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Informativo 622-STJ
Márcio André Lopes Cavalcante

Julgado não comentado por não ter relevância para concursos públicos: IUJur no CC 144.433-GO. Leia-o ao final.

ÍNDICE
DIREITO CIVIL
SEGURO
 Súmula 609-STJ.
 O contratante do seguro de vida em grupo não tem direito à renovação da apólice sem a concordância da
seguradora nem pode exigir a restituição dos prêmios pagos.

ARBITRAGEM
 Se a parte quiser arguir a nulidade da cláusula arbitral, deverá formular esse pedido, em primeiro lugar, ao próprio
árbitro, não sendo possível que proponha diretamente ação judicial.

PODER FAMILIAR
 Discussão sobre a possibilidade de o filho ajuizar ação de exigir contas em relação aos valores recebidos pelos pais
em nome do menor.

INVENTÁRIO
 Possibilidade de a parte já ingressar direto na via ordinária por entender que o juízo do inventário não é competente
para a demanda.

SUCESSÃO DE COMPANHEIRO
 Se o falecido deixou apenas companheira (sem ascendentes ou descendentes), ela herdará a totalidade da herança.

DIREITO DO CONSUMIDOR
APLICAÇÃO DO CDC
 Súmula 608-STJ.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL


GRATUIDADE DA JUSTIÇA
 Possibilidade de concessão de gratuidade da justiça a estrangeiros não residentes no Brasil.

INVENTÁRIO
 Possibilidade de a parte já ingressar direto na via ordinária por entender que o juízo do inventário não é competente
para a demanda.

DIREITO PENAL
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
 Qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários e descaminho?
 Súmula 606-STJ.
 Furto de “cofrinho” contendo R$ 4,80 de uma instituição de combate ao câncer, mediante induzimento de filho de
9 anos.

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FURTO
 O pagamento do débito oriundo de furto de energia elétrica antes do oferecimento da denúncia é causa de
extinção da punibilidade?

LEI DE DROGAS
 Súmula 607-STJ.
 Não incide a causa de aumento de pena do art. 40, III, da LD se o crime foi praticado em dia e horário no qual a
escola estava fechada e não havia pessoas lá.

DIREITO TRIBUTÁRIO
ICMS
 Responsabilidade pelo pagamento da diferença de alíquota caso tenha havido tredestinação da mercadoria.

IMPOSTO DE RENDA
 Ganho de capital obtido com a venda de imóvel residencial é isento de IR se ele for utilizado para pagamento de
parcelas de outro imóvel residencial comprado anteriormente.

DIREITO CIVIL

SEGURO
Súmula 609-STJ

Súmula 609-STJ: A recusa de cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente, é


ilícita se não houve a exigência de exames médicos prévios à contratação ou a demonstração
de má-fé do segurado.
STJ. 2ª Seção. Aprovada em 11/04/2018, DJe 17/04/2018.

Dever de informar doenças preexistentes


No momento em que a pessoa vai contratar um seguro, ela preenche uma ficha na qual será perguntado
a ela se possui alguma doença preexistente. Assim, caso o contratante tenha alguma enfermidade, ele é
obrigado a informar essa situação à seguradora no momento da assinatura do contrato.

O que é considerado doença preexistente?


No caso de seguro de vida, é a doença que o segurado sabia que possuía no momento da assinatura do
contrato e que mesmo assim não declarou na proposta de contratação (art. 62 da Circular SUSEP nº 302
de 19/09/2005).
No caso dos seguros e planos de saúde, doença preexistente é aquela “que o beneficiário ou seu
representante legal saiba ser portador ou sofredor, no momento da contratação ou adesão ao plano
privado de assistência à saúde” (art. 2º da Resolução Normativa 162/2007 da ANS.

Por que o consumidor tem esse dever de informar?


Porque os contratos de seguro de danos pessoais (morte, invalidez e acidentes pessoais) preveem cláusula
que exclui cobertura securitária em caso de dano causado por doença preexistente. Ex: no contrato de
seguro de vida, há uma cláusula dizendo que se o segurado falecer em decorrência de doença
preexistente, o beneficiário da apólice não terá direito ao recebimento da indenização.
Nos seguros e planos de saúde não há exclusão, mas existem cláusulas que estipulam uma carência de até
24 meses, período durante o qual o contratante não terá direito a procedimentos mais complexos
relacionados ao tratamento de tais doenças. Ex: a pessoa possui câncer e contrata um plano de saúde (ou

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seguro-saúde); o contrato poderá prever que ela estará sujeita a uma carência de 24 meses, de forma que,
neste período, não terá direito a cirurgia ou internação decorrente deste câncer.

E se o consumidor sabe que possui essa doença, mas omite tal informação no momento da assinatura
do contrato? Em outras palavras, se o contratante omite a doença preexistente?
Neste caso, o consumidor age de má-fé e não terá direito à cobertura securitária, conforme prevê o art.
766 do Código Civil:
Art. 766. Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir
circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito
à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido.

Exames médicos prévios


A demonstração de que o segurado agiu com má-fé e que não declarou a doença preexistente é difícil de
ser feita.
Diante disso, como cautela, antes de ser assinado o contrato de seguro, algumas seguradoras exigem que
o usuário seja submetido a exames médicos para verificar se ele apresenta ou não alguma enfermidade
física ou psíquica.
Não há ilegalidade da operadora na conduta de exigir esses exames médicos prévios. Isso é permitido.

A seguradora pode se recusar a arcar com a cobertura securitária sob a alegação de que o sinistro
ocorreu em virtude de doença preexistente?
SIM. Essa recusa será considerada lícita, no entanto, para isso, é necessário que a operadora:
1) Tenha realizado exames médicos no usuário antes da assinatura do contrato, constatando-se que ele
possuía essa doença; ou
2) Se a operadora não fez esses exames prévios, ela terá que provar agora (já durante o contrato) que o
consumidor agiu de má-fé e ocultou intencionalmente a existência da doença.

Em outras palavras, antes de concluir o contrato, a seguradora pode exigir do segurado a realização de
exames médicos para constatação de sua efetiva disposição física e psíquica. Se a operadora não realizou
os exames no contratante, ela assumiu os riscos por essa sua postura. Logo, somente poderá recusar o
tratamento se provar que o segurado agiu de má-fé.
Má-fé = omissão intencional de doença preexistente.

Vejamos um exemplo para ilustrar melhor:


João contratou seguro de vida.
No momento da assinatura, ele informou que não possuía qualquer enfermidade.
Passados alguns meses, João morre de bronquite crônica.
A viúva requer o pagamento da indenização securitária.
A seguradora nega, afirmando que se tratava de doença preexistente.
Essa recusa pode ser considerada lícita? Depende:
1) Se a seguradora fez exames antes da assinatura e detectou que João estava com bronquite: ela poderá
recusar o pagamento da indenização porque a morte foi decorrente dessa doença preexistente. A recusa
será lícita.
2) Se a seguradora não fez os exames prévios, haverá duas possibilidades:
2.1) Seguradora consegue provar que o segurado agiu de má-fé, ou seja, sabia que estava doente e omitiu
essa informação para poder conseguir assinar o seguro de vida: neste caso, a seguradora poderá recusar
a cobertura. A recusa será lícita.
2.2 ) Seguradora não consegue reunir provas de que o segurado agiu de má-fé: neste caso, a seguradora
não poderá recusar a cobertura securitária. A recusa será ilícita.

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Precedentes que deram origem à súmula


A maioria dos precedentes que deram origem à súmula estão relacionados com contratos de seguro de vida.
No entanto, o entendimento vale também para contratos de seguro saúde e até para contratos de planos
de saúde, nos quais se pode exigir uma carência de até 24 meses para doenças preexistentes. Confira:

Seguro de vida
A seguradora que não exigiu exames médicos previamente à contratação, não pode descumprir a
obrigação indenizatória sob a alegação de que houve omissão de informações pelo segurado quanto à
doença preexistente, salvo quando ficar provado que o contratante agiu de má-fé.
STJ. 3ª Turma. AgRg no REsp 1.286.741-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 15/8/2013 (Info 529).

Seguro saúde
A jurisprudência desta Corte firmou entendimento de que é ilícita a recusa da cobertura securitária, sob a
alegação de doença preexistente à contratação do seguro-saúde, se a seguradora não submeteu o
segurado a prévio exame de saúde e não comprovou má-fé.
STJ. 4ª Turma. EDcl nos EDcl no AREsp 567.144/PR, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 15/03/2016.

Plano de saúde
Não se justifica a recusa à cobertura de tratamento necessária à sobrevida do segurado, ao argumento de
se tratar de doença pré-existente, quando a administradora do plano de saúde não se precaveu mediante
realização de exames de admissão no plano ou prova inequívoca de má-fé a qual não ocorreu.
STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 998.163/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 21/02/2017.

Exceção à má-fé:
Como vimos, em regra, se o segurado omitir, de má-fé, que possuía alguma doença preexistente, a
seguradora poderá recusar a cobertura.
Existe, no entanto, uma exceção a essa regra. Há uma situação na qual mesmo que o segurado omita
doença preexistente, ainda assim ele terá direito à cobertura securitária. Trata-se da hipótese na qual essa
doença somente vem a se manifestar e exigir alguma providência por parte da seguradora muitos anos
após a assinatura do contrato. Neste caso, fica demonstrado que o contratante, mesmo apresentando a
doença, estava em boas condições de saúde. Veja:
(...) 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de não ser possível à seguradora eximir-se do
dever de pagamento da cobertura securitária sob a alegação de omissão de informações por parte do
segurado, se dele não exigiu exames médicos prévios à contratação do seguro. Precedentes.
1.1. Consoante cediço no STJ, a suposta má-fé do segurado (decorrente da omissão intencional de doença
preexistente) será, excepcionalmente, relevada quando, sem sofrer de efeitos antecipados, mantém vida
regular por vários anos, demonstrando que possuía razoável estado de saúde no momento da
contratação/renovação da apólice securitária. (...)
STJ. 4ª Turma. AgRg no REsp 1359184/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 06/12/2016.

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SEGURO
O contratante do seguro de vida em grupo não tem direito à renovação da apólice sem
a concordância da seguradora nem pode exigir a restituição dos prêmios pagos

Não é abusiva a cláusula contratual que prevê a possibilidade de não renovação automática
do seguro de vida em grupo por qualquer dos contratantes, desde que haja prévia notificação
da outra parte.
À exceção dos contratos de seguro de vida individuais, contratados em caráter vitalício ou
plurianual, nos quais há a formação de reserva matemática de benefícios a conceder, as
demais modalidades são geridas sob o regime financeiro de repartição simples, de modo que
os prêmios arrecadados do grupo de segurados ao longo do período de vigência do contrato
destinam-se ao pagamento dos sinistros ocorridos naquele período.
Dessa forma, nos contratos de seguro de vida em grupo não há direito à renovação da apólice
sem a concordância da seguradora ou à restituição dos prêmios pagos em contraprestação à
cobertura do risco no período delimitado no contrato.
Vale ressaltar que a seguradora pode decidir não mais renovar o contrato de seguro de vida,
mesmo que não comprove que houve desequilíbrio atuarial-financeiro. Trata-se de um
verdadeiro direito potestativo.
STJ. 2ª Seção. REsp 1.569.627-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 22/02/2018 (Info 622).

O que é o contrato de seguro?


No contrato de seguro, “o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse
legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados” (art. 757 do CC).
Em outras palavras, no contrato de seguro, uma pessoa física ou jurídica (chamada de “segurada”) paga
uma quantia denominada de “prêmio” para que uma pessoa jurídica (“seguradora”) assuma determinado
risco. Caso o risco se concretize (o que chamamos de “sinistro”), a seguradora deverá fornecer à segurada
uma quantia previamente estipulada (indenização).
Ex.: João celebra um contrato de seguro do seu veículo com a seguradora X e todos os meses paga R$
100,00 como prêmio; se, por exemplo, o carro for roubado (sinistro), a seguradora deverá pagar R$ 30 mil
a título de indenização para o segurado.

Nomenclaturas utilizadas nos contratos de seguro


Risco: é a possibilidade de ocorrer o sinistro. Ex.: risco de morte.
Sinistro: o sinistro é o risco concretizado. Ex.: morte.
Apólice (ou bilhete de seguro): é um documento emitido pela seguradora, no qual estão previstos os
riscos assumidos, o início e o fim de sua validade, o limite da garantia e o prêmio devido e, quando for o
caso, o nome do segurado e o do beneficiário.
Prêmio: é a quantia paga pelo segurado para que o segurador assuma o risco. O prêmio deve ser pago
depois de recebida a apólice. O valor do prêmio é fixado a partir de cálculos atuariais e o seu valor leva
em consideração os riscos cobertos.
Indenização: é o valor pago pela seguradora caso o risco se concretize (sinistro).

Feitos estes esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética:


João da Silva e outros ajuizaram ação contra a Caixa Seguradora S/A, alegando que são funcionários da Caixa
Econômica Federal e, nessa condição, firmaram com a seguradora ré contrato de seguro de vida em grupo.
Afirmam que os valores relativos aos prêmios do seguro sempre foram descontados diretamente em folha
de pagamento, razão pela qual nunca houve atraso da parte deles no cumprimento do contrato.
Sustentam que o contrato chegou ao fim e que a seguradora enviou carta aos requerentes comunicando
que não possuía interesse na renovação do pacto.

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Vale ressaltar que havia uma cláusula no contrato prevendo que o pacto tinha prazo determinado, sendo
possível a sua renovação automática, salvo se a seguradora ou segurado comunicasse o desinteresse nessa
renovação 30 dias antes do término da vigência.
Os autores argumentaram que essa cláusula seria abusiva e que a seguradora deveria ser obrigada a:
• renovar a apólice; ou
• restituir os prêmios pagos pelos segurados.

A tese dos autores foi acolhida pelo STJ?


NÃO.
Nos contratos de seguro de vida em grupo não há direito à renovação da apólice sem a concordância da
seguradora ou à restituição dos prêmios pagos em contraprestação à cobertura do risco no período
delimitado no contrato.
STJ. 2ª Seção. REsp 1.569.627-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 22/02/2018 (Info 622).

Contrato de seguro de vida


Por força do contrato de seguro de vida, a seguradora recebe uma contraprestação (prêmio) e, em troca,
garante interesse legítimo do segurado, relativo à sua pessoa, contra riscos predeterminados durante o
período de vigência do contrato.
Veja o que diz o Código Civil:
Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a
garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos
predeterminados.
(...)
Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado
não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.

Do contrato de seguro de vida é possível extrair duas características principais:


a) mutualismo das obrigações;
b) temporariedade contratual.

