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Caderno de Orientações

dos Serviços de Acolhimento:

Reordenar para
Bem Cuidar

Público: gestores, técnicos, trabalhadores


das unidades de acolhimento.

Proteção Social Especial de


Alta Complexidade em Minas Gerais

Diretoria de Proteção Social de Alta Complexidade


Superintendência de Proteção Social Especial
Subsecretaria de Assistência Social

Secretaria de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social

Agosto de 2018
Ficha Técnica e Expediente
Governo do Estado de Minas Gerais
Secretaria de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social

Governador
Fernando Damata Pimentel

Vice-governador
Antônio Andrade Eustáquio Ferreira

Secretária de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social


Rosilene Cristina Rocha

Secretária de Estado Adjunta de Trabalho e Desenvolvimento Social


Karla França

Subsecretária de Assistência Social


Simone Aparecida Albuquerque

Superintendente de Proteção
Básica e Gestão do SUAS
Deborah Akerman

Diretora de Gestão do Sistema Único de Assistência Social


Rosilene de Fátima Teixeira de Oliveira

Superintendente de Capacitação, Monitoramento, Controle e Avaliação de Políticas de


Assistência Social
Jaime Rabelo Adriano

Superintendente de Gestão
do Fundo Estadual
Cláudia Maria Bortot Falabela

Diretor de Regulação do Sistema


Único de Assistência Social
Alexandre Barbosa Romero

Superintendente de Proteção Especial


Régis Aparecido Andrade Spíndola
Diretora de Proteção Social de Média Complexidade
Cristiano de Andrade

Diretora de Proteção Social de Alta Complexidade


Tatiane Patrícia dos Reis Sanção

Diretora de Articulação com o Sistema de Garantia de Direitos e Integração da Rede


Socioassistencial
Natália de Souza Neves

Diretora de Gestão de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto


Lúcia Elena Santos Junqueira Rodrigues

Coordenação técnica
Simone Aparecida Albuquerque
Subsecretária de Assistência Social (Sedese - MG)

Redação
Lindalva Martins de Abreu
Tatiane Patrícia dos Reis Sanção

Revisão final
Simone Aparecida Albuquerque
Régis Aparecido Andrade Spíndola

Diagramação
Ana Beatriz de Lima

Contribuição
Alexandre Barbosa Romero
Cristiano de Andrade
Elisane dos Santos Gomes
Eva Aparecida Barbosa Pinheiro
Isabela Brum Kassab
Maria do Carmo Martins Ribeiro
Natália de Souza Neves
Sarah Ribeiro Carvalho
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Sumário
Apresentação.......................................................................................................... 6

Capítulo 1................................................................................................................ 8
1.1 Breve Histórico do Acolhimento no Brasil..........................................................8
1.2 O Cenário do Acolhimento em Minas Gerais e seus avanços............................16
1.3 Os serviços de acolhimento no âmbito do SUAS..............................................20
a. Excepcionalidade do Afastamento do Convívio Familiar................................................ 21
b. Provisoriedade do Afastamento do Convívio Familiar.................................................... 21
c. Preservação e Fortalecimento dos Vínculos Familiares e Comunitários.................................21
d. Garantia de Acesso e Respeito à Diversidade e Não Discriminação............................... 21
e. Atendimento Personalizado e Individualizado................................................................ 21
f. Garantia de Liberdade de Crença e Religião.................................................................... 22
g. Respeito à Autonomia..................................................................................................... 22
Reordenamento dos Serviços............................................................................................. 24

Capítulo 2.............................................................................................................. 29
2.1 A Intersetorialidade e a Integralidade no SUAS................................................29
2.2 Modalidades de Acolhimento e Formas de Acesso aos Serviços....................30
2.2.1 Público: Crianças, Adolescentes e Jovens................................................................. 30
a. Serviço de acolhimento institucional: Abrigo e Casa Lar............................... 31
b. República para Jovens..................................................................................... 32
2.2.2 Público: Pessoas Idosas........................................................................................... 32
2.2.3 Público: Jovens e Adultos com Deficiência............................................................... 33
Residência Inclusiva............................................................................................ 33
2.3 Equipe de Referência.......................................................................................34
2.3.1 Descrição das equipes de referência dos serviços ................................................... 34
2.3.2 Aspectos importantes do trabalho da equipe técnica............................................... 46
2.3.3 Capacitação da Equipe.............................................................................................. 52
2.3.4 Contribuições ao trabalho da equipe do acolhimento................................................ 53
a. Sexualidade....................................................................................................... 53
b. Deficiência não significa dependência ........................................................... 55
c.Adolescências: ato infracional ou ato de indisciplina?................................... 55
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

d. Quem acompanha a família do acolhido: o serviço de acolhimento ou o


Creas? ............................................................................................................... 57
e. Direito à educação: a escola como um “não espaço”.................................... 58
f. Participação na vida comunitária..................................................................... 59
g. Relação da equipe técnica com o Judiciário.................................................. 59
2.4 Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora ..............................................61

Capítulo 3.............................................................................................................. 70
3.1 Orientações Metodológicas..............................................................................70
3.1.1 Instrumentais............................................................................................................ 70
a.Projeto Político Pedagógico – PPP.................................................................. 70
b.Plano Individual de Atendimento - PIA............................................................. 74
c.Prontuário Individual: organização de registros sobre a história de vida e
desenvolvimento dos acolhidos....................................................................... 81
3.1.2 Acompanhamento psicossocial................................................................................. 81
a. Acolhida............................................................................................................. 82
b.A importância da construção de vínculo entre acolhido e equipe do acolhimento.83
c. Estudo de caso.................................................................................................. 84
d. Relatórios .......................................................................................................... 84
e. Acompanhamento familiar .............................................................................. 84
f. Acompanhamento pós-desligamento.............................................................. 86
g. Convivência familiar e comunitária - preservação e fortalecimento dos vínculos
afetivos com a família e convivência comunitária......................................... 87
h. Visitas domiciliares.......................................................................................... 89
i. Visita institucional ............................................................................................ 89
j. Articulação em rede .......................................................................................... 89
k. Preparação para o desligamento..................................................................... 91
l. Desligamento..................................................................................................... 91
m. Contrarrerefenciamento.................................................................................. 92
n. Acompanhamento pós-desligamento............................................................. 92
3.2 Fluxos do Acolhimento no SUAS ......................................................................93
3.3 Entraves e Desafios para os Serviços de Acolhimento.....................................99

Referências Bibliográficas.................................................................................... 102


Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Apresentação
O governo de Minas Gerais, por meio da Secretaria de Estado de Trabalho e
Desenvolvimento Social (Sedese), desenvolve uma importante estratégia que visa
qualificar a oferta dos serviços de acolhimento institucional em Minas Gerais. Este
caderno integra um conjunto de ações de apoio técnico realizado pela Subsecretaria
de Assistência Social (Subas) aos municípios e entidades que ofertam acolhimento
institucional a crianças, adolescentes, jovens e adultos com deficiência e idosos.
Historicamente, em todo o país, o acolhimento institucional se caracterizou
por diversas práticas pautadas na institucionalização de crianças, adolescentes,
jovens, idosos e pessoas com deficiência, mantendo-os afastados da convivência
familiar e da comunidade. No âmbito da assistência social, o que prevalecia eram
os grandes abrigos, com um número considerável de usuários e instituições que
não buscavam a inserção comunitária e a reinserção familiar. Ainda hoje, a partir
de diagnósticos nas unidades de acolhimento de Minas Gerais, encontram-se
instituições de acolhimento que, não obstante sua função de proteção, ofertam
serviços referenciados no modelo tradicional de institucionalização.
A oferta de serviços da Proteção Social Especial em Minas Gerais tem se
apresentado como um grande desafio para o estado e os municípios. A necessidade
de aumento da cobertura da Proteção Social Especial no conjunto de municípios de
pequeno porte, que representam a grande maioria no estado, motivou a elaboração
de estratégias que contemplam tanto os serviços especializados de proteção
social de média complexidade quanto os de alta complexidade. Dessa forma, o
Plano Estadual de Regionalização constitui-se elemento indispensável para a
consolidação da Política de Assistência Social em Minas Gerais.
Considerando a necessidade de reordenamento institucional que possibilite
a qualificação da oferta dos serviços, segundo os princípios e diretrizes do Sistema
Único de Assistência Social (Suas), o governo de Minas criou o Programa de
Aprimoramento da Rede Socioassistencial do Suas - Programa Rede Cuidar -, que
objetiva aprimorar e apoiar a Rede de Acolhimento Institucional no estado, por meio
de incentivo financeiro, assessoramento técnico e qualificação continuada.
Neste volume, priorizamos as orientações para os gestores, técnicos e
trabalhadores das unidades de acolhimento que atendem especificamente o público
“crianças, adolescente, jovens e adultos com deficiência e pessoas idosas”, em
consonância com as normativas específicas de cada segmento e em conformidade
com o Suas.
Reafirmamos, com a presente publicação, o compromisso estadual com o
processo de reordenamento dos serviços, segundo os princípios da excepcionalidade
e provisoriedade, tendo como principal objetivo a reconstituição e preservação dos
vínculos familiares e comunitários dos usuários atendidos.

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

A experiência desenvolvida até aqui nos possibilita reconhecer que ainda são
muitos os desafios para consolidarmos a oferta de acolhimento institucional que
garanta a proteção integral aos acolhidos, afiançada pela política de assistência
social. Nos possibilitou, também, compreender que o reordenamento é um processo
gradativo, que envolve ações planejadas e conjuntas da gestão federal, estadual
e municipal, equipe dos serviços, usuários, rede socioassistencial e Sistema
de Garantia de Direitos. É um processo que, sobretudo, precisa vencer a cultura
arraigada de institucionalização que vigorou no país.
Esperamos que este material provoque discussões, reflexões e inovações
na prestação de serviços, em conformidade com as normativas vigentes e Política
Nacional de Assistência Social e que edifiquemos o entendimento de que reordenar
é um desafio que devemos alcançar.

