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Ano Letivo 2021/2022

Direito do
Trabalho II

2.º Turma

Mariana Martins Ferreira


Rute Fernandes da Silva

Resumo realizado com base em:


• Apontamentos de aulas teóricas da Doutora Joana Vicente;
• Apontamentos de aulas práticas da Doutora Renata Esteves;
• Bibliografia da cadeira:
• Material disponibilizado no UcStudent.
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Na disciplina de Direito do Trabalho II estaremos a debruçar-nos,


principalmente, sobre o Direito Coletivo do Trabalho, ou seja, nas normas que
regulam a dimensão coletiva das relações sociais de trabalho.
A perspetiva individual do trabalho – empregador e trabalhador (estudada em
Direito do Trabalho I) – não é única possível.
Podemos olhar para estas relações sociais numa outra perspetiva – numa
perspetiva coletiva:
▪ Neste ponto de vista, estaremos a olhar para os grupos sociais de
empregadores e trabalhadores que estão em posições diferentes no
processo produtivo e que têm normalmente interesses divergentes e
uma tendência natural para conflituarem entre si.

A dimensão individual e coletiva do trabalho assalariado


▪ Dimensão individual: relação entre sujeitos individuais (trabalhador e
empregador);
▪ Dimensão coletiva: relação entre determinadas coletividades (grupos
sociais), situadas em posições diferentes no processo produtivo,
exprimem interesses entre si divergentes, demonstrando uma
tendência natural para conflituar entre si.

→ Nas palavras do Dr. Leal Amado, o Direito Coletivo do Trabalho exprime a


rutura com o individualismo radical, sendo um produto do homem solidário e
não solitário.

Portanto, o que é o direito coletivo do trabalho?


▪ É um setor do Direito do Trabalho;
▪ Composto essencialmente por normas legais;
▪ Que vai regular os fenómenos coletivos laborais (ao invés de regular
as relações de trabalho subordinado encaradas no plano individual de
trabalhador e empregador).
▪ Vai regular o modo por que se desenvolvem as relações e
atividades desses grupos sociais (desses trabalhadores e
empregadores).
▪ Portanto, os sujeitos serão grupos sociais que representam
interesses de trabalhadores e que representam interesses de
empregadores.

Quais são os grupos sociais?


▪ De trabalhadores;
▪ De empregadores.

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Quais os fenómenos coletivos laborais?


Os fenómenos coletivos laborais que estes grupos sociais de trabalhadores e
de empregadores movem podem ser vários tipos, uma vez que os grupos têm
diferentes modos de atuação.
Podem ser de três tipos:
1. Organizações:
▪ Formas que os grupos organizados de trabalhadores e
empregadores têm de defender e promover os seus interesses
coletivos.
▪ Constituem estruturas de representação coletiva (em especial, as
associações sindicais e as comissões de trabalhadores).
2. Negociações:
▪ Acordos através dos quais os grupos sociais e organizados de
trabalhadores e empregadores procuram a realização dos seus
interesses.
▪ Constituem instrumentos de regulamentação coletiva de
trabalho (em especial, a Convenção Coletiva de Trabalho).
3. Conflitos:
▪ Confrontos entre os grupos sociais portadores de interesses
contrapostos (reivindicações desatendidas, negociações
falhadas).
▪ Em especial, a greve enquanto conflito coletivo laboral
paradigmático, levanta sempre muitas questões, sendo que o
seu regime tem de ser articulado entre o CT e a CRP - e
porventura, outras fontes internacionais.

Porquê a necessidade de regular estes fenómenos coletivos?


▪ Como vimos anteriormente, o Direito Coletivo do Trabalho é um setor
do DT que tem um conjunto de normas legais que vai regular o modo
como se desenvolvem as relações entre os grupos sociais.
▪ O Direito deve aqui intervir na regulação destes fenómenos coletivos
do trabalho para tentar equilibrar os interesses dos trabalhadores
com os interesses da coletividade geral que não podem ser postos de
parte.
▪ É exemplo a greve, que tende a limitar serviços que constituem
necessidades da coletividade geral.
▪ O Estado entende a necessidade de criar normas legais para regular
estes fenómenos, para que se possa equilibrar e harmonizar a complexa
realidade social atual.
▪ Trata-se de realidades que envolvem muitos sujeitos e, como há́ uma
tendência para o conflito, há́ uma necessidade de intervir por parte do
Direito, por questões de paz social, de normalização e de satisfação
interesses gerais.

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▪ Há́ que olhar para estes fenómenos coletivos laborais com a ideia de
que o facto de o direito intervir neles traz vantagens em termos de
compatibilização dos interesses gerais com os interesses dos
trabalhadores e dos empregadores, em termos de paz social e em
termos de previsibilidade.
▪ Há que compatibilizar os interesses da comunidade com os
interesses destes grupos sociais.

→ É a nota de subordinação jurídica na relação de trabalho que faz surgir o


direito coletivo – é uma resposta a esta supremacia jurídica dos empregadores
– os trabalhadores unidos mais facilmente atingem os seus objetivos.

O associativismo dos trabalhadores


Breve resenha histórica (Portugal):
Antecedentes:
▪ Já havia antecedentes do associativismo dos trabalhadores na Idade
Média, designadamente, através dos grémios/corporações, associações
de socorros mútuos e cooperativas.
Séc. XIX (1891):
▪ Contudo, foi sobretudo a partir da segunda metade do século XIX – em
que vigorava, nos planos político e económico, a ideologia liberal – que
surgiram as primeiras manifestações do associativo moderno – aquele
que, depois, deu origem às associações sindicais e, mais tarde, às
comissões de trabalhadores.
▪ Industrialização + liberalismo leva a questão social + ideologia
marxista leva ao aparecimento das primeiras formas de
associativismo sindical que leva ao reconhecimento legal.
▪ Foi aqui que se criaram as condições para o nascimento do
associativismo dos trabalhadores, uma vez que surgiu neste
contexto como uma de resposta às consequências negativas que
o liberalismo estava a demonstrar – este caracterizava-se por uma
abstenção do Estado no que toca à economia e às relações de
trabalho.
▪ Os empregadores definiam só por si as condições de trabalho –
o que levava a condições precárias, salários baixos, etc. Foi uma
fase muito hostil.
▪ Isto gerou insatisfação e revolta e, associando à ideologia
marxista que começava a parecer, surge a ideia de que se
tentasse superar essas dificuldades dos trabalhadores.
Século XX (período corporativo; 1926-1974):

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▪ Este período, coincide com o Estado Novo, em que se tinha uma


doutrina corporativa, que se caracterizava por uma preocupação de
dominar, de controlar os fenómenos coletivos, limitando-os pelo
princípio da paz social e pelo princípio da hierarquia de interesses.
▪ Princípio da colaboração interclassista-instituição de sindicatos
únicos e forte controlo estatal sobre as associações sindicais.
▪ Ou seja, aqui até existiam associações de trabalhadores, mas elas eram
agrupadas com associações representativas de empregadores em
estruturas únicas.
▪ Ao invés de existirem diferentes associações de confronto, os
dois polos opostos ficavam agrupados numa só associação -
trabalhadores e empregadores na mesma associação.
▪ E, para além, disso, as associações também eram muito
controladas pelo estado quanto à sua constituição – eram
extremamente escrutinadas antes de poderem atuar.
Período pós-revolução (desde 1974):
▪ As mudanças não se fizeram sentir imediatamente, pois houve uma
certa persistência de algumas notas do período corporativo, mas a
partir de 1976 começaram a ganhar força ser as notas definidoras do
associativismo dos trabalhadores dos tempos atuais:
▪ Consagração constitucional da liberdade sindical e do
pluralismo sindical, assim como da independência das
associações sindicais face ao estado + instituições das
comissões de trabalhadores.

Estruturas de representação coletiva dos trabalhadores (art. 404.º CT):


a) Associações sindicais;
b) Comissões de trabalhadores e subcomissões de trabalhadores;
c) Representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no
trabalho;
d) Outras estruturas previstas em lei específica, designadamente
conselhos de empresa europeus.

AS ORGANIZAÇÕES
▪ Associações sindicais
▪ Comissões de trabalhadores
▪ Conselhos de empresa europeus
▪ Conselho de trabalhadores
▪ Representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no
trabalho
▪ Associações de empregadores

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ASSOCIAÇÕES SINDICAIS: art. 442.º CT e arts. 55.º e 56.º da CRP


O que é um sindicato? – art. 404.º/a) CT
▪ Ente coletivo (uma pessoa jurídica coletiva à qual o direito reconhece
personalidade jurídica, tendo capacidade jurídica e capacidade de
exercício de direitos);
▪ De tipo associativo (o que significa que o substrato são pessoas
enquanto trabalhadores);
▪ Com caracter voluntário (o que significa que a criação e a subsistência
desta organização dependem da vontade dos seus associados – p.e.,
não há obrigação de constituir um sindicato; a sua subsistência não
depende de terceiros);
▪ Contudo, há́ situações muito particulares em que pode haver
extinções judiciais de associações: são situações muito limitadas
em que, no fundo, a extinção dá-se contra a vontade dos
associados, mas estes contribuem para isso de alguma forma.
Estas situações pontuais não retiram o caráter de voluntariedade
à criação e à subsistência do sindicato.
▪ De caráter permanente, estável, duradouro (porque as organizações
são criadas com intenção de perdurarem no tempo, e não de se
extinguirem após atingir um determinado objetivo). Não significa que o
sindicato seja eterno, mas sim que o sindicato não é uma associação
que nasce com um fim, atinge esse fim e depois se extingue. Nasce com
vista a durar.
▪ De trabalhadores dependentes ou subordinados (isto significa que
os filiados figuram na associação na sua qualidade de serem
trabalhadores subordinados: prestam a sua atividade estando sujeitos
ao poder de direção/disciplinar da entidade empregadora (vínculo de
subordinação)).
▪ Hoje discute-se se a possibilidade de criar sindicatos deve ser só
para os trabalhadores subordinados ou se se deve estender aos
trabalhadores autónomos.
▪ Além disso, hoje em dia, existem categorias a emergir no terreno
que nem são de trabalhadores independentes, nem de
trabalhadores subordinados no sentido clássico. Trata-se de um
conjunto muito fragmentado, que têm notas de independência e
têm notas de subordinação, estando numa categoria intermédia
– a qual não se sabe se tem o direito a constituir sindicato.
▪ Para defesa dos seus interesses económicos e sociais (podem ser
abordados numa concessão mais restrita ou numa concessão mais
ampla):
▪ Se forem abordados numa concessão mais restrita, estamos a
afirmar que o sindicato se debruça sobre a defesa dos interesses
dos trabalhadores subordinados, ou seja, interesses
socioprofissionais.

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▪ Artigo 442º do CT: tendo em conta que se refere a


interesses socioprofissionais, este parece aderir a uma
conceção restrita.
▪ Se forem abordados numa concessão mais ampla temos aqui,
além dos interesses socioprofissionais dos trabalhadores, outro
tipo de interesses que não se esgotam e que tocam em matérias
alheias à figurado empregado. Como por exemplo as questões
fiscais, relacionadas com a maternidade e parentalidade... Estes
interesses não fazem parte do estatuto socioprofissional do
trabalhador, mas deste enquanto cidadão e, por isso, podem ser
incluídos nos interesses do trabalhador
▪ Artigo 56º/1 da CRP: não afirma que tipo de interesses
devem ser defendidos, parecendo dar guarida a uma
conceção mais ampla.
▪ Não há́ uma conceção unânime na doutrina.
▪ Temos autores que entendem que, mesmo atendendo à
Constituição, ela não significa necessariamente que os
interesses tenham que ter um caráter mais amplo.
▪ A Dra. Joana Nunes Vicente defende que, se a
Constituição não o diz, restringir interesses é limitar e, ao
limitar, estamos a restringir o Direito de alguma forma.

Ou seja
Da alínea a) do art. 442.º CT, sobre sindicato, conseguimos extrair 4 elementos:
▪ Elemento organizativo ou associativo – quando se diz que o sindicato é
uma associação (pessoa coletiva, personalidade jurídica própria, de
direito privado, associação voluntária – art. 46.º/3 da CRP)
▪ Temporal – é uma associação permanente.
▪ Subjetivo – quem é representado pelos sindicatos são os trabalhadores
do setor público ou do setor privado.
▪ Teleológico – os sindicatos existem para defesa dos interesses socio
profissionais – pode ser direta ou indireta e ter em vista interesses
patrimoniais ou extrapatrimoniais.

Classificações das associações sindicais:


1. Critério do âmbito subjetivo
Classifica-se as associações pelo modo como se agrupam os trabalhadores:
▪ Associações sindical de profissão ou de ofício (horizontais):
▪ Agrupam os trabalhadores em função da profissão;
▪ Exemplo: sindicato dos professores; sindicato dos
médicos.

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▪ Associações sindical de ramo de atividade (verticais):


▪ Agrupam os trabalhadores por trabalharem no mesmo
setor/ramo de atividade, independentemente da sua profissão.
▪ Neste caso o sindicato que é formado ele não está apenas a
agrupar os trabalhadores de uma profissão, mas trabalhadores
que independentemente da profissão que tem, trabalham todos
no mesmo setor
▪ Exemplo: sindicato dos trabalhadores das indústrias
elétricas.
▪ P.e., no ramo de atividade de restauração, posso ter
cozinheiros, pessoas que servem às mesas, pessoas que
fazem limpeza, etc.

2. Critério do âmbito territorial


Quando se cria uma associação sindical e se agrupa trabalhadores conforme
o setor ou profissão, ainda se pode determinar se o âmbito de atuação do
sindicato será, regional ou local/distrital
▪ Associações sindicais nacionais
▪ Exemplo: Sindicato nacional dos motoristas; Sindicato nacional
da indústria e da energia
▪ Associações sindicais regionais
▪ Exemplo: Sindicato dos professores da região centro
▪ Associações sindicais locais/distritais
▪ Exemplo: Sindicato dos trabalhadores da construção civil,
madeiras e mármores do distrito de Setúbal.

3. Critério do nível de organização (artigo 442º do CT)


Este critério obriga-nos a fazer uma distinção entre sindicato e associação
sindical.
▪ Sindicato (1º grau):
▪ Organização que agrupa os trabalhadores.
▪ Exemplo: Sindicato Independente dos Médicos.
▪ Federação de sindicatos e uniões (2º grau):
▪ Estruturas mais complexas de sindicatos. Agregam os próprios
sindicatos.
▪ Exemplo: Fenprof (Federação Nacional dos Professores)
▪ Exemplo: União dos Sindicatos de Leiria
▪ Confederações (3º grau):
▪ Agrupam sindicatos e federações de sindicatos e uniões.
▪ Exemplo: CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores
Portugueses - intersindical Nacional).
▪ Exemplo: UGT (União Geral de Trabalhadores).

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Se estivermos a utilizar a expressão sindicato tendo em conta o critério do nível


de organização, sindicato e associação sindical são coisas diferentes.
▪ Se estiver a falar de uma organização que agrupa trabalhadores do
ponto de vista do nível de organização, estou a falar de uma associação
sindical de nível I ou de 1º grau que são os sindicatos.
▪ Mas os próprios sindicatos podem agrupar-se em estruturas mais
complexas. Aí temos as federações de sindicatos e uniões (2.º grau) –
reúnem-se vários sindicatos.
▪ Por fim, ainda podemos ter uma associação sindical de 3º grau – as
chamadas confederações, que agrupam sindicatos e federações de
sindicatos e uniões numa estrutura máxima.
Uma associação sindical abrange estes 3.

Figuras afins:
▪ Comissões de trabalhadores
▪ Falaremos mais à frente.
▪ Ordens profissionais (ex: Ordem dos Médicos, dos advogados, dos
farmacêuticos, dos arquitetos, dos enfermeiros, dos engenheiros, dos
economistas).
▪ Associações de direito público de representação de
determinadas profissões que tem como objetivo a definição e a
imposição de regras técnicas e deontológicas de exercício de
determinadas profissões e do regime disciplinar inerente, a
certificação para o exercício da profissão e, genericamente, a
defesa de interesses coletivos da profissão.
▪ Não são o mesmo que associações sindicais.

Associações Sindicais vs. Ordens Profissionais


Natureza privada Natureza pública
Inscrição voluntária Inscrição obrigatória
Funções de tipo privado Funções de tipo privado e público
Representação de interesses laborais Representação de interesses
profissionais
Trabalhadores subordinados Trabalhadores subordinados e
trabalhadores independentes
Pluralismo Unicidade

LIBERDADE SINDICAL

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▪ O associativismo dos trabalhadores, nomeadamente, através da criação


de sindicatos, assume em Portugal um valor peculiar reforçado, porque
estamos a falar de um direito fundamental reconhecido aos
trabalhadores – a liberdade sindical é um direito, liberdade e garantia
dos trabalhadores.
▪ Se é um DLG, a sua tutela vai ser feita nessa qualidade, o que
significa, p.e., que a sua restrição tem de obedecer ao princípio
da proporcionalidade, respeitar o núcleo essencial, etc.

Consagração legal:
▪ Artigo 55.º da CRP: “É reconhecida aos trabalhadores a liberdade
sindical, condição e garantia da construção da sua unidade para defesa
dos seus direitos e interesses”
É um direito que não tem apenas tutela nacional, mas também tutela no
ordenamento supranacional.
▪ A liberdade sindical é ainda reconhecida em textos internacionais (p.e.,
na Carta Social Europeia, na Carta dos Direitos Fundamentais da EU e
na Convenção Europeia dos Direitos do Homem).

Liberdade sindical dos empregadores?


▪ Enquanto a liberdade sindical é reconhecida enquanto direito
fundamental dos trabalhadores, a lei fundamental não reconhece
propriamente a liberdade de constituição de associações de
empregadores como um direito fundamental – não temos o simétrico
do artigo 55.º para os empregadores.
▪ Isto não significa que não haja uma tutela constitucional para a criação
de associações de empregadores – significa apenas que essa tutela é
uma tutela geral que resulta do artigo 46.º da CRP, que reconhece a
liberdade de associação aos cidadãos em geral.
▪ Há́ aqui, então, um tratamento assimétrico entre os trabalhadores e os
empregadores.
▪ Esta assimetria não deixa de ser uma manifestação da conceção
que a CRP tem sobre a relação trabalho, porque a CRP encara a
relação de trabalho como uma relação assimétrica. Deste modo,
é normal que isso se manifeste na tutela que dá aos
trabalhadores.

Dimensões:
Trata-se de um direito de estrutura complexa, desde logo, porque, no que
toca à liberdade sindical, existem dimensões coletivas ou individuais.

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▪ Dimensões coletivas: do reconhecimento da liberdade sindical neste


artigo decorrem direitos das próprias associações sindicais, dos
sindicatos:
▪ Liberdade de criação de sindicatos a todos os níveis;
▪ Liberdade de organização e regulamento internos;
▪ Liberdade de ação sindical da empresa;
▪ Direito de tendência.
▪ Dimensões individuais: do reconhecimento da liberdade sindical
neste artigo decorrem direitos dos próprios trabalhadores, enquanto
indivíduos, face ao Estado/empregadores/sindicato.
▪ Vertente positiva: trata-se de criar medidas/mecanismos que
garantem a efetividade da liberdade de pertencer ou não a um
sindicato:
▪ Liberdade de inscrição e escolha de sindicato;
▪ Proibição de pactos/atos antissindicais:
▪ Vertente negativa: reflete a proibição ou evitar que existam
constrangimentos a essa liberdade de escolher o sindicato:
▪ Proibição de pactos /atos de segurança sindical.

Conteúdo:
Analisando a liberdade sindical do ponto de vista do seu conteúdo, pode
dizer-se que esta se desdobra em quatro liberdades fundamentais:

1. Liberdade de constituição de sindicatos (art. 55.º/2/a) da CRP):


▪ Não deve haver qualquer controlo para a constituição de
sindicatos – não deve haver qualquer tipo de autorização ou
controlo administrativo para a constituição de sindicatos.

2. Liberdade de inscrição (art. 55.º/2/b) da CRP): dimensão positiva (art.


444º/1 do CT) e dimensão negativa (art. 444.º/6 do CT);
▪ Cada trabalhador é livre de se inscrever ou não no sindicato – diz
respeito aos trabalhadores.

3. Liberdade de organização e de regulamentação interna (artigo 55.º/2/c)


da CRP), com respeito pelo princípio democrático (artigo 55.º/3 da
CRP):
▪ O sindicato tem o direito de criar as suas próprias regras, de se
auto organizar.

4. Liberdade de ação sindical na empresa (art. 55.º/2/d) da CRP; art. 460.º


e ss do CT).
▪ Devem ter certo tipo de faculdades e liberdades.

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1. Liberdade de constituição de sindicatos (artigo 55.º/2/a) da CRP)


▪ Liberdade de constituição de associações sindicais, a todos os níveis (1º,
2º e 3º graus);
▪ O surgimento do sindicato não está sujeito a qualquer ato ou
autorizações administrativas.
▪ Há um procedimento que deve ser observado previsto na lei, no
entanto, a sua criação não depende de nenhuma autorização
administrativa.
▪ Não há um controlo de oportunidade/mérito, mas somente
controlo de legalidade.
▪ Liberdade de escolha do respetivo âmbito pessoal (setorial ou
profissional) e geográfico;
▪ Liberdade de dissolução da associação sindical pelos seus associados:
▪ Ou seja, da mesma forma que têm liberdade para construir
associações sindicais, os trabalhadores também podem
dissolver.
▪ A outra única forma de dissolver um sindicato é por via judicial.
▪ Com isto, à partida, não há dissoluções administrativas: o
sindicato não se pode extinguir por ordem do estado – o estado
não interfere nem na constituição nem na dissolução do
sindicato.
▪ Liberdade de constituição de sindicatos paralelos/concorrentes –
pluralismo sindical:
▪ (Sindicatos concorrentes serão aquele que representam o
mesmo tipo de trabalhadores, o mesmo setor ou profissão).
▪ Entre nós vigora a regra de pluralismo sindical e não da
unicidade sindical – podem existir tantos sindicatos quanto
os trabalhadores quiserem – deve alcançar-se a comunhão
de interesses entre esses vários sindicatos que podem
existir.
▪ Não sujeito a qualquer forma de autorização administrativa
(artigo 447º do CT);
▪ Proibição de dissolução por via administrativa (artigo 456º do
CT);
▪ Incompatibilidade com a proibição legal de sindicatos paralelos.