Mutualismo das obrigações


Mutualismo (ou mutualidade) no contrato de seguro significa que o custo do risco individual (ex: morrer,
ficar inválido etc.) será dissolvido solidariamente entre todos os “clientes” da seguradora.
Todos os contratantes do seguro pagam os prêmios a que se obrigam, mas só uma pequena parte irá
receber a indenização. Isso porque o sinistro não acontecerá para todos. Assim, o dinheiro pago por
aqueles cujo risco não se concretizou será utilizado também para custear a indenização que será paga aos
que sofreram o risco.
Veja como Carlos Roberto Gonçalves explica o tema:
“O mecanismo do contrato de seguro assenta-se no princípio da mutualidade dos segurados. A empresa
seguradora privada nada mais é do que uma intermediária que recolhe os prêmios pagos pelos segurados
e os utiliza para pagar as indenizações pelos sinistros ocorridos. Dessa forma, são os próprios milhares de
segurados que pagam as indenizações devidas. O prêmio é fixado de antemão com base em cálculos
atuariais, que se apoiam na análise das probabilidades. Os dados estatísticos mostram a incidência dos
sinistros num determinado risco e possibilitam ao analista estabelecer, com precisão, qual será a referida
incidência em futuro próximo. Com base nesses dados fixa o segurador a taxa de seguro, suficiente para
pagar todas as indenizações e ainda proporcionar-lhe um lucro razoável.” (Direito Civil brasileiro. Vol. 3.,
9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 398).

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Temporariedade do contrato de seguro de vida


Em regra, o contrato de seguro de vida é por prazo determinado.
A temporariedade dos contratos de seguro de vida existe pelo fato de que a seguradora precisa,
periodicamente, avaliar, por meio de cálculos atuarias, a higidez e a idoneidade do fundo formado pelas
arrecadações dos segurados a fim de se ter certeza que os recursos disponíveis serão suficientes para
cobrir as indenizações. Isso é chamado de adequação atuarial.
Assim, por exemplo, se os níveis de homicídio aumentam significativamente na região, isso deverá ser,
obrigatoriamente, levado em consideração no momento de se calcular o valor do prêmio pago pelo
segurado no contrato do seguro de vida. Se o contrato fosse, como regra, vitalício, essa análise não poderia
ser feita periodicamente.

Mas existe a possibilidade de o contrato de seguro de vida ser vitalício?


SIM. Existe a possibilidade de, excepcionalmente, o contrato de seguro de vida INDIVIDUAL ser vitalício.
No entanto, para que isso ocorra as partes deverão ajustar expressamente até porque as bases contratuais
serão diferenciadas tendo em vista que os cálculos atuariais deverão observar regime financeiro próprio.
O seguro de vida vitalício, ainda que expressa e excepcionalmente possa ser assim contratado, somente
admite a forma individual. Em outras palavras, não existe a possibilidade de contrato de seguro de vida
em grupo (coletivo) vitalício.

Se o risco não se concretizar durante o prazo de vigência do contrato, não há razão para devolver o prêmio
Em se tratando de contrato por prazo determinado, a obrigação da seguradora (garantir os riscos
combinados previamente) restringe-se ao período contratado.
Se o risco se concretizar durante o período contratado, a seguradora será responsável pelo pagamento da
respectiva cobertura.
Em contrapartida, se o risco não ocorrer durante o prazo de vigência do contrato, não significa que tenha
havido qualquer inadimplemento contratual por parte da seguradora. Logo, mesmo que o risco não se
concretize, o segurado não tem o direito de reaver os valores pagos ou sequer um percentual destes.
Se houvesse essa devolução, isso iria descaracterizar um dos pilares do contrato de seguro, que é
justamente o mutualismo.
Da mesma forma, o segurado não terá como exigir da seguradora que mantenha o vínculo contratual.

Cláusula que permite a não-renovação é válida


Assim, a cláusula contratual que autoriza a não renovação do contrato de seguro de vida em grupo,
concedida tanto para a seguradora como para o segurado, não configura procedimento abusivo, sendo
decorrente da própria natureza do contrato.
Esta cláusula encontra-se em perfeita harmonia com o princípio do mutualismo.

Nos contratos individuais vitalícios é possível a restituição da reserva já formada


Apenas nos contratos individuais, desde que vitalícios ou plurianuais, há a formação de provisão
matemática de benefícios a conceder, calculada atuariamente no início do contrato, a qual possibilita a
manutenção nivelada do prêmio, que permanece inalterado mesmo com o envelhecimento do segurado
e o aumento do risco. Por outro lado, em caso de resolução dessa espécie de contrato no curso de sua
vigência, cabe a restituição da reserva já formada aplicando-se a regra estabelecida no art. 796, parágrafo
único, do CC/2002, de modo a evitar o enriquecimento sem causa do segurador:
Art. 796. O prêmio, no seguro de vida, será conveniado por prazo limitado, ou por toda a vida do
segurado.
Parágrafo único. Em qualquer hipótese, no seguro individual, o segurador não terá ação para
cobrar o prêmio vencido, cuja falta de pagamento, nos prazos previstos, acarretará, conforme se
estipular, a resolução do contrato, com a restituição da reserva já formada, ou a redução do capital
garantido proporcionalmente ao prêmio pago.

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Nos contratos de seguro coletivos o regime financeiro é o da repartição simples


Nos contratos de seguro coletivos o prazo é determinado e o regime financeiro é o de repartição simples.
Os prêmios arrecadados do grupo de segurados ao longo do período de vigência do contrato destinam-se
ao pagamento dos sinistros ocorridos naquele período. Não se trata de contrato de capitalização.
Quando o contrato é encerrado, não importa quantas vezes tenha sido renovado, não há reserva
matemática vinculada a cada participante e, portanto, não há direito à renovação da apólice sem a
concordância da seguradora nem à restituição dos prêmios pagos em contraprestação à cobertura do risco
no período delimitado no contrato.
Assim, mesmo que o segurado tenha se mantido vinculado à apólice coletiva por décadas, não se formou
uma poupança, pecúlio ou plano de previdência, que lhe garantiria, ou a seus beneficiários, segurança na
velhice. Suas contribuições (prêmio), ano a ano, esgotaram-se na cobertura dos sinistros do grupo no
período, realizadas, como já enfatizado, pelo sistema de repartição simples.

ARBITRAGEM
Se a parte quiser arguir a nulidade da cláusula arbitral, deverá formular esse pedido, em
primeiro lugar, ao próprio árbitro, não sendo possível que proponha diretamente ação judicial

A previsão contratual de convenção de arbitragem enseja o reconhecimento da competência


do Juízo arbitral para decidir com primazia sobre o Poder Judiciário as questões acerca da
existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a
cláusula compromissória.
Ex: a empresa 1 celebrou contrato com a empresa 2; neste contrato há uma cláusula arbitral;
a empresa 2 notificou extrajudicialmente a empresa 1 cobrando o cumprimento do ajuste; a
empresa 1 ajuizou ação declaratória de falsidade alegando que a assinatura constante no
contrato é falsa e, portanto, o pacto seria nulo; esta ação deverá ser extinta sem resolução do
mérito (art. 485, VII, do CPC/2015); isso porque, nos termos do art. 8º, parágrafo único, da Lei
nº 9.307/96, a alegação de nulidade da cláusula arbitral, bem como do contrato que a contém,
deve ser submetida, em primeiro lugar, à decisão do próprio árbitro, sendo prematura a
apreciação pelo Poder Judiciário. Trata-se da aplicação do princípio da kompetenz-
kompetenz, que confere ao árbitro o poder de decidir sobre a própria competência.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.550.260-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas
Bôas Cueva, julgado em 12/12/2017 (Info 622).

Em que consiste a arbitragem


Arbitragem representa uma técnica de solução de conflitos por meio da qual os conflitantes aceitam que
a solução de seu litígio seja decidida por uma terceira pessoa, de sua confiança.
Vale ressaltar que a arbitragem é uma forma de heterocomposição, isto é, instrumento por meio do qual
o conflito é resolvido por um terceiro.

Regulamentação
A arbitragem, no Brasil, é regulada pela Lei nº 9.307/96, havendo também alguns dispositivos no CPC
versando sobre o tema.

Convenção de arbitragem
As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de
arbitragem (art. 3º).
Convenção de arbitragem é o gênero, que engloba duas espécies:
• a cláusula compromissória e
• o compromisso arbitral.

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Em que consiste a cláusula compromissória:


A cláusula compromissória, também chamada de cláusula arbitral, é...
- uma cláusula prevista no contrato,
- de forma prévia e abstrata,
- por meio da qual as partes estipulam que
- qualquer conflito futuro relacionado àquele contrato
- será resolvido por arbitragem (e não pela via jurisdicional estatal).

Exemplo:
"Cláusula 5.1.2 Eventuais controvérsias que porventura surgirem na interpretação ou execução deste
contrato serão resolvidas por meio de arbitragem, segundo a Lei nº 9.307/96 e o Código de Processo Civil
brasileiro (este aplicado de forma apenas subsidiária à Lei de Arbitragem e ao Regulamento da Câmara de
Arbitragem)."

A cláusula compromissória está prevista no art. 4º da Lei nº 9.307/96:


Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato
comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal
contrato.

Feitas estas considerações, imagine a seguinte situação hipotética:


A empresa C1 celebrou contrato de empréstimo com o banco.
Neste contrato de financiamento, a empresa D2 constou como garantidora da dívida, ou seja, em caso de
não pagamento, ela honraria o débito.
Vale ressaltar que, neste contrato havia a previsão de convenção de arbitragem, ou seja, existia uma
cláusula compromissória dizendo que qualquer conflito futuro relacionado com o ajuste deveria ser
resolvido por meio de arbitragem.
A empresa C1 deixou de pagar as parcelas do financiamento, razão pela qual o banco notificou
extrajudicialmente a empresa D2 afirmando que iria cobrar dela os valores.
Diante dessa situação, a empresa D2 ajuizou ação declaratória de falsidade documental com pedido de
exibição de documento argumentando que a assinatura constante no contrato teria sido falsificada e que
esse termo de garantia não foi assinado pelos representantes da empresa.
A petição inicial da ação foi instruída com um laudo documentoscópico de um perito particular que atesta
a falsificação.
O juiz da vara cível, para onde a ação foi distribuída, julgou extinto o processo, sem resolução do mérito,
sob o fundamento de que a controvérsia acerca da autenticidade da assinatura estaria sujeita
exclusivamente ao juízo arbitral, por força da cláusula arbitral presente no termo de garantia.
Em outras palavras, o juiz afirmou que caberia ao árbitro decidir sobre a validade do contrato
considerando que existe uma cláusula compromissória. Fundamentou sua sentença no art. 8º, parágrafo
único, da Lei nº 9.307/96.

Agiu corretamente o juiz?


SIM. Vamos entender com calma.

O Poder Judiciário pode decretar a nulidade de cláusula arbitral (compromissória) sem que essa questão
tenha sido apreciada anteriormente pelo próprio árbitro?
REGRA: NÃO.

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Segundo a Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/96), antes de judicializar a questão, a parte que deseja arguir a
nulidade da cláusula arbitral deve formular esse pedido ao próprio árbitro, nos termos do art. 8º, parágrafo
único:
Art. 8º (...) Parágrafo único. Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as
questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que
contenha a cláusula compromissória.

Assim, por expressa previsão legal, não pode a parte ajuizar ação anulatória para desconstituir acordo com
base na nulidade da cláusula compromissória ali presente antes de submeter o assunto ao árbitro.

Luiz Antônio Scavone Júnior explica esse art. 8º, parágrafo único:
“O significado do dispositivo, portanto, indica que qualquer alegação de nulidade do contrato ou da
cláusula arbitral, diante de sua existência e seguindo o espírito da lei, deve ser dirimida pela arbitragem e
não pelo Poder Judiciário.
A lei pretendeu, neste sentido, "fechar uma brecha" que permitiria às partes, sempre que alegassem a
nulidade da cláusula arbitral ou do contrato, ignorar o pacto de arbitragem e acessar o Poder Judiciário
para dirimir o conflito.
Em resumo, ainda que o conflito verse sobre a nulidade do próprio contrato ou da cláusula arbitral, a
controvérsia deverá ser decidida inicialmente pela arbitragem e não pelo Poder Judiciário, (...)” (Manual
de Arbitragem. 4ª ed. São Paulo: RT, 2010, p. 87).

Isso é conhecido como aplicação do princípio da kompetenz-kompetenz (competência-competência)


considerando que compete ao próprio árbitro dizer se ele é ou não competente para conhecer aquele
conflito. Assim, se a parte está alegando que a cláusula compromissória é nula e que a questão não deve
ser submetida à arbitragem, quem primeiro deverá examinar a questão é o próprio árbitro.

Confira o que a doutrina explica a respeito do princípio da kompetenz-kompetenz:


“(...) Tem, pois o árbitro competência para estatuir sobre sua própria competência (Kompetenz-
Kompetenz) e, assim, interpretar o contrato e a convenção de arbitragem. As partes, ao optarem pela
arbitragem, estão dispostas a submeter toda e qualquer controvérsia que resulte do contrato ao juízo
privado, do que inclui as controvérsias sobre a própria eficácia ou validade daquele instrumento. (...)".
(MARTINS, Pedro Batista. Cláusula Compromissória in Aspectos Fundamentais da Lei de Arbitragem, Rio
de Janeiro: Forense, 1999, p. 219)

Veja as palavras da Ministra Nancy Andrighi sobre o tema:


"A kompetenz-kompetenz (competência-competência) é um dos princípios basilares da arbitragem, que
confere ao árbitro o poder de decidir sobre a sua própria competência, sendo condenável qualquer
tentativa, das partes ou do juiz estatal, no sentido de alterar essa realidade. Em outras palavras, no embate
com as autoridades judiciais, deterá o árbitro preferência na análise da questão, sendo dele o benefício
da dúvida.
Dessa forma, a resolução de questões litigiosas fica a cargo do árbitro e, para isso, não exige a lei que o
ato jurídico seja válido ou imune a nulidades ou causas supervenientes de ineficácia, como se defende na
espécie. Ao contrário, a questão litigiosa pode ser justamente a ineficácia do ato jurídico. Nessas
circunstâncias, a jurisdição arbitral não se desloca, pois legalmente é o árbitro quem detém competência
para dirimir essas matérias assim como para decidir sobre sua própria competência.
Essa prioridade não apenas se perfila com os princípios que circundam o instituto da arbitragem e com a
sistemática introduzida pela Lei nº 9.307/96, que se censuram atos de protelação ou afastamento do rito
arbitral, como também assegura a proposta de tornar o procedimento, uma vez eleito pelas partes, uma
alternativa segura e incontornável de resolução de conflitos, limitando a atuação do Poder Judiciário à
execução da sentença arbitral." (MC 14.295/SP, DJe 13/06/2008).

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10


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Vale ressaltar que não haverá prejuízo à parte considerando que, mesmo se o árbitro entender que a
cláusula é válida (e julgar a arbitragem), essa questão da nulidade poderá ser apreciada pelo Poder
Judiciário em momento posterior. Isso porque, para fazer cumprir a sentença arbitral, o credor terá que
ajuizar uma execução judicial. Nesse momento, o devedor poderá se defender por meio de embargos à
execução alegando a nulidade da cláusula arbitral e, consequentemente, da sentença arbitral.