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Capítulo 1
1.1 Breve Histórico do Acolhimento no Brasil
Apresentaremos um breve contexto e diferentes olhares sobre o acolhimento
institucional ao longo da história no Brasil e como essas concepções vêm sendo traduzidas
em ações e intervenções por parte da sociedade e do Estado. Abordaremos também o
percurso do atendimento que perpassa desde a negação de direitos prioritários até a
proteção e defesa desses direitos, assegurados nas legislações.
Trataremos, neste Caderno, sobre o acolhimento de crianças e adolescentes,
idosos e pessoas com deficiência e suas modalidades. O acolhimento de forma geral
está associado a variados tipos de perdas, de privação, de violência e da falta de políticas
públicas efetivas voltadas para esses públicos e seus respectivos familiares.
No Brasil Colônia, registravam-se nascimentos de muitas crianças frutos de
relacionamentos abusivos e de relacionamentos extraconjugais entre os senhores e
suas escravas e esses filhos eram abandonados à própria sorte.
Para ocultar os filhos indesejados e preservar a honra das famílias, surgiu, no
período colonial, a Roda dos Expostos¹1, mecanismo instalado nas paredes das Santas
Casas de Misericórdia para atender doentes, órfãos e desprovidos. De acordo com Arantes
(2010), as Rodas dos Expostos foram as primeiras iniciativas assistenciais em relação aos
recém-nascidos no Brasil e muitas Rodas surgiram no país durante o século XIX.

Fonte: A Roda dos Expostos da Santa Casa de Misericórdia da Bahia - uma abordagem
sobre a Infância no Brasil (1910).

1 A Roda dos Expostos era um cilindro de madeira onde as famílias depositavam as crianças rejeitadas,
sem que fossem identificadas.

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Segundo Faleiros e Faleiros (2008) cerca de 90% (noventa por cento) dessas crianças
acabavam morrendo por omissão ou falta de condições próprias das Santas Casas.
A Roda dos Expostos sobreviveu aos grandes regimes da história brasileira:
teve origem na colônia, perpassou o período imperial até a República, sendo extinta
completamente na década de 1950 (LYRA; OLIVEIRA, 2010).
É a partir do século XIX que as iniciativas de criação de um sistema de
institucionalização ligadas ao poder público se tornam mais consistentes. (ARANTES,
2010). Nesse processo, o público infantil ganha um novo olhar e passa a ser considerado
como uma questão social, o que ocasionou mudanças em relação ao atendimento de
crianças e adolescentes.
Em 1927, surge o Código de Menores, chamado de Código Mello Matos2, que trazia
na sua organização e estrutura os princípios da doutrina da situação irregular. A partir
desses princípios, o atendimento às crianças e aos adolescentes - os denominados
“menores” – se caracterizou pela intervenção e controle da população carente, por meio
da segregação e institucionalização em grandes internatos.
Em 1942, foi criado o Serviço de Assistência ao Menor - SAM:

(...) trata-se de um órgão do ministério da justiça, caracterizado


por uma orientação correcional e repressiva, que funcionava como
o equivalente do sistema penitenciário para a população menor
de idade. O sistema de atendimento era constituído por internatos
(reformatórios e casa de correção) para adolescentes autores
de infração penal e por patronatos agrícolas e escolas de ofícios
urbanos, para menores carentes e abandonados (MENDES; COSTA,
1994, p.124).

De acordo com Mendes e Costa (1994), a preservação da integridade das crianças e


adolescentes estava subordinada ao objetivo de proteção da sociedade contra os “futuros”
delinquentes, somando-se ainda a pobreza, o abuso e os maus-tratos.
Apresentados como ameaça à sociedade, esses “menores” eram internados em
instituições com aspectos punitivos e repressivos, onde as formas de reeducação eram
fundamentadas em castigos físicos e desumanos.
Até a década de 1970, as crianças eram “coisificadas”, consideradas como adultas.
Eram exploradas, sofriam maus-tratos e respondiam pelos seus atos, pois não eram vistas
como sujeitos de direitos. Importante demarcar que a Declaração Universal dos Direitos da
Criança, aprovada em 1948 pela Assembleia Geral das Nações Unidas – (AGNU), modificou
esse cenário, passando a conceber crianças e adolescentes como sujeitos de direitos.
Percebendo então que todas as alternativas de “proteção e cuidado” não estavam
solucionando os problemas vivenciados pelas crianças e adolescentes pobres, o Estado
redefiniu as políticas públicas em favor do público infantojuvenil, instituindo assim o
Código de Menores de 19793, que também se baseava na doutrina da situação irregular.

2 José Cândido de Albuquerque Mello Mattos, primeiro juiz de menores do Brasil e da América Latina,
atuou intensamente na área da Infância e Juventude, tendo se empenhado na criação de abrigos, escolas,
patronatos e creches.
3 O Código de Menores de 1979 (Lei 6.667, de 10 de outubro de 1979) adotou a doutrina jurídica de
proteção do “menor em situação irregular”, que reunia o conjunto de meninos e meninas que estavam dentro

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Em 1979, fundamentada no Código de Menores, a política de atendimento à infância


e adolescência passou a ser regulamentada pelo documento legal intitulado Política
Nacional de Bem-Estar do Menor - PNABEM, sendo a Fundação Nacional do Bem-Estar do
Menor - Funabem definida como órgão central da política de atendimento e, nos estados
da federação, as Fundações Estaduais de Bem-Estar do Menor – Febems (FROTA, 2002).
Órgão normativo da política para combater a marginalização, a Funabem foi instituída
sem sucesso, gerando mais problemas e exclusão social, utilizando condutas contrárias à
Lei e atuando sob a mesma lógica das entidades anteriores (FALEIROS; FALEIROS, 2008).

Fonte: Sebastião Salgado. Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem), São


Paulo, 1999.

No Brasil, mudanças significativas relacionadas às atribuições e responsabilidades


da família, do Estado e da sociedade no trato da questão da infância e juventude surgem
na década de 90, impulsionadas pelos movimentos sociais e segmentos organizados da
sociedade civil, que lutavam por direitos políticos, civis e sociais.
A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, as responsabilidades do
cuidado a crianças e adolescentes são definidas, conforme dispõe o artigo 227:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente


e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, que alterou os paradigmas


da assistência social no Brasil, foi aprovada a Lei n.º 8069/90, que instituiu o Estatuto da
Criança e do Adolescente – ECA, e regulamentou dispositivos constitucionais referentes

do que alguns autores denominam infância em “perigo” e infância “perigosa”, que abrange os casos de
abandono, prática de infração penal, desvio de conduta, falta de assistência ou representação legal, entre
outros. Essa população era colocada como objeto potencial da administração da Justiça de Menores.

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

às crianças e aos adolescentes. Em substituição à Doutrina da Situação Irregular, passou


a vigorar a Doutrina de Proteção Integral. As crianças e adolescentes passam a ser
reconhecidos como sujeitos de direitos em condições peculiares de desenvolvimento, e
a institucionalização passa a ser aceita apenas quando já estiverem esgotadas todas as
possibilidades viáveis de mantê-los junto a sua família. Assim,

Não se fala mais de internação de menores abandonados e delinquentes, mas


sim do abrigamento de crianças e adolescentes em situação de risco, também em
último caso respeitando seu direito à convivência familiar e comunitária (RIZZINI,
2004, p. 14).

Mesmo após a promulgação do ECA, os Estados mantiveram as grandes instituições


de acolhimento para crianças e adolescentes, não se adequando de imediato aos
princípios fundamentais estabelecidos, dificultando a proteção integral e a convivência
familiar e comunitária desse público. Morosamente começa-se a romper com práticas
fundamentadas na doutrina da situação irregular, dando espaço para a construção de
novas perspectivas de atenção às crianças e aos adolescentes, reconhecendo-os como
sujeitos de direitos e não mais objetos passivos a serem tutelados pelo Estado.
A prática da institucionalização, conforme mencionado anteriormente, está
arraigada em nossa sociedade desde o Brasil colonial, alcançando também outros
públicos que se encontram numa posição de abandono e fragilidade, como é o caso dos
idosos e pessoas com deficiência, que também eram afastados do convívio familiar e
comunitário. A instituição era o lugar dos não desejados pela sociedade: pobres, velhos,
doentes, mendigos, crianças e deficientes.
Ao longo da história, idosos e pessoas com deficiência foram vítimas de preconceitos,
segregação e ausência de cuidados.
Anomalias físicas ou intelectuais, deformações congênitas, amputações
traumáticas, doenças graves e de consequências incapacitantes, sejam elas de natureza
transitória ou permanente, são tão antigas quanto a própria humanidade. (SILVA, 2009).
As deficiências e doenças sempre se fizeram presentes, manifestando-se em certos
indivíduos e dificultando a sua sobrevivência, quer em razão da própria limitação, quer
em razão do tratamento de exclusão que experimentavam dentro da própria sociedade a
que pertenciam.
Nas primeiras tribos formadas pelos homens era praticamente impossível que
uma pessoa com deficiência sobrevivesse às vicissitudes daquele período, sendo prática
comum de certas tribos se desfazerem dos “deficientes” uma vez que eles representavam
um fardo e um perigo para todo o grupo. Tais comunidades eram obrigadas a se
locomoverem de forma constante de um local para outro e, dessa forma, o abandono e
mesmo a eliminação de pessoas (especialmente crianças) com algum tipo de deficiência
era comportamento aceitável na época, não representando nenhuma atitude antiética ou
imoral, uma vez que a proteção da tribo se sobrepunha aos riscos advindos da permanência
de um “deficiente” no grupo.
Durante os períodos históricos que marcaram a evolução do homem, constatou-se
que a pessoa com deficiência era tratada pela sociedade ora sendo aceita e respeitada, ora
sendo exterminada ou abandonada.
Com o surgimento do cristianismo e da doutrina da caridade e do amor surge uma
nova visão, embasada no amor ao próximo, no perdão, na humildade e na benevolência.

