Você está na página 1de 4

Componentes celulares do sistema nervoso

3ª aula

1.2 CONDUÇÃO DO IMPULSO NERVOSO

1.2.1 TRANSMISSÃO DO SINAL ELÉCTRICO


Um típico neurónio motor tem o seu pericário ou soma alojado na medula espinal e
transporte sinais às fibras de um músculo esquelético ilustra as características estruturais
e funcionais que caracterizam a maioria dos neurónios (Figura 1.4).
A membrana citoplasmática dos
dendritos do neurónio motor e do
pericário recebe sinais de (ou é
inervada pelos) terminais de outros
neurónios. O cone de implantação
ou cone axónico integra os sinais de
entrada de muitos neurónios e
determina se o neurónio iniciará o
seu próprio sinal, chamado um
potencial de acção ou PA. Num
potencial de acção, a tensão através
da membrana citoplasmática eleva-
se rapidamente e depois baixa, assim
o PA é às vezes chamado impulso
nervoso. O axónio carrega um PA
desde o seu ponto da origem no cone
axónico até aos terminais do axónio
ou telodendro que transmitem o

Figura 1.4 Um neurónio motor exemplifica as regiões sinal a outras células. No caso dos
funcionalmente especializadas de um neurónio típico. neurónios motores, o sinal viaja
O influxo nervoso é indicado pelas setas pequenas. O
impulso é recebido e integrado na membrana através dos terminais do axónio até
citoplasmática dos dendritos. Nalguns neurónios, como
este, o pericário (ou soma) recebe também o impulso e às fibras de um músculo esquelético.
contribui para a integração do sinal eléctrico. Os
potenciais de acção são iniciados (spike-initiation) no Na maioria dos neurónios, a zona de
cone axónico (axon hillock) e viajam então ao longo do
axónio até ao telodendro nos botões terminais do ignição do sinal (spike-initiation)
axónio, onde um neurotransmissor químico é libertado situa-se no cone axónico, embora,
para espoletar o sinal electroquímico na outra célula
seguinte. O axónio e as células gliais circunvizinhas da por vezes, possa encontrar-se noutra
bainha de mielina estão ilustrados na secção
longitudinal neste diagrama.
Apontamentos de BIOLOGIA NEURO-ENDÓCRINA 11
Componentes celulares do sistema nervoso

parte. Muito do comportamento fisiológico de um neurónio depende das propriedades


eléctricas passivas, tais como a capacidade e a resistência; assim sendo, a célula
nervosa tem muito em comum com os fios ou outros condutores eléctricos.

1.2.2. FLUXO AXOPLASMÁTICO


Ao contrário dos fios eléctricos, os neurónios possuem também propriedades eléctricas
activas que permitem que conduzam sinais eléctricos sem decréscimo (isto é sem
nenhuma perda da força do sinal). A transmissão eléctrica activa dos sinais pelos
neurónios e por outras células excitáveis depende da presença de proteínas específicas
chamadas de canais iónicos que estão presentes na membrana citoplasmática. Assim, o
interior do axónio é palco de transportes centrífugos (transporte anterógrado) e
centrípetos (transportes retrógrado) que se efectuam entre o pericário e os botões
terminais e vice-versa. Estes canais iónicos permitem que os iões se movam ao longo da
membrana citoplasmática de uma maneira regulada. Esses transportes recebem a
designação genérica de fluxo axoplasmático e são determinantes para o abastecimento
das sinapses, de moléculas intervenientes no processo de neurotransmissão, sintetizadas
ao nível do pericário, e também da reciclagem de produtos endocitados ao nível das
sinapses.

O transporte anterógrado envolve os feixes de neurotúbulos e pode ser rápido (400


mm/dia) ou lento (0,5 a 10 mm/dia). O transporte retrógrado processa-se igualmente ao
longo dos neurotúbulos com uma velocidade de 200 mm/dia.

1.2.3. POLARIZAÇÃO DA MEMBRANA


O funcionamento específico dos neurónios decorre das propriedades particulares da
membrana citoplasmática. Ao longo do axónio, a membrana tem por função a propagação
dos impulsos eléctricos. Na extremidade axonal, a membrana liberta neurotransmissores
ou assegura, através de junções hiato, a propagação da onda de despolarização.