Tiramos daqui dois corolários importantes:


▪ As escolhas para constituição e definição do âmbito das associações
sindicais são dos trabalhadores e daqui resulta, desde logo, que é
vedado ao Estado criar obstáculos à criação de sindicatos.
▪ Acrescido a isto, não são permitidas dissoluções administrativas.
▪ Ou seja, a Administração não interfere nem na constituição nem na
dissolução das associações sindicais.

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2. Liberdade de inscrição (artigo 55.º/2/b) da CRP)

Dimensão positiva
▪ Liberdade de inscrição num sindicato à sua escolha que na área da sua
atividade.
▪ A inscrição de trabalhadores num determinado sindicato não
está dependente de qualquer juízo subjetivo, de um ato
discricionário – o sindicato não tem de aprovar isso com base em
critérios subjetivos – só tem de cumprir com os requisitos legais.
▪ Ou seja, existe a liberdade dos cidadãos de escolher o sindicato
que pretender, desde que na área da sua atividade e que
represente a categoria respetiva – art. 444.º/1 do CT.
▪ Limite: proibição da dupla inscrição (artigo 444.º/5 do CT).
▪ Princípio da filiação única (art. 444.º/5) – não é permitida a
inscrição em dois ou mais sindicatos de um trabalhador a título
da mesma profissão, em sindicatos diferentes. (um trabalhador
poderá estar inscrito em 2 sindicatos se for com profissões
diferente, p.e., um médico que também é serralheiro).
▪ O trabalhador pode mudar de sindicato bastando que comunique essa
intenção com 30 dias de antecedência (444.º/6 CT).

Dimensão negativa
▪ Direito de não inscrição no sindicato, bem como o direito de o
abandonar a todo o tempo (artigo 444.º/6 do CT), isto significa que a
minha liberdade sindical compreende dois aspetos: inscrever-me ou
não.
▪ Direito de não pagar quotas ou contribuições para sindicato em que
não esteja inscrito (artigo 457º do CT).

Tutela da liberdade sindical de inscrição (artigo 406º do CT)


▪ Pactos e atos antissindicais: pactos que visam atingir a liberdade
sindical de inscrição e reduzir a influência do sindicato, mediante
compromisso dos trabalhadores não se sindicalizarem.
▪ São cláusulas que são inseridas nos contratos individuais de
trabalho pelos empregadores através de condutas como, por
exemplo, formular que só contrata quem não estiver filiado em
sindicato ou fazer inquéritos para ver quem estão filiados ou não
no momento de recrutamento - ou mesmo em momentos
posteriores, durante a realização do contrato de trabalho.
▪ São exemplos:
▪ Yellow dog contract – o trabalhador compromete-se a não
se filiar de todo, para obter determinado emprego.

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▪ Mise à l’index – “listas negras” – listas com a identificação


de trabalhadores que desenvolvem atividade sindical, de
modo a obstar à sua contratação ou manutenção dos
postos de emprego.
▪ São nulos por força do art. 406.º/1/a) do CT.

▪ Pactos de segurança sindical: atingem a liberdade sindical negativa (de


não inscrição, de abandono), com o objetivo de promover o reforço dos
sindicatos;
▪ Impõe aos trabalhadores, enquanto condição de admissão ou
manutenção do seu emprego, que se inscrevam em sindicatos da
preferência do empregador – trata-se de dar preferência a um
sindicato em detrimento de outros.
▪ Podem também, à semelhança dos pactos antissindicais, ter as
mais diversas condutas. São exemplos:
▪ Closed shop – para o acesso ao emprego é condição a
filiação em determinado sindicato.
▪ Union shop – a inscrição num determinado sindicato é
condição de manutenção do emprego.
▪ Preferência sindical – cláusulas que conferem um
tratamento preferencial aos trabalhadores inscritos em
determinado sindicato, em diversas matérias.
▪ Maintenance of membership – cláusula que impõe aos
trabalhadores que mantenham a sua inscrição de um
sindicato durante a vigência de determinada CCT.

3. Liberdade de organização e de regulamentação interna (artigo 55º/2/c)


da CRP)
▪ Liberdade de auto-organização e liberdade estatutária (aprovar
estatutos e regulamentos, eleger representantes, programar a
atividade);
▪ Ou seja, é o próprio sindicato que escolhe as suas regras de
funcionamento interno.
▪ Limites:
▪ Com respeito pelos princípios da organização e da gestão
democráticas (eleição periódica, escrutínio secreto, etc.) -
artigo 451º do CT; princípio da autonomia e
independência (art. 55.º/4 da CRP; art. 405.º/1 do CT)
▪ Possibilidade de surgimento de diferentes orientações no
seio de cada associação sindical: obrigação de os
estatutos definirem o direito de tendência.
▪ Surge como reposta ao pluralismo sindical – tem o
risco de os trabalhadores encontrarem os seus

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interesses mais diversos do que se houvesse apenas


um sindicato.
▪ Ver art. 450.º/2 CT;
▪ Este direito, faz com que se num sindicato se
agreguem trabalhadores com diferentes correntes
de opinião – para garantir que há uma
representação de todos os interesses, para mitigar
o efeito de dispersão de interesses dos
trabalhadores causado pelo pluralismo sindical.

4. Liberdade de ação sindical na empresa (artigo 55º/2/d) da CRP)


▪ Artigo 460.º e ss. CT.
▪ Nesta dimensão, o que é efetivamente importante é que a ordem
jurídica crie condições positivas para que a ação sindical se possa
desenvolver na empresa.
▪ Trata-se do direito a desenvolver a sua atividade no seio da empresa
implica, então, que haja um conjunto de medidas positivas para que
essa ação sindical se possa efetivar.
▪ Portanto, esta última dimensão da liberdade sindical tem um conteúdo
essencialmente positivo.

▪ Quais são as formas positivas de criar estas condições para a ação


sindical na empresa?
▪ Reconhecimento de estruturas sindicais no âmbito da
empresa: secção sindical; delegado sindical; comissão sindical;
comissão intersindical- artigo 442º/1 e), f), g) e h) do CT;
▪ Concessão de facilidades-medidas dirigidas a apoiar a ação
sindical:
▪ Beneficiários:
▪ Representantes Sindicais
▪ Associações sindicais
▪ Coletivo dos trabalhadores

Exemplos de facilidades/medidas:
▪ Direito de reunião dos trabalhadores no local de trabalho (dentro ou
fora do horário de trabalho) - artigo 461º do CT
▪ Direito de fixação e distribuição de informação sindical: artigo 465º
do CT
▪ Direito a informação e consulta de delegado sindical, sobre as
matérias contempladas: artigo 466º do CT
▪ Direito a instalação na empresa ou na sua proximidade para o
exercício de funções dos delegados sindicais: artigo 464º do CT

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▪ Direito de não comparecer no trabalho para desempenho de funções


sindicais artigos 408º, 409º, 468º e 414º do CT:
▪ Crédito de horas (sem perda de remuneração) até certo limite:
art. 468.º/1/2/5/8 CT;
▪ Faltas justificadas (com perda de remuneração), uma vez atingido
o limite: art. 409.º/2/3/4 CT.
A lei estabelece, contudo, limites gerais e transversais à utilização destas
facilidades (artigo 414º do CT).
▪ Isto significa que estas medidas estão funcionalizadas para o exercício
de funções sindicais, ou seja, não se pode utilizar, por exemplo, o
crédito de horas para funções que não sejam sindicais – aí, está a fazer-
se uma utilização abusiva do direito, o que pode ser passível de sanção
disciplinar por parte do empregador. Da mesma forma, estas
facilidades não podem prejudicar o normal funcionamento da empresa.

Qual o âmbito subjetivo da liberdade sindical?


Quem é trabalhador para efeitos de liberdade sindical?
▪ Critério da profissionalidade, da dependência económica e
determinação das condições de trabalho:
▪ São trabalhadores subordinados os que exercem
permanentemente uma atividade profissional, com dependência
económica, i.e., encontram-se economicamente dependentes da
profissão desenvolvida não só para sustentarem como para
sustentarem as suas famílias, e em condições heteronomamente
determinadas.
▪ Existem categorias de pessoas que não são trabalhadoras no
sentido estrito, no entanto, não deixam de ter interesses no que
toca à atividade, que devem ser objeto de promoção – de certo
modo mitiga-se um pouco o elemento subjetivo e faz se
prevalecer o elemento teleológico.

Casos pacíficos:
▪ Trabalhadores da Administração Pública (com vínculo de emprego
público);
▪ Em geral, este direito é reconhecido aos trabalhadores públicos,
independentemente do tipo de vínculo (artigo 337º da LFTP).

Casos controversos:
▪ Desempregados:
▪ Artigo 444º/2 do CT;

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Condição transitória – tem-se entendido que uma pessoa que


perca o emprego não tem de se desfiliar nem está impedida de
se filiar num sindicato – uma vez que o status dos desempregados
é transitório (já foi trabalhador e, provavelmente, voltará a ser).
▪ O desempregado pode, então, ter interesse em estar com
a associação sindical numa dupla perspetiva: não só
porque ela trata questões que podem vir a interessar-lhe
quando ele estiver empregado novamente, mas também
porque ela pode promover interesses e direitos dos
trabalhadores que podem vir a estar numa situação de
desemprego.
▪ O que é mais duvidoso, contudo, é a questão da
possibilidade de os desempregados constituírem um
sindicato – tendo em conta que para os desempregados é
uma condição transitória, seria limitativo atender a
interesses apenas de desempregados.
▪ Interesses em comum com trabalhadores.

▪ Reformados:
▪ Artigo 442º/2 do CT;
▪ Partilha de interesses conexos com a profissão (reformas e
pensões, acumulação de pensão com trabalho; etc.).
▪ À semelhança da questão dos desempregados faz sentido
que possam estar inscritos numa associação sindical
porque existe uma partilha de interesses conectados com
a profissão.
▪ Mais uma vez, também não se verifica a possibilidade de
os reformados constituírem uma associação sindical.

▪ Forças Armadas Guarda Nacional Republicana, Polícia Marítima:


▪ O artigo 270º da CRP;
▪ Argumentos contra:
▪ O argumento da neutralidade, do apartidarismo e da
defesa da segurança pública: estes estariam a ser
prejudicados se houvesse constituição de associações
sindicais.
▪ Solução atual, na legislação ordinária: absoluta proibição de
liberdade sindical; apenas associações representativas dos seus
interesses;
▪ Argumentos a favor:
▪ Dúvidas quanto à conformidade constitucional (artigo
270º da CRP) e com direito internacional (CEDH,
Convenção da OIT).

▪ Magistrados (magistrados judiciais)?

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ A outra categoria que também é controversa e que não tem


solução expressa na lei são os magistrados judiciais. Há, neste
caso, uma dualidade que tem sido difícil de conciliar para
reconhecer aos magistrados a liberdade de associação:
▪ Por um lado, são pessoas que exercem funções num órgão
de soberania, com garantias de independência, de
irresponsabilidade e de inamovibilidade;
▪ Por outro lado, são pessoas que estão integradas numa
carreira em que são dependentes no que toca à
determinação das condições de trabalho.

COMISSÕES DE TRABALHADORES

▪ Forma de organização dos trabalhadores no interior de empresa.


▪ O seu âmbito é diferente do âmbito das associações sindicais.
Enquanto as comissões representam apenas os trabalhadores de
uma determinada empresa, as associações sindicais
representavam trabalhadores com a mesma profissão ou setor,
mas dos mais vários sítios
▪ Elementos:
▪ Organização dotada de personalidade jurídica:
▪ Adquirem esta personalidade a partir do momento em
que há o registo dos estatutos da comissão de
trabalhadores. Verifica-se esta questão no art. 416.º CT.
▪ Isto acontece também no caso das associações sindicais –
adquirem esta personalidade a partir do momento em que
há o registo dos estatutos da associação sindical.
▪ Constituída por trabalhadores subordinados;
▪ Independentemente da categoria profissional.
▪ Eles não estão unidos por pertencerem a uma categoria
profissional, mas sim por pertencerem a uma determinada
empresa.
▪ Que são eleitos entre os trabalhadores da empresa mediante
votação;
▪ Que visa defender os interesses dos trabalhadores de uma
determinada empresa.

Tutela Constitucional (Dimensões):

1. Liberdade de constituição de comissões de trabalhadores nas empresas


(artigo 54.º/1 da CRP)

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Direito de os trabalhadores constituírem comissões de trabalhadores


(ver artigos 416.º, 430.º, 438.º e 439.º do CT).
▪ Têm o direito de constituir comissões de trabalhadores sem
interferência do Estado ou dos empregadores – é uma obrigação
de conteúdo negativo para estes.
▪ Apenas se exige:
▪ O registo junto do Ministério do Trabalho;
▪ A publicação no BTE;
▪ E a apreciação da legalidade pelo MP.
▪ É um direito que vale para qualquer tipo de empresa,
independentemente da dimensão da empresa, natureza de atividade,
do caracter público ou privado da empresa.
▪ Aqui, ao contrário das associações sindicais, vale a regra da unicidade –
só é possível uma comissão de trabalhadores por empresa.
▪ Ou seja, a uma empresa corresponderá apenas uma comissão.
Esta ideia concretiza-se com a proibição de comissões de
trabalhadores paralelas ou concorrentes (unicidade).
▪ Contudo, existe uma admissibilidade de subcomissões (artigo
415º/2 do CT):
▪ Há a possibilidade de uma comissão ter mais estruturas na
comissão – se uma empresa tiver estabelecimentos
dispersos (p.e., uma em Aveiro, outra em Lisboa, etc.)
pode constituir subcomissões, para cada local, por razões
de melhor representação dos interesses.

▪ Direito de os trabalhadores dissolverem comissões de trabalhadores:


▪ O Estado e o empregador não têm qualquer prerrogativa para
dissolverem comissões de trabalhadores; os únicos que o podem
fazer são os próprios trabalhadores ou os tribunais (se houver
uma extinção).

2. Liberdade de organização e regulamentação interna (artigo 54.º/2 da


CRP)
▪ Elaboração dos estatutos:
▪ Conteúdo mínimo (artigo 434º do CT) – ao terem liberdade para
se auto-organizar, a lei prevê apenas um conteúdo mínimo que
esses estatutos devem atender.
▪ Eleição dos membros:
▪ Voto secreto e direto;
▪ Respeito pelo princípio democrático (periocidade, liberdade e
igualdade de candidaturas).

3. Liberdade de coordenação (artigo 54º/3 da CRP)

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ As comissões de trabalhadores podem, para além de constituir


subcomissões, criar comissões coordenadoras, para conjugar esforços
e prosseguir objetivos comuns.
▪ Artigo 415º/4 do CT;
▪ Artigo 435º e ss. do CT.

Direitos das Comissões de trabalhadores

1. Direito à informação (artigo 54º/5/a) da CRP):


▪ Direito de obter esclarecimentos de caráter económico e social
necessários ao exercício da atividade (artigo 54º/5 a) da CRP);
▪ Âmbito da informação vasto: no artigo da CRP não se esclarece
quais são as matérias sobre as quais a constituição pode solicitar
esclarecimentos ao empregador, contudo o CT estabelece o
conjunto de matérias vasto no artigo 424.º do CT;
▪ Procedimento: forma escrita – artigo 427.º do CT;
▪ Verificamos que a comissão deve pedir por escrito a
informação sobre as matérias elencadas nessa lista. O
empregador tem o dever de prestar as informações se daí
constarem – se não o fizer, incorre numa contraordenação
grave – art. 427.º/8 CT.
▪ Limites: dever de sigilo e confidencialidade: artigo 412.º do CT;
▪ Outros processos de informação e consulta previstos a lei.

2. Direito à consulta prévia:


▪ Dever por parte do empregador de solicitar pareceres da comissão
sobre determinadas matérias – art. 425.º do CT.
▪ Âmbito das matérias: Artigo 425º do CT:
▪ Se o empregador não solicitar, está numa contraordenação grave
– art. 427.º/8
▪ Procedimento: prazo para emitir parecer: Artigo 427.º do CT;
▪ Limites: dever de sigilo e confidencialidade: Artigo 412.º do CT.

3. Direito de controlo de gestão e de participação nos processos de


reestruturação (artigo 54º/5/b)/c) da CRP):
▪ O direito de controlo de gestão consiste, no fundo, no direito de
participar na vida da empresa, intervindo na tomada de decisões e
fiscalizando a atividade de gestão por parte do empregador.
▪ A comissão de trabalhadores, no objetivo de defender os
interesses dos trabalhadores vai ter possibilidade de controlar a

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

gestão da empresa – mas, obviamente, os trabalhadores apenas


podem interferir até certo ponto.
▪ Este controlo de gestão pode ter uma intensidade variável (por vezes
esse controlo traduz-se em apenas emitir um parecer/recomendação
antes da tomada de decisão do empregador; e outras vezes exige-se
um parecer favorável da comissão, para que posteriormente possa ser
tomada a decisão).
▪ Note-se que o direito de controlo de gestão não se confunde com a
cogestão.
▪ A cogestão consiste numa gestão partilhada da empresa entre o
empregador e os trabalhadores, em que os processos de decisão
são feitos em conjunto pelas duas partes.
▪ Pelo contrário, o direito de controlo de gestão pressupõe uma
separação entre os órgãos de gestão e os trabalhadores.

4. Direito de participação na elaboração da legislação laboral (artigo 54º/


5/d) do CT):
▪ Noção de legislação laboral (artigo 469º do CT);
▪ Este direito está consagrado na CRP e vai ser desenvolvido ao
longo do CT (arts. 469.º, 470.º, 474.º, 475.º do CT).
▪ Sentido da participação: possibilidade de pronuncia prévia (através
de pareceres/audições) sobre projetos e propostas legislativas
publicados nos jornais oficias (artigo 470º, 474º do CT):
▪ Ou seja, quem elabora a legislação é, naturalmente, o
Parlamento ou o Governo – isto não significa que a comissão vá
elaborar juntamente com eles.
▪ Contudo, quando há projetos de propostas legislativas, as
comissões de trabalhadores têm acesso a eles e podem
pronunciar-se sobre esses antes de serem votadas ou aprovadas
– não há nenhum direito de voto ou veto por parte das comissões,
apenas se podem pronunciar.
▪ O parecer das comissões pode funcionar como elemento de
trabalho para os legisladores terem em consideração.
▪ Alcance da participação: elementos de trabalho – voto ou veto (artigo
475º do CT);
▪ Falta de participação: inconstitucionalidade procedimental.

Associações Sindicais vs. Comissões de Trabalhadores

O modelo dualista: o nosso ordenamento reconhece a dualidade de


instâncias representativas dos trabalhadores no âmbito da empresa: artigos
54º e 55º da CRP; artigos 415º e ss. e artigos 440º e ss. do CT.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

Pontos de contacto:
▪ Pessoas coletivas em sentido próprio:
▪ Têm personalidade jurídica.
▪ Pessoas coletivas de direito privado;
▪ Associações em sentido estrito;
▪ São constituídas por pessoas no seu substrato.
▪ Associações constituídas por trabalhadores subordinados;
▪ Associações que tem como fim a defesa dos interesses dos
trabalhadores.
Direitos Comuns:
▪ Direito de participação da elaboração da legislação laboral (artigo 56º/2
a) e artigo 54º /5 d) da CRP);
▪ Direito da participação nos processos de reestruturação da empresa
(artigo 56º/2 e) e artigo 54º /5 f) da CRP);
▪ Direito à informação e consulta (artigo 54º/5 a) e artigos 55º /6 da CRP;
artigo 424º e artigo 466º do CT).

Aspetos distintivos:
Associações sindicais Comissão de trabalhadores

Âmbito supra empresarial das Âmbito de atividade empresarial da


associações sindicais (contudo, figura comissão de trabalhadores;
do delegado sindical, secção sindical);

Formadas por trabalhadores de Formadas por trabalhadores de uma


determinada categoria ou setor de empresa independentemente da
atividade; categoria profissional;

Opção pela unidade da CT (artigo


Opção pelo pluralismo sindical ao nível 415º/1), temperada pela possibilidade
das AS; de criar subcomissões nas empresas
com estabelecimentos dispersos (artigo
415º/2);

Inscrição na associação sindical; Desnecessidade de inscrição na CT;

Direitos exclusivos da AS: exercício do direito de contratação coletiva


(artigo 56º/3 da CRP); direito de decretar e de gerir a greve (artigo 531º);
Direitos exclusivos da CT: exercer o controlo de gestão nas empresas
(artigo 54º/5 b) da CRP); gerir ou participar na gestão das obras sociais
da empresa (artigo 54º/5 e) da CRP).

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

TUTELA DOS REPRESENTANTES


▪ A CRP manda ao legislador ordinário que conceda uma tutela
adequada a estas categorias de trabalhadores – aos representantes.
▪ Ratio da tutela:
▪ Maior exposição → atuação reivindicativa → alvo de represálias/
condutas discriminatórias → necessidade de tutela;
▪ Entende-se que é necessária esta tutela adequada, porque
estes trabalhadores, pela posição que exercem de
representação, estão sujeitos a uma maior exposição (de
pedir informações, convocar protesto, etc.) ou a liderar
processos de maior escrutínio. Logo, o legislador entende
que por esses motivos podem ser alvo de condutas
prossecutórias, de represálias ou discriminatórias.
▪ Atuação reivindicativa → condições para o exercício efetivo da
defesa dos trabalhadores → necessidade de tutela.
▪ Por outro lado, se a sua atuação é muitas vezes de
escrutínio ou reivindicativa, não se podem sentir
amedrontados a fazer essas ações, pois assim não estariam
a representar o seu papel da melhor maneira de defesa
dos trabalhadores – é um modo de sentirem que não
precisam de ter medo de sofrerem represálias.

▪ Tem como base normativa: artigo 55.º/6 da CRP + artigo 54.º/4 da CRP:
▪ “Os representantes eleitos dos trabalhadores gozam do direito à
informação e consulta, bem como à proteção legal adequada
contra quaisquer formas de condicionamento, constrangimento
ou limitação do exercício legitimo das suas funções.”

