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TEORIA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA

2017/2018 – 2º Semestre

1ª Frequência: 2 de março. 2ª Frequência: 6 de abril.

I. O que é a Ciência Política?

• A Ciência Política, e os seus principais ramos: Teoria Política, Política


Comparada, Políticas Públicas e Relações Internacionais.
• Isaiah Berlin, e a pergunta crucial da Política: Porque alguém deve obedecer a
outrem?

1) O que é um triângulo?
2) Haverá comida no armário? → factos.
3) Why should anyone obey anyone else? → questão essencial da Teoria Política.
Obediência e coerção (é fundamental perceber estes conceitos).
Devemos obedecer, não a alguém (em concreto), mas sim à ideia de Lei. É a ideia de Lei,
que distingue uma sociedade justa, de uma sociedade injusta.

A ideia de Lei está, muitas vezes, associada à ideia de regra.


A sociedade livre é comparada a um jogo. São as regras, que nos permitem ‘aproveitar’
o jogo. O governo assume o papel de árbitro (não faz o jogo, arbitra-o). A Lei é general,
independentemente de pessoas.
Law → limited government. Temos que ‘procurar’ encontrar as regras que melhor
limitariam o poder, isto é, que impeçam que o governo ‘entre’ em nossa casa (live and
let live). Qual o objetivo da Lei? Limitar o poder, evitar a Guerra e a Tirania.

II. O ataque à Democracia Liberal;

Ataque às instituições do século XIX.


Ideia do séc. XIX → comércio livre. A prosperidade ‘ocorre’ na liberdade de comércio. Entre
1850 e 1912, nota-se o maior crescimento económico da Humanidade. Em termos relativos, havia
mais comércio internacional, nos finais do século XIX, do que há hoje. Durante o século XX,
houve muito mais protecionismo, do que em todo o século XIX. As moedas eram convertíveis
em ouro (padrão-ouro). As pessoas podiam, no século XIX, viajar por todo o Mundo, sem
passaporte (haviam muito menos entraves). No século XIX, conseguiu-se avançar, brutalmente,
sendo que a esperança média de vida duplicou, no final do século. O preço da alimentação, desceu.
Era uma ideia normal, no século XIX, a ideia de que a propriedade privada era, de facto, muito
importante. Sem a ideia de meu, não há troca, não há comércio livre. A ideia de propriedade
privada deriva daquilo que é meu, daquilo que é do outro, pois só isso, permite a troca.
O comércio leva à persuasão. As medidas do século XIX surgem, em alternativa, à força, ao
roubo. Avançam, agora, os interesses, em prol da persuasão. O comércio ‘conduzia’ à Paz.
A propriedade privada, leva a um outro princípio: se podemos trocar, a decisão, sobre aquilo que
é meu, é minha. Cada um de nós, pode decidir sobre aquilo que tem (decisão descentralizada).

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Nem todos vão acertar. O século XIX, convivia bem com a ideia de alguns fazerem bem, e outros,
fazerem mal. Um sistema de comércio, é um sistema de sinais (é o que nos permite tomar
decisões). Não é o Estado, que decreta o que cada um tem que fazer, cada um faz, de acordo com
os seus conhecimentos, e possibilidades → liberdade.
Para haver uma decisão descentralizada, cada um deve poder decidir fazer o que quiser, com a
sua propriedade. Deve, ainda, haver um governo, governo este, que se dizia, limitado (tem
determinado alcance, mas não pode interferir nas decisões das pessoas).
Moral vitoriana. Acompanhado com estes avanços, apareceu um certo tipo de pessoas, associado
aos finais do século XIX. Havia um certo código, uma certa maneira de operar, neste comércio
livre, que dava, às pessoas, um tom elevado. Estas ideias tinham como ‘pano’ de fundo, a
prosperidade individual das pessoas. Este sistema acusa, muito rapidamente, a falha. Esta camada
exterior tem, no fundo, haver com o código de gentlemanship. Tinham que se manter contratos, e
boas reputações. Esta moral assenta na ideia de honestidade, de boas reputações, não se podiam
vender maus produtos, e se o alguém o fizesse, tinham que ser honestos sobre a qualidade desses
mesmos produtos. O mercado não admite a mentira.
O comércio livre, está associado à poupança, ao consumo regulado (pela própria pessoa).

• Friedrich List (1789 - 1846): o sistema de economia política nacional.


O comércio livre, não é igual a prosperidade. Quando há uma troca, há uma parte que ganha
sempre mais, do que outra (como é caso dos países mais ricos). O que parece ser comércio livre,
acaba por beneficiar o país mais rico, em detrimento do outro país → acentuam-se as
desigualdades entre os países. As economias mais débeis, não devem entrar no comércio livre.
Defende um sistema nacional de economia política. Concede que haja comércio livre, mas
quando, e se, todos os Estados estiverem ao mesmo nível.
As teorias de mercado livre, confundem a economia pública, com a economia privada.
A economia privada, quanto toma decisões, não leva em consideração, a economia pública.
O bem-estar de cada um de nós, é diferente do bem-estar da Nação. Alguém deve tomar a decisão,
pela Nação. O taylor não tem em vista a sociedade, e ao tomar a sua própria decisão, contribui
para que a sociedade esteja, então, muito desagregada. Muitos não consideram a Nação, quanto
tomam decisões, no contexto da economia privada. Taylor ≠ Nation.
Há uma promoção do cosmopolitismo, que promove a atomização da sociedade. Temos que
proteger, diz List, as nossas indústrias de produção nacionais. Ficaríamos mais fortes, se
protegêssemos as nossas indústrias nascentes (argumento meramente económico).

• Vladimir Lenin (1870 - 1924): a hipocrisia da liberdade.


O comércio internacional só beneficia os países ricos. A propriedade privada é um roubo. Houve
uma exploração indevida da mais valia. É uma questão de Justiça. Ataca o governo limitado. A
moral vitoriana é um pouco criticada -- é uma moral de hipocrisia. A verdadeira moral, é a do
proletariado, a que une os trabalhadores de todo o Mundo. Lenine é internacionalista.
Toda a obra de Karl Marx, é a criticar os utópicos, os moralistas. Marx critica este tipo de autores.
A opinião de Lenine, é uma das muitas interpretações de Marx. Marx diz que, nada tem a ver com
os moralistas. Marx achava que o Socialismo não era uma questão de, gradualmente, se irem
aceitando as condições impostas pelo Regime Capitalista.

