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A INCLUSÃO DA CRIANÇA AUTISTA EM PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO:

POSSIBILIDADES DE UM APLICATIVO BASEADO NO MODELO TEACCH


THE INCLUSION OF AUTISTIC CHILDREN IN THE LITERACY PROCESS: POSSIBILITIES OF AN APPLICATION BASED ON
THE TEACCH MODEL

LA INCLUSIÓN DE NIÑOS AUTISTAS EN EL PROCESO DE ALFABETIZACIÓN: POSIBILIDADES DE UNA APLICACIÓN


BASADA EN EL MODELO TEACCH

▪ Carla Salomé Margarida de Souza (Doutoranda em Educação-PPGE/FaE/UFMG - c.salome@hotmail.com)

▪ Eixo/Subeixo temático: Inclusão e Acessibilidade no contexto das TDIC/Foco na Educação Básica

Resumo:
O presente trabalho tem como tema a inclusão de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA)
em processo de alfabetização, com foco específico no modelo de Tratamento e Educação para Autistas
e Crianças com Déficits Relacionados à Comunicação (TEACCH), a partir do aplicativo ABC Autismo. A
abordagem deste tema se deu por meio da seguinte problemática: em que medida o modelo TEACCH
associado ao aplicativo ABC Autismo pode responder às necessidades de aprendizagem das crianças
autistas em processo de alfabetização? Para responder a esta inquietação, realizou-se uma pesquisa
qualitativa e exploratória com base nos seguintes autores: Farias; Silva e Cunha (2014), Mello (2005),
Fonseca e Ciola (2014) entre outros, com o objetivo de discutir sobre a incorporação do modelo TEACCH
à tecnologia móvel e as suas possibilidades na alfabetização de crianças autistas. Os resultados da
pesquisa apontam que as crianças autistas necessitam de uma intervenção específica para se
desenvolverem e o modelo TEACCH agregado ao aplicativo ABC Autismo, oferece possibilidades
pedagógicas às práticas de ensino dos docentes ao contribuir com a alfabetização das crianças
autistas, favorecendo sua inclusão escolar e social.
Palavras-chave: Inclusão. Autismo. TEACCH. ABC Autismo.

Abstract:
The present work has as its theme the inclusion of children with Autism Spectrum Disorder (ASD) in the
literacy process, with a specific focus on the Treatment and Education model for Autistics and Children
with Communication-Related Deficits (TEACCH), based on the ABC Autismo application. The approach
to this theme was based on the following problem: to what extent can the TEACCH model associated
with the ABC Autismo application respond to the learning needs of autistic children in the literacy
process? To answer this concern, a qualitative and exploratory research was carried out based on the
following authors: Farias; Silva e Cunha (2014), Mello (2005), Fonseca and Ciola (2014), among others.
, with the aim of discussing the incorporation of the TEACCH model into mobile technology and its
possibilities in the literacy of autistic children. The research results indicate that autistic children need
a specific intervention to develop and the TEACCH model added to the ABC Autismo application, offers
pedagogical possibilities to the teaching practices of teachers by contributing to the literacy of autistic
children, favoring their school and social inclusion.
Keywords: Inclusion. Autism. TEACH ABC Autism.

Resumen:
El presente trabajo tiene como tema la inclusión de niños con Trastorno del Espectro Autista (TEA) en
el proceso de alfabetización, con un enfoque específico en el Modelo de Tratamiento y Educación para
Autistas y Niños con Déficit Relacionados con la Comunicación (TEACCH), basado en el ABC Autismo
aplicación. El abordaje de este tema se basó en el siguiente problema: ¿En qué medida el modelo
TEACCH asociado a la aplicación ABC Autismo puede responder a las necesidades de aprendizaje de los
niños autistas en el proceso de lectoescritura? Para responder a esta inquietud, se realizó una
investigación cualitativa y exploratoria a partir de los siguientes autores: Farias; Silva e Cunha (2014),

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Mello (2005), Fonseca y Ciola (2014), entre otros. , con el objetivo de discutir la incorporación del
modelo TEACCH a la tecnología móvil y sus posibilidades en la alfabetización de niños autistas. Los
resultados de la investigación indican que los niños autistas necesitan una intervención específica para
desarrollarse y el modelo TEACCH sumado a la aplicación ABC Autismo, ofrece posibilidades
pedagógicas a las prácticas docentes de los docentes al contribuir a la alfabetización de los niños
autistas, favoreciendo su inclusión escolar y social.
Palabras clave: Inclusión. Autismo. ENSEÑAR ABC Autismo.