Âmbito subjetivo da tutela


▪ Quem são os beneficiários da tutela?
▪ Membros das estruturas de representação dos trabalhadores.
Tutela 1: Transferência de local de trabalho (artigo 411º do CT)
▪ O trabalhador membro de estrutura de representação coletiva dos
trabalhadores não pode ser transferido de local de trabalho sem o seu
acordo, salvo quando tal resultar de extinção ou mudança total ou
parcial do estabelecimento onde presta o serviço.
▪ Sabemos que a lei prevê hipóteses em que a transferência de
local de trabalho é possível por ordem unilateral do empregador
(art. 194.º CT) – transferência coletiva ou individual.
▪ No caso dos representantes sindicais, a norma que regula a
transferência é a do art 411.º (e não o 194.º).
▪ Daqui retiramos:

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Sendo uma transferência individual, para ser lícita, não


pode ser uma ordem, tem de ser um acordo. O
representante tem de concordar para ser individualmente
transferido, seja a título definitivo ou temporário.
▪ Sendo uma ordem de transferência coletiva, o
representante está sujeito ao mesmo regime que os
restantes trabalhadores (“salvo quando…”);
▪ Acrescido a isto, quando estamos perante cláusulas de
mobilidade geográfica, previstas no art. 194.º/2 CT, os
representantes também têm um regime diferente:
enquanto o trabalhador exercer o cargo de representante,
a cláusula fica congelada, a eficácia fica suspensa. Logo, o
empregador não pode fazer uso dela durante esse
período.
▪ O empregador deve comunicar a transferência do trabalhador a que se
refere o número anterior à estrutura a que este pertence, com
antecedência igual à da comunicação feita ao trabalhador.

Tutela II: Procedimento disciplinar e despedimento (artigo 410º do CT)


▪ Suspensão preventiva do trabalhador (artigo 354º do CT): acesso ao
local de trabalho para o exercício das funções;
▪ Pelo art. 410.º CT, a suspensão preventiva de trabalhador não
obsta a que o mesmo tenha acesso à empresa e exerça a sua
atividade e funções sindicais. Enquanto o processo disciplinar
não estiver concluído, deixa de prestar as suas funções na
empresa, contudo, o trabalhador representante poderá
continuar a ter acesso às instalações para a sua função sindical –
arts. 308.º e 410.º/5.
▪ Presunção de despedimento sem justa causa: será este regime dos
representantes um regime probatório privilegiado? (artigo 342º do CC).
▪ Quando o trabalhador reage e intenta uma ação para pôr em
causa o despedimento, nos termos do art. 342º CC, cabe ao
empregador provar que o despedimento tem justa causa.
▪ Por isto, o Dr. Leal amado aponta para o facto a ideia de se
presumir o despedimento sem justa causa no caso de um
representante ser uma tutela não especial – justamente porque,
em princípio, qualquer trabalhador comum teria também esta
tutela.
▪ Quer isto dizer que, segundo o Dr. Leal Amado, este regime
probatório privilegiado acaba por não ser privilegiado porque
ele é, de acordo com as regras gerais, aquele que já valeria para
os trabalhadores comuns.

Meios de reação contra o despedimento:

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Providência cautelar de suspensão do despedimento facilitada (artigo


386.º do CT):
▪ Os representantes dos trabalhadores têm uma providência
cautelar de suspensão do despedimento facilitada porque, nos
termos do art. 410º/4 CT, na dúvida, o juiz vai decidir
favoravelmente à suspensão – o que não acontece com o
trabalhador comum, em que o juiz só opta pela suspensão se
tiver ficado efetivamente convencido de que não havia justa
causa para despedir.
▪ Ou seja, com o art. 410.º/4 CT, vemos que a suspensão do
despedimento é facilitada para estes trabalhadores, na
medida em que o tribunal só vai recusar a suspensão do
despedimento se concluir que existe uma probabilidade
séria de se verificar a justa causa que se alega.
▪ Impugnação do despedimento acelerada?
▪ Ademais, estas ações são, nos termos do art. 410º/5 CT,
apreciadas de forma célere. Será este um regime especial dos
representantes?
▪ A ação de impugnação de ilicitude do despedimento de um
trabalhador comum também é uma ação com caráter urgente, tal
como a ação de impugnação de ilicitude de um despedimento
coletivo de um trabalhador comum. Portanto, esta tutela é,
atualmente, quase nula.
▪ Portanto: o art. 410.º/5 CT é uma garantia cujo sentido útil
é algo contestável, pois todas as ações que visem a
licitude/ilicitude do despedimento têm natureza urgente
(o CPT diz-nos isto).
▪ Ação especial de apreciação da regularidade e licitude do
despedimento?
▪ Efeitos do despedimento por justa causa declarado ilícito:
▪ Indemnização de antiguidade majorada:
▪ Indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais;
direito ao pagamento dos salários intercalares; direito à
reintegração ou, em alternativa, a uma indemnização de
antiguidade.
▪ O critério de cálculo desta indemnização é mais benéfico
para o trabalhador representante do que para o
trabalhador comum (art. 410.º/6 CT).
▪ Uma vez declarada a ilicitude do despedimento, o
trabalhador terá direito a uma indemnização – essa
indemnização vai variar entre 30 e 60 dias – uma
indemnização majorada, superior à prevista para os
trabalhadores que não sejam representantes (15 a
40 dias?).
▪ Faculdade de oposição patronal à reintegração?

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Será que o empregador tem a faculdade de se opor à


reintegração?
▪ Quando estamos perante um trabalhador
representante a oposição à reintegração não vai ser
possível – a lei não diz isto diretamente.
▪ Quando há possibilidade de oposição à
reintegração a indemnização (ver art. 392.º) a
indemnização é de 30 a 60 dias (para trabalhadores
normais).
▪ Para os representantes, a lei não prevê um aumento
da indemnização no caso de oposição à
reintegração – como não está prevista uma
indemnização superior nestes casos o que
concluímos é que essa oposição não é possível.

Outras estruturas de representação coletiva dos trabalhadores


1. Conselhos de Empresa Europeus:
▪ Estruturas representativas dos trabalhadores que se encontrem ao
serviço de empresas ou grupos de empresas de dimensão comunitária:
▪ Critério da presença da empresa em 2 ou mais EM;
▪ Critério do nº de trabalhadores global: 1000; e do número
mínimo de trabalhadores: 150;
▪ E que tem como objetivo essencial assegurar a informação e a consulta
dos trabalhadores:
▪ (Dir. 94/45/CE, de 22-9 >Dir. 2009/38/ CE, de 6-5 > L 96/2009,
de 3-9)

2. Conselhos de trabalhadores:
▪ Estrutura representativa de trabalhadores que estejam ao serviço de
empresas sob a forma de sociedade anónima europeia, sociedade
cooperativa europeia (ou grupos) ou ainda de sociedade de
responsabilidade limitada resultante de fusão transfronteiriça, e que
têm como objetivo assegurar a informação e consulta dos
trabalhadores, bem como a participação dos trabalhadores no órgão
de administração ou de fiscalização da sociedade:
▪ Dir. 2001/86/CE, de 8-10; Dir. 2003/72/CE, de 22-7;
Dir.2005/56/CE, de 26-10; DL 215/2005, de 13-12; L 8/2008, de
18-2; L 19/2009, 12-5.

3. Representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde:

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Forma de representação institucional autónoma dos trabalhadores na


empresa em matéria da segurança e saúde, constituída com base em
listas apresentadas por associações sindicais ou subscritas por uma %
mínima de trabalhadores, e que tem em vista a tutela dos interesses dos
trabalhadores relacionados com a segurança e saúde no trabalho – Dir.
89/391/CEE, de 12-6; L 102/2009, de 10-9.
▪ Carácter facultativo (na falta > comissões de trabalhadores)
▪ Tutela idêntica àquela aplicável aos outros representantes (arts.
405.º a 414.º do CT)

ASSOCIAÇÕES DE EMPREGADORES
Associações de empregadores são:
▪ Pessoas coletivas;
▪ De direito privado;
▪ De natureza associativa;
▪ Com vocação duradoura;
▪ Composta por empregadores:
▪ Pessoas singulares ou coletivas de direito privado que sejam
titulares de uma empresa e que tenham habitualmente ao seu
serviço trabalhadores subordinados;
▪ Artigo 444º/4 CT;
▪ Que tem por fim a defesa e promoção dos interesses coletivos dos
empregadores:
▪ Interesses dos empregadores vs. interesses dos empresários:
▪ Não são interesses enquanto empresários, mas sim enquanto
empregadores – cfr. artigo 440º/2.

Tipologia (critério do nível de organização) - artigos 440º/4 e 441º/2:


▪ Associação de empregadores em sentido estrito;
▪ Federação de empregadores;
▪ Uniões de empregadores;
▪ Confederação de empregadores.

Constituição, organização e funcionamento


▪ Princípio da liberdade de constituição (artigo 440º/2);
▪ Aquisição da personalidade jurídica com o registo dos estatutos junto
do MT, sem controlo administrativo direto da legalidade (artigo 447º/1)
controlo judicial da legalidade a posteriori pelo MP (artigo 447º/5);
▪ Princípios da autonomia e independência (artigo 446º);
▪ Princípio da auto-organização- elaboração dos estatutos; limites (artigo
450º, 452º);

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Princípio da gestão democrática na organização e funcionamento-


eleição dos corpos sociais (artigo 451º).

Direitos:
▪ Direito de celebrar convenções coletivas de trabalho (embora não se
trate de um direito exclusivo);
▪ Direito de prestar serviços de caracter económico e social aos
associados (contudo, artigo 443º/3);
▪ Direito de participar na elaboração da legislação laboral;
▪ Direito de iniciar e intervir em processos judiciais ou administrativos
relativos a matérias do interesse dos seus associados;
▪ Direito de estabelecer relações ou de se filiar em organizações de
empregadores a nível nacional e internacional.
Paridade total entre associativismo sindical e associativismo patronal?
“liberdade sindical unilateral” ou “liberdade sindical bilateral?”
▪ Regime constitucional: omissão de qualquer referência na CRP ao
associativismo patronal;
▪ Regime infraconstitucional: disciplina legal paralela à das associações
sindicais (artigo 440º e ss); reconhecimento das especificidades das
associações de empregadores em relação ao regime geral das
associações em termos paralelos ao que sucede para as associações
sindicais (artigo 441º).

NEGOCIAÇÃO COLETIVA

Negociação Coletiva (em sentido amplo):


▪ Negociação/acordo;
▪ Realizada por sujeitos laborais;
▪ Todo o tipo de negociações entre os sujeitos laborais – i.e.,
estruturas de representação coletiva de trabalhadores e
estruturas de representação coletiva de empregadores.
▪ Com vista a estabelecer uma disciplina para as condições de trabalho
ou para as relações que giram em torno destas condições.

Tipos de negociação coletiva


Num sentido mais restrito, podemos falar de vários tipos de negociação
coletiva.
A. Negociação coletiva tripartida;
B. Negociação coletiva bilateral.

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A. Negociação coletiva tripartida


▪ Tipo de negociação particular realizada entre o Governo, as
confederações sindicais e as confederações patronais, sobre
matérias atinentes à política laboral e cujo produto são geralmente
acordos políticos, os chamados acordos de concertação social.
▪ Ou seja:
▪ É uma negociação tripartida pois, em função do número de
sujeitos, envolve 3 partes.
▪ Trata-se de um diálogo social constituído por membros do
governo, membros representantes de trabalhadores e membros
representantes das entidades patronais.
▪ É estabelecido o diálogo social entre estes 3 sujeitos com o
objetivo de criar plataformas de consenso mínimo quando o
governo pretende realizar reformas a nível laboral.
▪ É do interesse do governo que haja o mínimo de
consenso, uma vez que se o governo apresentar algo de
forma praticamente unilateral, pode dar aso a protestos,
etc., e as propostas acabam por não ser verdadeiramente
e corretamente implementadas.
▪ Isto não quer dizer que o decreto-lei vá ser exatamente o
que se definiu na negociação, mas há aspetos que se
discutem que têm de ser cumpridos.
▪ Artigo 65.º/3/d) e 92.º da CRP;
▪ Artigo 471.º do CT.

B. Negociação coletiva bilateral


▪ Tipo de negociação realizada entre estruturas representativas de
trabalhadores e empregadores, expressão do diálogo social direto
entre os parceiros sociais (diálogo direito entre as estruturas – não há
intervenção do governo).
▪ Negociação coletiva típica
▪ Negociação coletiva atípica

Negociação coletiva típica:


▪ Reconhecida na CRP: artigo 56.º da CRP – direito de contratação
coletiva;
▪ Titulares do direito:
▪ É um direito reconhecido na CRP aos trabalhadores (os
trabalhadores são os titulares do direito) – exercem esse direito
através das associações sindicais (o exercício do direito compete-
lhes).
▪ Sujeitos:
▪ As associações sindicais, do lado dos trabalhadores;

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▪ Os empregadores e associações de empregadores, do lado


patronal.
▪ Procedimento: está legalmente previsto.
▪ Produto final: Convenção Coletiva de Trabalho.

Negociação coletiva atípica:


▪ Negociação tendente à celebração de um acordo sobre condições de
trabalho de um determinado universo de trabalhadores, celebrado no
âmbito de uma empresa de modo relativamente informal, e
diretamente outorgado pelo empregador e os trabalhadores,
representados por uma comissão ad hoc ou pela comissão de
trabalhadores, mas posteriormente aceite pelos trabalhadores.
▪ Ou seja, após estas negociações, os trabalhadores têm de aceitar
posteriormente as disposições. Contrariamente, na convenção
coletiva, os trabalhadores afetados não têm que se pronunciar
sobre ela, uma vez que as associações sindicais representam os
trabalhadores, e o facto de estarem filiados é suficiente para que
sejam afetados por este.
▪ Ex: acordos da Autoeuropa:
▪ Por vezes, grupos de trabalhadores ou estruturas que não as
associações sindicais (p.e., comissões de trabalhadores), chegam
a acordo com os empregadores sobre as condições de trabalho.
▪ Muitos dos acordos celebrados coletivamente nesta fábrica são
acordos celebrados entre a comissão de trabalhadores e a
AutoEuropa.
▪ Estes acordos são negociação coletiva, mas não é típica (a típica
é a que consta da lei).

CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO


Noção de Convenção Coletiva:
▪ Acordo escrito;
▪ Celebrado entre instituições patronais (empregadores ou as suas
associações), por um lado, e por outro, associações representativas
dos trabalhadores;
▪ Com o objetivo principal de fixar as condições de trabalho que hão de
vigorar para as categorias abrangidas (salários, carreira profissional,
férias, duração de trabalho, etc.).
A CCT é uma fonte própria e exclusiva do direito do trabalho. Traduz num
modo específico a produção de normas jurídico-laborais.
É expressão fundamental da autonomia coletiva que permite a
autorregulamentação de grupos contrapostos.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

Insere-se num grupo mais vasto – os IRCT – art. 2.º do CT.

Natureza dos IRCT

Negocial – instrumentos que resultam da autonomia das partes:

▪ Convenção Coletiva de Trabalho;


▪ Acordos de adesão;
▪ Decisões proferidas em processo de arbitragem voluntário.

Não negocial – instrumentos em que de alguma forma releva autoridade pública –


há a intervenção de uma autoridade publica em algum momento:

▪ Portarias de extensão;
▪ Portarias para as condições de trabalho;
▪ Decisões proferidas em processos de arbitragem necessária/obrigatória.

Modalidade de convenção coletiva de trabalho:


(A competência para a celebração de convenções coletivas, no lado dos
trabalhadores, pertence às associações sindicais – art. 56.º/3 da CRP).

1. Critério da parte patronal celebrante (artigo 2.º/3 do CT)


▪ Contratos coletivos – convenção coletiva entre uma associação
sindical (de trabalhadores) e por uma associação de
empregadores.
▪ Acordos coletivos – convenção coletiva entre uma associação
sindical e uma pluralidade de empregadores para diferentes
empresas.
▪ Acordos de empresa – convenção coletiva entre uma associação
sindical e um empregador para uma empresa ou
estabelecimento.

▪ A distinção por este critério é importante para efeitos de


concorrência entre os instrumentos (art. 482.º/1 CT):
▪ O acordo de empresa afasta a aplicação do acordo
coletivo ou do contrato coletivo;
▪ O acordo coletivo afasta a aplicação do contrato coletivo.

2. Critério do âmbito geográfico


▪ Âmbito nacional
▪ Âmbito regional
▪ Âmbito local

3. Critério da unidade de negociação (âmbito material/subjetivo)

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Verticais ou de ramo de atividade – regulam um determinado


setor ou ramo de atividade, ficando abarcadas dentro desse setor
várias profissões;
▪ Horizontais ou de profissão – regulam uma determinada
profissão, ficando abarcados dentro dessa profissão vários ramos
de atividade.

▪ A distinção por este critério é importante para efeitos de


concorrência entre os instrumentos (art. 481.º CT):
▪ O instrumento de regulamentação coletiva de trabalho
negocial de um sector de atividade afasta a aplicação de
instrumento da mesma natureza cujo âmbito se define por
profissão ou profissões relativamente àquele sector de
atividade – i.e., prevalência do vertical.
▪ Atenção, para fazer uso deste artigo, temos de estar
perante instrumentos da mesma natureza.

Contratação coletiva vs. Concertação social


Contratação coletiva Concertação social
Mecanismo bilateral Mecanismo tripartido
Todo o tipo de associações sindicais Confederações
e patronais
Acordos normativos Acordos políticos

Acordos políticos:
▪ Estes acordos de concertação social não têm a força para se aplicarem
diretamente aos trabalhadores e aos empregadores.
▪ São acordos políticos que, de alguma forma, condicionam as decisões
e os atos legislativos que vão ser adotados pelo Governo, sendo o
substrato para a adoção de normas futuras. Não são, em si, normas, mas
depois podem dar origem a normas.
▪ O governo apenas fica vinculado politicamente ao compromisso – mas
não tem de reproduzir exatamente o que consta nele.
Acordos normativos:
▪ Resultam da contratação coletiva. O que resulta da negociação vai
vincular os sujeitos a partir daí, os sujeitos abrangidos pela negociação
(trabalhadores e empregadores) ficam vinculados.

Contratação coletiva vs. Negociação coletiva atípica/informal


▪ Problema da sua admissibilidade: falta de base normativa

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ O direito de contratação coletiva está previsto na CRP e no CT;


▪ Contudo, a negociação atípica não está prevista em lado algum –
não está consagrada na lei (falta de base normativa).
▪ Art. 405.º CC? Há quem entenda que este artigo poderia
legitimar, em última instância, a negociação coletiva atípica,
constituindo a sua base normativa.

▪ Problema da produção dos efeitos na esfera dos trabalhadores da


empresa:
▪ No caso da contratação coletiva:
▪ A lei estabelece que as convenções coletivas vinculam os
trabalhadores que estão filiados no sindicato que celebrou a
convenção e os empregadores que estão filiados na associação
de empregadores que celebrou a convenção.
▪ Como é que estas convenções vinculam um trabalhador que não
participou diretamente nelas? – coloca-se este problema.
▪ O CT responde que a filiação na associação sindical é o elo
que vai legitimar a associações sindicais a celebrar
convenções e que se produzam os efeitos delas nos
filiados das mesmas.
▪ A filiação no sindicato é um ato voluntário, sendo que é
este ato de filiação que vai fazer com que o trabalhador se
vincule a tudo o que for produzido por esse sindicato.

O REGIME JURÍDICO DA CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO


Material normativo relevante
▪ Artigo 56.º da CRP: o direito de contratação coletiva como direito
fundamental dos trabalhadores;
▪ Artigos 485.º a 503.º do CT.

Os sujeitos
Competência e legitimidade para celebrar convenções coletivas:
▪ Do lado dos trabalhadores:
▪ Associações sindicais (artigo 56.º/3 da CRP);
▪ Possibilidade de delegação de uma associação sindical noutra
associação sindical;
▪ Possibilidade de atribuição de poderes negociais à comissão de
trabalhadores (artigo 491.º/3).
▪ Não se confunde com negociação coletiva informal – aqui
é a própria associação sindical, que tem competência, que
vai delegar esse poder na comissão de trabalhadores (a lei

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

exige que seja apenas nas empresas com pelo menos 15º
trabalhadores).
▪ Do lado dos empregadores:
▪ Associações de empregadores.

▪ Ausência de critérios seletivos de representatividade e o problema da


fragmentação da atividade negocial.
▪ No nosso país, não há regras de representatividade – qualquer
associação sindical pode decidir que quer celebrar uma
convenção – não necessita de ter uma certa dimensão, não
precisa de ter uma determinada representatividade no tecido
social.
▪ O facto de qualquer uma associação ter a capacidade para
negociar leva a uma fragmentação – divide-se pelas várias
associações esse poder de negociação.

O processo de formação
1. Fase da proposta – modalidades, forma escrita, fundamentada,
menções obrigatórias, reptícia (artigo 486.º).
▪ Pode tratar-se de uma proposta de celebração de uma
convenção coletiva de trabalho ou de uma proposta de uma
revisão de uma convenção coletiva de trabalho já existente.
▪ Esta proposta tem de obedecer à forma escrita e ser bem
fundamentada, tendo de referir algumas menções obrigatórias
que estão previstas e tendo de ser recetícia.

2. Fase de resposta – modalidades, obrigatória, forma escrita,


fundamentada, menções obrigatórias, prazo legal (artigo 487.º).
▪ Esta ideia da fase de resposta significa que, a não ser que haja
circunstâncias muito excecionais (p.e., se a proposta não contiver
os elementos obrigatórios), há um dever de responder à
proposta (e não de aceitá-la) para ambas as modalidades.
▪ A resposta é obrigatória e deve obedecer à forma escrita e ser
fundamentada, tendo de conter as menções obrigatórias e de
cumprir o prazo legal.