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Para ele, o Socialismo não é uma ideologia de cariz moral, ou utópica. É uma questão de ser
verdade.
É como se de uma ciência, se tratasse → Socialismo Científico. O Socialismo não é uma espécie
de dever ser, é. Marx acha que, se descobriu uma Ciência da História. O Socialismo é uma Ciência
de facto. A História vai avançar, com base numa fricção entre a infraestrutura, e a superestrutura.
Karl Marx → o Socialismo é uma Ciência da História humana. O Socialismo é uma matéria de
facto, de verdade científica. Há estruturas, que nos levam ao Socialismo, e que são independentes
da nossa vontade. A força do capital, não é moldada por ninguém, nem mesmo pelos capitalistas.
É pela própria maneira de o Capitalismo operar, que este está condenado. A lógica de
funcionamento do capital, vai levar à sua própria destruição. Podemos adiantar a História, para o
destruir já. O Capital está, já, condenado pelas suas contradições internas, mas podemos acelerar
o processo destas contradições, para se chegar, mais rapidamente, ao Socialismo. Descobriu-se
que a História, se desenvolve através de graus, com que a Humanidade vai subir. A História é
composta por fases. Neste momento, estamos na fase do Capitalismo. Não é a última fase. A
verdadeira juventude da Humanidade, é o Comunismo. Até ao Capitalismo, toda a História é,
apenas, a História da luta de classes (Pré-História). A História é, até aqui, a História da luta de
classes.
Comunismo Primitivo → Slavery → Feudalismo → Capitalismo.
Por detrás desta História, está uma ideia de progresso. As coisas vão melhorar. Uma situação tão
terrível como a Escravatura, faz parte do percurso que a Humanidade tem, inevitavelmente, que
percorrer (a Escravatura é melhor, do que o Comunismo Primitivo). É uma História que temos,
efetivamente, que aceitar. Nada poderíamos fazer, para evitar a Escravatura. Os meios de
produção são, então, mais importantes do que parecem. Cada uma destas fases, representa uma
tecnologia, um meio de produção que, por sua vez, as explicam. A força motriz da História da
Humanidade é a tecnologia, a infraestrutura (até porque esta nem se nota). A desigualdade que se
sente no Regime Capitalista, está relacionada com a infraestrutura, com os meios de produção
que temos. Há uma classe dominante, porque detém os meios de produção da época. Marx faz
disto, uma Ciência muito rígida.
A família, a propriedade, e o Estado, aparecem na transição entre o Comunismo Produtivo e a
Escravatura. Karl Marx, defende o Capitalismo, sendo que afirma, que este é o período mais
avançado e produtivo da Humanidade, com mais bens, e com mais bem-estar. Chega a associar o
Capitalismo, a preços muito baixos.
O Capitalismo começa, no entanto, a ter contradições muito fortes. Começa a surgir uma classe
muito baixa, cada vez mais pobre, enquanto que os ricos, são cada vez menos, e vão se tornando
cada vez mais ricos. O capital leva ao Monopólio, e à desigualdade.
Conseguimos percecionar a superestrutura. As pessoas interagem de certa maneira.
Karl Marx associa o Capitalismo, a uma moral burguesa capitalista. É como se, a parte visível da
moral. Os capitalistas estão todos a fingir, cada um tem os seus próprios interesses, e esses
interesses chocam. A infraestrutura é, ela sim, a verdade.
Infraestrutura → Meios de produção, relações de produção;
Superestrutura → Estado; leis, moral, ideologias, religião.
Lenine entra em cena, em 1918. Cuidado com a ideia de Estado. O Estado é, apenas, a entidade
que preserva a relação de produção. O Estado é, nada mais que, o resultado dos interesses das
classes, serem inconciliáveis. Só o Estado mantém o proletário, proletário, e o burguês capitalista,
burguês capitalista.

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Lenine → O Estado e a Revolução.
Lenine diz que, na última fase do Capitalismo, o Capitalismo entrou por outra vertente, o
Imperialismo. O Capitalismo deixou de ser nacional, para passar a ser internacional -- isto para
justificar, o porquê de a Revolução Russa não ter acontecido em países de Capitalismo maduro.
O Capitalismo tem que ser, agora, imperialista, para retardar o efeito da taxa de lucro decrescente.
A ideia é retardar o efeito que é inevitável -- baixar a taxa de lucro. Já não há Nação, para o
Capitalismo. O Capitalismo não quebrou no país onde estava mais avançado, partiu no elo mais
fraco, no país onde o Capitalismo não tinha, ainda, acontecido. Teoria do elo mais fraco.
Depois do Capitalismo maduro, passamos para uma fase que nos vai levar até ao Comunismo. A
fase entre o Capitalismo e o Comunismo, é o período entre desmoronar o regime, e conseguir o
outro. Foi chamado de Ditadura do Proletariado. Lenine acha que, só através de uma Ditadura, é
que se consegue manter o Estado do nosso lado. É, através de uma Ditadura, que não se destrói,
e se preserva o Estado. O Estado, diz Lenine, é o órgão da classe governante, é o Estado que cria
a ordem. O Estado é o produto, e a manifestação dos antagonismos de classes. A revolução tem
que ser violenta, pois é a única forma, de se alterar a classe dominante (é pôr os trabalhadores, a
trabalhar).
Alguns autores advogam a abolição do Estado. Lenine discorda. Marx diz que, o Estado se
desvanece. O desvanecimento do Estado, é um processo lento, de dissolução muito gradual. O
Estado vai, inevitavelmente, desaparecer. A Revolução substitui uma força especial, a burguesia,
por outra força especial, o proletariado. Vamos usar a mão de ferro, de trabalhadores armados.

• Carl Schmitt (1888 - 1985): a fraqueza da liberdade.


A Nação devia decidir como uma só. Há uma vontade geral, uma direção dada à Nação, como
um todo. Os partidos são confusos, desorganizados. Vai defender algumas ideias, que podem ser
aproveitadas no campo político à extrema direita. É, também, conhecido por estabelecer uma
separação entre amigos e inimigos, sendo que cabe à política, descobrir quem é quem. O seu texto
mais conhecido é: O conceito do político.
O político liberal, não é bem um político. Foi um dos autores que proporcionou/possibilitou o
ambiente intelectual, no qual Hitler apareceu (paved the way to Hitler). O Mundo está a mudar.
Existem vários tipos de Estado.
Século XVII e XVIII: Absolute State. Século XIX: Neutral State -- o Estado Liberal, que sabia
os seus limites, e que não se envolvia nos assuntos das pessoas. No século XIX, o Estado era
muito diferente da sociedade, eram entidades completamente diferentes (State ≠ Nation).
Qual o Estado do século XX? O Estado, na transição do Neutral State, para o Estado do século
XX, passou a ser dualista. Por um lado, temos o monarca e a sua burocracia, ou seja, o Estado
governamental. Por outro, temos o Parlamento. O Parlamento representa a sociedade.
Ao longo do século XIX, tivemos o triunfo do Parlamento (torna-se cada vez mais proeminente),
logo, acabou a diferença, entre Estado e sociedade. Society becomes State.
O Estado passa a estar tão dependente daquilo que o Parlamento faz, e sendo o Parlamento, o
espelho da sociedade, o Estado passa a ser, então, a sociedade -- The end of the Neutral State.
Toda a sociedade é o Estado. No século XX, o Estado é total. No final do século XIX, o Estado,
devido à proeminência da sociedade, deixa de ser neutral. Se o Estado é total, e está baseado num
Parlamento, onde está representada a sociedade, temos um novo problema: a sociedade aparece
completa, ou aparece divida?

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Para Schmitt, os partidos são entidades estranhas. Diz Schmitt, que os partidos estão, apenas,
preocupados com parte do problema, consigo e com a sua clientela. Os partidos não olham a
sociedade como um todo, estão, ainda, preocupados com certos segmentos da sociedade.
Não veem the big picture. Precisamos de um partido, que ultrapasse essa questão.
Precisamos de um partido, que ocupe todo o Parlamento, e que veja a Nação, no seu conjunto,
que veja a vontade nacional do Estado total. Os partidos não passam de interesses egoístas, que
apontam em todas as direções.
Com partidos é, para além disso, difícil gerar maiorias. Um Estado baseado no multipartidarismo,
não permite, ao Estado total, agir com impacto na sociedade. As democracias liberais não
conseguem tomar decisões, não têm capacidade para ‘escolher’ os seus inimigos. As democracias
liberais nunca identificam os inimigos e são, por isso, fracas. Espécie de justificação do Total
State.

• Benito Mussolini (1883 - 1945): a doutrina do fascismo.