Nesse sentido é a jurisprudência do STJ:


Segundo a Lei de Arbitragem (art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 9.307/96), se a parte quiser arguir a
nulidade da cláusula arbitral, deverá formular esse pedido, em primeiro lugar, ao próprio árbitro, sendo
inadmissível que ajuíze diretamente ação anulatória.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.302.900-MG, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 9/10/2012.

As questões relacionadas à existência de cláusula compromissória válida para fundamentar a instauração


do Juízo arbitral devem ser resolvidas, com primazia, por ele, e não pelo Poder Judiciário.
Nos termos do art. 8º, parágrafo único, da Lei de Arbitragem, a alegação de nulidade da cláusula arbitral,
bem como do contrato que a contém, deve ser submetida, em primeiro lugar, à decisão do próprio árbitro,
sendo prematura a apreciação pelo Poder Judiciário.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.602.696-PI, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 09/08/2016.

Questões atinentes à existência, validade e eficácia da cláusula compromissória deverão ser apreciadas
pelo árbitro, a teor do que dispõem os arts. 8º, parágrafo único, e 20 da Lei n. 9.307/1996. Trata-se da
denominada kompetenz-kompetenz (competência-competência), que confere ao árbitro o poder de
decidir sobre a própria competência, sendo condenável qualquer tentativa das partes ou do juiz estatal
de alterar essa realidade.
STJ. Corte Especial. SEC 12.781/EX, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 07/06/2017.

EXCEÇÃO:
O STJ relativizou esta regra e decidiu que se a nulidade da cláusula compromissória for muito evidente,
será possível ao Poder Judiciário declarar a sua invalidade mesmo sem que este pedido tenha sido
formulado, em primeiro lugar, ao próprio árbitro. Veja trecho da ementa e fique atento para a expressão
"compromisso arbitral patológico", que poderá ser cobrada em sua prova:
O Poder Judiciário pode, nos casos em que prima facie é identificado um compromisso arbitral
"patológico", isto é, claramente ilegal, declarar a nulidade dessa cláusula, independentemente do estado
em que se encontre o procedimento arbitral.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.602.076-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/9/2016 (Info 591).

Trata-se de exceção à regra geral de prioridade do Juízo arbitral. Esta exceção é também admitida por
alguns doutrinadores:
“(...) A doutrina, de qualquer forma, ainda não tem posicionamento firme no sentido de identificar com
exatidão quais os limites dos poderes investigativos do juiz acerca da invalidade da convenção de
arbitragem. Emmanuel Gaillard sugere que o juiz só possa declarar a invalidade da convenção arbitral
quando o vício for reconhecível prima facie, ou seja, de pronto, sem necessidade de maior exame . Parece
que o ilustre professor parisiense tem razão, já que a limitação da cognição do juiz apenas a aspectos que
desde logo pode detectar, sem maiores indagações (cognição sumária, portanto), harmoniza-se com o
princípio da Kompetenz-Kompetenz adotado pela Lei. Se assim for, poderia o juiz togado reconhecer a
invalidade de um compromisso arbitral a que falte qualquer de seus requisitos essenciais, ou a
impossibilidade de fazer valer uma convenção arbitral que diga respeito a uma questão de direito
indisponível; mas não poderia determinar o prosseguimento da instrução probatória para verificar o
alcance da convenção arbitral ou para aferir se algum dos contratantes teria sido forçado ou induzido a
Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11
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celebrar o convênio arbitral”. (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. 3ª ed. São Paulo: Atlas,
2009, p. 177)

Voltando ao caso concreto:


O STJ entendeu que, neste caso concreto, deveria ser aplicada a regra geral, ou seja, a competência do
próprio árbitro para decidir sobre a validade do contrato.
No caso dos autos, a empresa D2 busca o reconhecimento da invalidade do contrato de garantia que se
encontra revestido de aparente validade. Assim, apenas por meio de exames periciais grafotécnicos
mostra-se possível verificar a veracidade dos documentos e das assinaturas nele apostas. Logo, não se
pode dizer que se está diante de vício flagrante, reconhecível prima facie, sem necessidade de maior
exame ou dilação probatória.

Em suma:
A previsão contratual de convenção de arbitragem enseja o reconhecimento da competência do Juízo
arbitral para decidir com primazia sobre o Poder Judiciário as questões acerca da existência, validade e
eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.550.260-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, julgado em 12/12/2017 (Info 622).

PODER FAMILIAR
Discussão sobre a possibilidade de o filho ajuizar ação de exigir contas
em relação aos valores recebidos pelos pais em nome do menor

O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar, são usufrutuários dos bens dos filhos
(usufruto legal), bem como têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua
autoridade, nos termos do art. 1.689, incisos I e II, do Código Civil.
Por essa razão, em regra, não existe o dever de prestar contas acerca dos valores recebidos
pelos pais em nome do menor, durante o exercício do poder familiar. Isso porque há
presunção de que as verbas recebidas tenham sido utilizadas para a manutenção da
comunidade familiar, abrangendo o custeio de alimentação, saúde, vestuário, educação, lazer,
entre outros.
Excepcionalmente, admite-se o ajuizamento de ação de prestação de contas pelo filho, sempre
que a causa de pedir estiver fundada na suspeita de abuso de direito no exercício desse poder.
Assim, a ação de prestação de contas ajuizada pelo filho em desfavor dos pais é possível
quando a causa de pedir estiver relacionada com suposto abuso do direito ao usufruto legal e
à administração dos bens dos filhos.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.623.098-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 13/03/2018 (Info 622).

Imagine a seguinte situação hipotética:


Lucas é filho de João e Maria.
Quando Lucas tinha 12 anos, seu pai faleceu.
João deixou uma pensão por morte, que foi dividida igualmente entre Lucas (filho) e Maria (viúva).
Ficou ajustado que a parte de Lucas deveria ser depositada todos os meses em conta bancária aberta em
seu nome e que este dinheiro deveria ser movimento por Maria para pagamento de despesas relacionadas
com o menor.
Ao completar 18 anos, Lucas buscou ter acesso à quantia que deveria estar depositada em seu nome,
quando descobriu que Maria sacou e movimentou os valores, utilizando a conta como se fosse sua,

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12


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emitindo cheques e pagando contas próprias, ou seja, fazendo gastos que não eram em benefício de Lucas.
Este argumentou, ainda, que, apesar de ter direito a essa verba, sempre viveu com dificuldades, tendo
sofrido abandono material por parte da mãe.
Diante disso, Lucas ajuizou ação de exigir contas de todo o período em que sua mãe administrou os
depósitos, isto é, entre a data do falecimento de seu pai e a data em que atingiu a maioridade.
O juízo de primeiro grau, ainda na vigência do CPC/1973, julgou extinto o processo, sem resolução de
mérito, sob o fundamento de impossibilidade jurídica do pedido (art. 267, VI), considerando que não se
pode pedir a prestação de contas a quem não tem o dever de prestá-las.
O magistrado alegou que os pais, detentores do poder familiar, são usufrutuários dos bens dos filhos
impúberes e responsáveis pela sua administração, nos termos do art. 1.689 do Código Civil:
Art. 1.689. O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar:
I - são usufrutuários dos bens dos filhos;
II - têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade.

Assim, como mãe e detentora do exercício do poder familiar, Maria estaria livre, por disposição legal, para
administrar os bens de seu filho, revelando-se, assim, ausente o dever de prestar contas.

A discussão foi, portanto, a seguinte: esse pedido é juridicamente possível?


SIM.
A ação de prestação de contas ajuizada pelo filho em desfavor dos pais é possível quando a causa de
pedir estiver relacionada com suposto abuso do direito ao usufruto legal e à administração dos bens
dos filhos.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.623.098-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 13/03/2018 (Info 622).

A possibilidade jurídica do pedido era uma condição da ação no CPC/1973.


O CPC/2015 não mais prevê a possibilidade jurídica como uma das condições da ação, passando esse
requisito a integrar questão de mérito.
CPC/1973 CPC/2015
Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
VI - quando não concorrer qualquer das condições da VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse
ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das processual;
partes e o interesse processual;

Nos termos do art. 1.689 do Código Civil, extrai-se que o pai e a mãe, enquanto no exercício do poder
familiar, são usufrutuários dos bens dos filhos (usufruto legal), bem como têm a administração dos bens
dos filhos menores sob sua autoridade.
Por esse motivo, em regra, não existe o dever de prestar contas acerca dos valores recebidos pelos pais
em nome do menor durante o exercício do poder familiar. Isso porque há presunção de que as verbas
recebidas tenham sido utilizadas para a manutenção da comunidade familiar, abrangendo o custeio de
alimentação, saúde, vestuário, educação, lazer, entre outros.
Ocorre que esse munus deve ser exercido sempre visando atender ao princípio do melhor interesse do
menor, introduzido em nosso sistema jurídico como corolário da doutrina da proteção integral,
consagrada pelo art. 227 da Constituição Federal, o qual deve orientar a atuação tanto do legislador
quanto do aplicador da norma jurídica, vinculando-se o ordenamento infraconstitucional aos seus
contornos.
Em outras palavras, o fato de os pais serem usufrutuários e administradores dos bens dos filhos menores,
em razão do poder familiar, não lhes confere liberdade total para utilizar, como quiserem, o patrimônio
de seus filhos, o qual, a rigor, não lhes pertence.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13


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Não por outra razão que o art. 1.691 do Código Civil determina que “não podem os pais alienar, ou gravar
de ônus real, os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites
da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia
autorização do juiz”.
Assim, partindo-se da premissa de que o poder dos pais, em relação ao usufruto e administração dos bens
de filhos menores, não é absoluto, deve-se permitir, em caráter excepcional, o ajuizamento da ação de
prestação de contas pelo filho, sempre que a causa de pedir estiver fundada na suspeita de abuso de
direito no exercício desse poder, como ocorrido na espécie.
Ora, inviabilizar, de plano, o ajuizamento da ação de prestação de contas nesse tipo de situação, sob o
fundamento de impossibilidade jurídica do pedido para toda e qualquer hipótese, acabaria por cercear o
direito do filho de questionar judicialmente eventual abuso de direito de seus pais no exercício dos
encargos previstos no art. 1.689 do Código Civil, contrariando a própria finalidade da norma em comento,
isto é, de preservação dos interesses do menor.

Flexibilização do procedimento
Vale ressaltar que deverá ser flexibilizada a forma de prestação das contas, pois não seria razoável admitir,
sobretudo em razão da excepcionalidade do caso, que a mãe do autor tenha um “livro-caixa”
especificando todas as receitas e despesas tidas com seu filho.
Assim, neste caso concreto, basta que a ré demonstre, com elementos mínimos, que garantiu os direitos
básicos de seu filho, não tendo o abandonado materialmente.

INVENTÁRIO
Possibilidade de a parte já ingressar direto na via ordinária por entender que o juízo do
inventário não é competente para a demanda

O art. 612 do CPC/2015 prevê o seguinte:


Art. 612. O juiz decidirá todas as questões de direito desde que os fatos relevantes estejam
provados por documento, só remetendo para as vias ordinárias as questões que dependerem
de outras provas.
A parte, antevendo que o pedido que será formulado não se enquadra na competência do juízo
do inventário, já pode ajuizar a ação autônoma no juízo competente, aplicando-se o art. 612.
Assim, é cabível o ajuizamento de ação autônoma perante o juízo cível quando se constatar,
desde logo, a necessidade de dilação probatória incompatível com o rito especial do
inventário.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.480.810-ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/03/2018 (Info 622).

Inventário
Inventário é o processo instaurado com o objetivo de se apurar quais foram os bens deixados pelo falecido
e, após isso, realizar a partilha entre os herdeiros.
Consiste, portanto, na descrição pormenorizada dos bens da herança, tendente a possibilitar o
recolhimento de tributos, o pagamento de credores e, por fim, a partilha.

Judicial ou extrajudicial
O inventário pode ser:
a) judicial: realizado por processo judicial decidido por sentença.
b) extrajudicial: realizado por meio de escritura pública lavrada pelo tabelião de notas.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14


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O inventário extrajudicial somente pode ser realizado se:


a) os herdeiros forem capazes;
b) não existir testamento;
c) os herdeiros estiverem de acordo com a divisão dos bens.

CC/2002. Art. 2.015. Se os herdeiros forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura
pública, termo nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo juiz.

CPC/2015. Art. 610 (...)


§ 1º Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura
pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para
levantamento de importância depositada em instituições financeiras.

Vale ressaltar que o inventário extrajudicial é facultativo, de forma que os herdeiros, mesmo preenchendo
todos os requisitos, podem escolher realizar o inventário judicial.
O julgado comentado trata sobre inventário judicial.

Questões que podem ser solucionadas no processo do inventário judicial


O juízo que conduz o processo do inventário poderá ter que decidir questões jurídicas relacionadas com a
definição de quais bens integram a herança e sobre quem são os herdeiros.

O juízo do inventário poderá decidir toda e qualquer questão jurídica relacionada com a herança ou com
os herdeiros?
NÃO.
• O juízo do inventário decide todas as questões que dependerem apenas de prova documental.
• Se os fatos precisarem ser comprovados por outros meios de prova (exs: testemunha, perícia etc.),
então, neste caso, deverão ser decididas pelas vias ordinárias (ex: vara cível, vara de família etc, a
depender da lei de organização judiciária). É o que prevê o art. 612 do CPC/2015:
Art. 612. O juiz decidirá todas as questões de direito desde que os fatos relevantes estejam
provados por documento, só remetendo para as vias ordinárias as questões que dependerem de
outras provas.

Essa regra existe porque o procedimento especial de inventário não foi feito para nele haver dilação
probatória. As provas produzidas e analisadas são apenas documentais.
Vale ressaltar que se a questão envolver tema jurídico de alta complexidade, mas que possa ser decidido
apenas com base em prova documental, neste caso deverá ser decidida no juízo do inventário.

Qual é o recurso cabível contra a decisão do juiz que se nega a decidir uma questão no juízo do inventário
e remete o julgamento para as vias ordinárias?
Agravo de instrumento, nos termos do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015:
Art. 1.015 (...)
Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias
proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de
execução e no processo de inventário.

Feitos estes esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética:


João faleceu e deixou dois filhos como herdeiros (Guilherme e Sarah).
Foi aberto inventário judicial na vara de sucessões.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15


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Guilherme entendeu que sua irmã (Sarah) havia dilapidado o dinheiro do pai no período em que estava
cuidando dele, nos últimos momentos de vida do patriarca.
Diante disso, Guilherme ajuizou, na vara cível, uma ação de exigir contas contra Sarah.
Ao ser citada na ação de exigir contas, Sarah arguiu a incompetência da vara cível afirmando que há um
processo de inventário tramitando na vara de sucessões e que este juízo é que seria competente para
decidir o tema.
Sarah argumentou que o art. 612 do CPC/2015 é um comando destinado ao magistrado e que somente
ele é que pode decidir se remete ou não o tema para as vias ordinárias, não podendo a parte, desde logo,
propor diretamente ação autônoma. Assim, para Sarah, Guilherme deveria ter feito o pedido de prestação
de contas no juízo do inventário e, se este entendesse que o tema exigiria mais provas, remeteria as partes
para as vias ordinárias.

