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História, Trabalho e

Movimentos Sociais
Material Teórico
Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Ney de Souza

Revisão Textual:
Profa. Esp. Vera Lídia de Sá Cicaroni
Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

• Introdução
• Inconfidência Mineira (1789)
• Inconfidência Baiana ou Revolta dos Alfaiates (1798)
• Revolução Pernambucana (1817)
• Confederação do Equador (1824)
• Cabanagem (1835)
• Guerra dos Farrapos ou Farroupilha (1835 - 1840)
• Revolta dos Malês (1835)
• Sabinada (Bahia - 1837)
• Balaiada (Maranhão 1838-1841)
• Praieira (Pernambuco 1847-1849)
• Lutas dos escravos, lutas religiosas e o surgimento das Sociedades e
Associações Mutualistas

·· Resgatar e analisar, no conjunto, os movimentos sociais nos primórdios da


formação da cidadania brasileira.
·· Oferecer a elaboração do estudo comparativo dos movimentos sociais no século XIX.

Caro aluno!
Nesta unidade vamos compreender um pouco mais um importante tema sobre História,
Trabalho e Movimentos Sociais. Procure ler, com atenção, o conteúdo disponibilizado e o
material complementar. Não esqueça: a leitura é um momento oportuno para registrar suas
dúvidas, por isso não deixe de registrá-las e transmiti-las ao professor-tutor. Para que a sua
aprendizagem ocorra num ambiente mais interativo possível, na pasta de atividades, você
também encontrará as atividades de avaliação, aprofundamento e a videoaula.
Bom estudo!!!

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Contextualização
Nesta Unidade estudaremos os caminhos e conflitos que marcaram a construção do Estado
brasileiro do século XIX, a construção da cidadania brasileira. São vários movimentos sociais
lutando pela conquista de seus direitos. São ações daqueles que nos antecederam contra as
injustiças sociais, discriminações ou atentados contra a dignidade humana. Nosso objetivo
é apresentar alguns destes inúmeros movimentos sociais, verificar sua composição, líderes,
região geográfica, reivindicações. Assim analisaremos aqueles que nos inspiram na construção
atual da cidadania brasileira.

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Introdução

Nesta unidade, estudaremos os caminhos e conflitos que marcaram a construção do Estado


brasileiro do século XIX, a construção da cidadania brasileira. Foram vários movimentos
sociais lutando pela conquista de direitos. Foram ações daqueles que nos antecederam contra
as injustiças sociais, discriminações ou atentados contra a dignidade humana. Nosso objetivo
é apresentar alguns desses inúmeros movimentos sociais, verificar sua composição, líderes,
região geográfica, reivindicações. O texto a seguir nos revelará uma grande quantidade
de grupos que participaram, por meio de lutas, da construção de seus ideais acreditando
defender causas coletivas. O texto também é um tributo a todos aqueles que deram sua vida na
construção da cidadania. Iniciaremos pelos movimentos do final do século XVIII por serem de
enorme importância para os desdobramentos das atividades reivindicatórias dos movimentos
no século XIX.

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Inconfidência Mineira (1789)

Este movimento aconteceu em Minas Gerais e representou o primeiro movimento a definir,


com nítida clareza, o objetivo de separação da metrópole. Grande parte da população vivia
na pobreza. Essa situação tornou-se insustentável a partir da segunda metade do século XVIII,
devido ao declínio da exploração do ouro.
Para a Coroa portuguesa, a situação de sua colônia no Atlântico Sul não interessava. Vital
para os portugueses era o pagamento dos impostos e pesados eram os impostos para os
mineradores. Um desses impostos era o quinto. Quando a produção de ouro caiu bastante, a
Coroa continuou a cobrança, mas os impostos não atingiam o que Portugal desejava. Devido
a esse fator, a Coroa portuguesa tomou uma atitude mais agressiva. Um clima de tensão
e revolta tomou conta dos proprietários das minas de ouro no exato momento em que o
governador da capitania, Visconde de Barbacena, anunciou que haveria derrama.

Saiba Mais
Derrama é a cobrança forçada dos impostos atrasados. Pagava esses impostos
toda a população, independentemente de ser o cidadão minerador ou não
(GOHN, 2013, p. 20).

A mais importante reunião dos conjurados

Fonte: Pedro Américo (1843–1905)

Membros da elite colonial das Minas Gerais começaram a planejar um movimento contra
as autoridades portuguesas e a cobrança da derrama. Esse movimento ficou conhecido pelo
nome de Inconfidência Mineira.