O homem fascista tem que ser austero consigo próprio, tem que se mobilizar.
Doutrina moral (só há uma maneira de ser). Era contra a descentralização, e contra a moral
vitoriana -- o fascista deve estar à frente da causa, no campo de batalha. Critica, de certa forma,
o comércio livre.
O Fascismo não é, apenas, uma doutrina política. Vai falar, muito, sobre o homem político, sobre
o conjunto de características, que Mussolini atribui ao fascista. Para conhecer o Fascismo, é
preciso conhecer o homem fascista.
O Fascismo é uma ideologia política, que se traduz numa espécie de caráter. O fascista tem que
ser absolutamente austero, para consigo próprio. O fascista é um homem perfeito, expurgado das
tentações urbanas. O fascista é um homem duro, religioso, dedicado à Nação, e à família. O
fascista despreza a vida confortável.
1. Liberalismo e individualismo → o fascista não deve ser individualista. A conceção
fascista é pelo Estado, e só é pela vontade do indivíduo, se esta coincidir com a do Estado.
O Estado é consciência e a vontade universal do homem. O Fascismo é o oposto do
Liberalismo. Reafirma o Estado, como aproximação do indivíduo.
2. Socialismo → fora do Estado, não poderá haver, nem indivíduos, nem grupos.
Não poderão haver partidos políticos, sindicatos, classes. O Fascismo é o oposto do
Socialismo. O Socialismo confia o movimento à História, dentro da luta de classes, e
ignora o Estado como identidade de união de classes. Nem Liberalismo, nem Socialismo.
As pessoas só são pensáveis, enquanto parte do Estado.
3. Dois tipos de Democracia → Será o Fascismo, contra, ou a favor da Democracia?
Mussolini acha que o tipo de Democracia fascista, é o melhor tipo de Democracia.
Há uma maneira pura, de fazer Democracia -- a maneira fascista. O fascista nega que a
maioria, pelo simples facto de ser uma maioria, possa governar a sociedade humana.
Nega, também, que esta maioria possa governar, através de uma consulta periódica, as
eleições. Não quer que a maioria governe, no sentido democrático. O Fascismo reafirma
a irremediável desigualdade entre os homens. Se os homens são tão desiguais entre si,
porque é que haveríamos de dar, a todos, um voto? A Democracia é um regime sem Reis,
mas com demasiados Reis. Antes um tirano, do que um sistema democrático. As pessoas
são muito diferentes, e o fascista sabe disso. Assume a desigualdade entre as pessoas, e
a realidade de que algumas estão mais aptas para governar, do que outras. A Democracia
iguala a Nação à maioria, ou seja, baixa ao nível da maioria. Mesmo assim, o Fascismo
trará a forma mais pura de Democracia, se a Nação, assim concebida, for democrática

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qualitativa, e não quantitativa. Qualitativamente = desigualdade entre os homens.
Quantitativamente = maiorias (baixa o nível da Nação).
4. O papel do Estado → É o Estado que cria a Nação. O papel do Estado é: criar a Nação,
criar a consciência da unidade moral da Nação. Estado como realidade ética, que só vive,
enquanto se desenvolver e alargar. Incita a propagação da Nação.
5. Crítica à vida confortável → O fascista despreza a vida confortável. Não pode ficar em
casa, well fed and fat. Se for preciso, deve, até, entrar em Guerra.

III. O contra-ataque da Democracia Liberal;

• F. A. Hayek (1899 - 1992): ordem espontânea e organização.


The Road to Serfdom (1944)
O seu argumento, a favor da Democracia Liberal, está relacionado com a impossibilidade de
percebermos tudo -- acha que a mente humana não consegue saber o suficiente, para decidir, seja
o que quer que for, muito menos, para decidir sobre a vida dos outros.
O argumento de Hayek parte, sempre, de uma constatação de ignorância. Temos uma teoria de
conhecimento, uma teoria sobre o modo como apreendemos, ou não, a informação. Desenvolveu,
ao longo dos anos 30, teorias sobre ciclos económicos -- crises, padrão-ouro, oscilações,
economia de Guerra e de Paz, tarifas, etc.
O seu interesse pela Ciência política aparece mais tarde, por achar que não teria tempo para
formar um partido político e ganhar eleições. Há um problema de cariz mundial -- poderia estar
a ser criada a sensação, em 1944, que a União Soviética e o Comunismo, poderiam estar a ajudar
os Aliados, a ganhar a Guerra. A primeira tese de Hayek, parece sugerir que o Comunismo e o
Nazismo, são faces da mesma moeda, troncos da mesma árvore. O seu livro é muito mal recebido,
principalmente, em Inglaterra. Nos EUA, não caiu muito mal.
Quer o Comunismo, quer o Nazismo, gostariam de centralizar a decisão, isto é, gostariam de
tomar a decisão certa.
A segunda tese de The Road to Serfdom, é um pouco mais complexa. Se é verdade que, o
Comunismo e o Nazismo são ameaças à Democracia Liberal, não é totalmente verdade que essas
ameaças, sejam as mais importantes neste momento.
Como são ameaças tão declaradas, só vai votar, nesses grupos, quem quiser. As pessoas estão
suficientemente esclarecidas, para quererem tentar evitar situações de Comunismo e de Nazismo.
Estas ameaças são importantes, mas muito explícitas, e elas próprias admitem que querem destruir
a Democracia.
O principal problema vai surgir de uma ameaça, que não se nota que é ameaça. Enquanto que
comunistas e nazis são facilmente identificados, a Democracia Liberal é mais humilde, não
partilha de tanto militantismo e, como tal, pode ser um alvo frágil. A ameaça vai ser, então, mais
complexa. Vai ser uma ameaça interna. Vão começar a surgir ideias que as pessoas vão tomar
como boas e atraentes, que vão mobilizar os seus interesses, e que podem levar à destruição da
Democracia Liberal -- caminho da servidão. Alguns partidos democratas e liberais, vão sentir a
atratividade de certas ideias, que todas as pessoas querem, e aceitam -- o caminho para a servidão
não está, afinal, nos extremos (Nazismo e Comunismo).
Que ideias são essas? Hayek chamava-as de nobres ideias → ideias de igualdade.
Segundo Hayek, a nobre ideia é a justiça social, uma forma de dizer igualdade, ou justiça

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distributiva. As pessoas vão querer a justiça distributiva/Welfare State (Estado Social) -- ameaça
interna às Democracias Liberais -- vai levar-nos à servidão.
As intenções do Welfare State, são muito diferentes dos seus resultados. A justiça distributiva,
tem excelentes intenções, mas não tão bons resultados. Hayek acha que, a atratividade pela justiça
social, relaciona-se com uma falha na maneira como nós pensamos, que vem da Grécia Antiga.
Diz o seguinte: temos tendência para pensar que, existem dois tipos de elementos na sociedade,
construções artificiais, e elementos que são, apenas, naturais, e que existem, independentemente
da nossa vontade. Os gregos separam o natural, do artificial.
Os gregos induziram-nos em erro, visto que não existem, apenas, elementos, ou artificiais, ou
naturais. Existem elementos que fazem falta na nossa vida, que são artificiais, na medida em que
foram feitos por nós (the product of human action), mas que não foram desenhados, ou
construídos por nós (but not of human design).
Há coisas que são produto da ação humana, mas que não foram desenhados pelo homem.
Há elementos não naturais que, apesar de serem resultado da ação humana, não são resultado do
pensamento deliberado de ninguém. A linguagem é, para Hayek, o maior exemplo.
Este conjunto de artefactos, não existe, por terem sido construídos por alguém, é a própria
existência, que lhes dá existência. Os gregos viam natureza, e artificialidade.
Mas, aquilo que a chamamos, human action, não quer dizer que o resultado alcançado seja
artificial. A linguagem, os mercados, o sistema de preços, a troca, não resultam do design humano.
É a interação humana, que cria este tipo de artefactos.
Chegou-se à ordem, através da interação. Esta ordem não foi criada. Hayek chamou-lhe: ordem
espontânea. O que é uma ordem espontânea? A organização, diz Hayek, é muito mais simples.
Tentar manipular a ordem espontânea, é praticamente impossível. Tentar modificar uma ordem
espontânea, leva ao afastamento das pessoas. As ordens espontâneas, são modos de processar a
informação.
As ordens espontâneas funcionam melhor, pela mera interação, e não pela correção, pela tentativa
de fazer melhor. A troca implica que as pessoas tenham valorizações e perceções diferentes, sobre
várias coisas. As ordens espontâneas processam a informação, mas cada um de nós, só usa uma
pequena parte dessa informação. As ordens espontâneas são maiores do que nós. A sociedade é o
agregado, o conjunto, e toda esta diversidade. As ordens espontâneas parecem funcionar melhor,
numa interação entre pessoas diferentes, que pensam de maneira diferente, e que escolhem usar
partes diferentes da informação.
Law, Legislation and Liberty (1973)
Os gregos dividiam natural, de artificial.
Diz Hayek que, há elementos que resultam da ação humana, mas que não foram desenhados por
ninguém.
Da ação humana, surge a ordem artificial, a made order. Sempre que temos um fundador,
normalmente temos uma made order. Da ação humana, surge outra ordem, a spontaneous order
(grown order). A conversa é bastante abstrata. Hayek encontra, na sociedade, dois tipos de ordens,
que resultam de dois tipos de ação humana.

