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Centro Sócio–Econômico
Departamento de Ciências Econômicas
Evolução do Pensamento
Econômico
Lauro Mattei
M435e Mattei, Lauro
110p.: il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-89032-32-2
CDU: 330.834
Universidade Federal de Santa Catarina, Sistema UAB. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida,
transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por
escrito, dos autores.
GOVERNO FEDERAL
CENTRO SÓCIO-ECONÔMICO
Diretor Ricardo José Araújo Oliveira
Vice-Diretor Alexandre Marino Costa
UNIDADE 1
BREVE SÍNTESE SOBRE A EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO
ECONÔMICO E ESTRUTURA DO LIVRO DIDÁTICO
UNIDADE 2
OS FISIOCRATAS E OS PRIMEIROS PASSOS PARA A
CONSTITUIÇÃO DA ECONOMIA POLÍTICA
UNIDADE 3
A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA E OS PRIMEIROS
FUNDAMENTOS DO PENSAMENTO ECONÔMICO
UNIDADE 4
MARX E A CRÍTICA À ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA
UNIDADE 5
OS MARGINALISTAS E A FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
NEOCLÁSSICA
UNIDADE 7
O PENSAMENTO MACROECONÔMICO PÓS TEORIA GERAL
DE KEYNES
Referências................................................................................................................... 110
Palavra do professor
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Evolução do Pensamento Econômico
Resumidamente pode-se dizer que no sistema feudal, dada a forma que se or-
ganizou a produção no âmbito dos feudos, primava-se pela auto-sustentação,
o que acabava restringindo o processo de trocas entre as pessoas e comunida-
des, ou seja, havia pouca geração de excedente, o que impedia a formação e
evolução de mercados.
Com o processo de desintegração do feudalismo criou-se espaço para o
desenvolvimento de atividades comerciais nas cidades, o que impulsionou
fortemente as grandes disputas comerciais entre as nações da época. Essa
corrida em busca de novas mercadorias, em especial de metais preciosos, fi-
cou conhecida como o período do “Mercantilismo”. Com quase três séculos
de duração, este período histórico apresentou um conjunto de mudanças na
ordem econômica, social e política.
Estritamente do ponto de vista econômico, essa expansão do processo de
trocas impôs mudanças nos sistemas produtivos vigentes. Nesta fase, os pro-
dutores já se separam dos vendedores e a pequena indústria artesanal começa
a ser substituída pelas pequenas manufaturas. Esse processo intensifica a di-
visão do trabalho, levando ao aumento da produção e, consequentemente, a
geração de excedentes que passa a ser trocado nas feiras e mercados. Neste
movimento reside a gênese do sistema capitalista, que somente se tornou um
sistema de produção completo quando essas relações de produção atingiram
todos os ramos de atividades.
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Unidade 1 - Breve síntese sobre a evolução do pensamento econômico...
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Evolução do Pensamento Econômico
Mas não devemos esquecer que o pensamento econômico clássico estava im-
pregnado pelos valores político-filosóficos da época, o que levou a formação
de um arcabouço teórico assentado nas seguintes proposições:
• Mercado: é o elemento revolucionário e se firma como a mão invisível
que concilia o benefício privado com o bem-estar coletivo. Essa mão
invisível expressa a adequação entre a ordem econômica e a ordem na-
tural, prevalecendo a harmonia social em que todos ganham;
• Liberdade individual: a lógica da ação individual permeada pela bus-
ca dos interesses privados e particulares; é o coração motor do sistema
econômico Smithiano;
• Liberdade econômica: é fundamental para os capitalistas organizarem os
mercados, principalmente operando os mesmos em livre concorrência;
• Propriedade privada: o progresso econômico e social está condiciona-
do ao respeito à propriedade privada;
• Estado mínimo: o Estado não deveria se envolver em assuntos econô-
micos, mas restringir sua atuação às áreas da segurança, da justiça e das
instituições sociais (educação, saúde).
Toda a fundamentação teórica clássica previa um funcionamento harmonioso
da sociedade. Bastava apenas que os interesses individuais fossem atingidos
para que o bem coletivo se realizasse. É a essência da filosofia individualista
que aos poucos também vai se impregnando no pensamento econômico.
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Unidade 1 - Breve síntese sobre a evolução do pensamento econômico...
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Evolução do Pensamento Econômico
Marx então se pergunta: qual era o segredo ou o mistério que envolvia as trocas?
Para ele, “nas trocas estão sendo cambiados trabalhos socialmente necessários, mas
há uma troca especial envolvida nesse processo: a troca entre capital e trabalho,
porque ela esconde uma razão de não-equivalência, a qual deriva do fato de que o
capital paga a força de trabalho, porém o valor do trabalho apropriado pelo capital
é superior ao valor da força de trabalho, uma vez que uma parcela do trabalho não
é paga (sobre-trabalho). É isso que faz com que o trabalho se subordine ao capital”.
A partir daí vai ser formulada a teoria do valor-trabalho que mostrou o se-
gredo do modo de produção capitalista, bem como suas leis gerais e as crises
sistêmicas. Talvez por isso mesmo passou a ser um autor questionado e perse-
guido até final de sua vida. É neste contexto que vai aparecer, ainda no Século
XIX, uma nova linha interpretativa da sociedade econômica.
Conhecido como pensamento econômico Neoclássico, esta corrente de pen-
samento muda o foco do debate e passa a dar maior ênfase na capacidade hu-
mana de fazer escolhas. Deste modo, qualquer escolha dos agentes econômicos,
quanto à alocação dos recursos, implica em uma relação entre custos (meios
empregados) e benefícios (resultados obtidos). Partindo-se da capacidade do
mercado, de atender a todas as satisfações materiais do homem, afirma-se que o
uso eficiente dos meios escassos propicia os melhores resultados. Com isso, a te-
oria deixa de tratar os fenômenos reais para enfatizar os problemas de escolhas,
tornando as explicações extremamente subjetivas e pouco empíricas.
A partir dessa concepção forma-se a teoria do Valor-Utilidade, em que se
afirma que o benefício adicional do aumento de um determinado bem dimi-
nui com o aumento da quantidade do mesmo. Por isso é que os desejos são
medidos indiretamente, ou seja, pelo preço que a pessoa se dispõe a pagar.