3. Fase de negociação em sentido estrito – deixada ao critério das partes


da negociação informada, participada e tecnicamente assistida,
princípio da boa-fé (artigo 489.º do CT).
▪ Há lugar a contactos diretos entre os representantes das partes.
O modo como se procede às negociações é totalmente deixado
ao critério das partes.
▪ A única coisa que a lei estabelece como padrão parte destas
negociações é o princípio da boa-fé.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

4. Fase de celebração – forma escrita, assinatura dos representantes,


menções obrigatórias (artigo 491.º e 492.º do CT).
▪ Do período de negociações pode não resultar uma convenção
coletiva de trabalho, sendo que são possíveis dois desfechos: ou
a celebração termina sem sucesso e não há lugar a nenhuma
convenção coletiva de trabalho ou se celebra um acordo que,
para assumir a qualidade de convenção coletiva de trabalho, tem
de ser reduzido a forma escrita, com a assinatura dos
representantes e as devidas menções obrigatórias.

5. Fase de depósito – receção e registo da CTT pelo MT, decisão


administrativa de deferimento ou recusa assente num controlo
essencialmente formal e sujeita a prazo legal (artigo 494.º)
▪ O controlo feito pelo Ministério do Trabalho é, então, meramente
administrativo, verificando apenas se a convenção cumpre
requisitos mínimos – não se trata de um controlo de mérito ou de
legalidade.

6. Fase da publicação:
▪ Publicação oficial no BTE, assegurada pelo MT, e entrada em
vigor nos mesmos termos da lei (sujeição aos prazos de vacatio
legis) - artigo 519.º;
▪ Publicação a nível interno/a nível da empresa para efeitos de dar
cumprimento do dever de informação do empregador - artigo
480.º.

O conteúdo da convenção coletiva de trabalho (relação com a lei)


▪ Qual o papel da lei nesta questão? A lei condiciona negativa e
positivamente o conteúdo da convenção?
▪ Quem fica vinculado pelo conteúdo da convenção?

Limites negativos
▪ A lei estabelece matérias que são excluídas de regulamentação coletiva,
▪ Exemplo: artigo 478º/1 b) e c) do CT

▪ Normas legais que assumem natureza absoluta ou relativamente


imperativa:
▪ A lei pode condicionar negativamente, ainda, quando as normas
legais têm uma natureza absolutamente ou relativamente
imperativa em relação à convenção – significa que as normas não
podem ser afastadas pela convenção ou podem ser, mas apenas
se se estabelecer uma clausula com conteúdo mais favorável ao
trabalhador, respetivamente.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Exemplos:
▪ Artigo 236º do CT (feriados)
▪ Artigo 339º do CT (cessação do contrato de trabalho)
▪ Artigo 250º do CT (motivos e duração das faltas)
▪ Artigo 238º (duração das férias)

Dúvidas:
→ Pode a lei conferir natureza absolutamente imperativa a qualquer norma
legal do CT ou há uma reserva de convenção coletiva de trabalho?
▪ Direito de contratação coletiva (artigo 56º da CRP)
▪ Compreende:
▪ Direito à liberdade negocial coletiva
▪ Direito a autonomia coletiva - alcance desta autonomia?
▪ Esta questão contende com a ideia de até que ponto a CRP reconhece
o direito de contratação coletiva? Se existe este direito, pode o
legislador ordinário conferir natureza imperativa a todas as suas
normas?
▪ Se pudesse estaria a esvaziar o espaço de manobra para a
convenção coletiva poder atuar.
▪ Então, será que do direito de contratação coletiva se extrai a ideia de
que há um espaço natural na convenção coletiva que o legislador não
pode abafar?
▪ Do direito à contratação coletiva decorre um direito à autonomia
coletiva.
▪ Se o reconhecemos, reconhecemos que não pode ser totalmente
esmagado o direito à autonomia na matéria de convenções
coletivas de trabalho.
▪ Há um conjunto de matérias que a lei tem de entender que são típicas
das convenções coletivas, e que só devem ser tocadas se houver um
importante interesse público justificativo.

→ Em caso de dúvida, como deverá o interprete classificar uma norma legal?


Como absolutamente imperativa? Como relativamente imperativa? Ou
dispositiva?
▪ Artigo 3º/1 do CT
Critérios a utilizar pelo intérprete para apurar a natureza de uma norma legal:
▪ Pode suceder qua a própria norma, expressamente, revele a sua
natureza, contendo elementos literais que a traduzam;
▪ Pode também ocorrer que não seja a própria norma que contenha
elementos reveladores da respetiva natureza, resultando esta de um

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

preceito anexo (por exemplo, localizado no início ou no final de uma


secção ou capítulo)
▪ Inexistindo qualquer elemento que revele expressamente, claramente,
que a norma é absoluta ou relativamente imperativa, ou dispositiva
temos de verificar se a matéria consta da lista prevista no artigo 3.º/3 do
CT.
▪ Se não estiver nessa lista, o art. 3º/1 do CT fixa que a norma legal deve
considerar-se dispositiva.

Confronto entre o artigo 3.º/1 do CT e o artigo 476.º do CT


O estatuto de um trabalhador pode ter elementos resultantes do acordo das
partes, das convenções coletivas e da lei.
▪ Artigo 3.º/1 do CT- as normas legais podem ser afastadas por CCT em
sentido mais ao menos favorável ao trabalhador, salvo quando delas
resultar o contrário (i.e, se as normas forem absolutamente imperativas).
▪ Artigo 476.º do CT- as clausulas de uma convenção coletiva de trabalho
só podem ser afastadas pelo contrato individual de trabalho quando
este estabelecer condições mais favoráveis para o trabalhador.

Limites positivos
▪ Conteúdo obrigatório
▪ É um conteúdo formal – não interfere propriamente com o que é
o essencial da convenção.
▪ São aspetos que a CC deve conter quando é elaborada (estes
elementos não são condição de validade).
▪ Artigo 492º/1 do CT.
▪ Conteúdo recomendado
▪ Artigo 492º/2 e 3 do CT
▪ Conteúdo facultativo
▪ Artigo 492º/4 do CT

Conteúdo da convenção e os sujeitos


Analisamos, agora, o conteúdo consoante os sujeitos a que se dirige a
convenção coletiva.
▪ Cláusulas obrigacionais: respeitantes às relações entre as partes
outorgantes (artigo 492.º/2/a)) – no fundo, estão a disciplinar as relações
entre as associações sindicais e de empregadores enquanto partes que
celebraram a convenção – i.e., definem os direitos e deveres entre estas
partes outorgantes.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ São aquelas que de certo modo regulam a própria convenção –


p.e., prazo de vigência, serviços mínimos em caso de greve,
regras quanto à interpretação da convenção, eventual resolução
de conflitos que possam surgir, etc. Ou seja, regras de
relacionamento entre as instituições patronais e as associações
sindicais outorgantes.
▪ Exemplos de clausulas obrigacionais típicas:
▪ Cláusulas de paz social (artigo 542.º);
▪ Cláusulas sobre serviços mínimos (artigo 492.º);
▪ Cláusulas sobre a resolução de conflitos decorrentes da
aplicação ou revisão da convenção (artigo 492.º/2/a)).

▪ Cláusulas normativas: respeitantes aos direitos e deveres dos


trabalhadores e empregadores abrangidos pela convenção – i.e., são
aquelas que se destinam a fixar as condições/regras a que têm de
obedecer os contratos de trabalho entre trabalhadores e
empregadores que são abrangidos pela convenção.
▪ São aquelas que projetam a sua eficácia para os contratos de
trabalho. Cumprem a principal função das CCT, i.e., regular as
condições de trabalho. Ou seja, teremos matérias relacionadas
com categorias profissionais, retribuição, segurança e saúde no
trabalho, descanso, férias, etc.
▪ Os sujeitos destinatários destas cláusulas normativas já não são o
sindicato e a associação patronal enquanto parte celebrante, mas
sim os trabalhadores ou empregadores que celebram contratos
de trabalho e que são vinculados por esta convenção coletiva de
trabalho.
▪ Exemplo de clausulas normativas:
▪ Artigo 492.º/2/e) do CT.
▪ Este é o conteúdo que associamos tipicamente à convenção
coletiva.
▪ O conteúdo maioritário e típico das convenções coletivas
de trabalho é composto por cláusulas normativas.
▪ Tem um efeito de uniformizar e disciplinar relações de trabalho.

Regras sobre a interpretação/integração do conteúdo da convenção


A convenção tem uma estrutura híbrida – corpo de contrato e alma de lei – é
contrato e lei ao mesmo tempo.
Por esta hibridez, podem surgir dúvidas na interpretação.
▪ Conflitos jurídicos ou de direito: litígios entre as partes celebrantes da
convenção a respeito do alcance/sentido de uma determinada cláusula
e/ou a respeito de um aspeto omisso/não previsto.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Problemas:
▪ Qual o modelo de interpretação a adotar?
▪ Quem resolve o conflito?

Qual o modelo de interpretação?


▪ A lei não resolve este problema. Na falta de um critério, pensa-se em
modelos possíveis.

▪ Nas posições monistas, temos dois modelos possíveis:


▪ A interpretação é feita de acordo com as regras da interpretação
da lei (artigo 9.º do CC):
▪ Há quem entenda que, por ser sobretudo uma lei, se deve
utilizar para interpretar o litígio, as regras que se usam para
interpretar as leis.
▪ Quem entende que a convenção tem esta feição
principalmente de lei, defende que se irá utilizar o modelo
de interpretação utilizado para as leis constante do art. 9.º
CC.
▪ A interpretação é feita segundo as regras civis gerais de
interpretação do negócio jurídico (artigo 236.º do CC):
▪ Quem entende que é sobretudo um contrato, considera
que o que se usa para resolver o conflito é o modelo de
interpretação dos negócios jurídicos – arts. 236.º e ss do
CC.

▪ Há, ainda, posições dualistas:


▪ Há quem entenda que a convenção coletiva tem dois conteúdos:
um conteúdo normativo e um conteúdo obrigacional.
▪ O conteúdo obrigacional – aquele que diz respeito aos
direitos e deveres das partes celebrantes da convenção –
deve seguir as regras de interpretação do negócio
jurídico.
▪ O conteúdo normativo deve seguir as regras de
interpretação da lei.

Quem resolve o litígio?


▪ Neste caso, o código precaveu-se.
▪ Pelo art. 492.º - a própria convenção deve ter a preocupação de definir
que caso surjam conflitos esses devem ser resolvidos por uma
comissão paritária (artigo 492.º/3 e artigo 493.º do CT).
▪ Trata-se, no fundo, de uma instância que vai ter competência
para interpretar e integrar as lacunas da convenção.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Esta comissão estará prevista e regulada na própria convenção coletiva


ou pode ser constituída ad hoc.
▪ Ou seja, não tiver havido essa precaução e não se tiver definido
na convenção essa comissão paritária, cria-se uma comissão ad
hoc, no momento em que o conflito se está a desenrolar.
▪ Estão fixadas três regras para o seu funcionamento:
▪ A comissão tem de ter uma composição paritária, ou seja, deve
integrar um número igual de representantes das entidades
celebrantes da parte dos trabalhadores e das entidades
celebrantes da parte dos empregadores.
▪ Para que uma deliberação seja válida, tem de haver um quórum
mínimo, ou seja, metade dos representantes de cada parte tem
de estar presente para a resolução dos conflitos.
▪ As deliberações têm de ser adotadas por unanimidade.

▪ Paralelamente a esta comissão paritária, a outra forma que existe para


resolver conflitos jurídicos é um meio judicial: a ação especial de
interpretação de cláusulas de convenções coletivas (artigo 183.º do
CPT).

Regras sobre a eficácia da convenção


1. Eficácia pessoal: regras que definem o âmbito subjetivo da parte
normativa da convenção;
2. Eficácia temporal: regras que definem o âmbito temporal da
convenção.

1. Regras sobre a eficácia pessoal


▪ Regras para determinar que trabalhadores/empregadores estão
abrangidos pela parte normativa, i.e., quem são os que ficam
vinculados.

Modelos jurídicos possíveis


▪ Regra da eficácia erga omnes/absoluta: regra da aplicação a todas as
entidades empregadoras e a todos os trabalhadores incluídos no
âmbito geográfico e material da convenção.
▪ Regra da eficácia limitada/relativa: regra da aplicação às entidades
empregadoras que subscreverem a convenção ou às entidades que
estão inscritas na associação de empregadores que subscreveu a
convenção e aos trabalhadores ao serviço desses empregadores que
estejam filiados nos sindicatos subscritores.
▪ Ou seja, para que se aplique ao trabalhador é necessário:
▪ Esteja filiado no sindicato que celebrou a convenção;

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Esteja ao serviço de uma entidade empregadora que


também tenha ela celebrado a convenção ou seja membro
de uma entidade empregadora que celebrou a
convenção.

Modelo jurídico português


▪ Adota-se a regra da eficácia limitada: princípio da dupla filiação –
artigo 496º/1/2.

N.º 1: Para efeitos da nossa lei, para o trabalhador ser abrangido, tem de ser
membro da associação sindical e tem de estar ao serviço do empregador
que celebrou a convenção.
▪ “A convenção coletiva obriga o empregador que a subscreve ou filiado em
associação de empregadores celebrante, bem como os trabalhadores ao seu
serviço que sejam membros de associação sindical celebrante.”

N.º 2: Quando não foi o sindicato que realizou a CCT, mas for uma união ou
confederação, o trabalhador é abrangido se o seu sindicato for membro
dessa união/confederação.
▪ “A convenção celebrada por união, federação ou confederação obriga os
empregadores e os trabalhadores filiados, respetivamente, em associações de
empregadores ou sindicatos representados por aquela organização quando
celebre em nome próprio, nos termos dos respetivos estatutos, ou em
conformidade com os mandatos a que se refere o n.º 2 do artigo 491.º”

P.e., um trabalhador da empresa A é membro do sindicato X. O sindicato X


celebra uma CCT com a empresa B. O trabalhador não é afetado, pois não está
ao serviço do empregador da empresa que celebrou a convenção (B).
▪ É necessária a dupla representação!

Será esta regra uma imposição constitucional ao legislador?


▪ Não. No art. 56º/4 CRP, o legislador constitucional apenas remete para
a lei a competência para fixar as regras, não impondo nenhuma regra
quanto ao tipo de eficácia que deve valer em matéria de eficácia
pessoal.
▪ Ou seja – a opção do legislador ordinário: a CRP não exigia que o
legislador ordinário seguisse um ou outro critério. O legislador nacional
remeteu para o legislador ordinário decidir sobre o critério mais
adequado.

Aspetos disfuncionais:
▪ Há problemas resultantes desta regra da eficácia limitada.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Desde logo, sendo a filiação uma condição para a aplicação da


convenção, a entrada e saída de trabalhadores enquanto membros da
associação sindical pode prejudicar a estabilidade do regime jurídico –
leva a uma instabilidade do regime jurídico.
▪ Esta regra, acrescendo à situação de que muitas vezes os trabalhadores
não estão inscritos em sindicatos ou estão filiados em diferentes
sindicatos, leva a que o empregador tenha de aplicar regras de
condições de trabalho diferentes para os vários trabalhadores – leva a
uma fragmentação.
▪ Pelo contrário, a regra da eficácia erga omnes não levantaria esse
problema – iria aplicar-se a todos independentemente da sua filiação ou
não num determinado sindicato.

Os desvios ao princípio da filiação


▪ O legislador laboral tem consciência de algumas destas insuficiências e
tem criado alguns mecanismos de atenuação destes aspetos
disfuncionais.
▪ Tem criado um mecanismo para mitigar os efeitos nocivos das
flutuações da filiação, i.e., a perda da qualidade de associado no
decurso do processo negocial e a desfiliação após a conclusão do
processo negocial.
▪ Artigo 496.º/3/4:
▪ Este artigo acaba por ter um elemento para dar alguma
estabilidade ao âmbito pessoal da convenção.
▪ Define:
▪ O momento de conexão relevante é o do início do
processo negocial (apresentação da proposta);
▪ Manutenção da vinculação até ao termo de vigência da
convenção ou, no mínimo, durante 1 ano:
▪ A desfiliação não produz a imediata cessação da
aplicação da convenção, ou seja, mesmo que se
desfiliem, durante um certo período, a convenção
ainda se vai aplicar.
▪ Filiação pós eficaz – art. 496.º/4 – a desinscrição não tem por efeito que
a CCT se deixe de aplicar.

Formas de extensão do conteúdo originário da convenção


▪ Formas voluntárias
▪ Unilaterais
▪ Pós filiação
▪ Adesão individual
▪ Bilaterais
▪ Acordos de adesão

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Formas não voluntárias


▪ Legais
▪ Transmissão
▪ Administrativas
▪ Portaria de extensão

Formas voluntárias
A vontade dos trabalhadores/empregadores releva para alargar o
conteúdo/âmbito pessoal da convenção.

Unilaterais

Pós filiação
▪ Aplicação da convenção coletiva a trabalhadores e a empregadores
que não eram filiados na associação sindical ou patronal outorgante,
mas que se filiam durante a vigência da CCT - artigo 496.º/3;
Adesão individual
▪ Aplicação da convenção coletiva a trabalhador não sindicalizado por
escolha do próprio/adesão individual de trabalhador não sindicalizado
– artigo 497.º;
▪ Ou seja, trata-se de uma situação em que se permite trabalhadores que
não fazem parte de nenhuma associação sindical possam, por vontade
deles, exercer o direito de escolher que lhes seja aplicável uma
determinada convenção.
▪ Não carece do acordo do empregador;
▪ Forma de adesão: não carece de forma escrita;
▪ Requisito material: a convenção escolhida tem de ser uma
convenção cujo âmbito material esteja abrangido pelo
trabalhador;
▪ Por exemplo, um eletricista não pode escolher uma
convenção com âmbito material abrangido por
contabilistas.
▪ Requisito geográfico: a convenção escolhida tem de ser uma
convenção cujo âmbito geográfico esteja abrangido pelo
trabalhador;
▪ Requisito temporal: art. 497.º/2.
▪ Requisito quantitativo: o trabalhador só pode usar esta faculdade
uma vez com o mesmo empregador – art. 497.º/5.
▪ Compensação monetária;
▪ (Des)conformidade constitucional? (o Acórdão do TC 338/2010)

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Liberdade sindical/autonomia coletiva: a autonomia


coletiva assenta na liberdade sindical – desincentivo à
filiação:
▪ Será que isto conflitua com a liberdade sindical e
com a autonomia coletiva?
▪ Parece que sim pois estamos a promover um
mecanismo que, de alguma forma, desincentiva à
filiação sindical – qual a necessidade de se
sindicalizar se uma das vantagens que poderia
retirar de lá, posso usufruir dela na mesma sem ter
de me inscrever?
▪ Contudo, não podemos dizer que há um conflito
assim tão direto – o legislador não está a obrigar
ninguém a inscrever-se ou não se inscrever. Mas
está a permitir uma grande vantagem sem estar
inscrito.
▪ Identidade de razão/igualdade de condições de trabalho:
▪ TC entendeu que o valor de dar igualdade de
condições de trabalho iguais a todos era um valor
superior e que devia prevalecer.
▪ A Dra. Joana acha que este fator não fere a
liberdade da filiação, mas não concorda na
postulação da ideia de igualdade. A Dra. refere que
há uma razão objetiva para um tratamento
diferenciado, já que aquilo que o princípio de
igualdade postula é que não haja uma igualdade
arbitrária.

Bilaterais
Acordos de adesão
▪ Aplicação da convenção coletiva a trabalhadores/empregadores, por
efeito do acordo de adesão – de um acordo superveniente entre uma
das partes da convenção e um sindicato, uma associação de
empregadores ou um empregador isolado que não tenha outorgado a
convenção inicialmente e deseja por ela abrangido - artigo 504.º:
▪ Ou seja, um sujeito que não participou no processo de elaboração vem
agora, a posteriori, aderir a essa mesma convenção, tendo como
interlocutor aquele sujeito que estaria caso ele tivesse participado na
elaboração inicialmente.
▪ Elementos desta extensão voluntária bilateral:
▪ Convenção coletiva tem de estar em vigor;
▪ Aceitação incondicionada – não há possibilidade de fazer
alterações à convenção;
▪ Forma escrita – art. 504.º;

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▪ Publicação e depósito – publicação no Boletim do Trabalho e do


Emprego (mesmos termos das convenções).

Formas não voluntárias


Estas formas não dependem da vontade dos próprios trabalhadores.

Legais
▪ Aplicação da convenção coletiva a empregador que não a outorgou,
por efeito da transmissão da empresa ou de estabelecimento - artigo
498.º;
▪ Corolário do fenómeno da sub-rogação legal inerente à operação de
transmissão da empresa:
▪ Na transmissão de empresa, o transmitente deixava de vigorar
como empregador, e o transmissário passava a ser o novo
empregador. Essa solução era criada para que o trabalhador não
sofresse alterações negativas face à situação.
▪ Quando há transmissão, não só a posição de empregador se
transmite, como o adquirente do estabelecimento passa a estar
vinculado pelo conteúdo de uma convenção que não outorgou,
mas que tinha sido outorgada pelo proprietário original do
estabelecimento.
▪ Quando deixa de se aplicar ao novo empregador?
▪ Em caso de transmissão, o instrumento de regulamentação
coletiva de trabalho que vincula o transmitente é aplicável ao
adquirente até ao termo do respetivo prazo de vigência ou no
mínimo durante 12 meses a contar da transmissão, salvo se,
entretanto, outro instrumento de regulamentação coletiva de
trabalho negocial passar a aplicar-se ao adquirente.
▪ Hipótese de pós-eficácia de alguns efeitos da convenção a partir do
momento em que ela se torna ineficaz perante o novo empregador.

Administrativas
▪ Aplicação da convenção a empregadores e trabalhadores inicialmente
não abrangidos, através de portaria de extensão: artigo 514º a 516º;
▪ Razões (uniformização; colmatar a falta de CCT)
▪ Requisitos materiais (circunstâncias económicas e sociais)
▪ Requisitos procedimentais (iniciativa competência; possibilidade
de oposição; emissão; publicação)
▪ Âmbito de aplicação subjetivo
▪ (Des)conformidade constitucional

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

Jurisprudencial
▪ Aplicação da convenção coletiva a trabalhadores não filiados em
matéria retributiva, caso a retribuição prevista em convenção seja mais
favorável do que a prevista no contrato individual de trabalho;
▪ Fundamento da extensão: princípio constitucional “trabalho igual,
salário igual” - artigo 59º/1/a) da CRP.

