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Aula 1
Testes: 2 de Março (Sex 15:30h) e 6 de abril (10h)
Teoria política
Ciência Política Política comparada
Política pública
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Guilherme Echeverri Teoria Política Contemporânea - 2º Semestre
comércio livre ou era a guerra (“quando os bens não atravessam fronteiras, os exércitos
atravessarão”) ou o roubo. O comércio gerava a paz. No meio destas características, temos um
período de prosperidade e crescimento no que toca à riqueza. Era possível viajar sem
passaporte, ao contrário de hoje em dia, havendo menos entraves, ou seja havia livre-
circulação. A população mundial multiplicou-se de 100 para 400 milhões, porque se
conseguiu avançar em vários campos e, portanto, na esperança média de vida, que se estima
que tenha triplicado. É pintado como um dos piores séculos, mas também houve grandes
avanços: foi um século de luzes e sombras, de contrastes.
- A propriedade privada era muito importante e associada ao comércio livre, porque só
podemos trocar através da ideia de “meu” e de “teu”. Se o que é meu é meu e o que é teu é teu
e podemos trocar, então a decisão sobre aquilo que é meu é minha: decisão descentralizada.
Permitimos as pessoas de investir e usar os seus conhecimentos e também as atividades são
descentralizadas, diferentes umas da outras.
- O governo do século XIX era um governo limitado, porque pode ter determinado alcance e
forma mas não pode interferir com as decisões das pessoas.
- Havia um código, uma maneira de operar, neste contexto que lhe dava um tom elevado (por
exemplo, a aparência do empresário). Todas estas ideias acima têm como pano de fundo a
prosperidade individual das pessoas, com uma pressão de que ninguém podia falar mal de
determinado produto que alguém vendia ou negociava ou mentir. Era um código de
gentlemanship, uma moral vitoriana (victorian morals), baseada na verdade, na reputação, na
poupança, na virtude, autocontrole, pensando sempre no futuro… Funcionava como uma
pressão vinda de dentro e de fora, estabelecida na sociedade.
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vitoriana, porque considera que a verdadeira moral é aquela que une os trabalhadores de todo o
mundo, mais importante ainda do que o que nos une a nossa nação.
Aula 2
Introdução: Karl Marx (1812-1883)
Karl Marx é visto por muitos como utópico, mas na verdade é ele que rompe com os
utópicos, aos quais chamou moralistas, pequenos-burgueses… Esses autores que Marx critica é
algo normal nesta área política muito à esquerda. Os comunistas não criticam tanto a direita, ou o
extremo-oposto, mas sim atacam-se uns entre os outros, que foi o que Marx fez.
A primeira coisa que faz é dizer que não tem nada a ver com os tais moralistas (ex: Saint
Simon), que queriam melhorar a sociedade aos poucos. Marx achava que não era uma questão
de gradualmente ir aceitando as condições impostas pelo regime que ele chama capitalista. Para
ele, o socialismo não é uma questão, não é uma ideologia de cariz moral ou utópico - é uma
questão de ser verdade, isto é, é quase uma ciência e por isso chamou-lhe socialismo cientifico
(não é uma espécie de dever ser e sim ser). O socialismo é, então, uma espécie de futuro,
achando que tinha descoberto uma ciência da história - uma matéria de facto.
Ele diz que a história vai avançando numa fricção entre uma infraestrutura e uma
superestrutura.
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O sistema capitalista tem as suas leis e os seus costumes: Marx associa o sistema
capitalista a uma moral burguesa capitalista (victorian morals).
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dominante e por o proletariado a governar. Para ele, o Estado não deve ser abolido, mas sim
desvanece-se, ou seja, há uma dissolução gradual. É evidente que o Estado irá desaparecer, mas
não somos nós a fazê-lo desaparecer: ele desvanece-se. Desvanecer é diferente de abolir. “Nós
não somos utopistas - não pensamos em dispensar toda a subordinação ou controle (…) e se for
preciso vamos usar a mão de ferro dos trabalhadores”.
Friedrich List
Decisão privada ≠ pública: As teorias de mercado livre confundem a economia pública
com a economia privada. Acontece que a economia privada, quando toma decisões não tem em
consideração a economia pública. Cada um de nós quando toma uma decisão privada, não está a
fazer o que deveria fazer para o bem da nação. O bem estar de cada um de nós todo somado é
diferente do bem estar da nação. Alguém deve tomar a decisão pela nação. É um erro estarmos a
compaginar interessa privado com interesse público, como disse Adam Smith (teoria da mão
invisível). Contribuímos com decisões privadas para a que sociedade esteja muito desagregada.
Vai defender que a sociedade do mercado livre promove o cosmopolitismo e que este promove a
autorização da sociedade, deixando as pessoas ter a noção de nação. Private ≠ public ⇢
Dissolution of society ⇢ Taylor ≠ nature ⇢ Defence national industries
Quer List, quer Marx são precursores não intencionais de pessoas como Lenine ou de
ideias que aparecem no século XX.
O mundo tem estado sempre a mudar ao longo dos séculos, no que toca ao Estado:
- XVII e XVIII: “absolute states”
- XIX: “neutral states” (liberal) - o que sabia os seus limites, que não se envolvia nos aferes das
pessoas
- Como será o estado no século XX?
É aqui que vai começar uma teoria sobre a evolução do estado. No século XIX, quando o
estado era neutro, era muito diferente da sociedade - eram entidades totalmente diferentes no
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sentido de cada um ter o seu lugar. O estado neutral é o que torna a equação “state ≠ society”. O
que começou a acontecer foi que o Estado, na transição para o século XX, começou a ser dualista
- por um lado temos o monarca e a sua ideologia (governamental state) e por outro temos o
parlamento (as entidades que estão representadas no parlamento são a sociedade).
Então, se tínhamos um estado neutro diferente da sociedade, por que razão se
considerava que uma parte do Estado era apenas uma representação da sociedade? Afinal,
estava representada no parlamento. Há uma parte do Estado que é o parlamento - que é a
sociedade por sua vez. Logo, se calhar não havia realmente uma equação como a mencionada
como os liberais nos faziam querer ver.
A partir da segunda metade do século XIX, o parlamento começou a ser cada vez mais
proeminente. Com isso, acabou a diferença entre entre Estado e sociedade. Passa a usar uma
expressão que ficou canónica: “society-become-state” - o Estado É a sociedade (the end of the
neutral state). Mas se toda a sociedade é o Estado, no século XX, o Estado será toda a sociedade
- “o Estado é total” (the total state). Passa a ser a regra e medida de toda a sociedade.
Se o estado é total e está baseada num parlamento onde está baseada a sociedade,
temos aqui um novo problema: a sociedade está unida ou dividida? Schmitt faz esta questão
devido à existência, que estão normalmente preocupados com parte do problema - consigo e com
a sua clientela. Estes estão apenas preocupados com segmentos da sociedade - esses partidos
não estão a ver o conjunto, the big picture, o problema da nação alemã. Precisamos então de um
partido que ultrapasse esta questão, que ocupe todo o parlamento e que veja a nação no seu
conjunto e que consigo perceber qual é a vontade total, nacional, de um estado total.
Para ele, os partidos são apenas interesses egoístas, com interesses parciais, que
apontam em todas as direções. Com partidos é difícil gerar maiorias - e mesmo que se façam
maiorias são sempre maiorias parlamentares como partidos heterogéneos. Precisava-se de um
partido coerente que jogasse com a vontade única do estado.
Se tivermos um estado baseado em pluripartidarismo vamos com isso impedir que o
estado total aja com impacto na sociedade - se tivermos muitos partidos o estado não consegue
agir como um só. Este argumento é um argumento vencedor, ainda hoje em dia, considerando
muita gente que são redutores e que dificultam criar maiorias.
Considera que as democracias já estavam gastas, fracas, apenas sabiam conversar, que
nunca conseguiam tomar decisões - não tinham capacidade de escolher os seus inimigos, nunca
conseguiam perceber quem está contra elas e por isso são fracas e vão desaparecer. É este o
argumento de Carl Schmitt, que muitos autores consideram errado (ex: julgamento de
Nuremberga, onde os países realmente julgaram e aniquilaram os seus inimigos), porque estas
lidam bem com a heterogeneidade e apesar de muito se discutir, também se conseguem criar
decisões e consensos. Talvez seja muito mais pratica. O que seria se tivéssemos alguém a decidir
por nós todos? A democracia vai contra isso.
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disso. E é por isso que diz que o fascismo se opõe à democracia, que iguala a nação à
maioria, ou seja, baixa-a ao nível dessa maioria - mesmo assim, o fascismo trará a forma mais
pura de democracia se a nação, assim concebida, for democrata qualitativamente e não
quantitativamente. Ou seja, há dois tipos de democracia: o fascismo é a mais pura das formas
de democracia - a qualitativa - e assume que há desigualdade entre as pessoas.
4. O papel do estado: vai falar do estado na ótica da maneira como deve criar e projetar a
nação - é o estado que cria a nação. Não é a nação que gera o estado mas sim o contrário. O
papel do estado é criar a nação, criar consciência da unidade moral da nação. É uma noção
de estado como realidade ética que só vive enquanto se desenvolver e se alargar - tentar
prender ou limitar a nação é destrui-la e portanto o governo fascista é incitar à propagação da
nação.
5. Crítica à vida confortável: “Para conhecer o fascismo, é preciso conhecer o homem fascista”
e para conhecermos os homens é preciso conhecer o Homem. Ele vai descrever essa pessoa,
o que tem muito que se lhe diga, porque põe lado a lado uma pessoa e uma ideologia. Quer
quase ultrapassar a perfeição humana, ele é um homem perfeito que está expurgada das
tentações mundanas nas quais caem os terríveis liberais. É austero, rígido, não pode ser
preguiçoso, liga-se muito ao militarismo, é conservador, deve ser duro, dedicar-se à família e à
nação… O fascista despreza a vida confortável. Deve comportar-se numa maneira perfeita e
se for preciso entrar em guerra - e é aí que se realiza o verdadeiro homem, quando tem que
tomar a decisão última de ter que matar.
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um livro de alguém que quer influenciar, a sua primeira tese, é que comunismo e nazismo são
faces da mesma moeda - “são como que troncos da mesma árvore” intelectual. Dizer isto em 1939
não teria sido muito chocante, até teria sido natural mas já neste ano o livro é muito mal
percebido, especialmente em Inglaterra, até ao ponto de se falar do facto de Churchill ter perdido
as eleições por ter citado o autor. Para Hayek quer socialismo que nacionalismo, querem
centralizar-se e fazem parte da mesma génese.