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Assim, os desfavorecidos, especialmente aqueles que eram vítimas de doenças crônicas,


defeitos físicos e mentais passaram a contar com a caridade e algum respeito da
sociedade cristã.
Na Idade Média, a deficiência era vista como “castigo de Deus” e o povo, de maneira
geral, supunha que o nascimento de uma criança com deficiência, com um corpo malformado
era a morada de uma mente igualmente malformada, supersticiosamente vista como
feiticeiros ou bruxos. Assim, aos indivíduos que apresentavam alguma deficiência somente
restava o abandono, a discriminação, a mantença à distância e a prática da mendicância.
Mas, ainda assim, as pessoas doentes e com deformações físicas começaram a receber
mais atenção. Com a ajuda da igreja, senhores feudais e governantes criaram hospitais e
abrigos para doentes e pessoas portadoras de deficiências. Dentre os hospitais daquela
época destinados ao acolhimento de pessoas com deficiência, destaca-se a fundação
do primeiro hospital para pessoas cegas, criado por Luiz IX (1214-1270), o Hospice des
Quinze-Vingts, que oferecia moradia e alimentação a aproximadamente 300 cegos.
Na Idade Moderna, surge o Renascimento que trouxe grandes transformações nas
artes, na música e, principalmente, nas ciências, operaram de forma significativa e positiva
quanto ao tratamento dispensado às pessoas com deficiência, que começaram a receber
atenções mais humanizadas nos hospitais e abrigos. Atenção essa que resultou em
descobertas relevantes no tratamento de determinadas deficiências. Foi também nessa
época, quando ainda não se concedia às pessoas com deficiência auditiva o direito à
educação, que o médico e matemático italiano Gerolamo Cardamo (1501-1576) inventou
um código de sinais destinado a ensinar as pessoas surdas a ler e a escrever.
No século XIX, um novo olhar é lançado sobre a deficiência e a sociedade começou
a assumir sua responsabilidade quanto a essas pessoas, constatando a necessidade de
atenção especializada às pessoas com deficiência. Segundo Silva (2009), ainda nessa
época percebeu-se que as pessoas com deficiência necessitavam não só de hospitais,
casas de saúde ou abrigos de caridade, mas de outras organizações para que os cuidados
e atendimentos fossem mais racionais e menos dispendiosos. Entretanto, a internação
das pessoas com deficiência, embora com o intuito de tratamento de suas doenças, não
passava de meio de marginalização e de exclusão.
Somente a partir da segunda metade do século XIX, a pessoa com deficiência passou
a ser vista com força laboral. Influenciado pelas ideias europeias, o então imperador do
Brasil, Dom Pedro II (1840-1889), funda o Imperial Instituto dos Meninos Cegos (1854),
hoje chamado Instituto Benjamin Constant (em homenagem ao seu terceiro diretor),
e o Imperial Instituto dos Surdos Mudos (1857), hoje denominado Instituto Nacional de
Educação de Surdos – Ines, ambos em atividade atualmente e referência nacional no
tratamento dessas necessidades especiais (MAZZOTTA, 2005, p. 28-29).
O século XX trouxe, de fato, uma maior mobilização para tratar do atendimento
à efetiva inserção da pessoa com deficiência na sociedade. Já na primeira década do
século XX, foram realizadas conferências e congressos em vários países, versando sobre
“crianças inválidas”, “pessoas deficientes”, reabilitação, dentre outros temas, podendo-
se oferecer maior ênfase às seguintes: Primeira Conferência sobre Crianças Inválidas
(Londres/Inglaterra, 1904), Congresso Mundial dos Surdos (Saint Louis/EUA, 1909)
e a Primeira Conferência da Casa Branca sobre os Cuidados de Crianças Deficientes
(Washington D.C./EUA, 1909).
Em 1945, surge a Organização das Nações Unidas – ONU, cuja função é trabalhar
pela paz entre as nações, fundada por meio da Carta das Nações Unidas. Reforçando as

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

determinações da Carta das Nações Unidas, em 1948, é promuga a Declaração Universal


dos Direitos Humanos que, em seu artigo 25 faz menção expressa à pessoa com deficiência,
denominada “inválida”.

Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua


família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados
médicos e os serviços sociais indispensáveis, o direito à segurança, em caso de
desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios
de subsistência em circunstâncias fora do seu controle.

Tal documento de valor histórico e humanitário serviu de impulso à melhor


organização das pessoas com deficiência, culminando no maior interesse para a criação
de novas instituições e consolidação das já existentes, voltadas à busca de meios de
concretização da inclusão social desses indivíduos.
Após o início da década de 1950, foram criadas instituições voltadas ao tratamento
específico de pessoas com deficiência em vários países, “principalmente buscando
alternativas para sua integração social e aperfeiçoamento das ajudas técnicas para
pessoas com deficiência física, auditiva e visual” (GUGEL, 2007). No entanto, no campo do
direito internacional, houve flagrante carência de previsões específicas sobre os direitos
das pessoas com deficiência.
O ano de 1981 foi declarado como Ano Internacional das Pessoas Deficientes,
demonstrando a preocupação mundial com a questão, porém persistiu a contínua exclusão
da pessoa com deficiência na esfera legislativa.
Somente com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 as pessoas com deficiência tiveram seus direitos e proteção específica assegurados
em diversos dispositivos. Em 1989, foi publicada a Lei Federal nº. 7.853/89, que criou a
Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Corde, bem
como disciplinou, entre outros pontos, o apoio às pessoas “portadoras de deficiência” e sua
integração social. Diversas outras medidas legais de proteção à pessoa com deficiência
em nível nacional foram adotadas, relativas à previdência social, educação inclusiva,
garantia de renda, dentre outras.
Sob o escopo de responder as demandas de proteção da pessoa com deficiência,
a assistência social avançou no âmbito da renda, garantindo o Benefício de Prestação
Continuada4 (BPC) e incorporando as ofertas de atendimento, com ênfase no Serviço de
Proteção Social Especial.
Outro avanço para a população com deficiência foi a criação do Plano Nacional dos
Direitos da Pessoa com Deficiência – Viver Sem Limites, em 2011, por meio do Decreto nº
7.612/2011. Esse Plano tem por objetivo promover a articulação de políticas públicas, de
forma a assegurar a efetividade dos direitos das pessoas com deficiência. Destaca-se o
processo de reordenamento dos serviços de acolhimento para pessoas com deficiência,
por meio da oferta do serviço de acolhimento para jovens e adultos com deficiência –
Residência Inclusiva.
A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – Lei Federal nº 13.143/2015,
conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, garante benefícios e medidas para

4 O Benefício da Prestação Continuada (BPC) da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) é a garantia
de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família.

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

maior igualdade e para inclusão na sociedade de pessoas com deficiência. É considerado


por especialistas como um dos mais avançados do mundo na defesa dos direitos da
pessoa com deficiência.
A ruptura de paradigmas e os avanços nas legislações não seriam possíveis sem a
atuação engajada e militante da sociedade civil organizada, sempre vigilante em seu papel
de cobrar do Estado brasileiro sua responsabilidade na garantia dos direitos humanos
das pessoas com deficiência. O trabalho de sensibilização do poder público para as
especificidades das questões ligadas às pessoas com deficiência foi fundamental para
os avanços conquistados até aqui, apesar dos inúmeros desafios que ainda precisam
ser superados.
Quanto às pessoas idosas, ressaltamos que o surgimento de instituições destinadas
a esse público não é recente. O cristianismo foi pioneiro no amparo aos velhos: “Há registro
de que o primeiro asilo foi fundado pelo Papa Pelágio II (520-590), que transformou a sua
casa em um hospital para velhos” (ALCANTARA, 2004).
A palavra “asylums”, que traduzida para o português significa asilo, usada,
inicialmente, pelos americanos para designar todas as instituições surgidas em alguns
países, no início do século XIX, ainda é utilizada nos dias de hoje para designar aquelas
instituições que oferecem moradia e cuidados para pessoas idosas.
Essa denominação “asilo” lembra pobreza e rejeição e contém uma carga negativa,
sendo geralmente empregada, quando se refere a uma instituição destinada a idosos
carentes. A criação dos asilos foi uma necessidade da época (indispensável ainda
em nossos dias) na tentativa de solucionar a problemática das doenças, da pobreza e
mendicância. Com o passar dos tempos, essas categorias (pobres, mendigos, doentes,
loucos, crianças) foram trabalhadas de modo isolado. Dessa forma, surgiram espaços
separados: os hospitais, os leprosários, os manicômios, os sanatórios, orfanatos e os asilos
que passam a abrigar somente aqueles que não se enquadravam nas outras instituições,
como pobres, mendigos, vagabundos e velhos. Somente no século XX, o termo asilo passou
a ser uma instituição para velhos. Justifica-se, desse modo, na sua origem, as instituições
para velhos como um lugar de tristeza, abandono, pobreza e decadência.
A cultura de institucionalização, de cunho assistencialista, estereotipava o
atendimento aos idosos e ratificava a existência dos asilos de “velhos”, considerados
como lugares de segregação e abandono, associados à miserabilidade. Essa forma de
institucionalização considera o isolamento enquanto método de trabalho e abordagem,
sendo que, atualmente, ainda se fazem presentes os estigmas e estereótipos relacionados
a essas instituições, produzindo e reproduzindo diversos conceitos, imersos na concepção
asilar e apartados da concepção de cuidado.
Segundo os autores Born e Boechat (2002) falar de idoso institucionalizado é fazer
referências a imagens negativas (relacionadas à tristeza e ao abandono) associadas a
entidades que o abrigam, para as quais a denominação “asilo” continua em uso ou se
encontra atenuada na expressão “instituição asilar”.
No Brasil, as casas de acolhimento para idosos surgiram desde 1794 quando foi
fundada, no Rio de janeiro, a Casa dos Inválidos, que tinha por objetivo, não a caridade,
mas servia para abrigar soldados com idade avançada para que tivessem uma velhice
digna e amparada. Posteriormente, em 1890, fundou-se o Abrigo São Luís para Velhice
Desamparada, destinado exclusivamente ao acolhimento de pessoas idosas. O ingresso
numa instituição como essa significava rompimento de laços familiares.
No final do século XIX, a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo dava assistência

14
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

a mendigos e, conforme o aumento de internações para idosos, passou a definir-se como


instituição gerontológica em 1964.
Embora não existam dados oficiais atuais a respeito do número de instituições para
idosos, nem quantos idosos vivem nelas no Brasil, segundo o recenseamento brasileiro
de 2013 estimou-se que 107 mil idosos viviam em instituições, representando 1% da
população idosa e os estados com a maior proporção de idosos em acolhimento são
Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul e Goiás.
Apesar de existirem instituições com atendimento de qualidade, ainda é expressivo
o número daquelas que não atendem a parâmetros básicos de funcionamento. O número
de asilos no Brasil vem crescendo assustadoramente, e é de extrema importância
direcionar esforços para que essas instituições possam cumprir de maneira satisfatória
suas responsabilidades perante os idosos, que são para além de proporcionar um espaço
de moradia, o de proporcionar um lar, um lugar de vida com qualidade e dignidade, de
aconchego, de identidade e de cuidados, buscando-se romper com sua imagem histórica
de segregação e se tornar uma saída, uma opção, na vida dos idosos.
Destaca-se, na época atual, a instituição de critérios e parâmetros para que a
oferta do serviço de acolhimento ao idoso seja realizada com qualidade, de forma que tais
instituições sejam espaços de proteção, que possibilitem aos idosos viverem a velhice
com dignidade.
A Constituição Federal de 1988 também traz avanços significativos para a efetiva
proteção à pessoa idosa, ao estabelecer que “a família, a sociedade e o Estado têm o dever
de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo
sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida” 5.
Apesar da inserção das questões relativas ao envelhecimento na Constituição Federal
de 1988, somente em 1994 foi instituída uma política nacional voltada especificamente
para os idosos, a Política Nacional do Idoso 6, que tem cinco princípios estabelecidos:

I - a família, a sociedade e o estado têm o dever de assegurar ao idoso todos os


direitos da cidadania, garantindo sua participação na comunidade, defendendo sua
dignidade, bem-estar e o direito à vida;
II - o processo de envelhecimento diz respeito à sociedade em geral, devendo ser
objeto de conhecimento e informação para todos;
III - o idoso não deve sofrer discriminação de qualquer natureza;
IV - o idoso deve ser o principal agente e o destinatário das transformações a
serem efetivadas através desta política;
V - as diferenças econômicas, sociais, regionais e, particularmente, as contradições
entre o meio rural e o urbano do Brasil deverão ser observadas pelos poderes
públicos e pela sociedade em geral, na aplicação desta Lei.