• A ação humana, por interação, pertence à ordem espontânea (grown order ou cosmos);
• A ação humana, by design, pertence à made order (organisation).

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Sempre que temos fundadores, criadores, construtores, temos made orders. A spontaneous order
resulta da interação. Temos dificuldade em conceder que há uma ordem que não foi, efetivamente,
criada por ninguém. Por vezes, não nos apercebemos que, certas ordens não foram criadas
deliberadamente.
A interação, também pode gerar ordem. Por vezes há ordem, sem mecanismos de coerção, sem
nenhum objetivo específico. Há ordens criadas por todos nós, através da interação. Por vezes há
ordem, sem a ligação de mecanismos coercivos -- ordem espontânea (resulta da interação livre).
Hayek cria uma espécie de modelo teórico (da Guerra Fria), para melhor percebermos o que se
passou no século XX.
Diz Hayek que, em qualquer organização, quando há um propósito, há certamente uma função e
um lugar, atribuídos a cada uma das pessoas. Cada uma das pessoas, passa a ter uma função
específica, dentro da empresa. As organizações têm um conjunto de propósitos unificadores.
Numa organização, as tarefas de cada um, têm que ser específicas, diz Hayek.
Quando temos um propósito, o que dizemos uns aos outros, não pode ser demasiado geral e
abstrato. Numa organização, para Hayek, não vamos ser regidos por regras, mas sim por
instruções específicas. Pelo contrário, ordem espontânea, dizem-nos normas genéricas, gerais e
abstratas, que geralmente nos dizem o que não fazer.
Uma ordem espontânea é regida por regras gerais e abstratas, que não nos dão qualquer indicação
sobre o que devemos fazer, dizem-nos, antes, o que não fazer. Os lugares e as funções, que cada
um desempenha numa organização, são centrally determined -- Hayek diz que, as organizações
são geridas por um comando (specific command). Os comandos dão-nos, exatamente, o que fazer.
Uma ordem espontânea também terá uma hierarquia, mas esta não é determinada por ninguém.
Quando não há um unifying purpose, não há maneira de saber -- não é centrally determined é,
sim, free by interaction. Cada um tem a sua função, determinada através da interação. Numa
ordem espontânea, também existem funções diferentes, mas estas foram definidas pela interação
(ninguém as determinou).
Hayek acha que, numa made order, somos normalmente levados a ter que fazer alguma coisa e,
numa ordem espontânea, há, antes, coisas que não podemos fazer. Numa, é nos dito o que fazer,
na outra, é nos dito o que não fazer. A sociedade livre, especifica o que é proibido, ou seja, na
ordem espontânea sabemos o que não fazer, mas ninguém nos diz, o que ser/fazer.
Nada é dito sobre o que fazer, mas sim, sobre o que não fazer. Normalmente, o que não se pode
fazer, é algo que provoque danos a terceiros. Na ordem espontânea, cada um segue o propósito
que lhe apetece, e as pessoas vão reagindo aos planos uns dos outros. Se a sociedade for
percecionada como uma ordem espontânea, começamos a tentar antecipar os planos uns dos
outros, e a tentar fazer outra coisa. As pessoas são responsáveis por usar o melhor dos seus
conhecimentos, para atingir o melhor dos seus propósitos.
A sociedade pode ser percecionada como uma organização? Na realidade, cada um, nas suas
funções específicas, nem sequer consegue perceber, em que medida é que está a contribuir para
um fim específico, o que diminui a dinâmica de trabalhão e a motivação.
Na ordem espontânea, acabamos por ser mais cooperativos, sem nos apercebermos. Porquê? Ao
longo da década de 30, os EUA (spontaneous order) foram produzindo aço, espontaneamente,
enquanto que a União Soviética (made order) deu ordens específicas, para se produzir mais aço.
Qual das duas ordens, a mais eficiente? Qual a ordem que produziu mais aço, em 20 anos?
A made order. Dar, a cada um, uma ordem específica, contribuiu para que se produzisse mais

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aço. Se medirmos, num espaço de tempo, e tivermos um propósito específico, a made order será
o sistema mais eficiente.
Chegou-se, porém, década de 50, e havia excesso de aço. Deixou-se de se produzir aço, porque
foram aparecendo novidades no Mundo Ocidental (por exemplo, o plástico, que substitui o aço
em várias áreas de consumo) -- o aço deixou de ter procura -- esqueceram a espontaneidade da
procura e da oferta.
Como no Mundo Ocidental, todos tinham liberdade para produzir o que quisessem, criou-se
espaço para a inovação -- não havia um propósito comum. A maneira como cada um decide, é
muito diferente, dependendo se é uma made order, ou uma spontaneous order.
Numa ordem espontânea, somos omissos, daí ter sido no Mundo Ocidental, que apareceram um
grande número de inovações (máquina a vapor, computadores, telemóveis). Essas inovações não
foram desenhadas por nenhum político, e quem as começou por fazer, foi fortemente criticado.
Há sempre grandes penalizações, para quem tenta inovar e fazer a diferença. A mudança vem de
baixo. A made order é constituída de cima, e como tal, vai falhar mais vezes, não se vai conseguir
adaptar. Na spontaneous order, as inovações surgem sem que ninguém peça por elas. Numa
sociedade livre, como não me é atribuído nenhuma função, vamos mais à procura de nós. A ordem
espontânea gera inovação porque há liberdade, espaço para se ser criativo etc.
Hayek resume tudo isto, numa palavra: informação. A principal diferença entre as duas ordens,
está na maneira como se processa a informação. Numa made order, a informação tem de chegar
ao líder. Há um certo engarrafamento da informação, há barreiras que são criadas. Numa ordem
espontânea, se alguém quer testar alguma coisa, não tem que prestar vassalagem a ninguém. A
forma como a ordem espontânea processa a informação, é mais direta -- se alguém tem uma
inclinação, pode executá-la.
Se, numa ordem espontânea, começarmos a introduzir comandos específicos, deixa de ser uma
ordem espontânea. Para Hayek, há uma grande diferença entre estes dois tipos de ordens: na
spontaneous order, a sociedade é omissa, relativamente ao modo como cada um interage.
Uma ordem espontânea não escolhe que tipo de organizações, existirão dentro de si. Haverá
certamente, um governo que está, ele próprio, abaixo da Lei. Cada um de nós pode contribuir com
o melhor dos seus conhecimentos, para os seus próprios fins. A ordem espontânea não define,
muito bem, os seus contornos. Todas as organizações fazem parte de uma organização maior.
Nenhuma organização tem poder de mudar o que vai fazer. Cada uma destas organizações pode
subir, pode descer, vai tentando, fracassa, etc. Na realidade, quando a sociedade é percecionada
como sendo uma ordem espontânea, nós ficamos numa situação muito interessante, há
flexibilidade.
A ordem espontânea tudo tem a ver com um jogo. Existem regras, em jogos. Para jogar o jogo, é
preciso uma combinação de talento e sorte. Na sociedade, o mesmo acontece. Tal como no jogo,
é necessário um árbitro -- a sociedade é arbitrada por um governo, que não deve tomar partidos.
O governo, na ordem espontânea, deve ser uma espécie de árbitro. Qual o objetivo do jogo? Há
quem jogue por jogar, há quem jogue para ganhar.
A ordem espontânea é, também ela, um jogo. O jogo é justo, se a arbitragem for justa, e imparcial.
Temos uma certa tendência, para dizer se há, ou não, justiça, atendendo à distribuição, aos
resultados. Não vamos medir resultados, para aferir a justiça.
E quando uma pessoa perde o jogo? Esta é umas das questões mais complexas da sua teoria. Em
primeira instância, se já ninguém quer carvão, não há muito a fazer com os mineiros, que se

