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Centro Universitário Ibmec

RJCurso de Direito

Seguros Privados de Saúde diante a Pandemia do Coronavírus

BEATRIZ SANTOS DE ALBUQUERQUE

Rio de Janeiro
2021
1.Introdução

A propositura do tema em questão surgiu a partir do advento acometido pela


pandemia da COVID-19 e o panorama caótico ao qual todos nós fomos submetidos.
O número de internados durante a pandemia crescera exponencialmente nos
hospitais particulares, os quais são conveniados e são nosso objetivo de pesquisa. Assim,
questiona-se sobre o limite ou não da cobertura deste seguro aos seus beneficiários.
Durante quase 2 (anos) de pandemia, assistimos nos jornais e tivemos acesso às
notícias que não nos levavam a crer que este cenário pudesse ter um fim breve, ainda
assim, fora motivo de temor até para quem já dispunha de um seguro privado de saúde,
em razão das lotações máximas e frequentes nos hospitais.
Neste diapasão, não houve só o temor pela doença, mas também o aumento dos
custos para com o seguro de saúde vez que se tornara muito mais relevante e algo
necessário na vida das pessoas, ora beneficiárias. Com a lotação dos hospitais, busca-se
saber se houve realmente a eficiência dos planos de saúde ou seus beneficiários ficaram à
mercê da sorte.
Destarte, muitas empresas de seguro privado de saúde abriram mão da cláusula de
exclusão da pandemia, facilitando assim o acesso e sua cobertura aos seus beneficiários.
Mas outras empresas, não abriram mão e deixaram de atender de certa forma seus
contratantes.
De certo, cada seguradora tem seu critério para consultas, exames e internações
além do interregno de tempo de carência contratual. Todavia, o que é proposta para
discussão é como se deram as coberturas destas seguradoras em casos emergenciais e
ainda assim, em casos preventivos de uma doença específica.
Porquanto, acerca do direito contratual e direito do consumidor em relação à
cobertura destes planos, a Agência Nacional de Saúde dispôs que todas as coberturas
dispostas no rol da ANS ou nos contratos de plano de saúde, continuariam tendo o
atendimento obrigatório, portanto nada mudaria em relação aos direitos do beneficiário.
Apesar deste entendimento da ANS, houve muitos casos em que os direitos do
segurado, ora beneficiário que não foram observados na prática.
Portanto, além de se buscar a efetividade dos seguros privados de saúde diante o
panorama da pandemia se busca também como isso está sendo dado nos judiciários, vez
que é um tema novo não só para a sociedade mas para o poder judiciário que não dispunha
de normas específicas acerca do tema para julgamento de mérito.

2.Relação entre seguradora e assegurado


Os seguros de saúde são definidos como serviços médicos oferecidos a custo
equilibrado, assim dá a possibilidade ao assegurado de escolher os profissionais pelos
quais pretende e gostaria de ser atendido e ainda, escolher a rede credenciada em razão da
ampla rede de atendimentos ao qual contratou.
Com isso, o órgão que regula esta relação é a Agência Nacional de Saúde
Suplementar – ANS, autarquia ligada ao Ministério da Saúde. O órgão foi criado a partir
da Medida Provisória 1.928/99 e posteriormente convertida na Lei n. 9.961/00. Tem como
características autonomia política, admnistrativa e financeira, como consta em no art. 1º
caput e p.ú da Lei supramencionada.

Art. 1o É criada a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, autarquia


sob o regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, com sede e foro na
cidade do Rio de Janeiro - RJ, prazo de duração indeterminado e atuação em
todo o território nacional, como órgão de regulação, normatização, controle e
fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde.

Parágrafo único. A natureza de autarquia especial conferida à ANS é


caracterizada por autonomia administrativa, financeira, patrimonial e de gestão
de recursos humanos, autonomia nas suas decisões técnicas e mandato fixo de
seus dirigentes.

Apesar da fiscalização pela autarquia sobre os seguros privados, vislumbram-se


diversos problemas entre as seguradoras e os assegurados no âmbito da saúde. Ainda
assim, nos cabe ressaltar que a relação entre esses personagens tem característica
consumerista, a partir do entendimento do Superior Tribunal de Justiça na Súmula
Vinculante n. 469.
Neste sentido, o contrato celebrado entre as partes configura a espécie de contrato
de adesão, nos moldes do art. 54 do CDC. A obrigação que os seguros de saúde contraem
ao realizar um negócio jurídico com essas pessoas físicas, é caracterizado como obrigação
de resultado, cujo deverá proporcionar assistência total para prevenção ou na hipótese de
cura do paciente.

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas
pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de
produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar
substancialmente seu conteúdo.

