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Capítulo 8

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

Dietoterapia
no transplante
de órgãos

O transplante geralmente é o último recurso de tratamento para doen-


ças terminais. Com o uso de novos imunossupressores e o crescente
número de cirurgias, o acompanhamento clínico torna-se uma etapa
importante para a garantia da sobrevida do enxerto em médio e lon-
go prazo. O transplante bem-sucedido reduz a mortalidade e melhora a
qualidade de vida.

Segundo o Registro Brasileiro de Transplantes de 2017 (ABTO, 2017),


houve um aumento de 14,6% na taxa de doadores em relação ao ano
anterior. O transplante hepático aumentou em 11%, o pulmonar, em
10,14%, o renal, em 7,1 %, e o cardíaco, em 3,6%.

Os pacientes transplantados convivem com privações alimentares


e outras limitações em vários aspectos da vida, e é necessário fazê-los
aceitar a intervenção nutricional por meio da educação nutricional e mu-
danças após o transplante para prevenir e tratar complicações, contri-
buindo para taxas menores de mortalidade e morbidade.

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O acompanhamento nutricional deve ser regular e compreende a

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avaliação nutricional, a orientação alimentar individual e o processo de
educação nutricional em conjunto com a família. A orientação nutricio-
nal deve levar em consideração as preferências alimentares, as condi-
ções clínicas e bioquímicas, o esquema de imunossupressores e os
aspectos sociais e culturais do paciente.

1 Cuidados nutricionais no transplante


cardíaco
O transplante cardíaco é um tratamento de escolha para pacientes
com insuficiência cardíaca em fase avançada, com terapia medicamen-
tosa otimizada, com expectativa de vida inferior a um ano e sem possibi-
lidade de outro tratamento alternativo clínico ou cirúrgico convencional.

PARA SABER MAIS

Tipos de transplante cardíaco

• Ortotópico: técnica em que o coração é substituído pelo órgão


do doador na posição ocupada originalmente pelo coração do
receptor.

• Heterotópico: técnica em que há a implantação do coração do


doador, mas o do receptor é mantido. É indicado para portadores
de resistência pulmonar elevada e em casos de desproporção
acentuada com o coração do doador.

Pacientes com insuficiência cardíaca têm risco de desnutrição como


consequência de anorexia, hipermetabolismo, aumento de perda de
nutrientes pela urina e fezes, entre outros.

A avaliação nutricional deve ser realizada antes da cirurgia para re-


duzir as complicações cirúrgicas. Recomenda-se utilizar na avaliação

156 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


anamnese alimentar, antropometria (índice de massa corpórea, prega
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cutânea tricipital, circunferência muscular do braço) e dados bioquími-


cos (albumina e transferrina sérica, colesterol e triglicérides séricos).

A terapia nutricional deve ter como objetivos: manter a composição


corporal e/ou limitar os efeitos do catabolismo; manter o estado fun-
cional e a qualidade de vida; alcançar as necessidades nutricionais; ten-
tar parar ou reverter o quadro de caquexia cardíaca, quando detectado;
diminuir a progressão da doença e o uso de medicamentos, sempre
que possível; auxiliar para minimizar as descompensações e interna-
ções; evitar a sobrecarga de fluidos e controlar edemas. É importante
salientar que a recuperação nutricional de pacientes com insuficiência
cardíaca grave, a maioria na espera do transplante, é uma tarefa difícil
e muitas vezes a recuperação completa só ocorre após o transplante.

IMPORTANTE

Para crianças candidatas ao transplante cardíaco, valem as mesmas


observações para os adultos, com o agravante de que sua base de
alimentação é de consistência líquida e os líquidos devem ser res-
tringidos na insuficiência cardíaca congestiva (ICC) grave. Após o
transplante, a restrição líquida não é mais necessária, mas a criança
passa a ter os mesmos riscos de adquirir as patologias decorrentes
da terapia imunossupressora que o transplantado adulto.

1.1 Pré-transplante cardíaco

O hipermetabolismo pode aumentar a necessidade energética ba-


sal de 20% a 30%, a qual pode ser calculada pela equação de Harris-
-Benedict, considerando o peso adequado e o fator estresse.

A consistência da dieta deve ser avaliada individualmente para


cada paciente. Se necessário, oferecer uma dieta fracionada e de fácil

Dietoterapia no transplante de órgãos 157


mastigação e digestão. Suplementos orais, dietas enterais ou até a die-

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ta parenteral podem ser necessários e considerados na incapacidade
de o paciente atingir suas necessidades calóricas e proteicas.

A restrição de líquidos (água, chás, sucos, refrigerantes, leites, iogur-


tes, caldos, sopas, gelatinas, sorvetes) deve ser individualizada, levando-
-se em consideração o estado volêmico e a gravidade da doença. Essa
restrição pode variar de 1,5 a 2 L para pacientes estáveis e de 700 mL a
1 L para pacientes mais graves.