Outro avanço na proteção à Pessoa Idosa, a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003,


que instituiu o Estatuto do Idoso, dispõe sobre a função da família, da comunidade, da
sociedade e do Poder Público de assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação
do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao
trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e
comunitária, garantindo convivência familiar e comunitária.

5 Art. 230 da Constituição Federal (1988).


6 Lei n. 8842/94, que tem por objetivo assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições para
promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade.

15
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

A Política Nacional do Idoso e o Estatuto do Idoso representam as principais leis


ordinárias de proteção da pessoa idosa no Brasil. Assim, as políticas públicas de atenção
ao idoso tiveram um avanço significativo, principalmente a partir da mobilização de
diversas organizações da sociedade civil para que os direitos desta crescente parcela da
população sejam garantidos e efetivados, de forma que possam assim envelhecer com
qualidade de vida.
A adequação da oferta do serviço de acolhimento ao idoso às normativas do Suas,
não é uma tarefa simples, fazendo-se indispensável uma mudança de concepção da lógica
asilar para o cuidado e direito.
Ainda que, a princípio, remeta a um caráter duradouro, a concepção do acolhimento
no âmbito do Suas deve ser fundamentada na provisoriedade e excepcionalidade, sendo
utilizado somente quando esgotadas todas as possibilidades de vida independente da
pessoa idosa ou de convívio com seus familiares. Nessas condições, mesmo em face
da institucionalização, faz-se importante o estímulo à vida autônoma e independente da
pessoa idosa, respeitando seus desejos e limitações.

1.2 O Cenário do Acolhimento em Minas Gerais e


seus avanços
A história recente dos acolhimentos em Minas Gerais aponta para práticas
tradicionais de institucionalização de crianças, adolescentes, jovens, pessoas idosas e
pessoas com deficiência em grandes abrigos, mantendo-os afastados da convivência
familiar e comunitária. Na esfera da saúde, a determinação da permanência em leprosários
e manicômios implicava no isolamento compulsório de pessoas, constituindo-se como
uma prática higienista. Na educação, existiam os grandes internatos e, na Assistência
Social, prevaleciam os grandes abrigos.
Não diferente de outros estados, a fundação que orientava pelo pressuposto da
institucionalização de crianças e adolescentes no estado era a Febem- Fundação Estadual
para o Bem-Estar do Menor.
Com outra perspectiva, o Estado de Minas Gerais mantinha a Fundação Educacional
Caio Martins – Fucam, fundada em 1948. O objetivo da instituição era promover a
escolarização de crianças e adolescentes, oriundos de área rural, com dificuldades de
acesso à escolarização, porém verificou-se que a tradição de internação ainda era o maior
motivo de demanda para o ingresso na Fucam e os adolescentes permaneciam durante
vários anos na instituição em regime de moradia estudantil.
Apesar de a fundação não ser registrada como uma instituição de acolhimento, aceitava a
“internação” de adolescentes até o ano de 2014. Contando com seis centros educacionais,
sendo quatro deles no Norte de Minas, um no Noroeste e outro na Região Metropolitana
de Belo Horizonte, a Fucam mantinha ainda praticamente a mesma missão desde sua
fundação, conforme descrita em seu Regimento Interno, datado de 1977.

E da simplicidade de um “lar”, onde as regras do bom senso ditavam toda filosofia


da obra, a Escola transformou-se numa grande família, unida em todos os

16
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

momentos e consciente de sua missão. Já não mais se preocupava, então, apenas


com os problemas do menor-carente. Já não mais se estudava, apenas, meios de
levá-lo a se integrar na comunidade, mas sim, de meios que provessem sua plena
realização, abrangendo toda extensão de sua vida sensível, intelectual, espiritual
e social. A granja-Escola transformou-se numa comunidade modelo, onde todos
os valores afloravam e o menor, rapidamente, era envolvido e ajustado. Por um

Fonte: Registros da Fucam.

processo simples de interação, muitas vezes indefinido, a Granja-Escola oferecia


os meios e as soluções para os problemas sociais mais complicados. (Regimento
Interno da Fundação Educacional Caio Martins –, aprovado em 05.08.1977)

A Sedese iniciou um processo de reordenamento da Fundação, criando em 2015


uma “Comissão de Reordenamento da Fucam”, por meio de Resolução conjunta Sedese/
SEE/Fucam nº 19/2015 de 19 de maio de 2015, publicada no Diário Oficial de Minas Gerais
em 20/05/2015. Essa Comissão trabalhou a partir do levantamento de dados coletados
sobre o atendimento oferecido na Fucam. Logo em seguida, deu-se início ao estudo de
caso dos 243 adolescentes que estavam internos na Fucam. A equipe foi composta por
psicólogos, assistentes sociais e estagiários de psicologia e serviço social da sede e dos
Centros Educacionais da Fucam, da Sedese e contou com o apoio dos técnicos do Centro
de Referência de Assistência Social - Cras e do Centro de Referência Especializada de
Assistência Social - Creas das cidades de origem dos educandos.
O resultado apontou que 198 adolescentes poderiam retornar para suas
famílias e 45 foram identificados com motivos que justificavam a necessidade de
permanência na moradia estudantil, por um tempo determinado, denominado de
“desligamento progressivo”.
Durante o ano de 2016, todos os adolescentes que retornaram às suas famílias
foram acompanhados pela equipe técnica da Fucam e o projeto de reordenamento
começou a ser implantado. Ao final desse mesmo ano, todos os adolescentes foram
desligados da moradia estudantil e foram inseridos no acompanhamento da rede dos
municípios de origem.
Atualmente, a Fucam tem seu trabalho orientado pelas políticas de Assistência

17
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Social, Cultura, Educação e Trabalho. Suas principais ofertas são de educação integral,
cursos técnicos, cursos profissionalizantes, oficinas de cultura e compõe os grupos de
trabalho da rede de proteção dos municípios em que está localizada.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a aprovação da Lei 8.069/1990,
que instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estado, com o propósito de adequar
a política estadual aos novos princípios do atendimento às crianças e aos adolescentes,
também previstos pela Lei 11.819/95, extinguiu todas as unidades da Febem em Minas
Gerais.
Com a extinção das Febems, o estado de Minas Gerais se depara com outra questão,
como ofertar proteção às crianças, aos jovens e aos adultos com deficiência, que por
muito tempo ficaram afastadas do convívio familiar e comunitário e perderam totalmente
os vínculos com suas famílias e comunidade.
As crianças e adolescentes que, por vários motivos, não retornaram para suas
famílias, foram encaminhados para as unidades de acolhimento municipais. Para
os demais, sobretudo, as pessoas com deficiência, foi instituído o Programa Casa Lar,
em 1996, cuja finalidade foi acolher os egressos das Febems, crianças e adolescentes
(à época), com deficiências, remanescentes do processo de desinstitucionalização. O
Programa Casa Lar passou a ofertar o acolhimento a esse público em pequenas unidades
residenciais, contando com cuidadores responsáveis pela atenção aos acolhidos.
Essas unidades de acolhimento institucional são gerenciadas por organizações
não governamentais, por meio de uma relação de parceria estabelecida com o Estado,
mediante celebração de Termo de Colaboração.
Atualmente, esse público é constituído por pessoas adultas com deficiência, que não
alcançaram condições de autonomia e ou (re) integração na família de origem, extensa ou
substituta, permanecendo sob tutela estatal. Existem no estado (2018) quarenta unidades
em funcionamento, acolhendo 268 (duzentos e sessenta e oito) pessoas com deficiência 7.
Ressalta-se que, à época da implantação do Programa Casa Lar, as normativas
nacionais ainda não haviam consolidado a tipificação e a parametrização dos serviços
socioassistenciais. Tampouco o Sistema Único de Assistência Social havia sido instituído.
O Programa foi regulamentado no ano de 2006, por meio da Resolução Conjunta SEDESE/
CEDCA nº 17/2006 8.
O estado de Minas Gerais possui a segunda maior rede de ofertas de serviços
de assistência social do Brasil. Cerca de 77% das unidades é composta por entidades
socioassistenciais (não governamental), segundo dados do Censo Suas 2016.
As unidades que ofertam o serviço de acolhimento institucional estão presentes em
355 municípios, nos 17 Territórios de Desenvolvimento 9. Essas unidades de acolhimento
atendem pessoas em situação de risco, como crianças, adolescentes, pessoas idosas,
mulheres, pessoas com deficiência, por vivência de violência ou por rompimento de
vínculos familiares.
Com o objetivo de apoiar especialmente as unidades de acolhimento, a Secretaria de

7 Dados referentes a 06/2018.


8 Regulamenta o Programa Casa Lar, com o objetivo de desinstitucionalizar crianças, adolescentes e
pessoas com deficiência, criando condições para a humanização do atendimento em abrigo.
9 Considera-se Território de Desenvolvimento espaços de desenvolvimento econômico e social, formado
por municípios, no interior do qual se organizam pessoas e grupos sociais, enraizados por suas identidades e
culturas. Os 853 municípios do Estado estão divididos em 17 (dezessete) Territórios de Desenvolvimento.

18
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social de Minas Gerais (Sedese), em parceria com


a Loteria do Estado de Minas Gerais (Lemg) e com o apoio do Serviço Social Autônomo
(Servas), criou no ano de 2017 o Programa de Aprimoramento da Rede Socioassistencial –
Rede Cuidar 10.
O Programa, deliberado e aprovado pelo Conselho Estadual de Assistência Social
de Minas Gerais (Ceas/MG), conforme Resolução nº 587 / 2017 – Ceas/MG 11, objetiva
instituir e fortalecer, no estado de Minas Gerais, os mecanismos de incentivo financeiro,
assessoramento técnico e qualificação continuados para aprimorar os serviços,
programas, projetos e benefícios de assistência social ofertados pela rede do Sistema
Único de Assistência Social (Suas).
Os beneficiários do Programa são as unidades públicas e privadas que compõem
a rede do Sistema Único de Assistência Social em Minas Gerais, ofertando serviços,
programas, projetos e benefícios socioassistenciais, além daquelas que realizam
assessoramento, defesa e garantia de direitos.
No ano de 2017, a Comissão Intergestora Bipartite- CIB (Resolução n° 05/2017)
e o Conselho Estadual de Assistência Social- CEAS (Resolução n°602/2017) aprovaram
que seriam elegíveis para participarem do Rede Cuidar as unidades governamentais e
as entidades e organizações de Assistência Social que ofertam serviços de Acolhimento
Institucional para os seguintes públicos:

I - Crianças e adolescentes;

II - Idosos;

III - Pessoas com deficiência.