2. Regras sobre a eficácia temporal

Início da vigência (art. 519.º/1):


▪ A convenção entra em vigor após a sua publicação oficial no BTE, nos
mesmos termos da lei (nos mesmos termos em que as leis entram, i.e.,
respeitando o período de vacatio legis – art. 5.º do CC).
▪ Ou seja:
▪ Ou as partes fixam uma data de início de vigência (tendo
esta de ser sempre posterior à publicação);
▪ Ou a convenção entra em vigor no 5.º dia após a sua
publicação.

Prazo de vigência:
Duas situações possíveis:
▪ Prazo convencional – art. 499.º/1:
▪ Liberdade contratual das partes na fixação do prazo que
entenderem, sem limites mínimos e máximos (salvo, limite
indireto previsto no art. 487.º/2):
▪ Ou seja, as partes têm liberdade para fixarem o prazo que
entenderem, sem limites, exceto a exceção do artigo.
▪ Liberdade contratual das partes para fixarem prazos diferentes
para diferentes blocos ou partes da convenção:
▪ Isto é, é até referido um mecanismo que permite que, a
cada parte da convenção ou em cada matéria diferente
que nela conste, seja atribuído um prazo diferente.
▪ Prazo legal supletivo – 1 ano - art. 499.º/2.
▪ No caso de as partes não fixarem prazo de vigência, o CT
estabelece um prazo de 1 ano.

Renovação:
▪ As partes podem, ou não, prever a renovação das convenções e regular
os termos em que esta ocorre.

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É possível falar de três possíveis cenários de prorrogação após o prazo


definido:
1. Previsão de renovação e previsão dos termos em que a renovação
decorre:
▪ A situação que está prevista expressamente na lei é a de as partes
preverem a vontade de renovar e regularem os termos dessa
renovação – artigo 499.º/1 CT.
▪ Ou seja, as partes fixam o prazo inicial, definem ainda que esse
se irá renovar e explicitam os termos em que a renovação é feita.
2. Previsão de renovação e não previsão dos termos da renovação:
▪ As partes preveem que a convenção se irá renovar, mas não
explicitam os termos dessa renovação.
▪ Para esta situação a lei não dá diretamente uma solução.
▪ Parece existir uma solução no art. 499.º/2, contudo, este
artigo não constitui uma solução direta a este problema –
o artigo está previsto para aplicar-se nos casos em que as
partes não preveem sequer a renovação da convenção.
▪ Portanto, aqui a solução está de certo modo em aberto.
▪ De um ponto de vista, se as partes manifestam vontade de
renovar, mas omitem o regime da renovação, a solução pensa-se
que terá de passar por uma de duas vias:
▪ Ou se aplica à renovação o prazo previsto para a vigência
inicial;
▪ P.e., se o prazo inicial de vigência estabelecido para
a convenção fosse de 2 anos, renovar-se-ia também
a convenção por mais 2 anos.
▪ Esta parece a solução que se aproxima mais ao que
terá sido a vontade das partes. É a solução que, no
ponto de vista da Dra. Joana, faz mais sentido.
▪ Ou se renova pelo prazo supletivo de 1 ano que está
estabelecido no artigo 499.º/2 CT – renovação anual.
▪ Este prazo de 1 ano está, portanto, previsto para
uma situação que não é propriamente esta, mas
que tem contornos próximos.

3. Previsão de caducidade automática no final do prazo inicialmente


estipulado (exclusão da renovação)?
▪ Será possível estabelecer apenas o prazo inicial de vigência e
definir que a convenção não será renovada (i.e., excluir a
hipótese de renovação)?
▪ Esta é uma situação controversa e para a qual a lei não dá uma
resposta concreta. Há argumentos a favor e argumentos contra
esta tese.
▪ Para perceber estas visões é necessário o estudo da cessação das
convenções.
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▪ Sabemos que, se as partes fizerem ago deste género


(prever que não se renovará) a consequência será que a
convenção cessa por caducidade. Ou seja, admitir esta
hipótese será admitir que uma convenção pode cessar
automaticamente por caducidade, porque as partes
excluíram a renovação.
▪ Há autores, p.e., Bernardo Gomes Xavier, que entendem
que isto é possível – entendem que está na autonomia
coletiva das partes fixar se querem ou não renovar; fixar a
não renovação e o efeito da caducidade automática da
convenção. Não proibido a lei tal situação e, ao abrigo da
autonomia coletiva, as partes podem fixar este sentido.
▪ Já outros autores entendem que, apesar de a lei não
proibir que as partes excluam a renovação, há elementos
quer na lei quer na lógica da convenção que vão contra
uma solução desse género. Argumentos invocados – do
artigo 501.º CT, estes autores extraem que o legislador
pretendia que as convenções nunca pudessem cessar por
um mero esgotamento de um prazo, i.e., teria de haver
sempre um comportamento de uma das partes que
demonstrasse a intenção de lhe pôr fim (denúncia). Ora,
se assim o é, então as partes não devem poder fixar logo
no início soluções deste género.

REGRAS SOBRE A CESSAÇÃO DA CONVENÇÃO


Formas de cessação (art. 502.º/1):
A. Caducidade;
B. Revogação.

A. Caducidade
▪ A caducidade é uma forma de cessação ope legis (opera por força da
lei), que liga determinado decurso do prazo com determinados factos
determinados pela lei.
▪ Ou seja, nos termos da lei, para haja caducidade de uma
convenção tem de estar associado o decurso do prazo, mas
também de um dos factos seguintes:
▪ Factos de que depende (art. 502.º/1 b)):
▪ Denúncia da convenção por alguma das partes;
▪ Extinção de associação sindical ou associação de empregadores
outorgantes.

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1. Caducidade por denúncia


▪ A caducidade por denúncia é despoletada por um ato de denúncia de
uma das partes outorgantes da convenção.
▪ Através da denúncia, uma das partes comunica à outra a intenção de
fazer cessar a vigência da convenção, decorrido qualquer que seja o
prazo de vigência ou o prazo de renovação de convenção que já tenha
sido renovada.
▪ Aqui a denúncia tanto poderá advir do lado do trabalhador
(associação sindical) como da entidade empregadora ou
associação de empregadores outorgante daquela convenção
coletiva, ao contrário do que vimos para o contrato de trabalho.
▪ A denúncia vai traduzir uma declaração de vontade com vista à
substituição ou caducidade da convenção coletiva, no entanto, não vai
produzir efeitos extintivos imediatos.

Requisitos da denúncia (art. 500.º do CT)


▪ Forma escrita – a denúncia, enquanto manifestação de vontade, tem de
revestir forma escrita;
▪ Fundamentada – têm de ser explicitados os motivos que estão na base
da denúncia;
▪ Construtiva – não se pode simplesmente comunicar que não se quer
mais a aplicação de determinada convenção (i.e., a denúncia não se
basta com a declaração de vontade) – tenho que acompanhar essa
comunicação com uma proposta negocial global.
▪ Proposta negocial global – trata-se de uma proposta alternativa de
uma nova convenção (art. 500º/4 CT).
▪ A proposta negocial é elaborada nos termos do art. 486.º CT.
▪ Deverá incluir-se os motivos de ordem económica ou estrutural
ou desajustamentos do regime da convenção denunciada que
determinam aquela denúncia (n.º 2) – ou seja, quais os
fundamentos que conduzem aquela denúncia.
▪ Quem promove a denúncia deve remeter cópia da mesma ao
serviço competente do ministério responsável pela área laboral,
juntando a proposta negocial global (n.º 3) – ou seja,
comunicação à contraparte e ao ministério responsável pela área
laboral.

Ou seja, a denúncia inicia-se mediante comunicação escrita à outra parte,


acompanhada de proposta negocial global. Portanto, a denúncia surge como
um ato construtivo, justamente por ser acompanhada de proposta. Isto traduz-
se, basicamente, numa preferência pela substituição da convenção e não
simplesmente a sua caducidade.

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Ainda é de ter em conta que não vale como denúncia, ou seja, não tem efeitos
extintivos, a mera proposta de revisão da convenção coletiva.
▪ Note-se que a denúncia não é a mesma coisa que a revisão de
convenção coletiva:
▪ Quando se inicia a revisão, a parte interessada diz às restantes quais as
cláusulas que quer rever e por que motivos. Se, no final deste processo,
estas cláusulas não se modificarem, a convenção coletiva mantém os
seus efeitos plenamente. Ou seja, a revisão não tem o efeito extintivo
que a denúncia poderá ter.
▪ Por sua vez, na denúncia, não é isso que acontece. A convenção é
denunciada, entra num processo de negociações de ajustamentos e, se
essas negociações tiverem sucesso, então, ela é substituída. Se não se
conseguir chegar a um entendimento, essa convenção coletiva acaba
por caducar.

Efeitos da denúncia (art. 501.º/3/4/5/6 do CT):


▪ Efetuada a denúncia, acompanhada da proposta negocial global, a
convenção coletiva não se vai extinguir automaticamente.
▪ A CCT continua a produzir efeitos até ao final do prazo que tinha sido
estabelecido ou até ao prazo de renovação e, a partir daí, a convenção
entra no período de sobrevigência – período durante o qual vão
decorrer negociações.
▪ Ou seja, a denúncia não vai extinguir a convenção de imediato –
vai fazer com que a CCT produza os seus efeitos normalmente
até ao final do prazo e a partir desse momento entra-se no
período de sobrevigência.
Sobrevigência
O que é?
▪ É um período de tempo considerado razoável durante o qual a vigência
da convenção é como que prolongada pela lei para que as partes,
através de negociação, possam chegar a acordo sobre uma nova CCT.

Como se processa?
▪ Para esse período de negociação, a lei define limites mínimos (12
meses) e limites máximos (18 meses) – art. 501.º/3/5 CT.
▪ Ou seja, no mínimo, durante 12 meses a convenção objeto de
denúncia continuará em vigor.
▪ Neste período, as partes irão tentar alcançar um acordo com vista
à substituição da CCT para que esta continue a vigorar, e não
para que caduque simplesmente.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Sempre que no período de 12 meses se verifique uma causa de


interrupção das negociações previstas no art. 501.º/4 – seja a
conciliação, a mediação, ou a arbitragem voluntária – e essas
interrupções se prolonguem por mais de 30 dias, a contagem
desse período mínimo suspende-se.
▪ Contudo, o período de sobrevigência na sua totalidade, já com
os meses em que esteve suspenso, não pode durar mais de 18
meses.
▪ Então, as causas de suspensão (p.e., a mediação ou a submissão
a arbitragem) suspendem a contagem do prazo mínimo, mas não
suspende, a contagem do prazo máximo.

▪ Contudo, há uma causa de suspensão do período de sobrevigência que


suspende a contagem do prazo mínimo e do prazo máximo.
▪ Por força da lei 93/2019 – foi introduzida uma nova norma – artigo
501.º-A – veio introduzir a suspensão do período de
sobrevigência por força de uma decisão arbitral – ou seja, o
período de sobrevigência pode ir além dos 18 meses sempre
que as partes se submetam à arbitragem do art. 501.º-A.
▪ Isto é, sempre que o tribunal concluir que existe uma
probabilidade séria de as partes chegarem a acordo, então, o
tribunal arbitral vai suspender o período de sobrevigência, e essa
suspensão não vai contar para o prazo de 18 meses.
▪ Portanto, sempre que a suspensão seja decidida nos termos do
art. 501.º- A, durante este tempo não se contam nem os limites
mínimos nem os limites máximos.

▪ Ao final deste tempo, a convenção pode caducar.


▪ Contudo, decorridos esses 12 ou 18 meses, mesmo pretendendo as
partes a caducidade da CCT, esta não caduca imediatamente.
▪ A convenção mantém-se em vigor durante 45 dias após comunicação
de uma das partes ao Ministério do Trabalho e à outra parte da rutura
das negociações.
▪ Estes dias não têm em vista a negociação, mas sim estabelecer os
efeitos e as condições/termos da caducidade da convenção (art.
501.º/7).

▪ Depois do período de 45 dias, dá-se a caducidade da convenção e esta


deixa de produzir os seus efeitos.
▪ No entanto, nem todos estes efeitos vão desaparecer imediatamente.
▪ A convenção extingue-se juridicamente, mas, enquanto aqueles
contratos de trabalho não forem abrangidos por uma nova convenção,
há determinadas matérias que ficam conservadas.
▪ Isto acontece relativamente a matérias elencadas no art. 501.º/8 CT,
nomeadamente:

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▪ Retribuição;
▪ Categoria da respetiva definição;
▪ Duração do tempo e trabalho;
▪ Regimes de proteção social.
▪ Vemos, então, que o nosso legislador dá preferência à solução de
substituição da convenção.

Portanto, os desfechos possíveis:


▪ As partes podem chegar a acordo quanto à revisão da convenção → há
revisão da convenção.
▪ As partes podem não chegar a acordo (falta de acordo) → a parte
descontente comunica ao MT e à outra parte da rutura das negociações
→ período de 45 dias → caducidade da convenção.

Regime jurídico até 2003:


Regime de sobrevigência potencialmente ilimitada
▪ Neste regime, tínhamos uma situação em que as partes podiam
denunciar a CCT e, uma vez denunciada, a convenção entrava num
período de sobrevigência, que só deixava de vigorar essa
sobrevigência quando a CCT fosse substituída por outra.
▪ A CCT só caducava quando fosse substituída por uma nova,
quando as partes chegassem a acordo sobre uma nova CCT.
▪ Este era um regime em que não havia um perigo de falta de
regulamentação.
▪ Encara-se como preocupante o facto de uma CCT caducar e isso
poder significar que a disciplina laboral aplicável a um conjunto
de trabalhadores deixar de existir pura e simplesmente.
▪ Então, o regime jurídico até 2003 salvaguardava integralmente
esse problema.
▪ Contudo, não obstante, este regime era também alvo de críticas:
▪ Entendia-se que, se uma das partes já manifestou a sua
insatisfação pela convenção e se já não se revê na disciplina
daquela convenção, tem o direito de poder dispor, de forma
livre, da regulamentação dos seus interesses – estar-se-ia a
ofender a autonomia coletiva, a autodeterminação.
▪ Além disso, referiam o facto de estas convenções se tornarem
obsoletas e de difícil revisão – acabariam por durar muitos anos,
o que causava essa falta de dinamismo nas CCT.

Regime jurídico a partir de 2003 e que (com ligeiras alterações) se mantém


atualmente:

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Regime de sobrevigência limitada


▪ Com este regime, já acontece que as convenções caduquem mais.
▪ Há a denúncia e findo o período de sobrevigência, mesmo que não haja
nova convenção, a convenção caduca.
▪ Este período de sobrevigência não é potencialmente ilimitado, porque
a lei estabelece prazos de duração mínima e de duração máxima.

Aspetos problemáticos:
▪ Deste modo, acontece que a partir de 2003 começaram a caducar
muitas convenções:
▪ Aqui surgiu um problema – muitas das convenções que
caducaram não foram seguidas de nenhuma nova (por exemplo,
porque uma das partes, nomeadamente, muitos empregadores
recusaram-se a celebrar outras).
▪ Isto levou a que em muitos setores tenha deixado de existir
suporte convencional a regular as relações laborais.
▪ Portanto, o regime antes de 2003 tinha os seus defeitos, contudo, este
novo regime, ao potenciar a caducidade (porque não eram celebradas
novas convenções), e ocorrendo situações de crise, veio eliminar o
dinamismo da contratação coletiva.

▪ Conformidade com a CRP – consideraram que este regime previsto


podia atentar contra o direito de contratação coletiva – pois, ao
promover estes regimes extintivos baseados na vontade de uma das
partes ativar a caducidade da convenção, estaria a restringir este direito
fundamental (e tal só deve ser feitos em situações excecionais e
obedecendo a um princípio da proporcionalidade).
▪ Acórdãos do TC 306/2003 e 338/2010 – aquela questão foi apreciada
pelo TC, que entendeu que a norma não era inconstitucional.
▪ Para defender que não ofendia a CRP, fundou-se em dois
argumentos:
▪ A circunstância de a caducidade estar associada a uma
denúncia da convenção;
▪ O facto de a denúncia da convenção também ser
expressão da autonomia coletiva.
▪ Entendia que o regime era também compatível com a CPR pois:
▪ A denúncia não gera a caducidade da convenção, gera a
sobrevigência.
▪ Mesmo quando a convenção caduca, a lei impõe que até
à vigência de uma nova convenção haja um conjunto de
efeitos que se mantêm.

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2. Caducidade por extinção da associação sindical ou associação de


empregadores outorgante
▪ Âmbito (art. 502.º/1/b) ii)
▪ No fundo, está presente a ideia de que, quando uma das partes
outorgantes se extingue, a convenção tem de caducar.
▪ Resulta da própria extinção da associação sindical ou
associação de empregadores outorgantes da convenção.
▪ Ou seja, a lei prevê que a pessoa coletiva se possa
extinguir, sendo que a extinção da associação leva à
caducidade da convenção coletiva.
▪ Claro que esta lógica só pode funcionar se se extinguir
uma parte fundamental para a manutenção da convenção.
Se estivermos, p.e., perante um acordo coletivo, se se
extinguir apenas um só empregador, continua a haver
várias outros, pelo que não caduca.

▪ Exceções (art. 502.º/7):


▪ Deliberação de extinção da associação de empregadores
adotada com o objetivo de, por essa via, obter a caducidade da
convenção coletiva de trabalho;
▪ Extinção voluntária ou perda da qualidade de união, federação
ou confederação sindical ou de empregadores outorgantes,
promovida de forma voluntária com o objetivo de, por essa via,
obter a caducidade da convenção.
▪ Estas hipóteses não são permitidas, i.e., o que não pode acontecer é a
pessoa coletiva extinguir-se tendo em vista somente a caducidade da
convenção.
▪ Precisamente para obstar a esta fraude à lei, o art. 502.º/7 estabelece
um procedimento de controlo à fraude à lei.
▪ Nestas hipóteses, a extinção da associação é nula e não produz efeitos,
pelo que não se dá a caducidade da convenção – quis-se salvaguardar
as hipóteses em que a extinção da associação tenha sido promovida
com o objetivo fraudulento de fazer caducar a convenção.
▪ Assim, embora o art. 502.º/1/b)/ii) estabeleça que a extinção da
associação leva à caducidade da convenção, esta extinção da pessoa
coletiva é controlada pelo procedimento previsto no art. 502.º/7.

Efeitos da caducidade:
▪ Efeito principal: extinção da convenção coletiva (art. 502.º/1/b) –
quando se dá a caducidade, a convenção deixa de produzir efeitos.
▪ Sobrevivência de alguns efeitos (para combater o vazio de
regulamentação convencional, alguns dos efeitos da convenção que
caduca mantêm-se, até entrar em vigor uma outra CCT):

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▪ Efeitos delimitados a priori na própria convenção coletiva – art.


501.º/7, 1.ª parte;
▪ Efeitos delimitados através de acordo ad hoc entre as partes,
promovido pelo MT, dentro de prazo legal – art. 501.º/7, 2.ª parte;
▪ Efeitos delimitados ex lege supletivamente – art. 501.º/8.
▪ Com isto, o legislador assegura uma certa estabilidade no núcleo
essencial do estatuto coletivo, que não se vai perder até à entrada em
vigor da nova convenção.
▪ No entanto, esta nova convenção pode nem existir, devido ao perigo
deste regime após 2003 (pode haver convenções que caducam e não
haver novas negociações para reerguer aqueles estatutos
convencionais – origina-se um vazio de regulamentação convencional).

B. Revogação
A revogação é a forma de cessação de vigência da convenção coletiva em que
as partes, por acordo, decidem pôr termo a uma convenção coletiva de
trabalho.
▪ Modalidades:
▪ Revogação simples:
▪ Pura e simplesmente há um acordo extintivo simples e,
aqui, a convenção cessa a sua vigência sem mais.
▪ Revogação + substituição por nova CCT (sucessão de CCT):
▪ Num hiato temporal seguido, as partes fazem cessar uma
convenção e fazem-na logo acompanhar por uma nova
convenção.

▪ Procedimento (art. 502.º/4):


▪ Depósito;
▪ Publicação no Boletim de Trabalho.

▪ Efeitos (art. 502.º/5):


▪ “A suspensão e a revogação prejudicam os direitos decorrentes da convenção,
salvo se na mesma forem expressamente ressalvados pelas partes.”
▪ Se houver revogação simples tudo deixa de fazer efeitos, a não
ser que as partes salvaguardem alguma das matérias
estabelecidas pela lei,

SUCESSÃO DE CONVENÇÕES COLETIVAS DE TRABALHO (CCT 1 e CCT2)


– art. 503.º
▪ O que é?

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▪ Dá-se quando a revogação de uma convenção se dá logo


acompanhada de uma substituição da convenção revogada por
uma nova convenção.
▪ Ou seja, um acordo revogatório da CCT1 é acompanhado
pela celebração da CCT2
▪ É diferente de concurso/concorrência entre CCT (arts. 481.º e ss.)

Como se resolve?
▪ A convenção 2 revoga a convenção 1.
Contudo, surge o problema do retrocesso social:
▪ Pode a CCT 2 alterar os regimes convencionais previstos na CCT 1, em
sentido menos favorável ao trabalhador?
▪ Ou vigora um princípio do tratamento mais favorável?
▪ E caso vigore um princípio do tratamento mais favorável, em que termos
se conclui pela maior ou menor favorabilidade de um texto
convencional?

Modelos possíveis:
▪ Teoria do cúmulo: só se aplica o que for mais favorável ao trabalhador
e, para avaliar isso, compara-se, cláusula a cláusula, as cláusulas das
duas convenções e faz-se prevalecer o que for melhor das duas delas.
Tudo o que for melhor, numa ou noutra convenção, prevalece.
▪ Teoria da conglobação: procura avaliar o caráter mais favorável de
uma convenção não comparando isoladamente cada cláusula de ambas
as convenções, mas apreciando-as na globalidade, prevalecendo e
permanecendo aquela que, no seu conjunto, se revelar globalmente
mais útil e favorável para os trabalhadores.
▪ Modelo escolhido pelo legislador português: art. 503.º/3 – a CCT2
prevalece sobre a CCT1, mesmo reduzindo direitos da anterior, desde
que no texto da CCT2 se reconheça expressamente o seu carácter
globalmente mais favorável.
▪ Então, pode haver recuos, desde que, na nova convenção, as
partes deixem expresso que, apesar de certos retrocessos, ela é
globalmente mais favorável do que a primeira.
▪ Portanto, nem se aplica a teoria do cúmulo nem a teoria da
conglobação.
▪ É uma situação sui generis.