Isto permite definir que a utilidade marginal de uma coisa para uma pessoa
diminui a cada aumento da quantidade dessa coisa.
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Evolução do Pensamento Econômico
Keynes partiu do pressuposto que “a sociedade capitalista de sua época (Século XX)
tinha dois dilemas básicos para resolver: o desemprego e a desigualdade na distri-
buição da renda. Para ele, a expansão contínua dessas desigualdades se transforma-
ria em ameaça real à estabilidade do sistema econômico capitalista”.
Suas teses são uma reação contrária à teoria Neoclássica, considerada por
Keynes inconsistente para explicar fenômenos reais, como o desemprego, e fe-
nômenos monetários, como o papel dos juros e da moeda no funcionamento
do sistema econômico, além da própria crise geral desse sistema.
Neste sentido, suas fundamentações se concentram tanto no campo teórico, com
questionamentos decisivos sobre o paradigma vigente, como no campo prático,
com a redefinição do papel da política econômica. Isto porque Keynes acredi-
tava que os problemas do emprego e dos salários não se resolveriam pela ideia
simples do livre mercado. Para tanto, entendia ser necessário que os governos
tivessem uma presença mais ativa na condução da vida econômica dos países.
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Unidade 1 - Breve síntese sobre a evolução do pensamento econômico...
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Unidade 2 - Os fisiocratas e os primeiros passos para a constituição da economia política
Para se familiarizar com essa escola de pensamento econômico você irá conhecer os
seus principais integrantes e estudar:
• Os preceitos mercantilistas que antecederam ao novo grupo de pensadores;
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Unidade 2 - Os fisiocratas e os primeiros passos para a constituição da economia política
A primeira metade do Século XVIII foi o período de maior influên cia desses
pensadores. Com a morte de Quesnais em 1774 e a revolução francesa na
sequência, essa escola é praticamente esquecida, sendo que alguns de seus
fundamentos voltam ao debate quase cem anos mais tarde, quando Marx os
discute em suas teses.
Em meados do Século XVIII o contexto francês era marcado por atividades
econômicas predominantemente agrícolas, porém a renda dos camponeses
era extremamente baixa, levando a população rural a um estado de pobreza
e de miséria. Enquanto a nobreza era protegida dos impostos, os campone-
ses eram expropriados pela estrutura tributária. Decorre daí a preocupação
central dos Fisiocratas: compreender as causas de tal pobreza, bem como a
forma de prosperidade humana. Para isso, precisavam entender a dinâmica
do processo econômico. Para tanto, se baseavam na crença de que todas as
atividades econômicas eram controladas por leis naturais, as quais estavam
sob o comando divino (Deus).
A partir dessa formulação passam a admitir que a sociedade humana da época
era governada pelas forças da natureza. É justamente neste enfoque que a agri-
cultura torna-se a fonte de inspiração e de explicação das teorias propostas.
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Unidade 2 - Os fisiocratas e os primeiros passos para a constituição da economia política
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Unidade 2 - Os fisiocratas e os primeiros passos para a constituição da economia política
Resumo da unidade:
O estudo dessa unidade possibilitou uma primeira aproximação com alguns fun-
damentos essenciais da economia política clássica, que encontra nos Fisiocratas
os seus primórdios. Pode-se dizer que esta corrente de pensamento elaborou uma
doutrina natural da vida econômica a partir das condições objetivas de seu funcio-
namento à época.
Adotando uma visão geral do sistema econômico, analisam o mesmo a partir da
interação dos indivíduos com o meio natural. Esse caminho analítico pôde ser enun-
ciado à luz de três ideias fundamentais: a produção, a circulação e a distribuição do
produto social. Com isso, concluem que a vida econômica de um povo surge e evolui
como um sistema de relações de intercâmbios que, renovando-se periodicamente,
aproxima as esferas da produção e do consumo.
Essa relação que se formula entre o produto social e a riqueza nacional colocou em
destaque um tema até então alheio aos debates: a geração da riqueza e sua reparti-
ção social. Sem dúvida, essa foi uma das grandes contribuições dos Fisiocratas para
a própria fundamentação da Economia Política Clássica, conforme veremos na uni-
dade seguinte.
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Evolução do Pensamento Econômico
Atividade de Aprendizagem – 2
Procure fazer uma revisão da unidade visando fixar os ensinamentos básicos dos
Fisiocratas, buscando responder os seguintes aspectos:
1) Quais os principais fundamentos dessa escola de pensamento?
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Unidade 3 - A economia política clássica e os primeiros fundamentos do pensamento econômico
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Evolução do Pensamento Econômico
Decorre daí o objeto central de estudo da Economia Política: entender as leis relacio-
nadas à produção e distribuição de bens destinados a satisfazer as necessidades hu-
manas, tanto individuais como coletivas. Ou seja, entender que da ação do homem
sobre a natureza visando atender suas necessidades decorrem relações de produção
e de distribuição que se consubstanciam em processos econômicos.
Desta forma, objeto (relações do homem com a natureza para satisfazer suas neces-
sidades) e objetivo (entender as leis que governam esse processo) dão consistência
a uma definição conceitual geral de Economia Política: é a ciência que estuda as leis
sociais relacionadas às atividades econômicas.
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Unidade 3 - A economia política clássica e os primeiros fundamentos do pensamento econômico
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Unidade 3 - A economia política clássica e os primeiros fundamentos do pensamento econômico
A obra de Smith é extremamente vasta. Todavia, para os propósitos deste curso va-
mos nos ater a seus dois campos de estudos primordiais: econômico e político
No campo econômico:
Ao analisar o curso da revolução industrial Smith percebeu duas coisas impor-
tantes: a) a existência da interdependência entre os homens, uma vez que
esses homens produzem bens para si e também para os outros, o que torna a
sociedade atomizada, uma vez que as pessoas se relacionam entre si para suprir
suas necessidades. Esse processo é mediado pelas trocas e vai desembocar em
uma característica muito especial da sociedade industrial: a formação de uma
sociedade de trocas permeada pelo mercado (elemento revolucionário) e pelo
trabalho (elemento que dá sentido ao mercado); b) a Divisão do Trabalho
era o elemento responsável pela alteração do bem-estar da sociedade. E essa
divisão era a forma de existência do homem, uma vez que sua sobrevivência
dependia de sua quantidade de trabalho, que era regulada pelo mercado.
