyares, médica e pesquisadora do Instituto do Sono. (3) Nissin. (4) “Joint tail and vocal alarm signals of gray squirrels
(Sciurus carolinensis)”; “Tail postures and tail motion in pigs: A review”; “Evidence for the functions of surface-active behaviors in humpback whales (Megaptera novaeangliae)”;
Marcelo Segall, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). (5) “Canis lupus: IUCN Red List of Threatened Species”.
março 2023 super 61
 oráCulo
Como se tira o álcool de uma cerveja sem álcool?
as
Antes, é preciso explicar como o álcool chega
lá. Durante a fermentação da cerveja, os açú-
Br
cares do mosto (uma mistura de água quente e
malte – ou seja, grãos de cereais umedecidos e
colocados para germinar) se transformam em
álcool e gás carbônico pela ação das leveduras,
um tipo de fungo. Elas comem o açúcar do
malte e “defecam” álcool. No método mais
simples, o fabricante diminui a temperatura no
fermentador. No processo normal, costuma ser
em torno de 12 °C, para uma lager. Aí ele baixa
para uns 6 °C quando o objetivo é eliminar o
álcool. Esse resfriamento diminui o metabolis-
mo das leveduras (elas “dormem”). Resultado:
acaba saindo uma cerveja com uma quantidade
pergunte
ao oráCulo
Escreva para
alexandre.santos@abril.com.br
mencionando sua cidade e
estado – ou mande a pergunta
via direct no Instagram.
62 super março 2023
Quando inventaram os sutiãs?
O que entendemos como sutiã moderno só foi patenteado em 1914,
nos Estados Unidos, pela socialite Caresse Crosby (mais conhecida pelo
apelido, Polly). Até aquele começo de século 20, as mulheres ocidentais
ainda sofriam com os espartilhos, que tinham armações de metal para
moldar o corpo de modo a dar a aparência de cintura minúscula e busto
voluptuoso. E para isso espremiam as usuárias desde embaixo do umbigo
até a altura dos seios. Em 1910, enquanto Polly – aos 19 anos – se preparava
para ir a um baile de debutante, achou que não estava suportando tanto
aperto. Comparou seu espartilho a “uma armadura em forma de caixa de
osso de baleia e cordão rosa”. Então improvisou uma solução: costurou dois
lenços e um pouco de fita, transformando esse conjunto no que seria um
sutiã simples. Com o tempo, as amigas pediram que ela costurasse sutiãs
iguais para elas. E a jovem foi sofisticando sua criação: o design ganhou
alças presas nos cantos superior e inferior da peça. Seu sutiã separava
naturalmente os seios, diferente dos espartilhos, que os juntavam à força.
Polly percebeu que tinha um negócio em potencial ali. Então patenteou
s
o sutiã e abriu uma pequena fábrica, que logo começou a receber pedidos
ta
de lojas de departamentos.
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ev
LISTA
R
il
Quais doenças
insignificante de álcool: 0,35%. A lei considera mais atraem
que a bebida com até 0,5% pode ser vendida investimento
como “cerveja sem álcool”. Esse processo tem em pesquisa?
a vantagem de não exigir equipamentos caros.
A contrapartida é que a bebida tende a ficar
com aromas e sabores menos elaborados. O
segundo método, mais moderno, é a retirada A Covid-19 é uma exceção: o
mundo investiu US$ 9,2 bilhões
do álcool já com a cerveja pronta. A fermen- em pesquisas sobre a doença
tação, aqui, é levada até o final. Temos, até só em 2020. Confira outras
então, a cerveja que deixaria qualquer um recordistas.
alegre depois de algumas latinhas. Mas não
neste caso. Um destilador a vácuo evapora aiDs
1
todo o álcool, deixando-o com a mesma capa- US$ 1,4 bilhão
cidade de embriaguez de um refrigerante. Daí
as cervejas que ostentam 0,0% no rótulo. (1)
tuberculose
2
US$ 723 milhões
malária
3
número incrível US$ 626 milhões
57
Dengue
4
US$ 78 milhões
Hepatite b
rolos de papel higiênico. É o que um 5
US$ 16 milhões
brasileiro usa, em média, por ano. (2)
 SÓ ACREDITO Qual é o voo É o que liga os aeroportos de Campinas
(VCP) e Boa Vista (BVB), com duração de 4

VENDO comercial mais horas e 35 minutos. Operado pela Azul, o

voo AD 2630 viaja da capital de Roraima
para o interior paulista, enquanto o AD
longo dentro do 2629 faz o trajeto contrário. Os passageiros
cruzam 3.227 km. Abaixo, confira os voos
Brasil? E do mundo? mais longos dentro e fora do país.