Em 1950 recebe um convite para lecionar na universidade de Chicago até 1971. É
conhecido por ser possivelmente como um dos Chicago Boys, um conjunto de economistas que
apoiaram de forma dissimulada Pinochet.
O livro Law, Legislation and Liberty (1970), constituído por três volumes é aquele que
vamos estudar.
A sua segunda tese é mais complexa. Em 1944, Hayek pensa assim: se é verdade que o
comunismo e o nazismo são ameaças à democracia liberal, não é totalmente verdade que essas
ameaças sejam as mais importantes neste momento. Como são ameaças tão declaradas, só vai
votar nesses grupos quem quiser. E se as pessoas quiserem, está tudo bem, aceitemos os
resultados. Hayek acha que as pessoas estão suficientemente esclarecidas para tentar evitar
situações de comunismo e nazismo: sofreram com a guerra e portanto já não vai ser fácil
convence-las. Estas ameaças são muito explicitas e elas próprias admitem que querem destruir a
democracia.
Na verdade, a ameaça vai surgir de uma ameaça que não se nota que é uma ameaça. A
ameaça vai ser mais complexa: a principal ameaça vem de uma entidade que não se nota, porque
de outra forma as pessoas não a apoiariam. Portanto, é uma ameaça interna às democracias,
surgindo ideias muito atraentes, que sejam aceites por todas e que mobilizem as pessoas - são as
ideias que nos podem levar nesta caminhada que virão destruir o limite da democracia liberal e é
isso que é o caminho da servidão - o caminho não está nos dois extremos. O que vai acontecer é
que alguns partidos democrata-liberais vão sentir a atractividade de outras ideias que toda a gente
quer e são essas ideias que vão levar para o caminho da servidão. Que ideias serão essas?
Hayek chamava-lhe de “nobres ideias”, que toda a gente aceita e toda a gente quer - se as
pessoas não as aceitassem e as ouvissem a suspeitar, tal não aconteceria. Essa nobre ideia é a
justiça social. É uma forma encapotada de dizer igualdade - de um país ter uma espécie de
padrão de distribuição. Esta justiça social não tem o sentido que usamos hoje mas sim no sentido
de justiça distributiva - o Welfare State (Estado Social).
De que forma a justiça distributiva nos vai levar à servidão? Acha que até 44 toda a gente
pensa que as políticas com boas intenções têm bons resultados. Hayek acha que esta nossa
apetência e atractividade pelo Walfare State relaciona-se por uma falha na maneira como nós
pensamos que vem da Grécia Antiga - ele diz o seguinte: nós temos tendência para pensar que há
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dois tipos de elementos na sociedade. Os gregos achavam que haviam coisas artificiais que nós
fazíamos e um outro conjunto de elementos que eram apenas naturais (da física, como a chuva,
crescimento das árvores a rotação da Terra), que são elementos que resultam independentemente
da nossa vontade - ou seja, os gregos diferenciaram entre natural e artificial.
Hayek diz que não concorda com isto, para ele não há só natural e artificial - há certos
elementos que fazem muita falta na nossa vida que não são nem uma coisa nem outra, ou melhor,
que são artificiais na medida em que são feitos por nós (the product of human action), mas que
não foram construídos ou desenhados por nós (but not of human design). Há elementos não
naturais que são resultado da ação humana, mas que não são resultado do pensamento
deliberado de ninguém. A linguagem é para Hayek é o maior exemplo deste tipo de artefacto que
é humano, mas ninguém o criou. É a própria existência que lhe dá existência. A moeda é outro
exemplo. Aquilo a que chamamos human action pode ser um critério ambiguo.
Há dois tipos de resultado ou ordem social da human action: by design (“artifical”, “made
order”, “organisation”, criadas deliberadamente por alguém com um determinado propósito), como
a empresa, universidades, o esperanto (uma língua criada deliberadamente); by interaction,
como a linguagem, mercados, mecanismos de preços.
- A ação humana por interação pertence à ordem espontânea (grown order ou cosmos).
- A ação humana by design pertence à made order (organisation).
Como e o quê se processa uma ordem espontânea? Hayek quer mostrar que mexer com
uma ordem espontânea é impossível. Estas são modos de processar a informação, que as
pessoas não conseguem perceber totalmente, mas que usam à sua maneira (como a linguagem,
já que nenhum de nos fala totalmente, mas entendemo-nos). As ordens espontâneas são
esponjas absorventes de informação. Ninguém inventou a linguagem, mas todos a falamos; além
disso não há ninguém que conheça totalmente uma língua, que a possa manipular. As ordens
espontâneas funcionam melhor pela interação, não pela correção, pela tentativa de fazer melhor
ou purificar. São mais elásticas, mais plásticas.
No mercado é o mesmo caso: ninguém vai para o mercado com a mesma finalidade que o
outro, porque caso contrário ninguém trocava; por outro lado, ninguém consegue mexer com
preços, porque o mercado auto-regula-se e nós apenas nos vamos ajustando a ele mesmo (ex: se
achamos que está barato compramos, se está caro não o fazemos). A única forma de
conseguirmos trocar algo é termos noções diferentes do valor dessas mesmas coisas. Portanto,
as ordens espontâneas parecem funcionar melhor numa interação entre pessoas diferentes,
divergentes, que pensam de maneira diferente e que usam partes diferentes da ordem
espontânea. É por isso que cometemos erros. Nós nua notamos que a língua sofre alterações, por
exemplo, mas nos adicionamo-lhes palavras, caem palavras, etc.
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Ex: construtores deliberadamente querem construir algo - made order; sem intenção,
alguém se senta a uma mesa e começa a interagir, criando algo não deliberadamente -
spontaneous order.
Por vezes, quem vê de fora, pode não perceber que uma ordem não foi criada
deliberadamente por ninguém, porque a distinção muitas vezes não é assim são forte, não sendo
por acaso que durante 25 séculos que as duas ordens estiveram juntas (por exemplo, temos
cabelos semelhantes, se alguém vir de fora pode pensar que essa ordem foi criada através da
organização, isto é, alguém a desenhou, teve esse desígnio). Outro exemplo, são as filas: porque
fazemos filas, instintivamente? O que Hayek nos vem dizer é que a interacção também pode gerar
ordem (ninguém combinou os cortes de cabelo) - ordem sem mecanismos de coerção, criada
não por alguém em concreto mas por TODOS, pela interação livre. É a ordem espontânea.
Numa organização a interacção não é tão livre, porque se eu entrar numa empresa, vão
me dizer certamente o que fazer. Esta tem um ou um conjunto de vários propósitos
unificadores. Numa organização, as nossas tarefas são mesmo nossas - são especificas -, isto é,
se estivermos numa empresa vamos ter um determinado cargo. A ordem que o superior dará a um
é diferente da ordem que dará a outro. Hayek chama a esta situação funções específicas. Numa
organização, somos regidas mas por instruções específicas, que não nos dizem o que não
podemos fazer, mas o que devemos fazer (logo não são regras). Estas são centrally
determined. Há “regras” mas não são assim tão importantes, nem são gerais, podem aplicar-se
só a mim - a estas instrução chamamos de “specific comands” - comando, que é o contrario da
regra.
Já numa ordem espontânea, temos regras gerais e abstratas, que nos dizem o que não
fazer, mas não nos dão qualquer indicação sobre o que devemos fazer. Então e nas ordens
espontâneas não há lugares nem funções? Também há, mesmo que percepcionemos a sociedade
como uma ordem espontânea. Também há hierarquias, por exemplo - mas não há ninguém que
as defina totalmente. Não há então nenhuma maneira de perceber uma hierarquia - podemos ter
sim funções diferentes - mas não são centrally defined, são sim free by interaction. Hayek acha
que numa made order somos normalmente levados a ter que fazer alguma coisa e numa ordem
espontânea normalmente há coisas que não podemos fazer. Tudo aquilo que não for
explicitamente proibido na nossa sociedade, é permitido - ninguém nos pode dizer o que fazer.
Normalmente o que não se pode fazer, é aquilo que provoque dano em terceiros é restringido -
mas de resto, segundo Hayek, podemos fazer o que quisermos. Daí que haja quem diga que ela
não nos dá ordens, mas diz-nos o que não devemos fazer, funcionando pela negativa.
Assim, as pessoas vão reagindo aos planos uns dos outros. Se a sociedade for
percepcionada como uma ordem espontânea, começamos a tentar antecipar os planos uns dos
outros e a tentar fazer outra coisa, tentando ser diferentes. Numa sociedade livre, ninguém é
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responsável pelo nosso próprio sucesso (as pessoas é que são responsáveis por usar o melhor
dos seus conhecimentos para o melhor dos seus propósitos.
Note-se que Hayek está a tentar criar um modelo de guerra fria (Made order = URSS;
Spontaneous order = EUA). Este autor é um cold-warrior.
E se a sociedade for percepcionada como uma organização? O que acontece? Falemos
então da URSS e dos países comunistas.
Ao longo da década de 30 a URSS foi aumentando a produção de aço e deu ordens
especificas aos seus países para a produção de aço. Espontaneamente, os outros países não
comunistas também produziam aço - quem produziu mais aço foi a URSS. Então, será a made
order o sistema mais eficiente? É que a curto prazo é, de facto, mas a longo prazo, até 1950,
outras coisas cruciais deixaram de ser produzidas, coisas que apareceram no mundo ocidental
(como o plástico que até substituiu o aço em certos bens). O aço não só já não tinha procura,
como havia excedentes - todo aquele aço não valia nada porque se esqueceram da
espontaneidade da procura e da oferta. Como no mundo ocidental toda a gente tinha liberdade
para produzir o que queria, deu-se lugar à inovação - não havia um propósito comum. Cada um
foi usando os seus conhecimentos para determinados propósitos. O mundo ocidental era mais
omisso, sendo por isso que foi nos países não comunistas que houve um enorme
desenvolvimento (tal como a revolução industrial que espontaneamente foi acontecendo) e foi
fazendo a diferença. Ainda hoje em dia, muitas das invenções saem da ordem espontânea
(computadores, facebook…). O que está em causa é que a maneira como cada um está a decidir
é muito diferente nas duas ordens.
Porque é que se inova então? Quem diz aos criadores que é ótimo criar determinados
artefactos - como Steve Jobs criou a Apple ou Henry Ford que criou os primeiros carros? Os
inovadores criam coisas que não são diretamente procuradas. A liberdade era fundamental. Numa
sociedade livre, como nenhuma tarefa especifica é atribuída, vamos à procura de novas coisas
para nos destacar-mos e satisfazermos necessidades, por nós próprios. Tudo isto pode ser
resumido numa palavra, que se trata da grande diferença entra as duas ordens: informação (a
maneira como ela é processada).