Tabela 1 – Recomendação de energia, proteínas, sódio e potássio para o paciente com


IC grave, candidato ao transplante

20-25 kcal/kg peso/dia para pacientes críticos

ENERGIA 25-30 kcal/kg peso/dia para pacientes estáveis


Acima de 30 kcal/kg peso/dia para pacientes com caquexia

1,0-1,5 g de proteínas/kg de peso/dia para pacientes críticos


PROTEÍNAS
1,5-2,0 g de proteínas/kg de peso/dia pacientes com caquexia

2,0-2,4 g/dia para dieta restrita


SÓDIO
3,0-4,0 g/dia para dieta moderada

Preconiza-se a ingestão de 3.500 mg/dia (90 mEq) (Em casos de baixa ingestão,
POTÁSSIO
deve-se suplementar por via medicamentosa.)

Fonte: Bacal et al. (2009).

1.2 Pós-transplante cardíaco

No pós-transplante, a dieta deve ser hipercalórica e hiperproteica, a


mudança da consistência deve ser gradativa, iniciando-se com dieta lí-
quida, leve, branda até a dieta geral. Os líquidos frios devem ser preferi-
dos nos primeiros dias pós-cirurgia, em razão da presença de náuseas,
irritação na garganta e desconforto.

158 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


As necessidades calóricas podem estar aumentadas em 30% a
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50% do gasto energético basal, e as necessidades proteicas, em 1,2 a


2,0 g/kg/dia durante o pós-imediato, e de 1,2 a 1,5 g/kg/dia, durante
a fase de manutenção.

A dieta deve ser calculada para atingir de 45% a 55% do valor


calórico total em carboidratos, 25% a 30% em proteínas, 18% a 25%
em gorduras, sendo 10% de gordura monoinsaturada, menos de 10%
de saturada e o restante em poli-insaturada, com colesterol mantido
até 200 mg, rica em fibras, moderada em sódio (2 a 4 g de sódio/dia)
e com restrição de carboidratos simples (RINGEWALD et al., 2001;
BACAL et al., 2009).

PARA SABER MAIS

O uso de corticosteroide, como a prednisona, estimula o apetite e


aumenta a preferência por doces, o que pode contribuir com a obe-
sidade e aumentar o nível glicêmico. Os seus efeitos antagônicos
sobre a vitamina D reduzem o balanço do cálcio corpóreo, contri-
buindo para o desenvolvimento de osteoporose e, em altas doses, é
associado com a hipertensão. Um efeito colateral em longo prazo do
uso de corticosteroides é a depleção de zinco. Sendo assim, deve-se
monitorar também a ingestão de cálcio, zinco e vitamina D.

1.3 Suplementação nutricional

Quando a ingestão alimentar é insuficiente, os suplementos de alta


densidade calórica podem ser utilizados, devendo ser fornecidos suple-
mentos com valor calórico em torno de 1,5 a 2,0 calorias/mL.

Dietoterapia no transplante de órgãos 159


2 Cuidado nutricional no transplante

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pulmonar
O transplante pulmonar é uma alternativa de tratamento para os es-
tágios finais da insuficiência respiratória, quando há limitação física e
baixa expectativa de vida.

O paciente estar com o peso entre 80% e 120% do ideal é um


pré-requisito para que seja submetido à cirurgia de transplante pul-
monar, em especial os que apresentam doença pulmonar obstrutiva
crônica (DPOC), enfisema e fibrose pulmonar. A desnutrição é mais
presente em pacientes com fibrose cística.

Os objetivos da dietoterapia no pré-transplante pulmonar são: aten-


der às necessidades energéticas e de nutrientes; preservar a massa
corpórea; manter o equilíbrio hídrico sem exceder as capacidades do
sistema respiratório de eliminar o dióxido de carbono. No pós-transplan-
te pulmonar, os objetivos são: reduzir as complicações causadas pelos
medicamentos; prevenir infecções; manter ou atingir o estado nutricio-
nal adequado; controlar o ganho de peso.

2.1 Pré-transplante pulmonar

A composição da dieta deve ser planejada para atingir às necessida-


des proteicas e energéticas e minimizar a produção de gás carbônico.

A oferta de proteínas não deve ultrapassar 20% do valor calórico total


da dieta, uma vez que o excesso desse nutriente pode aumentar a frequên-
cia e o esforço respiratório. Os carboidratos devem ficar entre 50% e
60% das necessidades energéticas totais, e a gordura, em torno de 30%.

Nos pacientes com fibrose cística, recomenda-se a suplementação


multivitamínica por causa da má absorção, especialmente de vitaminas
lipossolúveis.

160 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


O fracionamento e a consistência devem ser modificados depen­
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dendo do grau de dispneia do paciente, a fim de facilitar a mastigação


e a deglutição sem piorar o desconforto respiratório.

2.2 Pós-transplante pulmonar

Deve-se iniciar a dieta por via oral com água, chá e gelatina, e sua
evolução deve estar de acordo com a evolução clínica. Carboidratos
simples devem ser evitados por causa da hiperglicemia e da hipertri-
gliceridemia, e o consumo de gordura saturada e colesterol deve ser
limitado.