15.349 km
15.344 km
14.499 km
14.472 km
14.207 km
14.200 km
14.114 km
14.004 km
No MuNdo

13.834 km
13.804 km

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são Francisco (sFo)

a melbourne (mel)

a bengaluru (blr)
los angeles (lax)
a singapura (sin)

a singapura (sin)

a singapura (sin)
a auckland (aKl)
nova York (JFK)

nova York (JFK)

a londres (lHr)

auckland (aKl)

a sydney (sYD)

a sydney (sYD)
newark (eWr)

Houston (iaH)
a Dubai (Dxb)
il
Dallas (DFW)

Dallas (DFW)
perth (per)

as
Br

3.227 km 3.184 km 3.160 km 2.961 km 2.845 km 2.834 km

2.779 km 2.697 km
rio de Janeiro (gig)

2.674 km
a porto velho (pvH)

2.618 km
porto alegre (poa)

porto alegre (poa)

porto alegre (poa)

a boa vista (bvb)
No BrASil

a manaus (mao)

a manaus (mao)

a manaus (mao)

a manaus (mao)
são paulo (cgH)
são paulo (gru)
campinas (vcp)

campinas (vcp)
a maceió (mcz)

noronha (Fen)
a recife (rec)

a Fernando de
a natal (nat)
recife (rec)

recife (rec)

até que andar de um prédio um mosquito consegue subir turbulências nas alturas
para me picar? @estevaobayerl, via instagram

O que interessa para esses insetos é estar próximos aos locais em

que se reproduzem ou têm a chance de nos picar. Tanto podem estar
no 20º andar de um prédio, levados por uma corrente de ar, quanto
perto do chão. E aqui embaixo é onde tendem a se refestelar com
O oxigênio reduzido Chuva: se um mos-
a maior quantidade de gente. Por isso, mosquitos não costumam A densidade do ar
é outro desestímulo nas alturas também é quito pousado em
ser grandes viajantes. Os do tipo doméstico preferem não voar um galho for atingido
para os mosquitos um impeditivo. Inse-
acima de 8 metros de altura – incomodam mais quem mora até o subirem muito… No tos precisam fornecer por uma gota, a água
terceiro andar. O frio também é um motivo pelo qual eles tendem alto, as asas têm esse elemento aos o esmagará com uma
a voos mais rasantes. Insetos em geral são incapazes de regular a menos moléculas de seus tecidos por meio força de 10 mil vezes o
temperatura do corpo, de modo que a friaca em altitudes maiores ar para manter seus da respiração aeró- seu peso corporal.
pode “desligá-los” e impedi-los de se mover. (3) corpos voando. bica para funcionar.

Fontes (1) Alexandre Esber, professor da Academia de Cerveja; Cervejaria Antuérpia. (2) BNDES.
(3) Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, membro da APBE – Associação Portuguesa de Biologia Evolutiva; InsectCop.
março 2023 super 63
 oráCulo

A Fórmula 1 já inventou tecnologias

que foram parar nos carros de rua?
Sim. As mais relevantes são o uso da fibra de carbono e
o câmbio-borboleta. Sobre a fibra: em 1981, o McLaren
MP4/1 foi o primeiro carro da Fórmula 1 a usá-la em seu
chassi (na parte externa do cockpit). A ideia veio de um dos
engenheiros da equipe, John Barnard. A fibra de carbono
é mais leve (e resistente) que o aço. Reduziu o peso do
MP4/1 – e fez a McLaren vencer corridas. Hoje, até 70% da
estrutura de um F-1 é pura fibra de carbono, que também
ganhou as vias fora dos circuitos de corrida. Em 1992, a
própria McLaren produziu o primeiro carro de rua feito com
fibra de carbono: o chamado McLaren F1, vendido por US$
2 milhões em dinheiro de hoje. Só que o material ainda é
caríssimo – só dá as caras em superesportivos. John Barnard
também esteve por trás de outra invenção que acabou nas
ruas. Até o final dos anos 1980, as máquinas da F-1 ainda
usavam transmissão manual. O piloto tinha de tirar uma

pedestre pode ser multado?

s
das mãos do volante para trocar as marchas. Barnard criou
ta um câmbio semiautomático, no qual as trocas rolavam
em duas pequenas alavancas atrás do volante (os paddle
is
Stella Duarte, por e-mail
shifters ou câmbio-borboleta). Nos automóveis de rua, a
ev

Ferrari estreou o câmbio-borboleta em 1997, no modelo

Sim. Por infração de trânsito ou mau comportamento mesmo. O F355. E essa novidade se massificou. Hoje, é padrão em
artigo 254 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê multa para
R

boa parte dos carros com câmbio automático (o “modo

qualquer pedestre que faça algo nas “pistas de rolamento” (o asfalto) manual” costuma ser via câmbio-borboleta).
que não seja atravessar na faixa. A multa equivale a 50% do valor de
il

