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a ascensão

EDIÇÃO 455 • SETEMBRO 2023

da starlink
A rede de Elon Musk
já é responsável por
dois terços dos satélites
em órbita. E quer mais. p. 32

r$ 25,00

O primeiro modelo do
chamado Nível 3, em
que o motorista nem
precisa olhar para a
rua, já está no mercado
internacional. No Vale
do Silício, acabaram
de liberar dois serviços
de robotáxi. Entenda
o salto dos carros
autônomos – e o que
ainda falta para eles
chegarem até você. p. 20

POR BRUNO GARATTONI, DANIEL SANES E LEONARDO PUJOL

p. 40 p. 46 p. 52 p. 08
o futuro a astronomia Disney: 100 psicanálise
Dos laptops Dos povos anos De é mesmo uma
WinDoWs. inDígenas. história. pseuDociência?
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CARDÁPIO SETEMBRO DE 2023

20 Capa

CARROS AUTÔNOMOS
Os novos modelos dão ainda mais
liberdade ao motorista, que não precisa
ficar de olho na rua. Entenda a tecnologia
(e os mecanismos de segurança) por trás
desses veículos – e o que ainda falta
para eles deslancharem.

32 A ascensão da Starlink
Dos 6.718 satélites operacionais em órbita,
4.487 são da empresa de Elon Musk, que
começa a expandir-se também pelo Brasil.

40 Até 14 horas de bateria

Testamos dois modelos da nova geração de
notebooks Windows, que usa chips seme-
lhantes aos da Apple. Veja se vale a pena.

46 O céu indígena
Das estrelas às fases da Lua, saiba como
as observações astronômicas guiaram
a cultura de vários povos no Brasil.

As constelações
dos nossos povos 52 Festa no castelo
originários. P. 46 A Disney completa 100 anos. Conheça
a trajetória da empresa – e entenda
a crise que ronda o reino do Mickey.

5 carta ao leitor 12 puXou a mãe 65 manual

Dieta da gestante pode Como fazer suas roupas
influenciar o metabolismo
do filho após o nascimento.
número
incríVel ORÁCULO durarem mais.

ESSENCIAL 60 desce rasgando

Por que beber álcool
6 uma imagem... esquenta?
Na China, trabalhadores
colhem sementes de um
tipo de vitória-régia.

16 escolhidos a dedo
Veja os filmes que Martin
Scorsese elegeu como os
melhores da história. E saiba
8 ... uma opinião onde assisti-los.
Por que a 61 pá pum
psicanálise é uma 18 hacker corporal 63 só acredito Vendo
pseudociência? Gadget mostra se o seu 64 coneXÕes
corpo está queimando 64 lost in translation
carboidratos ou gordura.
71%
SUPERNOVAS 12 enquanto isso...

10 burlou o sistema 14 3 notícias sobre

dos 2.474 saté�
lites l ançados
no espaço em
ÚLTIMA PÁGINA
IA resolve verificações 16 pérolas do streaming 2022 pertencem 62 apostando corrida 66 #publi
captcha, que distinguem à rede star� Como o universo se expan- Quanto as celebridades
humanos de robôs. 19 Você decide link. p.32 de mais rápido que a luz? ganham por post no Insta?

Capa | Fotografia Eduardo Dulla


CARTA AO LEITOR
Carros autônomos:
mais do que um luxo, uma
necessidade civilizatória
A Vila Belmiro, estádio do San-
tos, tem capacidade para 30 mil tor-
cedores. O Brasil perde mais de uma
Vila Belmiro por ano em mortes no
trânsito. Em 2021, data dos números
mais recentes do Ministério da Saú-
de, foram 33.813.
Os acidentes com carros, cami-
nhões, ônibus e motos formam a se-
gunda “causa de morte evitável” no
país – atrás apenas do tabagismo,
que tira 160 mil vidas por ano.
O cigarro, falando nele, só não
faz parte do rol de substâncias proi-
bidas mundo afora por tradição (fo-
ra o lobby da indústria). Maços
faziam parte da ração dos soldados
nas Guerras Mundiais. Mas se o ta-
baco tivesse sido descoberto no sé-
culo 21, certamente não estaria à
venda nas padarias.
Com os carros e motos talvez não
tivesse sido diferente. Se por algum
desvio improvável da história os veí-
culos individuais só tivessem surgi-
do nesta década, dificilmente as
carteiras de habilitação seriam algo
amplamente acessível. Ficariam res-
tritas a motoristas profissionais. No
mundo, afinal, são 1,3 milhão de
mortes no trânsito a cada ano (uma
Porto Alegre inteira). E 50 milhões
de feridos (uma Espanha).
A evitabilidade dos acidentes fica
ainda nítida diante de outra estatísti-
ca: 90% deles, de acordo com a OMS,
são decorrência de falha humana.
Mas isso tende a mudar. Tecnolo-
gias que já existem são eficazes em
coibir tais falhas. É o caso da frena-
gem de emergência. Ela para o carro
ante ameaças de colisão iminente – e
é obrigatória para veículos novos na
Europa desde 2014. Também há o
controle de cruzeiro adaptativo (ACC
na sigla em inglês) – um piloto auto-
mático que deixa o veículo a uma dis-
tância sempre segura do da frente.
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EDITORIAL
O ACC faz parte do chamado “Ní-
vel 1” de autonomia. O Nível 2 junta o
controle de cruzeiro adaptativo com o
lane assist, sistema que mantém o car-
ro na faixa de rodagem durante uma
curva mesmo se você soltar o volante.
É o degrau no qual estão hoje os au-
tomóveis da Tesla (e de várias outras
fabricantes). De acordo com a monta-
dora de Elon, seus carros com esse
nível de autonomia sofrem um aci-
dente a cada 8,9 milhões de km –
versus um a cada 1 milhão de km da
média americana. Um salto.
E já existem automóveis no Nível
4 – caso dos 600 táxis-robôs que ro-
dam por São Francisco, na Califórnia.
Eles não têm motorista. Você chama
na rua, o carro chega sozinho e faz a
viagem por conta própria. Não que
seja tudo uma estrada de rosas. Em
nossa reportagem de capa, o editor
Bruno Garattoni, com os repórteres
Daniel Sanes e Leonardo Pujol, mos-
tra os desafios que os carros autôno-
mos ainda têm a vencer para fazerem
parte das nossas vidas.
De qualquer maneira, o futuro deles
é promissor. E o fator segurança torna
o desenvolvimento dessa tecnologia
mais do que um luxo. Trata-se de uma
evolução necessária. Civilizatória.
Alexandre Versignassi
di r etor de r edação
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Fundada em 1950
VICTOR CIVITA ROBERTO CIVITA
(1907-1990) (1936-2013)
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ESSENCIAL UMA IMAGEM...

6 super setembro 2023 Foto vcg / getty images

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setembro 2023 super 7

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ESSENCIAL ...UMA OPINIÃO

na página anterior: Trabalhadores colhem sementes da Euryale ferox em um lago

da província de Jiangsu, na China. A planta pertence à mesma família da vitória-régia,
e suas sementes são típicas da culinária do leste asiático. Quando secas, elas recebem
o nome makhana, e costumam ser usadas em sopas e em uma espécie de arroz doce
indiano. Além disso, as sementes estouram como pipocas quando aquecidas.

Sonhos são
realizações

Por que a de desejos

inconscientes?
A cura depende

psicanálise da recordação
de traumas
esquecidos?

é uma
Simplesmente
não há evidência
científica

pseudociência?
que apoie as
especulações
freudianas.
Entenda.

POR DANIEL GONTIJO*

o
“O inconsciente existe, mas a psicanálise é uma pseudociência.”
Embora essa afirmação pareça incoerente à primeira vista, muitos
filósofos e teóricos da psicologia a emitiriam sem pestanejar. Seria
mais ou menos como dizer que estrelas e planetas existem, mas a
Astrologia passa longe de ser uma ciência.
Por um lado, estudos científicos vêm corroborando a tese de
que vários processos neuropsicológicos ocorrem sem que os per-
cebamos. Experiências conscientes como sentimentos, decisões
e lembranças seriam continuamente sustentadas e moduladas
por operações automáticas e ocultas do cérebro. Na verdade,
essa premissa sequer é questionada pelos neurocientistas. Ponto
para Sigmund Freud.
Por outro lado, os conteúdos, os mecanismos e os efeitos
desse inconsciente neuropsicológico não se assemelham muito

*Daniel Gontijo é doutor em neurociências pela UFMG, fundador do Instituto Ponto Azul (IPA) e membro da
8 super setembro 2023 Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidências (ABPBE).

às especulações freudianas. Essa é a
avaliação do escritor de divulgação
científica Leonard Mlodinow, por
exemplo, para quem “as forças inter-
nas do novo inconsciente têm pouco
a ver com as motivações inatas des-
critas por Freud”, entre as quais “o
desejo dos garotos de matar o pai para
se casar com a mãe” e “a inveja das
mulheres do órgão sexual masculino”.
Tal como as evidências históricas
sobre o fato de Jesus ter existido não
provam seus milagres, as descobertas
neuropsicológicas sobre o inconsciente
ainda não provaram as principais hi-
póteses psicanalíticas.
Para ilustrar, consideremos o pro-
cesso que Freud chamou de “pedra de
fundação” da psicanálise: a repressão. Ba-
sicamente, ele acreditava que as lembran-
ças doloridas de um trauma poderiam
ser reprimidas no inconsciente – ou seja,
elas seriam “banidas” para lá, tornando-se
inacessíveis à consciência –, e estariam
por trás do desenvolvimento de sintomas
e neuroses.
No entanto, as evidências científi-
cas parecem não apoiar essa tese. Um
estudo conduzido pelo neurocientista
francês Pierre Gagnepain e colegas, em
2014, indica que lembranças indesejá-
veis suprimidas têm pouco poder sobre
nós. Os autores da pesquisa discutem
a necessidade de “reexaminar o cente-
nário pressuposto de que a supressão”
produz memórias “inconscientes que
prejudicam a saúde mental”.
Alguém poderia argumentar que
a carência de validação científica das
teses da psicanálise não justifica co-
locá-la no balaio das pseudociências
– afinal, as evidências ainda podem
chegar. Outros poderiam reunir um
punhado de estudos que parecem in-
dicar sua eficácia terapêutica. Por fim,
seria também possível alegar que os
psicanalistas não estão reivindicando
a cientificidade de sua prática. Consi-
derando tudo isso, não seria injusta a
acusação de que a doutrina fundada
por Freud é pseudocientífica? Antes de
responder a essas objeções, precisamos
recorrer rapidamente à filosofia.
Segundo o filósofo Sven Hansson,
pseudociências são doutrinas que,
embora careçam de confiabilidade, são
referências: Artigo Is Longer-Term Psychodynamic Psychotherapy More Effective than Shorter-Term Therapies? Review and Critique of the Evidence; Artigo Suppressing unwanted
memories reduces their unconscious influence via targeted cortical inhibition; Artigo Does Repression Exist? Memory, Pathogenic, Unconscious and Clinical Evidence; Texto
Definindo pseudociência e ciência; Livro Subliminar: como o inconsciente influencia nossas vidas.
CLUBE DE REVISTAS
O fato de que a saúde mental de pessoas
religiosas tende a ser (levemente) melhor
não significa que suas crenças teológicas
sejam verdadeiras.
defendidas como se fossem confiáveis.
Em outras palavras, os principais pro-
ponentes de uma pseudociência ten-
tam passar a impressão de que seu
sistema de ideias tem credibilidade
e/ou é apoiado por boas evidências.
E muitos deles fazem isso sem alegar
que sua doutrina é científica – e sem a
intenção de enganar os incautos.
À luz dessa perspectiva, não im-
porta se nem todos os psicanalistas
reivindicam o status de ciência para a
psicanálise. Em vez disso, poderíamos
avaliar como eles costumam se posi-
cionar na mídia, nas universidades e
em seus livros. Se a doutrina é apre-
sentada como se descrevesse confia-
velmente o funcionamento da mente,
isso basta para que ela seja avaliada
como científica ou pseudocientífica.
E o fato é que, desde o nascimento
da psicanálise, essa atitude presunçosa
vem sendo identificada – e criticada.
Ainda assim, é possível que a
terapia psicanalítica funcione, seja
eficaz. E, havendo estudos que de-
monstrem isso, a confiança que os
psicanalistas têm em sua prática seria
cientificamente justificada.
Infelizmente, essa não é a avaliação
de muitos especialistas. Embora exis-
tam pesquisas sugestivas de que esse
tipo de psicoterapia funciona – para
alguns tipos de caso, pelo menos –,
elas seriam relativamente escassas e
de baixa qualidade metodológica. Isso
não é nada trivial. Resultados positivos
gerados por métodos enviesados são
como alterações de peso aferidas por
balanças desreguladas. Isso significa
que, no máximo, os achados acerca da
eficácia da psicanálise são inconclusivos.
Mesmo que o cenário fosse outro,
bem-estar e melhorias comportamen-
tais gerados por uma prática não garan-
tem sua cientificidade. Consideremos
o caso da fé. O fato de que a saúde
mental de pessoas mais religiosas
tende a ser (levemente) melhor não
significa que suas crenças teológicas
sejam verdadeiras.
Muitas religiões podem melhorar
a vida social dos fiéis e dar a eles
respostas reconfortantes às suas
questões existenciais. Isso pode até
fazer bem, mas não faz com que as
doutrinas religiosas sejam científicas,
confiáveis. De forma análoga, é pos-
sível que os presumíveis benefícios
da terapia psicanalítica não tenham
muito a ver com suas doutrinas sub-
jacentes, e sim, por exemplo, com as
características pessoais dos terapeutas.
Obviamente, não podemos desprezar
o valor terapêutico das habilidades in-
terpessoais de quem trabalha com saúde
mental. Na verdade, isso é um pré-re-
quisito importante para o sucesso de
qualquer tipo de psicoterapia.
Mas, quando a tarefa é examinar
a cientificidade de uma doutrina, fi-
lósofos e demais teóricos precisam
descobrir se as afirmações que a cons-
tituem são confiáveis. Afinal, existem
boas evidências de que os sonhos são
realizações de desejos inconscientes?
De que a cura depende da recordação
de traumas esquecidos? De que ego,
id e superego são componentes fun-
damentais da mente humana?
Enquanto os pesquisadores de
orientação psicanalítica não passarem
a colocar suas hipóteses à prova, a cre-
dibilidade da psicanálise continuará
declinando. Graças aos avanços recen-
tes nas neurociências e na psicologia
experimental, já não é razoável alegar
que os processos inconscientes não são
passíveis de mensuração e testagem.
Aparentemente, os psicanalistas têm
resistido à oportunidade de avaliar
rigorosamente as teses controversas
em que depositam tanta confiança. Em
grande medida, isso resume por que
a psicanálise é frequentemente clas-
sificada como uma pseudociência. S
setembro 2023 super 9

supernovas
ILUSTRAÇÕES Mariana andrello e leticia kaMioka & tiaGo arauJo DESIGN caroline aranha
IA já consegue resolver “captchas"
Sabe quando você vai se cadastrar num site
ou app e tem de resolver uma charadinha, clican-
do em fotos, para provar que é humano? São os
captchas (“teste completamente automatizado para
discernir computadores e humanos", na sigla em
inglês). Eles são chatinhos, mas necessários. Sem
essa barreira, bots assumiriam o controle e pode-
riam fazer coisas ruins – como publicar spam, sur-
rupiar dados ou congestionar tudo, nos impedindo
de usar os serviços online. Mas essa defesa pode
estar prestes a cair. Cientistas da Universidade da
10 super setembro 2023
CLUBE DE REVISTAS
Califórnia compararam o desempenho de 1.400
voluntários e de um grupo de bots, que foram
colocados para resolver captchas nos 200 sites mais
acessados da internet1.
Resultado: as IAs conseguiram resolver 85% a
100% dos testes, dependendo do tipo. Elas se saí-
ram bem melhor do que os humanos (que tiveram
50% a 81% de acerto). A saída, dizem os pesqui-
sadores, será criar testes que sejam mais difíceis
para os robôs – utilizando o sensor de movimento
do celular, por exemplo. (Bruno Garattoni)
A
 CLUBE DE REVISTAS
sn. EDIÇÃO BRUNO GARATTONI

57%
dos ingleses
consideram o Brexit,
em que a Inglaterra
decidiu se separar
da União Europeia,
um erro. É a maior
taxa de rejeição
desde o referendo,
em 2016. O principal
motivo apontado é
o mau desempenho
econômico, com
inflação e queda
no padrão de vida.
Quem votou a favor
do Brexit achava
que ele levaria à
reindustrialização
do país, com forte
geração de empre-
gos, o que não se
concretizou. (BG) B

remédio aqueciMento Global pode reduzir fotossíntese

trata vício Calor extremo afeta as florestas – e pode ter outro efeito perverso, revela estudo.

em cannabis Se a humanidade não fizer nada para Pesquisadores dos EUA, do Brasil e da Aus-
reduzir o uso de combustíveis fósseis, as trália cruzaram medições de temperatura via
o aef0117, que está emissões de CO2 não vão diminuir. Elas satélite com amostras florestais, e descobri-
sendo desenvolvido tenderão, pelo contrário, a crescer – e o pla- ram duas coisas. A primeira é que, hoje, as
pelo laboratório neta poderá alcançar 4,3oC de aquecimento folhas das plantas já passam de 40oC em
francês AelisFarma, no ano 2100. Essa é a pior das hipóteses, o alguns momentos. A segunda é que o calor
passou na segunda mais catastrófico dos quatro cenários pro- extremo reduz a fotossíntese. Eles calcula-
rodada de testes em jetados pelo IPCC (Intergovernmental Panel ram que, se as florestas sofrerem mais 3,4 a
humanos2. Ele se on Climate Change), grupo internacional de 4,4oC de aquecimento, começarão a perder
mostrou eficaz em cientistas que analisa o aquecimento global. sua capacidade de fazer esse processo, em
voluntários com Pode acontecer, com diversas consequências que as plantas absorvem CO2. E isso teria
transtorno de uso graves – que incluiriam, como aponta um um efeito extra: sobraria mais dióxido de
da cannabis (CUD), novo estudo3 , a queda da capacidade fo- carbono na atmosfera, realimentando o
em que a pessoa se tossintética das florestas tropicais. aquecimento global. (BG)
torna dependente da
erva – essa condição
afeta cerca de 10%
dos usuários de
maconha. Agora, “Não queremos que as pessoas mostrem vídeos a eles",
o medicamento
seguirá para os testes disse hollie ross, supervisora do zoológiCo de toronto, no Canadá, cujos visitantes têm exibido
de Fase 3, a última clipes em seus smartphones para os gorilas. Os animais demonstram grande interesse – mas, segundo os
antes de chegar ao tratadores, isso pode fazer mal a eles. O zoológico de Chicago já enfrentou um problema similar: teve que
mercado. (BG) colocar uma corda para afastar os visitantes, e impedir que os gorilas vissem as telas de seus celulares. (BG)
ilustrações A Mariana Andrello e Leticia Kamioka. B Tiago Araujo. fonte (1) An Empirical Study & Evaluation of Modern CAPTCHAs. A Searles
e outros, 2023. (2) Signaling-specific inhibition of the CB1 receptor for cannabis use disorder: phase 1 and phase 2a randomized trials. PV Piazza e
outros, 2023. (3) Tropical forests are approaching critical temperature thresholds. C Doughty e outros, 2023.
setembro 2023 super 11

sn.
Num torneio do game
Valorant, Elon Musk
foi recebido com vaias
e gritos de “traga o
Twitter de volta”.
ENQUANTO
ISSO...
Texto Leo Caparroz
Ilustração Caroline Aranha
Cientistas usaram cascos de
tartaruga para medir os níveis
de radioatividade nas Ilhas
Marshall, onde os EUA testaram
bombas atômicas A.
Voluntários expostos a certos
perfumes enquanto dormiam
tiveram aumento na memória
e capacidade cognitiva B.
Um novo tratamento usa RNA
para tentar interromper o ciclo
de vida do P. falciparum, um dos
parasitas que causam a malária C.
Pesquisadores criaram uma
bactéria geneticamente modifi-
cada que ajuda a diagnosticar o
câncer de cólon em ratos D.
fontes A Pacific Northwest National Labora-
tory. B, C e D Universidade da Califórnia.
12 super setembro 2023
CLUBE DE REVISTAS
dieta da Gestante influencia a vida do filho
Alimentação pode alterar o metabolismo do bebê para o resto da vida.
Nossas característIcas INdIvIduaIs
começam a ser formadas quando ainda
estamos no útero – com alterações que
persistem a vida inteira. A preferência
por comidas gordurosas, por exemplo,
pode ser consequência daquilo que a
mãe comeu durante a gravidez. É o que
afirma um artigo científico4 publicado
por José Donato Júnior, do Instituto de
Ciências Biomédicas da USP, que analisou
os estudos mais recentes sobre o tema. A
Super conversou com ele para entender
o assunto.
O seu artigo diz que a dieta materna
causa uma reprogramação metabólica
no feto. O que isso significa?
É um fenômeno associado a determinadas
situações ambientais, como estresse e nu-
trição, que interferem em períodos críticos
do desenvolvimento do indivíduo e alteram
sua predisposição a doenças futuras. A pro-
gramação metabólica tem sido associada a
riscos aumentados de doenças cardiovas-
culares, obesidade e diabetes. Neste caso,
focamos no tecido adiposo da mãe. Ele não
só armazena gordura, mas também é uma
fonte abundante de hormônios, que têm
impacto sobre o controle metabólico.
Que hormônios são esses?
Os mais estudados são a leptina e a adipo-
nectina. A leptina é produzida de forma
fontes (4) Programming of metabolism by adipokines during development. J Donato Jr, 2023. (5) A Practical
Deep Learning-Based Acoustic Side Channel Attack on Keyboards. J Harrison e outros, 2023.
proporcional à quantidade de energia
armazenada no tecido adiposo. Ou seja,
pessoas excessivamente magras possuem
pouca leptina, enquanto obesos têm em
excesso. Já com a adiponectina ocorre o
oposto [magros têm altos níveis desse hor-
mônio, e obesos produzem pouco].
A leptina afeta o desenvolvimento de
circuitos neurais que controlam a sensação
de saciedade e fome. A adiponectina está
relacionada ao controle de glicemia e age
diretamente na placenta, alterando a quan-
tidade de nutrientes que o feto recebe da
mãe. Além de serem secretados durante a
gestação, esses hormônios também estão
presentes no leite materno.
A má alimentação da gestante pode
predispor o bebê a ter quais doenças?
O excesso [alimentar] está associado a
um maior crescimento do feto, e maior
risco de obesidade e diabetes no futuro.
Já a carência alimentar, curiosamente,
tem consequências parecidas – porque o
feto acaba desenvolvendo adaptações que
permitam sobreviver com pouca comida.
O problema acontece depois, quando eles
são expostos a um ambiente de fartura:
como seu organismo está preparado para
ser econômico, esses indivíduos acabam
desenvolvendo obesidade e diabetes com
mais facilidade. (Maria Clara Rossini e
Bruno Garattoni)
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Veganos emitem até 70% menos CO2

Estudo avaliou a dieta de 55 mil pessoas e o impacto da indústria de carne em 119 países.