O gasto energético em repouso pode estar aumentado em 20% nes-


ses pacientes.

Para o cálculo das necessidades energéticas, utiliza-se a equação de


Harris-Benedict para quantificar o gasto energético basal, multiplicada
pelo fator lesão (1,2 a 1,4), fator atividade (1,2 se acamado, 1,25 se aca-
mado + móvel, e 1,3 se ambulante) e fator térmico (1,1 para temperatura
de 38 °C, 1,2 para 39 °C, 1,3 para 40 °C, e 1,4 para 41 °C).

Outra alternativa é baseada no peso do indivíduo, fornecendo-se


25 a 35 kcal/kg peso/dia durante a fase catabólica, e 40 a 45 kcal/kg
peso/dia na fase do anabolismo. A quantidade de proteína recomenda-
da é de 1,0 a 1,5 g/kg/dia.

2.3 Suplementação nutricional

Pode ser recomendado o uso de suplemento proteico-calórico, mó-


dulos de proteínas e carboidratos e produtos específicos para pneumo-
patas que contenham em média 1,5 kcal/mL, em caso de desnutrição.

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3 Cuidados nutricionais no transplante

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hepático (TxH)
O transplante hepático (TxH) torna-se necessário em pacientes no
estágio final da doença hepática e hepatobiliar. O estado nutricional é
um fator importante que influencia a sobrevida dos pacientes subme-
tidos ao TxH. O acompanhamento deve ser individual, considerando as
diferentes etapas da evolução clínica e as complicações apresentadas.

3.1 Terapia nutricional no TxH

A terapia nutricional no TxH tem como objetivo promover a adequa-


da cicatrização, além de prevenir ou tratar infecções e alterações nutri-
cionais para melhorar o prognóstico do paciente.

3.2 Fase pré-TxH

A desnutrição pode estar presente nos estágios finais ou na descom-


pensação da doença hepática. Nessa fase, é necessário planejar uma
dieta de fácil digestão, fracionada e adequada às condições do paciente.

É interessante orientar os pacientes a consumir uma dieta fraciona-


da em 5 a 6 porções ao dia, reforçando a realização da refeição notur-
na. A refeição noturna pode auxiliar na prevenção da perda de massa
muscular, pois o jejum prolongado (de 4 a 6 horas) pode aumentar a
gliconeogênese em razão da diminuição dos estoques de glicogênio. A
utilização de aminoácidos de cadeia ramificada, probióticos e nutrien-
tes imunomoduladores, em pacientes cirróticos, tem apresentado asso-
ciação com menores complicações pré e pós-operatórias, melhora do
estado nutricional e da qualidade de vida.

A restrição rigorosa de sal deve ser bem avaliada, pois influencia


na palatabilidade dos alimentos, diminuindo a aceitação pelo paciente

162 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


e podendo piorar ainda mais o estado nutricional dos candidatos ao
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transplante. Na existência de edema e ascite, geralmente a recomen-


dação de sódio é de no máximo 2 g/dia, e no caso de edema e ascite
incontroláveis, a restrição pode chegar a 1 g/dia. É importante que o
paciente seja estimulado a utilizar ervas, especiarias e pimentas como
alternativas para dar sabor aos alimentos e não diminuir a ingesta
alimentar pela falta do sal.

Pacientes com hepatopatias crônicas geralmente apresentam defi-


ciências nutricionais, portanto é importante planejar e garantir a ingesta
de micronutrientes recomendada pelas DRI. Deficiência de tiamina,
folato e magnésio são comuns quando se faz uso abusivo de álcool,
e deficiência de vitaminas lipossolúveis é comum na doença hepática
avançada. Em pacientes cirróticos também é comum a deficiência de
vitamina D.

O uso de nutrição enteral suplementar deve ser avaliado quando o


paciente não conseguir suprir as necessidades calóricas e proteicas
somente com a nutrição por via oral.

Tabela 2 – Recomendações nutricionais pré-TxH

NUTRIENTES RECOMENDAÇÃO OBSERVAÇÕES

Calorias 35-40 kcal/kg/dia Evitar jejum por mais de 4-6 h, realizar refeições
frequentes distribuídas ao longo do dia

Proteínas 1,2-1,5 g/kg/dia Dar preferência a uma dieta rica em vegetais e


produtos lácteos

Carboidratos 50-70% da NET Recomenda-se um lanche noturno com 50 g


de carboidratos complexos com a intenção de
reverter a utilização exagerada de substrato e
melhorar a retenção de nitrogênio

Lipídeos 30% da NET Não deve haver restrição, a menos que exista
má absorção de gordura diagnosticada por teste
de gordura fecal ou que tenha sido relatado
esvaziamento gástrico lento

(cont.)