Saiba Mais
Inconfidência: referia-se, incialmente, à ideia de infidelidade e traição ao rei de
Portugal e seu governo. O termo foi perdendo essa conotação negativa e passou
a ser utilizado pelos pesquisadores para denominar os movimentos de oposição
ao domínio colonial.

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Esse movimento foi composto, basicamente, por intelectuais da elite e mineradores ricos
ou proprietários rurais. Também participaram do movimento clérigos e militares. Os líderes
intelectuais conheciam aspectos do pensamento dos filósofos iluministas europeus: Rousseau,
Montesquieu, Voltaire, Diderot. Os ideais iluministas estiveram na base da Independência dos
Estados Unidos (1776) e da Revolução Francesa (1789).
Os protagonistas da Inconfidência Mineira foram Cláudio Manuel da Costa (minerador e
poeta, formado em Coimbra), Inácio de Alvarenga Peixoto (minerador e latifundiário), Tomás
Antônio Gonzaga (poeta e jurista), Toledo e Melo (padre e minerador), Abreu Vieira e Oliveira
Lopes (coronéis). Seu líder principal, que não fazia parte da elite econômica, foi Joaquim
José da Silva Xavier, conhecido como Tiradentes. Assim era apelidado, pois havia exercido a
profissão de dentista, mas, na realidade, era alferes da cavalaria militar.
A Inconfidência Mineira não foi um movimento de caráter popular. Um de seus objetivos
era o fim da opressão portuguesa, que prejudicava a elite. Seu intento não era acabar com a
exploração social e a escravidão, por exemplo, em que vivia a maioria da população. Não é
bem certo, mas o historiador Boris Fausto afirma que o movimento chegou a uma solução de
compromisso pela qual seriam libertados os escravos nascidos no Brasil (2001, p. 118).
O movimento foi denunciado pelo coronel Joaquim Silvério do Reis ao governador
de Minas Gerais. Em troca, este obteve o perdão de suas dívidas junto à Fazenda Real.
Os inconfidentes foram presos, julgados e condenados à pena de morte. A rainha de Portugal,
D. Maria I, modificou essa sentença para o degredo em colônias portuguesas na África, com
exceção da sentença de Tiradentes, que foi enforcado e esquartejado. Muitos anos depois, já
na República, o movimento obteve o seu reconhecimento. A data de morte de Tiradentes,
21 de abril, tornou-se feriado nacional.

Somente na República os governantes mudaram a imagem que


tinham da Inconfidência. O movimento foi visto como o primeiro
a lutar pela independência, e Tiradentes tornou-se herói nacional.
Anos depois, em 1936, o governo republicano tomou medidas
para conferir à Inconfidência uma memória oficial e, em 1965,
Tiradentes foi considerado por lei, o ‘patrono cívico da nação
brasileira’ (LARA, 1992, p. 21).

A execução de Tiradentes

Fonte: Pedro Américo (1843–1905)

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Inconfidência Baiana ou Revolta dos Alfaiates (1798)

Este movimento, além de ter essas duas denominações, é conhecido também por Conjuração
dos Alfaiates ou Conspiração dos Alfaiates.
Você já compreendeu que alfaiates estavam envolvidos neste movimento, não é mesmo?!
Diferenciava-se este movimento da Inconfidência Mineira por um motivo: ele foi promovido
por homens brancos pertencentes às elites locais e também por negros e brancos pobres:
artesãos, soldados, sapateiros, pedreiros, oficiais, escravos e, principalmente por um grande
número de alfaiates.
Alguns membros tinham visões e perspectivas revolucionárias, como o médico Cipriano
Barata e o padre Agostinho Gomes. Os dois ofereceram um substrato político à Conjuração,
fazendo com que ela se tornasse um enorme movimento social. Um fator complicador, no
interior do movimento, foi a diferenciação de classes. Assim, “o desejo de liberdade dos
escravos se exacerbou, chocando-se com as posições dos senhores brancos da sociedade [...]”
(GOHN, 2013, p. 22). Na véspera de sua deflagração, a Conjuração foi delatada.

Praça da Piedade, local de execução dos conjurados

Fonte: Wikimedia Commons

O governador da Bahia, Fernando José de Portugal e Castro, procurou descobrir quem


promovia a revolta. Não faltaram informantes que denunciassem os conspiradores. As lideranças
populares foram presas e condenadas à morte ou ao degredo. Somente os pobres foram punidos.
Quatro líderes negros foram enforcados e esquartejados. Esse desfecho da Conjuração Baiana
oficializou a prática da delação e das denúncias, com prêmios e recompensas.
Veja você, as práticas de corrupção, do clientelismo e do fisiologismo foram legitimadas
pelo poder público, entrando, oficialmente, como valores podres da cultura brasileira (GOHN,
2013, p. 22).