CONSUMO MÉDIO DE CALORIAS POR DIA:

1.754 1.879 1.897 1.816 1.940 2.222

Veganos Vegetarianos pescetarianos carnívoros ocasionais carnívoros carnívoros

(comem até 50 gramas moderados intensos
QUANTO A ALIMENTAÇÃO DE CADA PESSOA GERA, POR DIA: de carne/dia) (50 a 99 g/dia) (mais de 100 g/dia)

co 2: Cada 1 kg emitido eQuivale a rodar 10 km de Carro

2,16 kg 3,33 kg 3,81 kg 4,21 kg 5,34 kg 7,28 kg

uso de terra (para produzir a Comida de 1 dia):

4,37 m 2 6,01 m 2 6,31 m 2 8,31 m 2 11,28 m 2 16,78 m 2

uso de água (para produzir a Comida de 1 dia):

410 litros 530 litros 710 litros 710 litros 780 litros 890 litros

fonte Vegans, vegetarians, fish-eaters and meat-eaters in the UK show discrepant environmental impacts. P Scarborough e
outros, 2023. Exhaust emission factors of greenhouse gases (GHGs) from European road vehicles. M Clairotte e outros, 2020.

95%
é a preCisão de uma inteligência artificial que analisa o barulho do teclado do
notebook ou do desktop – e consegue descobrir tudo o que você está digitando.
O programa, desenvolvido por cientistas ingleses 5 , identifica diferenças muito
sutis no ruído que cada tecla produz (o som emitido varia conforme a posição dela
no teclado, e o ângulo em que cada dedo a pressiona). A técnica permite hackear
um computador mesmo sem instalar nenhum vírus ou software espião – basta
um microfone escondido no ambiente. A IA também funciona em videochamadas
(poderia captar o som de coisas digitadas durante uma reunião, por exemplo). (BG)

Ilustração Tiago Araujo.

setembro 2023 super 13
 CLUBE DE REVISTAS
sn.

3 notícias sobre
Água
salgada
China x EUA causa
As superpotências seguem se estranhando – e o foco são questões tech. incên-
dios em
Teslas
Após a passagem
do furacão Idalia,
que causou inun-
dações na Flórida
no começo do
mês, dois Teslas
pegaram fogo
espontaneamente
em Palm Harbor.
Motivo: haviam
ficado parcialmen-
te submersos em
água do mar, que
se depositou nas
baterias, causando
curto-circuitos.
Os carros elétricos

1.
empresa é obrigada a
desacelerar placas
Os EUA decidiram limitar a
velocidade dos processadores
que podem ser exportados para
a China. Então a americana
Nvidia, que faz a maioria dos
chips usados em inteligência
artificial, criou dois produtos: as
placas H800 e A800, destina-
das ao mercado chinês. Elas são
iguais às H100 e A100 vendidas
no Ocidente, mas sua memória
é limitada (estima-se que traba-
lhe 50% mais devagar). (BG)
2.
regra vai limitar a
3.
país prepara máquina
podem ser mo-
lhados, mas não
com água salgada
– pois ela conduz
exportação de drones de 28 nanômetros mais eletricidade
O governo chinês anunciou que, Hoje a China usa máquinas
do que a doce. "Se
a partir deste mês, vai controlar ocidentais para fabricar CPUs,
a venda dos modelos "de alta e os EUA podem impedir a você possui um
performance": seus fabricantes exportação delas. Os modelos carro elétrico ou
terão de pedir permissão antes chineses são primitivos, têm híbrido que entrou
de enviá-los para outros países. precisão de 90 nm (suficiente em contato com
O objetivo da medida – que para fazer chips equivalentes
água salgada, tire-
deve atingir em cheio a empresa a um Pentium 4 lançado em
chinesa DJI, líder do mercado 2004). Mas o país tenta vencer o -o da sua garagem
global – é coibir o uso não auto- atraso: afirmou que, até o fim do imediatamente",
rizado de drones em situações ano, vai apresentar sua máquina alertou o corpo
militares, como a Guerra da de 28 nm – tecnologia que o Oci- de bombeiros
Ucrânia. (BG) dente dominou em 2010. (BG)
local. (BG)

1 o queijo 3 a lEituRa
Queijo Em 2022, o fabricante passou a im- O comerciante usa um laser para energizar
primir seu nome e QR codes na casca, o chip. Ele emite um sinal criptografado
italiano virá mas não adiantou: falsários copiaram – que identifica a autenticidade do queijo.
com chip ambos os detalhes. Célula
Laser
fotoelétrica
Sinal
Parmigiano reggiano Processador eletromagnético
adota tecnologia 2 o chiP Memória
para combater Foi criado pela empresa americana Antenas
falsificações. p-Chip, e tem o tamanho de um grão
de sal. É injetado na casca do queijo.

14 super setembro 2023

 CLUBE DE REVISTAS

NÃO É BEM
ASSIM...
Notícias que
bombaram por
aí – mas não
são verdade.

a notícia

Poluição do ar
deixa bactérias
mais resistentes
o que ela dizia
Quanto mais poluído
o ar, mais frequentes
são os casos de in-
fecção por bactérias
super-resistentes. É o
que afirma um estu-
do9 publicado por
cientistas do Reino

terapia Genética iMita o efeito do ozeMpic Unido e da China, que

analisaram os dados
de 116 países.
Procedimento, já testado em ratos, usa um vírus – e leva à perda de peso.
a Verdade
A semaglutida, princípio ativo do Ozem- que o próprio corpo aumente sua produção O estudo não encon-
pic, imita a ação de um hormônio natural de GLP-1. A técnica consiste em injetar um trou, nem tentou
chamado GLP-1 – que age sobre vários ór- vírus modificado, que carrega consigo um encontrar, uma rela-
gene criado em laboratório – e, ao entrar no ção de causa e efeito
gãos, incluindo o cérebro, para controlar o
entre a poluição e as
apetite (ele também faz o pâncreas liberar organismo, modifica o DNA do hospedeiro. infecções. O que ele
insulina, cuja falta causa diabetes). O porém A empresa publicou os resultados dos achou foi uma cor-
é que o remédio precisa ser aplicado por primeiros testes7 em ratos, nos quais o relação estatística,
toda a vida, ou a pessoa volta a engordar6. processo funcionou como esperado. Fez que é interessante
mas não prova nada.
Mas um tratamento radical, que está sendo mais efeito que a semaglutida, e de forma
Talvez os países
desenvolvido pela farmacêutica americana persistente (com uma única aplicação do com ar mais poluído
Fractyl Health, propõe uma solução de- vírus). Segundo a Fractyl, o tratamento não tenham mais infec-
finitiva: ela quer alterar o genoma, para causou efeitos colaterais. (BG) ções graves devido a
outros fatores, que
o estudo não avaliou
(como uso excessivo
de antibióticos, pre-
experiência ressuscita moléculas neandertais disposição genética,
ou prevalência de
bactérias diferentes).
Pesquisadores americanos usaram uma ferramenta de inteligência artificial para analisar Os próprios autores
o DNA neandertal e identificar8 quais trechos dele continham instruções para fazer "peptídeos dizem que "mais
antimicrobianos": moléculas que funcionam como antibióticos naturais, combatendo infecções no evidências médicas
organismo. O software encontrou mais de 100 peptídeos – que aí os cientistas sintetizaram quimica- são necessárias" para
estabelecer uma rela-
mente e injetaram em ratos de laboratório (que haviam sido infectados com vários tipos de bactéria).
ção entre poluição
Catorze moléculas demonstraram algum grau de atividade antimicrobiana. Segundo os pesquisadores, e bactérias. (BG)
a técnica pode revelar novos antibióticos para uso humano. (BG)

ilustrações Tiago Araujo. fontes (6) Weight regain and cardiometabolic effects after withdrawal of semaglutide: The STEP 1 trial extension. J Wilding e outros, 2022.
(7) 181-OR: Pancreatic Gene Therapy Durably Improves Glycemia and Delays Disease Progression in a Murine Model of Type 2 Diabetes. A Fitzpatrick e outros, 2023.
(8) Molecular de-extinction of ancient antimicrobial peptides enabled by machine learning. J Maasch e outros, 2023. (9) Association between particulate matter (PM)2·5 setembro 2023 super 15
air pollution and clinical antibiotic resistance: a global analysis. Z Zhou e outros, 2023.
 CLUBE DE REVISTAS
sn. playlist

A lista Em outubro, Martin Scorsese lança Assassinos da Lua das Flores,

com Leonardo DiCaprio e Robert De Niro. Confira a lista dos
dez melhores filmes de todos os tempos, segundo o cineasta.
do mestre Texto Rafael Battaglia • Design Luana Pillmann

ONDE ASSISTIR YouTube Globoplay Belas Artes À La Carte HBO Max Looke Oldflix Indisponível

2001: uma odisseia no espaço oito e meio cinzas e diamantes cidadão kane diário de um padre
1º (Stanley Kubrick, 1968)
2º (Federico Fellini, 1963)
3º (Andrzej Wajda, 1958)
4º (Orson Welles, 1941)
5º (Robert Bresson, 1951)

os sapatinhos Vermelhos
ViVer o leopardo a palaVra paisà
6º (Akira Kurosawa, 1952)
7º (Luchino Visconti, 1963)
8º (Carl Theodor Dreyer, 1955)
9º (Roberto Rossellini, 1946)
10º (Michael Powell e Emeric
Pressburger, 1948)

A seleção foi feita em 2022 a pedido da revista britânica
júri técnico Sight and Sound, que mantém dois rankings com os 100
melhores filmes da história: o dos críticos (formado
por 1.600 deles) e o dos diretores (que reúne os votos
de 480 cineastas; entre eles, Scorsese). As listas são
atualizadas a cada dez anos.
Três dos dez títulos da lista são italianos. Não por acaso:
che bello na infância, Scorsese vivia assistindo aos filmes do país
com os avós, imigrantes da Sicília. Em especial, os do
movimento neorrealista, que retratava as dificuldades
pós-Segunda Guerra. No doc Minha Viagem à Itália
(1999), Martin detalha essa paixão.

FILME FILME
50% (2011) Estranho Passageiro
MUBI (2020) Netflix
Adam está com dor nas costas. URSS, 1983. A psiquiatra Ta-
Vai ao médico e descobre que tiana é chamada para atender
PÉROLAS DO tem um câncer na coluna. Entra
no Google e fica sabendo que o
um cosmonauta que voltou
do espaço com amnésia. Ele
STREAMING tumor, um neurofibrossarcoma,
mata 50% dos pacientes. Ele
parece normal, só um pouco
irritado. Mas trouxe consigo
decide fazer a quimioterapia, algo sinistro: um parasita alie-
mas tenta manter a vida nor- nígena que controla sua mente.
mal: continua saindo, bebendo Sci-fi original e apavorante,
e se divertindo como qualquer que deverá ganhar uma refil-
cara de 27 anos. (BG) magem em Hollywood. (BG)

16 supEr setembro 2023 Imagens Reprodução/Divulgação.

 CLUBE DE REVISTAS
EDIÇÃO BRUNO GARATTONI

“Vi como ele

podia ser
atraente, como
convenceria
um cliente a
pedir o prato
520 mil voltas na pista do dia ou
É quanto a inteligência artificial deste simulador de corrida trei-
nou para aprender a dirigir nos 20 circuitos presentes nele. Isso resultou mais uma
em oponentes robóticos avançados, que se comportam como humanos.
O game também tem vários modos multijogador, gráficos bonitos e uma
taça de vinho",
A FELICIDADE enorme coleção, com mais de 500 carros, para escolher. (BG)
Forza Motorsport. Lançamento dia 10/10, para Xbox Series X/S e PC.
escreve a psiquiatra
forense Gwen Adshead

NA PRÁTICA R$ 349 (grátis no serviço Xbox Game Pass). sobre seu primeiro en-
contro com "Tony": um
garçom que se tornou
Em 1938, a Universidade Har- serial killer e foi conde-
vard começou a acompa- nado à prisão perpétua.
nhar a vida de 724 ex-alunos, Neste livro, Adshead
e não parou mais: continua conta histórias de sua
fazendo isso até hoje, com carreira atendendo
mais de 1.300 descenden- presos – e tenta enten-
tes deles. O objetivo do der como eles viraram
estudo, que inclui análises criminosos. (BG)
psicológicas, mapeamento
genético e exames médicos, O Mal que nos Habita.
é determinar quais fatores R$ 59,90.
mais influenciam o grau de
felicidade de uma pessoa
ao longo da vida (spoiler:
Bagdá, século nove
as amizades são o mais
importante). Este livro, es-
O Oriente Médio atravessa o que ficaria conhecido como Anarquia
em Samarra: um período de forte instabilidade, com quatro califas Os
crito pelos médicos Robert
Waldinger e Marc Schulz,
em apenas nove anos. Eis o cenário deste game, em que você faz
missões inspiradas em eventos históricos reais. Ele é mais enxuto do traumas
apresenta os resultados
mais recentes. (BG)
que outros Assassin's Creed: a campanha principal tem "apenas" 20 h
de duração. Por isso, seu preço também é um pouco mais baixo. (BG) de Elon
Uma Boa Vida. R$ 59,90. Assassin's Creed Mirage. Lançamento dia 5/10, para PlayStation, ele sofria bullying – e
Xbox e PC. R$ 210. certa vez apanhou tanto
que ficou uma semana
no hospital. Tinha uma
péssima relação com
documentário canal o pai, cuja lembrança
O Rei dos Clones tentou apagar na vida
DecifraHits
(2023) Netflix adulta. Desenvolveu
YouTube
Hwang Woo-suk ficou famoso
complexo de herói e
Você sabia que o título de foi estudar a vida de
pelas pesquisas com células- Smells Like Teen Spirit, do Nir-
-tronco, e virou herói nacional na Napoleão, cujas táticas
vana, veio de um desodorante?
Coreia do Sul. Até que publicou Que Bohemian Rhapsody, do
passou a adotar. Essas
dois estudos clonando, pela Queen, tem referências ao isla- são algumas das reve-
primeira vez na história, células mismo – pois Freddie Mercury lações desta biografia,
de embriões humanos. Isso nasceu num país muçulmano? escrita por Walter
atraiu a atenção da comuni- Que Viva la Vida, do Coldplay, Isaacson (mesmo autor
dade científica: que começou a é sobre a Revolução Francesa? de Steve Jobs). (BG)
descobrir coisas muito erradas Veja essas e outras histórias
no trabalho dele. (BG) sobre músicas de sucesso. (BG) Elon Musk. R$ 89,90.

setembro 2023 super 17


sn. tech
O leitor de
metabolismo
O aparelho, que se chama Lumen (US$ 299),
deve ser usado ao acordar, antes de cada refeição e
antes de fazer exercícios físicos. Você coloca o gadget
na boca, segura o ar por 10 segundos e expira. Aí ele
mede a chamada “taxa de troca respiratória”, que é o
teor de CO2 presente na sua expiração. Com isso, é
possível saber se o seu corpo está queimando carboi-
dratos ou gorduras, e em qual proporção, naquele mo-
mento – porque a oxidação (digestão) dessas moléculas
gera quantidades diferentes de dióxido de carbono.
O resultado é mostrado num valor que vai de 1 a 5.
18 super setembro 2023
CLUBE DE REVISTAS
Gadget usa a respiração para descobrir se o seu
corpo está queimando carboidratos ou gordura – e
promete ajudar a emagrecer. Veja como funciona.
Texto Bruno Garattoni • Design Cristielle Luise
o aplicativo
Além de apontar qual
fonte de energia o
corpo está usando, ele
também dá dicas do
que e quando comer – e
em quais momentos
do dia, de acordo com
o metabolismo, é mais
vantajoso se exercitar
para queimar gordura.
Se der 1, significa que o organismo está queimando só
gordura; o 5, por outro lado, quer dizer que ele está se
alimentando só de carboidratos (2, 3, 4 são intermediá-
rios, e indicam a proporção entre as duas coisas).
O Lumen foi criado por duas médicas israelenses, e é
a versão doméstica de um exame metabólico usado por
atletas (normalmente feito em laboratório, com a pessoa
fechada numa câmara por 60 minutos). A ideia por trás
dele: se você quer perder peso ou ganhar massa mus-
cular, o mais eficiente é que o corpo esteja queimando
gordura, não carboidratos.
fotos Reprodução/Divulgação

SATÉLITE
PARA TODOS
O destaQue do iPhone 14
é a função Emergency SOS:
se você estiver num lugar
sem sinal de celular, pode se
conectar com uma rede de
satélites e enviar mensagens
de texto pedindo ajuda (elas
são recebidas por atenden-
tes especializados). Agora,
o Motorola Defy Satellite
Link adiciona esse recurso a
qualquer smartphone – bas-
ta levar o gadget, que pesa
apenas 70 g, no bolso. Custa
US$ 149, mais US$ 5 mensais.
Por enquanto, ele só funcio-
na nos EUA – mas deve iniciar
o serviço na América Latina
até o final do ano.
CLUBE DE REVISTAS
EDIÇÃO BRUNO GARATTONI
Direto na retina
Está vendo essa peça grandona, acoplada VOCÊ DECIDE
na parte de trás? A Sony HX99 RNV é a primeira
câmera para deficientes visuais: a tal peça é um Os projetos mais
microprojetor, que exibe as imagens diretamente interessantes
na retina (a parte de trás do olho, onde há células do mundo do
que captam luz). A câmera reconhece a pupila e crowdfunding
mira nela – com isso, os raios de luz “pulam” os
mecanismos naturais de focalização do olho.
O público-alvo da máquina, que custa US$ 599, são
pessoas que sofrem de doenças na córnea.
Professor
de guitarra
indiegogo.com
projeto Mu6label
o que é Um gadget que en-
sina a tocar violão e guitarra.
Sem complicação É um computadorzinho
flexível, que você gruda na
Ver filmes Com som surround é legal. Mas você não tem lateral do instrumento. Ele
paciência nem espaço para encher a sala com caixas de som? A detecta as vibrações das
soundbar Sony HT-AX7 (US$ 499) propõe uma solução inteligente: cordas – e consegue captar
ela vem com duas caixinhas traseiras sem fio, a bateria. Na hora de ver os sons com alta precisão.
o filme, você pega as caixinhas (que medem 12 x 4 cm e pesam 300 g Mostra quais cordas você
cada) e põe nos cantos do sofá. Terminou? Basta recolocá-las sobre deve tocar, e se está fazendo
a soundbar, que carrega as baterias delas. A conexão da soundbar direito. Também funciona
com a TV também é sem fio, via Bluetooth. como metrônomo e afinador.
Quanto já arrecadou
US$ 40 mil
chance de rolar bbb
Dois em um
kickstarter.com
projeto Ringo Water Bottle
o que é Uma garrafa d’água
com ímã na tampa – que se-
gura o seu smartphone. Uma
ideia supersimples, mas que
Um headset diferente
pode ser bem útil em várias
situações (correndo na esteira,
se arrumando, cozinhando
Os Therabody Smart Goggles (US$ 199) parecem óculos de re- etc.). A garrafa pesa 370
alidade virtual, mas não têm telas. Eles servem para cuidar de algo gramas – e, segundo seus cria-
muito mais real: dores de cabeça. Aplicam uma combinação de calor, dores, mantém o smartphone
massagem e vibrações suaves na sua sua testa e têmporas enquan- em pé mesmo quando está
to tocam sons relaxantes, em sessões que duram 5 a 30 minutos. vazia, sem água.
O gadget tem um sensor de batimentos cardíacos, que ele usa para Quanto já arrecadou
medir o seu grau de relaxamento – e também, quando está no modo US$ 330 mil
automático, para ajustar a intensidade do tratamento. chance bbbb
setembro 2023 super 19
 CLUBE DE REVISTAS
capa

A NOVA FASE DO

CARRO
 CLUBE DE REVISTAS

AUTÔNOMO
O primeiro modelo do chamado Nível 3, em que o motorista
nem precisa olhar para a rua, está sendo lançado nos EUA.
No Vale do Silício, dois serviços de robotáxi acabam
de ser liberados para rodar sem limites, 24h por dia.
Entenda o salto dos veículos autônomos – e o que ainda
falta para eles chegarem até você.