Numa made order, a informação tem de chegar ao líder, há uma tendência para um efeito
de engarrafamento da informação - há barreiras que são criadas. Numa ordem espontânea, se
alguém quer testar alguma coisa, não tem que prestar vassalagem a ninguém e faz o que bem
entender. A maneira como a ordem espontânea processa a informação é totalmente diferente,
sendo muito mais direta - se alguém tem uma inclinação, pode executá-la (ex: se alguém acha
numa ordem espontânea que quer vender uma água com sabor a limão, pode fazê-lo livremente).
Se numa ordem espontânea alguém nos começa a dizer o que fazer, esta colapsa. Até
podem existir made orders dentro da ordem espontânea, como eu trabalhar numa empresa e
dizerem-me lá o que fazer, mas eu vou por iniciativa própria e posso sair. Numa sociedade de
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ordem espontânea, haverá por certo um governo, debaixo da lei. E cada um de nós pode
contribuir com o melhor dos seus conhecimentos para os seus próprios fins. Mas há também
pessoas que trabalham para organizações. Numa made order, o governo diz a essas
organizações o que fazer. Todas as organizações da sociedade fazem parte de uma organização
maior, ou seja, nenhuma organização tem o poder de mudar o que vai fazer. Numa ordem
espontânea, há flexibilidade.
Regras tipicamente existem em jogos. Para jogar o jogo, é preciso uma combinação de
talento e sorte. Na sociedade, o mesmo acontece. Também no jogo, as regras dizem o que não
podemos fazer, mas nada é dito na maneira dos jogadores jogarem. Se as regras forem
infringidas, normalmente há uma penalização. Para Hayek, a ordem espontânea tem tudo a ver
com o jogo - vai desencadear bem-estar através da sorte e o talento, com a existência de um
governo que não deve tomar partido, devendo ser uma espécie de árbitro. Se cada um usar o
melhor de sim para alcançar os seus fins, o governo não deve ter nada a dizer sobre isso - só
entra quando algo colida, quando há um choque, tendo em conta as regras pre-estabelecidas.
Num jogo, podemos dizer que foi justo em que circunstâncias? O jogo é justo se a
arbitragem for justa e imparcial e não o resultado. Diz Hayek que temos uma certa tendência para
dizer que há justiça e injustiça olhando para a distribuição, para os resultados. Temos alguém
muito rico e especulamos que deve ser injusto - Hayek pergunta: será que é? Cumpriu as regras
gerais e abstratas, então deve ser justo.
E quando uma pessoa perde o jogo? Aqui está um dos momentos mais complexos da sua
teoria. Por exemplo, quando os mineiros que trabalharam a vida toda no norte de Inglaterra e
descobriram, entretanto, uma maneira de fazer eletricidade sem o carvão, originando-se uma
enorme quantidade desemprego. Em primeira instância, se já ninguém quer carvão, não ha muito
a fazer aos mineiros, que se manifestaram na rua. Isto é verídico, durante o período de
governação de Margaret Thatcher. Foi um fracasso não merecido, porque eles não têm culpa dos
avanços. O que fazer nesses casos? Ou quando uma empresa abre falência? Não há nada a
fazer, para Hayek - o Estado não deve fazer nada, ou seja, ele é contra a intervenção, até porque
não está acima das regras gerais e abstratas, é apenas um árbitro. Se ninguém quer comprar o
produto, porque razão havemos de pagar mais impostos para suportar uma empresa que já não
satisfaz os consumidores? Se começarmos a dar apoio às empresas, elas não darão o seu
máximo para satisfazer os clientes, porque têm a segurança do estado. Então, cada uma das
pessoas deverá saber que se cair, vai encontrar uma “safety net”, mas não se dá a indicação
sobre onde se deve agarrar. Ou seja, não se deve deixar essas pessoas fiquem confortáveis, deve
apenas ser-lhes dado um “empurrão” - um apoio suplementar e circunscrito, que consiste em
pegar nas pessoas que sofreram um fracasso não merecido e lança-las de novo no jogo.
Hayek distingue então dois tipos de justiça: a justiça social ou distributiva e outra, que é
compatível com a ordem espontânea - o sistema de “common ground” (a.k.a. safety net). Em
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principio, Hayek não é contra estabelecer um rede, na qual se cairmos, cada um de nós é atirado
para cima. Todos nós estamos “above the law” e acima da “safety net”. Este formato de safety net
quer contratar com a ideia de justiça distributiva, que tem como objeto não dar oportunidade para
voltar ao mercado, mas sim remunerar de acordo com o mérito. Hayek acha que temos a
tendência para pensar que na sociedade era melhor se cada um de nós recebesse de acordo com
o seu marito - para ele, isto não faz sentido. Vai dando alguns exemplos: as pessoas têm a
tendência que as pessoas com melhores intenções e mais mérito deveriam ser mais ricas. Seria
isto bom? Como ficariam os mais pobres, se os mais ricos eram os melhores? Sabiam que além
de serem pobres, não tinham tanto mérito. Porque é que as pessoas não afirmam, pelo contrário,
que a remuneração não tem a ver com o mérito? Temos uma tendência de querer chegar a uma
justiça distributiva.
Por outro lado, há pessoas que enriquecem através de más escolhas e ações - segundo
Hayek, esse é o preço da liberdade e portanto assim devem ser deixados. Que razão nos leva a
pensar que certas profissões podem estar associadas a mais mérito moral do que outras? É que
na verdad’e é que o que temos é uma espécie de imagem sobre essa profissão e temos a
tendência para avaliar as pessoas por essa profissão. Hayek que a ideia de justiça social está
sempre associada à ideia de merecimento e essa, por sua vez, ao mérito. O autor acha que numa
sociedade livre devemos fazer claro que muitas vezes os mais ricos não tiveram mérito nenhum -
tiveram, sim, sorte e talento. E ainda bem que não tem nada a ver com mérito, porque uma
justiça distributiva cria padrões de distribuição de acordo com critérios como mérito, igualdade,
etc, sobre os quais não temos conhecimento. Esta, para ele, seria uma sociedade horrível. É que,
realmente, os mais ricos não são melhores que os outros. Hayek considera que governo deveria
tratar a todos da mesma forma, porque não sabe o suficiente sobre cada um de nós.
Nós devemos tudo aquilo que temos hoje de bom à sociedade numa ordem espontânea -
se fosse organizada, não teríamos nada. Podemos tentar remexer na sociedade e arranjar novas
formas de organização, mas isso acaba por não funcionar, porque não sabemos o suficiente.
Questionamo-nos porque é que determinada pessoa ganha mais do que outra. Porque é que um
babysitter ganha menos que um mecânico? O mercado trata disso. Além disso, apesar do
babysitter, tratar de coisas mais importantes, o mecânico pode ter trabalhado mais para lá chegar.
Porque é que não há equilibrio? Porque a sociedade determina isso por interação.
Numa ordem espontânea, processamos informação que não pode ser posta por palavras.
O tipo de informação que cada um de nós utiliza é tão disperso e tão seu que não temos que
justificá-lo a ninguém. Cada um de nós tem um conhecido tácito, prático. Esse conhecimento é
muito importante porque tem a ver com a capacidade de cada, uma espécie de conhecimento
intuitivo. Nós usamos conhecimento que não notamos que estamos a usar. Numa organização, o
que há é uma perceção de conhecimento que é diferente da ordem espontânea.
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Uma ordem espontânea tem regras gerais; uma made order não tem law, tem legislação. A
regra geral e abstrata é uma boa lei, mas se a lei nos disser concretamente o que fazer, já essa,
se calhar não é uma boa lei. Nós nos sentimos vinculados a essa segunda lei. A law, a lei
verdadeira, é, de um modo geral, antiga (old) e apenas nos inibia de fazer mal ao outro; a nova lei
(new), já nos proíbe e pode transformar-nos numa organização. Hoje em dia, estamos perto de
uma organização a nível da lei, porque nos dizem o que fazer. Não quer dizer que na ordem
espontânea não haja lugar para legislação, mas deve ir de acordo com as regras gerais e
abstratas.
Hayek acha que a sociedade tem mais sucesso quanto mais perto estiver de uma ordem
espontânea - exemplifica a Europa e os Estados Unidos na década de 80. Mas como medimos o
sucesso? Uma das maneiras de medirmos o sucesso é tirar uma pessoa ao acaso da multidão
numa ordem espontânea e compará-la com outra de uma organização - provavelmente a primeira
vive melhor e é mais feliz que a outra. No seu fim, passou a ter uma justificação demográfica -
sociedades mais livres teriam um maior peso demográfico, o que não acontece hoje, talvez
porque estamos a tornar-nos menos livres.
Muita gente pergunta a Hayek no final da década de 80 o que fazer perante a organização
(URSS) - ele responde que não era preciso fazer nada, porque esta iria colapsar. Ele considera
que enquanto houver sociedade diferenciadas, vai haver uma tendência muito natural de imitação.
Hayek diz que temos a tendência de imitar - ou seja, as sociedades mais livres vão sofrer por
contágio. Muitas vezes o que vai acontecer, as sociedades livres têm mais sucesso e todos os
outros passam a imitar - não podendo imitar nos países onde estão, tentam sair de lá e ir para
norte. O norte, mais livre, não podendo ser imitado, vai ser um polo de atração, enquanto
sociedade mais rica, pelas transformações ao longo dos séculos - tivemos a sorte de estar numa
sociedade que premeia a ambição e a liberdade, que é associada à cultura e religião judaico-
cristã, que foi fomentando certas ideias que foram importantes, nomeadamente os valores da
família, que levou à ideia de propriedade e que nem todos tem forçosamente que obedecer a uma
única maneira de ver as coisas, sendo permissiva às pessoas que pensavam de maneira diferente
- e sem essas ideias, não há ordem espontânea para que cada um possa dar o seu melhor para
os melhores fins. Portanto, foi por isso que este mundo foi ficando mais rico - a tradição
combinada com uma revolução industrial, que os outros povos vão tentando copiar e caso não
consigam, acabam em barcos e tentam chegar a norte. Prevê portanto um fluxo migratório que
estejam por dentro da nossa cultura e tradição.
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AQUILO QUE
VERDADE
SABEMOS
Aquilo que sabemos está sempre a mudar. Então, se é assim, devíamos ser mais
prudentes. Se nunca sabemos a verdade, como atingimos a certeza? Será possível conhecê-la?