O critério para a elegibilidade desses públicos levou em consideração a maior


concentração das unidades que atendem a esses públicos, na totalidade das unidades de
acolhimento institucional e também a existência de normativas e parâmetros nacionais já
estabelecidos, conforme descrito na Nota Técnica Subas nº 149/2017.
No intuito de ser uma referência para aferir a qualidade das ofertas das unidades
de acolhimento, bem como medir as principais fragilidades dessas ofertas para direcionar
as intervenções do Estado, constituindo-se como parâmetro para o reordenamento do
serviço de acolhimento institucional em Minas Gerais, a Sedese criou o indicador de
Desenvolvimento das Unidades de Acolhimento - ID Acolhimento 12, conforme disposto na
Nota Técnica –Subas 228/2017.

10 Lei 22.597, de 19 de julho de 2017, que cria o Programa de Aprimoramento da rede Socioassistencial
- Programa Rede Cuidar.
11 http://www.social.mg.gov.br/ceas/images/Resolucoes/2017/resol_587_2017.pdf
12 O ID Acolhimento é um indicador de monitoramento, ou seja, uma medida estatística usada para
traduzir quantitativamente um aspecto da realidade, para fins de monitoramento e avaliação no âmbito da
política pública de Assistência Social. Trata-se de um indicador sintético desenvolvido para mensurar, de
forma indireta, a qualidade do serviço socioassistencial ofertado pelas Unidades de Acolhimento do estado
de Minas Gerais. Cada dimensão do indicador (estrutura física, gestão e atividades e recursos humanos) é
dividida em níveis de desenvolvimento (superior, suficiente, regular e insuficiente), com notas de 1 a 4, que se
desdobram em quatro faixas que denotam o grau de adequação da unidade aos critérios considerados em
cada uma das dimensões, quais sejam: 1 - Insuficiente, 2 - Regular, 3 - Suficiente, 4 - Superior.

19
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

É importante destacar que o ID Acolhimento foi elaborado com o objetivo de


ser um instrumento de trabalho para a Sedese. A tentativa de quantificar as realidades
vivenciadas pelas unidades de acolhimento, proposta pelo indicador, tem a finalidade
de apontar caminhos e estratégias de atuação do Estado. Pretende-se, com isso, que o
ID Acolhimento consiga indicar quais unidades ofertam um serviço mais adequado às
normativas do Suas e quais apresentam maiores fragilidades, demandando, assim, maior
apoio do poder público para se adequarem e melhorarem as ofertas ao público-alvo.

1.3 Os serviços de acolhimento no âmbito do SUAS


Os serviços de acolhimento compõem a oferta da Proteção Social Especial de Alta
Complexidade no Sistema Único de Assistência Social. A oferta do acolhimento se dá em
distintas modalidades, para famílias e/ou indivíduos que se encontram sem referência
familiar ou comunitária ou necessitam ser afastados do núcleo familiar e/ou comunitário
de origem, como forma de garantir a sua proteção integral. Destina-se a diferentes públicos:
crianças e adolescente; jovens entre 18 e 21 anos, adultos e famílias; jovens e adultos com
deficiência; pessoas idosas; mulheres em situação de violência e famílias ou indivíduos
desabrigados/desalojados.
Destaca-se que o serviço de acolhimento é ofertado em modalidades diferenciadas,

Os serviços de acolhimento tipificados podem ser executados de


forma direta, pelo poder público, ou, ainda, serem ofertados através de
parcerias com entidades não governamentais da rede socioassistencial.
Independentemente da natureza, os serviços ofertados devem
respeitar os parâmetros nacionalmente estabelecidos.

de forma a atender as especificidades de cada público, conforme estabelece a Tipificação


Nacional dos Serviços Socioassistenciais13. Serão detalhadas em capítulo específico neste
caderno o acolhimento de crianças e adolescentes, pessoas idosas, jovens e adultos com
deficiência.

Tais serviços de acolhimento funcionam como moradia provisória até que o usuário
possa retornar à família de origem, ou ser encaminhado para família substituta, quando
for o caso. Tratando-se de pessoas idosas e pessoas com deficiência, esses serviços têm
lugar até que se dê o alcance da autonomia (moradia própria ou alugada), ou ainda, quando

13 Resolução nº 109, de 11 de novembro de 2009, normativa que possibilitou a padronização em


todo território nacional dos serviços de proteção social básica e especial, estabelecendo seus conteúdos
essenciais, público a ser atendido, propósito de cada um deles e os resultados esperados para a garantia
dos direitos socioassistenciais. Além das provisões, aquisições, condições e formas de acesso, unidades de
referência para a sua realização, período de funcionamento, abrangência, a articulação em rede, o impacto
esperado e suas regulamentações específicas e gerais.

20
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

possível, outras formas seguras de moradia compartilhada.


Para além de um lugar de moradia, os serviços de acolhimento ofertados pelo Suas
compõem uma complexa rede de proteção integral a famílias e indivíduos em situação
de violação de direitos ou ameaça grave a direitos, associadas ou não a vulnerabilidades
advindas do ciclo de vida, gênero ou dependência decorrente de deficiência.
Princípios dos serviços de acolhimento:

a. Excepcionalidade do Afastamento do Convívio Familiar


O acolhimento deverá ser a última alternativa de proteção a quem tenha tido seus
direitos violados. Anterior ao afastamento, deve-se garantir que todos os esforços sejam
empreendidos no sentido de manter o convívio familiar em seus diversos arranjos, seja na
família de origem, na família extensa ou ampliada, garantindo-se assim a excepcionalidade
do acolhimento, seja institucional ou familiar.

b. Provisoriedade do Afastamento do Convívio Familiar



Esgotadas todas as possibilidades de manutenção do convívio familiar e sendo o
acolhimento uma medida necessária para garantir direitos e proteção, o mesmo deverá
ocorrer em menor tempo possível, tendo sempre como premissa o retorno seguro ao
convívio familiar, não havendo mais risco pessoal e social.
Tão logo se dê o acolhimento, a equipe técnica do serviço inicia as intervenções
técnicas necessárias para que ocorra o desligamento da pessoa da unidade de acolhimento.

c. Preservação e Fortalecimento dos Vínculos Familiares e Comunitários


O princípio da Preservação e Fortalecimento dos Vínculos Familiares e Comunitários
permeará todo o acolhimento, cujo objetivo é a superação das violações, o fortalecimento
e/ou a reconstrução dos vínculos familiares e a reintegração familiar. Assim, todos os
esforços serão empreendidos para que o contato do acolhido com seus familiares sejam
constantes, desde que não haja impedimento legal, seja por meio de visitas na instituição,
telefonemas e ainda visitas do acolhido ao seu domicílio.

d. Garantia de Acesso e Respeito à Diversidade e Não Discriminação


Nenhum usuário poderá sofrer discriminação em razão de sua etnia, orientação
sexual, condição socioeconômica, religião, gênero, arranjo familiar, ou ainda por ser pessoa
com deficiência física ou mental, que vive com HIV/Aids, ou qualquer outra condição de vida.

e. Atendimento Personalizado e Individualizado



O acolhimento traz em si prejuízos à individualidade e singularidades dos sujeitos
acolhidos por se dar num espaço institucional e coletivizado. Assim, por mais que se busque
tornar os acolhimentos espaços com características as mais semelhantes possíveis às

21
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

de uma residência, é necessário construir possibilidades de trabalho com os acolhidos e


também com suas famílias que atendam às suas necessidades específicas e singulares. O
instrumento metodológico que irá garantir o atendimento personalizado e individualizado
é o Plano de Atendimento Individual e Familiar – PIA, a ser tratado neste caderno em tópico
exclusivo.

f. Garantia de Liberdade de Crença e Religião



A garantia de liberdade de crença e religião possibilita a cada acolhido o direito de
expressar e manifestar sua crença religiosa, seja ela qual for, devendo ser respeitado tanto
pelos que se encontram no serviço de acolhimento quanto por aqueles com os quais vier
a se relacionar, em razão de seu acolhimento.
As unidades de acolhimento, assim como as famílias acolhedoras, deverão propiciar
ao acolhido o acesso às atividades religiosas de sua preferência, bem como o direito de
recusar instrução ou orientação religiosa e/ou participar de ritos de crença que não lhe
sejam significativos.

g. Respeito à Autonomia

A todos os acolhidos deverá ser garantido o respeito à sua autonomia, considerando


sempre sua condição peculiar, seu estágio de desenvolvimento, sua saúde, dentre outros
aspectos.
É necessário avaliar o que o acolhido é capaz de realizar sozinho para que seja
estimulado a realizar as atividades possíveis. Os espaços de acolhimento devem ter seus
ambientes adaptados, de acordo com seu público (crianças na primeira infância, pessoas
idosas com grau de dependência, pessoas com deficiências, por exemplo), de modo a
favorecer a autonomia gradativa dos mesmos.

Importante:

• Usuários com vínculos de parentesco ou afinidade – casais, irmãos, amigos, etc.,


devem ser atendidos na mesma unidade e preferencialmente acomodados no mesmo
quarto.

• O serviço deve também apoiar e incentivar as visitas da família aos acolhidos, bem
como de pessoas que lhes são significativas, desde que não haja impedimento legal. Os
acolhidos poderão também realizar visitas aos seus familiares.

Os serviços de acolhimento se organizam de forma distinta, sendo que para cada


público atendido há uma modalidade de acolhimento específico. Assim, para crianças e
adolescentes, tem-se o acolhimento familiar e o acolhimento institucional. Aos demais
públicos o acolhimento institucional é ofertado em diferentes modalidades: Abrigo
Institucional, Casa Lar, Casa de Passagem, Residência Inclusiva e República.