FUNÇÕES DA CONVENÇÃO COLETIVA

Tradicionais:

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▪ Melhoramento das condições de trabalho – o objetivo da convenção


seria melhorar as condições de trabalho dos trabalhadores.
▪ Função em crise? (art. 3.º/1/3 do CT)
▪ Questiona-se se esta função estará em crise atualmente devido a
certos elementos no nosso ordenamento jurídico, que tornam
esta função menos evidente.
▪ Por exemplo, o facto de não nos regermos pelo princípio do
tratamento mais favorável, mas sim pelo princípio da
dispositividade (em que as normas se assumem como convénio-
dispositivas).
▪ Deste modo, o que temos será uma ideia de flexibilização das
condições de trabalho na relação entre a convenção e a lei.

▪ Instrumento de uniformização das condições de trabalho – o objetivo é


que haja uma certa uniformidade dos regimes de trabalho aplicáveis a
um grande número de trabalhadores.
▪ Princípio da filiação (art. 496.º) e os seus desvios – este princípio
coloca em causa a uniformização (pois só se aplica àqueles
previstos no artigo). Contudo, há desvios que possibilitam uma
maior uniformização (p.e., portarias de extensão, escolha da
convenção coletiva aplicável). Mas, de qualquer modo, a solução
génese do nosso ordenamento jurídico não permite
imediatamente essa uniformização.

Novas:
▪ Função de flexibilização
▪ Relação entre a lei e a CCT (art. 3.º/1 do CT) – quando este refere
que, por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho,
podem ser afastadas as normas legais reguladoras de contrato
de trabalho, salvo quando delas resultar o contrário.

▪ Função de instrumento de gestão da empresa


▪ A convenção pode ser um instrumento para o empregador
introduzir formas mais flexíveis de organização do trabalho na
empresa, sendo que isso é muito visto nos regimes de –
adaptabilidade e banco de horas (arts. 204.º e ss.).

▪ Função de aplicação de imperativo legal


▪ Muitas vezes, a lei impõe uma regra ou um princípio, mas, depois,
delega na convenção a responsabilidade para definir as
modalidades concretas da respetiva aplicação. Isso verifica-se,
p.e., no trabalho intermitente e banco de horas.

▪ Função de salvaguarda de interesses públicos

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▪ Greve e fixação de serviços mínimos (art. 538.º/1) – a associação


sindical que decreta a greve tem de salvaguardar que há serviços
mínimos a serem respeitados.

NATUREZA JURÍDICA DA CONVENÇÃO COLETIVA


Quanto à natureza da convenção, existe três teorias:
▪ Teorias contratualistas – aproximam a convenção coletiva de um
contrato;
▪ Teorias normativistas – aproximam a convenção coletiva de uma lei;
▪ Teorias ecléticas.

O que nos interessa, realmente, nesta matéria, é saber se uma convenção, no


nosso ordenamento jurídico, se aproxima mais de um contrato ou de uma lei,
sendo que, para isso, há que analisar os corpos legislativos do nosso
ordenamento. Nesta medida, há que analisar os subsídios do nosso
ordenamento jurídico positivo.

Subsídios do nosso ordenamento jurídico positivo:


1. Constituição da República Portuguesa
▪ Art. 56.º/4 – “a lei estabelece as regras respeitantes à eficácia das
normas da convenção coletiva” – a lei estabelece que as convenções
têm a eficácia que a lei determinar, e não a que não a vontade das partes
quiser.
▪ Percebe-se, então, que a convenção tem uma faceta normativa como
uma lei. Se fosse um puro contrato, seriam as partes a ter esse
monopólio.
▪ O TC aceita as disposições das CCT como normas para efeitos de
fiscalização da constitucionalidade (Ac. TC 174/2008).

2. Código do Trabalho
▪ Objeto de publicação oficial – o facto de a convenção ser objeto de
publicação oficial no BTE aproxima mais a convenção de um ato
normativo do que de um contrato, uma vez que os contratos não são
publicados.
▪ Regime jurídico da caducidade – remete também para uma natureza
normativa.
▪ Reconhecimento como fontes de direito.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

CONFLITOS COLETIVOS DE TRABALHO

→ Os sujeitos laborais não só têm uma tendência para se associarem


coletivamente, como também têm uma tendência para divergirem. Por sua
vez, exteriorizam essas divergências e, quando não encontram solução para as
mesmas, acaba por estourar um conflito.

Formas de exteriorização do conflito:


▪ Manifestações públicas: petição, ação de protesto, etc.;
▪ Recurso ao tribunal;
▪ Recurso a conciliação, mediação, arbitragem;
▪ Greve;
▪ Instrumento de última ratio do processo conflitual?
▪ Será que os sujeitos laborais só usam a greve como
medida de última instância? Quando nada mais é
possível?
▪ Há países em que, legalmente, os trabalhadores só podem
recorrer à greve depois de recorrerem a outros meios mais
pacíficos – aqui trata-se de um meio de última ratio.
▪ Entre nós, isso não acontece – não há nenhuma obrigação
de os sujeitos utilizarem outras formas de resolução de
conflito antes de usarem esta mais “agressiva”.
▪ Apesar disso, na prática, os trabalhadores só recorrem à
greve depois de usarem outros modos mais pacíficos.
▪ Contudo, juridicamente, a lei não impõe que a greve seja
um instrumento de última ratio.

Um conflito coletivo de trabalho é, portanto:


▪ Situação social;
▪ Exteriorização de pretensões divergentes;
▪ Sujeitos laborais;
▪ Com vista a alterar a situação existente ou impedir a alteração unilateral
dessa situação.
É ainda:
▪ Fenómeno dinâmico;
▪ Fenómeno multifacetado;
▪ Causas
▪ Sujeitos
▪ Formas de exteriorização

▪ Portanto:
▪ O conflito evoluiu muito ao longo do tempo.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Trata-se de um fenómeno multifacetado e dinâmico que não tem


as mesmas características do que no séc. XIX – não tem os
mesmos sujeitos, as mesmas causas, nem as mesmas formas de
exteriorização.

A ordem jurídica perante os meios de luta (greve)


Enquadramento jurídico do fenómeno:
▪ Não só o conflito evoluiu muito ao longo do tempo, como também a
greve em si, enquanto instituto para o direito, também evoluiu.
▪ Enquanto fenómeno jurídico a greve começou, no final do séc. XIX, por
ser um delito (inclusivamente passível de pena de prisão).
▪ A greve, não só era um incumprimento contratual, como era passível de
sanção por parte do empregador, sendo também um crime.
Evolução:
▪ Século XIX: greve-delito – a greve era considerada um crime. Ou seja,
a greve era ilícita tanto do ponto de vista contratual, como penal.
▪ 1910 - 1926: greve-liberdade – a greve deixou de ser crime – não era
ainda um direito propriamente dito, mas era algo que o ordenamento
jurídico já não punia. Era uma faculdade dada aos sujeitos (de forma
muito precoce e restritiva), sendo muito limitada por parte da lei.
▪ 1926 - 1974: greve-delito – com o Estado Novo, nesse contexto, a
greve voltou a ser proibida e punida, uma vez que ia contra o que o
estado corporativista pretendia.
▪ 1972 - até ao presente: greve-direito – atualmente a greve é
reconhecida como um direito dos trabalhadores.
▪ Este direito está constitucionalmente tutelado como direito
fundamental (DLG) - artigo 57.º/1 da CRP- “É garantido o direito
à greve”.

Rejeição do princípio da paridade de armas:


▪ A nossa CRP rejeita o princípio da paridade de armas: os trabalhadores
e empregadores não tem as mesmas armas para manifestarem as suas
divergências.
▪ O ordenamento jurídico português adota posições muito diferentes em
face dos meios de luta dos trabalhadores e dos empregadores.
▪ Greve: direito fundamental (artigo 57.º/1 da CRP) – reconhece
este direito aos trabalhadores.
▪ Lock-out:
▪ Trata-se de um homónimo dos empregadores
relativamente à greve (em que estes, p.e., fechariam a
empresa, etc.);

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Há uma proibição constitucional (artigo 57.º/4 da CRP) e


legal (artigo 544.º/2 do CT) deste meio.
▪ Isto acontece uma vez que a nossa Constituição reconhece direitos
fundamentais aos trabalhadores, no pressuposto de que há
desigualdade entre trabalhadores e empregadores. Deste modo, para
compensar essa desigualdade, são reconhecidos direitos à parte em
desvantagem (trabalhadores). A greve é um desses modos de
compensação.

Da greve de sociedade industrial à greve na atualidade:


Novos desafios/novas dificuldades:
▪ Enquanto forma de protesto (ato de os trabalhadores quererem
reivindicar algo) há aspetos, hoje em dia, que tornam esse fenómeno
coletivo mais dificultado.
Portanto, para ser um fenómeno eficaz, a greve tem outras dificuldades
atualmente:
▪ A empresa e os fenómenos de deslocalização/terciarização;
▪ O empregador e os fenómenos de crescimento de multinacionais,
empresas em rede, em grupo;
▪ O processo produtivo e os fenómenos de individualização;
▪ A estabilidade no emprego e os fenómenos de precarização do
emprego.

NOÇÃO JURÍDICA DE GREVE


▪ Ausência de uma noção legal:
▪ Nem a CRP nem o CT definem o que é a greve.
▪ Não fornecer uma definição legal de greve não foi desleixo – foi
intencional do legislador português.
▪ A ausência de definição de greve prende-se com o facto de
qualquer definição que fosse avançada para este direito seria
redutora e conduziria a uma limitação do direito, que não é
admissível.
▪ Ou seja, não se definiu, uma vez que se fossemos definir
legalmente o que era greve estaríamos a criar um modelo
que dita qual o tipo de fenómeno que seria considerado
greve. E, isso, significaria que estamos, de certo modo, a
limitar este direito.
▪ Essa falta de noção legal permite, ainda, que haja uma maior
tolerância/abertura em inserir os fenómenos na greve.
▪ Contudo, isto não significa que não conseguimos extrair uma
noção jurídica de greve no nosso ordenamento.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Ora, a doutrina a partir do regime jurídico da greve e das


características/regras estabelecidas, estabelece um conjunto de
elementos que integram a noção jurídica de greve.

▪ Elementos básicos da noção jurídica:

▪ Abstenção total e efetiva – recusa da prestação de trabalho


(elemento estrutural):
▪ Tem de haver uma recusa total e efetiva em prestar
trabalho – uma abstenção total de todos os elementos que
constituem a prestação de trabalho.
▪ Retiramos esta conclusão ao observar o regime jurídico da
greve:
▪ Quando os trabalhadores se inserem numa greve, o
seu contrato de trabalho fica suspenso. Só faz
sentido falar em suspensão do contrato de
trabalho se a greve consistir numa paralisação da
prestação. Ao dizer que numa greve o contrato de
trabalho fica suspenso, o legislador está a
considerar que o fenómeno que ele considera
greve implica uma abstenção da prestação de
trabalho.
▪ Outra questão relaciona-se com o facto de se
exigirem certos serviços mínimos mesmo quando
se está em greve. Ou seja, só se a greve for uma
abstenção da prestação de trabalho é que faz
sentido exigir em certos serviços mínimos em
áreas em que uma paralisação não pode ser total.

▪ Coletiva e concertada – carácter coletivo (elemento estrutural):


▪ Significa que só falaremos em greve quando a decisão de
levar a cabo esta abstenção de trabalho e o plano de como
essa será levada a cabo, for coletivamente declarado e
organizado.
▪ Portanto, os trabalhadores têm que abster-se da prestação
de trabalho em conjunto e concertados quanto aos fins
que visam prosseguir.
▪ Ou seja, a greve não é um protesto individual;
▪ Só é greve se for um protesto decidido coletivamente –
uma abstenção criada de forma coletiva e concertada.

▪ Trabalhadores subordinados – sujeitos de contratos individuais


de trabalho (elemento subjetivo):

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Esta questão coloca sempre dúvidas, na medida em que


se questiona se os trabalhadores economicamente
dependentes têm direito à greve.
▪ Entre nós, não é fácil sustentar esta ideia de gozo do
direito à greve para trabalhadores economicamente
dependentes, uma vez que o conceito clássico de greve se
refere a sujeitos de contratos individuais de trabalho.
▪ Há certas categorias de trabalhadores ou funcionários
titulares de cargos públicos que se podem discutir – é o
caso dos magistrados, que é uma categoria mais duvidosa.

▪ Com vista à tutela de interesses dos trabalhadores (elemento


intencional/finalístico):
▪ O objetivo da greve será o que os trabalhadores
envolvidos visam atingir/alcançar.
▪ É aos próprios trabalhadores que cabe a tarefa de definir
quais os interesses a defender através daquela declaração
de greve.

Delimitação dos fenómenos de luta que ficam cobertos (ou não) pelo
estatuto de greve

Atendendo ao elemento estrutural


A. “Comportamentos grevistas não abstensivos”
B. “Comportamento grevistas abstensivos/de maior prejuízo”
▪ São greves à luz do ordenamento jurídico português?
▪ E sendo classificadas como greve, são licitas?
▪ E sendo greves lícitas, devem ser tratadas como “greves
clássicas”?

A. Comportamentos grevistas não abstensivos (greves impróprias):


▪ Formas anómalas de prestação do trabalho: cumprimento da prestação
em moldes diferentes do contratualmente fixado.
▪ Greve de zelo:
▪ A tarefa correspondente à prestação laboral é exercida,
mas é feita de tal modo minucioso, detalhado, que se
acaba por provocar uma desorganização total do
processo produtivo.
▪ P.e., um grupo de trabalhadores, como forma de protesto
contra o empregador, realiza a sua atividade, mas de
forma minuciosa e zelosa tal, que o trabalho não fica
concluído.

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▪ Greve de rendimentos:
▪ Há uma diminuição do rendimento de trabalho e
consequente redução dos resultados. O trabalhador
executa a prestação de trabalho, mas baixa o seu
rendimento de trabalho e a sua produtividade, o que tem
como consequência a diminuição da propriedade da
própria empresa.
▪ P.e., um grupo de trabalhadores realiza a sua atividade,
mas de forma muito lenta, de modo a prejudicar o
rendimento da produção.
▪ Greve administrativa:
▪ P.e., um professor dá aulas, mas não realiza os exames ou
não lança as notas.
▪ Greve da mala:
▪ Característica do setor de transportes. Os transportes
continuam a circular, mas há abstenção da cobrança de
bilhetes.

▪ Todas estas situações (greve de zelo, greve de rendimento e greve


administrativa) não são consideradas greves para o nosso ordenamento
jurídico porque não são abstenções total da prestação de trabalho.
▪ Trata-se de um cumprimento defeituoso do contrato e, portanto, pode
ser alvo de processos disciplinar.
▪ Ou seja, nestas três situações supramencionadas, para efeitos da nossa
ordem jurídica, do ponto de vista estrutural, a doutrina tem entendido
que falta o tal primeiro elemento de abstenção total ou efetiva.

B. Comportamento grevistas abstensivos (greves de maior prejuízo):


“Greves” de maior prejuízo:
▪ A abstenção do trabalho é organizada através de paralisações
parceladas por forma a causar a mínima perda salarial possível aos
trabalhadores e ocasionar à entidade empregadora danos iguais ou
aproximados aos infringidos por uma greve contínua.
▪ Apenas as 4 greves a vermelho são greves de maior prejuízo.

1. Greve intermitente ≠ greve por períodos sucessivos:


▪ Greve intermitente: situações em que os trabalhadores
paralisam por períodos sucessivos e curtos, tornando
inaproveitável ou pouco rentável a sua disponibilidade nos
períodos intercalares. Param todos os trabalhadores ao
mesmo tempo e voltam a retomar ao mesmo tempo por
um certo período.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Greve por períodos sucessivos: o trabalhador pára,


depois retoma, depois pára e volta a retomar, etc. Mas,
quando retoma, consegue retomar o trabalho no
momento em que o parou.

2. Greve rotativa ≠ greve setorial


▪ Greve rotativa: Há uma paralisação de um grupo que
resulta na paralisação dos restantes porque é sequencial.
A paralisação de um setor vai comprometer a prestação
do outro e assim sucessivamente, gerando-se um ciclo de
improdutividade sequencial (i.e., são afetados mesmo os
setores que não adiram formalmente à greve).
▪ Greve setorial: as várias secções fazem greve em
períodos diferentes. A paralisação é total, mas não é
simultânea de todos os trabalhadores (é por secções). P.e.,
das 9h às 10h faz greve a secção A, das 10h às 11h faz
greve a secção B, etc. a paralisação de uma das secções
não interfere com as outras secções (a paralisação do setor
A não implica o setor B).

3. Greve trombose ≠ greve do setor-chave


▪ Greve trombose: tem-se a paralisação de um setor-chave
que provoca a paralisação dos restantes. Ao contrário da
greve rotativa, aqui, só pára um setor, mas ele é de tal
forma estratégico que, embora os outros setores estejam
disponíveis para trabalhar, aquele setor, parando, faz com
que o resto tenha de parar igualmente. É feito um conluio
entre os trabalhadores nesse sentido.
▪ Greve do setor-chave: Nem sempre uma greve de um
setor estratégico é uma greve trombose. Se não houver
conluio por parte de todos os trabalhadores, essa greve
vai ser apenas uma greve do setor-chave. Exemplo: greve
no setor da aviação aquando da greve dos pilotos – greve
da TAP de 2017.

4. Greve retroativa
▪ Greve retroativa: a prestação apresenta-se como uma
greve normal clássica, mas tem particularidade de ser
desencadeada num momento que torna inútil todo o
trabalho já prestado.
▪ P.e., greve dos trabalhadores do teatro (treinam
para a peça e no dia da peça não comparecem para
encenar) ou dos jogadores de futebol (treinam e no
dia do jogo não comparecem para jogar).

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

Relativamente a este tipo de greve, colocam-se as questões:


▪ São greves à luz do ordenamento jurídico português?
▪ É certo que são consideradas greves para a nossa ordem jurídica.
▪ Há a abstenção da prestação de trabalho.

▪ E sendo classificadas como greve, são lícitas?


▪ Nesta questão a doutrina diverge.
▪ Certos autores consideram que não são lícitas – consideram que
são ilícitas e abusivas, pois não existe proporcionalidade entre os
interesses prosseguidos e os prejuízos causados.
▪ Outros autores admitem que são lícitas – esta posição defende
que a desproporção não deve ser o fator para considerar se a
greve é lícita ou não, isto porque, não decorre da lei, da CRP,
qualquer limite ao prejuízo que uma greve possa causar (aliás, a
greve está prevista para causar dano). Como não decorre
nenhum limite, tal não pode ser fundamento para alegar a
ilicitude destas greves face ao prejuízo.

▪ E sendo greves lícitas, devem ser tratadas como “greves clássicas”?


▪ A posição mais dominante em relação a estes tipos de greve é a
sua aceitação enquanto greves; que não ofendem nenhum
preceito legal ao serem feitas daquele modo para serem
consideradas ilegais (logo são lícitas), mas defendem um regime
diferente no que toca à perda salarial do trabalhador.
▪ Os autores que entendem que elas preenchem os elementos da
noção de greve e que são lícitas, defendem que devem ser
tratadas de modo diferente em relação às greves clássicas, do
ponto de vista da perda salarial dos trabalhadores.
▪ Estas greves correspondem a greves próprias/clássicas –
se somarmos os períodos de paralisação de todos os
setores afetados, estas acabam por se tratar de greves
clássicas.
▪ Contudo, há aqui a questão de que a realidade se opõe ao
que é formalmente apresentado.
▪ Então, autores como a Dra. Maria do Rosário Palma Ramalho
entendem que, nestas greves em que se verifica um desequilíbrio
entre a perda do valor do salário dos trabalhadores e o valor dos
prejuízos causados ao empregador, o que deve acontecer é:
▪ O desconto no salário do trabalhador deve ser feito tendo
em conta o período de paralisação induzido (ou seja, não
só aquele em que eles efetivamente não estiveram a
trabalhar, mas aquele em que acabaram por não trabalhar
porque a prestação ficou comprometida).
▪ Ou seja, devemos analisar estas greves segundo um
princípio realista ou da substancialidade.

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▪ O desconto salarial deve incidir sobre o tempo real


de inatividade e não apenas sobre o tempo formal
que foi declarado.

▪ Nesta medida, a solução que adotamos é que estas greves são lícitas,
mas não são tratadas como se a perda salarial correspondesse apenas
ao período em que o trabalhador declarou formalmente que estava em
greve, incluindo-se também os que ele não estava formalmente em
greve, uma vez que, mesmo estando o trabalhador disponível para
prestar trabalho, a prestação já estava inutilizada pela paralisação
anterior.

O caso da “greve self-service” (médicos, 1998):


▪ Durante o período de greve fixado pelo sindicato não ocorreu uma
paralisação simultânea e contínua dos trabalhadores, sendo antes, os
trabalhadores que, individualmente, segundo o seu arbítrio, decidem
qual o dia ou os dias, compreendidos naquele período, em que faltarão
ao trabalho, invocando o direito à greve.
▪ Estaremos perante uma greve?
▪ Estaremos perante uma greve licita?

Argumentos avançados:
▪ A greve enquanto ato de protesto coletivo:
▪ Foi uma decisão tomada coletivamente; houve uma
programação delineada coletivamente; e ocorreu também uma
adesão ao plano delineado coletivamente – pelo que aparenta
ser, de facto, uma greve. Esta posição é apoiada pela Doutora
Joana.
▪ Contudo, certos autores consideram que houve uma ausência de
ação combinada – i.e., houve quem entendesse que não era uma
greve por ser cada trabalhador isoladamente a decidir quando é
que queria fazer greve ou não (estes autores consideravam que
isto seria uma atitude abstensiva de cada trabalhador
isoladamente e não havia a atitude concertada e coletiva).
▪ Vinculação ao plano versus liberdade de adesão
individual?
▪ Consideravam então alguns autores que isto não seria um
protesto coletivo.
▪ Contudo, sabemos que é reconhecida aos trabalhadores
uma liberdade na adesão à greve, de decidir, p.e., por
quanto tempo querem fazer a greve, se querem apenas
um dia, etc.