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manifestam na rua, o que foi verdade, durante o governo de Margaret Thatcher -- chama a isto,
um fracasso não merecido.
O que fazer, então, quando uma empresa abre falência? Não há nada a fazer. O Estado, nada
deve fazer. Se ninguém quer o produto, não há razão, para o Estado suportar uma empresa que,
já não satisfaz os seus consumidores. As ordens espontâneas, são formas de processar a
informação. Se começamos a dar apoio às empresas, estas não estão a ser incentivadas a dar o
seu melhor, e não vão satisfazer os consumidores, pois contarão, sempre, com a ajuda do Estado.
Vai criticar a justiça social, ou distributiva. Incentivar ao sucesso, será ter um sistema que, voltará
a pôr os mineiros, no modelo da ordem espontânea. Vai defender, o seguinte: cada uma das
pessoas, deverá saber que, se cair, vai encontrar uma safety net, mas, esse apoio, é um momento,
muito circunscrito, no tempo, e que tem, como objetivo, fazer com que a pessoa volte ao jogo.
Depois de se atingir, esta rede, somos, novamente, atirados para cima.
Defende qualquer tipo de apoio, que seja muito circunscrito, e que possibilite que as pessoas
voltem, para dentro do jogo.
A justiça distributiva, tem como objetivo, não proporcionar que as pessoas voltem ao sistema,
mas sim, renumerar de acordo, com o mérito. Temos a tendência, para pensar que a sociedade
seria melhor, se cada um de nós, recebesse de acordo com o seu mérito. Hayek discorda.
Como e que é possível, as pessoas fazerem muito dinheiro, com atividades que não considerados
boas? As pessoas, têm tendência para pensar que, pessoas com melhores intenções, e com mais
mérito, deviam ser mais ricas. Seria bom, viver uma sociedade, onde os ricos, fossem melhores?
Como é que viveriam, os mais pobres? Como, então, medir o mérito moral? Porque é que as
pessoas, não afirmam que, a remuneração, nada tem a ver com o mérito?
Há pessoas, que enriquecem, através de más escolhas, e de más ações -- é esse o preço da
liberdade. Que razão, é que nos leva a pensar que, certas profissões, estão associadas, a mais
mérito moral, do que outras?
Temos a tendência, para avaliar carateres e pessoas, com base nas profissões que estes exercem.
As ideias de justiça social, estão muito associadas à ideia de mérito. Dar a todos de forma igual,
foi tentado, e correu mal. Hayek acha que, numa sociedade livre, devemos tornar claro, que os
ricos, não têm mérito nenhum. Tiveram sorte, e um determinado talento. Nada tem a ver com
mérito. Há uma justiça distributiva, que tenta ter um padrão de distribuição, de acordo com
conceitos como mérito, igualdade -- correm sempre mal. Não sabemos o suficiente, sobre o
mérito, e sobre as intenções das pessoas. Tornar-se-ia uma sociedade soturna, uma sociedade onde
os ricos, têm mais mérito. Hayek diz que, o governo devia tratar de todos, da mesma forma,
porque não se conhece o suficiente, sobre o mérito de cada um.
Tudo o que consideramos bom, é o resultado de a sociedade ter sido percecionada, como uma
ordem espontânea, e não como uma organização. Hayek diz que, não temos conhecimento
suficiente sobre a sociedade, para a tentarmos mudar. Numa ordem espontânea, processamos
informação, que não pode ser posta por palavras. O tipo de informação, que cada um nós utiliza
é tão própria, que não o temos que justificar a ninguém. Cada um de nós, tem um conhecimento
tático/prático que usa, a cada vez que age. Este conhecimento, tem a ver com a capacidade de
cada um, é uma espécie de conhecimento intuitivo. Cada um de nós, utiliza conhecimento, que
nem notamos que estamos a usar. Numa ordem construída, tudo é passível de ser discutido.
Numa organização, há uma perceção do conhecimento, que é diferente de uma ordem espontânea.
Temos a tendência, de querer chegar a uma justiça distributiva. A interação do mercado, não é
suficiente, para dar todos os sinais corretos. Não sabemos o suficiente.

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A ordem espontânea, é gerida por regras gerais e chama-se Law. Uma organização, que tem
legislation, isto é, uma Lei que diz, exatamente, o que fazer, não é uma boa Lei. A regulação, que
se aproxima deste tipo de legislation, é muito especifica. A Law é antiga e, apenas, nos inibe de
provocar danos a terceiros.
A Nova Lei, é mais próxima da legislação e Hayek acha que, vão transformar a ordem espontânea,
numa organização. Como é que medimos o sucesso de uma sociedade? A sociedade, vai ter mais
sucesso, quanto mais se aproximar de uma ordem espontânea. Como é que medimos o sucesso?
Numa organização, tirar uma pessoa ao acaso, e compará-la com outra (é uma questão apenas
empírica). Mais perto do fim, passa a ter uma justificação democrática. Sociedades mais livres,
teriam maior peso demográfico.
O que fazer perante a União Soviética? Não é preciso fazer nada, a União Soviética vai colapsar.
Vai haver uma tendência muito natural, de imitação. Temos a tendência, de ser imitadores.
As sociedades mais livres, vão sofrer por contágio, por imitação. As sociedades, começam a ter
mais sucesso e, todos os outros, passam a querer imitar, mas, não podendo imitar, diretamente,
no seu país, vão sair dos seus países. África, e a América Latina, vão tentar chegar a Norte.
O Norte, não podendo ser imitado, vai ser um polo de atração. Hayek, associa esta liberdade, à
cultura e à religião judaico-cristã. Foram fomentadas certas ideias, como os valores familiares, a
ideia de propriedade, e a ideia de que nem todos têm de obedecer, forçosamente, a uma única
maneria de ver as coisas. O Mundo Ocidental foi, então, ficando mais rico. Os outros povos,
começam a tentar copiar.