22
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Na modalidade institucional, o acolhimento se dá em unidades que devem ter


aspectos semelhantes aos de uma residência, inseridas na comunidade, em áreas
residenciais, e oferecer ambiente acolhedor e condições institucionais para o atendimento
com padrões de dignidade, condições de habitabilidade, higiene, salubridade, segurança,
acessibilidade e privacidade.
Para o acolhimento de crianças e adolescentes as orientações técnicas do serviço
proíbem placa que identifique o serviço e o público atendido, diferentemente do que se
recomenda aos acolhimentos de pessoas idosas, conforme Estatuto do Idoso 14, que em
seu artigo 37, § 2º prevê que “toda instituição dedicada ao atendimento ao idoso fica
obrigada a manter identificação externa visível, sob pena de interdição, além de atender
toda a legislação pertinente”.
Os equipamentos deverão respeitar as normas de acessibilidade de forma a garantir
o atendimento integrado a todos os públicos, especialmente às pessoas com deficiência
e às pessoas idosas. As equipes devem ser capacitadas, continuamente, para que seja
ofertado acolhimento inclusivo e de qualidade.
A modalidade de acolhimento familiar, destinada apenas para crianças e
adolescentes, é realizada em residências de famílias acolhedoras previamente cadastradas
e habilitadas para o acolhimento. As famílias devem passar por um processo de seleção,
capacitação e acompanhamento pelo serviço. O serviço de acolhimento familiar
proporciona o atendimento de crianças e adolescentes em ambiente familiar, garantindo
atenção individualizada e convivência comunitária. Em cada família acolhedora é recebida
uma criança ou adolescente por vez, exceto quando se tratar de grupo de irmãos.
Dependendo do público atendido, há que se observar a aplicação de medida
protetiva por autoridade judicial competente, como no caso de crianças e adolescentes
(ECA, Art. 101).
No acolhimento de pessoa idosa faz-se necessário respeitar o desejo da mesma em
ser acolhida, desde que esteja lúcida e consiga se manifestar. A aplicação de medida de
acolhimento pelo Ministério Público ou Poder Judiciário para idosos somente ocorrerá em
casos excepcionais. O Abrigo ou Casa Lar que acolhe pessoas idosas deverá firmar contrato
de prestação de serviços com a pessoa idosa abrigada, ou com seu representante legal, se
o mesmo for considerado incapaz, conforme previsão do artigo 35 do Estatuto do Idoso.
O acolhimento de pessoas com deficiência ocorre em unidades denominadas
Residências Inclusivas. Essas unidades destinam-se ao acolhimento de jovens e adultos
com deficiência, em situação de dependência, que não disponham de condições de
autossustento ou de retaguarda familiar, conforme estabelece a Tipificação Nacional dos
Serviços Socioassistenciais.
A primazia do trabalho técnico, no acolhimento, é sempre a reintegração familiar
e a convivência comunitária, sendo necessário para isso, além das intervenções junto ao
acolhido e sua família, estreita relação e articulação com as demais políticas setoriais,
com o Sistema de Garantia de Direitos, rede local, dentre outros. Essa articulação, além
de favorecer a reintegração familiar, oportuniza aos acolhidos a convivência comunitária,
evitando-se desta forma a sua segregação e o seu isolamento.

14 Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, destinada a regular os direitos assegurados às pessoas com
idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.

23
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Os serviços de acolhimento no âmbito do Suas são ofertados conforme modalidades


e unidades , descritas abaixo:

Público Modalidade de Serviço Unidade de Oferta


Serviço de Acolhimento Abrigo
Casa Lar
Crianças e Institucional Institucional
adolescentes
Serviço de Acolhimento em Residência de Famílias voluntárias,
Família Acolhedora denominadas “acolhedoras”

Jovens de Serviços de Acolhimento em


República
18 a 21 anos República

Jovens e adultos Serviços de Acolhimento


Residências Inclusivas
com deficiência Institucional

Serviços de Acolhimento Abrigo Casa Lar República


Pessoas Idosas
Institucional Institucional

Mulheres em Serviços de Acolhimento


situação de violência
Abrigo Institucional
Institucional

Adultos e Serviços de Acolhimento Abrigo


Casa Lar República
Famílias Institucional Institucional

Fonte: Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais. Elaboração própria.

Reordenamento dos Serviços



A consolidação da Assistência Social como política pública compreende um
conjunto de ações e iniciativas que visam à garantia dos direitos socioassistenciais e a
qualidade da oferta dos serviços, programas, projetos e benefícios no âmbito da proteção
social brasileira.
É histórico o processo de abrigamento de pessoas com direitos violados e situações
de abandono e negligência em grandes instituições, submetidas a precárias condições
de vida e ausência de cuidados, por longos períodos. Tais instituições costumam estar
localizadas distantes das áreas residenciais e de convívio comunitário, atendem a um
número muito grande de pessoas que ali ficam por um longo período (muitas vezes por
toda a vida).
Essas instituições tendem a concentrar em seu interior todas as atividades e
atendimentos aos residentes, dificultando ou mesmo impossibilitando o convívio social
externo, assim como a utilização dos espaços e serviços públicos e comunitários. Além
disso, a localização e a forma de atendimento de tais instituições costumam fragilizar

24
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

ainda mais ou mesmo romper os vínculos familiares quando existentes, uma vez que não
há apoio da família na sua função de cuidado e proteção a seus membros.
Dentre os vários avanços e inovações do Sistema Único de Assistência Social -
Suas, o reordenamento dos serviços de acolhimento constitui-se como um grande
desafio que visa romper com a lógica segregacionista de isolamento e apartação das
pessoas institucionalizadas. Por meio do reordenamento pretende-se também propiciar a
efetivação da garantia dos direitos das famílias e indivíduos que se encontram em situação
de vulnerabilidade e risco pessoal e social.
A proposta atual da política de acolhimento é proteger, enquanto persistir a situação
de violação de direitos, tendo sempre como foco a desinstitucionalização. Nesse sentido,
a função de proteção não significa apenas a retirada dos indivíduos do ambiente cujas
condições precárias de cuidado ensejaram o acolhimento. Proteção significa, também,
possibilitar a esta pessoa, na medida do possível, as condições necessárias para que
conviva com a comunidade, para que acesse políticas públicas essenciais para seu
desenvolvimento pleno, como a educação e a saúde, dentre outros.

Reordenar significa reorientar os serviços públicos e privados para


que possam se adequar aos parâmetros de funcionamento, às normativas
e às orientações e legislações vigentes, às metodologias, qualificando o
atendimento aos usuários dos serviços.

O reordenamento não deve estar direcionado apenas para a reestruturação


de espaços físicos dos serviços, mas também para estimular a capacidade de cada
indivíduo/família adquirir maior nível de autonomia, dignidade e sentimento de
pertencimento, na perspectiva de romper com a lógica do isolamento e segregação,
e propiciar a efetivação da garantia dos direitos das pessoas acolhidas. Este novo
paradigma compreende os usuários como cidadãos, sujeitos de direitos, que devem
ter assegurado o acesso a cuidados e equipamentos que possibilitem a interação e/
ou superação das violações de direito sofridas e, assim, garantir-lhes igualdade de
oportunidades para desenvolver suas potencialidades, autonomia, bem como gozar do
direito à convivência familiar e comunitária.
O reordenamento deve ser concebido como um processo gradativo de adequação
dos serviços de acolhimento em parceria com outros serviços socioassistenciais,
sociedade civil e demais políticas públicas. Deve ser desenvolvido com ações planejadas
e conjuntas da gestão, equipe técnica, usuários dos serviços e a rede, para mobilização e
escolha das melhores estratégias para a implementação das mudanças necessárias.

O processo de reordenamento deve considerar os seguintes eixos:

• Estruturação de uma rede de serviços de acolhimento condizente com a demanda;

• Adequação da estrutura física e da capacidade de atendimento, de acordo com os

25
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

parâmetros estabelecidos nas normativas de cada serviço, considerando o público e a


modalidade do serviço ofertado;

• Estruturação das equipes do serviço, de acordo com a NOB-RH 15 e Resolução CNAS


N º17 de 20 de junho de 2011 16;

• Capacitação permanente dos recursos humanos dos serviços de acolhimento e do


órgão gestor;

• Adequação da metodologia aos públicos específicos, às violações de direitos sofridas


e às situações de dependência e cuidados necessários, visando alcançar a superação dos
motivos que culminaram no acolhimento, maior nível de autonomia e construção de novos
projetos de vida;

• Articulação dos serviços de acolhimento com os demais serviços socioassistenciais,


demais políticas públicas e órgãos de defesa de direitos;

• Coordenação da rede de serviços de acolhimento pelo órgão gestor da Assistência


Social, a quem compete realizar a gestão das vagas e o apoio, supervisão e acompanhamento
dos serviços (governamentais e não governamentais).

15 A Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Suas (NOB-RH/SUAS) estabelece e consolida


os principais eixos a serem considerados para a gestão do trabalho e educação permanente no âmbito do
Sistema Único de Assistência Social (Suas).
16 Ratifica a equipe de referência definida pela Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do
Sistema Único de Assistência Social – NOB-RH/Suas e reconhece as categorias profissionais de nível
superior para atender as especificidades dos serviços socioassistenciais e das funções essenciais de gestão
do Sistema Único de Assistência Social – Suas.

26
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Para ilustrar de forma prática como se dá o processo de reordenamento dos


serviços de acolhimento institucional, descrevemos um caso fictício de uma unidade de
acolhimento com fragilidades em suas várias dimensões de atendimento.

O caso, a unidade de acolhimento e seu funcionamento.

A unidade de acolhimento para idosos, “Casa da Feliz Idade”, está situada em


uma região bastante aprazível, longe do centro urbano, sem os barulhos da cidade.
Possui uma equipe composta por um geriatra, uma enfermeira, dois
cuidadores e um profissional que cuida da limpeza, pois os idosos ali acolhidos
possuem certa autonomia e independência. Não se elabora o Plano de Atendimento
Individual, considerando que os vínculos familiares dos idosos acolhidos na unidade
foram rompidos e nenhum deles recebe visita.
Trata-se de ambiente muito acolhedor, os idosos dormem em amplos quartos,
que acomodam até sete idosos cada, o que facilita o trabalho do profissional da
limpeza, pois diminui o número de quartos a serem higienizados.
Uma vez por mês, a coordenação da unidade realiza um baile, com a presença
de músicos da igreja, momento em que os idosos participam ativamente.