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Revolução Pernambucana (1817)

Estamos no final do período colonial e já no século XIX. A corte portuguesa instalou-se no


Brasil em 1808. Todos sabemos que sustentar uma corte não é fácil. Desse modo, os impostos
aumentaram em valor e quantidade. Tudo para manter a vida de luxo da família real instalada
no Rio de Janeiro.
Bênção das bandeiras da Revolução de 1817. A região de Pernambuco sofria não somente com
esses altos impostos, mas também com a seca de
1816. Essa tragédia trouxe novos problemas para a
população devido aos graves prejuízos na agricultura. A
consequência disso tudo foi, mais uma vez, a fome no
Nordeste. Os preços do açúcar e do algodão estavam
em queda no mercado internacional. Esse fator era
devido à concorrência com o açúcar das Antilhas e
com o algodão dos Estados Unidos. Tudo isso levou
à luta contra o governo da Metrópole instalado no
Brasil. O movimento recebeu o nome de Revolução
Pernambucana ou Revolução dos padres.
Era consensual, para este movimento, a proclamação
Fonte: Antônio Parreiras (1860 -1937)
de uma República, que seria organizada com o ideário
de liberdade, igualdade e fraternidade, os mesmos que
inspiraram a Revolução Francesa. Esse movimento era composto de líderes comerciantes
brasileiros e de vários padres. Eram mais de 40 padres. Um dos padres de maior destaque foi
o frei carmelita Joaquim do Amor Divino Rabelo, conhecido nosso como frei Caneca.
Os revoltosos conseguiram tomar o poder A bandeira da Revolução Pernambucana de 1817, cujas
em Recife e implantar um governo provisório. estrelas representam Pernambuco, Paraíba e Ceará, inspirou a
Elaboraram uma Lei Orgânica para orientar atual bandeira pernambucana
o novo regime até a promulgação de
uma Constituição para o “novo” país. A
novo Constituição deveria ser elaborada
numa Assembleia Constituinte. Com este
movimento não aconteceu nada diferente do
que houve com os outros já apresentados,
ou seja, foi sufocado. Vários de seus líderes
foram presos e mortos. Muitos dos padres
presos cometeram suicídio. É importante
ressaltar que o sentimento antilusitano era
extremamente forte. O alimento da terra, a
mandioca, era o de destaque neste período. A
rejeição a tudo que era português foi enorme.
Essa foi a única rebelião anterior à independência que ultrapassou a fase de conspiração; os
revoltosos chegaram a tomar o poder, governando por 75 dias.

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Confederação do Equador (1824)

Após a independência do Brasil (1822), foi elaborada a primeira Constituição em 1824.


Essa nova legislação garantia uma série de direitos relativos à propriedade, liberdade e
segurança. Contudo, esses direitos não se aplicavam à maioria da população brasileira, em
sua maioria, composta de escravos.

A Constituição brasileira atual (1988) assegura uma enorme quantidade de direitos


sociais, políticos e civis. Na prática, os direitos constitucionais fazem parte do cotidiano
Reflita da maioria dos brasileiros?

Estamos novamente no Nordeste do Brasil e, novamente, com frei Caneca. Apesar de


estarmos, agora, dentro de um outro quadro político, o Brasil independente, a população
continuava enormemente descontente. Os políticos estavam revoltados com o imperador Pedro I.
Este era autoritário. Havia dissolvido a Assembleia Constituinte, expulsado os deputados,
censurado a imprensa e imposto a Constituição de 1824.
Estudo para Frei Caneca

Fonte: Antônio Parreiras (1860-1937)

O primeiro lugar em que explodiu a crise foi no Nordeste, em Pernambuco, em 1824: a


Confederação do Equador.
Havia vários motivos para o descontentamento da população. A elite estava preocupada
com a queda das exportações do açúcar. Os comerciantes, militares rasos, mestiços, negros
livres e escravos viviam em estado de plena miséria. A Confederação deu continuidade aos
ideários da Revolução de 1817. Esses grupos estavam contrários à monarquia e à centralização
do poder. Líderes, como Cipriano Barata e frei Caneca, defendiam a instalação de um regime
republicano com poder descentralizado, ou seja, dando autonomia para as províncias.
O frade carmelita frei Caneca defendia, em seu jornal Typhis Pernambucano, a tese
de que o Brasil tinha todas as condições para instituir a federação: grandeza do território,
diversidade da população e das riquezas econômicas espelhadas pelo país. O movimento