Dessas percepções surge um novo campo de preocupação: descobrir o que
se encontrava por detrás das trocas, ou seja, porque elas eram realizadas de
acordo com determinadas proporções. Aqui Smith já adianta que o trabalho
é o elemento decisivo, porque somente através dele era possível estabelecer
a equivalência entre as mercadorias, ou seja, o trabalho era o elemento de
intercâmbio entre as mercaorias.
Smith era contra as leis que diziam o que deveria ser produzido, pois enten-
dia que “não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro e do padeiro
que esperamos nosso jantar, mas de suas preocupações com os seus próprios
interesses” (SMITH, 1988, p. 25). E esses produtores devem concorrer nos
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Evolução do Pensamento Econômico
No campo político:
A aversão de Smith à intervenção do Estado na economia decorria, em grande
parte, da corrupção, dos favores e da tirania dos monarcas europeus e, es-
pecialmente, dos ingleses. Nesta lógica, Smith define o conceito de Estado-
Mínimo, cujas funções deveriam ser: proteger o país contra os invasores
externos; proteger os indivíduos contra as injustiças e manter as instituições
públicas (saúde, educação e habitação) que, devido a sua natureza, os lucros
jamais compensariam as despesas caso essas instituições estivessem ao encar-
go de um pequeno número de indivíduos.
Posteriormente, essas funções foram ganhando novos contornos e culmina-
ram que o Estado, na parte referente à defesa do território, também poderia
usar sua estrutura militar para adentrar em novos mercados. Além disso, a
proteção de justiça aos cidadãos passou a ter uma nova dimensão: proteger a
propriedade e garantir o cumprimento dos contratos (essenciais para o bom
funcionamento do capitalismo). Finalmente, a função de manter instituições
de interesse público foi sendo interpretada como a criação e a manutenção de
instituições que fomentassem a produção e as operações comerciais.
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Unidade 3 - A economia política clássica e os primeiros fundamentos do pensamento econômico
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Unidade 3 - A economia política clássica e os primeiros fundamentos do pensamento econômico
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A partir daí o autor passou a formular um conjunto de leis que explicassem o fun-
cionamento da sociedade de sua época, com destaque para a Teoria da renda da
terra (também conhecida como renda diferencial); Teoria do comércio internacional
(também conhecida como teoria das vantagens comparativas); Teoria do lucro; e
Teoria do valor-trabalho. Todos esses aspectos teóricos já foram discutidos na disci-
plina de “Economia Clássica”, não sendo necessário retomá-los aqui.
Analisando o processo produtivo de sua época, o autor afirma que uma das
questões mais importantes a serem discutidas era a forma de determinação
do valor das mercadorias e a consequente geração do lucro, tendo em vista os
efeitos deste sobre o nível dos salários. Decorre daí seu embate com a teoria
do valor-trabalho de Smith.
Para Ricardo o valor das mercadorias era definido pela quantidade de traba-
lho contida nessas mercadorias, uma vez que entendia que o valor das coisas
era o trabalho para se produzir essas coisas e não da maior ou menor remune-
ração auferida pelo trabalhador, conforme definiu Smith. Para tanto, o autor
considerava que na troca de mercadorias ocorria troca de quantidades iguais
de trabalho utilizados na produção.
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Unidade 3 - A economia política clássica e os primeiros fundamentos do pensamento econômico
Resumo da unidade:
Esta unidade buscou recuperar a formação e a fundamentação do pensamento
econômico clássico, que tem em Adam Smith e David Ricardo seus dois principais
expoentes. Porém, diferentemente de muitos livros textos, procurei fazer aqui uma
conexão entre os pressupostos especificamente econômicos e a ideologia política
da época, no caso o liberalismo enquanto doutrina filosófica dominante.
Neste sentido, é importante observar como a Economia Política Clássica, conside-
rada a base de toda fundamentação do pensamento econômico, está impregnada
por aqueles valores. Tal situação foi potencializada pela revolução industrial e por
importantes fatos políticos que marcaram todo o período da fase inicial do sistema
capitalista de produção.
E é exatamente no seio das contradições da própria evolução deste sistema de pro-
dução que irão surgir novas teorias para se contrapor aos conhecimentos científico
e econômico instituídos nas sociedades da época. Decorrem daí as distintas aborda-
gens que organizaram o pensamento econômico no passado e, porque não dizer, o
organizam também no presente.
Atividade de Aprendizagem – 3
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Unidade 4 - Marx e a crítica à economia política clássica
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Evolução do Pensamento Econômico
Apenas relembrando que Marx inicia sua exposição não pela definição con-
ceitual da mercadoria, mas pela sua forma econômica real. Ou seja, inicia sua
fundamentação pela forma como a mercadoria se apresenta, pela sua manifes-
tação imediata. Após esse percurso, utiliza-se de abstrações para avançar em
suas análises e, posteriormente, reconstruir as formas econômicas mais com-
plexas de tal forma a atingir seu objetivo final: desvendar as leis econômicas
que governam o movimento da sociedade capitalista moderna.
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Unidade 4 - Marx e a crítica à economia política clássica
Mesmo com todas essas atividades políticas, Marx conseguiu escrever sua obra má-
xima. Porém, como já é de conhecimento de vocês, somente o primeiro volume de
O Capital foi publicado em vida, sendo que os demais foram organizados por Engels
após a morte de Marx.
No primeiro volume de sua obra seminal, Marx retoma a lei do valor e deduz a
partir dela a produção da mais-valia, considerando ser esta sua maior contri-
buição para a economia política. No segundo volume estuda-se o processo de
circulação do capital, contendo os esquemas de reprodução simples e repro-
dução ampliada do capital. Finalmente, o terceiro volume trata do processo
global de produção capitalista, apresentação a transformação de valores em
preços, a lei da tendência à queda da taxa de lucros e as teorias do juro e da
renda da terra.