Texto Bruno Garattoni, Daniel Sanes e Leonardo Pujol

Ilustração Gustavo Magalhães

Design Caroline Aranha

setembro 2023 super 21


D
Dirigir na Califórnia é um infer-
no. Pelo menos na Bay Area, região que
inclui São Francisco e demais cidades
do Vale do Silício, onde os motoristas
passam em média 97 horas por ano em
congestionamentos, segundo a empresa
de análise de tráfego Inrix. E está pio-
rando: de manhã, no horário de pico,
a velocidade média dos carros é 32%
inferior a 2019, antes da pandemia.
Mas, para um pequeno núme-
ro de pessoas, a ida para o trabalho
pode ficar um pouco menos sofri-
da. Neste mês, a Mercedes-Benz de-
verá lançar nos EUA os primeiros
carros do mercado com o chamado
Nível 3 de condução autônoma, em que o
computador de bordo assume a respon-
sabilidade pela direção, sendo capaz de
acelerar, frear e operar o volante quando
o veículo estiver rodando na estrada,
inclusive se ela estiver congestionada.
O sistema, batizado de Drive Pilot,
permite algo inédito: o motorista não
precisa nem olhar para a rua (os ou-
tros sistemas de automação, como os
presentes nos Tesla, exigem isso – eles
monitoram o seu rosto, e desligam
se você não estiver olhando à frente).
Ou seja, com o Drive Pilot, é possível
ficar lendo ou brincando no celular.
A Mercedes tem tanta confiança nes-
sa tecnologia, que recebeu autorização
para operar nas estradas da Califórnia
e de Nevada (e já havia sido liberada na
Alemanha em 2022), que colocou até
um game no console central do carro:
Tetris, que você joga tocando na tela. O
Drive Pilot está presente nas linhas EQS
e S-Class, cujos preços começam em
US$ 100 mil. Ele funciona a no máximo
60 km/h, e não é 100% autônomo: você
ainda precisa assumir a direção ao rodar
22 super setembro 2023
CLUBE DE REVISTAS
dentro da cidade. Também
não pode dormir ou sair
do banco do motorista.
Mas com os carros
da Cruise, uma startup
comprada no ano passa-
do pela General Motors,
dá para fazer essas coi-
sas. Desde 2022, ela opera
um serviço de táxis to-
talmente autônomos em
São Francisco. Você diz
para onde quer ir, usan-
do um app, e alguns
minutos depois o carro
aparece, como se fosse
um Uber. Só que com
velocidade limitada a 50
km/h, e sem motorista.
A novidade é que, no mês passado, a
Cruise e a Waymo (subsidiária de robo-
táxis do Google) receberam permissão
do governo local para rodar 24 horas
por dia, sem restrição: até então, seus
carros só podiam circular em número
limitado e à noite, quando há menos
trânsito. A liberação, que veio envolta
em controvérsia, rapidamente mudou a
rotina de São Francisco – e não só para
melhor (mais sobre isso daqui a pouco).
O ponto é que, após mais de dez
anos prometendo uma realidade que
 CLUBE DE REVISTAS
neste nível de
nunca se concretizava (o americana que foi fundada em 1905 e
automação, Google começou a testar hoje reúne 138 mil profissionais do setor,
você pode ler, veículos sem motorista criou uma escala que permite enxergar
jogar ou ficar nas ruas de Mountain com clareza a posição de cada empresa
no celular View, sua cidade-sede, nessa corrida. Ela classifica a automação
– mas deve
permanecer
em 2012), os carros au- veicular em cinco níveis, com requisitos
no banco do tônomos finalmente co- e limites bem definidos.
motorista. meçam a entrar pra valer O Nível 0 se refere aos veículos co-
no dia a dia urbano. Mas, muns, sem automação. Já o Nível 1 englo-
ao mesmo tempo, ainda ba recursos como o controle de cruzeiro
há obstáculos pela fren- adaptativo (ACC), que regula a velocidade
te – incluindo fatores e a distância em relação ao carro da frente.
que vão além da tecno- A maioria dos fabricantes já ofere-
logia, e têm a ver com o ce essa função, mesmo em modelos
comportamento humano. relativamente baratos.
No Nível 2, o carro também inclui
Autonomia ACC, mas ele trabalha em conjunto com
em camadas o lane assist, que aciona o volante para
Quase todas as grandes manter o veículo dentro da faixa. Com
montadoras estão desen- isso, o computador é capaz de assumir
volvendo carros autôno- o comando em determinadas situações.
mos – e o esforço inclui Quase todas as grandes montadoras
até empresas que não são oferecem Nível 2 em alguns de seus
do ramo, como Amazon e modelos [veja no quadro da pág. 24].
Apple. Os projetos estão Um detalhe interessante é que, em-
em estágios variados de bora a Tesla seja considerada a van-
desenvolvimento. Tam- guarda da automação, os sistemas que
bém incluem tecnologias e ela oferece, como o Full Self Driving e
protótipos ainda mantidos seu antecessor Autopilot, tecnicamente
em segredo. Mas a Society são “apenas” Nível 2. Todos os sistemas
of Automotive Engine- desse patamar, de todos os fabrican-
ers (SAE), uma entidade tes, têm em comum o seguinte: eles
são só assistências, ou
seja, quem está dirigindo
ainda é você.
O Nível 3 emprega
tecnologias similares (o
o NíveL 3 é o carro acelera, freia e vira
o volante para se manter
PRIMeIRo No qUAL dentro da faixa), mas com
uma dose extra de convic-
o CARRo, eM CeRTAS ção: ele é o primeiro no
qual, em determinadas
SITUAçõeS, Se situações, o computador
realmente está dirigin-
ReSPoNSABILIzA PoR do – e você não precisa
prestar atenção. Tanto é
TUDo – e voCê PoDe assim que, ao apresentar
os carros desse tipo na
fAzeR oUTRAS CoISAS. Alemanha, a Mercedes
disse que assumiria a
responsabilidade judicial
se houvesse acidentes por
falha no Drive Pilot.
Para conseguir ope-
rar no Nível 3, o sistema
apela à redundância: o
carro usa radar, câmeras
e um sensor LiDAR (light →

setembro 2023 super 23

 CLUBE DE REVISTAS
detection and ranging), que
dispara feixes de luz infra-
vermelha, para mapear o
ambiente e os veículos em

OS CINCO DEGRAUS
volta. Se um desses três
métodos falhar ou forne-
cer dados incorretos, ele
ainda tem os outros. Essa
é a mesma estratégia ado- A automação dos carros é classificada em níveis.
tada pela BMW: ela pre- Os mais básicos já estão se tornando relativamente
tende incluir um sensor comuns; o mais avançado ainda é uma utopia.
LiDAR em alguns de seus
carros, que poderão ser os
próximos a alcançar o Ní-
vel 3 de autonomia. Acre-
dita-se que a empresa vá
mostrar os novos mode-
los, que pertencem à sua
Série 7 (sedãs de luxo) até
o começo de 2024. Mas,
antes de sair rodando de
forma semiautônoma, eles O sistema ajuda
precisarão obter permis- o motorista
são das autoridades (algo
que por enquanto só a
Mercedes tem).
Já os Tesla não pos-
suem LiDAR. E a empresa
decidiu não colocar nem
radar nos seus carros fa-
bricados em 2021 e 2022,
que operam só com câme-
ras. É por isso, entre ou- Nível 0: Nível 1: Nível 2:
tros fatores, que os Tesla Sem auTOmaçãO aSSISTêNcIa auTOmaçãO
ainda não alcançaram o Como é: O motorista aO mOTOrISTa parcIal
Nível 3. Mas também faz é responsável por Como é: Inclui Como é: O carro
com que eles sejam mais todas as funções controle de cruzeiro conta com ACC e
baratos: nos EUA, o car-
do carro. adaptativo (ACC), lane assist operando
Quem ofereCe: que acelera e freia simultaneamente.
ro “básico” da marca cus- Todos os carros são sozinho para manter Você pode soltar o
ta US$ 40 mil. Mais uma assim. Certos re- a distância do veícu- volante, mas tem de
mensalidade de US$ 199 cursos robotizados, lo à frente. Também manter o olhar na
pelo uso do Full Self Dri- como o controle pode ter lane assist pista (o carro vigia
ving – que, vale lembrar, de estabilidade e a (que mantém o isso por uma câme-
frenagem automá- veículo dentro da ra) e estar pronto
não é full. A empresa diz tica de emergência, faixa). Apenas um para assumir imedia-
que seus carros já roda- também são enqua- desses sistemas tamente o controle,
ram mais de 480 milhões drados como Nível opera de cada vez. caso necessário.
de quilômetros no modo 0 (porque ajudam a Quem ofereCe: Quem ofereCe:
FSD, e ela está a um passo controlar o veículo, Quase todas as mar- A maioria das mon-
mas não são capazes cas, a partir dos mo- tadoras tradicionais
de oferecer automação to- de guiá-lo). delos intermediários. (e a Tesla também).
tal, de verdade – algo que,
desde 2014, Elon Musk
vem prometendo “para o
ano que vem”.
Me smo a ss i m , h á
quem diga que a Tesla
está indo rápido demais.
Em 1965, o advogado
americano Ralph Na-
der ficou famoso após

24 super setembro 2023

 CLUBE DE REVISTAS
publicar um livro, Unsafe at Any Speed dos EUA e até hoje tem e fazer um recall com mais de 363 mil
(“Inseguro em qualquer velocidade”, destaque na mídia de lá, veículos que já estavam rodando esse
não lançado no Brasil), apontando declarou que a liberação software. Motivo: em certas situações, o
casos em que a indústria automoti- do Full Self Driving era FSD poderia apresentar “riscos de coli-
va foi irresponsável: tirou peças dos “uma das coisas mais pe- são se o motorista não intervir”. Porque
carros, comprometendo sua estabili- rigosas e irresponsáveis ele tem bugs – e alguns parecem sérios.
dade, e tentou retardar a adoção de feitas por uma empresa Se você fizer uma busca rápida no
tecnologias vitais, como os cintos de automóveis nas últi- Google, vai encontrar vários exem-
de segurança, para economizar. O mas décadas”. O golpe plos. Um vídeo recente mostra um
livro teve uma repercussão enorme. mais duro veio em feve- Model S dando uma freada brusca, sem
E levou o governo dos EUA a criar reiro deste ano, quando a motivo aparente, dentro de um túnel
um órgão, o National Highway Tra- NHTSA mandou a Tesla em São Francisco, o que provocou o
ffic Safety Administration (NHTSA), parar a implantação do engavetamento de oito veículos. Nove
para fiscalizar a segurança dos car- sistema (que é enviado pessoas ficaram feridas, incluindo uma
ros. Recentemente ambos, Nader e a pela internet, na forma criança de dois anos. Em abril, um rela-
NHTSA, atacaram a Tesla. Ele, que de uma atualização de tório(1) da NHTSA revelou que o núme-
chegou a ser candidato a presidente software, para os carros) ro de acidentes envolvendo os sistemas
de automação dos Tesla
era muito maior do que
o divulgado anteriormen-
O sistema dirige,
te: foram pelo menos 273
mas pode exigir a O sistema faz colisões até hoje (o equi-
ação do motorista tudo sozinho valente a 69,6% de todos
os acidentes com carros
Nível 2).
Claro, isso se deve
ao fato de a companhia
ter uma frota maior (há
mais de 800 mil Tesla
com algum grau de au-
tomação circulando nos
EUA). Mas a divulgação
Nível 3: Nível 4: Nível 5: desses números atiçou as
auTOmaçãO alTa auTOmaçãO auTOmaçãO críticas à empresa.
cONDIcIONal Como é: Você vira cOmpleTa Ela diz que seus veícu-
Como é: Você não passageiro, e nunca Como é: O com- los são bem mais seguros
precisa nem olhar tem de se preocupar putador dirige que os carros comuns.
para a pista: pode em dirigir: se houver em todas as ruas,
algum imprevisto,
Segundo ela, os Tesla
ficar lendo ou avenidas e situa-
jogando no celular, o veículo – que ções, na mesma sofrem em média 1 aci-
por exemplo. Mas entende semáforos velocidade dos dente a cada 8,9 milhões
esse modo só é e placas de trânsito carros com moto- de km rodados. Muito
permitido em certas – é capaz de lidar ristas humanos. Ele melhor que a média dos
estradas e avenidas com ele. Roda a também pode ser
no máximo 50
carros sem automação
(atualmente, em programado (você
áreas da Alemanha km/h, e apenas em pode mandá-lo ir nos EUA, de 1 acidente a
e dos EUA). No resto regiões e horários buscar um parente cada 1 milhão de km. Os
do tempo, é preciso autorizados. no aeroporto e tra- dados foram compilados
assumir o volante. Quem ofereCe: zer para a sua casa, pela Tesla, não por um ór-
Quem ofereCe: Táxis robóticos Crui- por exemplo).
gão independente, e por
Mercedes (modelos se (GM) e Waymo Quem ofereCe:
(Google), nos EUA.
isso devem ser encarados
com Drive Pilot). Ninguém.
com algum ceticismo.
A empresa também anun-
ciou que está voltando a
fonte J3016_202104 Taxonomy and Definitions for Terms Related to Driving
Automation Systems for On-Road Motor Vehicles. SAE International, 2021. incluir um radar em seus
carros, já nos modelos
2023. Em maio, com a
permissão das autorida-
des, a Tesla recomeçou
a distribuição do FSD.
Elon Musk publicou um →
fonte (1) Standing general order in crash reporting – For incidents
involving ADS and Level 2 ADAS. NHTSA, 2023. setembro 2023 super 25

vídeo, rodando de forma
autônoma com um Model
S pelas ruas de Palo Alto,
na Califórnia – e disse que
seus carros vão pular di-
reto para o Nível 4 ou 5
até o fim deste ano.
Não será fácil. O Ní-
vel 4, de alta automação, é
um salto e tanto: dispensa
totalmente o motorista.
Hoje ele está presente
em veículos agrícolas e
de logística, que rodam
devagar em ambientes
controlados. Mercedes e
Volvo já têm caminhões
desse tipo, com GPS in-
tegrado à direção – o da
Mercedes, desenvolvido
em parceria com a em-
presa brasileira Lume Ro-
botics, vem sendo testado
em mineradoras e plan-
tações de cana de açúcar.
“A gente está focando nas
operações em ambientes
privados, porque eles são
autorregulados. O Brasil
não tem uma legislação
que permita a operação
em vias públicas”, diz o
engenheiro Ranik Gui-
dolini, CEO da empresa,
fundada em 2019 por
pesquisadores da Uni-
versidade Federal do Es-
pírito Santo (UFES). Eles
chamaram a atenção pe-
la primeira vez em 2017,
VINDO DE LONGE
1939
A General Motors constrói
uma enorme maquete, de
4.000 m2, na Feira Mundial
de Nova York. Batizada de
Futurama (1), ela simula as
cidades do futuro – que, na
visão da empresa, inclui-
riam veículos autônomos.
10 mil carrinhos circulam
sozinhos pela malha de
ruas e estradas da maque-
te, que tem 500 mil casas.
26 super setembro 2023
CLUBE DE REVISTAS
O QUE O CARRO DEVE FAZER?
Numa situação-limite, em que desviar de uma
pessoa signifique atropelar outra, qual vida o
veículo deve poupar? O MIT ouviu pessoas de 100
países, e coletou 40 milhões de respostas.
Qual viDa o carro
Deve salvar: Não deve priorizar Deve priorizar
Bebê
fonte The Moral Machine experiment. E Awad e outros, 2018.
Menina
Menino
Mulher grávida
Médico
Médica
Atleta (mulher)
Executiva
Atleta (homem)
Executivo
Mulher obesa
Homem obeso
Mendigo
Idoso
Idosa
Cachorro
Criminoso
Gato
-0,2 -0,1 0 0,1 0,2
quando seu protótipo – uma perua Ford
rodando software capixaba – fez uma
viagem de teste, rodando 74 km de Vi-
tória a Guarapari, de forma autônoma.
Era um veículo Nível 3, com uma pessoa
sentada no banco do motorista. Guido-
lini faz uma observação interessante,
que pode ajudar a entender a estratégia
da Tesla. “Os sistemas Nível 3 podem
O carro autônomo
é um sonho futurista.
Mas tem uma história
surpreendentemente antiga.
1957 década de 1960 1971 1987 a 1994
A Radio Corporation Pesquisadores ingleses A Universidade Stanford, As montadoras
of America (RCA) equipam um Citroen nos EUA, cria o Artificial europeias se unem no
demonstra o primeiro DS (modelo europeu Intelligence Laboratory Prometheus Project,
carro capaz de se guiar popular na época) com Cart, veículo capaz de um esforço conjunto
sozinho. Ele anda por uma tecnologia similar à seguir uma linha pintada para desenvolver carros
um trecho curto, de 120 americana: o carro capta no chão. Tinha rodas de autônomos. Ele con-
metros, numa estrada sinais magnéticos, que bicicleta, câmera e um some o equivalente a
em Nebraska. O sistema são emitidos por fios chip que executava 650 749 milhões de euros, e
é bem primitivo: o carro enterrados no asfalto. mil operações por segun- tem êxito: dois veículos
usa emissores elétricos O veículo anda a 130 do (20 milhões de vezes experimentais dirigem
instalados no asfalto km/h num circuito menos que um celular mais de 1.000 km por
para se orientar. de testes (2). moderno). estradas francesas.
 CLUBE DE REVISTAS
desarmar a qualquer momento, não
estão preparados para atuar em todas
as situações. Como é muito difícil ga-
a capacidade rantir que o motorista vai estar sempre
de decidir prestando atenção, algumas empresas
em casos
extremos preferem ir direto para o Nível 4”, diz.
terá de ser Pode ser mais seguro esperar, e já lançar
programada um produto mais evoluído.
no software Os táxis autônomos da Cruise e da
dos carros. Waymo, aqueles que recentemente foram
mas há quem
diga que, na autorizados a rodar sem limites em São
prática, di- Francisco, são do Nível 4. No começo de
lemas assim julho, um grupo de ativistas intitulado
serão raros. Safe Street Rebels tentou impedir sua
liberação. Eles criaram uma campanha,
batizada de Week of Cone (“semana dos
cones”), para fazer terrorismo contra os
pobres robotáxis.
Espalharam cones de sinalização pe-
las ruas da cidade – a ideia era assustar
os carros, que não saberiam como lidar
com isso e acabam empacados no meio
das vias, causando transtorno e conven-
cendo as autoridades a recuar. Segundo
os ativistas, a circulação irrestrita de
táxis autônomos poderia agravar os
congestionamentos e causar acidentes
(em maio, um carro da Waymo havia
atropelado e matado um
cachorro em São Fran-
cisco). Mas os protestos
não adiantaram: em 10 de
agosto, o governo estadu-
al da Califórnia ignorou
os ataques e a resistência
da prefeitura da cidade
(que era contra liberar
os táxis autônomos), e
concedeu a autorização.
Aí, no dia seguinte, a
bagunça começou.
1989 1995 1995
A Universidade Um carro da Carnegie Uma Mercedes S500
Carnegie Mellon, nos Mellon completa a No com sistemas de
EUA, demonstra os Hands Across America, automação é testada
primeiros veículos uma viagem de 4.558 em uma Autobahn:
autônomos equipa- quilômetros atraves- estrada alemã sem
dos com sistemas de sando os EUA. O veículo limite de velocidade.
redes neurais – um fez 98,2% dela no modo Alcança 175 km/h e
método de compu- autônomo, com um po- roda trechos bem
tação que passaria a rém: o robô só controlou longos, de até 158 km,
ser usado em todas o volante (acelerador e sem exigir nenhuma
as IAs veiculares dali freio eram comandados intervenção humana.
para a frente. por um pesquisador).
fontes (1) Vídeo disponível em bit.ly/47xoZ4I (2) Vídeo disponível em bit.ly/3KIXewd
Música, cimento e confusão
“Eu fiquei gritando da minha janela,
para avisar as pessoas. Quem é de fo-
ra da cidade não sabe que esses carros
não têm motorista”, disse o americano
Jeffrey Bilbrey à imprensa local. Ele
presenciou uma cena de filme: dez tá-
xis autônomos da Cruise bloqueando
um cruzamento de North Beach, onde
mora, na sexta-feira à noite. Os veículos
foram chegando, todos vazios, e empa-
cando uns atrás dos outros. Ficaram
assim, com os pisca-alertas ligados,
até que a Cruise percebeu o que estava
acontecendo – e mandou funcionários
correndo até o local, para manobrar e
tirar os táxis de lá.
Segundo a empresa, a pane se deu
porque ali perto rolava o festival Outsi-
de Lands (naquela noite, a atração prin-
cipal era o cantor Kendrick Lamar), o
que concentrou muita gente na mesma
área. As redes de telefonia celular fi-
caram congestionadas, e os carros da
Cruise não conseguiam se comunicar.
Isso revela que a tecnologia da empresa
não é tão autônoma quanto parece, já
que seus veículos dependem de conexão
à internet (seja para trocar dados uns
com os outros, seja para falar com uma
“central”, que monitora a frota).
O fiasco foi registrado em fotos e ví-
deos, que viralizaram nas redes sociais.
“Eu fico preocupado. Porque, se houver
uma emergência, os veículos de resga-
te não vão conseguir passar”, declarou
Bilbrey, a testemunha. De fato. Segundo
a prefeitura de São Francisco, a Waymo
e a Cruise têm cerca de 600 táxis autô-
nomos operando na cidade – e, ao longo
deste ano, antes mesmo da liberação →
1997 1998
A cidade de Roterdã A Toyota lança o
inicia as operações primeiro carro com
do ParkShuttle, controle de cru-
um micro-ônibus zeiro adaptativo
autônomo. Após dois (ACC), que acelera
anos de testes, ele é e freia sozinho
liberado ao público. para manter a
Existe até hoje: distância do carro
percorre uma linha da frente.
curta, de 1,8 km, e
roda a até 32 km/h,
levando 22 pessoas.
setembro 2023 super 27
 CLUBE DE REVISTAS
para rodar em qualquer
horário, eles impediram
a passagem de ambu-
lâncias, bombeiros ou
paramédicos 66 vezes. A
Cruise respondeu à acu-
sação de forma indireta,
dizendo que seus carros
tiveram mais de 168 mil
“interações” com veículos
de resgate em 2023. Ou
seja: percentualmente,
o número de vezes em
que eles atrapalharam
foi muito baixo. Mas os
tropeços dos carros da
empresa não se resumi-
ram a isso. “Houve vários
incidentes em que eles
entraram em áreas blo-
queadas, com incêndios
ou outras emergências,
e nós ficamos desespe-
rados tentando chamar
a atenção do veículo,
para fazê-lo parar”, de-
clarou Darius Luttropp,
vice-diretor do corpo de
bombeiros da cidade. Em
15 de agosto, um carro da
Cruise invadiu uma área
em obras, e ficou atolado
no cimento fresco. Ren-
deu memes. Mas o pior
ainda estava por vir.
Em 17 de agosto, pouco
depois das 22h, um Cruise
atravessou o cruzamento
entre as ruas Polk e Tusk,
no bairro Tenderloin,
com o sinal verde para
ele. Tudo certo. Só que
do outro lado vinha um
caminhão de bombeiros,

2004 2005 2010 2012 2014

A divisão de tecno- A Darpa repete o Quatro vans autôno- O Google obtém A Tesla lança os
logia avançada do desafio, e dobra mas, desenvolvidas pela permissão e começa primeiros carros com
Pentágono realiza a o prêmio. Desta empresa italiana VisLab, a testar seus carros o sistema Autopilot.
primeira Darpa Grand vez, cinco dos 23 fazem uma expedição autônomos nas Em sua primeira
Challenge, oferecendo carros participantes de 100 dias: saem de ruas de Mountain versão, ele tinha
um prêmio de US$ 1 conseguem completar Parma, na Itália, e vão View, na Califórnia dois recursos: auto
milhão para um carro o percurso – o ven- até Xangai, na China. (onde fica a sede da parking (estacionava
que consiga fazer cedor é Stanley, um Elas são acompanhadas empresa). Um dos sozinho) e summon
um percurso de 240 protótipo criado pela por cientistas, que modelos, o Firefly, (você podia chamar
km pelo deserto de Universidade Stanford assumem o volante é especialmente o carro, que vinha
Mojave. Nenhum dos em parceria com a em alguns trechos ousado: não dirigindo sozinho).
inscritos consegue. Volkswagen. da viagem. tem volante.