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revolucionário da Confederação do Equador reunia as províncias da região nordeste do país.
Essa nova movimentação social convocou uma Assembleia Constituinte e preparou um projeto
de Constituição. Suspendeu o tráfico de escravos e criou uma nova bandeira para o país.
A participação popular nesse movimento foi imensa, havendo uma grande radicalidade.
As elites locais, temerosas devido às ideias democráticas defendidas por esses setores populares,
abandonaram a Confederação, que enfraqueceu. O imperador fez um empréstimo com os
banqueiros britânicos, contratou uma esquadra naval e atacou os revoltosos por mar e por terra.
Imagine você qual foi o resultado dessa empreitada.
Isso mesmo, acertou, foram derrotados os revoltosos e seus principais líderes foram
condenados à morte. Frei Caneca foi executado.
Execução de Frei Caneca

Fonte: Murillo La Greca (1899-1985)

Com a morte de D. João VI, em Portugal, instalou-se uma grave crise. D. Pedro I era o filho
mais velho e, com a morte do pai, tornou-se herdeiro legítimo do trono português. Nessa
situação, o imperador do Brasil abdicou ao trono em favor de seu filho Pedro de Alcântara e
partiu para Portugal. Era em abril de 1831. Pedro de Alcântara era uma criança de apenas 5
anos de idade. Nessa circunstância, a Constituição de 1824 era clara, deveria ser instalada a
Regência. Durante esse período, tivemos, inclusive, um padre como Regente. Diogo Antônio
Feijó havia sido Ministro da Justiça e ocupou o cargo de maior importância no Brasil Regencial.
Padre Feijó, regente 1835-1837 O período regencial (1831-1840) foi um dos mais
sangrentos na história do Brasil. Diversos movimentos
sociais despontaram em várias regiões do país. As rebeliões
tiveram suas causas nos fatores de crise econômica, social e
política. A população sofria as consequências de um mercado
econômico exportador deficitário. A população rural e
urbana, na sua maioria, levava uma vida miserável. A riqueza
estava concentrada nas mãos de grandes fazendeiros e
comerciantes. Além disso, era imensa a crítica ao centralismo
do governo central e pregava-se a separação.
Foram várias as revoltas nesse período. Trataremos, aqui,
Fonte: Sébastien Auguste Sisson
neste texto, das principais.

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Cabanagem (1835)

Este movimento social ocorreu em Belém do Pará. A população estava revoltada com a
miséria e com os responsáveis pela sua exploração. Os membros deste movimento habitavam
em cabanas à beira de rios e igarapés. Daí o nome: Cabanagem.
Eram homens e mulheres pobres, negros, índios e mestiços. Sua atividade de trabalho era a
extração de produtos da floresta. Inicialmente foram apoiados, inclusive, por fazendeiros que
estavam descontentes com a política centralizadora. Essa elite local afastou-se do movimento,
pois este queria acabar com a escravidão e dividir as terras.
Cabanagem

Fonte: Wikimedia Commons

Vejamos quais eram os objetivos no movimento da Cabanagem.


Os objetivos principais da luta dos cabanos eram a tomada do poder da província e o fim
nas injustiças sociais. Seu objetivo principal foi conquistado: o poder na província. Expulsaram
o representante da corte imperial. Esse foi o primeiro e único governo popular de base índio-
camponesa na história do Brasil no período Imperial (GOHN, 2013, p. 35). Essa gestão no
poder durou apenas dez meses.
O movimento foi gravemente reprimido. Uma fase sangrenta de nossa história. Morreram
cerca de 30 mil pessoas, correspondentes a 30% da população do Estado do Pará naquela
época. Os sobreviventes foram presos. O historiador Caio Prado Júnior considera a Cabanagem
o “mais notável movimento popular do Brasil” (PRADO, 1957).