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Unidade 4 - Marx e a crítica à economia política clássica
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Para tanto, seu ponto de partida foi a mercadoria porque ela contém o produ-
to do trabalho humano. Para Marx, as mercadorias adquirem valor não pelas
suas propriedades naturais, mas por causa das relações sociais de produção
que se estabelecem. Mas essas relações ocorrem pelas mercadorias e também
através delas, porém na base dessas relações de produção encontra-se sempre
uma única relação: o capital versus o trabalho.
Marx faz a crítica à economia política clássica, tentando compreender o signifi-
cado do valor a partir das leis gerais do sistema capitalista. Contrariamente aos
“clássicos”, Marx afirmava que a sociedade de sua época não era de trocas, mas
sim uma sociedade do capital porque são suas leis que governam os homens.
Marx então se pergunta: qual era o segredo ou o mistério que envolvia as
trocas?
Para ele, nas trocas estão sendo cambiados trabalhos socialmente necessários,
mas há uma troca especial envolvida nesse processo: a troca entre capital e
trabalho porque ela esconde uma razão de não-equivalência, a qual deriva
do fato de que o capital paga a força de trabalho, porém o valor do trabalho
apropriado pelo capital é superior ao valor da força de trabalho, uma vez que
uma parcela do trabalho não é paga (sobre-trabalho). É isso que faz com que
o trabalho se subordine ao capital.
Portanto, Marx trata a mercadoria como a célula econômica da sociedade, por-
que ela possui o produto do trabalho humano, que se expressa na forma valor.
As mercadorias possuem valor de uso, que diz respeito à qualidade e utilidade
da mercadoria, e valor de troca, que expressa à proporção pela qual valores de
uso de uma determinada mercadoria são trocados por valores de uso de outras
mercadorias. O que significa dizer que nas trocas são permutados produtos que
possuem valor de uso também para os outros, porém com valores distintos. Isso
implica dizer, também, que os tipos de trabalho não são iguais.
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Unidade 4 - Marx e a crítica à economia política clássica
Com isso, Marx observa que as mercadorias – como valor de uso – possuem
qualidades diferentes e – como valor de troca – têm quantidades diferentes.
Isso o permite concluir que a troca exprime uma relação social em que o valor
de uso de uma mercadoria representa exatamente o valor de uso de outra
mercadoria. Marx então afirma que o caráter misterioso da mercadoria con-
siste no fato de que ela mostra aos homens as características sociais de seu
próprio trabalho.
A partir daí a mercadoria passa a ser analisada sob dois aspectos: o material,
contendo o trabalho concreto que é definido pela destreza e habilidade dos
trabalhadores; e o abstrato, que é a igualação social dos diferentes tipos de
trabalho, ou seja, o trabalho social, que nada mais é senão o trabalho que
todos executam e que produz as relações sociais. É esse trabalho que funda-
menta a sociedade capitalista.
Marx dizia, ainda, que o que conectava os homens era a propriedade privada que
o trabalho adquiria. Assim, diferentemente dos clássicos que concebiam o trabalho
como unidade de valor, Marx vai dizer que a unidade de valor é a propriedade priva-
da advinda do trabalho.
Outra diferença fundamental de Marx em relação aos clássicos é sua análise das clas-
ses sociais, uma vez que, diferentemente de Smith e Ricardo, Marx entendia que
existiam apenas duas classes: os Proprietários privados dos meios de produção e os
Não-Proprietários privados dos meios de produção.
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Evolução do Pensamento Econômico
Decorre daí a conclusão de Marx de que o trabalho não é valor. O valor é uma relação
social que faz com que o trabalho de cada um se transforme em trabalho social. E é
esse trabalho social que se torna a substância do valor. Durante a produção da mer-
cadoria ocorre o desprendimento de energia física e mental, que é o trabalho social,
e que se expressa em valor no momento da troca.
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Unidade 4 - Marx e a crítica à economia política clássica
Como a mercadoria possui valor de uso (que diz respeito à qualidade e à uti-
lidade das mercadorias – características que as diferenciam umas das outras)
e valor de troca (que expressa à proporção pela qual valores de uso de uma
mercadoria são trocados por valor de uso de outras mercadorias - relação
quantitativa que muda com o tempo), a troca exprime uma relação social em
que o valor de uso de uma mercadoria representa o valor de outra mercadoria.
Portanto, aqui ocorre uma igualação das mercadorias através do trabalho.
Com isso, o trabalho individual de cada um se transforma em trabalho social
(igualação dos diferentes tipos de trabalho), sendo que a troca transforma os
diferentes tipos de trabalho em equivalentes. E essa transformação é deter-
minada pelo tempo de trabalho socialmente necessário (trabalho gasto, em
média, na sociedade para produzir as mercadorias) e exprime uma relação
entre o trabalho concreto de um produtor de uma mercadoria e o trabalho
concreto dos outros produtores das demais mercadorias.
Essa média, porém não advém da produtividade individual, mas da produti-
vidade média da sociedade. Essa média é encontrada no mercado, através dos
movimentos de oferta e procura. É isso que faz com que, no longo prazo, as
mercadorias mantenham seus valores.
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Marx então afirma que “é neste momento que aparece a contradição fundamental
do modo de produção capitalista: o produto da jornada de trabalho (aquilo que foi
produzido durante x horas de trabalho) entregue ao capitalista (dono dos meios de
produção) era maior que o valor da cesta de bens que o capitalista devolvia ao tra-
balhador, em forma de salário, pelo pagamento de sua jornada de trabalho. A partir
daí ele vai estudar essa contradição e explicar suas consequências”.
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Unidade 4 - Marx e a crítica à economia política clássica
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Esse limite introduz então o tema da mais-valia relativa, que é obtida através
da redução do tempo de trabalho para reproduzir a FT. Esse processo se dá
via aumento da produtividade do trabalho a partir das inovações tecnológicas.
A finalidade é sempre baratear o custo da FT e, com isso, reduzir o trabalho
necessário sem que ocorra redução da jornada de trabalho. O resultado final
é que o trabalho excedente aumentará. Por isso, Marx afirma que a criação da
mais-valia ocorre no processo de produção.