A tese de Sarah foi acolhida pelo STJ? Havendo questão de alta indagação no inventário, a remessa das
partes às vias ordinárias para apuração dos fatos de maior complexidade é uma tarefa exclusiva do
magistrado ou a parte, antevendo a questão de alta indagação, pode ajuizar desde logo uma ação
autônoma em outro juízo que não o do inventário?
A tese de Sarah não foi acolhida.
É cabível o ajuizamento de ação autônoma perante o juízo cível quando se constatar, desde logo, a
necessidade de dilação probatória incompatível com o rito especial do inventário.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.480.810-ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/03/2018 (Info 622).

O fato de a parte, vislumbrando desde logo a necessidade de uma atividade instrutória diferenciada e
ampla, propor ação autônoma em juízo distinto do inventário não acarreta nulidade de nenhuma espécie.
Trata-se, ao contrário, de medida que atende aos princípios da celeridade e da economia processual.
O art. 984 do CPC/1973 (atual art. 612 do CPC/2015) não proíbe a parte de buscar, pelas vias ordinárias, o
acolhimento de pretensão incompatível com o rito do inventário.
O que esse artigo diz é apenas que, se a parte fizer um pedido que envolva uma questão de alta indagação
no juízo do inventário, deverá o magistrado remetê-la às vias ordinárias. Não está dito, todavia, que está
excluída a possibilidade de a parte deduzir a sua pretensão de modo autônomo, inclusive porque o juízo
cível também deve examinar a sua própria competência, sendo-lhe lícito, por exemplo, reconhecer que a
questão a ele submetida não era de alta indagação e que, em razão disso, a competência era do juízo
universal do inventário.
Admitir a tese defendida pela requerida (Sarah) significa dizer que a parte, mesmo ciente da complexidade
da controvérsia e da necessidade de ampla instrução, estaria obrigada a deduzir a sua pretensão perante
o juízo incompetente apenas para ter uma resposta negativa e, somente então, ingressar com a ação no
juízo correto. Trata-se de raciocínio que fere os princípios da razoável duração do processo, da celeridade,
e da economia processual.

SUCESSÃO DE COMPANHEIRO
Se o falecido deixou apenas companheira (sem ascendentes ou descendentes),
ela herdará a totalidade da herança

Importante!!!
Na falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge ou
companheiro sobrevivente, não concorrendo com parentes colaterais do de cujus.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.357.117-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/03/2018 (Info 622).

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16


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Imagine a seguinte situação hipotética:


João e Maria viviam em união estável há mais de 20 anos.
João faleceu.
Vale ressaltar que os pais e avós de João já eram falecidos e que ele não teve filhos.
Em outras palavras, João morreu sem deixar descendentes e ascendentes.
João era muito rico e deixou um grande patrimônio.
Pedro, irmão de João, ingressou com um pedido no juízo do inventário requerendo 2/3 da herança deixada
pelo seu colateral, com base no que prevê o art. 1.790, III, do Código Civil:
Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens
adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída
ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a
cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

O pedido de João deverá ser aceito?


NÃO. Pedro não tem direito à herança.

Mas como não tem direito? E o art. 1.790, III, do CC?


O art. 1.790 do Código Civil não é válido. O STF entendeu que este artigo é inconstitucional e que, portanto,
não deve ser aplicado. Veja:
No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a diferenciação de regimes sucessórios entre
cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829
do Código Civil.
STF. Plenário. RE 646721/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso e RE 878694/MG,
Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 10/5/2017 (repercussão geral) (Info 864).

É inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser


aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.332.773-MS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27/6/2017 (Info 609).

O art. 1.790 do CC é inconstitucional porque viola:


• o princípio da igualdade que deve existir entre casamento e união estável;
• a dignidade da pessoa humana;
• o princípio da proporcionalidade (na modalidade de proibição à proteção deficiente) e
• o princípio da vedação ao retrocesso.

Já que o art. 1.790 é inconstitucional, o que se deve fazer no caso de sucessão de companheiro? Quais
as regras que deverão ser aplicadas para a partilha dos bens de João?
A união estável deve receber o mesmo tratamento conferido ao casamento. Logo, em caso de sucessão
causa mortis do companheiro (como foi o caso de João), deverão ser aplicadas as mesmas regras da
sucessão causa mortis do cônjuge, regras essas que estão previstas no art. 1.829 do CC. Em outras
palavras, mesmo João e Maria sendo companheiros (união estável), devem ser aplicadas as regras de
sucessão como se eles fossem casados. Tais regras estão no art. 1.829 do CC:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17


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I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge* sobrevivente, salvo se casado este com o
falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640,
parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado
bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge*;
III - ao cônjuge* sobrevivente;
IV - aos colaterais.

* Pela decisão do STF, onde se lê: “cônjuge”, deve-se agora ler: “cônjuge ou companheiro(a)”.

Pelas regras do art. 1.829, se o falecido morreu sem deixar descendentes (filhos, netos etc.) ou
ascendentes (pais, avós etc.), o cônjuge/companheiro terá direito à totalidade da herança, sem ter que
repartir nada com os demais parentes colaterais (como irmãos, tios, sobrinhos etc.).
Isso significa dizer que, como João deixou companheira, a situação se amolda ao inciso III do art. 1.829 do
CC acima transcrito.
Diante disso, Pedro (irmão do falecido, portanto, colateral) não terá direito a nada, salvo se não houvesse
companheira, considerando que, neste caso, o fato se enquadraria no inciso IV do art. 1.829.

Resumindo:
Na falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge ou
companheiro sobrevivente, não concorrendo com parentes colaterais do de cujus.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.357.117-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/03/2018 (Info 622).

DIREITO DO CONSUMIDOR

APLICAÇÃO DO CDC
Não se aplica o CDC ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão

Súmula 608-STJ: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde,
salvo os administrados por entidades de autogestão.
STJ. 2ª Seção. Aprovada em 11/04/2018, DJe 17/04/2018.

Plano de saúde de autogestão


Planos de saúde de autogestão (também chamados de planos fechados de saúde) são criados por órgãos,
entidades ou empresas para beneficiar um grupo restrito de filiados com a prestação de serviços de saúde.
Tais planos são mantidos por instituições sem fins lucrativos e administrados paritariamente, de forma
que no seu conselho deliberativo ou de administração, há representantes do órgão ou empresa
instituidora e também dos associados ou usuários.
O objetivo desses planos fechados é baratear para os usuários o custo dos serviços de saúde, tendo em
vista que não visam ao lucro.
Exemplo: CASSI (Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil).

Segundo a Resolução Normativa 137, da ANS, de 14/11/2006, a operadora de autogestão é...


(...) a pessoa jurídica de direito público ou privado que, diretamente ou por intermédio de entidade pública
ou privada patrocinadora, instituidora ou mantenedora, administra plano coletivo de assistência à saúde
destinado exclusivamente a pessoas (e seus dependentes) a ela ligadas por vínculo jurídico ou estatutário,

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18


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ou aos participantes (e seus dependentes) de associações, fundações, sindicatos e entidades de classes,


nos termos dos incisos I, II e III e § 2º, do art. 2º.

A relação entre a empresa de plano de saúde constituída sob a modalidade de autogestão e os seus
filiados é regida pelo Código de Defesa do Consumidor?
NÃO.
Não se aplica o CDC às relações existentes entre operadoras de planos de saúde constituídas sob a
modalidade de autogestão e seus filiados.
STJ. 2ª Seção. REsp 1.285.483-PB, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/6/2016 (Info 588).

As operadoras de planos de saúde constituídas sob a modalidade de autogestão possuem inúmeras


diferenças em relação às operadoras comerciais de plano de saúde. Confira as principais distinções:
Planos de saúde comerciais
Planos de saúde de autogestão
(inclui-se aqui as cooperativas)
Operam em regime de mercado. Não operam em regime de mercado.
Buscam auferir lucro com as contribuições Não têm objetivo de lucro.
vertidas pelos participantes (proveito econômico).
Os assistidos não participam da gestão do plano. Os assistidos participam da gestão do plano.
São comercializados para o público em geral. São disponibilizados para um grupo restrito de
pessoas que possuem alguma relação com o plano.
Exs: Bradesco Saúde, Sulamérica, Unimed. Exs: CASSI, GEAP, ASSEFAZ.

Por conta dessas diferenças, os atos regulamentares da ANS conferem tratamento diferenciado para os
planos de saúde de autogestão, com a finalidade de atender às características próprias dessa modalidade
de operadora, possibilitando a redução dos custos de sua manutenção, cujos serviços são prestados, não
mediante contraprestação pecuniária com a finalidade de obtenção de lucro, mas a partir de contribuições
dos participantes calculadas, em regra, com base nos seus salários/aposentadorias etc., observando-se,
com isso, os princípios do mutualismo e da solidariedade.

Por essas razões, as regras do CDC não se aplicam às relações envolvendo entidades de planos de saúde
constituídas sob a modalidade de autogestão. Isso porque tais entidades não oferecem serviços no
mercado e não exercem empresa com o intuito de lucro, razão pela qual não se lhes aplica o conceito de
fornecedor estabelecido no art. 3º, § 2º do CDC.

O tratamento legal a ser dado na relação jurídica entre os associados e os planos de saúde de autogestão,
os chamados planos fechados, não pode ser o mesmo dos planos comuns, sob pena de se criar prejuízos
e desequilíbrios que, se não inviabilizarem a instituição, acabarão elevando o ônus dos demais associados,
desrespeitando normas e regulamentos que eles próprios criaram para que o plano se viabilize (STJ. 3ª
Turma. REsp 1121067/PR, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 21/06/2011).

Cancelamento da súmula 469 do STJ


O enunciado 469 do STJ dizia o seguinte:
Súmula 469-STJ: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.

Na mesma sessão que aprovou a Súmula 608, o STJ decidiu cancelar o enunciado 469, considerando que
ele não excepcionava os planos de saúde de autogestão. Assim, a Súmula 608, por ser mais completa, veio
substituir o enunciado 469, que está cancelado.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

GRATUIDADE DA JUSTIÇA
Possibilidade de concessão de gratuidade da justiça a estrangeiros não residentes no Brasil

Importante!!!
Novo CPC
O estrangeiro residente no Brasil tem direito à gratuidade da justiça?
SIM. O estrangeiro residente no Brasil possui direito à gratuidade da justiça. Isso é previsto no
CPC/2015 e também já era garantido na Lei nº 1.060/50.

E o estrangeiro não residente no Brasil?


Lei 1.060/50: Não tinha direito. Só poderia ser deferida a gratuidade da justiça para
estrangeiros residentes no Brasil (art. 2º).
CPC/2015: possui o direito. Atualmente, pode ser deferida a gratuidade da justiça para
estrangeiros residentes ou não-residentes no Brasil (art. 98).
A gratuidade da justiça passou a poder ser concedida a estrangeiro não residente no Brasil
após a entrada em vigor do CPC/2015.
STJ. Corte Especial. Pet 9.815-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 29/11/2017 (Info 622).

Garantia de assistência jurídica integral e gratuita


A CF/88 prevê a garantia da assistência jurídica integral e gratuita em seu art. 5º, LXXIV: “o Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.
Esse dispositivo constitucional consagra duas garantias:
II – Gratuidade da justiça
I – Assistência jurídica integral e gratuita
(Assistência Judiciária Gratuita – AJG).
Fornecimento pelo Estado de orientação e defesa Isenção das despesas que forem necessárias para
jurídica, de forma integral e gratuita, a ser que a pessoa necessitada possa defender seus
prestada pela Defensoria Pública, em todos os interesses em um processo judicial.
graus, aos necessitados (art. 134 da CF). Era regulada pela Lei nº 1.060/50, mas o CPC/2015
Regulada pela Lei Complementar 80/94. passou a tratar sobre o tema, revogando quase
toda essa lei.

Quem tem direito à gratuidade da justiça?


Tem direito à gratuidade da justiça a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de
recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios (art. 98 do CPC/2015).

Quem está abrangido por ela?


• pessoas físicas (brasileiras ou estrangeiras);
• pessoas jurídicas (brasileiras ou estrangeiras).

O estrangeiro residente no Brasil tem direito à gratuidade da justiça?


SIM. O estrangeiro residente no Brasil possui direito à gratuidade da justiça. Isso é previsto no CPC/2015
e também já era garantido na Lei nº 1.060/50.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20


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E o estrangeiro NÃO RESIDENTE no Brasil?


Lei 1.060/50 CPC/2015
Não tinha direito. Possui o direito. Atualmente, pode ser deferida a
Só poderia ser deferida a gratuidade da justiça gratuidade da justiça para estrangeiros residentes
para estrangeiros residentes no Brasil. ou não-residentes no Brasil.
Art. 2º Gozarão dos benefícios desta Lei os Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou
nacionais ou estrangeiros residentes no país, que estrangeira, com insuficiência de recursos para
necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar pagar as custas, as despesas processuais e os
ou do trabalho. (Revogado pela Lei 13.105/2015) honorários advocatícios tem direito à gratuidade
da justiça, na forma da lei.

A gratuidade da justiça passou a poder ser concedida a estrangeiro não residente no Brasil após a
entrada em vigor do CPC/2015.
STJ. Corte Especial. Pet 9.815-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 29/11/2017 (Info 622).

E se o pedido de gratuidade foi negado pelo estrangeiro não residente na época do art. 2º da Lei nº
1.060/50 e o processo perdurou durante o CPC/2015? Exemplo:
Em 2015, antes do novo CPC, Juan, nacional da Colômbia, residente em Bogotá, propôs ação no Brasil e
requereu a concessão dos benefícios da gratuidade da justiça.
O pedido foi negado pelo fato de ele não ser residente no Brasil, conforme exigia o art. 2º da Lei nº 1.060/50.
Juan não se conformou e recorreu contra a decisão.
Antes que o TJ julgasse o recurso, entrou em vigor o CPC/2015.
O TJ poderá aplicar a nova regra do art. 98 e conceder a gratuidade da justiça?
SIM. Isso porque se trata de norma de direito processual, portanto, a sua incidência é imediata, aplicando-
se aos processos em curso, consoante dispõe o artigo 14 do CPC/2015:
(...) 1. O artigo 2º da Lei 1.060/50 fora revogado pelo Novo Código de Processo Civil, cuja matéria passou
a ser disciplinada no artigo 98 do CPC/2015 (...)
1.1. Trata-se de norma de direito processual, portanto, a sua incidência é imediata, aplicando-se aos
processos em curso, consoante dispõe o artigo 14 do CPC/2015.
2. Em que pese à época da apreciação da matéria pelo Tribunal de piso, a legislação em vigor não prever
a possibilidade de concessão da assistência judiciária ao estrangeiro residente no exterior, com a vigência
das novas regras processuais passou-se a admitir tal hipótese.
2.1. O caput do artigo 98 do Código de Processo Civil vigente ampliou o rol dos sujeitos que podem ser
beneficiados pela concessão da assistência judiciária, em relação ao disposto no revogado artigo 2º da Lei
1.060/50. Portanto, não há qualquer impeditivo legal à pessoa estrangeira residente no exterior de
postular a assistência judiciária gratuita e ter deu pedido apreciado pelo juízo. (...)
STJ. 4ª Turma. REsp 1225854/RS, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 25/10/2016.