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Guerra dos Farrapos ou Farroupilha (1835 - 1840)

Os farroupilhas rejeitaram a ideia de rendição

fonte: José Wasth Rodrigues (1891 - 1957)

A Guerra dos Farrapos aconteceu no Rio Grande do Sul e foi a mais longa revolta de luta
armada da história do Brasil no século XIX. Teve dez anos de duração. As causas principais deste
movimento encontravam-se nas dificuldades econômicas dos produtores rurais. A economia
era baseada na produção do charque e voltada para o comércio interno. A concorrência era
imensa com os produtores do Uruguai e da Argentina. Não podemos esquecer a concorrência,
também, com os estancieiros da fronteira Brasil-Uruguai, que queriam eliminar ou reduzir
as taxas sobre o gado, propiciando, assim, a livre circulação de rebanhos e maior liberdade
administrativa para a província.

Charque: carne salgada. É uma carne salgada e seca ao sol com o objetivo de mantê-la
própria para consumo por mais tempo.

A participação nesse movimento era, predominantemente, de estancieiros, homens livres,


pobres, escravos. O objetivo dessa luta era garantir o lucro das estâncias e exercer o poder no
Rio Grande do Sul com autonomia. A cientista social Maria da Glória Gohn constata que “um
exército de mais de 5.000 homens derrubou o governo da então Província do Sul e instaurou
um governo com apoio de caudilhos, o qual distribuía armas, cavalos, roupas, erva-mate, rum
e salários a seus adeptos” (2013, p. 34).
O nome “Farroupilha” tem sua origem em ‘farrapos’. Pessoas vestidas com roupas rústicas,
em farrapos. Com o passar do tempo “a expressão se generalizou no Brasil e passou a ser
considerado farroupilha todo aquele que se ligava às lutas do povo” (GOHN, 2013, p. 34).
Após um longo período, esse movimento sofreu uma derrota militar, seguida de um acordo de
paz. O resultado daí obtido foi que os fazendeiros gaúchos não seriam punidos e receberiam anistia
do Imperador Pedro II. Por sua vez, os soldados farroupilhas seriam incorporados ao exército
imperial. Os escravos fugitivos que lutaram ao lado dos farroupilhas teriam direito à liberdade.

Documentário: Cecília e a Guerra dos Farrapos - filme pedagógico.


Metodo didático e agradável para estudar a Guerra dos Farrapos.
https://youtu.be/j8SB3eaPPao?list=PLemI4ujTiso1_W2tCAGElwPpRoCPyrhNY

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Revolta dos Malês (1835)

A Revolta dos Malês foi uma grande insurreição de escravos de origem muçulmana.

Fonte: Johann Moritz Rugendas (1802–1858)

A participação de escravos foi enorme. Estes eram chamados de malês, que, na língua
ioruba, significa muçulmano. Sabiam ler e escrever. Na maioria das vezes, eram mais cultos
que seus proprietários. Seu objetivo principal era lutar contra os proprietários de escravos na
tentativa de conquistar a liberdade.
O resultado desta revolta não foi muito deferente do dos outros movimentos sociais no
Brasil Império. Os malês foram derrotados e levados à prisão. Alguns foram condenados à
açoite em público e fuzilamento.

Revolta do Malês
Documentário – aula. Excelente e sintética apresentação desse
movimento social contra a escravidão negra.
https://www.youtube.com/watch?v=sE_LZe9X_PM

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Sabinada (Bahia - 1837)

A Sabinada foi uma revolta urbana resultante da instabilidade da Província da Bahia em


oposição ao governo regencial. Participaram desse movimento homens cultos e de posses,
moradores da cidade de Salvador.
A revolta tinha por objetivo instituir uma república na província enquanto o príncipe
herdeiro fosse menor de idade. Grupos da maçonaria participavam desse movimento. Eclodiu
em 1837, e seu principal líder foi Francisco Sabino Alvares da Rocha Vieira, daí o nome
Sabinada (GOHN, 2013, p. 36).
Os revoltosos chegaram a tomar o poder, mas os fazendeiros que os apoiavam, temerosos
diante das declarações de que o governo provisório da província concederia liberdade aos
escravos que lutassem ao lado dos rebeldes, abandonaram o movimento. Em seguida, os
fazendeiros passaram a ajudar as forças imperiais enviadas para combater a revolta. A repressão
foi extremamente violenta, mas os líderes do movimento não foram mortos. Em 1838, essa
revolta foi esmagada pelas forças imperiais.