Verificamos no caso hipotético acima que a unidade descrita apresenta fragilidades


em todas as dimensões que compõem o Id Acolhimento, quais sejam, estrutura física,
gestão e atividades e recursos humanos.
Assim, a unidade deverá se adequar ao que exigem as normativas e legislações
referentes ao acolhimento de pessoas idosas, considerando os seguintes aspectos a
serem reordenados:

a. Dimensão Estrutura Física


A localização da unidade de acolhimento não está em conformidade com a política
de atendimento à pessoa idosa, pois é afastada geograficamente do centro urbano, o que
denota um caráter de isolamento e segregação, por dificultar tanto a convivência familiar
quanto comunitária, assim como o acesso aos serviços socioassistenciais e demais
políticas setoriais (saúde, educação, lazer, etc.).
A ocupação/usuário por quarto não é a recomendada. A ocupação máxima, para os
serviços de acolhimento de pessoas idosas, por dormitório, é de até quatro pessoas.
Reordenamento: Mudar a localização do Abrigo, possibilitando que os usuários
tenham garantido o direito à convivência familiar e comunitária, acesso aos serviços dos
quais necessitam, bem como a participação em atividades culturais, recreativas e de lazer
da comunidade. Realizar a adequação do número de usuários por quarto.

27
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

b. Dimensão Gestão e Atividades


O Plano Individual de Atendimento – PIA, instrumento metodológico obrigatório
para os serviços de acolhimento, deve ser elaborado para todos os usuários do serviço,
destacando-se que atividades individuais e de reconstrução e/ou fortalecimento de
vínculos familiares deverão fazer parte das ações planejadas para cada usuário acolhido.
Ressalta-se que a elaboração do PIA é atribuição da equipe técnica, e essa unidade de
acolhimento não a possui.
Reordenamento: Elaboração do PIA, por equipe técnica a ser contratada, conforme
disposto na NOB-RH/SUAS.

c. Dimensão Recursos Humanos



A equipe de referência da unidade de acolhimento é composta por profissionais da
saúde, o que não é previsto na Assistência Social – NOB-RH/Suas.

Reordenamento: Para compor a equipe deverão ser contratados, coordenador,


assistente social e psicólogo (equipe técnica) e cuidadores, além dos demais
profissionais para as atividades de limpeza, preparação da alimentação e lavanderia.
Importante destacar que todo processo de reordenamento de serviços deve ser
precedido de um planejamento, no qual devem constar:

• Ações a serem realizadas;

• Definição de metas;

• Definição de prazos para a execução;

• Definição de responsabilidades;

• Monitoramento e avaliação.

28
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Capítulo 2
2.1 A Intersetorialidade e a Integralidade no SUAS
A compreensão de intersetorialidade surgiu associada ao conceito de rede como
uma nova concepção de gestão, contrária à setorialização e à especialização, propondo,
por outro lado, integração, articulação dos saberes e dos serviços ou mesmo a formação
de redes de parcerias entre sujeitos coletivos no atendimento às demandas dos cidadãos.
A intersetorialidade aparece como uma estratégia de gestão integrada para a
abordagem dos problemas sociais, respeitando a autonomia de cada ator envolvido no
processo. Desse modo, pode ser entendida como uma articulação de saberes e experiências
com vistas ao planejamento, para a realização e avaliação de ações, com o objetivo de
alcançar resultados integrados em situações complexas, visando um efeito sinérgico no
desenvolvimento social. Visa promover um impacto positivo nas condições de vida da
população, num movimento de reversão da exclusão social. Trata-se de uma nova lógica de
gestão pública, que busca superar a fragmentação das políticas, considerando o indivíduo
como um todo.
Ao estabelecer a intersetorialidade como um de seus eixos estruturantes, a Política
de Assistência Social e as demais políticas sociais de caráter integral ensejam a superação
de barreiras ao enfrentar os obstáculos de um ambiente historicamente setorial; obstáculos
estes que dificultam a consolidação da ação em rede e da intersetorialidade na esfera
prática.
Nos serviços de acolhimento institucional, independente do público para o qual
se destinam, são necessárias mudanças na operacionalização do atendimento. Essas
perpassam pela compreensão das questões sociais a partir de uma visão interdisciplinar
e integral, cujo enfrentamento deve ser articulado, envolvendo as várias políticas públicas
(saúde, educação, cultura, esporte e lazer, segurança pública, dentre outras), e o Sistema
de Garantia de Direitos.

Importante: A proteção integral a que tem direito as crianças e


os adolescentes acolhidos deve ser viabilizada por meio da utilização de
equipamentos da rede socioassistencial e rede de serviços local.

Nessa lógica, a intersetorialidade deve ser compreendida como um arranjo


complementar, capaz de dar respostas às demandas que as políticas setoriais, em virtude
de suas limitações, não conseguem obter a resolutividade almejada.
Já a integralidade consiste na integração dos trabalhos desenvolvidos pelas
diversas políticas públicas, instituições, setores privados e a sociedade em geral,
evitando assim que ações de um mesmo eixo e de mesmo objetivo sejam sobrepostas

29
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

por vários atendimentos.


Nesse sentido, o desenvolvimento de ações intersetoriais e da integralidade nos
serviços de acolhimento promove a sua qualificação, proporcionando um olhar mais
amplo e integral às demandas dos usuários e, consequentemente, o alcance de forma
mais eficaz dos objetivos do serviço: fortalecimento de vínculos, superação das situações
de violações vivenciadas e integração ou reintegração familiar.
Portanto, é fundamental a articulação intersetorial entre os atores que compõem a
rede do serviço de acolhimento, definindo estratégias de trabalho, fluxos de atendimento e
encaminhamentos, consolidando assim a intersetorialidade e a integralidade, superando a
fragilidade de ações fragmentadas e personificadas.

2.2 Modalidades de Acolhimento e Formas de


Acesso aos Serviços

2.2.1 Público: Crianças, Adolescentes e Jovens

O acolhimento de crianças e adolescentes é regulamentado pelo Estatuto da


Criança e do Adolescente-ECA, Lei n.º 8.069/1990, alterado pelas Leis nº. 12.010/2009, Lei
12.962/2014 e Lei 13.509/2017, Resolução Conjunta nº. 01/ 2009, do Conselho Nacional de
Assistência Social (CNAS) e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
(Conanda), que aprovou o documento “Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento
para Crianças e Adolescentes”, Plano Nacional de Promoção da Convivência Comunitária e
Familiar 17, Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes 18 e Diretrizes
Internacionais para Cuidados Alternativos a crianças sem cuidados parentais19.
O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, em seu art. 101, que crianças

17 O Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária foi aprovado em assembleia pelos Conselhos
Nacionais dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e de Assistência Social (CNAS) em dezembro
de 2006. O plano apresenta a concepção de políticas integradas às famílias e não apenas focadas na criança
e no adolescente de forma isolada. O objetivo é fortalecer a rede de proteção social à família, de forma
a prover-lhe todo o suporte necessário à criação e à educação das crianças e a minimizar os prejuízos
decorrentes das situações em que a separação é inevitável.
O reordenamento dos abrigos e a promoção de políticas públicas voltadas para o desabrigamento e para a
construção de alternativas ao acolhimento de crianças e adolescentes são aspectos essenciais do plano.

18 O Plano Nacional dos Direitos Humanos de Crianças e de Adolescentes, conhecido como “Plano
Decenal”, tem como finalidade assegurar a doutrina da proteção integral a crianças e adolescentes a partir
da articulação entre diversas políticas públicas. Como desdobramento deste Plano Nacional, as unidades
da federação – Estados, Distrito Federal e Municípios – devem elaborar seus planos locais levando em
consideração suas realidades distintas, seja a partir do ponto de vista de suas demandas, seja dos seus
recursos e estratégias de superação das vulnerabilidades e de promoção de direitos.

19 As diretrizes orientam os estados-membros da Organização das Nações Unidas-ONU em relação ao

30
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

e adolescentes que tenham sofrido violações de direitos só poderão ser abrigados após
aplicação de medida protetiva de acolhimento familiar ou institucional, por autoridade
judicial competente, destacando-se a prioridade pelo Acolhimento Familiar em detrimento
ao Institucional. Essa medida deverá ter caráter excepcional e provisório, não podendo
ultrapassar o prazo de 18 (dezoito) meses, conforme alteração trazida pela Lei nº. 13.509,
de 22 de novembro de 2017.
O acolhimento institucional de crianças e adolescentes dar-se-á nas modalidades
de Abrigo Institucional e Casa Lar. O acolhimento de jovens oriundos do acolhimento
institucional, sem êxito na reintegração familiar ou colocação em família substituta, que
permaneceram na unidade de acolhimento até completar a idade de 18 (dezoito) anos,
deve ser realizado no serviço de acolhimento em república. Já o acolhimento familiar se
dará em residências de famílias habilitadas para a função de acolher.
O acolhimento familiar e institucional, em qualquer uma de suas modalidades,
deverá contar com equipe profissional de referência exclusiva ao serviço e estrutura física
adequada ao público atendido, não devendo ainda ter placa que identifique o serviço e
o público ao qual se destina, em conformidade com as Orientações Técnicas: Serviço de
Acolhimento para Crianças e Adolescentes (2009).

a. Serviço de acolhimento institucional: Abrigo e Casa Lar


Abrigo e Casa Lar são modalidades de acolhimento institucional que oferecem
acolhimento provisório para crianças e adolescentes, na faixa etária de zero a 18 anos
incompletos, afastados do convívio familiar por meio de medida protetiva de abrigo (ECA,
Art. 101). Esse afastamento pode ocorrer em função de abandono ou quando as famílias ou
responsáveis pelas crianças e adolescentes acolhidos encontrarem-se temporariamente
impossibilitados de cumprir sua função de cuidado e proteção, até que seja viabilizado o
retorno ao convívio com a família de origem ou, na sua impossibilidade, encaminhamento
para família substituta.
O serviço deve ter aspecto semelhante ao de uma residência e estar inserido
na comunidade, em áreas residenciais, oferecendo ambiente acolhedor e condições
institucionais para o atendimento com padrões de dignidade. Deve ofertar atendimento
personalizado e em pequenos grupos e favorecer o convívio familiar e comunitário das
crianças e adolescentes atendidos, bem como a utilização dos equipamentos e serviços
disponíveis na comunidade local.
O Abrigo poderá acolher até vinte 20 crianças e adolescentes, a Casa Lar até, no
máximo dez crianças e adolescentes, sendo que ambas as modalidades deverão evitar
especializações e atendimento exclusivo, tais como, apenas crianças e adolescentes
de determinado sexo ou que possuem deficiência, ou que vivem com o vírus HIV/Aids
ou faixa etária muito estreita, de forma que o acolhimento não se estabeleça de forma
preconceituosa ou estigmatizante.
A Casa Lar difere-se do Abrigo, basicamente, em dois aspectos: em sua capacidade

atendimento a crianças e adolescentes privadas da convivência familiar e a melhor forma de protegê-las.