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Unidade 4 - Marx e a crítica à economia política clássica
TxMV = MV/CV
Essa taxa mede a razão entre o trabalho necessário para reprodução da FT
e a proporção de trabalho excedente. Registre-se que essa relação sempre é
expressa em termos monetários porque no sistema capitalista o dinheiro é a
expressão monetária do valor.
Vejamos um exemplo simples. Suponha um salário (W) de R$ 20,00 e R$
10,00 acrescidos ao produto ao final da jornada de trabalho (MV), com um
montante de capital da ordem de R$ 80,00. Então,
C= CC+CV+MV
C = 50 + 20 + 10
T x MV = MV/CV = 10/20 = 0,5 ou 50%
Essa taxa, como já vimos, pode ser aumentada de diversas maneiras. Pelo
aumento da jornada de trabalho; pela redução dos salários; e pela elevação da
produtividade do trabalho, via inovações tecnológicas.
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Evolução do Pensamento Econômico
É importante não confundir essa taxa de lucro com a taxa de mais-valia, uma
vez que a primeira considera o trabalho passado que se materializa nas máqui-
nas, equipamentos, prédios, etc., que aos poucos é transferido ao produto final.
Essa relação, segundo Marx o elemento chave do sistema capitalista, está em
função da MV e da COC, conforme fórmula seguinte:
L= MV (1 – COC)
Desta forma, pela taxa de lucro é possível observar que a concentração de capitais
se eleva, diminuindo o número de capitalistas. Nesta lógica, o trabalho teria cada vez
menos espaço no processo produtivo e, em consequência, os salários cada vez mais
reduziriam sua participação no conjunto da riqueza da sociedade.
A partir desse movimento, segundo Marx, surgiria o “Exército Industrial de Reserva”
composto por trabalhadores latentes, flutuantes, estagnados e pauperizados. O vo-
lume desse exército é que iria influenciar decisivamente o valor dos salários. Assim,
quanto maior esse número, menor a possibilidade dos salários aumentarem.
E assim Marx chega a sua derradeira conclusão: os salários sempre perdem! Isso é
totalmente distinto das teses de Smith (todos ganhavam) e de Ricardo (se salários
aumentassem os lucros cairiam).
Resumo da unidade:
Nesta unidade expusemos de forma bastante simples a fundamentação teórica de
Marx, cujo objetivo principal era entender as leis gerais que governam o funciona-
mento da sociedade capitalista de sua época. Para tanto, vimos que a base argu-
mentativa de Marx foge às amarras das teses clássicas de Smith que previam um
funcionamento harmonioso dessa sociedade.
Para Marx a sociedade capitalista moderna era movida pela contradição social evi-
denciada através da contraposição dos interesses do capital em relação ao trabalho,
sua substância de valorização. E era justamente essa contradição que explicitava aos
olhos de todos exatamente o oposto daquilo que a Economia Clássica propunha, ou
seja, o bem-estar coletivo. Sem dúvida, esta é a razão fundamental que não permite
que Marx seja estudado como um autor da “escola clássica”, como faz a grande maio-
ria dos livros e manuais sobre evolução do pensamento econômico.
Exatamente por entender que da relação entre capital e trabalho nascia à contradi-
ção social fundamental, Marx afirmava que a saída seria os homens construírem ou-
tra sociedade, em que sua reprodução e a própria geração de riqueza não ficassem
presas à relação salário versus lucro (W/L).
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Unidade 4 - Marx e a crítica à economia política clássica
Atividade de Aprendizagem – 4
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Anotações d m a
importante
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Unidade 5 - Os marginalistas e a fundamentação teórica neoclássica
OS MARGINALISTAS E A FUNDAMENTAÇÃO
TEÓRICA NEOCLÁSSICA
• Nas unidades anteriores vimos que a Economia Política, tanta a Clássica
como a Marxista, dava ênfase às relações sociais de produção que se
estabeleciam entre os homens e suas atividades econômicas.
• Nesta unidade veremos como a Escola Neoclássica dará ênfase na capa-
cidade humana de fazer escolhas, em função dos múltiplos fins e meios
para se efetivar essas escolhas. Deste modo, qualquer escolha dos agen-
tes econômicos quanto à alocação dos recursos implica em uma relação
entre custos (meios empregados) e benefícios (resultados obtidos).
Partindo-se da capacidade do mercado de atender a todas as satisfações ma-
teriais do homem, afirma-se que o uso eficiente dos meios escassos propicia
os melhores resultados. Com isso, a teoria deixa de tratar os fenômenos reais
para enfatizar os problemas de escolhas, tornando as explicações extrema-
mente subjetivas e pouco empíricas.
3) A Teoria do Valor-Utilidade;
Saiba que desde a obra seminal de Marx as teorias que enfatizassem as relações so-
ciais de produção e explorassem as contradições do sistema econômico capitalista
não eram desejáveis, ao passo que as teorias que não abordassem esses antagonis-
mos passaram a ser bem acolhidas e respeitadas.
Neste caso, deve-se destacar que as diversas teorias marginalistas não tinham
como objetivos estudar a evolução e as crises do sistema econômico capitalista,
que na época já migrara da fase concorrencial para a monopolista. Apenas pre-
tendiam provar que o capital também era criador de valor e que os preços dos
bens e serviços caminhavam sempre para uma situação de equilíbrio estável.
Por isso a rota da formação do pensamento econômico daria sua grande gui-
nada nesta época, já que os economistas deixaram de se preocupar com o
processo de produção e de distribuição da riqueza e voltaram suas atenções/
preocupações para a alocação dos recursos visando maximizar a utilidade e
a satisfação dos consumidores. Para tanto, as escolas marginalistas desenvol-
veram a teoria do valor utilidade, tentando integrá-la à teoria dos custos de
produção da economia clássica.
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continha valor de uso e valor de troca, como vimos nas unidades anteriores.
Agora a mercadoria passa a ser portadora de valores pessoais, ou seja, ela é
tratada como um bem superior que atenderá o consumo pessoal e seu valor é
definido subjetivamente, sem qualquer relação com o trabalho.