Assim, negado o pedido de gratuidade de justiça, com base no art. 2º da Lei nº 1.060/50, vigente à época,
o estrangeiro não residente no Brasil pode voltar a formulá-lo, já sob a vigência do atual CPC.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 21


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DIREITO PENAL

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
Súmula 606-STJ

Súmula 606-STJ: Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão


clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza o fato típico previsto no
art. 183 da Lei n. 9.472/1997.
STJ. 3ª Seção. Aprovada em 11/04/2018, DJe 17/04/2018.

Imagine a seguinte situação hipotética:


Os fiscais da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) constataram que João mantinha um
provedor de internet, via rádio, no qual os clientes pagavam a ele mensalmente e recebiam em suas casas
o sinal da internet.
Ocorre que João não tinha autorização da ANATEL para exploração desse serviço.
Foi, então, lavrado auto de infração e encaminhada notícia do fato ao MPF.
O Procurador da República denunciou João pela prática do delito do art. 183 da Lei nº 9.472/97:
Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação:
Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa
de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Segundo a tese do MPF, o provedor de acesso à Internet via radiofrequência (internet via rádio)
desenvolve dois serviços:
• um serviço de telecomunicações (Serviço de Comunicação Multimídia); e
• um Serviço de Valor Adicionado (Serviço de Conexão à Internet).

Dessa forma, a chamada “internet via rádio” pode ser considerada também um serviço de telecomunicação.

A jurisprudência acolhe a tese do MPF? A conduta de transmitir sinal de internet, via rádio, como se fosse
um provedor de internet, sem autorização da ANATEL, configura algum crime? Amolda-se ao art. 183 da
Lei nº 9.472/97?
SIM. É pacífico no STJ que a transmissão clandestina de sinal de internet, via radiofrequência, sem
autorização da ANATEL, caracteriza, em tese, o delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97.
Não há se falar em atipicidade do delito pela previsão de que se trata de serviço de valor adicionado, uma
vez que referida característica não exclui sua natureza de efetivo serviço de telecomunicação.
STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1077499/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 26/09/2017.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 971.115/PA, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 27/04/2017.

E no STF?
Apesar de existir um recente julgado em sentido contrário (STF. 1ª Turma. HC 127978, Rel. Min. Marco
Aurélio, julgado em 24/10/2017. Info 883), o entendimento que prevalece no STF é o mesmo do STJ. Veja:
O desenvolvimento clandestino de atividade de transmissão de sinal de internet, via rádio, comunicação
multimídia, sem a autorização do órgão regulador, caracteriza, por si só, o tipo descrito no artigo 183 da Lei
nº 9.472/97, pois se trata de crime formal, inexigindo, destarte, a necessidade de comprovação de efetivo
prejuízo.
STF. 1ª Turma. HC 152118 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 07/05/2018.

Em sua defesa, João invocou o princípio da insignificância, considerando que seu provedor operava com
a potência de 0,5 Watts, que é muito baixa. Tal alegação é aceita pela jurisprudência majoritária?
Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 22
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NÃO. Não é possível a aplicação do princípio da insignificância no crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97.
Isso porque a instalação de estação clandestina de radiofrequência, sem autorização, já é, por si, suficiente
para comprometer a segurança, a regularidade e a operabilidade do sistema de telecomunicações do país,
não podendo, portanto, ser vista como uma lesão inexpressiva.
Diante do entendimento pacificado, o STJ editou a Súmula 606.
Essa é também a posição do STF: 1ª Turma. HC 118400/RO, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em
04/10/2016 (Info 842).

O acusado argumentou também que não deveria ser condenado, considerando que não ficou provado
que ele causou prejuízo, seja para os clientes, seja para os serviços de telecomunicações. Essa alegação
é acolhida pelos Tribunais?
NÃO. O delito do art. 183 da Lei nº 9.427/97 é crime de perigo abstrato. Isso significa que, para a sua
consumação, basta que alguém desenvolva de forma clandestina as atividades de telecomunicações, sem
necessidade de demonstrar prejuízo concreto para o sistema de telecomunicações (STJ. 5ª Turma. AgRg
no REsp 1560335/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 21/06/2016).
Confira julgado que sintetiza esses entendimentos:
(...) 1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou sua jurisprudência no sentido de que a transmissão de
sinal de internet via rádio sem autorização da ANATEL caracteriza o fato típico previsto no artigo 183 da
Lei nº 9.472/97, ainda que se trate de serviço de valor adicionado de que cuida o artigo 61, § 1º, da mesma
lei.
2. É também pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a instalação de estação de
radiodifusão clandestina é delito de natureza formal de perigo abstrato que, por si só, é suficiente para
comprometer a segurança, a regularidade e a operabilidade do sistema de telecomunicações do país, não
tendo aplicação o princípio da insignificância mesmo que se trate de serviço de baixa potência. (...)
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1566462/SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 15/03/2016.

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
Qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários e descaminho?

Importante!!!
Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando
o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor
do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n.
75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.688.878-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 28/02/2018 (recurso
repetitivo) (Info 622).
STF. 2ª Turma. HC 155347, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 17/04/2018.

O princípio da insignificância pode ser aplicado no caso de crimes tributários e no descaminho?


SIM. É plenamente possível que incida o princípio da insignificância tanto nos crimes contra a ordem
tributária previstos na Lei nº 8.137/90 como também no caso do descaminho (art. 334 do CP).
O descaminho é também considerado um crime contra a ordem tributária, apesar de estar previsto no art.
334 do Código Penal e não na Lei nº 8.137/90.

Existe algum limite máximo de valor para que possa ser aplicado o princípio da insignificância nos crimes
tributários?

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 23


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SIM. A jurisprudência criou a tese de que nos crimes tributários, para decidir se incide ou não o princípio
da insignificância, será necessário analisar, no caso concreto, o valor dos tributos que deixaram de ser
pagos.

E qual é, então, o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários?


Tradicionalmente, esse valor era de 10 mil reais.
Assim, se o montante do tributo que deixou de ser pago era igual ou inferior a 10 mil reais, não havia crime
tributário, aplicando-se o princípio da insignificância.

Qual era o parâmetro para se chegar a esse valor?


Esse valor foi fixado pela jurisprudência tendo como base o art. 20 da Lei n. 10.522/2002, que determina
o arquivamento das execuções fiscais cujo valor consolidado for igual ou inferior a R$ 10.000,00. Em outros
termos, a Lei determina que, até o valor de 10 mil reais, os débitos inscritos como Dívida Ativa da União
não serão executados.
Segundo a jurisprudência, não há sentido lógico permitir que alguém seja processado criminalmente pela
falta de recolhimento de um tributo que nem sequer será cobrado no âmbito administrativo-tributário.
Nesse caso, o direito penal deixaria de ser a ultima ratio.

Esse valor de 10 mil reais permanece ainda hoje?


NÃO. Recentemente, foi publicada a Portaria MF nº 75, de 29/03/2012, na qual o Ministro da Fazenda
determinou, em seu art. 1º, inciso II, “o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda
Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).”
Desse modo, o Poder Executivo “atualizou” o valor previsto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002 e passou a
dizer que não mais deveriam ser executadas as dívidas de até 20 mil reais.
Em outras palavras, a Portaria MF 75/2012 “aumentou” o valor considerado insignificante para fins de
execução fiscal. Agora, abaixo de 20 mil reais, não interessa à Fazenda Nacional executar (antes esse valor
era 10 mil reais).
Diante desse aumento produzido pela Portaria, começou a ser defendida a tese de que o novo parâmetro
para análise da insignificância penal nos crimes tributários passou de 10 mil reais (de acordo com o art. 20
da Lei n. 10.522/2002) para 20 mil reais (com base na Portaria MF 75).

A jurisprudência acolheu essa tese?

STF: SIM, de imediato.


Para o STF, o fato de as Portarias 75 e 130/2012 do Ministério da Fazenda terem aumentado o patamar
de 10 mil reais para 20 mil reais produz efeitos penais.
Logo, o novo valor máximo para fins de aplicação do princípio da insignificância nos crimes tributários
passou a ser de 20 mil reais.
Precedentes:
STF. 1ª Turma. HC 127173, Relator p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 21/03/2017.
STF. 2ª Turma. HC 155347, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 17/04/2018.

STJ: relutou durante anos para aceitar a tese.


O STJ, durante anos, ficou decidindo que o valor de 20 mil reais, estabelecido pela Portaria MF nº 75/12
como limite mínimo para a execução de débitos contra a União, não poderia ser considerado para efeitos
penais (não deveria ser utilizado como novo patamar de insignificância).
O Tribunal apontava dois argumentos principais:
i) a opção da autoridade fazendária sobre o que deve ou não ser objeto de execução fiscal não pode ter a
força de subordinar o exercício da jurisdição penal;

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 24


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ii) não é possível majorar o parâmetro previsto no art. 20 da Lei nº 10.522/2002 por meio de uma portaria
do Ministro da Fazenda. A portaria emanada do Poder Executivo não possui força normativa passível de
revogar ou modificar lei em sentido estrito.
Em suma, para o STJ, o valor máximo para aplicação do princípio da insignificância no caso de crimes contra
a ordem tributária (incluindo o descaminho) continuava sendo de 10 mil reais.
Nesse sentido:
AgRg no AREsp 331.852/PR, julgado em 11/02/2014.
AgRg no AREsp 303.906/RS, julgado em 06/02/2014.

Qual é a novidade sobre o tema?


O STJ curvou-se ao entendimento do STF.
O STJ, vendo que as suas decisões estavam sendo reformadas pelo STF, decidiu alinhar-se à posição do
Supremo e passou a também entender que o limite para a aplicação do princípio da insignificância nos
crimes tributários e no descaminho subiu realmente para R$ 20 mil.
O tema foi decidido sob a sistemática do recurso repetitivo e fixou-se a seguinte tese:
Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito
tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art.
20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério
da Fazenda.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.709.029/MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 28/02/2018 (recurso
repetitivo).

Em suma, qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários e descaminho?
Tanto para o STF como o STJ: 20 mil reais (conforme as Portarias 75 e 132/2012 do MF).

Esse valor deve ser calculado quando? No momento da sentença, ele deve ser atualizado com juros e
correção monetária para saber se passa do teto de R$ 20 mil?
NÃO. Para se verificar a insignificância da conduta, deve-se levar em consideração o valor do crédito
tributário apurado originalmente no procedimento de lançamento.
Assim, os juros, a correção monetária e eventuais multas de ofício que incidem sobre o crédito tributário
quando ele é cobrado em execução fiscal não devem ser considerados para fins de cálculo do princípio da
insignificância.
Em outras palavras, o valor a ser considerado para fins de aplicação do princípio da insignificância é aquele
fixado no momento da consumação do crime e não aquele posteriormente alcançado com a inclusão de
juros e multa por ocasião da inscrição desse crédito na dívida ativa.
STJ. 5ª Turma. RHC 74.756/PR, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 13/12/2016.

Para o STF, é possível aplicar o novo limite (de 20 mil reais) mesmo que o fato tenha ocorrido antes da
Portaria 75/2012?
SIM. Para o STF, o limite imposto por essa portaria (20 mil reais) pode ser aplicado de forma retroativa
para fatos anteriores à sua edição considerando que se trata de norma mais benéfica (STF. 2ª Turma. HC
122213, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgado em 27/05/2014).

Esse valor é considerado insignificante tanto no caso de crimes envolvendo tributos federais, como
também estaduais e municipais?
NÃO. Esse parâmetro vale, a princípio, apenas para os crimes que se relacionam a tributos federais,
considerando que é baseado no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, que trata dos tributos federais. Assim, esse
é o valor que a União considera insignificante.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 25


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Para fins de crimes de sonegação fiscal que envolvam tributos estaduais ou municipais, deve ser analisado
se há lei estadual ou municipal dispensando a execução fiscal no caso de tributos abaixo de determinado
valor. Esse será o parâmetro para a insignificância. Veja como decidiu o STJ:
(...) 4. Para a aplicação do referido entendimento aos tributos que não sejam da competência da União,
seria necessária a existência de lei estadual no mesmo sentido, até porque à arrecadação da Fazenda
Nacional não se equipara a das Fazendas estaduais. Precedentes e doutrina.
5. Inviável a aplicação do referido entendimento ao caso em análise, no qual o paciente foi denunciado
por, em tese, suprimir o valor de R$ 819,00 (oitocentos e dezenove reais) de Imposto sobre a Circulação
de Mercadorias e Serviços (ICMS), de competência dos estados, de acordo com o art. 155, II, da
Constituição Federal.
6. Um dos requisitos indispensáveis à aplicação do princípio da insignificância é a inexpressividade da lesão
jurídica provocada, que pode se alterar de acordo com o sujeito passivo, situação que reforça a
impossibilidade de se aplicar referido entendimento de forma indiscriminada à sonegação dos tributos de
competência dos diversos entes federativos da União. (...)
STJ. 6ª Turma. HC 165003/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/03/2014 (Info 540).

E o contrabando? Podemos aplicar esse entendimento acima explicado para o contrabando?


NÃO. Não se aplica o princípio da insignificância ao crime de contrabando, uma vez que o bem
juridicamente tutelado vai além do mero valor pecuniário do imposto elidido, alcançando também o
interesse estatal de impedir a entrada e a comercialização de produtos proibidos em território nacional.
Trata-se, assim, de um delito pluriofensivo.
Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1472745/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em
01/09/2015.
O caso mais comum e que pode cair na sua prova é o de contrabando de cigarros.

Por que se aplica o princípio da insignificância para o descaminho, mas não para o contrabando?
No delito de contrabando, o objeto material sobre o qual recai a conduta criminosa é a mercadoria
PROIBIDA (proibição absoluta ou relativa). Em outras palavras, o objetivo precípuo dessa tipificação legal
é evitar o fomento de transporte e comercialização de produtos proibidos por lei.
No contrabando não se cuida, tão somente, de sopesar o caráter pecuniário do imposto sonegado, mas
principalmente, de tutelar, entre outros bens jurídicos, a saúde pública.
Em suma, no contrabando, o desvalor da conduta é maior, razão pela qual se deve afastar a aplicação do
princípio da insignificância. Veja:
O princípio da insignificância não incide na hipótese de contrabando de cigarros, tendo em vista que “não
é o valor material que se considera na espécie, mas os valores ético-jurídicos que o sistema normativo-
penal resguarda.
STF. 2ª Turma. HC 118.359, Min. Cármen Lúcia, DJ 11/11/2013.