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▪ A inutilização do papel do pré-aviso:


▪ Funções do pré-aviso e greve:
▪ Houve quem entendesse que este tipo de greve tem um
aspeto perturbador, relacionado com o pré-aviso de
greve.
▪ O aviso prévio desta greve não dizia que era este o modo
como a greve iria funcionar. Portanto, criou a aparência de
uma greve mais tradicional que depois, em bom rigor, se
tornou uma greve self-service.
▪ Ocorreu, então, uma desconformidade entre o que
constava no aviso prévio e o que foi a realidade – isto pode
ser um aspeto ao qual se pode apontar a ilicitude de uma
greve.
▪ Impedir a imprevisibilidade? – função do pré-aviso.
Transparência quanto ao programa de ação.
▪ Não pode haver greves surpresas.
▪ Alguns autores entenderam que o aviso prévio, nesta
greve, não ia desempenhar o papel para o qual foi
imposto porque não se conseguiam impedir as
paralisações inesperadas.
▪ Os períodos de greve de cada trabalhador não eram
seguidos de qualquer aviso pré-definido.
▪ Nesta medida, estes autores entendiam que esta era uma greve
ilícita porque inutilizava a função do aviso-prévio.

▪ A greve acabou por ser considerada ilícita.

O caso da “greve cirúrgica” (enfermeiros, 2018):


▪ As ausências ao trabalho concentraram-se nos enfermeiros que
prestavam serviço nos blocos operatórios, os quais escalonaram as suas
faltas numa ação concertada, tendo como objetivo a
inoperacionalidade dos blocos operatórios, com o mínimo de faltas de
trabalho (faltava 1 trabalhador, então nenhum podia trabalhar).
▪ Estaremos perante uma greve?
▪ Estaremos perante uma greve licita?
▪ Estaremos perante uma greve que deve ser tratada como greve
clássica?
Alguns aspetos controversos:
▪ Houve ação concertada – quer na declaração de greve, delimitação do
plano, etc.
▪ Modo de paralisação? O parecer entendeu que era uma greve rotativa
especial.

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▪ Esta é uma greve que vai atingir um setor dos serviços de saúde,
sendo que, para a operacionalidade desse setor, é necessário um
trabalho em equipa e os elementos dessa equipa faltavam
alternadamente entre si, inviabilizando o funcionamento.
▪ Em bom rigor, não se trata de uma greve intermitente, de uma
greve rotativa ou de uma greve trombose – o que se pode ter é
uma certa greve rotativa, sendo que a rotatividade não é de setor,
mas sim entre sujeitos.

▪ Concluindo, pode olhar-se para esta greve como lícita, mas não deve
ser tratada como uma greve clássica do ponto de vista do rendimento
dos enfermeiros, uma vez que deve haver uma proporcionalidade entre
a perda de retribuição dos enfermeiros e os prejuízos do empregador.

› Em suma: só as greves próprias/clássicas e as greves de maior prejuízo são


consideradas, de um ponto de vista jurídico, verdadeiras greves. As greves
impróprias são consideradas meros incumprimentos do contrato.

Atendendo ao elemento finalístico


Classificação das greves, sob o ponto de vista dos fins que pretendem atingir:
▪ Modelo contratual de greve: a greve tem em vista interesses
estritamente profissionais; i.e., têm objetivos diretamente ligados às
condições de trabalho, esgrimidas contra o empregador → greves
profissionais;
▪ Modelo mais amplo: tem em vista também outros interesses (políticos,
económicos, etc.); são dirigidas contra quaisquer entidades que
possam tomar medidas capazes de afetar os interesses dos
trabalhadores (p.e., dirigidas contra o Estado) – greve de solidariedade,
greve política.
▪ Greve de solidariedade – quando outros trabalhadores não
envolvidos no processo grevista fazem greve como forma de
apoiar as motivações que estão por trás do movimento dos
outros trabalhadores;
▪ Greve política – têm por objetivo pressionar o Estado a adotar
uma política de modo diferente.

Qual o modelo admitido pelo nosso ordenamento jurídico?


▪ Há divergências:
▪ Há uma minoria de autores que vê a questão de uma forma muito
restritiva, entendendo que apenas as greves profissionais são admitidas
como greves lícitas.

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▪ A maioria da doutrina tende a admitir que o conceito de greve, no


ordenamento jurídico português, abrange tanto as greves profissionais
ou laborais como as greves não profissionais ou não laborais

Artigo 57.º/2 da CRP- “compete aos trabalhadores definir o âmbito de


interesses a defender através da greve, não podendo a lei limitar esse âmbito”.
▪ A doutora Joana sustenta o modelo mais amplo, invocando o art. 57.º/2
da CRP.
▪ Rejeição constitucional do “modelo contratual-laboral” /do “modelo
funcionalizante” de greve.
▪ A doutora Joana encara a greve como um direito que está conexo com
a liberdade sindical, com o direito ao trabalho livre e com a liberdade
de expressão daqueles que não têm voz ou que são mais vulneráveis.
▪ Nesta medida, a greve pode ser considerada um instrumento mais
amplo a utilizar para defender interesses dos trabalhadores.

CLASSIFICAÇÃO DAS GREVES

1) Critério dos fins:


▪ Profissionais ou laborais – quando prossegue interesses profissionais e
laborais.
▪ Extraprofissionais ou não laborais – quando prossegue fins que não são
estritamente profissionais.
2) Critério do seu objetivo:
▪ Ofensivas – visam implementar determinada mudança;
▪ Defensivas – visam obstar a determinada mudança que a entidade
empregadora queira implementar.
3) Critério da finalidade:
▪ Principais ou autónomas – os trabalhadores visam prosseguir um
interesse direto, próprio deles;
▪ De solidariedade ou acessória – não é um interesse propriamente
direto, mas declaram a greve com o sentido de mostrar a sua
solidariedade com a pretensão de outros trabalhadores grevistas.
4) Entidade deliberativa:
▪ Sindicais – em regra, serão as Associações Sindicais as entidades com
competência para declarar determinada greve, com a exceção do art.
531.º/2 CT.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Não sindicais – exceção do artigo 531.º/2 CT: aí pode ser declarada à


margem das AS, pela Assembleia de trabalhadores.
▪ Assembleia de trabalhadores é diferente de comissão sindical e
de comissão de trabalhadores. Consiste numa comissão ad hoc.
Nasce exclusivamente para o efeito de convocar declarar
determinada greve e extingue-se com a sua realização.
▪ Para que possa ser declarada a greve por estas assembleias têm
de se verificar os pressupostos que constam no art. 531.º do CT.
5) Critério do modo de paralisação:
▪ Próprias ou clássicas: Para termos uma greve a paralisação tem de ser
coletiva, concertada e total. Quando tivermos uma greve de paralisação
de todos os modos de trabalho temos uma greve própria.
▪ Atípicas ou impróprias: Meios de conduta laboral em que não ocorre
uma verdadeira abstenção ou ocorrendo ela é meramente parcial. Não
temos aqui uma abstenção da prestação do trabalho, o que temos é
uma mera perturbação da prestação da atividade. É um cumprimento
defeituoso do contrato.
▪ Exemplos:
▪ Greves de zelo;
▪ Greve de rendimento;
▪ Greve administrativa;
▪ Greve da mala.
▪ Maior prejuízo: Há uma verdadeira abstenção da prestação de trabalho.
São consideradas verdadeiras greves em sentido técnico-jurídico. Estas
greves maximizam os prejuízos da entidade empregadores e mitigam
as perdas salariais.
▪ Exemplos deste tipo de greve:
▪ Greve intermitente;
▪ Greve rotativa;
▪ Greve trombose;
▪ Greve retroativa;
▪ Greve self service.

Natureza jurídica do direito de greve:


Dimensão individual:
▪ A greve é um direito fundamental (DLG) cuja titularidade pertence a
cada trabalhador subordinado;
▪ Trata-se de um ato de recusa e paralisação temporária da prestação de
trabalho:
▪ A manifestação mais expressiva do direito à greve é a recusa e
paralisação da prestação de trabalho – a greve concretiza-se
sempre nas adesões ou não a esta recusa e paralisação.

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▪ A dimensão individual é uma dimensão indiscutível – pertence a cada


trabalhador individualizado essa decisão de recusa e paralisação.
▪ Por isso, dizemos que a greve é um direito dos trabalhadores individuais
(individualmente considerados) viabilizado pela dimensão coletiva do
fenómeno grevista.
▪ Ou seja, não se esgota nesta dimensão, também tem uma dimensão
coletiva.

Dimensão coletiva:
▪ A greve nasce da integração do trabalhador numa realidade coletiva,
i.e., da integração do trabalhador num grupo com o qual partilha
interesses – daí ter uma dimensão coletiva.
▪ A greve pressupõe a cooperação ou exercício do mesmo direito por
outros trabalhadores.
▪ O trabalhador participa numa ação coletiva organizada:
▪ Sindicato – decisão da greve, declaração de greve, gestão da
greve;
▪ A dimensão coletiva manifesta-se, principalmente, no
processo que antecede a greve – decisão de fazer greve e
a sua delineação, etc.
▪ É um direito individual (de cada trabalhador enquanto membro
de um grupo) de exercício coletivo (exercício em cooperação
com os outros membros do grupo).
▪ É, assim, um direito individual, com uma dimensão coletiva que faz parte
do seu conteúdo e é condição essencial, imprescindível, da sua
efetivação.

REGIME JURÍDICO DA GREVE


Quatro etapas/momentos fundamentais:
1. A decisão de greve;
2. A declaração de greve;
3. A adesão à greve;
4. Gestão e termo da greve.

1. A decisão de greve:
▪ Este é um momento que faz parte do processo preliminar da greve.
▪ O legislador ordinário confere competência para declarar greve às
Associações Sindicais (art. 531.º/1).
▪ A competência parece ser, então, das AS e não dos
trabalhadores propriamente (os trabalhadores são uma coisa
diferente da AS).

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▪ Contudo, o art. 531.º/2, estabelece que a greve pode ser decidida por
Assembleia de trabalhadores.
▪ Portanto, o nosso sistema admite:
▪ Greves sindicais: por competência das associações sindicais;
▪ Greves não sindicais: por competência das assembleias de
trabalhadores – no caso da maioria dos trabalhadores não esteja
filiada em nenhum sindicato.

▪ Questiona-se a conformidade constitucional do preceito do art. 531.º/1


– se a CRP afirma que o direito à greve é um direito dos trabalhadores
(da sua titularidade) em que medida a lei ordinária pode determinar que
a decisão de greve é de competência das associações sindicais? –
parece uma contradição.
▪ Pode tentar apresentar-se o argumento de que os trabalhadores
não filiados em sindicatos vão ficar privados do momento do
processo preliminar. Contudo, o nosso sistema não é de
monopólio sindical, é de “quase” - i.e., a decisão de recorrer à
greve é, no nosso sistema, uma decisão de quase monopólio
sindical.
▪ Ou seja, não está excluída a ideia de que esses trabalhadores não
sindicalizados não possam participar no processo inicial através
de assembleia de trabalhadores – ou seja, não ficam totalmente
privados do processo preliminar – simplesmente, as condições
em que o podem fazer são relativamente apertadas porque a lei
não as estabelece.
▪ Portanto, em bom rigor, a titularidade do direito à greve é dos
trabalhadores, mas a competência da decisão da greve cabe às AS e
Assembleias de trabalhadores.
▪ Contudo, o momento crucial da greve é o momento de adesão
individual de cada trabalhador à greve e esse continua intocável.

2. A declaração de greve:
▪ Este é um momento que faz parte do processo preliminar da greve.
▪ Além da decisão de greve, tem de haver uma forma de exteriorização
(uma declaração) – o aviso prévio – para notificar, dar a informação de
que essa greve irá ocorrer (art. 534.º).

▪ Proibição de “greves surpresas” (# greve ultima ratio)


▪ Rejeita-se a possibilidade de greves surpresa, daí a exigência
para que se dê esse aviso prévio.
▪ Destinatários do aviso prévio:
▪ Empregador/associação de empregadores
▪ Governo
▪ “Comunidade”

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▪ Antecedência mínima:
▪ Aviso prévio geral – com antecedência de 5 dias – quando a
empresa onde a greve vai ocorrer for uma empresa que não se
destina à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.
▪ Aviso prévio especial – com antecedência de 10 dias – quando
se tratar de uma empresa ou estabelecimento destinado à
satisfação de necessidades impreteríveis.
▪ Ver art. 537.º/2 CT.
▪ É maior a antecedência deste aviso prévio porque se trata
de empresas ou estabelecimentos destinados à satisfação
de necessidades sociais imperativas, que assumem uma
dimensão de indispensabilidade para a comunidade e
que, por isso, não podem ter uma paralisação total.
▪ Esta maior antecedência vai permitir aos titulares dessas
empresas e estabelecimentos criar formas de mitigar, com
mais tempo, os efeitos perturbadores que essa greve vai
criar. Apesar disto, esta maior antecedência não vai nunca
acabar com os efeitos da greve.

Conteúdo do aviso prévio:


Conteúdo geral: informação sobre o programa a que obedecerá a paralisação
▪ Âmbito subjetivo e geográfico:
▪ Há que informar os destinatários de qual vai ser o âmbito
geográfico em que a greve vai ocorrer e qual vai ser seu o âmbito
material/funcional, ou seja, que categorias de trabalhadores ou
setores profissionais vão ser abrangidos por aquela greve.
▪ Objeto (tipo de paralisação):
▪ Deve constar no aviso como será o tipo de paralisação – se esta
será uma paralisação de trabalho suplementar, de trabalho
durante a manhã, de setores em termos rotativos, etc.
▪ Data e hora de início da greve:
▪ (A duração da greve não tem de constar do aviso prévio – não é
necessário a data do fim, até porque a greve pode ter uma
duração indeterminada).
▪ Proposta de serviços necessários à segurança e manutenção de
equipamento:
▪ A paralisação da prestação de trabalho pode, muitas vezes, pôr
em causa a segurança e a própria manutenção de equipamentos
(p.e., equipamentos que não podem parar e têm de estar
permanentemente ligados, tendo de ter algum tipo de
manutenção durante o período dia).
▪ Ora, os equipamentos do empregador não podem, devido à
greve, sofrer deterioração ou ser destruídos.
▪ Motivos? Objetivos?

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▪ É discutível se o aviso prévio deve conter uma exposição dos


motivos ou objetivos que estão por detrás da greve.

Conteúdo especial
▪ Proposta de serviços mínimos (#definição prévia através de IRCT, art.
492.º/2/g)).

Funções do aviso prévio:


▪ Dimensão externa (proibição de greves surpresa):
▪ Habilitar o empregador a adotar medidas destinadas a
acautelar/atenuar prejuízos face ao programa de paralisação
comunicado;
▪ Informar o público em geral (utentes/consumidores), permitindo
que estes se preparem para suportar as perturbações face ao
programa de paralisação;
▪ Tempo adicional para organização dos serviços mínimos, com
eventual intervenção do Governo;
▪ Tempo adicional para resolução do conflito, i.e., tempo
suplementar para que as partes cheguem a acordo;
▪ Dimensão interna
▪ Instrumento de disciplina e coordenação da ação coletiva (auto-
vinculante).

Forma do aviso prévio:


▪ Tem de assumir forma escrita – p.e., uma carta dirigida ao empregador,
etc.
▪ Por também ser feito através dos meios de comunicação social – p.e.,
anúncio em jornal, panfletos, etc.

Efeitos do aviso prévio:


▪ Delimitação do âmbito (geográfico e material) dentro do qual a
abstenção individual pode ser qualificada como adesão à greve
▪ Ao comunicar qual o setor de atividade e qual o setor geográfico
em que a greve irá ocorrer, vai delimitar quais são as abstenções
dos trabalhadores que podem ser classificadas como adesão à
greve.
▪ Ou seja, a importância prática: permite saber se, quando o
trabalhador não presta trabalho, estamos perante uma
suspensão do CT ou se se deve aplicar o regime das faltas
injustificadas.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Delimitação para efeitos de proibição de substituição de trabalhadores


grevistas:
▪ A partir do momento em que há aviso prévio, o empregador fica
proibido de substituir os grevistas por pessoas que, à data, não
trabalhavam no respetivo estabelecimento, não podendo, a
partir dessa data, admitir trabalhadores para aquele fim.
▪ Importância prática: (art. 535.º): mantém se o efeito útil da greve
(de causar prejuízos e danos ao empregador como forma de luta)
ao definir que os trabalhadores não podem ser substituídos
durante a greve por outros vindos do exterior e não pode ser
admitido novos trabalhadores para esse fim.
▪ No entanto, o empregador pode adaptar o serviço de forma a
mitigar (mas não anular) os prejuízos.
▪ É-lhe permitido: reorganizar o serviço/produção; redistribuir
tarefas; mudança de trabalhadores de atividade e do local de
trabalho, mas dentro do mesmo setor ou de estabelecimento (ou
seja, não é permitida mobilidade geográfica); mobilidade
funcional temporária (nos termos do art. 120.º).

3. Adesão à greve:
▪ Este é um momento que faz parte da greve propriamente dita.
▪ Âmbito da adesão (quem pode aderir):
▪ Trabalhadores filiados no sindicato declarante:
▪ (Um trabalhador filiado num sindicato, não tem obrigação
de aderir à greve por ele determinada).
▪ Trabalhadores filiados em outro sindicato;
▪ Trabalhadores não filiados.
▪ Podem aderir estes trabalhadores, desde que façam parte do âmbito
material e geográfico definido no aviso prévio da greve.

▪ Art. 540.º – no sentido de preservar a total liberdade no que toca a


adesão à greve, este artigo estabelece que não é permitido penalizar,
tratar de forma desfavorável, coagir ou prejudicar um trabalhador pelo
facto de ter (ou não) aderido à greve.
▪ Trata-se, portanto, de uma liberdade – não havendo nunca
obrigatoriedade de adesão à greve, para qualquer uma das categorias
de trabalhadores acima.

Forma de reconhecimento de adesão:


▪ A lei não toma posição sobre isto – como se exterioriza o ato de
reconhecimento da greve?
▪ Basta a mera ausência do local de trabalho?
▪ Ou é necessária uma ação comunicativa?

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▪ Há uma tendência para a doutrina divergir.

Posição A:
▪ No texto do doutor José Abrantes, este tem uma posição mais simples
– a mera ausência do local de trabalho, em princípio, é presunção de
que o trabalhador aderiu à greve.
▪ Contudo, adiciona que esta presunção é ilidível (o sujeito pode
esclarecer que afinal não aderiu à greve e estava a faltar por outro
motivo).
▪ Não se pode, no entanto, fazer essa presunção em certos casos – p.e.,
nas hipóteses em que os trabalhadores não têm uma baliza fixa para as
horas em que estão presentes, mas antes estão disponíveis a todas as
horas que for necessário.

Posição B:
▪ Por outro lado, o Doutor Monteiro Fernandes tem uma posição que não
é tão abrangente.
▪ Entende que não se deve tratar a ausência do local de trabalho como
presunção de adesão à greve para todos os trabalhadores em geral.
▪ Faz, por isso, uma divisão – divide os trabalhadores filiados no sindicato
declarante, dos trabalhadores não filiados nesse sindicato (ou de todo).
▪ Define que no caso de um trabalhador filiado no sindicato que declarou
a greve, a mera ausência deve indicar que aderiu à greve.
▪ Nos casos dos trabalhadores não filiados no sindicato que declarou a
greve ou não filiados de todo, entende que aí deve haver uma
comunicação escrita, para que se possa definir que aderiram à greve.

→ A Dra. Joana, considera que, não tendo nenhum apoio na lei a distinção
feita na posição B, a posição A será a que faz mais sentido.

Ato absolutamente livre:


▪ O ato de adesão é um ato completamente livre – portanto, o trabalhador
decide se, quando e até quando adere à greve.
▪ Para aderir a uma greve, não têm de se vincular em termos
temporais a todo o plano/programa.

▪ Proibição de coação, prejuízo ou discriminação por motivo de adesão


ou não à greve (art. 540.º)
▪ Atos do empregador
▪ Atos de outras entidades (sindicatos)

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PIQUETES
▪ São mecanismos de informação e persuasão para adesão à greve (art.
533.º), i.e., mecanismos que pretendem incentivar e persuadir os
trabalhadores a aderir à greve.
▪ Apesar de a adesão à greve ser um ato completamente livre, tal
não impede que se possam criar estes mecanismos.
▪ A lei isto, permitindo a possibilidade de organização de piquetes de
greve para que os trabalhadores possam ser devidamente informados
sobre os motivos e objetivos da greve, sempre que isso se revele
necessário.

Local dos piquetes


▪ Piquetes externos – exercem a atuação de informação e persuasão fora
das instalações da empresa.
▪ Em relação a estes, não há qualquer dúvida que podem existir.
▪ Piquetes internos – exercem a atuação de informação e persuasão
dentro das instalações da empresa.
▪ Quanto a estes, temos de mobilizar alguns argumentos:
▪ Argumento gramatical – o elemento literal (do art. 533.º)
nada especifica em relação a isto, i.e., a lei não distingue
entre piquetes internos e externos. Por esse motivo,
considera-se que o nosso ordenamento jurídico aceita
tanto os piquetes externos como os internos. Contudo,
apenas este argumento não basta. É necessário outros.
▪ Argumento histórico – o doutor Leal Amado mobiliza o
argumento no sentido de que se deve ir aos antecedentes
legislativos daquilo que é a solução que se tem
atualmente. Ou seja, deve verificar-se como surgiu a
norma dos piquetes e quais as discussões que houve em
torno dela quando foi adotada. No decreto-lei de 1974,
fazia-se referência aos piquetes externos, em específico.
Entretanto, em 1976, com a Lei da Greve, caiu a referência
aos piquetes externos (passou a falar-se apenas em
piquetes). Acrescido a isto, houve ainda uma proposta do
PSD no sentido de apenas admitir os piquetes externos,
tendo essa sido chumbada. Portanto, Leal Amado
considera que podemos extrair desta evolução que o
legislador quis adotar uma posição ampla em relação aos
piquetes, admitindo ambos.
▪ Argumento teleológico – refere-se ao próprio propósito
dos piquetes – se estes são criados para persuadir
trabalhadores para aderirem à greve, permitir que essa
função possa ser exercida na sua plenitude é mais
potenciado se se admitirem piquetes externos e internos.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Somados estes elementos, parece que há mais razões para sustentar


que o nosso ordenamento aceita tanto piquetes externos como
internos.