28 super setembro 2023


com a sirene ligada, a ca-
minho de um incêndio. “O
veículo da Cruise identifi-
cou o risco e iniciou uma
manobra de frenagem,
mas não conseguiu evi-
tar a colisão”, declarou a
empresa. O ocupante do
táxi foi levado de ambu-
lância até um hospital –
mas, segundo a Cruise,
não sofreu ferimentos
graves. Naquela mesma
noite, um segundo carro
da empresa se envolveu
num acidente similar:
outro veículo avançou um
sinal vermelho, no cruza-
mento das ruas 26 e Mis-
sion, e os dois bateram.
O robotáxi estava vazio.
O motorista do outro car-
ro teve ferimentos leves.
Dez RoBoTáxIS DA
CRUISe BUGARAM
– e eNTUPIRAM UM
CRUzAMeNTo De São
fRANCISCo. MoTIvo:
A INTeRNeT CAIU.
CLUBE DE REVISTAS
Aquilo foi a gota d’água, e as auto-
ridades decidiram enquadrar a Cruise:
mandaram a empresa reduzir imediata-
mente a frota em 50%, ficando limitada
a 50 táxis de dia e 150 à noite, até que a
cidade conclua uma investigação sobre
a segurança de seus veículos autônomos
(a Waymo continua liberada).
As duas batidas têm algo em comum.
Elas não foram causadas por falhas no
software do carro, mas por uma defici-
ência mais profunda: sua incapacidade
em lidar com imprevistos, como moto-
ristas humanos avançando o sinal. Se
você está dirigindo e vê um caminhão
de bombeiros se aproximando, é lógico
que dará preferência a ele, ainda que o
semáforo esteja verde para você. Da mes-
ma forma, quando está rodando à noite,
você toma mais cuidado ao passar nos
cruzamentos – porque sabe que nesse
período há mais motoristas bêbados. E
por aí vai. Só que o robô não tem essa
“malícia”, o que pode ser um problema.
Se é suficiente para causar acidentes
em São Francisco, cidade de 800 mil
habitantes onde as pessoas dirigem bem
devagar e os pedestres nunca atravessam
fora da faixa ou com o sinal fechado
(até 2022 isso era ilegal, e dava multa
de US$ 200), o que poderia acontecer
no trânsito caótico de uma metrópole?
Outro porém é que a Cruise e a Way-
mo ainda são comercialmente inviáveis:
os carros são caros, e as empresas têm
custos operacionais altíssimos. Por is-
so, ambas dão prejuízo. Só no primeiro
trimestre deste ano, a Cruise queimou
US$ 561 milhões do dinheiro da GM.
Para alcançar lucro, ela precisaria ter
uma frota muito maior.
Mas, para que os carros autôno-
mos conquistem as ruas e avenidas
do mundo, não basta que eles sejam
capazes de dirigir perfeitamente. Será
preciso ir além – e criar veículos que
consigam lidar com ab-
solutamente qualquer si-
tuação, incluindo coisas
que não estão previstas
no software. É o patamar
máximo de automação, o
chamado Nível 5. “Ain-
da temos um longo ca-
minho para chegar nesse
cenário, tão populariza-
do pelos filmes”, admite
Evandro Bastos, gerente
de produtos automotivos
da Mercedes-Benz Brasil.
O Nível 5 é difícil por-
que, embora ele use siste-
mas parecidos com os do
Nível 4, há uma diferença
crucial: a confiança, que
agora precisa ser abso-
luta. Como o carro toma →

2016 2016 2018 2022 agosto De 2023

Carros da Tesla rece-
bem uma atualização
para a plataforma Full
Self Driving (FSD),
capaz de dirigir o
carro em determinadas
situações. Apesar do
nome, até hoje o FSD
não oferece automação
total – ele é classifica-
do como Nível 2 (veja
no quadro da pág. 24).
Um Tesla Model S bate A Waymo, A Cruise, empresa de São Francisco autoriza
em um caminhão na subsidiária do carros autônomos a Waymo e a Cruise a
Flórida, e o motorista Google criada para comprada pela Gene- operar 24 h, sem limites
morre. É o primeiro desenvolver os car- ral Motors, começa (antes só podiam rodar
óbito causado por um ros autônomos da a operar uma frota à noite, quando há
carro autônomo. Em empresa, começa a de robotáxis nas ruas menos trânsito, e o
2018, acontece outro: oferecer um serviço de São Francisco, na Waymo precisava ter
um Volvo XC90, que de táxi robótico em Califórnia. um motorista a bordo,
rodava um software Phoenix, Arizona. como backup). A libe-
experimental da Uber, ração causa problemas
atropela e mata – e a cidade restringe a
uma mulher. operação da Cruise.

setembro 2023 super 29

 CLUBE DE REVISTAS
conta de tudo, os veículos dessa cate-
goria poderiam rodar até sem motorista
a bordo – transportando crianças, por
exemplo. Então eles não podem falhar
nunca. As empresas de automóveis só
vão se arriscar no Nível 5 quando as
tecnologias envolvidas alcançarem um
grau de confiabilidade extremo, com-
parável ao da aviação comercial. Isso
pode, e vai, levar tempo.
Mesmo quando/se chegarmos lá,
restará um último problema. Uma ques-
tão filosófica que foi proposta há mais um trânsito
de 50 anos, e se refere a algo ainda mais 100% robóti-
antigo: o “dilema do bonde”. co poderia ser
mais seguro.
mas ainda
“Só me diga o que fazer” é um sonho
Um homem aponta para um cartaz na distante.
parede, que mostra um veículo pres-
tes a tomar uma decisão: ou ele segue
em frente e atropela três crianças, ou Os resultados(2) tam-
desvia e mata um adulto. Observando bém mostraram diferen-
a imagem, um carro entristecido fala: ças entre as regiões. As
“Por favor, não me obrigue a escolher! pessoas da América La-
Só me diga o que fazer”. Essa é uma tina deram mais impor-
das tirinhas publicadas no site Evil tância à idade – e disse-
AI Cartoons, criado pelo cientista da ram que o carro poderia
computação Iyad Rahwan. Em 2018, atropelar um idoso para
Rahwan foi um dos líderes da Moral salvar uma criança. Os
Machine, uma pesquisa online reali- participantes da Ásia não
zada pelo MIT (Instituto de Tecnologia concordaram. Já os paí-
de Massachusetts) e pela Universida- ses da América do Norte
de Harvard para descobrir o que, na e da Europa revelaram
opinião humana, os carros autônomos preferência pela inação:
deveriam fazer em 13 situações extre- para eles, o carro deveria
mas – nas quais desviar de uma pessoa simplesmente continuar
resultaria no atropelamento de outra, na trajetória que já esta-
mesmo acionando os freios. va, sem tomar nenhuma
A Moral Machine atualizou para a decisão moral. Tem sua lógica. “No
era da inteligência artificial o “dilema caso de ter que escolher entre a vida
do bonde”, criado pela filósofa britânica de uma pessoa mais jovem e de uma
Philippa Foot na década de 1960 (nele senhorinha, por exemplo, alguém po-
a pessoa deveria escolher entre matar deria alegar que ela já viveu a vida dela.
cinco pessoas, que estavam amarradas Mas nós não somos Deus para decidir
nos trilhos, ou puxar uma alavanca para isso. É um dilema que a engenharia
desviar o bonde, que atropelaria uma só). não vai conseguir resolver”, afirma o
A pesquisa do MIT coletou ao todo 40 engenheiro Camilo Adas, consultor da
milhões de respostas, de mais de 100 SAE Brasil.
países. Os participantes fizeram algumas Também há quem argumente o
escolhas controversas, como salvar exe- seguinte: nas frações de segundo que
cutivos e atletas em detrimento de men- antecedem um acidente, nenhum mo-
digos ou pessoas obesas [veja infográfico torista humano tem tempo de fazer
na pág. 26]. Também colocaram, na escala escolhas assim – e na prática, então,
de prioridades, indivíduos classificados as máquinas não irão se deparar com
pela pesquisa como “criminosos” abaixo elas. “Confundir experimentos men-
dos cachorros – mas acima dos gatos. Se tais com a realidade pode retardar a
programados na memória de um carro implantação de veículos [autônomos]
autônomo, julgamentos desse tipo cer- bem mais seguros do que os motoristas
tamente causariam polêmica. humanos”, escreveu Karl Iagnemma,

fontes (2) The Moral Machine Experiment. I Rahwan e outros, 2019. (3) AAA: Fear of Self-Driving Cars on the Rise.
30 super setembro 2023 American Automobile Association, 2023. (4) Global Plan for the Decade of Action for Road Safety 2021-2030. OMS, 2021.
 CLUBE DE REVISTAS
CEO da Motional (joint
venture entre Hyundai
e Aptiv que opera um
serviço de robotáxi entre
cassinos em Las Vegas),
num artigo sobre o tema.
“Eles nunca ficam bêba-
dos, sonolentos ou dis-
traídos.” Ou seja: quan-
to maior a proporção
de carros robóticos nas
ruas, menos imprevisível
o trânsito. E, com menos
acidentes, haverá menos
dilemas morais.
Mas a sociedade ainda
enxerga os veículos autô-
nomos com desconfiança.
Uma pesquisa3 realizada
em março pela American
Automobile Association
revelou que 68% das pes-
soas nos EUA dizem ter
medo deles – um salto
de 13 pontos percentu-
ais em relação a 2022. O
receio aumentou porque,
conforme veículos robo-
tizados vão chegando às
ruas, é inevitável que haja
alguns acidentes – inclu-
sive porque eles dividem
espaço com motoristas
humanos. Até hoje, os
é INevITáveL
qUe hAjA ALGUNS
ACIDeNTeS CoM
CARRoS AUTôNoMoS
– INCLUSIve PoRqUe
eLeS DIvIDeM AS
RUAS CoM MoToRIS-
TAS hUMANoS.
EUA contabilizaram 419 colisões en-
volvendo veículos semi ou totalmente
autônomos, com 18 óbitos.
Toda morte é uma tragédia. Mas
esses números são minúsculos per-
to do massacre operado pelos carros
convencionais e seus falhos motoristas
de carne e osso. Segundo a OMS, há
1,3 milhão de mortes no trânsito(4) por
ano – e o número de feridos pode ser
até 38 vezes maior. No Brasil, o último
levantamento do Ministério da Saúde
aponta 33.813 mortes em acidentes de
trânsito ao longo de 2021. E, segun-
do dados da OMS, nove em cada dez
acidentes de carro no Brasil são cau-
sados por erro humano. Mesmo não
sendo perfeitos, os carros autônomos
poderiam reduzir muito o problema.
E revolucionar a vida nas cidades.
Se os robotáxis se tornarem baratos
e confiáveis, um dia ninguém mais
precisará ter carro: haverá uma rede
de veículos autônomos, sempre dispo-
níveis, se deslocando da forma mais
eficiente possível. Isso permitirá aten-
der à demanda com bem menos veícu-
los – logo, menos congestionamentos.
O trânsito não será mais um tormen-
to, e o carro deixará de ser um vilão.
Mas isso levará tempo, até porque não
depende só de tecnologia.
Os primeiros elevadores automá-
ticos, em que você mesmo escolhe o
andar apertando um bo-
tão, foram inventados no
começo do século 20. Mas
as pessoas tinham medo.
Eles só começaram a se
popularizar em 1945, lo-
go após o fim da Segun-
da Guerra, quando os 15
mil ascensoristas de Nova
York decretaram uma gre-
ve que parou a cidade. Isso
finalmente convenceu a
população, por linhas
tortas, de que não havia
nada a temer. Sem ascen-
soristas, o elevador ficou
mais barato, onipresente
e “invisível” – mal pensa-
mos nele, tanto que nem o
consideramos um meio de
transporte. Só mais uma
peça, discreta e eficiente,
da vida moderna. Talvez,
um dia, os carros também
sejam assim. S
setembro 2023 super 31
 CLUBE DE REVISTAS
sociedade

Texto Bruno vaiano Design Luana Pillmann

Edição Alexandre versignassi Ilustração Raul Aguiar

STAR
32 super setembro 2023
 CLUBE DE REVISTAS

LINK,
o VERDADEIRO X DE EloN Musk
a ideia de oferecer banda larga via satélite
para qualquer lugar do planeta parecia um
plano futurista. virou realidade. e hoje dois
terços dos satélites operacionais na órbita
da Terra pertencem à rede de musk. entenda o
avanço, e os perigos, que isso representa.

setembro 2023 super 33


Dizem que foguete
não Dá ré. E é verda-
D
de. Ao longo do século
20, eles foram veículos
descartáveis, que faziam
viagens só de ida. Os
mais comuns consistiam
em três partes: primeiro
estágio, segundo estágio
e a nave espacial em si
(a cápsula onde ficam os
tripulantes ou a carga).
O primeiro estágio,
com motores maiores e
mais combustível, faz a
força bruta de tirar a en-
genhoca do chão e levá-la a
mais ou menos 100 km de
altitude. É como um car-
ro engatando a primeira
marcha em uma subida
íngreme. Após transpor a
resistência inicial da gravi-
dade, esse primeiro estágio
– que perfaz até metade do
comprimento do foguete –
se desacopla e cai de volta
na Terra. Vira lixo.
Então os motores me-
nores do segundo estágio
entram em ação e põem
o conjunto de vez no es-
paço, para depois se sol-
tarem (dá-lhe mais lixo)
e deixarem a pequena
cápsula seguir sozinha –
por inércia, já apontada
na trajetória certa para o
destino final.
Sai caro jogar esse
equipamento todo fora
após uma única quei-
ma. E o custo proibitivo
CLUBE DE REVISTAS
é mais um dos vários motivos pelos
quais a exploração (em geral, científica
ou militar) do vácuo começou como
uma exclusividade dos governos ame-
ricano e soviético no início da Guerra
Fria. Com o passar das décadas, porém,
os foguetes foram se tornando relati-
vamente acessíveis à iniciativa privada.
Nota-se pelos números. Vamos aos
dados: desde 1957, quando a URSS pôs
o Sputnik em órbita, a humanidade
lançou exatos 15.946 objetos para o
espaço. Entre 1965 e 2015, o número
de artefatos postos na órbita da Terra
permaneceu estável entre 100 e 150 por
ano (veja o gráfico da pág. 36).
Menos de 10% desses equipamentos
são veículos destinados à Lua, a Marte
e a outros pontos do Sistema Solar. A
maioria desses foguetes decolou para
lançar satélites artificiais, que fazem de
tudo: GPS, imagens aéreas do Google
Maps e, claro, dar acesso a internet em
áreas remotas – onde não há conexão
via cabo ou fibra óptica. No começo de
2023, 5.280 dos 6.718 satélites opera-
cionais eram privados, e essa proporção
tende a aumentar.
Esses 6.718 objetos operacionais re-
presentam só 67% do total que existe
em órbita. Atualmente, o Escritório das
Nações Unidas para Assuntos do Espaço
Sideral (UNOOSA) lista 11.330 (por falta
de uma palavra melhor) coisas na órbita
da Terra. Muitas são carcaças de satélites
desativados, várias delas abandonadas
no que se chama de “órbitas-cemitério”,
os ferros-velhos do espaço.
O foguete deu ré
Os números ficaram empacados em
100 ou 150 lan-
çamentos anuais a multidão
até 2015, quando de satélites
já atrapalha
observações
astronômicas
(como as do
Hubble). e a
tendência é
piorar.
 CLUBE DE REVISTAS
a SpaceX de Elon Musk
pousou o primeiro está-
gio de um foguete Falcon
9 – e pôde reaproveitá-
-lo para lançamentos
subsequentes. Foi uma
revolução. Pela primeira
vez, um foguete pousou,
pronto para outra. Desde
então, a empresa fez 247
lançamentos de Falcon 9,
181 deles com foguetes
que já tinham voado.
81% dos primeiros es- plano de internet comum. Uma revo-
tágios (201, em números lução considerando que 3,3 bilhões de
absolutos) aterrissaram pessoas (43% da população mundial)
sem percalços. Ir ao es- não têm acesso à rede.
paço ficou mais barato A constelação metálica de Elon Musk
do que nunca. E a média representa muita coisa para muitas áreas
anual de satélites lança- do conhecimento. O enxame de Star-
dos pela humanidade au- links se tornou o inimigo número um
mentou no mínimo dez dos astrônomos, está gerando um con- Ao todo, 2,7% das fotos
vezes nos últimos quatro gestionamento celeste que piora as (já do Hubble tiradas com 11
anos, de 150 para algo co- grandes) dores de cabeça dos operadores minutos de exposição
mo 1.500. O recorde foi de satélites, tem implicações legais que já são arruinadas por
2022, com 2.474. desafiam especialistas em direito, mudou gadgets orbitais como os
Boa parte da responsa- o rumo da guerra na Ucrânia e é, talvez, de Musk. Como a luz de
bilidade por esse número o maior avanço da história em termos astros distantes é muito
é do próprio Musk. 71% de democratização do acesso à internet. tênue, o obturador da câ-
desses 2.474 satélites Vamos entender tudo isso. mera precisa passar um
de 2022 – 1.775, ao to- tempão aberto para cap-
do – pertencem à rede Bem na foto tar luz – o que multiplica
de internet via satélite Em 2019, quando o primeiro lote de sa- as chances de algo se mo-
Starlink. Um Falcon 9 télites Starlink subiu, astrônomos come- ver na frente. Qualquer
decola aproximadamen- çaram a dar entrevistas prevendo que as solução para esse proble-
te a cada 15 dias com até navezinhas em órbita baixa atrapalhariam ma precisa rolar na base
60 deles a bordo. Eles co- a observação do espaço em uma escala da conversa, já que não
meçaram a ser lançados inédita. Milhares de satélites depois, o há uma regulamentação
em 2019; dados de julho problema virou rotina. A chance de uma internacional para lidar
indicam que já há 4.519 foto do telescópio espacial Hubble apa- com a superpopulação de
em órbita, e 4.487 estão recer com um risco branco (um satélite satélites privados. Essa é
operacionais. O plano fi- passando na frente e refletindo luz do Sol uma briga inédita.
nal são 12 mil até 2027: na direção da lente) aumentou de 3,7% “O problema persiste
7.500 satélites a 350 km em 2002 para 5,9% em 2021. e tende a se agravar”, diz
de altitude; 1.600 a 550 Hélio Jaques, presidente
km de altitude; 2.800 a da Sociedade Astronô-
1.150 km de altitude. mica Brasileira (SAB) e
Quando todos eles
A cada 15 dias professor no Observató-
estiverem no céu – cada
um com 260 kg e 2,8 m
decola um foguete rio do Valongo, no Rio de
Janeiro. “Os acordos inter-
de comprimento –, será Falcon 9 com até nacionais que balizam a
possível acessar banda exploração espacial estão
larga de qualquer lugar 60 novos satélites defasados (...) foram fir-
do mundo, sem cabos mados entre países, pois
ou fibra óptica, usando
da starlink a exploração era realizada
uma antena do tamanho
de uma pizza e pagando
a bordo. pelos governos. Não es-
tá claro para mim se as
mensalidades não mui- empresas privadas estão
to maiores que as de um

setembro 2023 super 35

 CLUBE DE REVISTAS

Sputnik 1 Telescópio Espacial Hubble Estação Espacial Internacional

2600 núMero de satélites lançados por ano desde a sputnik 1, eM 1957

2400

2200
Entre 1965 e 2015, o A rede Starlink é a principal
2000
Nº DE SATÉLITES LANÇADOS

número de objetos postos responsável por esse au-

em órbita permaneceu mento: pôs 1.775 satélites
1800 estável: entre 100 e 150 em órbita em 2022, 71%
lançamentos por ano. dos 2.474 lançados.
1600

1400

1200
Em 2015, a SpaceX bara-
1000 teou a coisa com os seus
foguetes reaproveitáveis.
800 A taxa de lançamentos
atingiu 1.500 por ano.
600

400

200

0
1957 1967 1977 1987 1997 2007 2017 2023*

ANO *Até junho

havia 6.718 satélites operacionais

na órbita da terra eM Janeiro de 2023:

auMeNto eM a Maior parte deles é ope-

FuNÇÃo QuaNtiDaDe relaÇÃo a
JaNeiro De 2022 rada por eMpresas priva-
Telecomunicações 4.823 53,84%
das coM fins lucrativos*:
Observação 1.167 13,3%
da Terra uso coMercial 5.280

Desenvolvimento
ou demonstração 414 7,53%
de tecnologias uso De goverNos 688

Navegação e
posicionamento 155 0,64%
(GPS e similares) uso Militar 588

Telescópios e
outros satélites de 109 0,93%
pesquisa científica uso civil NÃo lucrativo 162

Outros 50 - *305 satélites (4,5%) são classificados

como de uso misto.