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Além de formular suas teses abstratamente sobre uma economia imaginária de tro-
cas, diversas questões ficaram sem respostas e tornaram-se motivo de grandes con-
trovérsias no Século XX, conforme veremos na unidade seguinte.
Essa formulação de Jevons não consegue dar conta de fenômenos reais como, por
exemplo, das relações de preços dos bens entre setores. Além disso, não ofereceu uma
explicação convincente sobre o que determina o custo de produção das mercadorias.
Em resumo, sua teoria apenas demonstra que, para os preços existentes, é desejável
que cada indivíduo possa obter as quantidades de mercadorias que deseja comprar.
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Resumo da unidade:
Nesta unidade expusemos de forma sintética toda a fundamentação básica do pen-
samento econômico Neoclássico que, ao contrário das escolas estudadas anterior-
mente, procurou explicar o funcionamento da sociedade do final do Século XIX e
início do Século XX com base no valor-utilidade dos bens. A partir daí desloca-se a
preocupação anterior que dominou o pensamento econômico por mais de um sé-
culo da órbita da sociedade em seu conjunto para a esfera dos indivíduos.
Por detrás dessas explicações buscou-se formular uma tese geral em contraposição
às ideias Marxiana, ou seja, comprovar que não era apenas o trabalho que gerava
valor. Para tanto, através da teoria da utilidade a síntese marginalista apresentou
agrupamentos de noções básicas do pensamento clássico com suas teses básicas.
Dentre estas, destaca-se a fundamentação nos pressupostos das escolhas e preferên-
cias racionais dos indivíduos, com o objetivo de mostrar que a economia deveria ser
interpretada como uma ciência que trata da maneira de utilizar os meios escassos ca-
pazes de assegurar o grau máximo de realização do objetivo escolhido pela atividade
humana. O resultado dessa lógica interpretativa é que a economia deixa de ser uma
ciência empírica que trata dos fenômenos reais e passa a ser uma ciência baseada na
“lógica da escolha” assentada nos mesmos critérios que conformam a matemática.
A partir daí as explicações econômicas migram para o campo da subjetividade, uma
vez que agora se busca estudar os fenômenos relacionados à escassez, que por sua
vez está relacionado à ideia de escolha (opção). O resultado é que com este olhar
fixo na questão da utilidade das mercadorias as preocupações anteriores (produção,
acumulação e distribuição da riqueza) perdem importância e tudo passa a ser expli-
cado através da noção de equilíbrio entre oferta e procura.
Desse caminho teórico instaura-se a separação econômica, nascendo os fundamen-
tos básicos de todas as explicações microeconômicas.
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Anotações d m a
importante
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A crise da década de 1920 foi tão ampla e afetou o sistema como um todo por-
que as ondas especulativas visavam à valorização fictícia do capital ocioso das
grandes empresas. Este movimento articulado e coordenado pelos bancos era
possível porque havia um fluxo contínuo de capitais de outros países em direção
aos EUA atraídos pela valorização acionária das empresas norte-americanas.
Esse movimento foi potencializado pela ação política do governo dos EUA que,
ao invés de atuar no sentido estruturar um sistema cambial estável, de manter o
funcionamento dos mercados e de aumentar os empréstimos, atuou apenas no
sentido de preservar os mercados dos produtos de suas empresas.
Com isso, as consequências sobre a economia mundial foram decisivas, com
forte retração das atividades econômicas devido ao desemprego dos fatores
produtivos; expansão do desemprego; redução da procura por mercadorias
com efeitos negativos direto sobre comércio internacional; retração geral do
crédito e dos mecanismos de estímulo aos investimentos; queda da renda
nacional nos principais países; aumento da desigualdade de distribuição da
renda; etc. A consequência disso foi a expansão em escala mundial da exclu-
são social.
No plano teórico, esses fatos decorrentes do funcionamento do sistema eco-
nômico capitalista colocaram em xeque as teorias em voga, especialmente
aquelas ligadas à corrente neoclássica que previa uma economia funcionan-
do harmonicamente à luz da Lei de Say e da filosofia do ajuste automático
dos mercados. Tais fundamentações descartavam a possibilidade de crises
econômicas e descreviam o problema de desemprego como um problema
do trabalhador. Para tanto, bastaria apenas flexibilizar os salários (na prática
diminuir) que o mercado de trabalho se equilibraria novamente. Da mesma
forma, bastaria deixar o livre mercado operar que as defasagens entre oferta e
procura desapareceria e a economia retornaria ao seu nível de equilíbrio.
É precisamente sobre a maioria desses postulados que Keynes irá se contrapor
mostrando que a economia mundial do Século XX carecia de instrumentos
analíticos adequados para explicar seu funcionamento, especialmente a parte
relativa às crises e seus reflexos sobre o mundo real.
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Sua obra seminal mostra que Keynes partiu do pressuposto que a sociedade capita-
lista de sua época (Século XX) tinha dois dilemas básicos para resolver: o desempre-
go e a desigualdade na distribuição da renda. Para ele, a expansão contínua dessas
desigualdades se transformaria em ameaça real à estabilidade do sistema econômi-
co capitalista. Decorre daí sua preocupação em estudar essa ordem de problemas
com o objetivo de revitalizar o funcionamento desse sistema, pois diferentemente
de Marx, ele não queria destruir o modo de produção capitalista.
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Suas teses são uma reação contrária à teoria Neoclássica, considerada por
Keynes inconsistente para explicar fenômenos reais, como o desemprego, e fe-
nômenos monetários, como o papel dos juros e da moeda no funcionamento
do sistema econômico, além da própria crise geral desse sistema.
Neste sentido, suas fundamentações se concentram tanto no campo teórico, com
questionamentos decisivos sobre o paradigma vigente, como no campo prático,
com a redefinição do papel da política econômica. Isto porque Keynes acredi-
tava que os problemas do emprego e dos salários não se resolveriam pela ideia
simples do livre mercado. Para tanto, entendia ser necessário que os governos
tivessem uma presença mais ativa na condução da vida econômica dos países.