1. Introdução

O movimento da inclusão pretende valorizar e respeitar os direitos e deveres de todas


as pessoas, sem distinção. A inclusão educacional tem redimensionado os sistemas de ensino
para a oferta de uma educação de qualidade para todos os alunos e alunas (SOUZA; REIS e
SANTOS, 2018). As limitações das pessoas não diminuem seus direitos, seja por alguma
deficiência física, intelectual, cor de pele, orientação sexual, gênero ou poder aquisitivo dentro
da comunidade.
O autismo se tornou foco de pesquisas mais atuais por ser um transtorno do
desenvolvimento que acompanha o indivíduo durante toda a sua vida. Seus sintomas estão
associados à comunicação, comportamento e interação social e podem ser observados no início
da infância. É possível verificar as dificuldades da família, da escola e das demais pessoas que
interagem com uma criança autista, sendo necessário uma abordagem adequada e eficiente para
que ela consiga se desenvolver durante sua vida escolar e social (MARINHO; MERKLE, 2009).
Uma pessoa com autismo deve ser estimulada a se desenvolver e, para isso, são
necessárias ações motivadoras, de tal forma que ela sinta vontade de participar de atividades
para que se estabeleçam vínculos com as pessoas ao seu redor. Os maiores desafios na inclusão
escolar da pessoa com TEA é fazer com que elas permaneçam na sala de aula e realizem as
atividades propostas pelo professor. Para isso, são necessários o uso de recursos alternativos e
metodologias específicas.
Nesse sentido, emerge a necessidade de a escola redimensionar suas práticas
pedagógicas. Com o apoio das novas tecnologias, podemos aliar ludicidade, atratividade e
aprendizagem, a fim de superar um ensino homogeneizador que desconsidera os diferentes
estilos e ritmos de aprendizagem.
A escolha do tema deste estudo se deu pela necessidade de reunir dados que
possibilitem refinar os conhecimentos sobre o autismo e a prática de ensino específica para
atender esses estudantes em processo de alfabetização, tendo em vista a incorporação do
modelo TEACCH à tecnologia móvel e às suas possibilidades na alfabetização de crianças autistas.
Assim, delimitamos como objetivo discutir sobre o TEA, considerando a incorporação do
modelo TEACCH ao aplicativo ABC Autismo, tendo em vista o atendimento às necessidades
específicas das crianças autistas na escola comum. Para tanto, a metodologia utilizada foi a
pesquisa qualitativa a partir de um estudo exploratório com base nos seguintes autores: Farias;
Silva e Cunha (2014), Mello (2005), Fonseca e Ciola (2014), entre outros.