Fontes Union of Concerned Scientists (UCS), United Nations Office for Outer Space Affairs (UNOOSA), Starlink, blog
36 super setembro 2023 Pixalytics, site de monitoramento do astrônomo Jonathan McDowell, do Centro de Astrofísica Harvard-Smithsonian.
 CLUBE DE REVISTAS
vinculadas a esses acor-
dos. Por isso mesmo, não
há um tribunal que julgue
o caso. A ONU trata de
países, não de empresas.”
O problema da polui-
Starlink ção vai além do óbvio. É
que nem todo telescópio
é como o Hubble, que faz
fotos usando a mesma
luz que nossos olhos
podem ver. As ondas
eletromagnéticas que
nós enxergamos ocupam
só uma janela estreita no
amplo espectro de ondas
satélites da starlink que existem. As que são
ligeiramente maiores
que estarão eM órbita até que a cor vermelha se
chamam radiação in-
2027, por altitude: fravermelha e sua pele
as detecta como calor,
2,8 mil enquanto as mais cur-
tas que a cor violeta são
a radiação ultravioleta
(UV), que queima sua
1,6 mil pele na praia. Também
existem ondas de rádio,
TV e wi-fi, bem como
7,5 mil as micro-ondas que es-
quentam comida.
Tudo isso é luz, ainda
que invisível, e os astros
emitem a gama toda. Por
isso construímos telescó-
12 mil pios capazes de observar
em infravermelho, ultra-
ao todo.
violeta e rádio, e então tra-
duzimos os dados que eles
Para o futuro
distante, geram em imagens. Os sa-
fala-se em até télites Starlink também in-
terferem com observações
42 mil em infravermelho, porque
esquentam ao absorver luz
do Sol, e em rádio – porque
1.150 km
o próprio sinal de internet
que eles transmitem é rá-
550 km dio, e atrapalha os sinais
350 km
hoJe, há 4.519 satélites
starlink eM órbita...
4.487 estão
operacionais*
*Dados de julho de 2023.
parecidos que chegam de fenômenos
naturais espaço afora. O problema vai
piorar cada vez mais conforme a demanda
por internet ocupar regiões do espectro
que antes estavam reservadas à ciência.
Pense no espectro eletromagnético
como uma estrada com várias faixas.
Em cada faixa, trafegam ondas de um
certo comprimento. E cada comprimen-
to é reservado a uma necessidade: as-
tronomia, internet, TV… Quando faixas
demais estão carregadas por uma certa
demanda, é preciso invadir outras que já
estão ocupadas. E aí os telescópios não
conseguem mais separar quais ondas
são um torrent de filme pirata e quais
são radiação emitida por um buraco
negro supermassivo a 11 bilhões de
anos-luz daqui.
Para resolver a questão específica
dos comprimentos de onda visíveis, a
SpaceX prometeu revestir os satélites
com o material menos reflexivo pos-
sível. O problema é a parte do “possí-
vel”. Não dá para pintar o dito-cujo de
preto fosco – ele superaquece e para de
funcionar. “Lá em cima, o ambiente é
muito hostil. Você vai de -80 ºC pa-
ra 200 ºC em uma órbita”, diz Ronan
Chagas, engenheiro de Sistemas Espa-
ciais do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe). “Às vezes, o material
precisa refletir, para o satélite não ab-
sorver toda a energia emitida pelo Sol.”
Para piorar, boa parte da superfície de
um Starlink consiste no painel solar
que gera a energia elétrica usada para
mantê-lo funcionando. E aí, não tem
jeito: todo painel solar reflete luz.
A dor de cabeça dos astrônomos é só a
cereja no bolo dos problemas de trânsito
na órbita da Terra. Conforme o núme-
ro de objetos ao nosso redor aumenta,
cresce também o risco de colisões entre
eles. Por isso, os operadores trabalham
com margens de erro baixíssimas. De
acordo com Ronan, uma probabilidade
de acidente superior a 1% já é considera-
da alta e justifica acionar brevemente os
setembro 2023 super 37

propulsores de um satélite
para desviá-lo. As mano-
bras são combinadas en-
tre os responsáveis pelos
aparelhos, o que torna
o controle de tráfego
espacial uma conversa
internacional permanente.
A margem de erro é
baixa porque as consequ-
ências são catastróficas. O
limite inferior de detecção
de um objeto no espaço é
de 10 cm. Isso basta para
acompanhar a trajetória
de aparelhos inteiros,
mas não de destroços.
Se ocorrer uma colisão,
pedacinhos de satélite in-
detectáveis ficarão à solta
e começarão a atingir ou-
tros satélites; numa reação
em cadeia com potencial
para transformar em re-
alidade o filme Gravidade
(aquele em que Sandra
Bullock e George Clooney
são astronautas tentando
sobreviver a um engaveta-
mento cósmico). Sempre
que possível, então, o ideal
é descartar satélites jogan-
do-os de volta na Terra:
o atrito com a atmosfera
pulveriza o aparelho, evi-
tando a poluição cósmica.
Internet off-road
Pedro Paulo Pena é coor-
denador de Educação de
Jovens e Adultos (EJA) –
aulas com os conteúdos
da 1ª à 9ª série para pes-
soas com mais de 15 anos
que não fizeram o Ensino
Fundamental. Ele trabalha
na Secretaria de Educação
38 super setembro 2023
CLUBE DE REVISTAS
do município de Jacarea-
canga, sudoeste do Pará.
Trata-se de um pedaço
da Amazônia maior que
a Bélgica com apenas 41
mil habitantes; 10 mil
deles, indígenas. O des-
locamento entre a zona
urbana e uma grande al-
deia da etnia Munduruku
chamada Waro Apompo,
às margens do Rio Curu-
ru, usa 200 litros de gaso-
lina e demora até 8 horas.
“A aldeia não tem ener-
gia elétrica. Eles usam um
gerador, ligado todos os
dias das 6h da tarde às
10h da noite”, diz Pena.
Em junho deste ano, os
indígenas procuraram a
Secretaria pedindo ajuda
para obter uma antena
Starlink, já que só é pos-
sível comprá-la pela inter-
net, com cartão de crédito.
“A internet que o governo
oferece por meio do pro-
grama Educação Conecta-
da não é boa, trava.”
Pena é parte de um gru-
po de Facebook com 2,6
mil usuários e entusiastas
os acordos so-
bre exploração
espacial estão
defasados. Eles
levam em conta
governos – e
não empresas
privadas, como
a spaceX.
brasileiros da Starlink – quase todos
felizes com o acesso à internet, ainda
que, em alguns casos isolados, obs-
táculos geográficos como morros ou
montanhas perto de casa impeçam a
conexão. A tendência é que, com cada
vez mais satélites no céu, obstáculos
locais façam menos diferença, já que
as antenas terão mais oportunidades
de interagir com a rede lá em cima. Por
enquanto, o CNPJ que a Starlink abriu
no Brasil é simbólico: serviu para o
corre-corre burocrático de autorizar a
implantação do serviço por aqui, mas
não fornece suporte técnico.
A Anatel liberou a Starlink no Brasil
em janeiro de 2022. O kit com antena,
cabo, roteador etc. custa R$ 2 mil (depen-
dendo da promoção, menos), mais frete
e impostos de importação, que podem
ultrapassar os R$ 1 mil. O preço do pa-
cote mais barato estava em R$ 184 na
data da conclusão deste texto. As mensa-
lidades variam conforme a necessidade:
há planos residenciais e comerciais, bem
como planos móveis, mais caros, para
quem pretende andar com a antena em
carros, ônibus ou aviões.
Renan Araujo e Geisy Batista, por
exemplo, pagam mais caro: R$ 280.
Eles formam um casal de nômades
digitais, então precisam de um paco-
te que permita acessar a rede a partir
do carro (a dupla viaja o Brasil há seis
meses enquanto mantém empregos
CLT, e publica a jornada no Instagram
@turinaestrada). “Fiz uma adaptação
para usar a Starlink em movimento,
com placa solar, bateria auxiliar e con-
troladores de carga”, explica Renan, que
montou um motorhome do zero para
a viagem. “A ideia é estacionar, abrir
nosso telhado e trabalhar. Mas usamos
bastante a Starlink em movimento,
também. Cancelamos nosso plano de
celular e ficamos só com ela.”
Bacana. Mas esse copo tem um lado
meio vazio. Permitir acesso à banda
larga em qualquer lugar do mundo
concentra uma quantidade impensá-
vel de poder nas mãos de Musk. “Se
amanhã ele apertar um botão errado
ou, simplesmente, bloquear a cone-
xão de um país inteiro, muita coisa
vai parar. Afinal, à medida que ele for
barateando a tecnologia, as pessoas
vão migrar para ela”, diz a advogada
Elisângela Menezes, especialista em
Direito Digital.
 CLUBE DE REVISTAS
É claro que isso vale
para qualquer empresa
que domina uma fatia
do mercado de telecomu-
nicações. Mas a internet
não é tão regulamentada
quanto TV ou a telefonia
(que são concessões, ou
seja: o governo autoriza
uma empresa privada a
fornecer um serviço de
interesse público).
O exemplo extremo
da submissão de um país
a Musk não vem daqui,
mas da Ucrânia. Apenas
dois dias após o começo
da guerra, em fevereiro de
2022, o empresário liberou
acesso à rede em território
ucraniano e começou a do-
ar antenas para que civis e
militares se conectassem.
Três meses depois, em
maio, 150 mil ucranianos
já dependiam dele para
acessar a internet. Os mi-
litares logo começaram a
usar a Starlink para operar
drones de reconhecimen-
to e ataque. É verdade que
os EUA e outros países
aliados, desde o início,
financiaram 30% das
mensalidades e 85% das
antenas – ou seja, a medi-
da não foi caridade com-
pleta por parte da SpaceX.
Mas todos os envolvidos,
inevitavelmente, estavam
na mão de Musk. E aí, não
deu outra.
No Brasil, o Em fevereiro de
kit de ins- 2023, a SpaceX se
talação da deu conta de que o
Starlink pode uso pelos militares
custar até r$
3 mil. O paco-
te mais barato
de assinatura
é de r$ 184.
havia se tornado insustentável poli-
ticamente e o restringiu. Além disso,
requisitou que o governo americano
passasse a pagar integralmente as
mensalidades ucranianas que ainda
estavam saindo de graça. Musk tuitou:
“A SpaceX não está pedindo um res-
sarcimento por gastos passados, mas
não podemos financiar o sistema atual
indefinidamente e mandar milhares de
outras antenas que usam até cem vezes
mais dados que uma casa comum. Não
é razoável”.
Não há motivo para achar que ele te-
nha feito isso por má vontade ou sim-
patia aos russos. É óbvio que operar
um sistema desse tamanho de graça dá
prejuízo. Mas esse é um caso raro em
que um Estado se viu imobilizado por
uma empresa privada, e não o contrário.
Tudo isso pede uma regulamentação
mais sólida, e internacional.
Porque Musk tem poderes que, ao
longo de todo o século 20, estiveram
nas mãos de governos. De foguetes que
pousam a internet de banda larga uni-
versal, a SpaceX está na vanguarda da
exploração do espaço – a fronteira que
nossa civilização ainda não transpôs.
As ações de Musk, hoje, são tão in-
fluentes quanto eram as decisões de
exploradores portugueses e espanhóis
nas Grandes Navegações, quando o
Atlântico tinha o lugar do céu como
limite inexplorado da humanidade.
Eles criaram o mundo como o conhe-
cemos. Daqui a cinco séculos, Musk
talvez seja estudado como Colombo
ou Cabral são hoje – pelo que ele fizer
de bom e de ruim. A aniquilação dos
povos nativos americanos mostra que a
catástrofe é um desfecho comum. Mas
ela não precisa ser inevitável. S
setembro 2023 super 39
 CLUBE DE REVISTAS
tecnoloGia

O FUTU
RO DOS até 14 horas de

NOTE
Texto Bruno Garattoni Ilustração felipe Del Rio Design Krauss
bateria. liga e
desliga imediato.
veja como os
processadores
com arquitetura
arM aproximam os
laptops Windows
dos MacBooks
– e confira o teste

BOOKS
de dois modelos.

40 super setembro 2023

CLUBE DE REVISTAS

O
O celular, O kindle, O cOnsOle de
games... no mundo moderno, as coi-
sas eletrônicas simplesmente funcionam.
São tão confiáveis quanto uma geladei-
ra. Fazem o trabalho e estão sempre
prontas, sem dor de cabeça. Com uma
exceção: o notebook. Ele demora para
ligar e desligar, aguenta pouco longe da
tomada, às vezes drena a bateria sem
motivo aparente... é como um bebê, você
sabe que vai dar trabalho e tem de ficar
atento. No fim de 2020, a Apple resolveu
a questão: lançou um novo processador,
o M1, que gastava muito menos energia.
Graças a isso, a bateria dos MacBooks
alcançou 16 a 18 horas, um patamar iné-
dito. Isso significa que eles podem ficar
em modo de espera, ligados e prontos
para responder, o tempo todo – como
os smartphones.
O mundo Windows tentou igua-
lar isso, mas não chegou nem perto.
O problema é que os chips da Intel e
da AMD são baseados na “microar-
quitetura” x86, que prioriza o poder
de processamento, não a economia
de energia – quando ela foi criada,
em 1976, nem existiam notebooks.
A Apple também usava processadores
do tipo x86, mas migrou para ARM:
essa arquitetura, inventada pela em-
presa inglesa de mesmo nome, per-
mite desenhar CPUs que consomem
bem menos eletricidade. Por isso ela é
adotada nos MacBooks, e em todos os
smartphones: segundo a Arm Limi-
ted, que fica sediada em Cambridge
e tem 5.700 funcionários, até hoje já
foram fabricados mais de 250 bilhões
de chips baseados nessa tecnologia.
Cada vez mais, o mundo roda em ARM.
E agora existem laptops Windows
com essa arquitetura. Dois chegaram re-
centemente ao Brasil – e nós testamos.
Curiosamente, ocupam os dois extre-
mos do mercado. O Compaq Presario
5320 é básico e barato: foi lançado por
R$ 2.699, mas está em oferta por menos
de R$ 1.700. Já o Lenovo ThinkPad X13s
é de luxo, com preço à altura: R$ 11.699.
Ambos usam processadores ARM (da
linha Snapdragon, produzida pela
Qualcomm) e vêm com uma versão
especial do Windows 11, refeito para
rodar nesses chips. Ele é visualmente
idêntico ao Windows comum – e fun-
ciona perfeitamente, com um porém
(mais sobre isso daqui a pouco). Vamos
começar pela máquina mais simples.

setembro 2023 super 41

 CLUBE DE REVISTAS
Sede da empresa
inglesa Arm,
em Cambridge.
Ela criou e
desenvolve a
arquitetura ARM
– que licencia
para algumas
fabricantes
de chips,
como Apple,
Qualcomm e
Samsung.
Talvez você nunca do mercado aos poucos.
tenha ouvido falar da O Presario 5320 que te-
Compaq, mas ela já foi nho em mãos é fabricado
uma potência – e teve pela empresa brasileira
250
um papel fundamental Positivo, que licenciou os
na história. No começo direitos de uso da marca.
dos anos 1980, conseguiu Ele é todo de plástico,
fazer “engenharia rever- mas surpreendentemente
sa” (decodificar e copiar bem construído: o tecla-
a BIOS, a camada mais do é sólido (a estrutura
básica de software) do não “afunda” durante a
primeiro PC, criado pe- digitação), o trackpad é
la IBM. Com isso, abriu preciso e a tampa abre e
caminho para que mui- fecha com suavidade. A
tas empresas fabricassem máquina é fina, leve e bo-
clones daquele computa- nita, não parece um lap-
dor – o que derrubou os top barato. Seus pontos
preços e espalhou bilhões negativos são a tela de 15
de desktops pelo mundo. polegadas, que não é Full
A Compaq se tornou lí- HD e tem ângulo de visão
der do mercado global. restrito (se você não esti-
Mas, nos anos 1990, so- ver bem em frente a ela,
freu com a concorrência as cores ficam lavadas). E
da Dell e perdeu fôlego; a webcam, cuja imagem
em 2002 acabou com- é meio borrada. Coisas
prada por outra rival, a típicas dos notebooks
HP, que pagou US$ 25 nessa faixa de preço.
bilhões (US$ 42 bilhões Já o processador não é
em valores atuais). E seu nada típico. Trata-se de
nome foi desaparecendo um Snapdragon 7c Gen2,
42 super setembro 2023
com oito núcleos, que trabalha a até
2,55 GHz. Combinado aos 8 gigabytes
de memória RAM e ao SSD de 256 GB
presentes no laptop, ele proporciona um
desempenho bem razoável. Mesmo com
dez abas do navegador abertas, incluin-
do textos e planilhas do Google Docs, o
WhatsApp Web e música por streaming
(Tidal), o notebook não ficou lento.
Um detalhe curioso é que, nos víde-
os do YouTube, o áudio sempre ficava
ligeiramente fora de sincronia com a
imagem. Pesquisando na internet des-
cobri ser um bug, que o navegador Edge
apresenta ao rodar no Snapdragon 7c.
Bizarro. Mas, felizmente, foi fácil de
resolver (basta entrar nas configura-
ções do Windows e desativar o item
“Aprimoramentos de áudio”).
E a bateria? Ela dura muito, sim. Com
todas essas coisas rodando e o brilho
da tela ajustado para 30%, consegui
impressionantes 12h18min – o dobro
de um laptop similar com processador
x86. Já é o suficiente para atravessar um
dia inteiro de trabalho, com folga. Mas,
para ver se o Compaq conseguiria ir
além, mexi em algumas configurações:
desliguei o Bluetooth e ativei o modo
de economia de energia do Windows
e do Edge. Não fez diferença: 12h16 de
bateria. Esse parece ser o limite.
É um resultado muito bom. Até
porque a bateria do Compaq é rela-
tivamente pequena, com capacidade
de 40 Watt-hora – bem menos que
os 66,5 Wh de um MacBook Air de 15
polegadas, por exemplo. Isso significa
que, em consumo de energia por hora
de uso, o processador da Qualcomm
é tão econômico quanto os chips da
Apple. Inclusive quando o notebook
está fechado porém ligado, em modo
bilhões de
chips da de espera. Ou seja, você não precisa
arquitetura mais ficar desligando o laptop para
ARM foram economizar bateria. Excelente. Mas
produzidos
até hoje. com uma ressalva.
Eles estão O Compaq é rápido e gasta pouca
presentes energia quando está rodando softwares
em smart-
phones, “nativos”, ou seja, que foram refeitos
MacBooks para rodar em chips ARM. O Windows
– e, agora,
em alguns 11, o Edge e o pacote Office já ganharam
laptops versões assim, mas a grande maioria dos
Windows. outros programas não. Se você tentar
rodar o Chrome, que só tem versão x86,
não vai gostar do resultado: o notebook
fica lento, engasgando até na rolagem
das páginas, e também gasta mais bate-
ria (dura aproximadamente 9h, se você
 CLUBE DE REVISTAS

UMA NOVA ERA Notebooks com chips ARM

consomem menos energia – e
Para
rodar bem,
PARA OS PCS suas baterias duram o dobro
do tempo. Entenda por quê. gastando

1
pouca
A ARQUITETURA cpu
energia,
É o modelo de organização dos Gpu
circuitos de um processador. As
principais são a x86, usada na
(acelerador gráfico 3D)
os chips ARM
maioria dos computadores, e a
ARM – que foi criada pela inglesa
HexaGON
(acelerador de vídeo)
precisam de
Arm Limited e está presente nos
smartphones, nos Macs e, agora,
em alguns notebooks Windows.
SeNSING
HuB
NúcleO
De
SeGuraNça
SpecTra ISp
(processador
de fotos)
softwares
Os chips ARM são capazes
snapdragon 8cx Gen 3
mODem 5G
FaSTcONNecT
(Wi-Fi e
Bluetooth)
adaptados.
de executar 230 operações
diferentes, contra 1.500 dos chips
x86. Isso não traz problemas Núcleos não arrancar os cabelos e
(basta adaptar os softwares),
de alta
performance
3 GHz 3 GHz 3 GHz 3 GHz
14 MB desistir antes). Isso acon-
e permite que a CPU seja mais memória cache tece porque o Windows
Núcleos 2,4 2,4 2,4 2,4
simples, economizando energia. de baixo consumo GHz GHz GHz GHz tem de “traduzir”, em
tempo real, as instruções

2 3
do navegador de x86 para
ARM, o que consome po-
AS CPUS OS SOFTWARES der de processamento – e
São fabricadas pela americana A Microsoft reescreveu o Windows, sobrecarrega o chip.
Qualcomm, e adotam a arquitetura o pacote Office e o navegador Edge Então é recomendável
ARM. Os principais modelos são para os chips ARM. Funcionam evitar programas x86, e
o Snapdragon 7c, mais básico, e o perfeitamente, e são idênticos às priorizar os ARM. Trata-
Snapdragon 8cx, mais sofisticado versões tradicionais. Também dá -se de uma limitação.
(veja acima). Eles combinam dois para instalar e rodar programas x86 Mas, ao mesmo tempo,
tipos de núcleo de processamento comuns, mas o desempenho cai – não é tão problemático
– e também incorporam funções porque aí o Windows precisa emular, quanto parece. Isso por-
extras, como modems Wi-Fi e 5G. em tempo real, a presença de
que o Edge é uma cópia

4
uma CPU desse tipo.
do Chrome: ambos usam
AS MÁQUINAS o mesmo “motor” de ren-
derização de páginas, e
por isso rodam os sites
e serviços online exata-
mente do mesmo jeito,
com a mesma compati-
bilidade (até truques bem
específicos, como um
que utilizo ao operar o
site da Super, funcionam
nos dois). Então não se
perde nada, na prática,
CoMpAQ pRESARio 5320 Thinkpad X13s trocando o Chrome pe-
CpU: Snapdragon 7c Gen 2, oito núcleos CpU: Snapdragon 8cx Gen 3, oito núcleos lo Edge. Se você conse-
memória ram: 8 GB memória ram: 16 GB
gue resolver a sua vida
armazenamento: SSD, 256 GB armazenamento: SSD, 512 GB
sistema operacional: Windows 11 Home sistema operacional: Windows 11 Pro
só com o navegador e o
rede: Wi-Fi (não possui 5G) rede: Wi-Fi e 5G Office (o suficiente para
Tela: 15,6 polegadas, 1.366 x 768 pixels Tela: 13 polegadas, 1.900 x 1.200 pixels muita gente), o Compaq
(equivalente a 720p) (Full HD) dá conta – e oferece, em
peso: 1,63 kg peso: 1,06 kg troca, muita economia de
preço: R$ 2.699 (compaq.com.br) preço: R$ 11.199 (lenovo.com/br) energia. Sua autonomia

setembro 2023 super 43

 CLUBE DE REVISTAS
não fica tão atrás dos MacBooks – por
1/5 do preço de uma máquina Apple.
Mesmo assim, seria bom que mais
programas do Windows fossem con-
vertidos para a arquitetura ARM. Atu-
almente, são pouquíssimos: tirando o
Edge e o pacote Office, os principais são
o Photoshop, o Spotify e o tocador de
vídeo VLC. A Microsoft vem tentan-
do estimular a migração de outros. Em
2022 ela lançou nos EUA um compu-
tador desktop, o Project Volterra, com
processador Snapdragon e Windows
11 – o público-alvo dessa máquina, que no Fra-
custa US$ 599 e parece fisicamente com mework,
o Mac mini, são justamente os desen- só não dá
volvedores de software. Também há para trocar
rumores de que a empresa esteja de- a tela. Todo
o resto, sim.
senvolvendo seu próprio chip ARM,
para tentar bater de frente com os da
Apple. Essa tese ganhou força em maio,
quando ela publicou ofertas de emprego
para uma nova divisão interna chamada
“Microsoft Silicon”.
Enquanto esse suposto processa- máquina emprestada pela x86, a autonomia cai pa-
dor não chega, a Qualcomm segue Lenovo era um protótipo, ra aproximadamente 10h).
aperfeiçoando seus chips para note- ainda sem o 5G habili- Ou seja: continua sendo
book. Sem muita pressa, é verdade: tado, não conseguimos melhor priorizar os soft-
o Snapdragon 8cx Gen 3, atual topo de avaliar o impacto disso. wares ARM. Com eles, o
linha, foi apresentado no final de 2021. Mas testes realizados ThinkPad é excelente.
Esse é o chip presente no ThinkPad pela imprensa dos EUA Ao contrário da Apple,
x13s, o outro notebook ARM a ser lan- apontaram que não chega que rapidamente conse-
çado, este ano, no mercado brasileiro. a ser um problema: se vo- guiu migrar quase todos