Um exemplo paradigmático: Imaginemos que queremos saber com certeza a cor dos
cisnes. Então, se queremos saber com certeza, lançamos um empreendimento cientifico. Como
tal, reunimos um conjunto de cientistas e outros especialistas, dos melhor que há. Estes cientistas
começam à procura de cisnes e vêem o primeiro cisne - é branco; vêem mais um - é branco;
vêem dez cisnes - todos são brancos; mil cisnes - todos brancos. Os cientistas começam a ter
bolsas mais avultadas e a viajar por todo o mundo à procura de cisnes, passando uns vinte mil -
todos brancos. E por aí em diante. Então, chegaram a isto: “All swans are white” (universal
statement).
Poderão ter a certeza que todos os cisnes são brancos? Não, porque não viram todos os
cisnes. Para termos a certeza, teríamos que ver todos, até os que não nasceram e os que já
morreram. Contudo, há aqui um ponto: podemos nunca estar satisfeitos com o número de cisnes
brancos - podemos acumular cisnes e ainda assim não podemos ter a certeza. Mas será que não
podemos ter certeza sobre nada?
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Guilherme Echeverri Teoria Política Contemporânea - 2º Semestre
Para Karl Popper, podemos alcançar certeza. De um lado temos as observações positivas
(todos os cisnes são brancos) - mas quantos cisnes não-brancos é que eu preciso de ver para ter
a certeza que a frase não é verdadeira? Basta um cisne preto, para termos certeza de que todos
os cisnes não são brancos. A isto se chama a assimetria dos universais.
Segundo Popper, a ciencia funciona na ótica das afirmações, para indicar o que está certo.
É a tentativa de perceber melhor os fenómenos e que nos dá de alguma forma um poder de
premonição. Dizer “alguns cisnes são brancos” já não é ciência. Pelo facto de conseguirmos
refutar a primeira afirmação, ainda mais ciência se torna.
À universal statement, Popper chamou conjetura. O aparecimento do non-white swan é a
refutação. Por sua vez, uma conjetura é passível de ser submetida a testes - corroboração.
Então, o que Popper está a dizer sobre a ciência? Para ele, os cientistas lançam
conjeturas (dizem frases do estilo mencionado) e o que devemos nós, outros cientistas, fazer a
seguir? Devemos procurar refutar a sua conjetura, tentando procurar cisnes que não sejam
brancos. Todo o trabalho da ciência é um trabalho de mera destruição, ou seja, todo o trabalho
cientifico passa por destruir. Isto tem um nome em ciência: Popper chamou-lhe de crítica. Todo o
trabalho do cientista é criticar - ou seja, tentar mandar abaixo a teoria do outro, para chegar a
uma mais correta (atenção: o cientista que diz que todos os cisnes são brancos pode estar errado,
mas isso não nos diz nada sobre ele).
Todo o nosso conhecimento é, portanto, conjetural - vamos tentando refutá-lo para chegar
à verdade, mas nunca lá chegamos. O que precisamos para que o nosso conhecimento avance?
O conhecimento avança, falsificando (não é corroborando, é pela observação negativa, que no
permite saber mais). Devemos desconfiar e procurar, pedir apoio, e para isso, temos que ter
liberdade - ingrediente essencial para a busca do conhecimento. Em liberdade, desconfiamos,
mesmo que pareça um absurdo achar o contrário. Portanto, não há campo nenhum de estudo que
esteja vedado - toda a gente pode refutar e conjeturar o que quiser (mas as refutações é que
fazem avançar o conhecimento). A prova empírica é importante para provar a conjetura após a
refutação, mas não é a que mais importa, porque nenhuma tem a autoridade - sonhos,
imaginação, razão também contam. Quer isto dizer que talvez não haja nenhuma fonte de
conhecimento que seja superior às outras (cientistas vs. outras fontes, por exemplo).
A conjetura deve ser cientifica, isto é, deve ser submetível a teste, ou seja, se for possível
provar que está errada. E a verdade é que nenhuma teoria é totalmente certa ou melhor do que
outra, porque ainda assim, mesmo que date 700 anos, pode ser refutada. Todo o conhecimento
está susceptível a ser refutado, sendo submetida uma teoria a teste. NENHUMA teoria é a
verdade. Todas as teorias são tentativas de explicação. As teorias refutadas têm então mais valor
que as teorias corroboradas no avanço do conhecimento.
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Guilherme Echeverri Teoria Política Contemporânea - 2º Semestre
Não é que estejamos perdidos e não saibamos nada - o que nós sabemos é o que não
existe. Não se trata da procura do consenso e do acordo, mas sim da diferença. O conhecimento
só estagna quando não há liberdade para refutar.
II
Popper dedica uma parte importante à discussão de dois conceitos da democracia. Talvez
onde este assunto se torna maior revelante foi uma palestra dada em Lisboa na Gulbenkian.
Popper diz que há dois conceitos de democracia e que o conceito mais comum é também
o mais antigo que remonta a Platão, mas que é um conceito errado. Popper vai propor um novo
conceito que segundo ele faz justiça à experiencia. Na tradição os filósofos criticam um modelo da
realidade e procuram alterar a realidade de acordo com o ideal, mas para Popper, o modelo ideal
de Platão esta errado e é necessário um novo conceito que corresponda a realidade. Primeiro
temos de conhecer a democracia antiga, depois, a critica de Popper à mesma, e por fim, saber
qual é a sua proposta para a nova democracia.
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Guilherme Echeverri Teoria Política Contemporânea - 2º Semestre
Agora passamos à critica de Popper. Há duas dimensões para esta critica. Uma é
sobretudo empírica, a dizer que a teoria não corresponde aos factos, e se a teoria não
corresponde aos factos é fatal, como sabemos pela sua teoria do conhecimento. As teorias
existentes com sucesso não correspondem ao governo de todos de Platão. A segunda dimensão é
puramente lógica e filosófica, que diz que esta maneira de olhar para a democracia e os regimes é
Auto contraditória, paradoxal. Popper diz que se aceitarmos que o melhor regime é a monarquia, e
vamos submete la a teste, e a pergunta é: se eu disser que o melhor regime é aquele em que o
melhor governa, oque acontece se esse, que é o melhor para governar, decide entregar o governo
a alguns ou a muitos? De acordo com isto, ele estaria a destruir o melhor regime. Este paradoxo,
não acontece só no caso da monarquia. Se eu disser que o melhor regime é o de alguns, o que
acontece se entregarem o poder a um ou a todos? Acontece o mesmo. O paradoxo é o facto de
eles poderem tomar essa decisão, mas, ao faze-lo, estão a destruir o melhor regime. O mesmo se
passa na democracia, se ela passar o governo a alguns ou a um.
Portanto, qualquer definição de melhor regime leva a um paradoxo, pelo facto de ser
autodestruído sem ser contraditório à definição inicial do regime.
Vamos agora passar à terceira parte, a apresentação de uma visão alternativa. Qual é a
origem do paradoxo anterior. Ele ocorre por causa da pergunta inicial. Qualquer tentativa de
resposta vai levar a um paradoxo. Temos de abandonar esta pergunta e encontrar uma mais
compatível com os factos. Então Popper propõem uma nova pergunta não sobre quem governar,
mas sim, sobre como governar. Quando remetemos a pergunta para um quem estamos à procura
de uma resposta numa pessoa, mas com a pergunta sobre o como, estamos a remeter para
procedimentos. Assim, a pessoa tem de se adaptar aos procedimentos, e não os procedimentos
que tem de se adaptar à pessoa. Mas não é só isso, porque se não perguntávamos como
devemos governar simplesmente.
Uma primeira versão da pergunta, para evitar o paradoxo, seria “how to dismiss bad
governments without bloosdhed”? Aqui a pergunta remete para um entendimento negativo.
Enquanto que anteriormente perguntamos quem eram os melhores deviam governar, agora, oque
perguntamos é quem não deve governar, no sentido do menos mau. É uma formulação negativa e
procedimental. Outras perguntas foram: how to avoid tyranny? How to allow change without
bloosdhed/violence.
Ao começar a discutir esta pergunta, chama a atenção para o facto da primeira resposta
característica de um procedimento que impeça a tirania sem violência é a ideia de limited
government/governo limitado, tem de haver um poder acima do governo. Na democracia antiga
não havia nenhuma referencia a limites do poder. O conceito é do rule of law, a ideia de
constitutional government. O governo tem de estar abaixo da lei.
Popper diz que se começarmos a olhar para o melhor regime nos começamos a descobrir
que esta ideia de governo limitado não é uma ideia moderna. A democracia se for entendida como
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Guilherme Echeverri Teoria Política Contemporânea - 2º Semestre
governo limitado é uma experiencia que remete para a Grécia antiga, o Imperio romano, mas que
tem especialmente origem com a Magna Carta de 1215. Uma proposta que limita o poder do rei.
Inclui determinados direitos que o rei não pode abolir, como o facto de não poder aprisionar
alguém sem acusação, não poder ser impedido de ir ao estrangeiro, não poder ter propriedade
nacionalizada por sair do país, ter direito a ser julgado pelos seus pares, o direito à propriedade
privada. É aqui que vai aparecer a ideia fundamental do Parlamento, inicialmente, devido á
aceitação ou não de impostos, porque o rei não poda criar impostos sem a aceitação do
parlamento. O ponto de partida da Revolução Americana, pelo facto de os impostos não terem
sido aceites pelos representantes das colonias americanas.
Popper diz nos que se olharmos para a questão do melhor governo na visão da nova
pergunta, começamos a verificar que a experiencia do governo limitado distingue a democracia já
há séculos. Popper defende a aceitação de procedimentos ligados ao governo limitado, para alem
da existência da constituição, tem de haver uma separação de poderes que se devem
contrabalançar. E ainda, a ideia do Bill of Rights, direitos fundamentais de não podem ser
infringidos por nenhum individuo ou governo. Por fim, há a ideia de accountability to parliament.
No entanto, dizem muitos, que ele acaba o argumento com o parlamento, como se fosse o
argumento do governo de todos, acabou por definir a democracia da mesma maneira que Platão e
Rousseau na democracia antiga. Mas, na definição, o parlamento é fundamental, mas como
elemento fiscalizador, o ponto é compreender o seu papel fiscalizador under the rule of law. Não é
a fonte de um governo absoluto como acontece no governo de todo de Platão. O parlamento é um
dos procedimentos para impedir que caiamos numa tirania.