Balaiada (Maranhão 1838-1841)

Uma das causas principais desta revolta foi a crise da economia agrária da província em
função do preço do algodão, que era o principal produto da província. Outra causa foi a perda
de compradores no exterior devido à concorrência do algodão dos Estados Unidos. Essas duas
causas são reveladoras da miséria de grande parte da população local.
Os revoltosos eram vaqueiros, sertanejos e escravos. Também participaram do movimento
profissionais urbanos. O nome da revolta tem origem na atividade realizada por um grande
grupo de participantes, ou seja, a fabricação de balaios.
O objetivo da revolta consistia em lutar contra a miséria, a fome, a escravidão e os maus-
tratos a que eram submetidos. O resultado desta também não foi em nada diferente do das
outras revoltas. O governo enviou tropas para combater os rebeldes que haviam conquistado
a cidade de Caxias. Nesse momento, os profissionais urbanos abandonaram os revoltosos e
aliaram-se às tropas do governo. Após um combate violento, os revoltosos foram derrotados.
Morreram cerca de 12 mil sertanejos e escravos.

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Praieira (Pernambuco 1847-1849)

O nome da revolta está ligado ao nome do partido político que abrigava a maior parte
dos líderes: o Partido da Praia, que estava situado na rua da Praia. O Partido opunha-se aos
partidos Liberal e Conservador. “O partido da Praia formou-se em 1842 e se aglutinou em
torno do jornal Diário do Povo” (GOHN, 2013, p. 37).
O governo da Província de Pernambuco fora demitido pelo novo gabinete conservador.
Os liberais negaram-se a aceitar o nome indicado pelo gabinete conservador do império para
a presidência da Província e iniciaram a revolta.
Alguns dos objetivos dos revoltosos eram estes: voto livre e universal; liberdade de imprensa;
garantia de trabalho para o cidadão brasileiro; extinção do poder Moderador; exercício
do comércio a varejo só para os brasileiros; garantia dos direitos individuais do cidadão;
estabelecimento da federação.
As ações efetivas duraram dois meses. Os revoltosos não possuíam recursos militares e,
assim, não resistiram à repressão imperial. Os principais líderes foram condenados à prisão
perpetua. Em 1851 todos foram anistiados. Pedro Ivo Veloso da Silveira, o líder principal,
fugiu para a Europa e morreu na viagem.
Como você percebeu, nesta revolta, as reivindicações básicas possuíam um caráter
profundamente antilusitano.

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Lutas dos escravos, lutas religiosas e o surgimento das Sociedades
e Associações Mutualistas
Você encontrará, nesta parte de nosso texto, alguns dos movimentos que tiveram seu
início a partir de 1850. “Os movimentos em torno da questão dos escravos absorveram
grande parte da agenda das lutas sociais do período. Sintetizando, podemos dizer que aqueles
movimentos envolviam aspectos da luta pela cidadania, identidade, liberdade humana [...]”
(GOHN, 2013, p. 40).
Nesse período encontramos vários movimentos messiânicos, portanto de caráter religioso.
Foram movimentos que lutaram em torno da questão agrária. Trataremos, neste texto, de um
deles: Canudos.
Finalizando este item e o texto, trataremos dos movimentos de auxílio mútuo: o mutualismo.
Entidades de ajuda mútua cuidavam não apenas das necessidades econômicas de seus
afiliados, mas também de aspectos culturais, como bibliotecas, instrução, festas, bailes, jogos,
piqueniques, dentre outros interesses.

Lutas pelo fim da escravidão


Durante o século XIX, a escravidão africana atingiu seu ponto máximo no Brasil.
De 1801 até meados do século, estima-se que o tráfico negreiro tenha trazido ao país cerca de
1,7 milhão de africanos (KLEIN, 1987, p. 58). Isso corresponde a 42% de todos os africanos
obrigados a vir para o país desde o início do comércio negreiro no século XVI. Nesse contexto,
surgiram várias revoltas que lutaram pela liberdade dos escravos.

Lei Eusébio de Queirós (1850)


Esta lei aboliu o tráfico negreiro no Brasil. Foi promulgada devido a pressões externas,
da Inglaterra. O país europeu era uma potência moderna capitalista e estava interessado na
libertação dos escravos, pois isso proporcionar-lhe-ia a liberação de enormes quantias de
capital imobilizadas com a escravidão.
Antes da Lei, as revoltas de escravos eram constantes. Um dos locais de maior concentração
de revoltas era a Bahia. Ali foi aparecendo o apoio à causa da abolição. Nas décadas seguintes,
essa causa transformou-se na principal questão social do Brasil.

Movimentos Abolicionistas
Encerrada a Guerra do Paraguai, em 1870, cresceu, no Brasil, a campanha abolicionista,
denominado, assim, o movimento popular pela libertação dos escravos. O movimento
conquistou amplos setores da sociedade: parlamentares, imprensa, artistas, intelectuais.
Os principais líderes foram Joaquim Nabuco, José do Patrocínio, Raul Pompeia, Luís Gama
e Castro Alves.