Em sede de contrabando, ou seja, importação ou exportação de mercadoria proibida, em que, para além
da sonegação tributária há lesão à moral, higiene, segurança e saúde pública, não há como excluir a
tipicidade material tão-somente à vista do valor da evasão fiscal, ainda que eventualmente possível, em
tese, a exclusão do crime, mas em face da mínima lesão provocada ao bem jurídico ali tutelado, gize-se, a
moral, saúde, higiene e segurança pública.
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1418011/PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em
03/12/2013.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 26


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PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
Furto de “cofrinho” contendo R$ 4,80 de uma instituição de combate ao câncer,
mediante induzimento de filho de 9 anos

Não se aplica o princípio da insignificância ao furto de bem de inexpressivo valor pecuniário


de associação sem fins lucrativos com o induzimento de filho menor a participar do ato.
STJ. 6ª Turma. RHC 93.472-MS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 15/03/2018 (Info 622).

Imagine a seguinte situação baseada no caso concreto, mas com adaptações:


Vânia estava com seu filho de 9 anos na Associação dos Voluntários de Combate ao Câncer, uma
associação civil sem fins lucrativos.
Vânia viu um “cofrinho” de moedas em cima da mesa.
Ela, então, falou para o seu filho pegar o “cofrinho” sem que ninguém visse e o colocasse na sua bolsa.
O filho fez isso.
O fato, contudo, foi presenciado pela voluntária que trabalha na associação.
Assim, quando Vânia e o filho estavam saindo foram abordadas pela diretora da associação.
O caso foi levado à autoridade policial e Vânia denunciada por furto.
Em sua defesa ela invocou o princípio da insignificância considerando que dentro do “cofrinho” havia
apenas R$ 4,80 (quatro reais e oitenta centavos).

O STJ acolheu a tese da defesa?


NÃO.
Não se aplica o princípio da insignificância ao furto de bem de inexpressivo valor pecuniário de
associação sem fins lucrativos com o induzimento de filho menor a participar do ato.
STJ. 6ª Turma. RHC 93.472-MS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 15/03/2018 (Info 622).

Requisitos objetivos para aplicação do princípio


O Min. Celso de Mello (HC 84.412-0/SP) idealizou quatro requisitos objetivos para a aplicação do princípio
da insignificância, sendo eles adotados pela jurisprudência do STF e do STJ.
Segundo a jurisprudência, somente se aplica o princípio da insignificância se estiverem presentes os
seguintes requisitos cumulativos:
a) mínima ofensividade da conduta;
b) nenhuma periculosidade social da ação;
c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e
d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.

O STJ entendeu que, no caso concreto, não se podia falar em mínima ofensividade nem havia reduzido
grau de reprovabilidade do comportamento. Isso porque para conseguir a subtração do bem, a ré induziu
que seu próprio filho fosse pegar o objeto. Além disso, o crime foi praticado contra uma instituição sem
fins lucrativos que dá amparo a crianças com câncer. Ainda que irrelevante a lesão pecuniária provocada,
porque inexpressivo o valor do bem, a repulsa social do comportamento é evidente.
Deve-se reconhecer, portanto, presente tipicidade conglobante do comportamento em tela.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 27


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FURTO
O pagamento do débito oriundo de furto de energia elétrica antes do
oferecimento da denúncia é causa de extinção da punibilidade?

O pagamento do débito oriundo de furto de energia elétrica (art. 155, § 3º do CP) antes do
oferecimento da denúncia é causa de extinção da punibilidade, nos termos do art. 9º da Lei nº
10.684/2003?
6ª Turma do STJ: SIM
O valor fixado como contraprestação de serviços públicos essenciais como a energia elétrica e
a água, conquanto não seja tributo, possui natureza jurídica de preço público, aplicando-se,
por analogia, as causas extintivas da punibilidade previstas para os crimes tributários.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 796.250/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 26/09/2017.

5ª Turma do STJ: NÃO


O furto de energia elétrica não pode receber o mesmo tratamento dado aos crimes tributários,
considerando serem diversos os bens jurídicos tutelados e, ainda, tendo em vista que a
natureza jurídica da remuneração pela prestação de serviço público, no caso de fornecimento
de energia elétrica, é de tarifa ou preço público, não possui caráter tributário, em relação ao
qual a legislação é expressa e taxativa. Nos crimes patrimoniais existe previsão legal específica
de causa de diminuição da pena, qual seja, o instituto do arrependimento posterior, previsto
no art. 16 do CP.
STJ. 5ª Turma. HC 412.208-SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 20/03/2018 (Info 622).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João foi preso em flagrante e denunciado em razão da prática do crime de furto de energia elétrica (art.
155, § 3º do Código Penal):
Art. 155 (...)
§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.

Antes do recebimento da denúncia, João pagou toda a dívida cobrada pela concessionária de energia
elétrica referente aos meses em que houve “gato”. Em razão disso, a defesa pediu a extinção da
punibilidade, com base no art. 9º da Lei nº 10.684/2003. Será que esse pedido de João será acolhido?
Vamos entender com calma.

Pagamento integral do débito e extinção da punibilidade


O pagamento integral do débito fiscal realizado pelo réu é causa de extinção de sua punibilidade, conforme
previu a Lei nº 10.684/2003:
Art. 9º É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da
Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 - Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o
agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
(...)
§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica
relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 28


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Lei nº 12.382/2011
Em 2011, foi editada a Lei nº 12.382, que alterou o art. 83 da Lei n. 9.430/96 e passou a dispor sobre os
efeitos do parcelamento e do pagamento dos créditos tributários no processo penal. Veja o que diz a Lei:
Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária
previstos nos arts. 1º e 2º da Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a
Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro
de 1940 (Código Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão
final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente.
(Redação dada pela Lei nº 12.350/2010)
(...)
§ 2º É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante
o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos
crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido
formalizado antes do recebimento da denúncia criminal. (Incluído pela Lei 12.382/2011)
§ 3º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva. (Incluído
pela Lei 12.382/2011)

§ 4º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa
jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos,
inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento. (Incluído pela Lei
12.382/2011)

Estelionato previdenciário não está previsto nas Leis n. 9.430/96 e 10.684/2003:
O art. 9º da Lei nº 10.684/2003 e o art. 83 da Lei nº 9.430/96 mencionam os crimes aos quais são aplicadas
suas regras:
• arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137/90;
• art. 168-A do CP (apropriação indébita previdenciária);
• Art. 337-A do CP (sonegação de contribuição previdenciária).

Repare, portanto, que o furto de energia elétrica (art. 155, § 3º do CP) não está listado nessas duas leis.

Mesmo sem o furto de energia elétrica estar previsto, não é possível aplicar essas regras por analogia
em favor do réu? O pagamento do débito oriundo de furto de energia elétrica (art. 155, § 3º do CP) antes
do oferecimento da denúncia é causa de extinção da punibilidade, nos termos do art. 9º da Lei nº
10.684/2003?
6ª Turma do STJ: SIM
O valor fixado como contraprestação de serviços públicos essenciais como a energia elétrica e a água,
conquanto não seja tributo, possui natureza jurídica de preço público, aplicando-se, por analogia, as
causas extintivas da punibilidade previstas para os crimes tributários.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 796.250/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 26/09/2017.

5ª Turma do STJ: NÃO


O furto de energia elétrica não pode receber o mesmo tratamento dado ao inadimplemento tributário,
de modo que o pagamento do débito antes do recebimento da denúncia não configura causa extintiva
de punibilidade, mas causa de redução de pena relativa ao arrependimento posterior (art. 16 do CP).
Isso porque nos crimes contra a ordem tributária, o legislador (Leis nº 9.249/1995 e nº 10.684/2003), ao
consagrar a possibilidade da extinção da punibilidade pelo pagamento do débito, adota política que visa
a garantir a higidez do patrimônio público, somente. A sanção penal é invocada pela norma tributária
como forma de fortalecer a ideia de cumprimento da obrigação fiscal.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 29


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Já nos crimes patrimoniais, como o furto de energia elétrica, existe previsão legal específica de causa de
diminuição da pena para os casos de pagamento da “dívida” antes do recebimento da denúncia. Em tais
hipóteses, o Código Penal, em seu art. 16, prevê o instituto do arrependimento posterior, que em nada
afeta a pretensão punitiva, apenas constitui causa de diminuição da pena.
Outrossim, a jurisprudência se consolidou no sentido de que a natureza jurídica da remuneração pela
prestação de serviço público, no caso de fornecimento de energia elétrica, prestado por concessionária,
é de tarifa ou preço público, não possuindo caráter tributário. Não há como se atribuir o efeito
pretendido aos diversos institutos legais, considerando que o disposto no art. 34 da Lei nº 9.249/1995
e no art. 9º da Lei nº 10.684/2003 fazem referência expressa e, por isso, taxativa, aos tributos e
contribuições sociais, não dizendo respeito às tarifas ou preços públicos.
STJ. 5ª Turma. HC 412.208-SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 20/03/2018 (Info 622).

LEI DE DROGAS
Súmula 607-STJ

Súmula 607-STJ: A majorante do tráfico transnacional de drogas (art. 40, I, da Lei nº


11.343/2006) configura-se com a prova da destinação internacional das drogas, ainda que não
consumada a transposição de fronteiras.
STJ. 3ª Seção. Aprovada em 11/04/2018, DJe 17/04/2018.

Imagine a seguinte situação hipotética:


João foi preso em flagrante delito, no Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP, na fila do check in do voo
da companhia aérea South African, com destino a Johannesburg/África do Sul, levando consigo cerca de
2kg de cocaína amarrada em seu corpo.
O agente foi denunciado pela prática de tráfico transnacional de drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/2006),
com a incidência de duas causas de aumento previstas no art. 40, III e V:
Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:
I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato
evidenciarem a transnacionalidade do delito;
(...)
III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais,
de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas,
esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem
espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de
drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;

A defesa alegou que o agente não chegou a atravessar a fronteira de nenhum país, de forma que não
houve transnacionalidade. Logo, não deveria incidir a causa de aumento do inciso I. Essa tese é aceita pela
jurisprudência? Para incidir essa causa de aumento, é necessário que o agente atravesse a fronteira?
NÃO.
Para a incidência da causa especial de aumento de pena prevista no inciso I do art. 40 da Lei de Drogas, é
irrelevante que haja a efetiva transposição das fronteiras nacionais, sendo suficiente, para a configuração
da transnacionalidade do delito, que haja a comprovação de que a substância tinha como destino/origem
localidade em outro País.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 377.808/MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 12/09/2017.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 30


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A incidência da majorante, que tem como objetivo apenar com maior severidade a atuação do traficante
direcionada para além das fronteiras do País, não exige o transporte efetivo para o exterior, basta que se
identifique a intenção.
STF. 2ª Turma. HC 127221, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 25/08/2015.

Esse entendimento pacificado do STJ e STF foi agora sumulado.


Vale mencionar uma súmula relacionada que adota o mesmo raciocínio:
Súmula 587-STJ: Para a incidência da majorante prevista no artigo 40, V, da Lei 11.343/06, é desnecessária
a efetiva transposição de fronteiras entre estados da federação, sendo suficiente a demonstração
inequívoca da intenção de realizar o tráfico interestadual.

Súmula 528-STJ
A explicação da Súmula 607 do STJ acabou. No entanto, se você ainda tiver um tempo, vamos relembrar
um tema conexo, qual seja, a súmula 528 do STJ.
Súmula 528-STJ: Compete ao juiz federal do local da apreensão da droga remetida do exterior pela via
postal processar e julgar o crime de tráfico internacional.

Vamos explicar a súmula 528 com o seguinte exemplo:


Pablo, que mora na Espanha, enviou de lá, por correio, uma caixa contendo droga. O destinatário da
encomenda seria alguém que mora em Londrina (PR) e que encomendou pela internet o entorpecente. Ocorre
que, ao chegar no Brasil, em um voo que veio de Madrid e pousou em São Paulo, a caixa foi levada para
inspeção no posto da Receita Federal e lá se descobriu, por meio da máquina de raio X, a existência da droga.

Qual foi o delito em tese praticado pela pessoa que seria destinatária da droga (que encomendou o
entorpecente)?
Tráfico transnacional de drogas (art. 33 c/c art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006). Essa pessoa, em tese,
importou a droga.

A competência para julgar será da Justiça Estadual ou Federal?


Será da Justiça Federal, nos termos do art. 109, V, da CF/88 e art. 70 da Lei nº 11.343/2006:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
V — os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no
País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;
(...)
Art. 70. O processo e o julgamento dos crimes previstos nos arts. 33 a 37 desta Lei, se caracterizado
ilícito transnacional, são da competência da Justiça Federal.

A competência será da Justiça Federal de São Paulo ou de Londrina?


Será da Justiça Federal de São Paulo (local da apreensão). Na hipótese em que drogas enviadas via postal
do exterior tenham sido apreendidas na alfândega, competirá ao juízo federal do local da apreensão da
substância processar e julgar o crime de tráfico de drogas, ainda que a correspondência seja endereçada
a pessoa não identificada residente em outra localidade.

Por que?
O CPP prevê que a competência é definida pelo local em que o crime se consumar:
Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou,
no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução.

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A conduta prevista no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 constitui delito formal, multinuclear, sendo
que, para sua consumação, basta a execução de qualquer das condutas previstas no dispositivo legal.
No caso em tela, a pessoa que encomendou a droga praticou o verbo “importar”, que significa “fazer vir
de outro país, estado ou município; trazer para dentro.” Logo, pode-se afirmar que o delito se consumou
no instante em que o produto importado tocou o território nacional, entrada essa consubstanciada na
apreensão da droga.
Vale ressaltar que, para que ocorra a consumação do delito de tráfico transnacional de drogas, é
desnecessário que a correspondência chegue ao destinatário final. Se chegar, haverá mero exaurimento
da conduta. Também não importa, para fins de consumação e competência, se a pessoa que encomendou
a droga já foi identificada ou não pela polícia. A consumação (importação) ocorreu quando a encomenda
entrou no território nacional.
Dessa forma, o delito se consumou em São Paulo, local de entrada da mercadoria, sendo esse o juízo
competente, nos termos do art. 70 do CPP.

LEI DE DROGAS
Não incide a causa de aumento de pena do art. 40, III, da LD se o crime foi praticado
em dia e horário no qual a escola estava fechada e não havia pessoas lá

Importante!!!
A prática do delito de tráfico de drogas nas proximidades de estabelecimentos de ensino (art.
40, III, da Lei 11.343/06) enseja a aplicação da majorante, sendo desnecessária a prova de que
o ilícito visava atingir os frequentadores desse local.
Para a incidência da majorante prevista no art. 40, inciso III, da Lei nº 11.343/2006 é
desnecessária a efetiva comprovação de que a mercancia tinha por objetivo atingir os
estudantes, sendo suficiente que a prática ilícita tenha ocorrido em locais próximos, ou seja,
nas imediações de tais estabelecimentos, diante da exposição de pessoas ao risco inerente à
atividade criminosa da narcotraficância.
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1558551/MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/09/2017.
STJ. 6ª Turma. HC 359.088/SP. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 04/10/2016.