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2. Perspectiva teórica

2.1. A Educação Inclusiva diante do TEA e da Tecnologia Móvel

Antes de iniciarmos as discussões sobre a educação inclusiva diante do TEA e das


tecnologias, não podemos deixar de apresentar algumas considerações pertinentes à educação
numa perspectiva inclusiva, em que, “para começar, o professor precisa valorizar de verdade a
presença de cada um. Precisa reconhecer permanentemente que todos influenciam a dinâmica
da sala de aula” (HOOKS, 2013, p. 18).
Nesse sentido, para romper com o paradigma da homogeneidade e uniformização do
modelo tradicional, faz-se necessário “contemplar a diversidade e as diferenças presentes em
sala de aula” como “o primeiro passo para desmantelar a concepção cartesiana do ser humano
formada por séculos dentro do modelo tradicional de ensino” (FURTADO, 2012, p. 02).
Faz-se urgente edificar uma nova proposta de organização político-pedagógica que
atenda aos princípios e fins da educação para a diversidade numa perspectiva inclusiva, pois,
conforme Reis, Santos e Oliveira (2017, p. 49) “o foco consiste em desenvolver práticas
pedagógicas que consigam dar respostas adequadas às necessidades de cada aluno”.
Sob essa acepção, o que se almeja de um ambiente educativo vai além de um mero ensino
focado nos aspectos conceituais e cognitivos, uma vez que deve haver a preocupação com o
crescimento da pessoa como ser humano. Em outras palavras, a escola “se preocupa com a
formação humana, emocional e cidadã de todos” (REIS; SANTOS; OLIVEIRA, 2017, p. 26).
Desta forma, de acordo com Ferreira (2006, p. 231 - grifo nosso) “espera-se hoje que a
professora5 seja capaz de compreender e praticar o acolhimento à diversidade e esteja aberta a
práticas inovadoras na sala de aula”. Em consonância com essas considerações, Hooks (2013,
p.24) evidencia que, espera que os professores “[...] abram a cabeça e o coração para conhecer
o que está além das fronteiras do aceitável, para pensar e repensar, para criar novas visões,
celebro um ensino que permita as transgressões”.
Não se pode pensar em um ensino assim, sem a participação das tecnologias, destacando
aqui a tecnologia móvel em smartphones e tablets. Com o crescimento da telefonia móvel, banda
larga e redes sem fio, a mobilidade e a computação em múltiplas plataformas e aparelhos
tornam-se cada vez mais viáveis (SACCOL; REINHARD, 2007). A tecnologia móvel em smartphones
e tablets está cada vez mais presente na vida das pessoas, incluindo aquelas que possuem alguma
necessidade especial, o que coloca a escola diante de uma aliada na inclusão escolar. Além desse
referencial, essa tecnologia é capaz de exercer grande atratividade sobre as crianças autistas,
despertando o interesse e a atenção dessas (CAMINHA et al, 2016).
Daí percebe-se a relevância de fazer desses recursos tecnológicos um aliado na
aprendizagem das crianças com TEA. Além do mais, é importante ressaltar que estratégias lúdicas
utilizadas no processo de ensino e aprendizagem são bem recebidas por crianças com algum
transtorno do desenvolvimento, pois torna agradável atividades cansativas como, por exemplo,
a de escrever e ler.
Nessa ótica, a escola não pode ficar alheia às transformações que emergem no nosso dia
a dia em virtude das novas tecnologias. Torna-se urgente a redefinição de práticas educacionais
de modo a contemplar a “cibercultura” e seus dispositivos (PRENSKY, 2012). E, desta forma, no
que se refere à educação inclusiva percebemos que a tecnologia móvel pode estar para além do

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simples entretenimento, tendo em vista que pode ser utilizada para pensar uma nova forma de
ensino e de aprendizagem.
Hoje, dispomos gratuitamente de uma ampla gama de aplicativos que podem ser
utilizados em sala de aula de acordo com os objetivos a serem alcançados. São vários jogos
digitais com possibilidades de trabalho pedagógico.
Esses jogos digitais aliam ludicidade, atratividade e aprendizagem e podem ser eficientes
porque fazem uso de técnicas de aprendizagens interativas. Entre essas técnicas de
aprendizagens interativas evidenciam-se: a possibilidade de aprender na prática e com os erros;
a devolutiva imediata com feedback para a criança; aprendizagem guiada por meta, descoberta,
pergunta; aprendizagem fundamentada em tarefas; aprendizagem contextualizada,
construtivista, role-playing; treinamento; e, além do mais, selecionar a partir de objetos de
aprendizagem e instrução inteligente (PRENSKY, 2012).