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Devido a pressões internacionais - destacando-se a continuidade do governo inglês na sua luta


pela total libertação dos escravos por motivos econômicos - a luta recebeu reforços. O governo,
nesse contexto, promulgou duas leis que emanciparam uma parcela da população escrava.
Lei do Ventre Livre (1871) declarava livres os nascidos de mãe escrava a partir da data
da promulgação. A lei, obviamente, libertava os proprietários de escravos da obrigação de
alimentar os filhos de escravos. A Lei, ainda, permitia aos escravos que haviam conseguido
juntar dinheiro entrar na justiça para comprar sua própria liberdade (alforria).
Lei dos Sexagenários (1885) declarava livres os escravos com mais de 65 anos. Beneficiava
imensamente os proprietários de escravos, que ficaram livres de cuidar dos negros idosos que
haviam conseguido sobreviver mesmo após uma longa vida de exploração de seu trabalho.
Essas leis não colocaram fim à escravidão. Adiaram, ao máximo, a abolição definitiva.
Nesse período ocorreram manifestações políticas favoráveis à abolição. Esta veio, em 1888,
com a Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel, regente do Império.
Como todos sabemos, essas leis e a abolição não significaram uma melhora na situação dos
negros no país. O Brasil, naquele momento, recebia uma quantidade imensa de desempregados.
Resta, ainda hoje, quebrar as algemas da discriminação racial, do preconceito. Tudo isso
nos levou a esta imensa desigualdade social ainda existente no tempo presente. Devido a esses
fatores, na atualidade e justamente, realizam-se movimentos reivindicatórios por parte das
comunidades negras.

Questão Religiosa
O conflito com a Igreja Católica no Brasil é de longa data. No período colonial, foi uma
instituição submetida à Coroa Portuguesa devido o regime de Padroado. Nenhuma ordem do
papa poderia entrar aqui sem a anuência do rei português.
Em 1872, no final do período imperial, os bispos D. Vital (Olinda) e D. Macedo Costa
(Belém do Pará) resolveram colocar em prática as normas estabelecidas pelo Papa Pio IX:
punir os membros da Igreja que apoiavam ou pertenciam à maçonaria. D. Pedro II, imperador
do Brasil, influenciado pela maçonaria, solicitou aos bispos que suspendessem as punições.
Os bispos recusaram terminantemente a obedecer ao Imperador. Assim, foram condenados
a quatro anos de prisão. Em 1875, foram anistiados e libertados. O episódio, no entanto,
abalou as relações entre a Igreja e o regime imperial.

Canudos (1874-1897)
Canudos foi um movimento popular de cunho religioso, liderado por Antônio Vicente
Mendes Maciel (1828-1897), apelidado Antônio Conselheiro. A revolta aconteceu no sertão
nordestino durante o mandato do presidente Prudente de Morais. Seu início foi marcado pela
revolta de homens livres e pobres do campo e da cidade contra a cobrança de impostos. Com
o passar dos anos, transformou-se num espaço geopolítico totalmente distinto do território
nacional, com costumes, religiões e outras atividades. O Conselheiro realizava pregações
que atraíam muitas pessoas. Seus adversários identificavam-no como um fanático religioso e
monarquista. Um de seus lemas era: a terra não tem dono, a terra é de todos.

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Milhares de pessoas mudaram-se para Canudos; sertanejos sem-terra, vaqueiros, ex-
escravos, pequenos proprietários pobres, homens e mulheres perseguidos pelos coronéis ou
pela polícia. O povoado de Canudos, na Bahia, reuniu, em pouco tempo, cerca de 20 mil
a 30 mil habitantes. Segundo alguns pesquisadores, Canudos vivia um sistema comunitário.
A prostituição e a venda de bebidas alcoólicas eram proibidas.
Os fazendeiros baianos e a elite local temiam o crescimento de Canudos. Para a Igreja Católica,
Conselheiro e seus seguidores desviavam os fiéis. Para os proprietários de terra e o governo,
Canudos representava uma ameaça, pela ocupação das terras e pela recusa ao pagamento de
impostos. Para muitos, ali viviam loucos, fanáticos, monarquistas. Uma das principais motivações
dessa reunião de Canudos foi a necessidade de escapar da fome e da violência.
Canudos foi destruída pelas tropas do governo federal. As tropas locais foram insuficientes
para destruir o povoado. A organização foi destruída em outubro de 1897. Mais de cinco
mil casas foram incendiadas. A população sertaneja morreu defendendo sua comunidade.
A guerra de Canudos foi tema do livro de Euclides da Cunha Os Sertões.