Limites na atuação dos piquetes


▪ O art. 533.º estabelece que a atuação deve ser feita de forma pacífica
(só devem persuadir por meios pacíficos) e com respeito pela liberdade
de trabalho dos não aderentes.

4. Gestão e termo da greve


▪ É a entidade declarante que vai fazer a gestão da greve:
▪ Associação sindical (greve sindical)
▪ Comissão de greve (greve não sindical)
▪ Essa gestão é composta por vários atos de gestão:
▪ Organizar piquetes (art. 533.º);
▪ Prepara proposta de serviços mínimos (art. 534.º)
▪ Assegurar a organização e prestação de serviços mínimos (art.
537.º);
▪ Negociar com o empregador durante a paralisação;
▪ Deliberar o fim da greve – unilateralmente ou por acordo com o
empregador ou associação de empregadores (art. 539.º).

EFEITOS DA GREVE
Efeitos da greve lícita na situação laboral do trabalhador aderente:
Suspensão do contrato de trabalho (art. 536.º/1):
▪ A recusa de prestar trabalho, do ponto de vista jurídico laboral, leva à
suspensão do contrato de trabalho.
▪ O trabalhador vai ficar exonerado de realizar a prestação porque fica
numa situação de imunidade contratual, que a lei enquadra como
suspensão do contrato de trabalho.
▪ Portanto, o trabalhador fica com um manto protetor em que o não
cumprimento do contrato não lhe vai originar responsabilidade
disciplinar nem contratual.
▪ Isto significa que, durante o período em que o trabalhador estiver em
greve, vão suspender os principais direitos e deveres das partes.

Direitos e deveres do trabalhador suspensos:


▪ Os direitos e deveres que se suspendem são os que pressupõem a
efetiva prestação de trabalho:

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

▪ Retribuição
▪ A questão das greves de maior prejuízo
▪ Assiduidade
▪ Pontualidade
▪ Diligência
▪ Subordinação
Direitos e deveres do trabalhador que se mantêm (art. 536.º/2):
▪ Os direitos e deveres que se mantêm são os que o trabalhador tem
sempre de respeitar, quer esteja ou não a trabalhar efetivamente, em
termos materiais, i.e., aqueles que não pressupõem a efetiva prestação
de trabalho:
▪ Segurança social
▪ Antiguidade
▪ Respeito
▪ Lealdade

Efeitos da greve ilícita na situação laboral do trabalhador aderente:


▪ Art. 541.º CT.
▪ Regime de faltas injustificadas – o trabalhador que adere a uma greve
ilícita passa a ser enquadrado, do ponto de vista laboral e individual,
como um trabalhador que não comparece, pois está a dar faltas
disciplinadas.
▪ Responsabilidade disciplinar – por ter dado faltas injustificadas;
▪ Responsabilidade civil – se isso tiver causado danos à entidade
empregadora;
▪ Responsabilidade contra-ordenacional e penal – se eventualmente tiver
praticado atos violentos, etc.

▪ Hipótese dos grevistas de boa-fé – estado de ignorância desculpável –


i.e., podemos ter situações de trabalhadores que aderiram a uma greve,
mas não sabiam que essa greve era ilícita.
▪ Tirando estas situações, em regra, a adesão a uma greve ilícita
gera o regime de faltas injustificadas e a possibilidade de
responsabilidade disciplinar, civil e penal.

LIMITES DO DIREITO À GREVE


Limites convencionais
▪ O direito à greve é comprimido pelos próprios interessados.
▪ Situações em que os sujeitos com competência para declarar a greve se
auto limitam no exercício desse direito.
▪ Nomeadamente, as cláusulas de paz social.

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

Limites legais
▪ O direito à greve é comprimido, mas é a própria lei que impõe essa
limitação.
▪ Nomeadamente, a obrigação de serviços mínimos.

Surgem, a propósito disto, algumas questões:


▪ Como se articula o direito de contratação coletiva e o direito a greve?
▪ Pode o exercício do direito à greve ser limitado pela convenção coletiva
de trabalho?
▪ Será que as greves só podem ser feitas para reivindicar questões
relacionadas com condições de trabalho, reguladas em CCT?
▪ A greve só serviria para reivindicar questões relacionadas com
condições de trabalho que estivessem reguladas em CCT, se o
nosso ordenamento tivesse uma perspetiva estritamente
funcionalizada da greve.
▪ Mas tal não acontece.
▪ Se assim fosse, nosso OJ só se admitiria greves profissionais, o
que não é o caso.

O dever de paz social


▪ Sentido amplo:
▪ Obrigação resultante da lei ou assumida pelos representantes
dos trabalhadores de não desencadearem ou apoiarem uma
greve contra os empregadores que, com tais representantes,
celebraram uma convenção coletiva.
▪ Sentido restrito:
▪ Obrigação voluntariamente assumida na convenção coletiva
pelas estruturas representativas dos trabalhadores de não
convocarem ou aderirem a uma greve para modificar o conteúdo
da convenção antes do termo da vigência desta.
▪ É mais neste sentido que iremos abordar o tema das clausulas de
paz social.

Dever implícito ou dever explícito?

▪ Dever implícito de paz social


▪ Existe uma natural conexão entre as condições acordadas na CTT
e a greve e, como tal, é como se a greve estivesse funcionalizada
à CTT.
▪ Isto significa que pelo facto de se celebrar uma convenção,
os sujeitos celebrantes ficam impedidos de recorrer à

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Ano Letivo 2021/2022 FDUC Mariana Ferreira e Rute Silva

greve no que toca a essas matérias que foram reguladas


na convenção.
▪ O dever de paz social é imanente à convenção.
▪ Há uma conexão muito estreita entre greve e CCT.

▪ Dever explícito de paz social


▪ Cada um dos direitos tem o seu espaço próprio.
▪ O direito à greve e a CCT têm campos de atuação
autónomos.
▪ O dever de paz social carece de uma cláusula expressa.
▪ Não é o mero facto de celebrar uma CCT que vai
comprimir o direito à greve enquanto a CCT vigorar.
▪ Para comprimir o direito é necessário fixar uma clausula
expressa com esse efeito.

Problema da admissibilidade das clausulas sociais:


▪ O problema da admissibilidade das cláusulas sociais é o de saber até
que ponto os representantes dos trabalhadores podem assumir o
compromisso de não recorrer à greve durante o período em que vigora
uma determinada convenção coletiva.
▪ Que limites pode a CCT estabelecer ao exercício do direito à greve?
▪ A mera celebração da CCT traduz-se num impedimento ao recurso à greve?
▪ Pode proibir toda em qualquer greve?
▪ Pode proibir a greve por tempo indeterminado?
▪ Pode proibir a greve sobre todas as matérias laborais?

O dever de paz social no ordenamento jurídico português


Evolução legislativa
▪ DL 392/74, de agosto – em 1974, havia uma admissibilidade expressa
do dever de paz social – o dever de paz social existia e estava previsto
na lei.
▪ Lei 65/77, 26 de agosto/DL 519-C1/79 – a partir de 1977 com a lei da
greve, esse deixou de existir – pretendia-se uma proibição de limitações
ao exercício dos direitos fundamentais.
▪ CT2003 – em 2003, o Código do Trabalho passou a admitir as cláusulas
de paz social de forma expressa dentro de certos limites.
▪ CT2009 – admissibilidade expressa.

Portanto:
▪ Hoje está consagrado na lei a admissão de clausulas de paz social – i.e.,
é possível que a CCT limite o direito à greve.

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▪ A ideia de que estas cláusulas são admitidas resulta, hoje, do art. 542º
CT – da leitura deste artigo vemos que este dever é admitido como
dever explícito.
▪ As partes têm de consagrar essa limitação do direito à greve –
têm de estabelecer uma clausula expressa.
▪ Não é o mero facto de celebrarem a CCT que significa que lhes
fica limitado o direito – por isso não é implícito.

Requisitos de licitude no sistema jurídico português (art. 542.º CT)

▪ Obrigação voluntária:
▪ A obrigação de não recorrer à greve tem de ser uma obrigação
que resulte da vontade das partes, ou seja, tem de ser uma
obrigação voluntária.
▪ Não estamos aqui perante uma obrigação de fonte legal.

▪ Obrigação explícita:
▪ O nosso ordenamento acolhe a teoria do dever de paz social
explícito.
▪ Só admite o dever de paz social se ele for expressamente e
voluntariamente declarado na convenção coletiva.
▪ Tem de haver uma cláusula ad hoc, expressa na própria
convenção, através da qual a associação sindical declara assumir
um compromisso de não recorrer à greve.
▪ O nosso ordenamento jurídico rejeita, portanto, a ideia de que o
nosso dever de paz social é um dever implícito – se assim fosse,
não era necessário clausula expressa e tal decorreria da natureza
da convenção.

▪ Obrigação temporária:
▪ A obrigação de paz social é uma obrigação que só é admitida
com caráter temporário.
▪ O compromisso de não recorrer à greve por parte da associação
sindical não pode valer por tempo indeterminado.
▪ Só é admitido o compromisso de a associação sindical não
recorrer à greve durante um determinado período, ou seja,
enquanto a convenção coletiva estiver em vigor (art. 542º/última
parte).
▪ Questiona-se se “durante a vigência” inclui o período de
sobrevigência:
▪ O elemento literal do artigo apenas diz “durante a
vigência” e “não durante a vigência e
sobrevigência”.

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▪ Para além disso, a finalidade destas clausulas é a de


dar alguma estabilidade ao conteúdo da
convenção. A partir do momento em que uma das
partes denuncia a convenção, isso significa já não
está em conformidade com o conteúdo que foi
celebrado.
▪ Sendo assim, na opinião da Dr.ª Joana não fará
sentido prolongar a clausula no período de
sobrevigência pois tal parece contrário à logica da
cláusula de paz social, que serve para garantir a
estabilidade do conteúdo da convenção tal como
foi pensado no momento em que foi celebrado.

▪ Obrigação relativa:
▪ A obrigação assumida de não recorrer à greve é uma obrigação
que não visa alterar o conteúdo da convenção.
▪ Ou seja, a AS só se obriga a não recorrer à greve para modificar
o conteúdo de matérias que estão previstas na CCT.
▪ Poderá, contudo, recorrer à greve para modificar outros aspetos
não regulados na CCT.
▪ Nesta medida, o nosso ordenamento jurídico proíbe as cláusulas
de paz social de caráter absoluto, sendo que só admite as de
caráter relativo.

▪ Obrigação formal:
▪ A obrigação da paz social tem de revestir a forma escrita (já que
é um elemento que tem de estar expresso na CCT).

▪ Isenção de responsabilidade dos trabalhadores:


▪ Quem assume a obrigação através da clausula de paz social é a
Associação Sindical (é uma clausula que faz parte do conteúdo
obrigacional).
▪ É uma clausula que limita os sindicatos no que toca ao direito a
declarar a greve (pois são estes que assumem o dever), mas não
limita os trabalhadores em aderir à greve.
▪ O trabalhador não fica limitado no seu direito individual de aderir
à greve – esse permanece intocável.
▪ Isto significa que, se um trabalhador filiado numa AS que
celebrou a CCT vier a aderir a uma greve, ele não vai sofrer
responsabilidade nessa matéria.
▪ As únicas entidades que sofrem responsabilidade pelo não
cumprimento das cláusulas de paz social são as próprias
associações sindicais, quando quebram essa cláusula de paz
social que assumiram.

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▪ Ausência de qualquer compensação:


▪ As cláusulas de paz social não admitem qualquer possibilidade
de serem compensadas pecuniariamente pela outra parte.
▪ Uma parte não pode tentar pagar à outra parte para a celebração
de uma convenção coletiva com uma cláusula de paz social.

Obrigação de serviços mínimos


Artigo 57.º/3 CRP e artigo 537.º/1/2 do CT.
▪ A greve como direito fundamental (DLG), mas não um direito absoluto/
ilimitado:
▪ Há limites no direito à greve, resultantes da necessidade de
salvaguardar outros direitos/bens constitucionalmente protegidos
(tarefa de concordância prática, de balanceamento entre direitos
fundamentais colidentes).
▪ Quando há a fixação de serviços mínimos, há uma tentativa de
equilibrar o direito à greve, que não pode ser anulado nem
restringido de forma absoluta, com outros direitos fundamentais
de que são titulares outros sujeitos durante a greve.

Obrigação de serviços mínimos vs. Obrigação de segurança


▪ Ambas previstas na CRP (artigo 57.º/3 da CRP).

▪ Obrigação de segurança – trata-se de uma tutela dos equipamentos e


das instalações que são propriedade dos estabelecimentos. Dentro do
conteúdo obrigatório do aviso prévio tem de estar uma proposta
quanto à manutenção e segurança dos equipamentos da empresa.

▪ São obrigações que podem coexistir durante a greve, mas que se


distinguem:
▪ Âmbito:
▪ OMS: tipo de necessidades que a empresa visa satisfazer
(necessidades sociais impreteríveis);
▪ OS: tipo de instalações e de equipamento da empresa.
▪ Fundamento:
▪ OMS: interesses das fundamentais das pessoas físicas,
destinatários do produto ou serviço prestado;
▪ OS: direito de propriedade do empregado; salvaguarda
do suporte do emprego dos próprios trabalhadores.
▪ Atividade:
▪ OMS: exige uma atividade produtiva;
▪ OS: exige mera atividade de manutenção ou de vigilância.

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Problemas – operações relacionadas com a obrigação de serviços mínimos


1. Decisão sobre a existência/fixação de serviços mínimos
2. Decisão sobre o âmbito/medida dos serviços mínimos
3. Designação dos trabalhadores afetos à prestação de serviços mínimos

1. Decisão sobre a existência de serviços mínimos


▪ Quais os pressupostos que tem de estar reunidos para haver lugar à
fixação de serviços mínimos?
▪ Quem tem competência para decidir da existência de serviços
mínimos?

Quais os pressupostos para a existência da obrigação de serviços mínimos?


Artigo 57.º/3 CRP e artigo 537.º CT
1) A greve ocorre em empresa ou estabelecimento destinados à
satisfação de necessidade sociais impreteríveis.
▪ Como se identificam as empresas destinadas à satisfação de
necessidades sociais impreteríveis?
▪ A lei não dá uma identificação precisa dessas empresas, mas, no
art. 537º/2, estabelece uma lista exemplificativa de empresas ou
estabelecimentos que se destinam à satisfação de necessidades
sociais impreteríveis (esta lista não esgota todas as empresas que
podem satisfazer essas necessidades).
▪ A lei também não fornece uma noção explicita do que constitui
uma necessidade social impreterível. No entanto, conseguimos
deduzir que estas vão estar relacionadas com a proteção de
direitos que são dotados de uma proteção constitucional idêntica
à da greve, cuja não satisfação tempestiva provoca danos
irreparáveis.
▪ Ou seja, tem a ver com interesses das pessoas físicas que têm
uma importância tão grande como o direito à greve – aspetos
vitais para as pessoas satisfazerem as suas necessidades básicas.
▪ Tem de ser um interesse com dignidade idêntica à greve, i.e.,
igual importância do ponto de vista constitucional (direitos com
tutela constitucional).

2) As prestações laborais que a greve interrompe destinam-se à


satisfação de necessidades sociais impreteríveis.
▪ Além da empresa ter de satisfazer necessidade social
impreterível, a própria atividade que a greve interrompe tem de
se destinar à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.
▪ Pensemos nos exemplos:

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▪ Empresa de transporte: serviço de limpeza vs. serviço de


transporte – nesta empresa, a necessidade social impreterível
será aquela satisfeita pelo serviço transporte. Ou seja, não faz
sentido exigir serviços mínimos aos funcionários de limpeza. A
sua prestação laboral não vai satisfazer a necessidade social
impreterível em questão (a verdadeira necessidade é a de
deslocação).
▪ Estabelecimento de saúde – departamento financeiro vs. bloco
operatório ou serviço de urgência.
→ Em relação a estes dois requisitos, a jurisprudência e doutrina são unânimes.
A questão está em saber se ainda é preciso um terceiro requisito.

3) A prestação dos trabalhadores em greve mostra-se indispensável à


satisfação das necessidades sociais em causa?
▪ Há quem entenda que, verificados os dois requisitos anteriores,
há sempre lugar à fixação de serviços mínimos. Este raciocínio é
aquele que tem sido sustentado por parte da doutrina.
▪ Contudo, há autores que é necessário que a prestação dos
trabalhadores em greve se mostre indispensável à satisfação das
necessidades em causa – critério da indispensabilidade.
▪ Estes autores argumentam pelo facto de a obrigação de
serviços mínimos ser uma limitação do direito à greve,
sendo que este se trata de um direito fundamental.
▪ Ora, para restringir um DLG, só pode fazê-lo mediante o
princípio da proporcionalidade, i.e., na medida do
necessário – art. 18.º/2 CRP.
▪ Certos autores, nomeadamente, o Dr. Leal Amado e o Dr. José
Abrantes, entendem que é necessário fazer intervir este terceiro
critério de indispensabilidade.
▪ Para a Dra. Joana, esta posição que fala de um princípio da
indispensabilidade logo no momento da fixação é aquela mais
conforme à nossa CRP.

Quem tem competência para decidir da existência de serviços mínimos?


A lei dá preferência a vias consensuais – por acordo.
▪ Acordo prévio: clausulas de definição de serviços mínimos – artigo
492.º/2/g) e artigo 538.º/1:
▪ As próprias convenções coletivas podem ter cláusulas que
definem serviços mínimos.
▪ Acordo atual após a comunicação do recurso à greve: artigo 538º/1
▪ Pode acontecer que, a partir do momento em que a greve foi
declarada através do aviso prévio, haja um acordo entre a

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associação sindical que declara a greve e os empregares, sobre


a fixação destes serviços mínimos.

▪ Em caso de falta de acordo


▪ Empresa pertencente ao setor privado
▪ Intervenção do Ministério do Trabalho: artigo 538º/2/4/a)
▪ Promoção de acordo entre os representantes
▪ Fixação unilateral por despacho conjunto
▪ Empresa do setor empresarial do Estado
▪ Intervenção do tribunal arbitral: artigo 538º/4/b)
▪ Decisão arbitral
▪ (Aqui o Estado já não intervém, pois se estivermos a falar
de uma greve que se vai desenrolar no setor empresarial
do Estado, o Estado é parte no conflito e, como tal, não
faria sentido que este, por conflito de interesses, pudesse
fixar os serviços mínimos).

2. Decisão sobre o âmbito/medida dos serviços mínimos


Artigo 538.º/5
▪ A definição dos serviços mínimos dever respeitar os princípios da
necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
▪ Aqui, os resultados possíveis desta medida dos serviços mínimos
podem ser muito diferentes.
▪ A decisão sobre o âmbito dos serviços mínimos pode conduzir a
uma solução em que a fixação dos serviços mínimos corresponde
a uma redução significativa da atividade (10%, p.e.), tal como
também podem acontecer situações em que a definição de
serviços mínimos implique que continue a ser satisfeita a
atividade normal do estabelecimento (100%).

3. Designação dos trabalhadores adstritos aos serviços mínimos


Artigo 538.º/7
Que designa os trabalhadores?
▪ Em primeiro lugar, quem tem competência para indicar os
trabalhadores são os representantes – i.e., Associação Sindical ou
comissão de greve.
▪ Em última instância, quando os representantes não comunicarem com
antecedência, então, o empregador pode definir unilateralmente quem
serão esses trabalhadores.

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Qual o procedimento para a designação dos trabalhadores?


▪ Essa fixação dos trabalhadores tem de ser feita com uma antecedência
de 24 horas, em relação à greve.
▪ Se essa fixação não ocorrer com uma antecedência de 24h antes da
greve, então, é o empregador que o faz naquelas 24h que sobram até
a greve começar.

Que trabalhadores podem ser designados?


▪ Devem ser designados os trabalhadores mais aptos a desempenhar as
funções necessárias.

Regime de prestação de serviços mínimos


▪ Sujeição ao poder de direção no que respeita a execução dos serviços
(artigo 537.º/4):
▪ Supostamente, os trabalhadores aderentes à greve têm os seus
contratos de trabalho suspensos, logo não deveriam estar
sujeitos a poderes do empregador. Contudo, em bom rigor,
estes trabalhadores continuam a prestar atividade, a trabalhar
(prestar serviços mínimos), logo não parece que o seu contrato
esteja suspenso.
▪ Por este motivo, a doutrina diverge.
▪ A posição do legislador é a de que o contrato não está
verdadeiramente suspenso, pelo que os trabalhadores vão estar
sujeitos ao poder disciplinar e de direção do empregador, mas
estritamente na medida do que é necessário para cumprir os
serviços mínimos.

▪ Previsão de requisição civil como resposta ao incumprimento do dever


de prestação de serviços mínimos (artigo 541.º/3):
▪ Como resposta ao incumprimento de prestar serviços mínimos,
o artigo estabelece a requisição civil.
▪ Ou seja, temos a hipótese de, perante o incumprimento dos
trabalhadores designados, o Governo, ao abrigo de um diploma
sobre a requisição, requisitar os trabalhadores para
responderem obrigatoriamente a esses serviços mínimos.

Questões controversas
▪ Pode a requisição civil ser requisitada antes de a greve ocorrer?
▪ A lei diz “em caso de incumprimento de serviços mínimos”,
portanto, literalmente, parece-nos que não.

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▪ Outros autores, todavia, fazem uma leitura mais habilidosa desta


norma e afirmam que mesmo antes da greve decorrer o governo
pode desencadear, lançar mão, da requisição civil.
▪ Pode o trabalhador que não cumpre o dever de prestar serviços
mínimos ser objeto de outra sanção?
▪ Certos autores entendem que, para além disto (da requisição
civil), o empregador pode também exercer o seu poder
disciplinar.

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