2.2. O Transtorno do Espectro Autista – TEA

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) foi descrito pela primeira vez pelo Dr. Leo Kanner
(médico austríaco) em 1943. Alguns anos depois, em 1944, o médico Hans Asperger, também
relatou casos de crianças com várias das semelhanças que já haviam sido descritas por Kanner.
O autismo é uma condição que não apresenta causas definidas, sendo mais considerada como
uma alteração no desenvolvimento e manifesta-se durante toda a vida e que normalmente
aparece nos primeiros anos de vida. Caracteriza-se por alguns desvios qualitativos na interação
social, uso da imaginação e na comunicação. Segundo Melo,

Estes três desvios, que ao aparecerem juntos caracterizam o autismo, foram chamados
por Lorna Wing e Judith Gould, em seu estudo realizado em 1979, de “Tríade”. A Tríade
é responsável por um padrão de comportamento restrito e repetitivo, mas com
condições de inteligência que podem variar do retardo mental a níveis acima da média
(MELLO, 2005, p.16).

Mesmo sendo muito difícil imaginar esses três desvios juntos, dentro dessa “tríade”
observa-se a existência de gradações e intensidades dos sintomas, analisando graus de
comprometimento do autista. Os sinais do austismo podem ser observados antes dos três anos
de vida, visando um padrão de comprometimento distinto em relação às outras crianças da
mesma idade. À medida que a criança vai crescendo, é possivel observar alguns fatos que
chamam a atenção. Os comandos dados são de mais difícil compreensão, talvez exista uma
ausência de medo e insensibilidade à dor, movimentos repetitivos, monotomia da rotina,
podendo também ter um comportamento estranho e maneiras inesperadas de brincar. Melo
afirma que

O autismo não é uma condição de ‘tudo ou nada’, mas é visto como um continuum que
vai do grau leve ao severo. A definição de autismo adotada pela AMA i, para efeito de
intervenção, é que o autismo é um distúrbio do comportamento que consiste em uma
tríade de dificuldades (MELLO, 2005, p.20).

O que faz a diferenciação das pessoas com o espectro autista é a intensidade dos
sintomas. A confirmação do diagnóstico deve ser feita por um ou mais profissionais

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especializados em TEA, com a ajuda de testes. O principal profissional para fazer essa avaliação
é o neuropsicólogo ou neuropsiquiatra que realiza a avaliação neuropsicológica e, diante desta,
o neurologista infantil, ao agregar a avaliação clínica, emite o laudo.
Segundo o Manual Estatístico Diagnóstico da Associação Americana de Psiquiatria DSM-
5/2013, o TEA é dividido em 3 níveis, sendo eles: o primeiro que necessita de suporte; o segundo
que necessita de suporte substancial; e, o terceiro que necessita de suporte muito substancial.
Contudo, isso também depende do perfil de cada criança, pois o autismo pode sofrer alterações
de uma criança para outra.
Na área de interação e comunicação social, no primeiro nível é comum a pessoa
apresentar um interesse diminuído nas interações sociais. Já no segundo nível, o autista já
demonstra déficts marcantes na conversação, com respostas reduzidas ou consideradas atípicas.
No terceiro nível apresenta dificuldades graves no cotidiano, com uma resposta mínima à
interação com outras pessoas e a iniciativa de conversar extremamente limitada.
Em relação ao comportamento restritivo ou repetitivo, no primeiro nível, a criança ou
adulto autista costuma ter dificuldade com troca de atividades devido à rigidez no
comportamento e à inflexibilidade mental e, por isso, a independência acaba sendo um pouco
limitada. No segundo nível os comportamentos atípicos interferem no cotidiano da pessoa numa
grande variedade de ambientes. E, no terceiro nível o indivíduo tem uma dificuldade extrema de
lidar com mudanças, no geral, demonstrando grande aflição quando precisa trocar de atividades,
podendo até mesmo ocasionar crises, quando há a necessidade de troca de rotina.
A Associação de amigos do autista (AMA) foi criada em 1983 pelo Dr. Raymond
Rosenberg. Essa associação indica que o diagnóstico seja feito por testes e por médicos
especializados, uma vez que exames laboratoriais não conseguem detectar o autismo. Mas, ainda
assim, são solicitados alguns exames para investigar condições de possíveis comorbidades.
O diagnóstico do autismo só pode ser conclusivo após os vinte e quatro meses de idade.
Porém, é mais frenquente ter esse laudo certo com idade superior a trinta meses. Para cada grau
do autismo é feito um tipo de intervenção, por isso a importância do diagnóstico precoce.
Atualmente, mesmo com tanta informação e conhecimento, o autismo ainda surpreende
as pessoas pelo fato de ter várias características e graus diferentes, fazendo com que na maioria
das vezes a dificuldade de uma criança autista seja totalmente diferente da outra. Os
diagnósticos têm aumentado muito nesses últimos anos: algumas estatísticas norte-americanas
da Central de Controles de Doenças (CDC) mostram que a prevalência do TEA aumentou de 1 à
cada 150 crianças em 2000-2002; de 1 a cada 68 crianças durante 2010-2012; de 1 a cada 59
crianças em 2014; e, nos dados do mês de março de 2020 foi alcançado uma marca de 1 a cada
54 crianças. A incidência do autismo aumentou quase 16% entre 2012 e 2014, e 9% em um
período de 6 anos até 2020. É interessante mencionar que o autismo incide igualmente em
famílias de diferentes raças, credos ou classes sociais.