O autor entendia, também, que grande parte das crises que assolava o sistema
econômico capitalista tinha origem na insuficiência dos investimentos; uma
vez que ao contrário da teoria Neoclássica que negava a possibilidade de subu-
tilização da capacidade produtiva instalada, porque se assentava na lei de Say
que não poderia admitir crises, Keynes mostrou que em situações permeadas
por quedas sequenciais na demanda as empresas operavam com capacidade
produtiva ociosa.
A partir daí o autor vai concluir que são as deficiências na demanda que não
deixam a economia capitalista funcionar adequadamente. Desta constatação
deriva a formulação do princípio da demanda efetiva que vincula dois as-
pectos básicos: o nível de emprego e de renda dos consumidores ao nível de
investimento global da economia. À luz dessa linha de raciocínio Keynes iria
formular uma nova teoria do emprego, contrapondo-se às teses neoclássicas
ardorosamente defendidas por seus colegas da Universidade de Cambridge,
especialmente de Pigou.
Em linhas gerais, esta teoria se opõe ao fundamento Neoclássico básico que
receitava a redução dos salários como mecanismo de combate ao desemprego.
Keynes questiona teoricamente esta ideia afirmando que reduções de salários
gerariam ainda mais desemprego, uma vez que estas reduções promoveriam
quedas no poder de compra dos assalariados, que por sua vez desaqueceriam a
economia e fariam com o sistema econômico operasse com capacidade ociosa.
Neste contexto, estavam dadas as condições para o desemprego continuar a
se expandir. Além disso, dizia ainda que as questões relativas aos temas do
emprego e do desemprego eram bem mais complexas, por dependerem de
um conjunto de relações macroeconômicas, conforme veremos mais adiante.
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Unidade 6 - Keynes e a formação do pensamento macroeconômico no século XX
Papel da moeda:
A teoria neoclássica sempre considerou a moeda como um meio de paga-
mento. Com isso, variações em sua quantidade afetavam apenas as variáveis
monetárias. Já Keynes afirmava que num mundo econômico permeado pela
incerteza a moeda desempenha um papel fundamental, especialmente no que
diz respeito às expectativas dos agentes em relação ao futuro. Portanto, esta
é uma variável que provoca efeitos tanto nas variáveis monetárias como nas
variáveis reais.
A partir dessas definições foi construído o modelo geral composto por 4 variáveis
macroeconômicas: uma de natureza institucional e que diz respeito à fixação da
oferta monetária por conta da autoridade monetária (BC), enquanto as demais, se-
gundo Keynes, são de natureza psicológica. Isto porque a Preferência por liquidez (L)
relaciona a taxa de juros com moeda; a Eficiência Marginal do Capital (EMC) relacio-
na investimentos com juros; e a Propensão Marginal a Consumir (PMgC) relaciona o
consumo com a renda.
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Unidade 6 - Keynes e a formação do pensamento macroeconômico no século XX
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Resumo da unidade:
Os fatos históricos, sobretudo durante as três primeiras décadas do Século XX, apre-
sentaram um novo cenário da economia mundial marcado pela forte retração das
atividades econômicas e com elevação dos níveis de desemprego em escala global.
Esses fatos não encontravam mais guarida na teoria Neoclássica que até então do-
minava o pensamento econômico, especialmente a Lei de Say e o Equilíbrio Geral de
todos os mercados. É neste contexto que emerge a teoria keynesiana para mostrar
que os instrumentos analíticos existentes não davam conta de explicar o funciona-
mento da economia capitalista do Século XX.
O ponto de partida de Keynes foi observar que as questões do desemprego e da
desigualdade na distribuição da renda eram centrais para a sociedade capitalista
contemporânea. Por isso, ele se dedicou a estudar os fatores responsáveis pela de-
terminação do nível de emprego e quais eram as causas geradoras de desemprego,
bem como o efeito de ambos sobre o nível de renda dos consumidores.
Portanto tinha dois grandes desafios: comprovar a inconsistência teórica do pensa-
mento neoclássico e, ao mesmo tempo, formular uma nova teoria que se aplicasse
ao conjunto do sistema econômico e não apenas aos indivíduos e/ou as empresas.
Era isso que, segundo ele, tornava a teoria econômica algo bem mais complexa.
Assim, ataca logo princípios consagrados como o da Lei de Say; a teoria do emprego
clássica; a teoria monetária; e a própria ideia do livre mercado como instrumento
de equilíbrio do funcionamento econômico. Para tanto, coloca no centro de suas
análises a dinâmica da esfera da demanda e sua relação com o nível de produção,
emprego e renda, concluindo que mesmo em condições de livre mercado, existiria
insuficiência de demanda que levaria a subutilização da produção com consequên-
cias negativas sobre esses dois indicadores. A partir daí vai provar que a dinâmica
econômica dependia fortemente do nível de investimento global da economia, sen-
do esta afetada tanta pelas variáveis reais como pelas variáveis monetárias.
Atividade de Aprendizagem – 6
Assista agora à videoaula relativa a esta unidade.
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Unidade 7 - O pensamento macroeconômico pós teoria geral de Keynes
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Evolução do Pensamento Econômico
Palavra do Professor
Perceba aqui a grande diferença com relação à teoria geral, uma vez que nas inter-
pretações ortodoxas não existe espaço para expectativas e incertezas e a moeda é
apenas um meio de troca.
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Unidade 7 - O pensamento macroeconômico pós teoria geral de Keynes
Como dissemos anteriormente, a trajetória pós TG foi marcada por grandes contro-
vérsias e equívocos analíticos, sendo o mais conhecido o “keynesianismo ortodoxo”,
ou o “velho keynesianismo”. Essas expressões, na verdade, acabaram agrupando cor-
rentes do pensamento macroeconômico que fizeram uma leitura “equilibrista” de
Keynes. A todas elas Samuelson chamou de Síntese Neoclássica (SN), a qual sinteti-
zava as diferentes interpretações neoclássicas da TG (lembre-se: Keynes escreveu a
TG exatamente para rejeitar as teses neoclássicas).