Não incide a causa de aumento de pena prevista no art. 40, inciso III, da Lei nº 11.343/2006,
se a prática de narcotraficância ocorrer em dia e horário em que não facilite a prática
criminosa e a disseminação de drogas em área de maior aglomeração de pessoas.
Ex: se o tráfico de drogas é praticado no domingo de madrugada, dia e horário em que o
estabelecimento de ensino não estava funcionando, não deve incidir a majorante.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.719.792-MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 13/03/2018
(Info 622).

Tráfico cometido nas dependências ou imediações de estabelecimentos de ensino


O art. 40, III, da Lei nº 11.343/2006 prevê uma causa de aumento de pena para o caso de o tráfico de
drogas ser cometido nas dependências ou imediações de estabelecimentos de ensino:
Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:
(...)
III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais,
de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas,
esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 32


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espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de


drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;

Qual é a razão da existência dessa causa de aumento de pena?


A aplicação da causa de aumento de pena prevista no artigo 40, III, da Lei nº 11.343/2006, tem como
objetivo punir com mais rigor a comercialização de drogas em determinados locais onde se verifique uma
maior aglomeração de pessoas, de modo a facilitar a disseminação da mercancia, tais como escolas,
hospitais, teatros, unidades de tratamento de dependentes, entre outros (STF. 1ª Turma. HC 118676, Rel.
Min. Luiz Fux, julgado em 11/03/2014).

Essa é a lição da doutrina:


“a justificativa para a existência desta majorante diz respeito à enorme facilidade de disseminação do
consumo de drogas nesses locais em virtude da maior concentração de pessoas, o que acaba por
representar maior risco à saúde pública.” (LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação Criminal Especial
Comentada. 4ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 793)

Vamos agora verificar duas situações enfrentadas pela jurisprudência:

Situação 1:
Ricardo é preso vendendo droga em um beco que fica a 240m da escola pública do bairro.
O Ministério Público denuncia Ricardo pela prática de tráfico de drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/2006)
com a causa de aumento de pena prevista no art. 40, III, considerando que a infração foi cometida nas
imediações de uma escola.
A defesa questionou a incidência da causa especial de aumento de pena do art. 40, III, alegando que não
houve comprovação de que o réu se utilizou daquele local com maior concentração de pessoas para
potencializar a disseminação da droga. Além disso, a venda não foi feita para nenhum aluno, funcionário
ou frequentador da escola.

A tese da defesa foi acolhida na situação 1?


NÃO.
A prática do delito de tráfico de drogas nas proximidades de estabelecimentos de ensino (art. 40, III, da
Lei 11.343/06) enseja a aplicação da majorante, sendo desnecessária a prova de que o ilícito visava
atingir os frequentadores desse local.
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1558551/MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/09/2017.

Para a incidência da majorante prevista no art. 40, inciso III, da Lei nº 11.343/2006 é desnecessária a
efetiva comprovação de que a mercancia tinha por objetivo atingir os estudantes, sendo suficiente que
a prática ilícita tenha ocorrido em locais próximos, ou seja, nas imediações de tais estabelecimentos,
diante da exposição de pessoas ao risco inerente à atividade criminosa da narcotraficância.
STJ. 6ª Turma. HC 359.088/SP. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 04/10/2016.

Justamente por essa razão, o STJ entende que esta causa de aumento de pena tem natureza objetiva, de
forma que não importa a intenção do agente:
Em relação à causa de aumento do art. 40, inciso III, da Lei de Drogas, cumpre destacar que a respectiva
majorante tem caráter objetivo, prescindindo da análise da intenção do acusado em comercializar
drogas com alunos das instituições de ensino.
STJ. 5ª Turma. HC 359.467/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 18/08/2016.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 33


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Situação 2:
João, viciado em droga, liga para Pedro, traficante, pedindo para comprar cocaína.
Eles combinam de se encontrar no domingo, às 2h da madrugada, em frente à escola pública existente no
bairro.
No momento em que o traficante está entregando o entorpecente, aparece a viatura da polícia e efetua
a prisão em flagrante do agente.
O Ministério Público denuncia Pedro pela prática de tráfico de drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/2006) com
a causa de aumento de pena prevista no art. 40, III, considerando que a infração foi cometida nas
imediações de uma escola.
A defesa questionou a incidência da causa especial de aumento de pena do art. 40, III, alegando que a
mera proximidade da escola não basta para configurar a referida majorante, mesmo porque, pelo dia e
horário do crime, o estabelecimento de ensino encontrava-se fechado.

A questão chegou até o STJ. Afinal de contas, neste caso concreto, deve incidir ou não a causa de
aumento de pena do art. 40, III?
NÃO.
Não incide a causa de aumento de pena prevista no art. 40, inciso III, da Lei nº 11.343/2006, se a prática
de narcotraficância ocorrer em dia e horário em que não facilite a prática criminosa e a disseminação
de drogas em área de maior aglomeração de pessoas.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.719.792-MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 13/03/2018 (Info 622).

No caso concreto, o crime foi praticado durante a madrugada, em um domingo, ou seja, em horário em
que obviamente a escola não estava em funcionamento. Assim, a proximidade da escola foi um elemento
meramente circunstancial, sem qualquer relação real e efetiva com a traficância realizada pelo acusado.
Ainda que se trate de majorante de cunho precipuamente objetivo - ou seja, não é necessário demonstrar
que o acusado pretendesse atingir as pessoas (notadamente alunos) do estabelecimento de ensino, mas
apenas beneficiar-se de sua proximidade - também não se pode, por outro lado, esquecer de uma
interpretação teleológica da norma em tela. Ora, o aumento de pena imposto àquele que trafica nas
dependências ou imediações de estabelecimento de ensino justifica-se nos benefícios advindos ao agente
com a mercancia nas proximidades de tal estabelecimento, diante da maior circulação de pessoas e da
possibilidade de se atingir os frequentadores do local.
Essa conclusão não retira o caráter objetivo da majorante, pois continua sendo desnecessária a
demonstração de que o acusado tivesse o dolo de atingir aquele público específico. Mas é preciso que o
cometimento do tráfico naquele local (ou seja, nas proximidades da escola) represente um proveito ilícito
maior ao agente, maximizando o risco exposto àqueles que frequentam a escola (alunos, pais, professores,
funcionários etc).

Resumindo. Causa de aumento de pena do inciso III do art. 40 da LD:


• INCIDE mesmo que o tráfico não tivesse como objetivo atingir os frequentadores da escola. Isso porque
esta majorante tem caráter objetivo, dispensando a análise da intenção do acusado em comercializar
drogas com alunos ou frequentadores das instituições de ensino;
• NÃO INCIDE se a prática de narcotraficância ocorrer em dia e horário em que a escola esteja fechada, de
forma que não facilite a prática criminosa e a disseminação de drogas em área de maior aglomeração de
pessoas.

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DIREITO TRIBUTÁRIO

IMPOSTO DE RENDA
Ganho de capital obtido com a venda de imóvel residencial é isento de IR se ele for utilizado
para pagamento de parcelas de outro imóvel residencial comprado anteriormente

A isenção prevista no art. 39, § 2º, da Lei nº 11.196/2005, alcança as hipóteses nas quais o
produto da venda de imóvel por pessoa física seja destinado, total ou parcialmente, à quitação
ou amortização de financiamento de outro imóvel residencial que o alienante já possui.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.668.268-SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 13/03/2018 (Info 622).
STJ. 2ª Turma. REsp 1469478/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, Rel. p/ Acórdão Ministro Mauro
Campbell Marques, julgado em 25/10/2016 (Info 594).

Art. 39 da Lei nº 11.196/2005


O art. 39 da Lei nº 11.196/2005 prevê uma hipótese de isenção de imposto de renda:
Art. 39. Fica isento do imposto de renda o ganho auferido por pessoa física residente no País na
venda de imóveis residenciais, desde que o alienante, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias
contado da celebração do contrato, aplique o produto da venda na aquisição de imóveis
residenciais localizados no País.

Ex: João comprou seu apartamento por R$ 3 milhões; dois anos depois, vendeu este imóvel por R$ 4
milhões, tendo “lucrado” R$ 1 milhão com o negócio. Diz-se que seu ganho de capital foi de R$ 1 milhão.
Em princípio, João teria que pagar imposto de renda sobre esse ganho de capital. Ocorre que o art. 39
acima transcrito garante uma isenção do imposto caso ele utilize este valor recebido para adquirir outro
imóvel residencial.

Feitos estes esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética:


Em janeiro de 2016, Pedro comprou uma casa por R$ 3 milhões.
Em julho de 2017, Pedro vendeu a casa por R$ 4 milhões. Dessa forma, ele teve um ganho de capital de
R$ 1 milhão (4-3).
Em agosto de 2017, Pedro utilizou R$ 400 mil (ou seja, parte do produto obtido com a venda) para quitar
o financiamento habitacional de um apartamento que estava pagando parceladamente há 5 anos.
Pedro, na declaração de imposto de renda, informou que os R$ 400 mil que recebeu de ganho de capital
com a venda da casa seriam isentos do IR. Diante disso, recolheu o imposto de renda apenas sobre R$ 600
mil, isto é, sobre o montante não utilizado para quitar o financiamento.
A Receita Federal, contudo, não concordou e afirmou que, para ter direito à isenção do IR, Pedro deveria
ter utilizado todo o dinheiro (R$ 1 milhão) para a compra do imóvel residencial (apartamento). Além disso,
a compra do imóvel residencial deveria ter sido posterior à data do ganho de capital. No caso de Pedro,
foi o contrário, pois primeiro ele já estava pagando o apartamento e depois teve o ganho de capital com
a venda da casa, utilizando o dinheiro para terminar de pagar o financiamento.
O Fisco sustentou que existe expressa vedação à pretensão de Pedro no art. 2º, § 11, I, da Instrução
Normativa-SRF n. 599/2005, que regulamentou a isenção legal. Veja o texto da IN 599/2005:
Art. 2º Fica isento do imposto de renda o ganho auferido por pessoa física residente no País na
venda de imóveis residenciais, desde que o alienante, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias
contado da celebração do contrato, aplique o produto da venda na aquisição, em seu nome, de
imóveis residenciais localizados no País.
(...)
§ 11. O disposto neste artigo não se aplica, dentre outros:

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 35


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I - à hipótese de venda de imóvel residencial com o objetivo de quitar, total ou parcialmente, débito
remanescente de aquisição a prazo ou à prestação de imóvel residencial já possuído pelo alienante;

Afinal, Pedro tem direito à isenção neste caso?


SIM.

Da leitura do art. 39 da Lei nº 11.196/2005, podem ser extraídos os requisitos necessários para a concessão
da isenção:
a) tratar-se de pessoa física residente no País;
b) alienação de imóveis residenciais situados em território nacional; e
c) aplicação do produto da venda no prazo de 180 dias na aquisição de outro imóvel residencial no País

O STJ entende que o art. 2º, §11, I, da Instrução Normativa-SRF nº 599/2005 é ilegal e que a isenção do
art. 39 da Lei nº 11.196/2005 se aplica mesmo que o dinheiro obtido seja utilizado para pagar as
prestações de um imóvel residencial que o contribuinte já possuía e que estava quitando parceladamente.
Nesse sentido:
A isenção do Imposto de Renda sobre o ganho de capital nas operações de alienação de imóvel prevista
no art. 39, da Lei nº 11.196/2005 se aplica à hipótese de venda de imóvel residencial com o objetivo de
quitar, total ou parcialmente, débito remanescente de aquisição a prazo ou à prestação de imóvel
residencial já possuído pelo alienante.
STJ. 2ª Turma. REsp 1469478/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, Rel. p/ Acórdão Ministro Mauro Campbell
Marques, julgado em 25/10/2016 (Info 594).

A isenção prevista no art. 39, § 2º, da Lei nº 11.196/2005, alcança as hipóteses nas quais o produto da
venda de imóvel por pessoa física seja destinado, total ou parcialmente, à quitação ou amortização de
financiamento de outro imóvel residencial que o alienante já possui.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.668.268-SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 13/03/2018 (Info 622).

A restrição imposta pela instrução normativa da Receita Federal torna a aplicação do art. 39 da Lei nº
11.196/2005 quase que impossível. A grande maioria das aquisições imobiliárias das pessoas físicas é feita
mediante contratos de financiamento de longo prazo (até trinta anos). Isso porque o mais comum é que
as pessoas não tenham liquidez para adquirir um imóvel à vista.

Além disso, pessoa física geralmente adquire o "segundo imóvel" ainda "na planta" (em construção), o
que dificulta a alienação anterior do "primeiro imóvel", já que é necessário ter onde morar. A regra então
é que a aquisição do "segundo imóvel" se dê antes da alienação do "primeiro imóvel".

Sendo assim, a finalidade do art. 39 da Lei nº 11.196/2005 é mais bem alcançada quando se permite que
o produto da venda do imóvel residencial anterior seja empregado, dentro do prazo de 180 (cento e
oitenta dias), na aquisição de outro imóvel residencial, compreendendo dentro deste conceito de
aquisição também a quitação do débito remanescente do imóvel já adquirido ou de parcelas do
financiamento em curso firmado anteriormente.

Ademais, se você observar a redação do art. 39, verá que ele exige apenas a aplicação do "produto da
venda na aquisição de imóveis residenciais localizados no País". Não existe uma exigência do momento
em que deve ocorrer esta aquisição. Não há qualquer registro na Lei de que as aquisições de que ela fala
sejam somente aquelas cujos contratos ocorreram depois da venda do primeiro imóvel residencial.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 36


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Em outras palavras, a Lei nº 11.196/2005 não faz qualquer exigência cronológica quanto à aquisição do
imóvel residencial nem exclui da isenção a quitação ou amortização de financiamento, desde que seja
respeitado o prazo de 180 dias e seja recolhido o IR sobre o valor não utilizado na aquisição.

Aliás, a lei nem poderia dizer isso, pois, como já descrevemos, destoaria da realidade do mercado
imobiliário para pessoas físicas que se faz com contratos a prazo, financiamentos, e o início da aquisição
do segundo imóvel antes mesmo da realização da venda do primeiro.

Desse modo, conforme já explicado, o art. 2º, § 11, inciso I, da Instrução Normativa SRF nº 599/2005, ao
restringir a fruição do incentivo fiscal com exigência de requisito não previsto em lei, afronta o art. 39, §
2º, da Lei nº 11.196/2005, padecendo, portanto, de ilegalidade.