Apontamentos de BIOLOGIA NEURO-ENDÓCRINA 12


Componentes celulares do sistema nervoso

Figura 1.5 Os canais iónicos (ou bombas) de sódio /potássio transportam activamente os iões de sódio
(Na+) para fora (meio extracelular) e os iões de potássio (K+) para dentro (meio intracelular ou citoplasma –
cytosol), respectivamente, contrariando os gradientes electroquímicos normalmente vigentes; há um gasto
de energia de uma molécula de ATP consumida por cada 3 Na+ que saem e 2 K+ que entram

Como todas as células, o neurónio é capaz de manter, no seu interior, uma composição
francamente diferente da do meio exterior. Os neurónios possuem vários tipos de canais
iónicos, em que cada um deles permite apenas a passagem de determinados tipos de
iões particulares. Assim sendo, os canais iónicos encontrados nos neurónios não estão
distribuídos uniformemente sobre a superfície da célula, mas sim estão localizados
preferivelmente nas regiões que tem funções de sinal especializadas. A diferença iónica
intra e extra-celular no neurónio é particularmente evidente no que respeita às
concentrações em iões sódio (Na+) e potássio (K+). (Figura 1.5) O meio exterior
(extracelular) é cerca de dez vezes mais rico em sódio que o interior (citoplasma); este,
pelo contrário é aproximadamente dez vezes mais rico em potássio que o exterior. Nestas
condições, em virtude das diferenças dos potenciais electroquímicos, o sódio e o potássio
tendem ambos a passar através de canais iónicos da membrana (canais não
controlados). No entanto, a membrana do axónio, por exemplo, é especializada na
condução do PA em virtude dos canais iónicos de acção rápida, chamados
apropriadamente de bombas de sódio-potássio, as quais permitem selectivamente que
Na+ e K+ cruzem a membrana (Figura 1.5). Além disso, a membrana citoplasmática dos

Apontamentos de BIOLOGIA NEURO-ENDÓCRINA 13


Componentes celulares do sistema nervoso

terminais do axónio contém bombas de cálcio Ca2+ e as outras especializações que


permitem que os neurónios transmitam sinais às outras células quando o PA invade os
botões terminais. Todavia, para que a diferença iónica se mantenha, é necessário que
estes iões sejam constantemente bombeados, permutando os iões sódio que entram,
pelos iões potássio, que saem. Este bombeamento constante é assegurado pelas bombas
de sódio-potássio, constituídas por complexos proteicos intrínsecos, e consumidoras de
adenosina trifosfato (ATP). Cada bomba consome a energia de uma ligação fosfato do
ATP para trocar 3 iões sódio do interior, por 2 iões potássio do exterior (Figura 1.5).
Quando funciona em regime máximo, cada bomba pode transportar cerca de 200 Na+ e
130 K+ por segundo. Contudo, a cadência é ajustada, em cada momento, em função das
necessidades da célula. A maior parte dos neurónios possuem entre 100 e 200 bombas
por µm2 de superfície membranar, mas em certas regiões, a densidade das bombas pode
ser até dez vezes superior. Um neurónio típico de pequena dimensão possui,
aproximadamente, um milhão de bombas de sódio-potássio e pode, assim, deslocar
cerca de 200 milhões de iões por segundo. É precisamente graças aos gradientes de Na+
e K+ que o neurónio é capaz de propagar o impulso nervoso. A diferença de
concentrações dos iões sódio e potássio de cada lado da membrana, polariza
negativamente o interior do axónio, em cerca de -70 milivolts (mV), relativamente ao
exterior. Esta diferença de potencial, designada por potencial da membrana em
repouso, é consequência do desequilíbrio iónico provocado pela acção antagónica das
bombas sódio-potássio, mas também pelas características dos canais acima referidos.
Com efeito, os canais iónicos que intervêm neste processo, embora se encontrem
permanentemente abertos, são diferentemente permeáveis aos dois iões: por cada 100
iões K+ que saem, apenas entram livremente 7 iões Na+. A permeabilidade dos canais aos
iões sódio é, portanto, fraca, no estado de repouso, de forma que não existe praticamente
nenhum fluxo contrário de iões sódio do exterior para o interior. O fluxo de potássio gera
assim um défice de cargas positivas sobre a superfície interna da membrana e um
excedente de cargas positivas, sobre a superfície externa. Daí resulta a diferença de
potencial de 70 mV, ficando o interior negativo. O ião Na+ é cerca de 30 % mais pequeno
que o ião K+, o que, à partida, faria presumir um comportamento diferente por parte dos
canais referidos. Contudo, sabe-se que a dimensão não constitui o factor principal da
selectividade. Esta assenta em interacções que os iões estabelecem com os elementos
hidratados da estrutura interna do canal.

Apontamentos de BIOLOGIA NEURO-ENDÓCRINA 14

Você também pode gostar