• Karl Popper (1902 - 1994): a sociedade aberta e a crítica ao historicismo, ao


positivismo e ao relativismo.
Vamos começar pela teoria do conhecimento, antes de passarmos para o alcanço político da sua
teoria. Popper, ficou conhecido pela sua teoria acerca do conhecimento, sendo que o seu livro
mais conhecido, é a Sociedade Aberta e os seus Inimigos, sobre Platão, Hegel, e Marx, um livro
de teoria política. O livro, que o levou ao estrelato, foi A Descoberta Científica.
Segundo Karl Popper, a verdade é alguma coisa que explicaria o significado de tudo. O problema,
é que, normalmente, nos não conhecemos a verdade, conhecemos outras coisas. Nos temos
tendência para pensar que, se sabemos algo, é porque deve ser verdade.
Se aceitarmos que, aquilo que sabemos é diferente da verdade, seriamos muito mais prudentes, e
não iriamos impor nada a ninguém.
Então, se não sabemos a verdade, como é possível termos certezas? O que é que é possível
conhecer com certeza?
O que é possível saber com certeza? Queremos saber com certeza a cor dos cisnes. Então, se
queremos saber com certeza, lançamos um empreendimento científico. Os cientistas começam,
então a procura de cisnes. O primeiro cisne é branco, o segundo, também é branco. Vem 10 cisnes,
e também são brancos. Vem milhares de cisnes, e também são brancos. Concluem que todos os
cisnes, são brancos. Podem ter a certeza que todos os cisnes são brancos? Não, porque não viram
todos os cisnes. Nenhum número, satisfaz a nossa pergunta.
Podemos acumular cisnes, mas, ainda assim, não podemos ter certezas. Mas, será que não
podemos ter certeza sobre nada? Será que podemos alcançar certeza? Para Popper, podemos
alcançar certeza. Por um lado, nunca podermos ter a certeza que todos os cisnes são brancos. Por
outro, basta um cisne não ser branco, para termos certeza que nem todos os cisnes são brancos.

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Passamos a ter certeza de o statement. Todos os cisnes são brancos, é falso. A ciência, tem de ser
feita, na medida, em que se pode dizer que algo está, sempre, correto. A ciência, é a tentativa, de
perceber melhor os fenómenos.
Uma afirmação universal, é uma conjetura (quando é passível de ser submetida a um teste).
O aparecimento de um cisne não branco, é a refutação. Criar uma hipótese, que não seja possível
de ser refutada, não é fazer ciência.
Os cientistas, lançam conjeturas. O que é que nós, os outros cientistas devemos fazer? Devemos
procurar cisnes pretos, pois, só assim, teríamos certeza. Todo o trabalho da ciência, é um trabalho
de mera destruição, ou seja, todo o trabalho científico, passa por destruir. Karl Popper chamou-
lhe: criticar. O trabalho do cientista é, nada mais do que, criticar. Faz lembrar o jogo do tiro aos
pratos. O cientista lança pratos (conjeturas) ao ar, e os outros cientistas vão tentar provar que, o
cientista que mandou o prato, estava errado. Todas as teorias, têm de explicar parte dos
fenómenos, e têm que proibir, sempre, alguma coisa.
A verdade, é um chapéu preto, numa sala, completamente escura. Como progredimos no
conhecimento? Começamos a tocar e vemos que o chapéu, ainda, não está aqui. Todo o nosso
conhecimento é, portanto, conjetural. A verdade, ainda está aqui. Se nós concordarmos que
avançamos no conhecimento, podendo criticar as teorias dos outros, o que é que precisamos para
que o conhecimento avance? O conhecimento avança, falsificando as hipóteses. Há, no entanto,
um elemento crucial: a liberdade. Para podermos refutar/criticar uma teoria, temos de ter liberdade
para o fazer.
A quem é que podemos dar o direito de refutar? A toda a gente. O conhecimento avança pelas
refutações, não pelas conjeturas. Qualquer pessoa, pode refutar.
Até que se encontre algo que refute uma teoria, temos um conhecimento verossímil.
Não existe nenhuma fonte de conhecimento, que seja superior às outras. Todas as fontes de
conhecimento, são igualmente válidas, nenhuma tem autoridade.
Temos liberdade, para nos refutarmos uns aos outros, independentemente de onde venha a
conjetura. Só conseguimos falsificar. Vamos corroborando, no tempo.
O conhecimento conjetural, está sempre sujeito a ser refutado. Todas as teorias científicas, são
científicas, se forem suscetíveis de serem submetidas a testes. As teorias, são tentativas de
explicação. Não há teorias mais válidas, do que outras.
Não sabemos, qual o melhor regime. Não sabendo a verdade, não quer dizer que não existam
factos.
A observação negativa, é o que nos permite saber, e é o que nos traz certeza.
Popper, diz que há dois conceitos de Democracia, e que o conceito mais comum é, também, o
mais antigo. É um conceito errado. O modelo ideal, dado por Platão, está errado. Critica a teoria
de Platão, uma vez que esta não corresponde à realidade.
Dois conceitos de Democracia: Who should rule? Um -- Monarquia; alguns -- Aristocracia; todos
-- Democracia.
Platão introduz uma divisão, baseada em três tipos de regimes. Essa classificação, assenta numa
pergunta fundamental, numa pergunta decisiva, para distinguir os vários tipos de regimes
políticos: Who should rule? Quem deve governar?
Segundo Platão, consoante o tipo de resposta que fosse dado, teríamos regimes políticos
diferentes. Platão, estabeleceu três tipos fundamentais de resposta.

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Teríamos uma Monarquia, quando governa o Rei filósofo. Outro tipo de resposta, seria alguns,
the few, isto é, os melhores. Se o regime, fosse fundando, no governo de alguns, teria o nome de
Aristocracia. Finalmente, não seria, nem o governo de um, nem o governo de alguns, seria o
governo de todos, uma Democracia. A verdade, é que foi esta trilogia, que foi adotada pela
filosofia política ocidental, ao longo dos séculos. Não foi, no entanto, a classificação que a
experiência política prática adotou. Esta foi a classificação inicial, introduzida por Platão.
Platão, também disse que, cada um destes regimes, poderia ter, também, uma versão degenerada.
A Monarquia, poderia degenerar para uma Tirania, a Aristocracia, para uma Oligarquia, e a
Democracia era, já em si mesmo, um regime degenerado.
As definições de Platão e Rosseau, não correspondem à experiência política prática.
A crítica à teoria de Platão: Popper põe em causa, a definição de Democracia. A teoria de Platão,
não corresponde aos factos. A Democracia, não é o governo de todos.
Há duas dimensões, para a crítica de Popper. Uma é empírica, que diz que esta teoria, que esta
divisão/classificação, não corresponde aos factos.
As Democracias realmente existentes, isto é, com sucesso, não correspondem ao governo de
todos. A segunda dimensão, é puramente lógica e filosófica. Consiste em dizer que, esta maneira
de olhar, não só para Democracia, como para os regimes políticos, em geral, é contraditória, ou
seja, leva, inevitavelmente, a um paradoxo.
Se se aceitar que o melhor regime, é a Monarquia, o que é que acontece, se esse um, que deve
governar, decidir entregar o poder, a alguns ou a todos? O que é que acontece ao melhor regime?
Este um, pode decidir, de acordo, com o que achar melhor. Ao entregar o poder a alguns, ou a
todos, destrói o melhor regime. Este paradoxo, não acontece, apenas, no caso da Monarquia,
acontece, também, na Aristocracia e na Democracia.
O que é que acontece, se os alguns que devem governar, decidirem entregar o poder a um, ou a
todos? Destrói-se o melhor regime, de acordo com a definição que tinha sido dada. A definição
de melhor regime, permite a sua própria definição.
Se na Democracia, todos ou a maioria, decidirem entregar o poder, a um ou a alguns? Destrói-se
o melhor regime. Qualquer definição de melhor regime, de acordo com esta trilogia, leva a um
paradoxo -- o melhor regime, pode autodestruir-se, sem a contradição, com a definição inicial de
regime.
Popper, apresenta uma visão alternativa: qual a origem deste paradoxo? A origem do paradoxo,
ocorre por uma razão muito simples, por causa da pergunta. Qualquer tentativa de reposta, a esta
pergunta leva, inevitavelmente, a este paradoxo. Temos de abandonar esta pergunta, e adotar uma
mais compatível, com os factos.
Popper propõe uma nova pergunta: How? Não, quem, mas como?
Quais os procedimentos a adotar? É a pessoa, que tem que se adaptar aos procedimentos. Em vez
de quem, a pergunta começa com: como? Popper, propõe uma primeira versão: how to dismiss a
bad government without bloodshed? Como demitir governos, sem violência?
Esta segunda pergunta, remete para um entendimento negativo. Quais os procedimentos, que
podem evitar o pior regime? A segunda pergunta, visa evitar o pior.
How to avoid tyranny? How to allow change, without bloodshed? Como permitir a mudança, sem
violência?