ICMS
Responsabilidade pelo pagamento da diferença de alíquota
caso tenha havido tredestinação da mercadoria

Atenção! PGE
A empresa vendedora de boa-fé que evidencie a regularidade da operação interestadual
realizada com cláusula FOB (Free on Board) não pode ser objetivamente responsabilizada
pelo pagamento do diferencial de alíquota de ICMS em razão de a mercadoria não ter chegado
ao destino declarado na nota fiscal.
A despeito da regularidade da documentação, o Fisco pode tentar comprovar que a empresa
vendedora intencionalmente participou de eventual fraude para burlar a fiscalização,
concorrendo para a tredestinação da mercadoria (mediante simulação da operação, por
exemplo). Neste caso, sendo feita essa prova, a empresa vendedora poderá ser responsabilizada
pelo pagamento dos tributos que deixaram de ser oportunamente recolhidos.
STJ. 1ª Seção. EREsp 1.657.359-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 14/03/2018 (Info 622).

Imagine a seguinte situação hipotética:


A COOPERSUCAR, situada em São Paulo (SP), vendeu álcool hidratado para a empresa “C2”.
Pelo contrato, a mercadoria teria como destino a cidade de Salvador (BA).
Também de acordo com o contrato, a venda seria com cláusula FOB (Free on Board). Isso significa que a
obrigação da vendedora (COOPERSUCAR) era apenas a de entregar a mercadoria para a transportadora
escolhida e contratada pela empresa compradora. Neste momento, ocorre a tradição e encerra-se a
responsabilidade contratual da vendedora. A partir daí todas as despesas e riscos correm por conta da
compradora.

Recolhimento do ICMS e alíquotas aplicáveis


A COOPERSUCAR estava vendendo mercadoria. Logo, tinha que pagar ICMS (um dos fatos geradores do
ICMS é a circulação de mercadorias).
O ICMS possui alíquotas diferentes caso a venda seja para dentro do Estado ou se for para um comprador
situado em Estado diferente do vendedor.
No primeiro caso, o vendedor terá que pagar, ao Estado de origem, a alíquota interna.
Na segunda hipótese, o vendedor paga, ao Estado de origem, a alíquota interestadual e o comprador paga,
ao Estado de destino, a diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual.
Isso está previsto no art. 155, § 2º, VII e VIII, da CF/88:
Art. 155 (...)

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 37


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§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:


(...)
VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou
não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao
Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota
interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual;
VIII - a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a
alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída:
a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto;
b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto;

Em nosso exemplo, como a venda era para outro Estado, a empresa vendedora foi obrigada a recolher a
alíquota interestadual do ICMS, que era de 7%.
Se a COOPERSUCAR tivesse vendido para dentro do Estado de São Paulo, ela teria que recolher a alíquota
interna de ICMS, que era de 25%.

Mercadoria não foi entregue em Salvador (BA)


A COOPERSUCAR entregou a mercadoria para a transportadora contratada pela empresa “C2”. Apesar
disso, não consta que a carga tenha sido entregue em Salvador (BA). Com isso, na prática, não houve
comercialização interestadual, tendo a mercadoria permanecido no Estado de São Paulo.
Diante disso, o Fisco paulista autuou a COPERSUCAR dizendo o seguinte: você pagou alíquota interestadual
de 7% considerando que informou que a venda era para outro Estado; no entanto, isso não aconteceu;
logo, terá que pagar a diferença da alíquota interna (25% - 7% = 18%) mais multa e juros.

Argumentos da empresa vendedora


A empresa vendedora argumentou que:
• vendeu as mercadorias à empresa C2, que constava como habilitada em todos os cadastros públicos;
• a empresa C2 ficou responsável pelo transporte (cláusula FOB);
• adotou todas as cautelas antes de fechar a operação (recebeu pedido de compra, pagamento antecipado
e identificado, ordens de carregamento etc);
• emitiu a nota fiscal tendo como destinatária empresa situada em outro Estado;
• não poderia seguir a carga durante seu transporte até o destino final;
• por tudo isso, não poderia ser punida pela constatação posterior de que a empresa compradora não era
idônea e possivelmente desviou a carga para outro destino, com a participação da transportadora.

Os argumentos da empresa vendedora foram acolhidos pelo STJ?


SIM.
A empresa vendedora de boa-fé que evidencie a regularidade da operação interestadual realizada com
cláusula FOB (Free on Board) não pode ser objetivamente responsabilizada pelo pagamento do diferencial
de alíquota de ICMS em razão de a mercadoria não ter chegado ao destino declarado na nota fiscal.
STJ. 1ª Seção. EREsp 1.657.359-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 14/03/2018 (Info 622).

A empresa vendedora adotou as cautelas de praxe e emitiu a nota fiscal com o destino correto, de forma
que agiu de boa-fé, não podendo ser responsabilizada objetivamente pelo pagamento do diferencial de
alíquota de ICMS em razão de a mercadoria não ter chegado ao destino declarado. Vale ressaltar que a
vendedora não tinha obrigação de fiscalizar o itinerário da carga.

O CTN determina que as convenções particulares não vinculam o Fisco no que tange à responsabilidade
pelo pagamento dos tributos (art. 123 do CTN). Apesar disso, deve-se levar em consideração que o negócio
jurídico foi realizado com a cláusula FOB, de sorte que a responsabilidade do frete ficou a cargo do

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 38


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comprador, não se podendo obrigar o vendedor de boa-fé a perseguir o itinerário da mercadoria,


considerando que essa tarefa é privativa do poder de polícia exercido pela autoridade fiscal e, por isso,
indelegável.

Importante esclarecer que, a despeito da regularidade da documentação, o Fisco pode tentar comprovar
que a empresa vendedora intencionalmente participou de eventual fraude para burlar a fiscalização,
concorrendo para a tredestinação da mercadoria (mediante simulação da operação, por exemplo). Neste
caso, sendo feita essa prova, a empresa vendedora poderá ser responsabilizada pelo pagamento dos
tributos que deixaram de ser oportunamente recolhidos.

A responsabilidade por infração (art. 136 do CTN) não alcança o vendedor de boa-fé, pois sua configuração
exige que o Fisco identifique o agente ou responsável pela tredestinação, não sendo possível atribuir
sujeição passiva por mera presunção, competindo à autoridade fiscal, de acordo com os arts. 116 e 142
do CTN, espelhar o princípio da realidade no ato de lançamento, expondo os motivos determinantes que
a levaram à identificação do fato gerador e o respectivo responsável tributário.

As grandes empresas vendedoras, como as indústrias, realizam uma grande quantidade de operações
interestaduais, com inúmeros compradores sediados em diversas unidades da Federação, de modo que
não se mostra razoável atribuir às empresas vendedoras um novo ônus tributário relacionado com a
efetiva entrega das mercadorias nos destinos informados pelos compradores, especialmente quando o
negócio é feito com a cláusula FOB, em que o frete se dá por conta e risco do comprador. Pensar de
maneira diferente, para reconhecer a responsabilidade objetiva das empresas vendedoras de boa-fé,
representa, na prática, impor mais um ônus financeiro a esse empresário, que injustamente passará a ser
garantidor da Administração para cobrir prejuízos na realidade provocados por infrações cometidas por
outras empresas.

EXERCÍCIOS
Julgue os itens a seguir:
1) A recusa de cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente, é ilícita. ( )
2) (DPE/MG 2014) Se o segurado fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na
aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao
prêmio vencido. ( )
3) Nos contratos de seguro de vida em grupo não há direito à renovação da apólice sem a concordância da
seguradora ou à restituição dos prêmios pagos em contraprestação à cobertura do risco no período
delimitado no contrato. ( )
4) A previsão contratual de convenção de arbitragem enseja o reconhecimento da competência do Juízo
arbitral para decidir com primazia sobre o Poder Judiciário as questões acerca da existência, validade e
eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória. ( )
5) (Juiz TRF3 2015 banca própria) O instituto da “Kompetenz Kompetenz” (em vernáculo “Competência
Competência”) estabelece que todo Juiz, ainda que incompetente, tem competência para analisar sua
própria incompetência. ( )
6) A ação de prestação de contas ajuizada pelo filho em desfavor dos pais é possível quando a causa de
pedir estiver relacionada com suposto abuso do direito ao usufruto legal e à administração dos bens dos
filhos. ( )
7) É cabível o ajuizamento de ação autônoma perante o juízo cível quando se constatar, desde logo, a
necessidade de dilação probatória incompatível com o rito especial do inventário. ( )

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8) (DPE/SC 2014) De acordo com as disposições do novo Código de Processo Civil, quanto ao inventário, o
juiz deve remeter às vias ordinárias a análise de questões que demandam qualquer outro meio de prova
que não seja a documental. ( )
9) Na falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão ao companheiro sobrevivente em
concorrência com os parentes colaterais do de cujus. ( )
10) Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor a todos os contratos de plano de saúde, salvo os
administrados por cooperativas. ( )
11) O estrangeiro, desde que residente no Brasil, possui direito à gratuidade da justiça. ( )
12) Segundo entendimento sumulado do STJ, aplica-se o princípio da insignificância a casos de transmissão
clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza o fato típico previsto no art. 183 da
Lei n. 9.472/1997. ( )
13) Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito
tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art.
20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério
da Fazenda. ( )
14) Não se aplica o princípio da insignificância ao furto de bem de inexpressivo valor pecuniário de associação
sem fins lucrativos com o induzimento de filho menor a participar do ato. ( )
15) A majorante do tráfico transnacional de drogas (art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006) configura-se com a prova
da destinação internacional das drogas, ainda que não consumada a transposição de fronteiras. ( )
16) (PGE/TO 2018 FCC) Compete ao juiz estadual do local da apreensão da droga remetida do exterior pela
via postal processar e julgar o crime de tráfico internacional. ( ) E
17) A prática do delito de tráfico de drogas nas proximidades de estabelecimentos de ensino (art. 40, III, da
Lei 11.343/06) enseja a aplicação da majorante, sendo desnecessária a prova de que o ilícito visava atingir
os frequentadores desse local. ( )
18) Não incide a causa de aumento de pena prevista no art. 40, inciso III, da Lei nº 11.343/2006, se a prática
de narcotraficância ocorrer em dia e horário em que não facilite a prática criminosa e a disseminação de
drogas em área de maior aglomeração de pessoas. ( )
19) A isenção prevista no art. 39, § 2º, da Lei nº 11.196/2005, alcança as hipóteses nas quais o produto da
venda de imóvel por pessoa física seja destinado, total ou parcialmente, à quitação ou amortização de
financiamento de outro imóvel residencial que o alienante já possui. ( )
20) A empresa vendedora de boa-fé que evidencie a regularidade da operação interestadual realizada com
cláusula FOB (Free on Board) não pode ser objetivamente responsabilizada pelo pagamento do
diferencial de alíquota de ICMS em razão de a mercadoria não ter chegado ao destino declarado na nota
fiscal. ( )

Gabarito
1. E 2. C 3. C 4. C 5. C 6. C 7. C 8. C 9. E 10. E
11. E 12. E 13. C 14. C 15. C 16. E 17. C 18. C 19. C 20. C

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JULGADO NÃO COMENTADO

PROCESSO IUJur no CC 144.433-GO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por


unanimidade, julgado em 14/03/2018, DJe 22/03/2018

RAMO DO DIREITO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

TEMA Incidente de uniformização de jurisprudência. CPC/1973. Ausência de


previsão no CPC/2015. Divergência entre Turmas de Seções diversas.
Afetação do feito à Corte Especial. Art. 16 do RISTJ.
DESTAQUE
Em se tratando de incidente de uniformização de jurisprudência suscitado no STJ durante a vigência do
CPC/1973, para resolver divergência entre Turmas componentes de Seções diversas, torna-se conveniente a
afetação do feito à Corte Especial, nos termos do art. 16 do RISTJ.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente cumpre salientar que o incidente de uniformização de jurisprudência suscitado durante a vigência
do CPC/1973, em tese, poderia ser admitido, observando-se, quanto ao seu cabimento, as regras então dispostas
pela lei adjetiva civil anterior. Todavia, em juízo de ponderação quanto à conveniência em se instaurar um
procedimento que não mais guarda previsão no CPC/2015, afigura-se possível aventar a adoção de outras
providências, que, a um só tempo, atendam à postulação e ao direito da parte de prevenir/encerrar a divergência
jurisprudencial aventada. No que tange à possibilidade de se instaurar, de ofício, o Incidente de Resolução de
Demandas Repetitivas (IRDR), previsto nos artigos 976 e seguintes do CPC/2015, verifica-se que os dispositivos
legais que regem o novel instituto são destinados, exclusivamente, aos Tribunais estaduais e regionais. Veja-se
que o art. 982 do CPC/2015 preceitua, que admitido o incidente, "o relator suspenderá os processos pendentes,
individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na Região, conforme o caso". Naturalmente, se a intenção
do legislador fosse instituir tal instituto também para os Tribunais Superiores, não haveria a delimitação
espacial de tal comando. Ademais, o Regimento Interno do STJ, adaptado às alterações promovidas pelo § 3º, do
art. 982, do CPC/2015, não prevê o procedimento de IRDR, mas tão somente o rito para suspender todos os
processos individuais ou coletivos em curso no território nacional que versem sobre a questão objeto do
incidente (art. 271-A). Nessa linha, evidencia-se que o STJ não tem competência originária para instaurar IRDR,
mas sim competência recursal. Saliente-se, ainda, que, no âmbito do STJ, a via adequada para a resolução de
questões repetitivas dá-se por meio do julgamento do recurso especial repetitivo, nos termos do art. 1.036 e
seguintes do CPC/2015. No que tange à adoção do Incidente de Assunção de Competência (IAC), previsto no art.
947 do CPC/2015, verifica-se que esse possui procedimento próprio. Como se constata do referido artigo, o
incidente de assunção de competência, para além do propósito de pacificar questão de grande repercussão
social (sem repetição em múltiplos processos), também se presta a prevenir ou dissipar divergência entre
turmas do Tribunal acerca de relevante questão de direito, o que atenderia ao propósito ora perseguido.
Entretanto, tal providência teria que advir, necessariamente, da própria Corte Especial, afinal somente tem
atribuição de assumir/avocar a competência de determinado Órgão fracionário o Órgão julgador de maior
abrangência. Cabe, assim, à Seção, por iniciativa e deliberação de seus membros, instaurar o IAC quando há
divergência entre as suas Turmas integrantes. Por sua vez, em se tratando de dissenso entre Turmas
componentes de Seções diversas, como se dá no caso, somente a Corte Especial, por iniciativa e deliberação dos
membros que ali possuem assento, poderia instaurar o Incidente de Assunção de Competência. Sobressai, nesse
contexto, a necessidade de se observar a atribuição regimental conferida às Seções e às Turmas de afetar os
feitos de sua competência à Corte Especial "quando convier pronunciamento desta" ou "em razão da relevância
da questão jurídica ou da necessidade de prevenir divergência entre as Seções", em estrito cumprimento ao
disposto no art. 16 do RISTJ.

Informativo 622-STJ (20/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 41

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