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NUTRIENTES RECOMENDAÇÃO OBSERVAÇÕES

Fibras 25-45 g /dia A fermentação de prebióticos parece ter


um efeito benéfico sobre o desempenho
neuropsiquiátrico

Vitaminas e DRI Avaliar a necessidade de suplementação de


minerais vitaminas lipossolúveis e hidrossolúveis, cálcio,
zinco, selênio, ferro e magnésio

Sódio 2 g/dia Restrição de 2 g/dia para pacientes que


apresentarem ascite e edema

Fonte: Anastácio e Correia (2016), Pereira et al. (2012).

3.3 Fase pós-TxH

Deve ser oferecida dieta hipercalórica e hiperproteica para auxiliar na


cicatrização, manter níveis bioquímicos normais e minimizar proteólise
e perda de peso. Os requerimentos energéticos e proteicos permane-
cem altos por semanas após o transplante. No pós-cirúrgico imediato,
o catabolismo proteico é bastante acentuado, portanto necessita-se de
um maior aporte de proteínas, conforme se vê na tabela 3. As neces-
sidades energéticas vão variar de acordo com o estado metabólico e
inflamatório de cada paciente.

Nos primeiros 30 dias, os pacientes enfrentam quadros infecciosos,


rejeição aguda e toxicidade por causa dos agentes imunossupressores.

A terapia nutricional tem por objetivo manter em equilíbrio as fun-


ções metabólicas e fisiológicas, reverter o desiquilíbrio energético-
-proteico decorrente da insuficiência hepática e minimizar os efeitos
colaterais dos imunossupressores.

A dieta oral pode ser iniciada nas 24 horas pós-cirurgia, porém com
maior aceitação entre 2 e 5 dias pós-transplante, quando se observa
melhora dos sintomas como náuseas, anorexia, alteração no paladar,
diarreia ou obstipação.

164 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


As recomendações nutricionais no pré e no pós-transplante são
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similares.

Tabela 3 – Recomendações nutricionais no pós-TxH

NUTRIENTES RECOMENDAÇÃO OBSERVAÇÕES

Calorias 25-30 kcal/kg/dia

Proteínas 1,5-2 g/kg/dia

Verificar necessidade de
restrição de carboidratos
Carboidratos 50-70% da NET
simples no caso de
hiperglicemia

Lipídeos 30% da NET

Fibras 25-45 g/dia

Avaliar possibilidade de
Vitaminas e minerais DRI suplementação, se
necessário

Restrição de 2 g/dia para


Sódio 2 g/dia pacientes que apresentarem
ascite e edema

Se o paciente apresentar
Restrição de 1.000 a 1.500
Líquidos hiponatremia (sódio < 130
mL/dia
mEq/L)

Fonte: Anastácio e Correia (2016), Pereira et al. (2012).

No pós-transplante imediato, os pacientes recebem altas doses de


imunossupressores e com frequência desenvolvem diabetes, porém
com o passar do tempo e a suspensão de alguns medicamentos, par-
ticularmente a prednisona, há diminuição do número de pacientes dia-
béticos. Para os pacientes que desenvolverem diabetes é importante
estabelecer um plano alimentar que estimule o consumo de carboidra-
tos oriundos de hortaliças, leguminosas, grãos integrais, frutas e leite. É

Dietoterapia no transplante de órgãos 165


recomendada a ingestão de fontes alimentares de gorduras monoinsa-

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turadas e a substituição do açúcar por edulcorantes.

Os pacientes podem também desenvolver hipercalemia e devem ser


orientados quanto ao controle da ingestão de alimentos ricos em potás-
sio e técnicas dietéticas que diminuam o teor de potássio nos alimentos.

Outro problema comum é a hipomagnesemia (magnésio sérico in-


ferior a 1,8 mg/dL), decorrente do uso de imunossupressores. Esses
pacientes recebem, normalmente, suplementação desse mineral, sob a for-
ma de óxido de magnésio, porém alguns deles podem apresentar diarreia.

Quanto ao pós-transplante tardio, o paciente pode vir a desenvolver


várias complicações metabólicas decorrentes da imunossupressão e
do ganho de peso. O risco de desenvolvimento de hipertensão arterial
sistêmica e dislipidemia e o aumento da incidência de diabetes podem
impactar no resultado do transplante e na sobrevida. Esse conjunto de
alterações metabólicas pode levar ainda ao desenvolvimento de sín-
drome metabólica, o que ocorre em cerca de metade dos pacientes.
Portanto, os pacientes em pós-transplante tardio devem ser acompa-
nhados e receber todas as orientações para evitarem o ganho de peso
e não desenvolverem complicações que possam prejudicar sua saúde e
qualidade de vida (ANASTÁCIO; CORREIA, 2016).