01
Ele custa seis vezes o preço do Compaq, cê só usar o 5G, vai sacri- os softwares do Mac pa-
e tem muitas diferenças em relação a ficar um pouco mais de ra a arquitetura ARM, o
ele. A começar pelo corpo, que não é de 1 hora da autonomia do mundo Windows deve
plástico: a máquina é feita com uma liga ThinkPad. Ainda sobra continuar com os dois
de magnésio, cuja leveza é espantosa bastante. Só vale lembrar: pés plantados na x86
(o ThinkPad pesa 1,06 kg, quase 200 para ter 5G no laptop, é por enquanto. É com-
g a menos que o MacBook Air 13, de preciso pagar um plano preensível. A Microsoft
tamanho equivalente). de internet separado (o não tem o poder de ditar
Sua tela – Full HD, claro – é de 13 po- ThinkPad aceita chips quais CPUs serão usadas
legadas, menor que a do Compaq, e a hora é a de todas as operadoras). nos computadores (como
redução na
bateria é maior: 49,5 Watt-hora. Por essa autonomia Ele vem de fábrica com a Apple faz nos Macs).
combinação de coisas, o ThinkPad tem do ThinkPad 16 gigabytes de memória E há muito mais pro-
autonomia ainda mais longa. Rodando x13s se RAM e SSD de 512 GB, gramas para Windows
você usar a
as mesmas coisas que o Compaq, ele conexão 5G o dobro do Compaq. Seu do que para Mac – a
aguentou 13h52min longe da tomada. (que con- processador, o Snapdra- conversão, se acontecer,
some mais
Um diferencial interessante é que o energia). gon 8cx Gen 3, também levará tempo.
Lenovo tem internet 5G. Você coloca Mas ainda é sensivelmente mais Mas, como o Com-
um chip de celular, e aí nunca mais fica sobra muita potente. Ele se saiu me- paq 5320 e o ThinkPad
bateria:
dependente do Wi-Fi (ou de acionar o quase 13 lhor com os programas x13s mostram bem, a
modo “hotspot portátil” do seu celular). horas. x86: não engasgou tan- arquitetura ARM é o
Isso transforma a experiência de uso to com o Chrome, por futuro: com ela, os no-
do notebook: ele passa a ter conexão exemplo. Mas também tebooks Windows dão
sempre, em todos os lugares, como um sofreu um pouco e con- um grande salto de ba-
smartphone. As conexões 5G trabalham sumiu mais bateria com teria, e se aproximam dos
em frequências altas, e são famosas eles (no ThinkPad, se MacBooks. Se a Qual-
por consumir muita bateria. Como a você só usar programas comm conseguir criar

44 super setembro 2023

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O FIM DA Novo tipo de laptop permite

A Qualcomm
comprou
OBSOLESCÊNCIA o upgrade das peças, como se
fosse um PC de mesa. a Nuvia,
A americana Framework Computer pretende transformar os notebooks em algo
empresa que
tão consertável e atualizável quanto os PCs de mesa – que são modulares, e por
isso podem ter as peças trocadas pelo próprio usuário. A empresa foi fundada em foi fundada
por ex-
janeiro de 2020, bem no começo da pandemia, o que atrasou as coisas: seu primeiro
modelo, o Framework 13, só chegou (aos EUA) um ano e meio depois. Fez sucesso,
e a empresa lançou mais dois: o Framework 16 e o Framework Chromebook – que
roda o sistema Chrome OS, do Google. As máquinas custam de US$ 949 a US$
1.699, preços comparáveis aos dos demais fabricantes.
engenheiros
A diferença é que elas podem ser atualizadas: a Framework periodicamente lança da Apple
– e promete
novas placas-mãe, com CPUs e chips de vídeo mais modernos. As placas custam a
partir de US$ 299, e são compatíveis com todos os modelos da empresa. O upgrade
é relativamente simples, e não requer ferramentas especiais: basta seguir um guia
passo-a-passo publicado no site da companhia. uma CPU
revolucionária.
além de trocar uma CPU Snapdragon
a placa-mãe, mais forte, que seja capaz
onde ficam os de rodar os programas
componentes, x86 um pouco melhor,
também dá já pode ser o suficiente
para substituir
os conectores. para uma migração em
se um dia exis- massa. Talvez ela consiga.
tir o padrão Em 2021, a Qualcomm
USB 5.0, por comprou a Nuvia, uma
exemplo, o empresa de chips que
Framework
irá aceitá-lo. foi fundada por ex-enge-
nheiros da Apple, e vinha
sendo disputada a tapa:
o Google, a Microsoft e
a Intel também estavam
no páreo para adquiri-la.
A Nuvia é valiosa porque
criou um novo tipo de
chip ARM, que promete
ser tão potente quanto
os melhores x86, só que
gastando muito menos
energia. Exatamente o
que a Apple fez nos seus
processadores M1 e M2.
O Snapdragon 8cx Gen 4,
que a Qualcomm vai lan-
çar no ano que vem, deve-
rá ser o primeiro baseado
no projeto da Nuvia. Se
esse chip entregar o que
promete, poderá revolu-
cionar o mercado. Pelo
bem dos notebooks, to-
mara que sim. S

setembro 2023 super 45

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ciência
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AS T RONOMIA
indígena
Texto Maria Clara Rossini Design Luana Pillmann
Edição Alexandre versignassi Ilustração Tayrine Cruz

os Tupinambás, do Maranhão, sabiam da influência da Lua sobre

as marés. As constelações Guarani marcam os ciclos do
ambiente e guiam os comportamentos sociais dessa população.
Saiba de que forma os povos originários viam (e veem) o céu.

A
a lendA do boto cor-de-rosA você
já conhece. O que vamos fazer aqui é
colocá-la em outro contexto. Para os
indígenas Tembés, nativos da Amazô-
nia, a mitologia é que o boto travestido
de rapaz teria seduzido a filha de um
cacique. Os dois se apaixonaram e pas-
saram a se encontrar todas as noites de
lua cheia. O resultado dessa perambu-
lação foi a gravidez da garota, que deu
à luz três filhotes de boto. Eles foram
soltos na água – mas visitam a mãe
nas noites de lua cheia e lua nova, e
quando saltam, fazem ondas e alagam
as margens do rio (1).
A história descreve o fenômeno da
pororoca, o encontro das águas oceâ-
nicas e fluviais. A atração gravitacio-
nal mais forte nas épocas de lua nova
e cheia faz com que a maré entre na
foz do rio, provocando ondas de até 6
metros de altura.
Isso deixa claro o seguinte: os ín-
dios Tembés sabem que as fases da
Lua influenciam nas marés. A cultura
Tembé floresceu depois da chegada
dos portugueses. Seu idioma, porém,
é herdado dos Tupinambás, que viviam
onde hoje fica o Maranhão. A cultura
deles precede a colonização – e o povo
Tupinambá também sabia da influência
da Lua sobre as marés.
Isso foi revelado pelo missionário
Claude D’Abbeville no século 17. O frade
francês conviveu com os Tupinambás
durante quatro meses em 1612, e relatou
a experiência em um livro (2) publicado
dois anos depois. Há um capítulo inteiro

setembro 2023 super 47

 a
CLUBE DE REVISTAS
Ema
a constelação surge na segunda quin-
zena de julho, dando início à estação
seca para as populações do norte. suas
“penas” são formadas pela mancha
esbranquiçada da via láctea, que
atravessa o corpo do animal.

Ara
Escorpião

Vela

O OUTRO CÉU
BRASILEIRO
Conheça as conste-
lações observadas
por diferentes povos
indígenas brasileiros
– e veja como elas se Cruzeiro do Sul
sobrepõem às constela-
ções oficiais da IAU.
Veado
é mais conhecida entre as populações do sul
do país. (para as etnias do norte, o veado
Constelações indígenas fica muito próximo do horizonte, o que difi-
Constelações oficiais da IAU culta sua observação.) ela surge na segunda
quinzena de março, marcando a transição
do calor para o frio.

dedicado à astronomia indígena, em que rotação da Terra em torno do próprio

D’Abbeville conta, com surpresa, que a
população distinguia os dois tipos de
marés cheias mais intensas – a da lua
nova e a da lua cheia.
Na época, esse fato ainda não fazia
parte do arcabouço científico ociden-
tal (ainda que outros povos, como os
gregos antigos, tenham registrado
bem antes que as marés coincidem
com as fases da lua). Em 1616, só dois
anos após a publicação de D’Abbeville,
Galileu escreveu uma carta intitulada
Discurso do fluxo e refluxo do mar, em
que defende que as marés são causadas
pelo balanço da Terra durante a órbita
ao redor do Sol e pelo movimento de
rotação. Quando Johannes Kepler suge-
riu adicionar a Lua na equação, Galileu
não poupou críticas ao astrônomo.
Foi só em 1687 que Isaac Newton
demonstrou a influência gravitacional
da Lua sobre as marés. Grosso modo,
o movimento de translação da Lua e
eixo proporcionam duas marés altas
ao longo de 24h. Só que nos períodos
de lua nova e cheia, quando o satélite
está alinhado à Terra e ao Sol, a atra-
ção gravitacional da estrela soma-se à
da Lua, provocando marés ainda mais
Para vários po- cheias – principalmente próximo à li-
nha do equador.
vos indígenas, Assim como os marinheiros da época,
os Tupinambás sabiam disso empirica-
o ano começa mente. Além das constatações sobre a
em junho, com o Lua, D’Abbeville ainda menciona 30
constelações observadas pelos indígenas,
renascimento das completamente diferentes das divisões
Plêiades no céu do zodíaco (já que cada povo vê nas es-
trelas os desenhos que bem entender).
noturno. Nos séculos seguintes, descobriríamos
que o céu brasileiro é muito mais ilus-
trado do que poderíamos imaginar.
O “horóscopo” indígena
Que fique muito claro: não existe ho-
róscopo indígena. Quem buscar o termo

fontes (1) Artigo “O céu como guia de conhecimentos e rituais indígenas”; (2) Livro Histoire de la mission des pères capucins en l’isle de Marignan et terres circonvoisines où est traicté des singularitez
48 super setembro 2023 admirables & des moeurs merveilleuses des indiens habitans de ce pays. (3) Artigo “As Constelações Indígenas Brasileiras”; (4) Artigo “As estrelas eram terrenas: antropologia do clima, da iconografia
e das constelações Ticuna”; (5) Artigo “Interpretações arqueoastronômicas da supernova 1054 no sítio arqueológico lagoa do escuro e na toca dos astros”.
Lagarto
Cefeu
Anta do Norte
como o nome diz, só é visível no norte do
país. Ela fica na região da Via Láctea, que
compõe o corpo do animal. Não à toa, a
mancha esbranquiçada no céu é chamada
por Tembés e outros povos de “caminho da
anta”, por conta da constelação.
Plêiades
Betelgeuse
Homem velho
Presente em várias etnias indígenas. Para os
povos do norte, indica o início do período
chuvoso. Para os do sul, marca o começo do
verão. Acima da cabeça do homem estão as
Plêiades, um marcador de início de ano.
na internet vai encontrar referências a
“horóscopo tupi” e coisas do tipo. Mas é
mentira, simplesmente. Os povos origi-
nários usam as estrelas como marcado-
res temporais, indicando eventos cíclicos
do meio-ambiente que são explicados
pela mitologia de cada população.
Pegue a constelação do Homem Ve-
lho, por exemplo. O mito mais comum
diz que esse indivíduo foi traído pela
esposa, que o trocou pelo irmão dele.
Para ficar com o cunhado, a mulher
matou o marido, cortando-lhe a perna.
Em termos práticos, a aparição do
Homem Velho no céu significa a che-
gada do “inverno” para as populações
do norte (nome dado para o período
chuvoso na região). A figura surge na
segunda quinzena de dezembro, quando
estão prestes a começar as chuvas mais
intensas da Amazônia. Para efeito de
comparação, as pernas do homem são
compostas pelas estrelas do cinturão de
Órion, as Três Marias. E Betelgeuse, a
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gigante vermelha que brilha intensa-
mente, é o local em que o membro foi
amputado (veja na imagem ao lado).
Enxergar essa constelação já fazia
parte da cultura Tupinambá no século
17, e também aparece entre os Gua-
ranis, que vivem hoje no sul do país
(3). Para eles, o Homem Velho marca o
início do verão – e, de fato, o solstício
de verão no hemisfério sul ocorre no
dia 22 de dezembro.
Embora separadas por 2.500 km e
400 anos, essas etnias têm ancestrais
em comum e fazem parte da mesma
família linguística (o tupi-guarani), o
que explica os conhecimentos astro-
nômicos compartilhados. As Plêiades,
por exemplo, recebem o mesmo nome:
Eixu, que significa ninho de vespas ou
abelhas. Essa parte da “nossa” constela-
ção de Touro é visível durante a maior
parte do ano, ficando oculta pelo Sol por
Órion apenas um mês. O renascimento das
Plêiades, em junho, é um importante
marcador temporal para vários povos
indígenas, que geralmente interpretam
o fenômeno como o início do ano.
Outras famílias linguísticas têm ou-
tras constelações. Na década de 1940,
o etnólogo alemão Curt Nimuendajú
descreveu a da onça e do tamanduá,
uma das mais importantes e simbóli-
cas para o povo Ticuna, que habita o
oeste amazônico (4). Ela retrata a briga
entre os dois animais – que começa
30
em junho, com a onça por cima, re-
presentando o período de seca. Com
o passar dos meses, a constelação “se
move” pelo céu (consequência do movi-
mento de translação da Terra) e termina
com o tamanduá por cima da onça, em
novembro. A vitória do animal traz a
chegada das chuvas.
Já a população Tukano, que também
vive na Amazônia, marca a chegada das
enchentes com a constelação da jarara-
ca. Elas começam quando a cabeça da
serpente atravessa o horizonte, no meio
constelações de novembro. A partir daí, cada parte
indígenas foram re- do corpo que cruza o céu nomeia uma
gistradas por Claude enchente: há a do rabo da jararaca, da
D’Abbeville durante
bolsa de ovos, da glândula de veneno...
sua visita aos Tupi-
nambás do Maranhão,
“Essas enchentes vêm de chuvas nas
no início do século 17. cabeceiras dos rios ou degelo no alto da
Colômbia, aí você tem o aumento do
nível”, diz Walmir Cardoso, astrônomo
e pesquisador da USP que trabalha com
setembro 2023 super 49
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essa população. As enchentes dificultam

a pesca – significa que está na hora de
focar em outras formas de subsistência,
como a caça e plantio.
“As chuvas, enchentes e estiagens
determinam um ritmo de vida social
– que por sua vez tem a ver com algo
mais complexo, os ritos”, diz Cardoso.
Há uma organização social relaciona-
da aos “irmãos maiores”, que são as
estrelas. Cerimônias de casamentos,
confecção de artesanatos e trocas en-
tre grupos étnicos, então, também são
definidas pelo céu.
O povo Desana, da mesma região e
família linguística dos Tukanos, leva
essa influência até a arquitetura. Suas
casas comunais, onde moram diferen-
tes famílias, são construídas no sentido
leste-oeste, o do nascer e do pôr do Sol.
Elas seriam um reflexo das “malocas do
céu”, orientadas dessa maneira.
É praticamente impossível apontar
quando ou como essas tradições co-
meçaram. De qualquer forma, atribuir
simbologia aos corpos celestes é uma
característica inerente à humanidade. Em
1930, a União Astronômica Internacional
(IAU) “congelou” o céu, dividindo-o em
88 constelações que não podem se so-
brepor – por padronização mesmo. Elas
incluem Ursa Maior e Menor, Sagitário,
Cruzeiro do Sul… As que você já conhe-
ce. Todas elas carregam simbologias – da A partir de julho do ano Para datá-los com precisão, seria ne-
mesma forma que as indígenas. 1054, uma supernova cessário levar amostras da tinta para
Hoje, há um movimento para que a surgiu no céu noturno. laboratório. E enquanto não houver um
IAU reconheça constelações não-euro- O brilho do colapso es- projeto de pesquisa dedicado a isso, tu-
peias. Não para substituir as existentes, telar ficou visível em todo do o que podemos fazer é especular.
mas para que o simbolismo delas não o planeta por quase dois Um dos primeiros a se interessar
se perca com o tempo. anos. Chineses, árabes e especificamente pela astronomia in-
outros povos registraram dígena no Brasil foi o pesquisador
Escrito nas paredes o fenômeno na forma de Germano Afonso (1950-2021), na
Sabe aqueles quartos de criança que escrita e pintura: geral- década de 1990. Ele mapeou mais de
têm estrelas fluorescentes grudadas mente, como um corpo 100 constelações dos povos originários
nas paredes e no teto? A Toca do Cos- celeste muito brilhante, ao e as relacionou a mitos e fenômenos
mos, no interior da Bahia, é mais ou lado da Lua. Há registros naturais. Em uma das visitas a uma
menos assim. A caverna é repleta de semelhantes nas paredes aldeia Guarani, no Paraná, Germano foi
pinturas que fazem referência a objetos da Bahia e de Pernambu- informado de que a atividade de mos-
celestes: estrelas, eclipses, cometas. co – por isso, alguns pes- quitos e outros insetos aumentava em
Pelo menos essa é a interpretação mais quisadores teorizam que noites de lua cheia – uma relação que
aceita pela arqueoastronomia, área de os brasileiros pré-cabrali- de fato existe graças à luminosidade
pesquisa que busca entender o passado nos também registraram do satélite natural, mas que ele próprio,
da nossa relação com os astros. Há re- a supernova (5). como astrônomo, nunca tinha notado.
presentações desse tipo espalhadas pelo Só que ainda não dá Afonso também investigou o possí-
Brasil, como na Lagoa do Escuro e na para bater o martelo. Pri- vel uso de relógios solares pelos povos
Toca dos Astros, ambas em Pernambuco. meiro porque não sabe- indígenas antigos. Ele dizia ter encon-
Algumas dessas pinturas podem, mos exatamente quando trado pedras verticais cravadas no solo
inclusive, relatar eventos específicos. os desenhos foram feitos. que poderiam ser gnômons: somada a

50 super setembro 2023

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Toca do Cosmos
o sítio arqueológico localizado no
município de itaguaçu, na Bahia,
é repleto de inscrições que fazem
referência a corpos celestes.

outras indicações no chão, a sombra trabalhos sobre astronomia indígena

dessas rochas indicaria o horário do não vão ser aceitos ou publicados”, diz
dia e até período do ano. Esses ins- Luiz Borges, pesquisador do Museu de
trumentos também foram utilizados Astronomia e Ciências Afins, no Rio
por outros povos na antiguidade, da de Janeiro. “Precisamos de pessoas no
Mesopotâmia à China. Alguns pes- campo [...] e, quanto mais a gente souber
quisadores concordam que interpretar sobre esses conhecimentos indígenas,
os monólitos e a disposição de rochas As estrelas mar- mais ajudamos a quebrar estereótipos.”
como relógios solares talvez seja uma
extrapolação. Mas o fato é que exis-
cam os períodos E é bom que isso seja feito logo.
Assim como as culturas ancestrais
tem poucos estudos formais sobre a de chuva e estia- desaparecem junto com as popula-
finalidade dessas construções. Desde
a década de 1990, uma nova geração
gem – guiando o ções indígenas, locais como a Toca
do Cosmos encontram-se vulnerá-
de pesquisadores tem se interessado comportamento veis pela ação do tempo e a própria
pelo tema, seja fazendo pesquisas de depredação humana. “Tem poucos
campo com povos indígenas atuais
de subsistência e sítios aqui no Brasil em que foi feito
(trabalho que pode levar mais de um ritualístico um trabalho sistemático de datação
ano, para observar os ciclos celestes), e escaneamento 3D” diz Flávia Lima,
ou estudando a arqueologia e relatos do grupo. astrônoma da Fundação Planetário da
de etnógrafos do passado. Cidade do Rio de Janeiro. “Precisamos
Apesar dos esforços para o estudo da de um projeto grande no Brasil, reu-
astronomia cultural e da arqueoastro- nindo várias instituições para cata-
nomia no Brasil, esse ainda é um tópico logar e datar esses locais.” Afinal, é o
que gera preconceito nas universida- conhecimento sobre a nossa própria
des. “Muitos pesquisadores acham que história que está em jogo. S

agradecimentos Luiz Carlos Borges, Pesquisador do Museu de Astronomia e Ciências Afins - MAST; Walmir Cardoso, Pesquisador no Grupo de História, Teoria e Ensino de Ciências da USP;
Flávia Pedroza Lima, astrônoma da Fundação Planetário da Cidade do Rio de Janeiro; Rundsthen Vasques de Nader, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro. setembro 2023 super 51
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cultura

100
Texto Rafael Battaglia
Ilustração Kin Noise
DA
anos
Design Caroline Aranha e Cristielle Luise

edição Alexandre versignassi

DISNEY O filme da Disney

que eu mais assisti quan-
do criança não era exa-
(com velinha e tudo), organizaram um
novo show de fogos de artifício e prepa-
raram um vídeo convidando o público
tamente um filme. Era para a festa.
uma propaganda. Tinha uma versão em português
Em 1996, o Magic desse material na casa dos meus avós.
Kingdom, primeiro par- Na capa do VHS, o tal bolo gigante.
que da Disney na Flóri- Ninguém jamais soube explicar como
da, completou 25 anos. aquilo foi parar lá (não tínhamos grana
Para comemorar, trans- para uma viagem em família). Mas tudo
formaram o castelo da bem: gravei na mente cada canto do
Cinderela num bolo de parque como se fosse um guia turístico.
aniversário cor-de-rosa Estava fascinado.