2.3. O modelo de tratamento e educação para autistas e crianças com déficits relacionados à
comunicação - TEACCH

O modelo de ensino estruturado, cientificamente intitulado como TEACCH, foi criado no


final da década de 1960, pelo Dr. Eric Schopler, do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de
Medicina da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos. A proposta é fundamentada
em evidências adotadas por vários profissionais para trabalhar problemas de comunicação e
ensinar habilidades. “O programa TEACCH procura entender como a pessoa com autismo pensa,

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vive, aprende e responde ao ambiente, a fim de promover aprendizagem com independência,
autonomia [...]” (FONSECA; CIOLA, 2014).
O modelo TEACCH se desenvolveu como resposta do governo ao movimento crescente
dos pais que reclamavam da falta de atendimento para as crianças com autismo nos Estados
Unidos. O método foi implantado em salas especiais em um número grande de escolas públicas
desse país. De acordo com Ischkanian (2020, p. 38), trata-se de

[...] um programa educacional e clínico com uma prática predominantemente


psicopedagógica criado a partir de um projeto de pesquisa que buscou observar
profundamente os comportamentos das crianças autistas em diferentes situações e
frente a diferentes estímulos.

Esse método, nas considerações de Ischkanian (2020), responde às necessidades


específicas dos autistas em seus comportamentos em diferentes situações e frente a diferentes
estímulos. Tem como objetivo melhorar o comportamento da pessoa com TEA e incentivar a sua
independência, melhorando o seu desenvolvimento, tendo um ambiente organizado na escola,
no trabalho ou em casa.
No trabalho com o TEACCH são utilizados cartões ilustrativos, fotos, gestos e movimentos
corporais que auxiliam que a criança ou o adulto coordene seus movimentos e comportamentos.
O TEACCH não utiliza o ensino estruturado como uma técnica para organizar o ensino da criança,
mas sim, para encontrar a forma de estruturar uma organização que a criança se adapte melhor.
O método TEACCH utiliza a avaliação denominada Perfil Psicoeducacional Revisado (PEP-
R), que avalia a criança determinando os pontos fortes e de maior interesse, seu hiperfoco e suas
dificuldades, baseando-se na adaptação do ambiente para facilitar a sua compreensão. Podemos
ressaltar a importância do uso desse método uma vez que proporciona ampliar os etímulos
corporais, visuais, auditivos, por meio de atividades diversificadas e brincadeiras com temas que
despertam a curiosidade e o interesse da criança com TEA.

Os sistemas de trabalho utilizados pelo TEACCH são assim denominados, por


envolverem um processo de construção de tarefas que inclui como selecionar os
materiais, como localizar a atividade, como proceder ao que está sendo solicitada, a
orientação guiada pelo educador, a execução visualmente mediada e o conceito de fim,
dentre outras (FONSECA; CIOLA, 2014, p. 87).