4 Cuidados nutricionais no transplante


de medula óssea (células-tronco
hematopoiéticas – TCTH)
O sucesso do transplante de medula óssea (células-tronco hema-
topoiéticas – TCTH) depende de vários pontos, como: diagnóstico e
estágio da doença, tipo de transplante (autólogo: as células-tronco he-
matopoiéticas provêm do próprio indivíduo que vai receber o transplan-
te; singênico: as células-tronco hematopoiéticas provêm de um gêmeo
idêntico ao receptor; ou alogênico: as células-tronco hematopoiéticas
provêm de outro indivíduo), grau de histocompatibilidade do doador,

166 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


regime preparatório (mieloblativo: TCTH convencional, no qual se utili-
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zam altas doses de agentes citotóxicos no condicionamento pré-trans-


plante; não mieloblativo: no qual se minimiza a intensidade ablativa do
tratamento com agentes citotóxicos no condicionamento pré-transplan-
te), fonte de células (medula óssea, sangue periférico, sangue do cordão
umbilical e placentário), idade, tratamento prévio e estado nutricional.
Sabe-se que esses pacientes apresentam alto risco para desnutrição,
tanto na fase pré quanto pós-transplante.

Os primeiros passos devem ser a triagem e a avaliação nutricio-


nal, que devem ser realizadas no momento da internação e na admis-
são ambulatorial. Os métodos mais utilizados nesse processo são
NRS-2002, ASG-PPP e ASG, e também são recomendadas a anamnese
nutricional que contemple os dados clínicos e dietéticos e a análise de
parâmetros bioquímicos.

4.1 Necessidades nutricionais


Durante o tratamento de TCTH, os pacientes apresentam várias com-
plicações, principalmente no trato gastrointestinal (TGI), o que impede
a ingestão e a absorção dos nutrientes e calorias. Os pacientes neces-
sitam de um aporte elevado de calorias: 1,5 vez o balanço energético
basal ou, aproximadamente, de 30 a 35 kcal/kg de peso corporal/dia
(MUSCARITOLI et al., 2002).

Segundo critérios do Fred Hutchinson Cancer Research Center, refe­


rência mundial em TCTH, no período de pós-transplante imediato (de
30 a 50 dias), as necessidades energéticas refletem o aumento do re-
querimento em razão de condicionamento, febre, infecções, doença do
enxerto-contra hospedeiro (DECH) e outras complicações metabólicas.

As proteínas devem ser de 1,5 g/kg de peso corporal/dia durante


os três primeiros meses pós-transplante (MUSCARITOLI et al., 2002).

A oferta de 30 mL de água/kg ao dia está indicada, considerando o


resultado de balanço hídrico, as perdas e as retenções (CUPPARI, 2005).

Dietoterapia no transplante de órgãos 167


As recomendações nutricionais para o período pré e pós-TCTH são

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bastante similares.

Tabela 4 – Necessidades nutricionais de calorias, proteínas e líquidos para paciente oncológico adulto
submetido a transplante de células-tronco hematopoiéticas

QUANTIDADE RECOMENDADA NO PRÉ E PÓS-TRANSPLANTE

Calorias 30 kcal/kg a 35 kcal/kg ao dia

Proteínas 1,5 g/kg de peso corporal atual

Líquidos 30 mL/kg a 35 mL/kg ao dia

Fonte: Inca (2015).

4.2 Terapia nutricional

A terapia nutricional deve ser iniciada precocemente, pois a maio-


ria desses pacientes apresentam uma necessidade elevada de nutrien-
tes e possuem alterações no metabolismo de carboidratos, proteínas
e lipídeos e também dificuldade para ingestão oral, necessitando de
modificações da dieta oral, suplementação e terapia nutricional, com
o objetivo de prevenir e/ou tratar a desnutrição e reduzir a mortalidade,
proporcionar conforto ao paciente com transtornos do TGI, reduzir per-
das intestinais e manter o TGI funcionante.

A terapia nutricional pode ser indicada por via oral, enteral ou paren-
teral. A escolha da via deve ser pela presença de sinais e sintomas e
pela adequação da ingestão oral, com o objetivo de atender às necessi-
dades nutricionais do paciente.

A terapia nutricional deve ser iniciada logo após o transplante, princi-


palmente para pacientes desnutridos, em transplante alogênicos, com
ingestão oral insuficiente (menos de 60% a 70% da sua necessidade
energética), podendo ser mantida por um período de 15 a 20 dias.

168 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


Os critérios para a indicação da via a ser utilizada, para a suspensão
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da terapia nutricional e para o programa de desmame são os mesmos


de outras terapias nutricionais abordadas nos capítulos anteriores.

4.3 Acompanhamento ambulatorial

O acompanhamento ambulatorial tem por objetivo minimizar os


prejuízos da condição nutricional secundária em função da toxicidade
gastrointestinal. O período de 6 meses após o TCTH ou os 100 primei-
ros dias são decisivos no sucesso do tratamento, pois é quando ocorre
maior risco de infecções com o aumento da morbidade e da mortalida-
de, em especial para pacientes submetidos ao transplante alogênico.

O transplante autólogo, pelo fato de as células-tronco serem do pró-


prio paciente e por não exigir o uso de drogas imunossupressoras, con-
fere menos tempo de risco, que pode ser de 3 a 6 meses, assim como
o transplante singênico, pois as células são originadas de um doador
gêmeo homozigótico.