Essa corrente começou a se formar quando Hicks procurou, via diagrama IS-
LM, mostrar como e porque os agregados flutuavam. Seu objetivo final era
provar a possibilidade de conciliar as formulações neoclássicas com aquelas
da Teoria Geral de Keynes. Após formular seu modelo geral – representa-
do pelo IS-LM - concluiu que variações na demanda agregada ou na oferta
monetária deslocavam as curvas IS-LM, levando a um ponto de equilíbrio
simultâneo da renda (mundo real) e dos juros (mundo monetário). Em outras
palavras, a um processo de equilíbrio simultâneo tanto no mercado de bens
como no mercado monetário.
Essa conclusão levou Hicks a afirmar que, ao contrário do que Keynes dizia,
sua teoria não era geral, mas sim um caso particular (Armadilha de Liquidez)
da teoria tradicional (Neoclássica). A partir daí, passou-se a interpretar a TG
como base nos modelos de equilíbrio, como se nesses coubessem as expecta-
tivas e incertezas.
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Evolução do Pensamento Econômico
Todos esses equívocos foram desfeitos em 1979 pelo próprio Hicks que, re-
conhecendo seu erro, admitiu ter interpretado equivocadamente a TG, espe-
cialmente nas questões relativas aos preços (rigidez versus flexibilidade) e à
duração do período, cujo curto prazo foi suposto por ele como sendo de uma
semana. Esse erro, segundo Hicks, mostrou que as duas curvas não se ajusta-
vam ao mesmo tempo (equilíbrio simultâneo) porque o ajuste no mercado de
bens, por depender de planos de produção, não ocorre imediatamente como
se verificava no mercado monetário.
O resultado final apontado pelo próprio Hicks é que seu diagrama IS-LM não con-
tinha uma versão completa e correta da Teoria Geral. Na verdade sua interpretação
havia transformado a TG em uma teoria do equilíbrio econômico, o que não corres-
pondia aos ensinamentos elementares de Keynes.
Mas entre 1937 e 1979 o estrago já havia sido feito e, principalmente nas escolas ma-
croeconômicas norte americanas, se passou a ensinar a TG com base em Hicks e não
em seu teor original. Era isso que gloriosamente o ensino manualizado da macroe-
conomia passou a chamar de “revolução keynesiana”. Nada mais estranho porque
esses ensinamentos eram a própria negação da teoria keynesiana original.
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Unidade 7 - O pensamento macroeconômico pós teoria geral de Keynes
Saiba que essa escola teve grande influência na conformação das políticas econô-
micas das décadas seguintes, bem como na formação de professores de economia,
especialmente na América Latina, local onde mais se disseminou essa corrente de
pensamento macroeconômico.
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Unidade 7 - O pensamento macroeconômico pós teoria geral de Keynes
Em síntese, a corrente novo clássica ataca tanto a teoria keynesiana quanto a teoria
monetarista. Particularmente em relação a esta última escola de pensamento discor-
dam da formação das expectativas, mas confluem na teoria monetária. Em última
instância reafirmam os primórdios do livre mercado para que o sistema econômico
funcione adequadamente.
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Unidade 7 - O pensamento macroeconômico pós teoria geral de Keynes
Por isso, os PK têm claro que sua tarefa é concretizar aquilo que Keynes se propôs
a fazer: uma abordagem nova e complexa da economia. Para tanto, entendem que
não é seu papel ficar introduzindo problemas keynesianos no âmbito das teorias:
clássica e neoclássica.
Com isso, verifica-se que atualmente esta corrente de pensamento está concentrada
no desenvolvimento de instrumentos teóricos sobre sistema financeiro internacio-
nal; na teoria da firma bancária; e na explicitação do circuito financiamento-inves-
timento-poupança-funding. Este último aspecto vai mostrar como os recursos para
investimentos provêm dos bancos e dos mercados de títulos e de capitais e não
apenas da poupança como afirmava a teoria neoclássica.
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Unidade 7 - O pensamento macroeconômico pós teoria geral de Keynes
Palavra do Professor
Perceba que desde a década de 1980 a macroeconomia do Mainstream dominou
completamente as formulações econômicas mundiais. De um modo geral, receitou-
se a mais ampla possível desregulamentação dos mercados, em especial dos merca-
dos financeiros, ao longo de todo esse período. Essa estratégia gerou um movimen-
to especulativo sem precedentes na história contemporânea do sistema econômico
capitalista, cujo resultado se explicitou na primeira grande crise de proporções mun-
diais que tomou conta da economia a partir de 2007/2008.
De um modo geral, a crise financeira atual se encarregou de colocar em xeque dog-
mas e postulados da macroeconomia ortodoxa, em especial a tese da livre circula-
ção dos capitais. Com isso, atualmente o mundo está buscando uma nova estrutura
institucional capaz de recuperar as atividades econômicas e os níveis de emprego
aos patamares do final do Século XX. Para tanto, é momento dos postulados das
escolas heterodoxas voltarem ao centro dos debates teóricos e práticos, em especial
da política econômica de retomada do desenvolvimento.
Resumo da unidade:
Nesta unidade vimos como o pensamento macroeconômico moderno se tornou ex-
tremamente complexo após as formulações keynesianas e, como a macroeconomia
passou a ser interpretada de distintas maneiras, levando à formação atual de duas
grandes linhas pensamento: a ortodoxa e a heterodoxa.
Por um lado, a ortodoxia que continua insistindo em usar Keynes para comprovar
suas teses básicas assentadas em modelos de equilíbrio geral e no pleno emprego
de fatores, destinando a moeda um caráter meramente passivo na vida econômica.
Por outro, a heterodoxia que, no campo específico da macroeconomia, procura res-
gatar os fundamentos gerais de Keynes, mostrando as inconsistências e superficiali-
dades da teoria macroeconômica neoclássica para explicar os fatos contemporâne-
os, como foi o caso da recente crise econômica mundial.
Atividade de Aprendizagem – 7
Faça uma resenha dos fundamentos teóricos de cada escola com base nos estudos
desenvolvidos nas diversas disciplinas ministradas ao longo de todo o curso. Dê
atenção especial às proposições Keynesianas e às críticas que foram formuladas a
essas teses, uma vez que elas representam a base teórica do pensamento macroe-
conômico ortodoxo.
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REFERÊNCIAS
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