Karl Popper defende a sociedade aberta à critica, à tentativa e ao erro, à refutação e ao
conhecimento. Como procurámos o cisne negro, vamos identificar o governo ilimitado - a tirania.
Não vamos procurar as democracias para justificar que é o melhor (que é um check, um travão,
para evitar o pior dos regimes) - vamos procurar o pior para o evitar. Então, passamos a falar
sobre procedimentos e não sobre a fonte do poder - como se governa e não quem governa.
III
Agora, passamos a falar sobre os inimigos da democracia - Platão (e Aristóteles), Hegel e
Marx. Mas como Popper não quer falar em pessoas, vamos criticar as teorias dele. Os inimigos
não são as pessoas, são as maneiras de pensar, que nos fazem aproximar de uma sociedade
fechada. Se vamos falar em quatro maneiras de pensar que estão erradas, temos que pensar que
estes inimigos ainda perduram porque têm a sua força.
O principal inimigo de todos para Popper é o relativismo, uma atitude intelectual (dividido
em quatro). Uma sociedade fechada e presa é o resultado destes quatro inimigos (Four
conceptual enemies of the open society): uma das maneiras de pensar chama-se historicismo,
outra chama-se positivismo (ético), outra denomina-se coletivismo e a última utopianismo.
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1) Historicism
2) Ethical Positivism
Relativism
3) Collectivism
4) Utopianism
Para o relativismo, entre dois enunciados, não poderemos saber nada sobre um ou o
outro, ou seja, tudo é possível ou não. Afinal, quem pode dizer entre dois enunciados qual é
verdadeiro ou qual é falso ou se ambos o são? Ninguém tem conhecimento suficiente. Nada se
pode dizer sobre nada. Esta atitude intelectual é inimiga da sociedade aberta. Tem um monte de
problemas: um deles é que se não podemos dizer nada sobre nada, já estamos a afirmar algo ao
dizê-lo. É por isso que há quem diga que é absurda. O relativismo não se inibe a si próprio de
dizer que nunca saberemos nada sobre os enunciados, que tudo é relativo ou que tudo é igual ao
seu contrário. Como sabemos que nunca o saberemos?
Estes autores encontraram formas intelectuais e conceptuais de criar o mesmo tipo de
situação que um relativista criaria através das quatro palavras anteriores. Este tipo de relativistas
nunca vão sair de cena, uma vez que vão estar sempre “corretos” (vão estar sempre a dizer-nos
coisas como “todos os cisnes são brancos” ou “free beer tomorrow”).
Historicismo
Quem lança a ideia do historicismo é Hegel. O historicismo é a crença de que a história
está escrita e pré-determinada. É a crença de que tudo aquilo que podemos ou não fazer não
altera o decurso da história. É, por isso, uma forma de determinismo: a própria história determina
a história, através de um conjunto de leis históricas que existem independentemente da nossa
vontade, que vão sempre existir e que não vamos conseguir modificar. Façamos o que fizermos,
esta vai desenrolar-se por si mesma.
Segundo os historicistas, podemos tentar alterar o rumo da história mas isso não vai servir
de nada porque a história está escrita, tal como acontece num filme. Tudo o que podemos fazer, a
partir da liberdade, é adiantar um pouco a história. Se ela está totalmente escrita e determinada,
porque razão os revolucionários marxistas fizeram tantos esforços para a sua revolução? Para
adiantar o ritmo da história, não para a mudar. É essa a única liberdade que temos.
Há leis de ferro da história e, portanto, a passagem dos vários estados que falámos em
Marx - comunismo primitivo, escravatura, feudalismo, capitalismo - é inevitável. Pode ser
considerada uma forma de relativismo porque não há ação livre, ou seja, o que fizermos está
embutido em “leis escritas”. Esta crença isenta-nos de qualquer coisa - tudo pode ser considerado
inevitável, funcionando como uma espécie de justificação: “Porque aconteceu o Holocausto? Era
inevitável, não poderíamos alterar o rumo da história…”
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Guilherme Echeverri Teoria Política Contemporânea - 2º Semestre
Sendo assim, dizer que a história está escrita é o mesmo que dizer, como na teoria de
Popper, que todos os cisnes são brancos. Isto não nos leva a lado nenhum e não vai acrescentar
nenhuma teoria, nem se trata de ciência porque não há maneira de testar.
Karl Popper apresenta uma serie de argumentos contra o historicismo, mesmo que seja
impossível de refutar pelo facto de constituírem profecias: o historicismo diz que a história está
determinada e tem determinadas fases - se isto for verdade, porque é que o historicista acha que
a próxima fase será aquela que ele acha que é? Outra questão: se Marx diz que são as
metodologias e as estruturas da sociedade que nos dão cada uma das fases e que nos vão levar
até as próximas, como sabe ele a próxima, o comunismo? Para Popper, ele só poderia saber da
próxima quando ela acontecesse. Não teríamos uma forma de dizer que fase é que temos no
futuro se ela não fosse presente. A única forma do historicismo ser lógico era passar-se o futuro,
também ele próprio, hoje. Se o comunismo é o regime do futuro, então já é o regime de hoje. Para
ter razão, tem que anular o efeito do tempo e realizar-se no momento que está a ser dito.
Positivismo ético
Por exemplo, afirme-se que “o comunismo será o futuro” - vamos supor, por um segundo,
que esta frase é verdadeira, de forma a analisar o argumento. Há quem ache que se esta frase for
verdadeira dela decorre necessariamente a frase “Eu deveria apoiar o comunismo”.
Se o comunismo for realmente o futuro, temos um facto (quase um “is” em vez de “will”).
Aqui não estamos a usar um facto (“ought to support” e não “will support”). Porque é que estamos
a atribuir uma espécie de moralidade a um facto?
Esta mistura acontece porque se isto for inevitável, se realmente vai ser o futuro, então eu
devo sê-lo, porque é o comunismo que vai triunfar e toda a sociedade vai sê-lo. No meio das duas
deveria estar “I choose to support only winning causes”. Os valores devem ser reduzidos a factos.
Se o positivista acha que deve apoiar os vencedores, por facto, então, quem é que o
positivista apoia mesmo? Quem é o vencedor? É a pessoa que teve mais capacidade, o mais
forte, o mais temível - há um lado físico nisto. É como dizer “Eu escolho, moralmente, estar do
lado do mais forte”.
“Might is right” - ou seja, quem tem poder e a força, vai dizer-nos o que está de facto
correto, enquanto valor. Isto é o resultado do positivismo ético. Quem tem mais força diz que valor
prevalece. Se formos positivistas éticos, confundimos força e direito. É uma ideia que retira a
liberdade individual, ficando acomodado ao vencedor, a quem ameaça mais. Não há direito, não
há valor, não há mais nada correta a não ser a causa vencedora - o mais forte determina tudo.
Esta a uma maneira de olhar para o relativismo de uma forma muito mais pragmática.
Coletivismo
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É outra atitude intelectual que acredita que há uma entidade moral coletiva, diferente dos
indivíduos que a compõem. Trata-se de uma ideia de que uma ação pelo coletivo é melhor do que
pelo individual.
Karl Popper apresenta algumas razões para não associarmos coletivismo ou
individualismo diretamente a ações coletivas ou individuais. Vai um pouco mais longe - vai achar
que muitas ações que podem ser feitas em nome do coletivo podem não ser boas ou até muito
egoístas; por outro lado pode ser haver ações individuais com muito boas intenções.
Os coletivistas têm tendência para se ver a si próprios como uma espécie de entidade que
aja bem toda junta, melhor que todas as outras. Pensa que há uma dimensão tribal por acharmos
que um determinado coletivo, com algo que nos une, somos melhores por alguma razão.
O que Popper usa como contra-argumento é: vermo-nos aos grupos causa tensão entre
grupos, por exemplo, colectivos que quase entram em guerra por serem diferentes. “O coletivo
não pode ser agente moral, porque o coletivo não pensa, não age, não espera, não tem voz” -
provavelmente terá alguém que falará pelo coletivo e, portanto, até o coletivo precisa do individual.
Por outro lado, o coletivismo e o extremo individualismo são faces da mesma moeda -
individualismo muito extremo é coletivismo dissimulado. Por exemplo, no comunismo, há
coletivismo, mas com um líder com todo o poder também há o extremo individualismo.
Olhar diretamente para as pessoas é muito mais importante, especialmente porque
determinadas pessoas pertencem a determinados grupos, sem opção de escolha.
Não há tensão nenhuma entre os sentimentos de grupo que um indivíduo possa ter, que
até podem ser bons, mas pensarmos que estamos acima de algo por estarmos num grupo já
constitui um inimigo à democracia. É relativismo porque é auto-justificativo.
Utopianismo
Para Karl Popper, utopia e violência são o mesmo, são quase sinónimos.
Pensa que existem várias fontes de conhecimento: a utopia vai ser resultado de uma que
não vai considerar totalmente correta. Como já vimos, as fontes de conhecimento não eram assim
tão importantes, pelo simples facto de precisarmos da refutação.
Popper considera que temos duas maneiras de pensar, ambas com fé na razão:
racionalismo dogmático e racionalismo crítico. A utopia está a associada ao racionalismo
dogmático, associado a Platão.
Para Popper, o crítico pode ser mais interessante que o dogmático, porque ele inclui a sua
própria crítica, no qual o cientista, o verdadeiro cientista, aceita o próprio erro eventual da sua
teoria e dá a possibilidade a outros para ser refutada. Ou seja, o papel da refutação é
fundamental. O racionalismo critico é aquele que sabe que, em princípio, a própria razão não lhe
dá teorias assim tão acertadas.
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Guilherme Echeverri Teoria Política Contemporânea - 2º Semestre
Esta critical reason vai então trazer um modelo em que a política é o contrário de global e
utópico - a política, o esforço politico, tem que entrar nas nossas vidas não para uma utopia
global, mas de forma parcelar (engenharia social parcelar). Não projeta toda uma sociedade,
mas vai atuar aos bocadinhos não sobre bens abstratos (por exemplo promover a saúde, de
forma global), como na utopia, e sim sobre males concretos - ex: em vez de promover a saúde,
ter formas de combater em forma de doença. Para Popper, é muito mais fácil concordarmos que
uma pessoa está doente, mas sobre aquilo que é o melhor modo de vida em saúde, cada um vai
ter a sua visão diversa - e cada um usa a saúde à sua maneira, não havendo qualquer problema
nisso. Então, o governo deve estar presente, quando alguma coisa está mal e não para melhorar
o que já está bem - é ver o cisne preto. Vamos aliviar o mal concreto através do sistema de
Piecemeal Social Engeniering, em vez de promover bens abstratos como os dogmáticos.