Os pacientes que apresentarem complicações pós-TCTH, como


desnutrição grave, diabetes e dislipidemias, decorrentes dos efeitos
tardios de regime realizado com quimioterápicos, imunossupressores
e corticoides, devem ser orientados a receber a terapia nutricional no
pós-transplante com um acompanhamento periódico para correção
das perdas e complicações.

5 Cuidados nutricionais no transplante renal


(TxR)
O transplante renal (TxR) é considerado um método de escolha para
a terapia de substituição renal no tratamento da doença renal crônica
(DRC) terminal e resulta na melhora da qualidade de vida dos pacientes
e na redução na mortalidade.

Dietoterapia no transplante de órgãos 169


5.1 Terapia nutricional

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A terapia nutricional deve ser individual e é parte importante do
tratamento. As anormalidades metabólicas no pré-TxR podem persistir
no pós-TxR e outras complicações podem surgir.

5.1.1 Energia

A quantidade de energia a ser prescrita pode ser calculada pelo peso


corporal, pela equação de Harris-Benedict ou pela calorimetria indireta.

No período pós-TxR imediato (4 a 6 semanas após a cirurgia) ou na


rejeição aguda, quando a dose de esteroide é elevada, recomenda-se
30 a 35 kcal/kg/dia. Nesse período, pacientes com excesso de peso
devem ser orientados para a manutenção do peso e, posteriormente,
na presença de dose de manutenção do imunossupressor, iniciar a
redução energética.

No pós-TxR tardio (após 6 semanas da cirurgia), recomenda-se


25 a 30 kcal/kg/dia. Nos pacientes com excesso de peso, recomenda-
-se controle da ingestão energética (20 a 25 kcal/kg/dia).

Na presença de estresse metabólico, infecção e febre, pode-se elevar


a quantidade de energia para 35 a 45 kcal/kg/dia.

No período TxR imediato, a recomendação de lipídeos é de 30% a


35% do valor energético total. Na presença de hiperlipidemia, recomen-
da-se ingestão de lipídeos inferior ou igual a 30% do valor energético to-
tal, sendo 10% de gordura saturada, superior ou igual a 10% de gordura
monoinsaturada e 10% de gordura poli-insaturada.

A recomendação de carboidratos tanto no pós-TxR imediato ou


tardio é de 50% a 60% do valor energético total. Na presença de
hiperglicemia e hipertrigliceridemia, recomenda-se a ingestão de fi-
bras (25 a 30 g/dia).

170 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


As recomendações para diabetes mellitus pós-TxR (DMPT) são
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semelhantes para pacientes diabéticos e faz-se necessário associar o


tratamento farmacológico e medicações da dose e/ou tipo de imunos-
supressor à terapia dietética.

5.1.2 Proteínas

Considerando os efeitos catabólicos dos imunossupressores, re-


comenda-se para pós-TxR imediato a oferta de 1,3 a 1,5 g/kg/dia de
proteínas, mesmo para pacientes com rejeição aguda, atraso na fun-
ção do enxerto ou necessidade de diálise. A ingestão proteica deve ser
reduzida apenas na presença de necrose tubular aguda com sintomas
urêmicos associados.

Para pós-TxR tardio, a recomendação de proteína é de 1 g/kg/dia


associado a atividade física regular.

Para pacientes com nefropatia crônica do enxerto (NCE), a ingestão


deve ser de 0,6-0,8 g/kg/dia, contanto que a ingestão de energia seja >
25 kcal e a dose de prednisona ≤ 0,2 mg/kg/dia.

Essa conduta ajuda a minimizar o grau de proteinúria, a diminuir a


atividade de renina plasmática e a preservar a função do enxerto. Nos
pacientes com NCE, deve haver um monitoramento rigoroso do estado
nutricional e da massa magra.

É recomendado evitar o excesso de proteína dietética na presença


de níveis elevados de ácido úrico no sangue.

5.1.3 Eletrólitos, minerais e vitaminas

O nível máximo para ingestão diária de sódio é de 2.400 mg, que cor-
responde a 6 g de sal (NaCl)/dia. Para pacientes com hipertensão arterial
(HA) relacionada a retenção hídrica, é recomendada a ingestão de menos
de 2.000 mg de sódio/dia.

Dietoterapia no transplante de órgãos 171


5.1.4 Potássio

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A restrição a potássio deve ocorrer em caso de hiperpotassemia ou
oligúria (25 a 73 mEq/dia).

5.1.5 Magnésio

O uso prolongado de ciclosporina está associado aos níveis séri-


cos mais baixos de magnésio. A necessidade de suplementação deve
ser avaliada individualmente, de acordo com os níveis séricos normais
(1,8 a 2,52 mcg/dL). Para isso, deve-se utilizar a ingestão dietética de
referência (DRI – dietary reference intakes).

5.1.6 Cálcio e fósforo

O hiperparatireoidismo, a hipocalcemia e a hipo ou hiperfosfate-


mia podem persistir após o TxR e podem ser agravados pelo uso de
imunossupressor.