Mutualismo
Dentre as inúmeras associações mutualistas, apresentaremos, brevemente, o nome e as
atividades de algumas dessas entidades que atuaram no século XIX. Fundada em 1891,
temos a Sociedade Beneficente dos Alfaiates de São Paulo. Nesse mesmo ano, outras três
também em São Paulo: Associação Auxiliar das Classes Laboriosas; Associação Escandinava
de Auxilio Mútuo; Associação Auxiliadora União Internacional.
Em 1893, foram criadas, em Campinas, a Associação Beneficente Dr. Salles de Oliveira e a
Associação dos empregados da Estrada de Ferro Mogiana. Em 1896, foi criada a Associação
dos Trabalhadores do Livro.
Maria da Glória Gohn apresenta uma listagem completa dessas entidades mutualistas em
seu estudo realizado sobre os movimentos e as lutas sociais (2013).

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Material Complementar
Para aprofundar mais seus estudos, consulte as indicações a seguir:
Vídeos:
Netto e o domador de cavalos
No início da Guerra dos Farrapos, o General Netto (Werner Schünemann) descobre que
um antigo parceiro das guerras do Sul, o Sargento Torres, está preso. Para libertá-lo,
busca a ajuda de escravos rebelados, entre eles, o Negrinho do Pastoreio, o melhor
cavaleiro da fronteira.
https://www.youtube.com/watch?v=BPLmkVFNQgM

500 Anos O Brasil - Império na Tv - Rebeliões no Império - Ep. 02


D. João VI retorna para Portugal, as tensões aumentam, forças tradicionais e renovadoras
confrontam-se. A Revolução do Porto impõe limites ao absolutismo e acaba sendo
elaborada uma nova constituição. De que forma isso afeta o Brasil? O povo brasileiro
clama por D. Pedro. O Dia do Fico, a Proclamação da Independência e a repercussão
nas províncias.
https://www.youtube.com/watch?v=2QLkP2NDhMg

A Abolição da Escravidão – História


No século XIX, a escravidão negra finalmente acabou. Para entender esse processo, vale
a pena analisar os casos dos EUA e do Brasil, último país a encerrar a escravidão, com
a Lei Áurea.
https://www.youtube.com/watch?v=ynf9M_llRsA

Sinhá Moça (1953)


No auge da escravidão no Brasil, uma história de amor e luta pela liberdade em que
a filha de um grande fazendeiro e dono de escravos se rebela contra o pai, causando
consequências violentas ao iniciar uma campanha abolicionista
https://www.youtube.com/watch?v=qpeVgH3f6sQ

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Referências
CASTELLS, M. O Poder da Identidade. São Paulo: Paz e Terra, 2010.
GOHN, M. G. História dos Movimentos e Lutas Sociais: a construção da cidadania dos
brasileiros. 7. ed. São Paulo: Loyola, 2012.
HOBSBAWM, E. J. Mundos do Trabalho: novos estudos sobre história operária. 3. ed. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 2000

Complementar
AQUINO, R. S. L. et alii. Sociedade brasileira: uma história através dos movimentos
sociais. Da crise do escravismo ao apogeu do neoliberalismo. Rio de Janeiro: Record, 2005.
FAUSTO, B. (dir.). História Geral da Civilização Brasileira. T. III. O Brasil Republicano.
Vol. 9. Sociedades e instituições (1889-1930). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.
GOHN, M. G.; BRINGEL, B. M. Movimentos sociais na era global. Petrópolis: Vozes,
2012.
KHOURY, Y. A. As greves de 1917 em São Paulo. São Paulo: Cortez Editora, 1981.
ORO, A. P. (org.). Representações sociais e humanismo latino no Brasil atual.
Religião, política, família e trabalho. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004.

Bibliografia Complementar da Unidade


GOHN, M. G. História dos Movimentos Sociais. A construção da cidadania dos brasileiros.
São Paulo: Loyola, 2013.
KLEIN, H. Tráfico de escravos. Estatísticas históricas do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE,
1987.
LARA, S. H. Pátria amada esquartejada. São Paulo: DPH/SMC, 1992.
PRADO, C. J. Evolução Política do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1957.

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Unidade: Movimentos Sociais no Brasil do século XIX

Anotações

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