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Ao começar a analisar esta pergunta, Popper chama a atenção, de que a primeira resposta, a
primeira característica, de um procedimento, que ameaça a Tirania, e que permite demitir
governos, sem violência, é a ideia de Limited Government -- the rule of Law -- constitucional
government.
Precisamos de alguma coisa, de algum princípio, acima do governo. Qualquer que seja o governo,
tem de ser limitado. O governo, não governa, acima da Lei. A Lei fundamental, de um regime
constitucional, é a Constituição. O governo, está limitado pela Lei, e pela Constituição.
Se começarmos a olhar para a questão do melhor, com base nesta pergunta, começamos a
descobrir que esta ideia de governo limitado, não é uma ideia moderna. A ideia de governo
limitado, é uma experiência, que remete para a Grécia antiga, e que surge, principalmente, com a
Magna Carta (1215), uma proposta que limita o poder do Rei. Surge a ideia fundamental do
Parlamento.
A ideia inicial de um governo, que presta contas ao Parlamento, está associada à questão dos
impostos (o Rei, não podia criar novos impostos, sem o consentimento do Parlamento).
O governo que lança impostos, tem de prestar contas ao taxpayers, que estão representados no
Parlamento.
A questão crucial é: como? O governo, é limitado pela Constituição. A Constituição, está acima
do governo, e há uma separação de poderes, associada à ideia de checks and balances. Há ainda,
uma outra muito importante, que é a chamada Bill of Rights, uma lista de direitos do indivíduo,
que não podem ser infringidos, por nenhum governo. Há um outro ponto, que é a accountability
to Parliament, ou seja, a prestação de contas ao Parlamento. O Parlamento, corresponde ao
governo de todos. Acabou por definir a Democracia, pela mesma maneira de Platão. A
Democracia, define-se pela accountability to Parliament. O governo, presta contas a todos.
Popper está a dizer que, esta teoria não diz que a Democracia é o melhor governo, a Democracia
é, apenas, o menos mau.
O Parlamento, é fundamental para fiscalizar. O seu papel principal, é um papel de fiscalização, e
essa fiscalização, é feita under the rule of Law. O Parlamento, é um instrumento da limitação do
governo, e não a fonte de um governo absoluto. O Parlamento, aparece como uma limitação ao
governo. A vontade dos governantes, tem de estar limitada, pelo Parlamento, mas, não só.
O Parlamento, é um dos procedimentos, que impede que caíamos numa Tirania.
Popper defende a sociedade aberta à crítica, à tentativa e ao erro, à refutação e ao conhecimento.
Procuraramos, agora, isolar o pior e promover o melhor (regime). Passamos, agora, à seguinte
questão: como evitar a Tirana? Vamos à procura do pior, para o conseguir evitar.
A Democracia, não é uma fonte de poder absoluto, não é o melhor regime, é sim, um travão aos
governos, que devem ser evitados. Vamos isolar, e perceber quem são os inimigos -- as teorias de
Platão, Engels, Marx e Aristóteles. Os inimigos não são pessoas, são maneiras de pensar, que
põem em risco a sociedade aberta. Estes inimigos ainda perduram e, para Popper, o maior inimigo
de todos, é o Relativismo. São as maneiras de pensar, que fecham a sociedade. Uma sociedade
fechada e presa, é o resultado destes inimigos.
Uma das maneiras de pensar, é o Historicismo; outra é o Positivismo; o Coletivismo; e o
Utopismo.
Estamos a falar de inimigos, inimigos estes que são conceptuais.
The four conceptual enemies of the Open Society
Historicism;

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Ethical Positivism;
Collectivism;
Utopism.
Para o Relativismo, perante dois enunciados, nunca saberemos nada, com certeza, sobre um, ou
sobre outro. Afinal, quem pode dizer, entre dois enunciados, qual é verdadeiro, qual é falso, ou
se ambos o são? Ninguém tem conhecimento suficiente. O Relativismo, não se inibe de dizer que
nunca saberemos nada, sobre os enunciados. Tudo é relativo, ou tudo é igual ao seu contrário.
Nada se pode dizer, sobre nada. Se não podemos dizer nada, sobre nada, como é que sabemos que
tudo algo é relativo? Se o conhecimento é relativo, não temos maneira de chegar a esta conclusão.
Estes autores, encontraram formas de apelar ao Relativismo, que não saem do seu tipo de
conhecimento.
O Historicismo, é a crença de que a História está escrita, e pré-determinada. Tudo o que podemos
fazer, não altera o curso da História. É uma forma de determinismo. A própria História, determina
a História. Há um conjunto de Leis históricas, que existem, independentemente, da nossa vontade,
que vão sempre existir, e que não conseguimos modificar. A História vai-se desenrolar, de acordo
com o que é suposto. Segundo os historicistas, a História já está escrita. Nada do que possamos
fazer, adiantaria alguma coisa.
Tudo o que podemos fazer, é adiantar a História. Se a História já está determinada, porque é que
os revolucionários marxistas fizeram tantos esforços, para concretizar uma revolução, que já ia,
de qualquer forma, acontecer? É uma espécie de justificação, para adiantar o ritmo da História.
É essa a única forma de liberdade, que temos. A passagem entre fases da História, é inevitável.
É a crença, de que a História está pré-determinada. Não há ações livres. Todas as ações, estão
determinadas pela História. Isentamos de qualquer juízo, sobre as ações dos outros -- tudo é
considerado inevitável. É uma espécie de desculpa, para fazer tudo. Dizer que tudo aquilo que
acontece, está escrito nas Leis da História, é igual a dizer: todos os cisnes são brancos. É uma
profecia, que não dá para provar, ou desaprovar. Não é ciência. Não nos leva a lado nenhum, não
há forma alguma de refutar, ou testar, esta teoria.
Communism will be the future;
Há quem ache que se, esta frase for verdadeira, decorre, necessariamente, esta frase: I ought to
support Communism. Se a primeira for verdadeira, a segunda tem que ser verdadeira? Não.
A primeira frase, remete uma matéria de facto, logo, devíamos, moralmente, apoiar o
Comunismo? Não, necessariamente. Porque é que estamos a atribuir, uma espécie de moralidade,
a um facto? Imaginemos que uma, vai, mesmo, levar à outra. Isto acontece porque, o ser e o dever
ser se misturam, já que toda a sociedade seria comunista. Por ser inevitável, é o futuro, e devo
apoiar tudo o que é o inevitável. I choose to support only winning causes -- eu devo apoiar o
Comunismo -- positivismo ético. Os valores, devem ser reduzidos a factos. Devíamos apoiar a
causa vencedora. Se o positivista reduz valores, a factos, e apoia o vencedor, quem é, então, o
vencedor? Quem é que o positivista apoia, mesmo? O vencedor pode ser, apenas, o que tem mais
capacidade, logo, tenho que estar do lado dele. Ideia de: might is right -- ou seja, quem tem poder
e força, vai dizer-nos o que está de facto, correto. Quem tem mais força, faz a História e diz que,
o valor prevalece. O vencedor, faz as regras. Confunde-se força e direito, o que retira qualquer
papel à decisão pessoal, pois acomodamo-nos ao mais forte. Relativismo, é acomodarmo-nos a
quem ganha, a quem tem força de positivar, a quem ameaça mais. O mais forte, determina o que
acontece. Não há mais nada correto, a não ser a causa vencedora. Quem tem a força, diz o que
está correto.