A ingestão de cálcio e fósforo deve ser individualizada, em geral,


recomenda-se de 800 a 1.500 mg de cálcio, e de 1.200 a 1.500 mg de
fósforo. Para pacientes com rejeição crônica do enxerto, a ingestão
de fósforo recomendada deve ser de 800 mg/dia.

5.2 Suporte nutricional


É indicado na presença de desnutrição e/ou ingestão alimentar insu-
ficiente, em qualquer fase do período pós-TxR.

5.3 Acompanhamento nutricional

O acompanhamento nutricional deverá ser iniciado junto com a equipe


multiprofissional desde a fase pré-TxR. O paciente deve ser orientado sobre
as necessidades e a importância da terapia nutricional após o TxR.

172 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


Tabela 5 – Resumo das recomendações de nutrientes para receptores de TxR
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NUTRIENTE PERÍODO PÓS-TXR IMEDIATO PERÍODO PÓS-TXR TARDIO

Energia 30-35 kcal/kg/dia 25-30 kcal/kg/dia

≤ 30% energia total diária


10% gordura saturada
Lipídeos 30-35% energia total diária 10-15% monoinsaturada
10% poli-insaturada
Colesterol < 300 mg dia

Carboidratos 50-60% energia total diária 50-60% energia total diária

Proteína 1,3-1,5 g/kg/dia (50-75% AVB*) 1 g/kg/dia (50-75% AVB*)

2.400 mg/dia 2.400 mg/dia


Sódio < 2.000 mg/dia, se houver HA < 2.000 mg/dia, se houver HA
retenção hídrica ou oligúria retenção hídrica ou oligúria

Avaliar níveis séricos


Avaliar níveis séricos
Restrição (1.000-3.000
Restrição (1.000-3.000 mg/dL)
Potássio mg/dL) se houver
se houver hiperpotassemia e/ou
hiperpotassemia e/ou
oligúria
oligúria

Avaliar níveis séricos/uso de Avaliar níveis séricos/uso de


Magnésio ciclosporina-A ciclosporina-A
Suplementar se necessário Suplementar se necessário

Avaliar níveis séricos Avaliar níveis séricos


Cálcio Restringir ou suplementar se Restringir ou suplementar se
necessário. necessário.

Avaliar níveis séricos


Avaliar níveis séricos
Restringir (800 mg/dia) se
Fósforo Restringir ou suplementar se
houver rejeição crônica do
necessário
enxerto

Avaliar estoque corporal Avaliar estoque corporal


Ferro
Suplementar se necessário Suplementar se necessário

(cont.)

Dietoterapia no transplante de órgãos 173


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NUTRIENTE PERÍODO PÓS-TXR IMEDIATO PERÍODO PÓS-TXR TARDIO

Suplementar se necessário
Vitaminas Se houver rejeição
Suplementar se necessário
hidrossolúveis crônica do enxerto e dieta
hipoproteica

Vitamina D3 Suplementar se necessário Suplementar se necessário

*AVB: aminoácidos de alto valor biológico.


Fonte: Cuppari, Avesani e Kamimura (2013).

No período pré-TxR, os pacientes necessitam de avaliação nutricio-


nal criteriosa para melhorar o prognóstico cirúrgico. No período pós-TxR
imediato (4 a 6 semanas após a cirurgia), além do estresse cirúrgico, há o
risco decorrente das altas doses de medicamentos imunossupressores.

A utilização da terapia imunossupressora é parte importante do trata-


mento clínico e seus efeitos adversos podem afetar o estado nutricional.

Após 6 semanas (pós-TxR tardio), podem ocorrer algumas altera-


ções nutricionais, como desnutrição energético-proteica, sobrepeso e
obesidade, dislipidemias e intolerância a glicose, sendo esses quadros
importantes fatores de risco de mortalidade e de perda da função do
enxerto renal.

Quadro 1 – Fases do TxR

FASES TXR CARACTERÍSTICAS

Avaliação nutricional criteriosa


Período pré-TxR
Melhorar prognóstico cirúrgico

Enxerto renal funcionante


Reversão do quadro urêmico
Período cirúrgico Retardo na função do enxerto – necessidade de DP* ou HD**
Uso de altas doses de medicamentos imunossupressores
Aumento de apetite

(cont.)

174 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


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FASES TXR CARACTERÍSTICAS

Função renal estável – sem distúrbio metabólico grave


Período pós-TxR tardio Início ou persistência de diabetes, sobrepeso, obesidade, hipertensão,
doença óssea

*DP: diálise peritoneal; **HD: hemodiálise.


Fonte: adaptado de Martins, Pecoits-Filho e Riella (2004); Teplan et al. (2009).

5.4 Sobrepeso e obesidade


Estima-se que o ganho excessivo de peso seja maior que 40% após o
TxR. Em média, no primeiro ano pós-TxR, o aumento de peso corporal é
em torno de 10%. O aumento do apetite (hiperfagia) e o ganho excessi-
vo de peso têm sido atribuídos a diversos fatores, como sedentarismo,
liberação das restrições alimentares necessárias durante o tratamento
conservador ou de diálise e a terapia imunossupressora.