52 super setembro 2023


Em um século, a casa do Mickey
lançou mais de 800 filmes e construiu
um império bilionário de parques
temáticos, estúdios de cinema e
canais de TV. Conheça a história da
empresa – e entenda por que ela
passa por um momento delicado.
(Daí você cresce – e entende por que
regulam a publicidade infantil.)
Quase todo mundo tem alguma
história com a Disney. Em 100 anos de
existência, a empresa lançou 812 filmes,
entre desenhos e live actions (com atores
de carne e osso) dos seus vários estúdios,
além de um sem-fim de curtas animados,
programas de TV e produtos licencia-
dos. É a segunda maior companhia de
entretenimento do mundo em valor de
mercado (US$ 149 bilhões), só atrás da
Netflix (US$ 194 bi).
CLUBE DE REVISTAS
Mas há algo de errado no reino do
Mickey. A empresa perdeu mais da me-
tade do seu valor desde 2021, quando
atingiu o pico de US$ 357 bilhões (veja
o gráfico na página 58). O preço das
ações é o mais baixo em nove anos.
Uma das principais razões é a crise
no mercado de TV, um importante
segmento para a Disney, responsável
por 33,8% do faturamento, entre ca-
nais abertos e a cabo. O Disney+ tam-
bém tem sua parcela de culpa. Desde
o lançamento, em 2019, a plataforma
setembro 2023 super 53
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já deu um prejuízo de
US$ 11 bilhões.
A situação fez o CEO
da Disney, Bob Iger,
anunciar em fevereiro
um plano para reequi-
librar as contas da casa
e cortar US$ 5,5 bilhões
em custos. Entre as medi-
das, a empresa demitiu 7
mil funcionários. Vamos
entender essa história do
começo. Bem do começo.

No início, era tudo

rato A Disney co-
Desde criança, Walter
Elias Disney já ganhava
uns trocados desenhan- meçou fazendo
do. Nascido em 1901, em
Chicago, Walt se mudou
aos seis anos para uma
fazenda em Marceline,
curtas anima-
cidadezinha de 2,5 mil
habitantes no estado do
Missouri, no meio dos
dos para sessões
EUA. O garoto passa-
va os dias brincando
de copiar e colorir car-
de cinema.
toons do jornal – vez
ou outra, conseguia uns
frilas de ilustração com o conflito. Passou boa parte do tempo de Alice, curta inspirado
comerciantes locais. fazendo desenhos na lateral das am- na obra de Lewis Caroll.
A fazenda ficava pró- bulâncias e para o jornal do exército. Só que não foi sufi-
xima a uma ferrovia, o De volta aos EUA, arranjou emprego ciente para segurar as
que fez de Walt um afi- num estúdio de arte e ficou amigo de pontas do estúdio, que
cionado por trens. Mas um talentoso desenhista, Ub Iwerks. faliu em 1923. Walt se
só como hobby: queria Nessa época, Walt entrou em contato mudou para Hollywood
trabalhar desenhando com o então recém-criado mercado de (seu irmão mais velho,
mesmo. Quando a famí- animações (o primeiro desenho anima- Roy, já morava em Los
lia se mudou para Kansas do da história, o francês Fantasmagorie, Angeles) e conseguiu
City, Walt passou a fazer saiu apenas uma década antes, em 1908). uma parceria para dis-
dois turnos entregando Ele logo percebeu que a técnica das tribuir Alice, que acabou
jornais para pagar por folhas de acetato, desenvolvida em 1915, virando uma série para o
cursos de arte (e ajudar era a mais produtiva. Nesse método, cinema. Disney chamou
nas contas da casa). Recu- os artistas ganhavam tempo ao animar Iwerks para a empreitada
perava o sono cochilando apenas os personagens, que eram sobre- e, junto a Roy, fundou o
no colégio. postos num cenário estático. Em 1921, Disney Brothers Studio
Em 1918, aos 17 anos, ele contratou Iwerks e outros artistas, (mais tarde rebatizado de
tentou alistar-se para criou o Laugh-O-Gram Studio e pas- Walt Disney Studio).
lutar na Primeira Guer- sou a fazer curtas para o cinema local Em 1927, Disney encer-
ra, mas foi barrado por (lembre-se: não existia TV). rou Alice para focar em um
ser jovem demais. Ele Os desenhos fizeram sucesso, mas a projeto 100% animado. O
falsificou a certidão de Laugh-O-Gram operava no vermelho pedido veio do produtor
nascimento, conseguiu (animação sempre foi um negócio caro). Charles Mintz, que iria
uma vaga na Cruz Ver- Para economizar, Walt começou a testar distribuí-lo via Universal
melha e viajou à Europa outra técnica do momento, mais bara- Pictures. Iwerks e Walt,
– mas chegou logo após ta, que mesclava animação com atores então, criaram Oswald, o
o armistício que encerrou reais. Nascia aí O País das Maravilhas Coelho Sortudo.

54 super setembro 2023


Deu certo – mas não
por muito tempo. Em
1928, Walt foi a Nova
York renegociar um con‑
trato mais lucrativo com
a Universal, que detinha
os direitos de Oswald.
Então descobriu que o
estúdio havia chamado
quase todos os anima‑
dores da Disney para
produzir os desenhos por
conta própria. Walt saiu
sem acordo, sem funcio‑
nários – e sem o coelho.
Na viagem de volta,
rascunhou um novo per‑
sonagem: Mortimer Mou‑
se, um ratinho largamente
baseado nas feições do co‑
elho Oswald. Ub Iwerks
refinou o visual, e a espo‑
sa de Walt, Lilian, sugeriu
um nome menos formal:
Mickey. A estreia foi no
curta Plane Crazy (1928),
em que ele dá um rolê
com a Minnie num avião.
CLUBE DE REVISTAS
Mas o que fez Mickey e a Disney
levantarem voo (rs) foi o desenho se‑
guinte: Steamboat Willie, considerada a
primeira animação com som sincro‑
nizado. A tecnologia era novidade. O
primeiro filme falado da história, O
Cantor de Jazz (1927), havia estreado só
sete meses antes. Outros estúdios de
animação tentavam, sem grandes êxitos,
harmonizar som e imagem. No curta
da Disney, a música e todos os efeitos
sonoros casavam perfeitamente com o
que estava na tela.
Disney manteve o sarrafo lá em cima
com Silly Symphonies, desenhos surrea‑
listas que acompanhavam a música de
uma orquestra. Foi graças a um episódio
dessa série, Flowers and Trees, que Walt
ganhou o seu primeiro Oscar, em 1932.
Os anões, a greve e a guerra
Em 1933, os curtas da Disney eram um
sucesso. Pluto, Pateta e Pato Donald
já tinham estreado. Mas Walt estava
insatisfeito. Entendia que seria mais lu‑
crativo investir em filmes de longa‑me‑
tragem. Foi quando decidiu produzir
Branca de Neve e os Sete Anões – ele era
fã de uma versão da história produzida
como filme mudo, em 1916.
Só tinha um problema: até então,
ninguém nunca tinha feito um longa
animado, colorido e com som. A im‑
prensa não botava fé e apelidou o pro‑
jeto de “A Loucura de Disney”. O filme
custou US$ 31,4 milhões, em valores
de hoje – quatro vezes o valor médio
de uma produção da época.
Branca de Neve estreou em dezem‑
26
bro de 1937. Com quase 1h30 de du‑
ração, o filme envolveu mais de 1.400
ilustradores, animadores e assistentes.
Deu certo: arrecadou o equivalente a
US$ 138 milhões, tornou‑se um marco
OSCARS do cinema e pavimentou o caminho
É o número para as animações seguintes do estúdio:
de esta-
tuetas que Pinóquio e Fantasia, de 1940.
Walt Disney Mas esses filmes fizeram menos
ganhou ao dinheiro que Branca de Neve, já que o
longo da mercado europeu estava fechando por
vida. Um conta da Segunda Guerra. A Disney
recorde.
apertou os cintos e demitiu diversos
funcionários; os que sobraram pas‑
saram a trabalhar dobrado. As longas
jornadas, aliadas a baixos salários – e a
um ressentimento por Walt ter todo o
crédito das obras – levou a uma greve
no meio da produção de Dumbo (1941).
A simpática figura pública de Disney
setembro 2023 super 55
 CLUBE DE REVISTAS
escondia um chefe errático. Walt costu-
mava delegar tarefas difíceis com prazos
apertados, e raramente fazia elogios. A
greve acabou quando Disney assinou
um contrato sindical.
Meses depois, os EUA entraram na
guerra. Para Walt, um patriota de car-
teirinha, era a chance de ajudar o país
e, de quebra, fazer dinheiro. A empresa
fez um acordo com o governo ameri-
cano para produzir curtas que servi-
riam como propaganda do exército e
para vender war bonds – títulos que os
EUA comercializavam ao público para
financiar o confronto.
A guerra salvou a Disney da falên-
cia, mas a crise financeira não passou
– o mercado de curtas havia se torna-
do mais competitivo com desenhos da
Warner Bros (Looney Tunes), MGM
(Tom e Jerry) e de outros estúdios.
Para baratear a operação, Roy Disney,
encarregado das finanças, sugeriu fil-
mes que mesclassem live action com
animação (ou sem animação nenhu-
ma). Foi quando saíram obras como
o documentário Seal Island (1948) e a bastidores da produção do
aventura A Ilha do Tesouro (1950). parque. Marketing puro.
Cinderela (1950), o primeiro longa O parque abriu em 17
animado do estúdio em oito anos, foi de julho de 1955, num
um sucesso de público e crítica. Mas evento transmitido para
Walt se distanciou cada vez mais do 83 milhões de especta-
departamento de animação. Estava fo- dores. Foi um caos. In-
cado numa nova empreitada. gressos falsos causaram
superlotação. Brinquedos
Bem-vindo à Disneylândia quebraram… Mas a coisa
Parques de diversões estavam fora de vingou: em dois meses,

80%
moda nos EUA do pós-guerra. Quan- um milhão de visitantes
do Walt propôs a construção de um na passariam por lá.
frente da sede da empresa, em Burbank A Disneyland fez re-
(Califórnia), a prefeitura barrou: não é quanto nascer o mercado de
queriam que uma “atmosfera circense” os parques parques nos EUA. Em
tomasse conta da cidade. representa- uma década, o comple-
Mas o projeto seguiu. Disney com- vam do fa- xo de Anaheim recebeu
turamento
prou 650 mil m² em Anaheim, a 50 km da Disney
50 milhões de pessoas e
de Los Angeles. E fundou uma nova em- em 1983. virou lar de brinquedos
presa, a WED (iniciais de Walter Elias Hoje, cor- marcantes (alguns, inclu-
Disney), para desenvolver as atrações do respondem sive, inspirariam futuros
parque. Ele queria que os brinquedos a 27,5%. filmes, como Mansão
provocassem o mesmo sentimento de Mal-Assombrada, Tomor-
assistir a um filme. Para isso, deslocou rowland e Piratas do Caribe).
vários de seus artistas mais talentosos Mas Walt queria mais.
para a nova empreitada. Em Anaheim, o cresci-
A Disneyland custou US$ 193 mi- mento da cidade impedia
lhões, em valores de hoje. Uma parte saiu a expansão do parque, en-
de um acordo com a rede de TV ABC, tão o jeito foi achar outro
que financiou parte do projeto em troca lugar. Nos anos 1960, a
de um programa para sua grade. A série, empresa comprou, em
apresentada pelo próprio Walt, mostrava segredo, várias porções de

56 super setembro 2023


terras na região central da
Flórida. O clima tropical
e os preços baixos foram
chamarizes, mas não só:
o governo local abraçou a
ideia, mirando no aumento
de empregos e do turismo.
Em 1967, a Disney conse-
guiu transformar seu lo-
teamento de 131 km² (uma
Zona Oeste de São Paulo)
em um “distrito especial”,
no qual um conselho tem
autonomia para regular a
construção de prédios, es-
tradas, rede de esgoto… a
lei permitia até a instalação
de uma usina nuclear, caso
Walt quisesse.
Ele não quis, mas
seus planos não eram
menos ousados. Além
de parques, Walt deseja-
va construir uma cidade
futurista, à la Jetsons. Um
município para valer, com
gente trabalhando e mo-
rando. Chamou-a de “Co-
munidade Protótipo Ex-
perimental do Amanhã”
(EPCOT, em inglês). Mas
ele não viveu para termi-
nar o projeto. Morreu em
1966, aos 65 anos, de cân-
cer no pulmão – era um
fumante voraz.
Entre as décadas
de 1970 e 1980,
o departamento
de animação foi
deixado de lado.
CLUBE DE REVISTAS
Roy, então, assumiu Em 1983, os parques
as rédeas da empresa. E representavam 80% do
o Magic Kingdom abriu faturamento da empresa.
em 1º de outubro de 1971. O departamento de ani-
O irmão de Walt morre- mação tinha sido deixado
ria dois meses depois. de lado. Mau negócio. A
Os novos presidentes falta de sintonia entre
mantiveram o foco nos artistas mais velhos e a
parques, que se conso- nova geração do estúdio,
lidariam como o maior aliado ao desinteresse
ganha-pão da Disney. da companhia, levaram
A ideia original do a Disney a uma safra de
EPCOT nunca saiu do desenhos com críticas e
papel. Mas foi adaptada bilheterias insatisfatórias.
para um misto de parque Roy E. Disney, filho do
com centro educacional outro Roy, convenceu o
que abriu ao lado do Ma- conselho da empresa a
gic Kingdom, em 1982. No demitir o então CEO,
ano seguinte, veio a Tokyo Ron Miller, e ir atrás de
Disneyland, o primeiro alguém que pudesse ajei-
dos quatro complexos da tar a casa do Mickey.
empresa fora dos EUA (os Roy chamou Michael
demais, hoje, estão em Pa- Eisner, chefão da Para-
ris, Xangai e Hong Kong). mount, e Frank Wells,
da Warner – era a pri-
As trevas – e o meira vez que gente sem
Renascimento nenhuma relação com a
Walt costumava dizer que companhia assumia o
o segredo da Disney era comando. Eisner trouxe
o seguinte: cada pilar da consigo o produtor Jef-
companhia ajudava a sus- frey Katzenberg para di-
tentar o outro. Desenhos rigir a divisão de filmes.
eram combustíveis para Juntos, bolaram um plano
os parques, e vice-versa. ambicioso: lançar uma
Esse sistema, porém, es- animação por ano, entre
tava desbalanceado. projetos em andamento
e novas ideias.
O número de artistas
subiu de 150 para 550. No
final dos anos 1980, eles
aprenderam a operar um
novo sistema para colo-
rir as animações digital-
mente. O software era
de um pequeno estúdio,
que fazia comerciais da
Listerine para pagar as
contas: a Pixar.
O primeiro exemplo
sólido de toda essa mu-
dança foi A Pequena Sereia
(1989). A Bela e a Fera, que
saiu dois anos depois, tor-
nou-se a primeira anima-
ção indicada ao Oscar de
Melhor Filme. Começava
o chamado “Renascimen-
to Disney”, um sopro de
novidade a uma empresa
setembro 2023 super 57

já septuagenária, que
incluiu também Aladdin
(1992) e O Rei Leão (1994),
entre outros.
A guinada não se res-
tringiu às animações. Eis-
ner e Wells investiram em
melhorias nos parques (e
construíram outros). Er-
gueram hotéis e centros
de compras. Abriram edi-
toras de livros e compra-
ram um time de hóquei.
Entre 1984 e 1994, o va-
lor de mercado da Disney
saltou de US$ 2 bilhões
para US$ 22 bi. Tio Pa-
tinhas ficaria orgulhoso.
Em 1995, a Disney en-
trou de cabeça no mercado
CLUBE DE REVISTAS
televisivo. Em um acordo de US$ 19 bi-
lhões, comprou a ABC (na época, o se-
gundo maior canal aberto dos EUA), 80%
da ESPN, mais uma porção de canais a
cabo. Fazia sentido: nos anos 1990, mais
de 60% das casas americanas tinham al-
gum tipo de pacote de assinatura (mais
tarde, a divisão de TV superaria a de
parques e se tornaria a maior fatia de
faturamento da Disney).
Nos bastidores, porém, a coisa era
conturbada. Funcionários dormiam
no escritório e desenvolveram pro-
blemas de saúde para cumprir os
prazos apertados. Além disso, Roy,
Eisner e Katzenberg trocavam farpas
sobre quem era o verdadeiro respon-
sável pela bonança. A situação entre
os executivos se tornou insustentá-
vel, e Katzenberg deixou a empresa

O tamanho do castelo
Em um ano e meio, a Disney perdeu 58% de valor de mercado. Veja a evolução no gráfico:
VALOR
(em bilhões de US$) 10/03/2021
US$ 357,1 bi
$300 BI

$200 BI

04/09/2023
$100 BI
US$ 149,4 bi

2001 2005 2010 2015 2020 SET

2023

De onde vem a grana

Em 2022, a Disney faturou US$ 83,7 Somando as suas três ESPN+
25,2
bilhões. Veja a fatia correspondente principais plataformas de milhões
a cada setor da companhia: streaming, a Disney tem

Canais de TV Streaming
219,9 MILHÕES
HULU
48,3
milhões

33,8% de assinantes. DISNEY+

23% Só fica atrás da Netflix, 146,1
milhões
que tem 238 milhões.
Produtos
(próprios e 6,2% Mesmo assim, o segmento de streaming
licenciados) Filmes e ainda opera no vermelho: em 2022, deu
outros
9,5% conteúdos prejuízo de
Parques**
27,5% originais* US$
4 bilhões.
*Inclui a bilheteria dos cinemas, a venda de Blu-Ray, o licenciamento de filmes e programas para TV, a distribuição de música e até pe-
ças da Broadway. **Inclui a venda de ingressos, os hotéis, os cruzeiros e todos os produtos e alimentos comercializados nestes locais.
Fonte: Relatório Anual da Disney (2022).

para fundar o próprio
estúdio de animação:
a Dreamworks.
Bobeou, comprou
Nos anos 2000, uma su-
cessão de gastos de Eis-
US$
ner que não deram em
nada irritaram o conselho
da empresa. Roy Disney,
que divergia fortemente
das opiniões do CEO,
afastou-se da companhia
em 2003. Mas não sem
antes iniciar uma campa-
86,7bilhões.
nha na internet pedindo
a saída do desafeto. Deu
gastou, no
certo: os investidores total, para
pressionaram e Eisner
renunciou em 2005.
O novo chefe, Bob
Iger, que veio da divi- Lucasfilm e
são de TV, deu início
a um a m a ra ton a de
aquisições. Você deve
se lembrar. Em 2006, a
Disney pagou US$ 7,4
bilhões pela Pixar, com
quem tinha uma parceria
CLUBE DE REVISTAS
na distribuição de filmes. Em 2009,
foi a vez da Marvel, por US$ 4 bi; em
2012, a Lucasfilm (Star Wars, Indiana
Jones), pelo mesmo valor. Em 2019,
concluiu a compra da 21st Century
Fox por US$ 71,3 bi e virou dona de
dezenas de franquias, de Avatar a Es-
queceram de Mim.
O arsenal titânico de filmes, séries e
personagens fez com que todos aguar-
dassem com atenção o lançamento da
plataforma de streaming do grupo. E
o Disney+ estrearia em 2019 nos EUA
com uma assinatura mais barata que a
da Netflix e a promessa de conteúdo
É quanto original constante.
a Disney Iger ficou conhecido como o “Rei de
Hollywood” e se aposentou no início
comprar de 2020. Deu lugar a Bob Chapek, um
a Pixar, a executivo do setor de parques. Mas
Marvel, a ele deu azar. Pouco tempo depois, a
pandemia fechou cinemas e todos os
a Fox.
resorts da empresa. O Disney+ segu-
rou as pontas: atingiu 100 milhões de
assinantes em 16 meses e manteve o
valor da companhia no alto.
Em 2022, o caldo engrossou. A pro-
messa de lucro do Disney+ não veio,
e vários dos últimos lançamentos da
empresa tiveram re-
cepções mornas (você
assistiu a Lightyear? Ou
ao novo Pinóquio?). Cha-
pek acabou demitido – e
o antigo CEO voltou
ao comando.
E agora?
A crise da Disney é mais
um reflexo das mudanças
no show-biz. O compor-
tamento do espectador
mudou. Em 2022, a ocu-
pação das salas de cinema
nos EUA atingiu só 65%
dos níveis pré-Covid. O
público da televisão tam-
bém caiu: por lá, os canais
tradicionais já represen-
tam menos da metade da
audiência de TV (o stre-
aming domina as telas).
Péssimo negócio para
uma empresa que tinha
apostado forte na TV,
aberta e a cabo. Até ho-
je os canais são a maior
fonte de faturamento da
Disney – daí a queda nas
ações. O streaming? Bom,
segue um mistério – e um
ralo de dinheiro. Platafor-
mas como Amazon Prime
Video e Apple TV+ têm
big techs por trás e não se
importam em torrar bi-
lhões sem expectativa de
retorno no curto prazo.
A Disney, que depende
exclusivamente de con-
teúdo, não se pode dar
esse luxo. A exemplo
da Netflix, o Disney+
aumentou a sua mensa-
lidade, criou pacotes com
anúncios e vai lutar con-
tra o compartilhamento
de senhas. Tudo para ver
se sobra um cascalho no
fim do mês.
A Disney começa o seu
segundo século tendo de
reaprender a navegar no
mundo do entretenimen-
to, que ela mesma ajudou
a criar. Resta saber se essa
história vai terminar com
fogos de artifício. S
setembro 2023 super 59
 CLUBE DE REVISTAS

oráculo ILUSTRAÇÕES MALU MENEZES DESIGN CRISTIELLE LUISE

40
pessoas foram salvas nos Alpes
pelo cão Barry (1800–1814), um
São Bernardo. Ele é ilustrado carre-
gando um barril de conhaque para
aquecê-las, mas não carregava
um, na verdade. 1