No fundo, o que temos é a defesa de uma intervenção indireta, sempre de um lado
negativo - como nas outras teorias que estudámos. Há quem chame a isto uma forma de
utilitarismo negativo.
Numa sociedade aberta, temos que ver-nos livres do relativismo, seja qual for o tipo.
Oakeshott
I - Samões
É dos autores mais peculiares e sugestivos, desde programa.
Oakeshott vai criticar uma certa maneira de olhar a política e vai, depois, apresentar a sua
proposta.
É o único autor, dos que vamos abordar, que nunca esteve em exílio. É, também, o único
autor inglês.
Dividiu o pensamento político, em dois. Para Oakeshott, dá duas grandes maneiras de
olhar a política. Essas duas maneiras, podem ser colocadas em grandes blocos: the politics of
faith, and the politics of scepticism.
Todas as maneiras de pensar a política, podem ser agrupadas nestes dois grupos.
Oakeshott parece querer dizer que é conservador, e vai pôr este adjetivo, do lado do ceticismo.
Vai associar fé, a outra atitude intelectual, que não é tanto do lado conservador: a fê na política.
Quem tem fé na política? O racionalista, em política. A expressão atual da fé da política, segundo
Oakeshott, é o racionalismo. Vamos, primeiro, falar sobre as politics of faith (or passion).
Estes dois grupos vão, contudo, tomando formas diferentes, ao longo do tempo. Depois da
Revolução Francesa, a politics of faith não é apresentada, como politics of faith, mas sim como
racionalismo, em política. Crença de que o esforço político racional, conseguia resolver todos os
problemas.
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Estávamos, até aqui, presos a certas tradições que não eram propriamente racionais, e a
partir da Revolução Francesa, passa a ser prevalecer o racionalismo.
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aparecem imposições, sanções, penas, para quem não quiser o melhor. O racionalista acha,
sempre, muito estranho, existir alguém que não queria o melhor.
O Estado é o maestro, alguém que nos vai dizer, o que tocar, para daqui resulte uma
harmonia, que é o melhor. Esta harmonia é uma espécie de propósito, um fim a atingir, através do
esforço político. O racionalismo, em política, leva-nos a olhar a sociedade, como se esta fosse
uma empresa, uma empresa governada, pelo governo -- Enterprise Association.
Hayek diz que a Enterprise Association, faz lembrar a made order. Oakeshott discorda.
Para Oakeshott, a ordem espontânea está do lado da fé. Também a ordem espontânea,
acha que tem uma espécie de melhor, a alcançar. Oakeshott disse, sobre Hayek, que um plano
para destruir todos os planos, pode ser melhor do que o oposto, mas pertence ao mesmo estilo de
política -- um plano para destruir planos, não deixa de ser um plano. Hayek não deixa de ser um
racionalista, e Oakeshott acha que, todos os tipos de racionalismo, levam a uma política de
perfeição, e à hostilidade.
Há uma certa atração pelo racionalismo, sendo que certas correntes racionalistas, são
conservadoras. Alguns conservadores, têm a tendência para serem racionalistas, como
Oakeshott.
Em que é que será, que é baseada a política do ceticismo?
É difícil falar sobre a disposição do ceticismo, porque não é um credo, e não é uma
ideologia. O capitalismo, o comunismo, etc., têm todos fins, apontam para algo que tomam como
melhor. O ceticismo é apenas uma disposição, que vai ser baseada no presente. Com uma certa
ligação ao passado, e sem estar obcecado com o futuro. Vai, acima de tudo, estimar o presente. O
cético não escolhe a beleza, escolhe pelo apego, algo que se sente, e que pode não ter uma
justificação racional. Oakeshott procura que a política não esteja tão voltada, para a própria
política, mas que vai ter outro fim: aquilo que nós aproveitamos -- enjoy the present.
II (Espada)
Um dos seus argumentos mais originais: a principal distinção da historia do pensamento
politico ocidental não é propriamente entre esquerda e direita, mas, fundamentalmente, uma
conversação entre dois tipos de olhares, de entendimentos, sobre a natureza da ação política. A
uma dessas interpretações Oakeshott chamou “política de fé” (inicialmente de paixão); a outra,
chamou “política do ceticismo”.
Isto não é propriamente entre famílias políticas e si sobre os olhares sobre a política. Mas,
dentro destes dois é possível encontrar vários tipos de famílias políticas. Tanto a fé como o
ceticismo são ATITUDES políticas.
Oakeshott acrescentou a isto o seguinte: no mundo moderno, em regra, associa ao pós-
revolução francesa (1789), a principal expressão da política de fé, que é o racionalismo político.
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Para que não haja contradição, quando se fala em fé, não se trata de religião; está a falar
sobretudo em fé na política. Embora no passado, tenham havido políticas de fé que tivessem tido
expressão religiosa, fala-se agora de fé na razão. Já a principal expressão da política de
cepticismo do mundo moderno é aquilo a que chamou de “disposição conservadora”.
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espontaneidade dos arranjos locais, mas é produto do desenho racional, vou necessitar de
generalizar a melhor solução e, por conseguinte, vou precisar de centralizar poderes, para libertar
as pessoas que não estão racionalmente iluminadas. Isto gera intolerância sobre modos de vida.
Mas quem vai fazer tudo isto? É o Estado, esclarecido, racional, que vai ser como um maestro
que vai mobilizar os contributos de cada membro da sociedade com vista a alcançar um propósito
comum, que é o melhor.
C: The State As Umpire - o Estado é visto como um árbitro. Há um paralelo com um jogo,
porque o árbitro não joga e não toma partido das outras partes. Este não dirige a sociedade,
apenas aplica as regras do jogo. A principal função do Estado é fazer respeitar a lei (e não criar a
lei) - rule of law. Os cidadãos é visto de uma forma abstrata - são as equipas do jogo. Esse
cidadão está enraizado em modos de vida (ways of life). A questão crucial aqui é que a função
essencial do Estado é proteger o usufruto de diferentes modos de vida, que não foram
centralmente desenhadas e muito menos impostos.
R: A política é o centro. Algumas correntes nacionalistas chegaram a dizer “A política é a vida
toda” - tudo é política. Tudo tem a ver com o desígnio racional e portanto o indivíduo e muito
importante, devendo ser politicamente aware.
C: Para esta tradição cética, a política é apenas uma ordem superficial, que não deixa de ser
muito importante. O que quer dizer é que esta não deve ser imposta. Esta ordem superficial é
fundamental para poder garantir que nós, cidadãos, podemos jogar. O centro das nossas vidas é:
“Enjoying our own ways of life”, daí a política ser superficial. Ninguém os desenhou, ninguém
os impôs, portanto são nossos e são variados. Quando há ways of life hostis, o árbitro entra em
jogo, daí ser fundamental para manter as regras. É para garantir que ninguém invada a liberdade
do outro.
Oakeshott diz que dentro da disposição conservadora, está a disposição to enjoy our own
ways of life, que não foi centralmente decidido e imposto. Daí todo o ceticismo aos elementos já
mencionados. O nosso way of life pode não ser o melhor, mas é o meu e para mim é o melhor, é
onde me sinto confortável.
Então, quais são as duas atividades que melhor exprimem a conservative disposition?
pescar e entreter os amigos. É que pescadores, como passatempo, apanham o peixe e voltam a
pô-lo no mar - ou seja, não são os resultados que interessam, mas o “enjoy”.
III
As políticas conservadoras não são doutrinas, são formas de estar. Para o
conservadorismo, ser conservador é preferir o certo ao incerto - limitado ou ilimitado. É preferir o
que temos ao que podemos ter; o conhecido ao desconhecido; o experimentado ao não
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Liberdade Negativa
Para Isaiah Berlin liberdade negativa é algo que não está lá. Na negativa, temos a ideia de
ausência - Berlin disse, “aquilo que não está lá, é coerção”. Este “não” dá-lhe o lado negativo.
Então, eu sou livre na ausência de coerção, numa esfera de não intromissão. Para tornar o
conceito claro, acho que a coerção tinha que incluir a intencionalidade. É, portanto, ausência de
coerção intencional por terceiros. A liberdade só é restringida quando alguém nos inibe de fazer
alguma coisa. Estas liberdades são relações entre homem contra homem. Eu só sinto falta de
liberdade se alguém me impedir. É uma liberdade DE (“liberty from”) e não para fazer.
LIBERDADE NEGATIVA
Ausência de coerção intencional por terceiros.
Liberdade Positiva
O que seria uma liberdade positiva? Vai ser uma capacidade. Por exemplo, uma pessoa
sem pernas pode andar de bicicleta? Pode, mas poderá não conseguir. Ou, uma pessoa que não
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fala alemão pode ler o original de Engels? Pode, mas não perceberá nada. Portanto, esta tem
mais a ver com a realização de uma determinada ação. Trata-se da capacidade de agir.
Mas então se a liberdade positiva permite ler Engels, andar de bicleta, então a liberdade
positiva é uma liberdade para aquilo que eu quiser fazer. É uma liberdade PARA (“liberty to”)
fazer TUDO.
LIBERDADE POSITIVA
(Igual) capacidade de agir.
Por exemplo, para viajar à Austrália - Na negativa, se eu quiser viajar, posso fazê-lo sem pedir
autorização a quem tem o monopólio da coerção - o Estado (sem prestar-lhe vassalagem), isto é,
ninguém nos pode impedir. Na positiva, é preciso ter capacidade de pagar para viajar.
• Dimensão política:
- N: a mesma definição serve de resposta para todas as definições.
- P: capacidade igual de decisão política, em termos de participação da feitura da lei: mas para
isso tem que existir uma entidade que represente a vontade geral de todos, ou seja, todos
participam de igual modo. E se alguém discordar? É porque ainda não é livre - terá que ser
forçado a ser livre.
• Dimensão cultural-filosófica:
- N: a mesma definição serve de resposta para todas as definições (eu penso como me apetecer
- liberdade de consciência, expressão, opinião etc.
- P: capacidade de pensar como o todo pensa, que é a melhor forma de pensar, porque essa é a
mais correta. Vai, por isso, haver uma linha oficial de pensamento, através da qual somos livres.
Sou livre na igual participação na verdade. Isto retira todo o peso e importância à liberdade.
Liberdade que seja apenas liberdade de pensar da forma que os outros achem correta, não é
liberdade nenhuma.