Os pacientes pós-TxR que apresentam sobrepeso ou obesidade


têm maior risco de desenvolver doenças como diabetes mellitus tipo 2,
hipertensão, hiperlipidemia e hiperuricemia, a qual tem papel importan-
te na patogênese das doenças cardiovasculares. Considerando que a
obesidade tem consequências no perfil de morbidades em longo prazo,
é importante que sejam tomadas medidas precoces para prevenir ou
minimizar o excesso de peso.

5.5 Desnutrição energético-proteica


A desnutrição energético-proteica (DEP) está presente em aproxima-
damente de 15% a 20% dos receptores de TxR. As causas e as prevalên-
cias da DEP necessitam de maior elucidação, mas sabe-se que a pre-
sença de comorbidade e a insuficiência do próprio enxerto levam à DEP.

A DEP pode causar impacto negativo na sobrevida do enxerto do


paciente e por isso a importância de sua prevenção e tratamento.

Dietoterapia no transplante de órgãos 175


Foi sugerido que a DEP em receptores de TxR pode decorrer da sín­

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drome desnutrição-inflamação-arteriosclerose, presente no período pré-
-TxR. Outros fatores que interferem são efeitos catabólicos da imunos-
supressão, da insuficiência do enxerto e da presença de infecções. Outro
fator é a presença de acidose metabólica, considerada o principal es­
tímulo para a degradação da massa muscular.

5.6 Hipertensão arterial (HA)

A hipertensão arterial (HA) é uma complicação frequente após o TxR


e sua causa é multifatorial. Entre 50% e 80% dos receptores adultos
e pediátricos apresentam HA e isso representa um fator de risco para
doenças cardiovasculares, sendo a principal causa de mortalidade em
receptores de TxR. Os fatores considerados de risco para HA após o
TxR incluem doador com histórico de HA, idade do doador, TxR com
doador falecido, presença de rim nativo, obesidade, tempo prolongado
de isquemia fria ou quente, recorrência da doença que leva à DRC e
medicamentos imunossupressores.

5.7 Diabetes mellitus pós-TxR (DMPT)

A incidência de diabetes mellitus pós-TxR (DMPT) varia entre 2% e


54%, com um percentual cumulativo de 1,1% no primeiro ano pós-TxR,
e aumento para 29,8% após 15 anos. O DMPT está associado à redução
da função e da sobrevida do enxerto em longo prazo e ao aumento de
incidência de doença cardiovascular.

Os fatores de risco incluem idade acima de 40 anos, história fa-


miliar de diabetes, intolerância a glicose, raça não branca, obesidade
(IMC > 30 kg/m2), síndrome metabólica, terapia imunossupressora,
entre outros.

176 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


5.8 Dislipidemias
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As alterações no metabolismo de lipídeos no TxR podem estar


associadas ao grau de função do enxerto, e disso vai depender a
quantidade de imunossupressores, que podem ter como efeitos co-
laterais o desenvolvimento de dislipidemias e obesidade, elevação da
ingesta energética, aumento das gorduras totais e do colesterol. As
dislipidemias mais comuns são a hipercolesterolemia, em torno de
60% dos pacientes, LDL-colesterol elevado e hipertrigliceridemia (35%
dos casos).

IMPORTANTE

As alterações do metabolismo de lipídeos estão associadas com o


esquema de imunossupressão. As azatioprinas e esteroides estão
associados à hipertrigliceridemia, e a combinação ciclosporina e
prednisona está associada à hipercolesterolemia.

5.9 Hiper-homocisteinemia
Os pacientes com TxR têm risco aumentado para adquirir doença
cardiovascular e o nível sanguíneo de homocisteína está associado a
doenças cardiovasculares.

Considerações finais
O acompanhamento nutricional em pacientes receptores tem um
papel importante na prevenção e no tratamento das complicações pré
e pós-transplantes. O acompanhamento deve ser multiprofissional e
seu início deve ocorrer no preparo do paciente para o transplante.

As diversas particularidades inerentes aos tratamentos desses


pacientes ressaltam a importância do papel do nutricionista.

Dietoterapia no transplante de órgãos 177


As modificações no padrão alimentar devem sempre ser enfatiza-

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das, garantindo um melhor controle de distúrbios nutricionais e um
melhor funcionamento do enxerto.

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180 Dietoterapia nas doenças do sistema cardiorrespiratório, doenças renais e câncer


Sobre a autora
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

Renata Hyppólito Barnabe é nutricionista formada pela Faculdade


de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). Especialista
em Nutrição Materno-Infantil pela Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp). Pós-graduada em Padrões Gastronômicos pela Universidade
Anhembi-Morumbi. Especialista em Administração Hospitalar pelo
Centro Universitário São Camilo. Nutricionista do Instituto da Criança do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo (HCFMUSP).

Link para o currículo Lattes:


<http://lattes.cnpq.br/2017289123704598>.

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