Esse fogo é ilusão. Acontece o seguinte:

nossos receptores de calor ficam na pele. O

por que
álcool dilata os vasos sanguíneos do corpo e
faz mais sangue chegar à pele. Essas termi-
nações nervosas registram o calorzinho extra
do sangue e seu cérebro acha que está quente.
Mas é cilada, Bino: a pele mais quente acelera
a transpiração e a troca de calor com o ar, e a

beber álcool
temperatura corporal cai. Para se manter aque-
cido, um corpo sóbrio faz o contrário: contrai
os vasos da pele e direciona o sangue para os
órgãos internos, preservando a temperatura de
sistemas vitais. “Oráculo, e por que a bebida

esquenta?
‘rasga’ a garganta?” Nossos receptores de calor
usam a proteína TRPV1, ativada em tempera-
turas a partir de 43ºC. A cana (como a pimenta)
abaixa o sarrafo da TRPV1, que passa a apitar
com 34ºC. O “rasgo”, então, é só a sua goela
@solrac_hayd, via Instagram se tornando sensível aos 37ºC do corpo. 2
 CLUBE DE REVISTAS
EDIÇÃO BRUNO VAIANO E MARIA CLARA ROSSINI

a palavra “lavanderia” tem alguma coisa

a ver com a flor de lavanda?
@mathcurti, via Instagram

Tem. A raiz leue- (“raiz” é a parte no comecinho da palavra que fica igual em todas as
suas variações) já se referia ao ato de tirar sujeira das coisas na Europa pré-histórica
de 5 mil anos atrás, e deu origem à raiz lav- em latim, que então desembocou em
“lavar”, “lavanderia”, “lavabo” e afins em português. Quando os romanos começaram
a usar óleo de lavanda para perfurmar roupas lavadas, a flor ganhou seu nome.
Outras palavras que vêm de leue- são “dilúvio” e “diluir”, que ganham o dis- antes.
Essa partícula remete à noção de distância (algo que fica óbvio na própria palavra
“distância”) e, junto de leue-, significa usar água para levar algo para longe. Por fim,
existe a palavra “aluvião”, nome que se dá à terra, argila e cascalho carregados pela
água corrente de um rio, que vão se acumulando. A partícula a- antes do lu- significa
“para”, “com a finalidade de”. Ou seja, o sedimento seria algo “para lavar”. 3

PÁ PUM Por que as colas não secam dentro É verdade que cavalo não vomita?
da embalagem? @mathcurti, via Instagram
@viniciusrochaa, via Instagram
Sim. A musculatura na junção entre o estô-
A cola branca escolar é formada por mago e o esôfago do cavalo é muito forte, e
Por que a caixa- longas cadeias de moléculas, chamadas o ângulo em que os dois órgãos se conectam
-preta dos aviões polímeros, dissolvidas em água. Quando não permite que a comida volte. Caso o animal
é laranja? a cola sai do tubo, a água evapora. Os precise muito vomitar – o que pode ocorrer
Ian Nolasco, polímeros, antes dispersos no solvente, por excesso de comida no estômago ou várias
via e-mail emaranham-se em uma rede e formam outras complicações de saúde –, a parede
aquela película semitransparente (que gástrica pode se romper, e o animal morre. Por
Para que fique mais
atire a primeira pedra o aluno entedia- causa dessa limitação anatômica, o cavalo não
fácil encontrá-la em
meio aos destroços. do que nunca cobriu os dedos de cola só não consegue como não sabe vomitar. Ele
branca e esperou secar para, depois, não sente enjoo, porque a parte do sistema
NÚMERO INCRÍVEL puxar a casquinha). Não é à toa que nervoso central que desencadeia a sensação

3g
você sopra ou abana a cola para fazê-la e o mecanismo do vômito não existe. “É por
secar mais rápido – funciona mesmo. Já isso que, em casos de dor abdominal no cavalo
as supercolas de cianoacrilato, como a (que chamamos de cólica), é tão importante
Super Bonder, funcionam ao contrário: é passar uma sonda nasogástrica – um tubo que
da cola mais forte do o vapor d’água presente no ar que endu- colocamos no nariz do animal e chega até o
mundo, da marca Delo, rece a substância. Por isso é importante estômago para esvaziá-lo”, diz Carla Bargi
erguem um caminhão manter o tubinho guardado em um Belli, professora da Faculdade de Medicina
de 17,5 toneladas. 4 ambiente seco. Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP.

OUTRO DADO
RELEVANTE SEM
NENHUMA LIGAÇÃO Porque a seleção natural programou o dito-cujo para reagir a sons
Por que o gato vem

3g
quando fazemos agudos. Os roedores se comunicam usando frequências mais altas, e os
“pspspsps”? gatos aprenderam a identificá-las como um chamado para o almoço (Tom
@gabrielpelaquin, e Jerry não é ficção, afinal). A audição felina é sensível a sons que vão até
via Instagram 85 kHz – enquanto nós, humanos, só ouvimos até 20 kHz. O que chama
é o peso do beija-flor- a atenção dos bichanos são os sons semelhantes ao assobio, presente
-de-garganta-preta na letra “s”. Cada país tem sua própria onomatopeia para chamar seus
(Archilochus alexandri), Frajolas, e todas são sibilantes. Na Suécia e Rússia, os felinos respondem
de 3,25 cm. 5 a ksksks. Na Hungria, tststs. Alemanha, mismismis. 6

Reportagem Alexandre Versignassi, Bruno Vaiano, Caio Cesar Pereira, Leonardo Caparroz, Maria Clara Rossini, Rafael Battaglia. Fontes Museu de História Natural de Berna;
artigo “The claim: drinking makes you warmer in winter”, do New York Times; vídeo “Does alcohol really keep you warm?”, do SciShow; blog Origem da Palavra, Online
Etymology Dictionary; Guinness World Records; catálogo humingbirds.net; artigo “Hearing range of the domestic cat”. SETEMBRo 2023 super 61
 CLUBE DE REVISTAS
oráculo

coMo o universo se expande

Mais rápido que a luz?
@viniciusrochaa, via Instagram

O limite de velocidade do cosmos se aplica ao movimento das coisas no espaço,

e não ao espaço em si. Como sabemos disso? Imagine que o Universo é um paneto-
ne no forno, e as galáxias são as uvas passas. Conforme o panetone cresce, todas
as uvas se afastam de todas as uvas. E a taxa de afastamento muda conforme a
uva. Se o panetone dobrar de tamanho, duas uvas que estavam a 5 cm de distância
vão ficar a 10 cm. E duas que estavam a 10 cm vão ficar a 20 cm. Do ponto de vista
de uma uva qualquer, as mais próximas se afastam mais devagar – e as distantes,
mais rápido. Se o panetone levar 20 minutos para dobrar de tamanho, a uva a 10
cm se afastou a 2 cm por minuto. Já a uva passa que estava a 5 cm se afastou a só 1
cm por minuto. Se o panetone fosse do tamanho da Terra, uvas na China e nos EUA
se afastariam a milhares de quilômetros por minuto. No Universo, com distâncias
na casa dos bilhões de anos-luz, as galáxias mais distantes de nós se afastam a
velocidades maiores que a da luz. É possível determinar a velocidade exata pelo
grau em que o afastamento “estica” a luz delas no caminho até os telescópios, um
fenômeno denominado redshift (“desvio para o vermelho”, porque a luz vermelha
tem as ondas mais longas de todas as cores). 1

Qual é a origem da palavra restaurante? Como evitam que

Tem a ver com “restaurar”? tubarões em grandes
aquários não comam
LISTA
Sim. Hoje associamos os restaurantes à comida, mas no os outros peixes? Qual a cidade
século 18 eles eram uma espécie de hospital ou posto de @icafreitas, com o nome mais
saúde. Em Paris, pouco antes de as cabeças começarem a via Instagram longo do Brasil?
rolar durante a Revolução Francesa, espalharam-se pela
cidade alguns locais onde as pessoas iam para se recuperar Tubarões bem alimenta-
de doenças, machucados ou simplesmente descansar dos não atacam colegas.
após um dia de trabalho exaustivo. Esses lugares (às Na natureza, eles passam Haja espaço nos documentos
dos vilabelenses para encaixar o
vezes também chamados casas de saúde) serviam um vários dias ou semanas sem nome de seu município.
caldo feito com carne e ovo para restaurar as forças das comer; já nos aquários, os
pessoas. Restaurant, do francês restaurador, era o nome tubarões são mimados com VILA BELA DA SANTÍS�
da tal sopa milagrosa. três refeições semanais. Ma- 1 sima trindade (mt)
Não sabemos ao certo quando essas casas passaram a tar mais do que o necessário 32 caracteres
oferecer outros alimentos, aproximando-se mais dos para a sobrevivência é um são Francisco de
restaurantes como a gente conhece. O fato é que estabele- comportamento chamado 2 assis do piauí (pi)
cimentos que vendem comida existem desde a antiguidade, overkill, observado em orcas, 31 caracteres
com relatos do Egito, Grécia e Roma antigos. Mas a palavra lobos, hienas… mas não em
“restaurante”, de qualquer forma, é obra francesa. tubarões. Afinal, ir atrás de são sebastião da
3 Vargem alegre (mg)
uma presa requer energia,
30 caracteres
e o tubarão cativo não
tem motivo para gastá-la. são sebastião de
perGunte Mas, se algum peixe estiver
soltando sangue, o instinto
4 lagoa de roça (pb)
30 caracteres

ao oráculo de caça do tubarão pode

ser estimulado. Por isso, é 5
são josé do Vale
Escreva para do rio preto (rj)
bruno.vaiano@abril.com.br importante que todos os 29 caracteres
mencionando sua cidade e animais do aquário estejam
estado – ou mande a pergunta
via direct no Instagram. saudáveis. 2

62 super SETEMBRO 2023

 12
112
237
CLUBE DE REVISTAS
390

É muito Você nem imagina. Entre 2014 e 2020,

SÓ ACREDITO comum uma
mais de 2 mil criptomoedas desaparece-
ram – seja por falta de volume de negocia-
VENDO criptomoeda
ção, seja porque eram um golpe disfarçado,
seja por não encontrarem compradores
suficientes ao serem lançadas. Veja o
“falir”? número anual de defuntos:
Bráulio jorge Menezes,
via e-mail 2
2
6 51
5
46 73
20 2
71 203
277 1
169
27 5
223 4
22
152 0
2
9 2
8
19 2
23
77 36
0 50
34
0
0
9

2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 2022

LAUDO DAS MORTES

Abandonadas por falta Eram golpes Natimortas: não encon- Eram uma piada
de volume de negociação (como esquemas traram compradores sufi- ou sátira.
(ou outras causas). de pirâmide). cientes no lançamento.

Fonte: Visual Capitalist, com dados da Coinkickoff

Para que existem as guitarras com dois braços?

Maria Clara Rossini, repórter da Super

Geralmente, o objetivo é alternar entre um braço com 6 cordas

(uma guitarra comum) e um com 12 cordas (uma guitarra com cordas
duplicadas, que produzem um som mais brilhante). Muitas canções Geddy Lee, do Chris Squire, do Robbie Robertson,
usam uma guitarra de 12 e uma de 6 na gravação original. Na hora Rush, usava um ins- Yes, tinha um baixo da The Band, tem a
trumento com um de três braços: um Gibson EMS-1235, uma
do show, é prático usar um instrumento dois-em-um para alternar
braço de guitarra (6 comum, um com 3 guitarra com man-
entre elas. Jimmy Page do Led Zeppelin fazia isso para tocar Stairway to cordas agudas) e um cordas duplicadas e dolim (um pequeno
Heaven ao vivo. Há outras configurações possíveis para instrumentos de baixo (4 cordas um que simula um instrumento agudo
de dois braços. Conheça algumas ao lado. mais graves). baixo acústico. de 4 cordas duplas).

Fontes: livro-texto Astronomia: uma visão geral do Universo, da Edusp; Bianca Rangel, doutora em fisiologia geral pelo Instituto de Biociências da USP.

SETEMBRO 2023 super 63

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oráculo

Por que a inflação na É verdade que a picanha é

Argentina é tão extrema?
@rafaelb04, via Instagram
Porque o governo imprime
dinheiro para pagar suas pró-
prias contas – algo vetado em
economias sérias (como a nos-
sa). Aqui, o governo faz dívida
via títulos públicos para com-
plementar a arrecadação de
impostos. Aí pagam ou quando
a grana dos impostos supera as
despesas (superávit primário)
ou fazendo dívidas novas (a
juros menores que os de antes,
quando tudo vai bem). Na Ar-
gentina, é diferente. Existe um
título público chamado Leliq
(Letra de Liquidez). E quem
paga os juros e amortizações da
coisa é o Banco Central – não
com a grana de impostos ou
uma invenção brasileira?
@ricabattaglia, via
Instagram
A ideia de assá-la na brasa
é brasileira, mas o corte já era
tradicional na Europa. A histó-
ria mais difundida diz que, nos
anos 1950, o húngaro Lazlo
Wessel (1916–1997) vendia
o corte em seu açougue no
bairro paulistano do Bixiga
para imigrantes alemães que
trabalhavam na Volkswagen. O
comum no Brasil, nessa época,
era vender a picanha junto à
peça de alcatra (que é um naco
grande e engloba outros cortes,
como a maminha). Mas os ale-
mães já sabiam pedi-la isolada
para fazer tafelspitz – um prato
cozido temperado com maçã

átoMo faz soMbra?

de novas dívidas, mas emitindo e raiz-forte. Nós gostamos da
dinheiro novo. Isso causa uma ideia e fizemos à nossa manei-
enxurrada de pesos na praça. E ra: a churrascaria paulistana
@jvcalderaro, via Instagram a moeda perde valor. Por conta Dinho diz ser a primeira a pre-
disso, a inflação por lá está ao parar e servir o churrasco de
não. Nós só conseguimos ver algo quando ondas eletromag-
néticas (luz) batem em um objeto e são refletidas na direção
norte dos 100% ao ano. picanha, em 1973. 2
dos nossos olhos. A sombra, por sua vez, é uma região em
que chegam menos ondas porque a passagem está bloqueada.
Um átomo individual é menor do que o comprimento de onda
da luz visível. Por isso, a luz o atravessa sem sofrer qualquer
interferência — de modo que ele não faz sombra nem é pos- LOST IN
sível vê-lo. Em um sentido amplo da palavra “ver”, porém, a
coisa é diferente. Existe uma técnica chamada pticografia TRANSLATION
que permite fotografar átomos individuais disparando um Origem Coreia Eomma chinguui adeul
feixe de bilhões de elétrons contra eles. Por meio do desvio
na trajetória dessas partículas, é possível inferir a forma do
átomo atingido. O computador precisa traduzir a rota dos
elétrons em imagens. Essa técnica, em teoria, produz sombra, Ao pé da letra, “filho da amiga da minha mãe”. Refere-se a uma
porque há uma área atrás dos átomos em que os elétrons não pessoa perfeitinha, com faculdade e emprego bons, à qual sua
família fica te comparando de maneira incômoda.
conseguem chegar. 1

Olívia Palito Thimble Theater

CONEXÕES A personagem foi criada por
E. C. Segar em 1919 – dez
Uma série de tirinhas di-
ária no New York Journal.
De Olívia Palito
a Olivia Rodrigo anos antes do Popeye. Olívia Popeye apareceu como
por Maria Clara debutou nas tirinhas de jornal coadjuvante em 1929,
Rossini como noiva de Ham Gravy, mas logo ganhou prota-
um malandro preguiçoso que gonismo. Seu primeiro
tenta ganhar dinheiro rápido. filme live-action, de 1980,
Eles foram os primeiros perso- era intitulado apenas…
nagens do…

64 super SETEMBRO 2023


MANUAL Como fazer as suas
por Rafael
Battaglia
3. NO ARMÁRIO
Opte por cabides grossos,
como os de madeira. Os fi-
nos deformam as peças. O
que você pouco usa (como
paletós e vestidos) devem
ficar em sacos de TNT, e
não de plástico (a roupa
precisa “respirar”). Duas
vezes por ano, esvazie
o armário e desinfete o
interior com um pano
e um pouco de vinagre
(se o seu guarda-roupas
acumula umidade, faça
isso a cada dois meses).
para saber Mais
Não exagere no amaciante. Com
toalhas, use metade da quantidade
recomendada – e só depois da quin-
ta lavagem, para que mantenham
a capacidade de absorção.
Popeye (1980)
Nesta comédia musical, o
marinheiro é interpretado por
Robin Williams. Combinar um
personagem querido e um
ator carismático parecia
sucesso na certa, mas o longa
flopou. Para a distribuição do
filme, o estúdio fez uma
parceria com a…
Fontes textos “On seeing atoms” da Universidade da Dakota do Norte; “See the highest-resolution atomic image ever
captured”, da Scientific American; artigo “Picanha: do Brasil para o mundo”, da revista Problemas Brasileiros.
CLUBE DE REVISTAS
roupas durarem mais
1. NA MÁQUINA 2. NA SECAGEM
Evite misturar tecidos Vire roupas coloridas e jeans
– o atrito dos grossos do avesso e deixe-as na
com os mais finos pode sombra, para não desbotar.
formar aquelas bolinhas As brancas podem pegar
indesejadas. Feche zí- sol (mas recolha assim
peres e botões para que que ficarem prontas, o
eles não se enrosquem que preserva as fibras). Para
em outras peças. Deixe evitar peças deformadas,
as roupas coloridas de dobre as camisetas ao
molho por 15 minutos meio no varal; para calças
e lave-as em água fria, e bermudas, use ao menos
viradas do avesso. As três prendedores, de modo
brancas pedem mais que elas fiquem retas. Com
molho (de uma a duas camisas e jaquetas, ponha
horas) e água quente. para secar já no cabide.
4. CUIDADO ESPECIAL
Suéteres e roupas de lã
deformam facilmente. Por
isso, não seque esse tipo
de roupa no varal – mas
sim numa superfície plana,
apoiada numa toalha. No
armário, não pendure –
dobre. Com jeans, o lance
é lavar o menos possível,
para não desbotar. Adie
a ida à máquina deixando
as peças respirarem e lim-
pando sujeiras pontuais.
Se não tiver jeito, lave-as
viradas do avesso.
Parece novo
Cheque as instruções da etiqueta Para remover bolinhas de tecido, Peças delicadas vão em sacos
de cada peça e confie nos modos não use lâminas de barbear. Opte protetores para protegê-las do
de lavagem da sua máquina. Use-a por aparelhos “papa-bolinhas” (cus- atrito na máquina. Com roupas
com ⅔ da capacidade. Lotá-la pode tam a partir de R$ 30). Ou improvise de cama, sacuda antes de pôr para
prejudicar a performance. com um bolo de fita crepe. lavar para se livrar de pelos e cabelo.
Fonte: Fernando ricci, criador da página “roupa suja se lava na máquina” (@lavadorasderoupas_oficial)
Disney Olivia Rodrigo
Os musicais são marca A cantora de 20 anos,
registrada da empresa. A famosa pelo hit “Driver’s
Disney provou que o estilo Licence”, começou na série
continua dando certo nos de High School Musical
anos 2000 com o filme como a personagem Nini.
High School Musical e a série O programa foi ao ar em
spin-off High School Musical: 2019, exatos cem anos
The Musical: The Series, a após o nascimento de
produção que estourou… Olívia Palito.
setembro 2023 super 65
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ÚLTIMA PÁGINA DESCULPA QUALQUER COISA E ATÉ LOGO

Um único post patrocinado no feed do Cristiano Ronaldo custa quase R$ 12 milhões*. Es-

Instagramável sa é a estimativa do site Hopperhq.com, um serviço que administra contas do Instagram.

Veja quanto as empresas desembolsam se quiserem aparecer na conta de Kylie Jenner,
Beyoncé, Neymar e outras celebridades. Infográfico Luana Pillmann e Maria Clara Rossini

Ranking
considerando 0,04 0,03 0,02
o preço por NICHO Atletas Artistas Socialites VALOR/SEGUIDOR (R$)
Valor de seguidor
um post

r$ 11.93 9.457 r $ 9.1 4 0.1 3 5 r $ 8. 851. 2 37 r $ 8. 64 2 . 035 r $ 8. 532.453

13º 8º 18º 14º 15º

@cristiano @kyliejenner @leomessi @selenagomez @therock

442 M 33 8 M 3 28 M 32 0M 316M

Nº de seguidores
r$ 8 .41 2 .90 9 r $ 8.4 0 2. 947 r $ 6.93 8. 533 r $ 6. 574 . 92 0 r $ 6 .4 25.49 0

5º 11º 16º 6º 17º

@kimkardashian @arianagrande @beyonce @khloekardashian @kendalljenner

31 1 M 31 1 M 2 57 M 24 3M 2 38M

r $ 6 .38 0. 66 1 r$ 5 .6 88 .3 02 r $ 5. 6 2 8.5 30 r $ 5.419.3 2 8 r $ 5.13 5.41 1

9º 3º 4º 2º 12º

@justinbieber @taylorswift @jlo @virat.kohli @nickiminaj

236M 21 0 M 20 8M 2 00 M 190M

r$ 4 . 801 .6 84 r $ 4 .707.0 4 5 r $ 4 . 622 . 36 8 r $ 5.12 5 .4 4 9 r $ 3. 885.1 80

20º 7º 10º 1º 19º

@kourtneykardash @neymar @mileycyrus @katyperry @kevinhart4real
1 78 M 174M 171M 16 3M 144 M

À moda indiana Keeping up with Instagram Menino Ney

Entre os nomes acima, você talvez não
conheça Virat Kohli, um jogador de críquete
indiano. O esporte é extremamente popular
na Índia – o que explica seus 200 milhões
de seguidores.
As únicas contas que não pertencem
a atletas ou artistas são as da família
Kardashian-Jenner. Após estrelarem
seu próprio reality show, as socialites
construíram um império multimilionário.
Neymar é um dos poucos não americanos na
lista. Apesar de receber menos que Cristiano
Ronaldo por post, seu ""preço" por seguidor
é maior: cada um deles vale R$ 0,02705,
comparado aos R$ 0,02701 do CR7.

* Cotação do dólar no dia 21 de agosto. As estimativas são do site Hopperhq.

66 super setembro 2023 com, com base em dados de setembro de 2022.
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