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Mas se cada um pensa da maneira que quiser, do ponto de vista negativo, cada um
hierarquiza os seus valores e pensa da maneira que quiser. O facto de cada um ter a sua noção
não só não tem mal nenhum, como tem valor. Berlin chamou a esse valor de pluralismo. Se nós
nos inclinarmos a esta noção de liberdade, teríamos um sistema pluralista.
E qual é o contrário de pluralismo? O sistema torna-se monista: a crença na qual só há
uma hierarquia de valores, sendo que as pessoas apenas participam nessa escala.
Isaiah Berlin argumenta que o tipo pluralista cria sociedades mais tolerantes e pacíficas.
Quando se diz que os pluralistas não querem muito saber da vida dos outros, não querem mesmo
- há uma certa dose de desprezo (“não interfere comigo, deixa-o estar”). Isto obriga as pessoas a
não (se) levarem tudo muito a sério. Deixar as pessoas serem como são, não tem mal nenhum, a
não ser que haja uma regra que é voluntária.
Há quem critique que esta liberdade negativa fica na borderline do relativismo.
Embora não tenha sido muito conhecido, começou-se a tornar conhecido a seguir à sua
morte quando os seus assistentes e alunos se começaram a tornar conhecidos. Afinal quem era
Leo Strauss? É um dos autores acerca dos quais há muitas interpretações, nomeadamente de
Alan Bloom, que escreveu “A Cultura Inculta”.
Leo Strauss introduz as vagas de modernidade com: “É apropriado por mais razões que a
mais óbvio de todas que eu devo começar esta série de aulas citando uma passagem da
declaração da independência”. A nação dedicada a esta proposição tornou-se, devido a esta
dedicatória, a nação mais poderosa e próspera da Terra”.
“Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são
criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a
liberdade e a procura da felicidade. Que a fim de assegurar esses direitos, governos são
instituídos entre os homens, derivando seus justos poderes do consentimento dos governados;
que, sempre que qualquer forma de governo se torne destrutiva de tais fins, cabe ao povo o direito
de alterá-la ou aboli-la e instituir novo governo, baseando-o em tais princípios e organizando-lhe
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os poderes pela forma que lhe pareça mais conveniente para realizar-lhe a segurança e a
felicidade.”
Será que esta nação, na sua maturidade, ainda tem esta fé em direitos inalienáveis? Será
que ainda temos direito à liberdade e à busca da felicidade? E se temos porque é que temos?
Na década de 30, um diplomata poderia dizer que a fundação dos direitos humanos eram
autoevidentes para todos os americanos, mas ao mesmo tempo, os académicos alemães,
poderiam descrever uma diferença entre o pensamento alemão e o pensamento ocidental (EUA),
sendo que este último estava ainda apegado ao direito natural. Por outro lado, na Alemanha os
termos desapareceram. Abandonando este termo, com todas as incertezas e questionamentos, o
pensamento alemão criou um sentido historico e isso levou-a a um relativismo sem limites.
Mas aquilo que era uma descrição do pensamento alemão no principio da década de 30
tornou-se hoje corrente em todo o mundo ocidental. Não seria a primeira vez que uma nação
derrotada no campo de batalha iria impor aos vencedores o julgo do seu próprio pensamento.
Com o final da guerra, o Ocidente “comprou” o relativismo aos alemães. “Estão a ver como não há
direito natural? Como o mais forte mata o mais frasco?”. Para a Alemanha não era nada
autoevidente. Assim, a Alemanha sentiu de forma mais profunda e precoce os “three ways of
modernity”.
A Alemanha “ganhar” deixou-nos a dúvida: teremos direito à vida, à liberdade, à
propriedade e à busca da felicidade? O que aconteceu para deixarmos de ter a certeza do que
somos? Porque é que deixamos de ter direito natural? E o que são estas vagas de modernidade?
As vagas de modernidade são três ideias que aparecem ao longo do tempo e no final do
qual ficámos todos relativistas. Estas vagas operam contra um determinado pensamento,
nomeadamente o do direito natural.
Donde é que esta ideia vem? Segundo ele, como resultado da interacção, da acção entre
duas cidades, Atenas e Jerusalem. Há dois homens muito importantes nessas cidades que
discordariam em muitas coisas, mas concordariam num ponto: Jesus Cristo e Sócrates.
Eles concordariam que havia uma distinção entre o bem e o mal. Ambos acreditariam que
Right não é a mesma coisa que Wrong. Esta ideia é verdadeira independentemente da nossa
vontade: de acordo com a filosofia clássica e o cristianismo - é assim por natureza.
Isto gerou a ideia de que aquilo que deveria ser está a um novel diferente de aquilo que é -
e esta diferença também é by nature. Desde Sócrates a Jesus Cristos e a todos os seus
discípulos, que se segue esta ideia do que deveria ser.
Há uma medida objetiva daquilo que deve ser e o que é, porque há diferença entre o bem
e o mal, uma cidade considera que podemos chegar à resposta pela razão/filosofia e outra pela fé.
Encontramo-nos perante a filosofia clássica e a cultura judaio-cristã. Esta medida é exterior a nós.
Os autores deixam de ser clássicos, para Leo Strauss, com Maquiavel com 1516. Ele faz
parte da primeira vaga de modernidade. Todos os autores anteriores a ele falaram do que
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deveria ser, de coisas que nunca se realizaram, embora concorde com elas. Mas para ele, estes
autores clássicos têm falado tanto do que deveria ser, que deveria falar sobre aquilo que é - da
política tal como ela é. E o que é a política?
A política é uma mera técnica para alcançar o poder. Custe o que custar, por todos os
meios, seja de que maneira for. É alcançá-lo e mantê-lo e usar todos os meios disponíveis para
assim ser. É não estar à mercê da sorte/fortuna. Devemos ter um povo incorruptível e se não o for,
torná-lo assim e usar a força necessária. Com isto, Maquiavel só esta a contribuir para a
discussão. Há quem diga q não deveria ser, mas é o que é e Maquiavel não discorda dos seus
antepassados.
Hobbes vem operar nesta mudança feita por Maquiavel. O que é que as pessoas são? As
pessoas, na realidade, movem-se por paixões, desejos. No entanto, há algo que todos nós
tememos e que nos torna iguais. É um instituto de auto-preservação, o medo - daquilo que mais
rejeitamos, que é a morte, mais precisamente, a morte às mãos de outros homens, que sejam
nossos inimigos. Temos usado o conceito de virtude para procurar o bem, mas porque não
inverter e entender aquilo que nos causa mais medo? Deveríamos ver realmente como os homens
realmente vivem, olhando para nós próprios num sentido descendente, com um movimento de
“abaixamento do olhar” cada vez mais racional, enquanto a razão ganha cada vez mais
importância na primeira vaga.
Contudo, a primeira vaga deixou intacta a diferença entre o ser e o dever ser, não
conseguindo destruir o hiato entre estes dois. É aqui que aparece a segunda vaga, protagonizada
por um autor suíço - Jean Jacques Rosseau. Este acha que os da primeira vaga não tinham total
razão, porque na realidade aquilo que deve ser não pode ser assim tão diferente daquilo que nós
todos queiramos. Imaginemos que só existimos nós e todos nós queremos algo: provavelmente
isso é bom. Ou seja, se eu encontrar algo que nos torne a todos livre ao mesmo tempo e que
todos queiramos na mesma medida, sem excepção, isso será certamente bom. É a ideia de
vontade geral. Quer isto dizer que podem haver elementos que são para todos e de todos - algo
que vem de nós todos e que todos damos o consentimento e que vemos como bom e que se
dirige a todos, é a vontade geral. Se todos tivermos a mesma vontade e todos a pudermos ter,
todos consentimos e obtemos. Então, considera que a diferença entre o ser e o dever ser deve ser
ultrapassada. Se todos quisermos é porque é bom. Queremos no ser, mas pela vontade geral
queremos pelo dever ser. Se todos quisermos algo que pode servir a todos, é a vontade geral - a
vontade geral por ser já é aquilo que deve ser. Este foi o impacto da segunda fase.
Entretanto, há uma espécie de sub-vaga, diz Strauss, é aquela a que chamamos a “escola
histórica” alemã, protagonizada por Hegel e Marx. Esta sub-vaga introduziu ideias simples: se nós
encontramos um momento no qual queremos a mesma coisa, esse momento é um momento
histórico e um dos exemplos dessa situação está na revolução francesa, inspirada por Rosseau.
O que seria conseguirmos prolongar esse estado de vontade geral, que já existia? Vamos ter
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sempre situações umas a seguir as outras em que a história vai andando por via das nossas
vontades. Marx acrescente que isso é verdade, mas considera que a história acha que é uma
fricção entre infraestrutura e superestrutura (que inclui a nossa vontade), e, é por isso, que temos
várias fases da história. Na realidade, para Marx, estas fases da história são uma escada, ou seja,
vai havendo progresso de umas fases para as outras - avançamos historicamente. Portanto, há
um sentido histórico. Em cada um dos estádios, não conseguiríamos sequer passar para o outro
estádio, porque cada um deles é resultado do modo de produção disponível que desemboca
numa relação de produção, relacionada com uma ideia de estado, de cultura e religião. Não há
dever ser.
É aqui que aparece a terceira vaga, protagonizada por Nietzsche. Este vai nos dizer
assim: tudo aquilo que os filósofos anteriores disseram está correto. Karl Marx tinha razão na
parte do dever ser. Mas este diz que Marx não teve coragem de tirar as ultimas conclusões da sua
teoria - olhar o abismo. “Se olhar o abismo, o abismo olha de volta para si” - não há nada para
além do abismo. Na verdade, este a escada de Karl Marx contem uma ideia que não deve estar aí
contida. Pode parecer que existe progresso, mas de onde vem essa medida de progresso? Se
dissermos que a superestrutura é resultado da tecnologia, e assim evoluímos do feudalismo para
o capitalismo, é porque há um padrão exterior que nos diz que estamos sempre em progresso, é
uma ideia que também vem dessa infraestrutura. Logo, não podemos dizer que há progresso,
porque caso contrário, o dever ser continua lá.
Se a moral, a religião, as ideias e o estado são resultado de um modo de produção, então
a própria ideia de que pode haver progresso, de que o comunismo é superior, é resultado do
próprio estado em que estamos - logo não temos nada a não ser a medição que vem da própria
infraestrutura e se assim vem não há uma forma exterior de analisar aquilo que está bem. O que
há é estados da historia que estão mais ou menos espalhados. A ideias de que o feudalismo é pior
é uma medida do capitalismo.