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O terceiro inimigo, é o Coletivismo. É a atitude intelectual, que acredita que existe uma entidade
moral coletiva, ou seja, diferente dos indivíduos, que a compõem. Se alguém faz alguma coisa
pelo Coletivismo, está a fazer melhor, do que se fizesse para si próprio.
Karl Popper, apresenta algumas razões, para não julgarmos uma ação, apenas por se tratar de uma
ação coletiva, ou de uma ação individual. Muitas ações, em nome do coletivo, podem ser, até,
bastante egoístas. Os coletivistas, têm tendência para se verem a si próprios, como uma espécie
de entidade, que age bem, toda junta, só por ser coletiva. Popper diz que, o coletivo pode proceder
a ações egoístas, não muito boas, a pensar, apenas, nos membros do coletivo, e não em toda
humanidade. Só os indivíduos, é que podem ser avaliados, desta maneira. As pessoas, em grupo,
fazem por vezes pior, do que individualmente. O coletivismo, e um extremo individualismo, são
faces da mesma moeda. O individualismo extremo, um é coletivismo dissimulado. O coletivo,
não pode ser agente moral, porque o coletivo não pensa, não age, não espera, não tem voz, não
sente prazer, e não sente dor -- alguém tem de falar pelo coletivo e, portanto, até o coletivo precisa
do individual, logo, há sempre um intérprete no coletivo.
O coletivismo, pode levar a sentimentos de exclusão ódio, vindo de pessoas, que não pertencem
a esse coletivo.
Popper diz que, a sua teoria é interpessoal e, que não há tensão entre sentimentos de grupo, que
um indivíduo possa ter, que até podem ser bons, mas, torna-se mau, quando pensamos que
estamos acima de algo, por estarmos incluídos num grupo -- constitui um inimigo à Democracia.
Para Popper, utopia vai significar violência. Acha que existem várias fontes de conhecimento.
A utopia, é o resultado de uma.
Popper, acha que existem duas maneiras de pensar: a uma vai chamar, racionalismo dogmático e
a outra, racionalismo crítico. Vai associar o utopismo, ao racionalismo dogmático, e a Platão.
O racionalismo crítico, parece ser mais interessente, do que o dogmático, uma vez que apresenta
a sua própria crítica.
Segundo Popper: todos os grandes cientistas, tinham de dizer aos seus alunos, como é que podem
ser refutados. O papel da crítica, é fundamental. O racionalismo crítico, é aquele que sabe que a
próprio razão, não nos dá teorias, assim tão acertadas. A razão, é suspeita. Porque é que
acreditamos na razão? A melhor razão, é a crítica.
O racionalismo dogmático, acha que vai haver uma medida certa e que, por inspeção da razão, se
pensarmos bem sobre o assunto, podemos chegar a uma conclusão.
O racionalista dogmático acha que, através da razão, podemos chegar a uma conclusão, isto é, a
uma sociedade perfeita, a uma utopia. Se usarmos a razão, como a única fonte de conhecimento
que devemos usar, podemos projetar, na sociedade, o que está correto, isto é, as conclusões a que
a razão chegou. Os racionalistas dogmáticos, pensam que a razão pode-nos dar a solução, a
resposta definitiva: uma sociedade, que poderia ser projetada de forma global, através de uma
blue print. A sociedade, poderia ser projetiva, como uma global utopian blueprint.
Uma utopia, seria todos sermos totalmente felizes.
O racionalismo crítico, não despreza a imaginação, o sonho, a tradição, e a tentativa-erro -- são
tudo formas de conhecimento. A felicidade de todos, na mesma medida, é uma ideia de Platão.
Há, contudo, um problema: existem várias formas de felicidade. Uma sociedade projetada para a
felicidade de todos, vai ser a felicidade de quem? O que é a felicidade de todos?

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Ñão só há uma grande diversidade de felicidade, como as felicidades das pessoas, não são muito
compatíveis. A ‘nossa’ felicidade, tem a ver com os nossos esforços pessoais. A felicidade, vai
ser aquela, que o poder acha que devíamos ter. Iam ter, que nos ensinar, a ser felizes e a aceitar
aquilo que o governo tinha programado, para sermos felizes. O que o governo acha racional é, no
fundo, melhor para todos e é, também, uma grande irracionalidade, porque é, também, uma
escolha de paixão. Esta maneira que o governo escolheu, para ser compatível, para todos nós é,
também, resultado de uma preferência, de alguém que ganhou. A ideia de felicidade, para todos,
vai ser a paixão do vencedor, e vão haver tensões, entre as várias ideias de felicidade.
Racionalismo dogmático, compara-se ao irracionalismo. Diz que, tudo o que for resultado da
inspeção racional, estará correto, mas, é forma de razão que, mais facilmente, leva à
irracionalidade. Popper associa esta irracionalidade, a sociedades pequenas e fechadas. São estas
sociedades pequenas, que as pessoas vão tentar competir, umas com as outras, por uma noção de
felicidade, que se ache coreto. Vão estar, sempre, em guerrilha, a lutar por fins, que não passam
de são preferências.
Não há utopismos, sem o desprezo das pessoas, tal e qual, com elas são. Se não há ciência
possível, também não há argumentos. Quando não há argumentos, descamba a violência.
A tentativa de construir uma utopia, vai levar à violência. Não há discussão possível.
As pessoas são todas diferentes, nem todas vão ser felizes, e a maioria vão ser felizes, devido a
elementos, que não são políticos. Cada um tem o seu próprio conceito de felicidade, que não se
presume superior, e que dialoga com todas as fontes de conhecimento. Se não podemos ter um
plano ideal, em relação à sociedade, o que podemos fazer na sociedade?
Ligar sociedade e política, normalmente, não dá bom resultado. A política, tem de ser o oposto
de global e utópico. O esforço político deve atuar, de forma parcelar. Não projeta uma sociedade,
um blue print, mais, vai atuar de forma parcelar, nunca global. Vai atuar, aos bocados.
Em vez de se promover bens abstratos (como na utopia), a política deve atuar sobre males
concretos. Para Popper, é fácil concordamos que alguém está doente, mas, não há consenso sobre
qual deverá ser o melhor modo de vida a adotar, etc., cada um tem a sua versão. Em vez de
promover a saúde, há que promover medidas/formas de combater a doença, e em caso de doença,
atuar sobre quem está mal. Olhar para o cisne preto. A política, é a procura dos cisnes pretos --
combater o mal concreto. Em vez de promover bens abstratos, o sistema piecemeal social
engineering tenta contribuir para eliminar males concretos. Temos a defesa de uma intervenção
indireta, sempre de um lado negativo (à procura do que não corre bem, do que refuta a teoria, de
uma forma de o governo atuar, sobre o que está mal). Forma de utilitarismo negativo -- a política,
devia centrar-se no problema mais concreto, em quem está pior, não se preocupando com quem
vive bem. Quem está mal, é quem precisa de mais apoio.
Quando falamos de historicismo, não falamos de um argumento. O historicismo não é refutável,
por uma razão: a História está pré-determinada, e tem várias fases e, se isto for verdade, porque é
o historicista acha que sabe qual é a próxima fase? Se o historicismo funcionou até agora, como
é que sabemos que vai funcionar no futuro? Se Karl Marx diz que, são as metodologias que nos
dão cada uma das fases, e que nos vão levar até as próximas, como é que se sabe que a próxima
fase, é o Comunismo? Ele só poderia saber, quando chegasse a essa fase. As fases não são futuras,
são presentes. A única forma para o historicismo, ser lógico, era passar-se o futuro, no próprio
hoje. Não posso não saber nada sobre amanhã, e esta forma ser verdadeira hoje, sem o futuro ser
hoje. O historicismo, é o produto da própria fase, em que se está, e não se verifica sempre.
Se toda as fases da História estão determinadas, e se tudo o que temos é fruto da fase histórica em
que estamos, então, o próprio historicismo, é produto da fase em que nos encontramos.

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