Podemos classificar esse método em duas categorias sendo elas - Sistemas de Trabalhos
Concretos e Sistemas de Trabalhos Simbólicos (imagens ou códigos). Por meio desses métodos
o material visualmente organizado é dividido em área de armazenamento e área de execução. A
área de armazenamento é da parte extrema esquerda, onde se depositam os estímulos móveis
que serão transferidos para a parte direita da tarefa ou lugar. A seguir, apresentamos dois
exemplos de atividades que foram estruturadas para alunos com autismo a partir do
aproveitamento de materiais de uso comum como livros, jogos e objetos do dia a dia:

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Imagem 1. Atividade estruturada - vogais

Fonte: Fonseca e Ciola (2014).

Imagem 2. Atividade estruturada – Nome

Fonte: Prociv e Tores (2015).

As atividades acima envolvem estruturas para crianças autistas que estão em processo de
alfabetização. A alfabetização não é um processo simples e, para as crianças autistas, pode ser
ainda mais complexo. Porém, as evidências científicas têm mostrado que, com o modelo de
ensino estruturado, é possível alfabetizar crianças com TEA. Os estudos de Temple Grandin e
Richard Panek (2020) comprovam que pessoas autistas são pensadores visuais e, por isso, as
imagens em estrutura atendem às necessidades específicas de aprendizagem dos estudantes
com TEA.
São estruturas que facilitam a compreensão, auxiliando o estímulo, o foco e a atenção e
se constituem em ferramentas que permitem que a criança use suas habilidades em uma
variedade de ambientes. É importante evidenciar que os materiais devem oferecer objetos
concretos e visuais que possibilitem a troca da área de armazenamento para a área de execução.
Os educadores devem ter conhecimento das habilidades que são necessárias para cada faixa
etária de acordo com o currículo nacional para que as atividades sejam programadas de forma
adequada.

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3. Perspectiva metodológica

Este trabalho se caracteriza como uma pesquisa qualitativa de caráter bibliográfico e


exploratório. De acordo com Flick (2009, p.16) a pesquisa qualitativa, é uma metodologia que
privilegia o uso do texto “como material empírico (ao invés de números) ”.
De forma mais específica, o estudo se classifica no grupo das pesquisas exploratórias. O
objetivo desse tipo de pesquisa é familiarizar-se com um assunto ainda pouco conhecido e pouco
explorado. Portanto, é uma classificação de pesquisa oportuna, já que a nossa temática ainda
necessita ser explorada. Este tipo de estudo visa proporcionar um maior conhecimento para o
pesquisador acerca do assunto, a fim de que esse possa formular problemas mais precisos ou
criar hipóteses que possam ser pesquisadas por estudos posteriores (GIL, 1999).

4. Resultados e discussão

Desenvolvido por pesquisadores do Instituto Federal de Alagoas (IFAL) - Campus Maceió,


em parceria com a Associação dos Municípios Alagoanos (AMA-AL), o ABC Autismo se trata de
um aplicativo disponível gratuitamente para smartphones e tablets, cuja principal função é
auxiliar no processo de alfabetização e servir como instrumento de apoio no tratamento e
educação de crianças com TEA (FARIAS; SILVA; CUNHA, 2014). Encontra-se disponível para três
idiomas: português, inglês e espanhol.
O aplicativo ABC Autismo é baseado na intervenção pelo TEACCH, possui 40 fases
interativas distribuídas em 04 níveis de complexidade, e suas fases correspondem à atividade de
transpor figuras de uma área denominada área de armazenamento (lado esquerdo da tela), até
uma área denominada área de execução (lado direito da tela). Os quatro níveis do jogo estão
representados na figura 03.

Figura 3: Os quatro níveis do aplicativo ABC Autismo

Fonte: Adaptação de Farias, Silva e Cunha (2014).