Resultado: se chegarmos ao fim de cada uma destas fases, é o abismo. Não há
continuidade nenhuma. E portanto nada se pode dizer sobre nada, e portanto não sabemos o que
é bem ou mal. O que nós estamos é para além do bem e do mal. Não existe nem mal. A única
coisa que existe é o “is”.
Se não há “dever ser”, para Nietzsche, e apenas o que é, então tenho que começar a olhar
a volta e ver aquilo que existe: sempre que eu encontro vida, encontro vontade de poder. A única
coisa que existe é VONTADE DE PODER. Não há rigorosamente mais nada. O que há é will to
power e um abismo. Portanto, não há nem bem nem mal, há vontade de poder. Mas então porque
estamos há 25 séculos a falar em bem e mal?
Essas ideias de bem e mal surgiram na Grécia Antiga e Jerusalém por via de pessoas, que
na realidade não tinham muita força. Ou seja, o que houve foi pessoas que na realidade eram
como que escravos e os escravos quando estão a ser subjugados por quem é mais forte, têm
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tendência para criar ideias mais ou menos delirantes sobre bem e mal. Imaginando coisas, lançam
ideias que possam travar o mais forte: “olhe que isso está mal”. E o mais forte começa a ficar
confuso: “bem/mal, o que é isso? eu sou o mais forte”. Foi um colete de forças que os mais fracos
tentaram vestir aos mais fortes. Ou seja, a ideia de bem e de mal é uma forma de atar os mais
fortes. Esse colete é um travão e para o autor, não é real.
Então o que é que o mais forte precisa de fazer? Quando reparar que a ideia de bem e
mal não existe, deve libertar-se, tirar a sua espada e aniquilar os seus inimigos. Conquistar todo o
poder - esta pessoa é logicamente Hitler. A expressão que se usa: “super-homem” (over man ou
super man). O super-homem vai se aperceber que esta ideia foi a criação dos mais fracos.
Termina Strauss a dizer que temos uma ideia de bem e mal clássica que termina aqui. Se
o will to power ganhou, o que temos que fazer?
Então, temos que recuperar autores antigos e modernos que não entraram em rotura.
Contra o relativismo total, devemos abrir escolas de artes liberais. A criação de uma elite e de um
instituto que estuda os grandes livros.
E Leo Strauss? O que nos está a tentar dizer?
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Rawls pertence à tradição do comunitarismo escocês, que diz que vai ser justo tudo aquilo
que todos os membros decidirem que é justo, ou seja, é justo tudo aquilo que consentirmos - é
justiça por consentimento. A tudo aquilo que considerarmos justo é justo se chamarmos justo,
todos os que assinarem o contrato social, no qual cada um de nós tem também o direito de veto.
Se todos assinarmos A, significa que A é justo.
3. Original Position
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A proposta de John Rawls é a seguinte: a questão da justiça deve ser abordado em duas
fases. Numa primeira fase, na posição original, os membros de qualquer sociedade vão acordar
por unanimidade os princípios da justiça. Depois de o fazerem, passamos a uma segunda fase: já
não a da posição original, mas a da sociedade real, a realmente existente. Mas ao fazê-lo, vamos
aplicar na sociedade realmente existente os princípios acordados, as regras da constituição. Uma
vez aprovada a constituição, passamos à vida política normal, que vai ser vivida debaixo dos
princípios da justiça que foram definidos na posição original.
1. Talentos e capacidades: por exemplo, não temos conhecimento para saber se temos talento
para ser um jogador de basquetebol ou um professor de filosofia em Harvard (que por
coincidência foi o que aconteceu com Rawls); no entanto sabemos que haverá DIFERENTES
TALENTOS e que vai haver pessoas com mais talento para umas coisas e para outras.
2. Posições particulares: não sabemos o que cada um dos indivíduos vai ser na sociedade
depois do véu da ignorância, mas sabemos que vão haver diferentes profissões e
provavelmente com recompensas variadas.
3. Concepções particulares do bem: concepções do bem, da religião, morais, filosóficas não
se conhecem, mas sabe-se que vão haver várias concepções.
Este torna as pessoas ignorantes, mas continuam a ser racionais, livres e morais. Passam
a ser ignorantes em relação às suas aptidões, interesses profissionais, vocações, acerca do seu
próprio estatuto social, das suas posses e bens, acerca de si próprios e dos outros. As pessoas
deixam de conhecer a organização social em que viviam, a sua cultura, ou outras organizações
sociais que possam existir. Agora tornam-se absolutamente iguais e totalmente imparciais. Sei
apenas que existem várias crenças, estatutos, etc. No entanto, todos continuam a escolher de
acordo com os interesses de cada um, interesses esses que se encontram no contrato social
através da unanimidade.
4. Estratégia MAXIMIN
Esta estratégia, de acordo com a teoria dos jogos, é a mais racional quando os membros
da sociedade se encontram numa situação de alta incerteza. Esta, associada a esta situação de
incerteza decorrente do véu da ignorância, é o oposto da estratégia de um “casino gambler”, uma
vez que este aposta para ganhar. Se ele tivesse uma posição prudente, em principio não ia jogar,
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mas ele aposta mesmo assim, sabendo que está numa estratégia de alto risco - também ele está
numa posição de incerteza.
A estratégia maximin é a estratégia racional mais adequada a uma situação de alta
incerteza, a estratégia exprime a prudência do participante da sociedade, que perante a situação
de incerteza, vai ter uma atitude altamente prudente. Isto quer dizer que a estratégia Maximin
consiste em dois momentos: o primeiro consiste em imaginar o mínimo - o pior que nos pode
acontecer quando chegar à meta; em segundo, tentamos maximizar o mínimo, ou melhor, tentar
obter o melhor a partir do pior que me pode acontecer (chegar ao menos mal).
Podemos relacionar isto com a saída do Mayflower para o “Novo mundo” (EUA) e durante
a viagem, que deve ter durado várias semanas, decidiram, em forma de acordo unânime, um
contrato, assinado por todos, que estabelecia as regras e os princípios sobre as quais iriam viver
quando chegassem ao novo mundo. Há uma certa similitude com a posição original, visto que não
conheciam o novo mundo, não sabendo o que iriam encontrar lá (high uncertainty). A grande
diferença é que eles sabiam as particular conceptions.
Quais seriam, então, os princípios da justiça que os membros desta sociedade, sob
o véu da ignorância, iriam decidir unanimemente?
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a estratégia maximin. A distribuição justa é igualitária, exatamente por não termos conhecimento
nenhum sobre o DNA, as posições de cada um e concepções de bem, exigindo-se a igualdade.
MAXIMIN IGUALDADE
A B
A B
B A
Sob o véu
da ignorância eu maximizo a posição do mais pequenino, pelo que assim posso ser eu. Maximizo
a minha posição de bem estar em igualdade, mas e se avançar mais um pouco e falar de
desigualdade?
A distribuição justa é em principio igual, a não ser que uma outra distribuição desigual
melhore a situação de alguém que não está igual. A desigualdade pode ser considerada justiça se
melhorar a situação dos mais pobres. Este é o principio da diferença: a distribuição da justiça é
igualitária, a não ser que a desigualdade melhore a situação de quem está pior, entre todos.
Então, se sob estas premissas chego a esta conclusão, o que Rawls diz à sociedade que a
distribuição deve também ser assim: a distribuição pelos mais pobres. Assim, melhora-se a
sociedade dos mais pobres. Permitimos que os ricos sejam mais ricos, mas damos um pouco aos
pobres, para lhes dar a mesma chance de enriquecer.
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modelo que serve um momento da história. Para Nozick há pessoas que estão piores que os
pobres.
Ele aparece então com um exemplo, que é o Wilt Chamberlain: um dos três maiores
jogadores de basquetebol. Nozick diz: imaginemos que este jogador começa a ter um pico de
fama e toda a gente corre para o estádio para o ver. O estádio fica completamente crowded e há
uma multidão de pessoas que não consegue comprar bilhete. Ele é a estrela do momento. Cada
vez que há um jogo, muitas pessoas ficam de fora. Sendo assim, Wilt fala com o presidente do
clube propõe-lhe que se faça uma coisa do género: por exemplo, poderia jogar dois jogos em vez
de um. Mas atenção este segundo jogo, voluntário (sem pagamento), só pode estar acessível às
pessoas que não conseguiram o bilhete. O presidente diz que até pode concordar com ele, mas
não concorda com o seu voluntariado. Põe então uma caixa ao lado da venda de bilhetes, com
uma ranhura onde se escreva Wilt. A ranhura é muito pequenina e cabem 25 cêntimos, na qual se
põe a moeda quando não se paga nada pelo bilhete (muitas punham e outras não punham). Wilt
Chamberlain recebe, então, milhões de dólares nessas moedas. E Wilt Chamberlain, pergunta-
nos a nós agora: é justo ficar com o dinheiro? Nozick dirige-se a Rawls, claro.
É que para Rawls, Wilt teria que redistribuir o dinheiro pelos mais pobres, quando as
pessoas lhe deram o dinheiro como um “gift”. Wilt até disse que não queria ser pago, nem usou
meios de coerção. Nozick diria que o dinheiro era seu, com todo o direito a ele.
Ha portanto uma confusão entre dois tipos de justiça: a justiça padrão (A de Rawls baseia-
se em end-state/end-result/padrões), de Rawls; a justiça de Nozick, que diz que o resultado é
justo se o processo for justo. Mesmo que o resultado seja a desigualdade - a desigualdade é justa.
Chamberlain ficou rico justamente.
A justiça processual de Nozick é histórica e de processos - se o processo é justo, o
resultado também o é. Esta é a “entitlement theory of justice”, na qual a forma como os ricos
ficaram ricos e a pobres ficaram pobres é a única coisa que interessa, que tem três princípios. Se
as pessoas dão o dinheiro, mais ninguém tem nada a ver com isso, muito menos o Estado.
Para Nozick, numa sociedade livre, a distribuição faz-se da maneira como nos vamos
escolhendo uns aos outros. Não se metem valores, esforço, nem mérito. O que há é escolhas. As
pessoas vão consentindo e dão dinheiro uns aos outros para que as atividades se continuem a
passar - no entanto, não há nenhum padrão nem mesmo de valor. Até o amor segue uma justiça
processual e histórica.
Não devemos olhar para o resultado e sim para o processo, portanto, qualquer resultado
será justo. Esta noção histórica leva à sua teoria de justiça: tudo aquilo que adquirirmos sem
fraude ou coerção é nosso; tudo aquilo que transferirmos (oferta) sem fraude ou coerção é justo;
todas as ações voluntárias devem ser aceites.
1. Aquisição
2. Transferência
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