§ 1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de


adesão do contrato.
Por conseguinte, vislumbra-se o paciente, ora assegurado, na figura constante de
hipossuficiente vista sua posição de inferioridade e desvantagem nesta relação de
consumo dada diversas formas de desequilíbrio contratual ao qual está submetido.
Isto posto, havendo a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, há também a
possibilidade de interpretação das cláusulas contratuais da forma mais benéfica ao
consumidor, nos moldes do art. 47 c/c art. 54, parágrafo 4º do CDC.
Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável
ao consumidor.
Art. 54 § 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor
deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil
compreensão.

Por fim, os tribunais seguem a máxima de entender a relação entre seguradora e


assegurado como consumerista ao qual aplica as regras e dispositivos referentes ao mesmo
tema, como visto no julgado a seguir:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVO INTERNO. SEGURO DE
SAÚDE. RELAÇÃO DE CONSUMO. LIMITAÇÃO DE TRATAMENTO
PSICOTERÁPICO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 302 DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1. A relação jurídica entre os planos e seguros
privados de assistência à saúde e os respectivos segurados submete-se às
normas do Código de Defesa do Consumidor. 2. A cláusula contratual
que estabelece limite temporal para internação hospitalar, inclusive para
tratamento psiquiátrico, é nula, porque abusiva e incompatível com o
princípio da boa-fé, que rege os contratos desta natureza. 3. O
estabelecimento de regime de co-participação de internação psiquiátrica
significa limitação ao exercício do direito à saúde e circunstância vedada pela
súmula 302 do Superior Tribunal de Justiça. 4. Deu-se provimento ao Agravo
de Instrumento. Prejudicado o Agravo Interno.

(TJ-DF 07039637620188070000 DF 0703963-76.2018.8.07.0000, Relator:


FLAVIO ROSTIROLA, Data de Julgamento: 25/07/2018, 3ª Turma Cível,
Data de Publicação: Publicado no PJe : 30/07/2018 . Pág.: Sem Página
Cadastrada.). GRIFOS MEUS.

2.Seguros de saúde e seu uso diante a pandemia da Covid-19

Os seguros de saúde dispõem de somente dois tipos de aumento pecuniário – os


reajustes anuais e os reajustes de acordo com a faixa etária do assegurado. E neste
sentido, a partir do entendimento pacificado do Supremo Tribunal Federal em sede de
ADI n. 1.931/2014, a Lei dos Planos de Saúde não poderia retroagir a contratos
firmados antes de sua publicação – Lei n. 9.656/98.
Com o advento da pandemia da Covid-19, a Agência Reguladora editou a
Resolução n. 453. Esta Resolução, veio com o escopo de determinar a garantia dos
planos de saúde sobre testes de diagnósticos para infeçcão do coronavírus para todos
seus assegurados. Ainda assim, determinou medidas visando com que as seguradoras
priorizassem os casos relacionados à Covid-19
Art. 1º A presente Resolução altera a Resolução Normativa - RN nº 428, de 07
de novembro de 2017, que dispõe sobre o Rol de Procedimentos e Eventos em
Saúde no âmbito da Saúde Suplementar, para regulamentar a utilização de testes
diagnósticos para infecção pelo Coronavírus.

Neste diapasão, por muito se falou em um possível colapso na área da saúde em


razão da falta de leitos de UTI e respiradores de oxigênio. Por isso a instauração de
diversas medidas para tentar conter o aumento exponencial de casos ou ao menos,
priorizar casos de infectados, tendo em vista que a saúde pública poderia não dar conta de
todas as pessoas, transferindo aos entes privados a necessidade dos serviços.
Os seguros de saúde foram obrigados a cobrir os casos de infectados em sua
integridade, inclusive casos que desencadearam internação em UTI e intubação à vista que
doenças pré-existentes não poderiam ser alegadas vez que doenças respiratórias compõem
o rol taxativo da Agência Reguladora.
Podemos ver a aplicação destas medidas diante alguns tribunais estaduais, ao tratar
sobre a prestação de serviços de saúde advindos de seguros.

Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Lei 11.746, de 30 de junho de 2020,


do Estado da Paraíba. Proibição de operadoras de planos de saúde no
Estado da Paraíba recusarem a prestação de serviços a pessoas suspeitas
ou contaminadas pelo COVID-19 em razão de prazo de carência
contratual. 3. Usurpação de competência privativa da União para legislar
sobre direito civil, comercial e sobre política de seguros. 4. Interferência nas
relações contratuais firmadas entre operadoras de plano de saúde e
usuários. 5. Período de carência. Suspensão. COVID-19. Disciplina dada
pela Lei Federal 9.656/1998. 6. Inconstitucionalidade formal. Precedentes.
ADI 6441, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgada na Sessão virtual de 07/05 a
14/05 de 2021. 7. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.

(STF - ADI: 6493 PB 0098727-07.2020.1.00.0000, Relator: GILMAR


MENDES, Data de Julgamento: 14/06/2021, Tribunal Pleno, Data de
Publicação: 28/06/2021)

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