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O Nível 1 consiste em atividades básicas de transposição/deslocamento de figuras,
obedecendo a ordem estabelecida pelo programa TEACCH, esquerda-direita. O Nível 2 exige o
discernimento dos elementos para executar a atividade. O Nível 3, demanda que o jogador
diferencie posturas e ações, bem como realize combinações. O Nível 4 é composto por atividades
envolvendo palavras iniciando pelas vogais, visando ensinar o autista sobre as habilidades de
alfabetização.
Conforme os níveis vão avançando, novos elementos TEACCH vão sendo inseridos. O jogo
inicia-se com a exploração das cores e formatos, envolvendo a transposição de figuras e, à
medida que a criança vai conquistando a execução das tarefas, a área aceitável para as respostas
diminui, fortalecendo aspectos como a coordenação motora. Posteriormente, são inseridos
elementos como a aleatoriedade da apresentação das formas na tela, a fim de evitar que o aluno
decore a ordem de execução da atividade. São trabalhadas, ainda, diversas representações de
um mesmo elemento, atividades de parear, sequenciar e quebra-cabeça. O quarto nível envolve
atividades de alfabetização que exige uma diversidade maior de dicas para uma efetiva aplicação
e obtenção de melhores resultados.
Observa-se que esse aplicativo possibilita um trabalho educativo com as crianças autistas,
estimulando-as desde o reconhecimento de formatos e cores, até a coordenação motora e o
desenvolvimento de atividades de alfabetização. Contudo, como os próprios autores ressaltam,
a interação com o objeto concreto, realizado de forma convencional pelo TEACCH, é fundamental
e não pode ser deixado de lado, sendo o aplicativo ABC Autismo apenas um suporte que
acrescenta nas intervenções com as crianças em processo de alfabetização (FARIAS; SILVA;
CUNHA, 2014).
De acordo com Farias; Silva e Cunha (2014), muitas características de intervenção pelo
TEACCH foram efetivadas no aplicativo ABC Autismo. Entre elas, podemos destacar a ordem
crescente de nível, a diferenciação entre tamanhos, formas e cores dos objetos representados, a
aleatoriedade dos elementos na tela e a utilização de letras do alfabeto, em que os campos são
configurados em uma estrutura que aciona dicas de acordo com o número de erros
apresentados, não sendo possível avançar caso um elemento de resposta esteja em um campo
inválido.

5. Considerações finais

Neste artigo apresentamos considerações sobre uma nova tendência educacional em que
se observa no campo da educação especial. Desse modo, estabelecemos reflexões sobre as
implicações pertinentes à pesquisa da ciência e da tecnologia, principalmente no tocante aos
impactos da tecnologia móvel, não apenas para o desenvolvimento econômico do país, mas
principalmente para a melhoria da qualidade na educação, possibilitando aos discentes com
deficiências, independência e autonomia no processo de aprendizagem.
Para isso, evidenciamos neste trabalho um dos principais métodos educacionais aplicados
a indivíduos com TEA e como esse pode ser utilizado em aplicativos educacionais, além de ter
sido permeado por discussões que reforçam a necessidade da escola redimensionar, inovar suas
práticas a fim de ser de fato inclusiva para todos os discentes. Percebemos que para atender aos
princípios de uma educação inclusiva, não se pode pensar em um ensino sem a participação das
novas tecnologias, destacando aqui a presença da Tecnologia em dispositivos móveis.

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As pessoas com TEA apresentam déficit de atenção, organização e processamento,
impedindo a compreensão de regras e padrões de linguagem. Assim, a função básica do apoio
visual presente no TEACCH é exatamente suprir essa deficiência por meio da mediação das cores.
E, os aplicativos aqui destacados cumprem bem essa função.
O ABC Autismo favorece intervenções pedagógicas, podendo a escola usufruir dessa
tecnologia em benefício da alfabetização das crianças autistas de forma gratuita. Esse aplicativo
faz uso do TEACCH e pode ser utilizado por professores regentes, professores de apoio, além de
propiciar uma intervenção complementar no Atendimento Educacional Especializado (AEE) na
sala de recurso multifuncional. Dessa forma, pode contribuir com o enfrentamento das
dificuldades inerentes à condição educacional das pessoas autistas em processo de alfabetização,
fortalecendo sua inclusão escolar e social.
Vale pontuar que novas pesquisas nessa temática podem (e devem) ser desenvolvidas,
tanto para ampliar este trabalho quanto no sentido de contribuir com as discussões em torno
das possibilidades do aplicativo ABC Autismo como uma metodologia pedagógica na
alfabetização de crianças autistas.

6. Referências

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