uma infração leve para motoristas – ou seja, R$ 44,19. Só que não

as

existe uma regulamentação sobre como essas multas devem ser

aplicadas. A resolução 706/2017 do Conselho Nacional de Trânsito
Br

tentou padronizar a autuação: coleta de dados pessoais, identificação

do infrator mediante abordagem… Mas a resolução foi revogada em LOST IN Estou
2019. Resultado: entre as 29.615 multas aplicadas em 2022 pelo Detran
no estado de São Paulo, nenhuma delas foi para um pedestre. Mas nem TRANSLATION feito
só do trânsito vivem as multas. A cidade do Rio de Janeiro prevê uma Origem Portugal
de R$ 748,21 para quem for flagrado urinando na rua. Só no sábado de ao bife.
Carnaval, a prefeitura aplicou 117 dessas. O Rio também faz operações
com fiscais do Programa Lixo Zero. Qualquer um flagrado jogando Você sabe que fez um trabalho ruim e agora foi chamado
pequenos resíduos na rua (como bitucas de cigarro e garrafas) paga para uma conversinha com o chefe? Então você está em
uma multa de R$ 273,09. O guarda municipal emite a multa com apuros. Ou “está frito”, como diríamos no Brasil. Os portu-
uma impressora portátil e você deve ir ao site da Comlurb, a empresa gueses são mais específicos: indicam o alimento que, como
municipal de limpeza da cidade, para pagar. você, vai para o óleo quente.

Não. O caráter depende do livre-arbí-

PENSANDO Podemos ensinar trio de cada um. Não podemos tornar
um filho a ser ninguém bom com ensinamentos,
BEM... gente boa? apenas explicar o que é a bondade,
Filósofos de por que uma ação é boa e como
ontem opinam em podemos construir sociedades que a
assuntos de hoje estimulem. O grego faz uma analogia
por Alexandre Carvalho com andar a cavalo: ninguém se torna
aristóteles bom cavaleiro lendo sobre isso. Preci-
384 a.C.–322 a.C. sa cavalgar bastante. E com vontade.

64 super março 2023

 MANUAL Como fazer os alimentos
por Rafael
Battaglia durarem mais?
1 - Cebola, alho e tomate 2 - Frutas

A trinca para um bom molho As maçãs devem ficar no

fica bem fora da geladeira. lugar mais frio da geladei-
Retire a cebola e o alho do ra, fechadas em um saco
saquinho do mercado e guar- ou em pote. Isso porque
de-os juntos. Escolha um local elas liberam etileno, que
fresco, seco e com pouca luz. acelera o amadurecimento
No caso dos tomates, eles só de outras frutas. Banana e
vão para a geladeira quando abacate (e a cebola) também
estiverem maduros (um liberam etileno – então a
bom indicativo é observar dica é mantê-los longe de
se estão mais molinhos e alimentos como berinjela
bem perfumados). e verduras.

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3 - tubérCulos
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4 - Folhas
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Batatas não precisam de Guarde-as na geladeira,
ev

geladeira. Conserve-as em sacos plásticos se-

em ambientes frescos lados – e sem lavar. O
R

e escuros. E tire-as do excesso de umidade faz

saco – elas precisam com que elas murchem
il

que o ar circule. Outros mais rápido. Guardá-las

as

tubérculos (beterrabas, junto a um pedaço de

cenouras…) vão para a papel-toalha ajuda nesse
Br

geladeira, em saquinhos ou controle de umidade. Fi-

potes herméticos. Corte os que de olho nas folhas
talos e as folhas, que tiram marrons e nas viscosas;
a umidade do vegetal. descarte-as sempre.

para saber mais Estragou? Aqui não.

Guarde os ovos com a mesma pressa que
você guarda o sorvete: assim que chegar
do mercado. Eles vão dentro da caixa – e
na parte mais fria da sua geladeira (as
prateleiras inferiores).
Para salsa, cebolinha e coentro: lave e
seque bem, com papel-toalha. Leve-os à
geladeira em uma jarra com água, como
um buquê de flores. Ou simplesmente
corte e congele o resto no freezer.
Para salvar uma alface murcha, corte
um pouco da raiz da cabeça e guarde-a
na geladeira em um recipiente com um
pouco de água, envolta em plástico (a
água precisa encostar na raiz).

Sim. Mais que uma possibilidade, o Sim. Segundo o americano, autor

ensino de caráter é uma obrigação.
“O treinamento de um homem para
seus filhos reflete claramente sua
virtude ou a falta dela.” O chinês
enfatiza que praticar boas ações
não é algo que descobrimos por nós
mesmos. Absorvemos esse hábito
ConFúCio nos espelhando nos exemplos da-
russell KirK
551 a.C.–479 a.C. queles que mais admiramos.
de A Mentalidade Conservadora, a
bondade não é uma característica
inata. Então a família é a instituição
mais importante quando se trata
de ensinar bons hábitos morais. A
virtude é o produto de experiências
vividas desde cedo com os pais, os
professores e os vizinhos.
1918–1994

março 2023 super 65

 ÚLTIMA PÁGINA desculpa qualquer coisa e até logo

ouro arriscado
O Comitê Olímpico Internacional revelou quais atletas sofreram mais lesões durante as
Olimpíadas de Tóquio. Veja o ranking dos esportes que mais causaram acidentes e quais
são as partes do corpo mais vulneráveis. Infográfico Natalia Lara e Maria Clara Rossini

27,1%

27,1%

22,2%

21%
incidência de lesões

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incidência de lesões em mulheres

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Fonte Artigo “New sports, COVID-19 and the heat: sports injuries and illnesses in the Tokyo 2020 Summer Olympics”.
66 super março 2023

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