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I – Introdução
É prática corrente a designação de regras de arbitragem da CNUDCI1
ou “UNCITRAL2 Arbitration Rules”, nas cláusulas compromissórias de
contratos de caráter internacional, negociados por juristas de empresas,
advogados e alguns operadores económicos angolanos, como regras
processuais para reger o procedimento arbitral em casos de litígios
resultantes de tais contratos. Se, nalgumas situações, essas regras são
propositadamente escolhidas pelas partes ou pelos seus advogados, nou-
tras, a sua indicação resulta de um simples fenómeno de “copy-paste”
(copiar-colar), fazendo com que algumas cláusulas constantes de modelos
contratuais oriundos de outros países sejam automaticamente repercutidas
nos contratos negociados e celebrados em Angola.
No já célebre caso SOFOMIL, Lda vs. ABAMAT-UEE, que constitui
a primeira arbitragem em Angola de que resultou uma sentença sobre
o mérito da causa, publicada na Revista da Ordem dos Advogados de
3 In Revista da Ordem dos Advogados de Angola, Ano I, n.º 1, Centro de Documen-
-CNUDCI-CCJA, in http://www.acicol.com/__temp/Mlle.pdf.
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pp. 272-273.
A ESCOLHA DE REGRAS DA “UNCITRAL”
PARA REGER O PROCEDIMENTO ARBITRAL: QUAIS AS IMPLICAÇÕES? 315
IV – Caso de aplicação
Se uma das partes contestar, v. g., a arbitrabilidade do litígio, o tribunal
aprecia a questão tendo em conta a lei de arbitragem aplicável. De acordo
com o Regulamento, a sentença interlocutória sobre a competência do
Tribunal arbitral é final e vinculativa. O Regulamento prevê que todas as
sentenças (incluindo as parciais ou interlocutórias) são finais e vinculativas.
As partes obrigam-se a executar qualquer sentença sem demora (art. 32.º,
n.º 2, in fine, RAC 1976; art. 34.º RAC 2010). A finalidade da sentença
tem um duplo sentido. Por um lado, a sentença é final quando esgota a
competência do tribunal arbitral, e, por outro, ela é final quando já não é
suscetível de recurso perante os tribunais judiciais, isto é, quando transitou
em julgado11. O sentido dado pelo Grupo de Trabalhos encarregue da
redação do Regulamento é mais restritivo, isto é, todas as sentenças são
finais quando chegam ao conhecimento das partes, não carecendo mais
de interpretação ou retificação12. Se a Lei da Arbitragem aplicável é a
Lei angolana, a impugnação dessa decisão interlocutória só é possível nos
termos do artigo 31.º, n.º 3: “A decisão do Tribunal Arbitral através da
qual se declare competente para decidir a questão só pode ser apreciada
11 CARON, David/CAPLAN, Lee M., The Uncitral Arbitration Rules – A commen-
tary, Second Edition, Oxford, 2013, pp. 738-739.
12 CARON, David/CAPLAN, Lee M., The Uncitral Arbitration Rules – A commen-
tary..., pp. 738-739.
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3.º Apreciação
A Autoridade de Nomeação deve verificar se o procedimento esta-
belecido pelo Regulamento da UNCITRAL foi respeitado, para intervir
validamente no processo visando a recusa do árbitro. Conforme refere
VAN DEN HOUT14, mesmo o Secretário Geral da Corte Permanente
de Arbitragem de Haia procede à verificação, com a ajuda dos juristas
do Bureau Internacional, que “[…] o procedimento previsto pelo Regu-
lamento de Arbitragem foi respeitado”, antes de proceder à designação
da Autoridade de Nomeação a pedido de uma das partes à arbitragem.
Uma parte na arbitragem não pode recorrer diretamente à Autoridade
de Nomeação sem que notifique a outra parte, ao árbitro recusado e aos
demais membros do tribunal sobre a recusa que pretende apresentar (art.
11.º). A Autoridade de Nomeação, que pratica atos tendentes a responder
à petição da parte recusante, quando não observar o procedimento previsto
no art. 11.º do Regulamento de Arbitragem viola as suas disposições e os
atos por ela praticados são ineficazes por terem sido praticados de forma
prematura e, por conseguinte, sem poderes para o efeito. Coloca-se aqui o
problema da prematuridade da intervenção da Autoridade de Nomeação.
No sistema das Regras da UNCITRAL de 1976 e de 2010, não se
atribui ao Tribunal Arbitral um poder de apreciação dos motivos em que
se baseia a recusa de árbitro pela parte recusante. Todos os árbitros são,
no entanto, notificados da decisão de recusa tomada pela parte recusante.
A partir daquele momento, a parte contrária pode aceitar a recusa ou
o árbitro recusado escusar-se. Se estes não o fizerem dentro do prazo
http://www.cedroma.usj.edu.lb/pdf/conf1/Pdf/Vandenhout.pdf.
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VI – Conclusões
O Regulamento da UNCITRAL tem caráter facultativo, isto é, só se
aplica quando as partes assim acordaram, e sujeita-se às regras impera-
tivas do direito estadual aplicável.
Tendo as partes escolhido a aplicação de Regras da UNCITRAL,
essas regras são diferentes ou distintas em relação às regras da LAV
quanto ao afastamento dos árbitros. O tribunal arbitral não tem poder
para prosseguir a arbitragem contra a vontade de uma das partes que
recuse um árbitro. Não havendo acordo da outra parte ou dos árbitros
em relação à recusa proposta pela parte recusante, esta deverá recorrer
à Autoridade de Nomeação.
A determinação do direito aplicável à arbitrabilidade dos litígios
releva do direito aplicável à convenção de arbitragem. A lei aplicável
à convenção de arbitragem será a lei da arbitragem aplicável, tal como
poderá resultar da vontade das partes ou da sua determinação pelo Tri-
bunal arbitral.
A impugnação de sentenças parciais ou interlocutórias proferidas no
âmbito de uma arbitragem realizada com base nas regras da UNCITRAL,
junto dos tribunais estaduais, sujeita às disposições da Lei da arbitragem
aplicável. Por conseguinte, só é possível depois de proferida a decisão
arbitral sendo a LAV aplicável.
A ESCOLHA DE REGRAS DA “UNCITRAL”
PARA REGER O PROCEDIMENTO ARBITRAL: QUAIS AS IMPLICAÇÕES? 321