20 Embora os Serviços de Acolhimento possuam capacidade máxima de atendimento, conforme
orientações Técnicas do Conanda, o Abrigo ou Casa Lar, deverá atenderá observar a capacidade de
acolhimento, garantindo assim um atendimento humanizado e qualificado aos acolhidos.

31
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

de atendimento, que é menor, e na composição da equipe, que conta com um Educador/


Cuidador Residente21.

b. República para Jovens


Serviço de acolhimento que oferece apoio e moradia subsidiada para jovens de
18 a 21 anos, especialmente para aqueles com os quais se esgotaram as intervenções
técnicas para a reintegração familiar ou colocação em família substituta e permaneceram
no acolhimento até completarem a maioridade, não possuindo ainda condições de
autossustento.
A República é um equipamento que organiza o acolhimento para o atendimento a
até seis jovens por unidade, com separação por gênero (unidades masculinas e unidades
femininas), com acessibilidade e estrutura de uma residência privada, contando com uma
equipe de referência para a supervisão da gestão coletiva da moradia e acompanhamento
psicossocial dos acolhidos.
Por ser a juventude uma fase transitória para a vida adulta, algumas intervenções
merecem atenção especial. Citamos como aspectos importantes a serem contemplados
no PIA dos jovens: os direitos sexuais e reprodutivos, a identidade de gênero e a proteção à
maternidade. Também é importante que a equipe de referência ofereça apoio à construção
de projetos de vida desses jovens, preparando-os para seu desligamento. Não existe um
tempo determinado para a permanência do jovem na República, devendo-se avaliar cada
caso. Alguns necessitam de um tempo maior para adquirir sua autonomia.

2.2.2 Público: Pessoas Idosas


Conforme previsto na Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, o
acolhimento de pessoas idosas se dá por meio do serviço de acolhimento institucional,
nas modalidades: Abrigo e Casa Lar.
Destina-se a pessoas com 60 anos ou mais, de ambos os sexos, independentes e/ou
com diversos graus de dependência. É previsto para pessoas idosas que não dispõem de
condições para permanecer com a família, idosos em situação de rua e de abandono, com
vínculos familiares fragilizados ou rompidos. É também previsto para pessoas idosas com
vivência de situações de negligência familiar, institucional, de autonegligência, abusos,
maus tratos e outras formas de violência.
Os idosos com vínculo de parentesco ou afinidade – casais, irmãos, amigos,
etc., devem ser atendidos na mesma unidade. Preferencialmente, deve ser ofertado aos
casais de idosos o compartilhamento do mesmo quarto. Idosos com deficiência devem
ser incluídos nesse serviço de modo a prevenir práticas segregacionistas e o isolamento
desse segmento.
A natureza do acolhimento deverá ser provisória e, excepcionalmente, de longa
duração, quando esgotadas todas as possibilidades de autossustento e convívio com os
familiares. Nesse sentido, é de suma importância que os técnicos que trabalham neste
serviço, em conjunto com a rede socioassistencial, quando for o caso, propiciem atividades

21 Formação Mínima: nível médio e capacitação específica. Profissional que trabalha e reside na Casa Lar.

32
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

de convivência familiar e comunitária e de resgate da autoestima e da autonomia. O idoso


não deve ficar isolado no acolhimento, mas participar de serviços e programas do Cras
e do Creas e de atividades culturais e de lazer no território, sendo respeitado em seus
desejos, potencialidades e limitações.
Acolhimento em República: Serviço que oferece apoio, proteção e moradia
subsidiada a idosos que tenham capacidade de gestão coletiva da moradia e condições
de desenvolver, de forma independente, as atividades da vida diária, mesmo que requeiram
o uso de equipamentos de autoajuda. Apresenta-se como uma opção de alternativa de
cuidados, e, por vezes, atende a uma opção voluntária e desejada pelo próprio idoso, que
busca essa opção de moradia por não querer “dar trabalho” para a família, e também para
estar entre pessoas na mesma condição que a sua.
Deve-se garantir a convivência da pessoa idosa com sua família, amigos e pessoas
que lhes sejam significativas, e ainda proporcionar a participação em atividades culturais,
educativas, lúdicas e de lazer em espaços da comunidade.

2.2.3 Público: Jovens e Adultos com Deficiência

Residência Inclusiva
A Residência Inclusiva é uma unidade que oferta serviço de acolhimento
institucional, no âmbito da Proteção Social Especial de Alta Complexidade do Suas, para
jovens e adultos com deficiência (18 a 59 anos), em situação de dependência, que não
disponham de condições de autossustentabilidade, de retaguarda familiar temporária ou
permanente, ou que estejam em processo de desinstitucionalização de instituições de
longa permanência. Atende prioritariamente beneficiários do BPC, que não disponham de
condições de autossustentabilidade ou de retaguarda familiar.
O trabalho nas Residências Inclusivas deve promover a inclusão desse público na
vida comunitária e social e contribuir para a construção progressiva da autonomia dos
usuários.
Todos os serviços de acolhimento devem assegurar a convivência com familiares,
amigos e pessoas de referência e assegurar acesso às atividades culturais, educativas,
lúdicas e de lazer na comunidade.
Os serviços de acolhimento que atendem pessoas idosas e pessoas com deficiência
devem contar com pessoal habilitado, treinado e supervisionado por equipe técnica
capacitada para auxiliar nas atividades da vida diária.

33
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

2.3 Equipe de Referência


As equipes de referência diferem de acordo com o público atendido e também de
acordo com a modalidade de acolhimento.
O quadro de recursos humanos poderá ser acrescido de outros profissionais de
acordo com a demanda, considerando o público, a caracterização das deficiências e o
grau de dependência de cada usuário.
Todos os profissionais do acolhimento devem ter uma postura acolhedora
que estabeleça relacionamentos horizontais, com respeito e estímulo ao processo de
autonomia dos acolhidos. Destaca-se a necessidade de capacitação inicial e continuada
para todos os profissionais que atuam nos serviços de acolhimento.
Dada a complexidade dos serviços de acolhimento e, em cumprimento às normativas
e orientações técnicas referentes a cada público, as equipes deverão ser exclusivamente
destinadas para esse serviço, respeitando-se o número mínimo de profissionais
necessários, carga horária mínima e o cumprimento das atribuições de cada profissional.

2.3.1. Descrição das equipes de referência dos serviços


a. Público: crianças e adolescentes

Modalidade: Abrigo

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

Curso Superior e experiência em


função congênere

Experiência na área e amplo


conhecimento da rede de proteção
Gestão da unidade; elaboração
à infância e juventude, de políticas
do Projeto Político Pedagógico do
públicas e da rede de serviços da
1 Coordenador serviço, em conjunto com equipe
cidade e região.
técnica e demais colaboradores;
Gestão; trabalho em rede;
Carga horária: organização da seleção e contratação
conhecimentos sobre seleção
40 (quarenta) de pessoal e supervisão dos trabalhos
e desenvolvimento de recursos
horas semanais; desenvolvidos; articulação com a
humanos; conhecimento aprofundado
rede de serviços; articulação com o
sobre como se organiza os serviços
Sistema de Garantia de Direitos.
em consonância com os princípios,
diretrizes e as orientações contidas
nas normativas e políticas nacionais
de atendimento de acordo com o
público atendido.

34
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

Elaboração, em conjunto com


o/a coordenador (a) e colaboradores,
do Projeto Político Pedagógico;
acompanhamento psicossocial dos
usuários, suas respectivas famílias, com
vistas à reintegração familiar; apoio na
seleção dos cuidadores/educadores
e demais funcionários; capacitação
e acompanhamento dos cuidadores/
educadores e demais funcionários;
apoio e acompanhamento do
trabalho dos educadores/cuidadores;
encaminhamento, discussão e
Curso Superior: Serviço Social e planejamento conjunto com outros
Equipe Técnica Psicologia atores da rede de serviços e do SGD
2 profissionais das intervenções necessárias ao
Experiêncianoatendimento acompanhamento dos acolhidos e suas
para a crianças, adolescentes e famílias
atendimento a famílias; organização das informações
em situação de risco; violações de dos acolhidos e famílias, na forma
até 20 crianças/ direitos; vinculações; atendimento
adolescentes. de prontuário individual; elaboração,
em grupo; trabalho em rede; encaminhamento e discussão com
acesso a serviços, programas a autoridade judiciária e Ministério
Carga horária e benefícios; conhecimento da
mínima Público de relatórios semestrais sobre a
política de assistência social, situação de cada criança e adolescente,
recomendada: Suas, legislações e normativas
30 (trinta) horas apontando se há possibilidade de
específicas de acordo com o reintegração familiar, necessidade
semanais. público acolhido, dentre outras. de aplicação de novas medidas, ou
quando esgotados os recursos de
manutenção na família de origem, a
necessidade de encaminhamento para
adoção; preparação do acolhido para
o desligamento (em parceria com o(a)
cuidador(a)/educadora(a) de referência);
mediação, em parceria com o educador/
cuidador de referência, do processo
de aproximação e fortalecimento ou
construção do vínculo com a família de
origem ou adotiva, quando for o caso.

35
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

Auxiliar de
educador/
cuidador22 Nível Fundamental e capacitação Apoio às funções do cuidador;
específica cuidados com a moradia (organização
1 profissional para
atendimento a e limpeza do ambiente e preparação
Desejável experiência em atendimento dos alimentos, dentre outros).
até 10 crianças e a crianças e adolescentes.
adolescentes por
turno.

Fonte: Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes/2009. Elaboração Própria.

Modalidade: Casa Lar

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

Gestão da(s) unidade(s); elaboração


Coordenador Nível superior
do Projeto Político Pedagógico do
serviço, em conjunto com a equipe
1 profissional para Experiência em função congênere;
técnica e demais colaboradores;
atendimento a experiência na área; amplo
organização da seleção e contratação
até 20 crianças e conhecimento da rede de proteção
de pessoal e supervisão dos trabalhos
adolescentes em à infância e juventude, de políticas
desenvolvidos; articulação com a
até 3 Casas Lares. públicas e da rede de serviços da
rede de serviços; articulação com o
cidade e região.
Sistema de Garantia de Direitos.

22 Para preservar o caráter de proteção e por acolher, em um mesmo ambiente, crianças e adolescentes
com diferentes históricos, faixa etária e gênero, faz-se necessário que o abrigo mantenha uma equipe noturna
acordada e atenta à movimentação.

36
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

Acompanhamento psicossocial
dos usuários e suas respectivas
famílias, com vistas à reintegração
familiar; elaboração, em conjunto com
o/a educador/a cuidador residente e,
sempre que possível, com a participação
das crianças e adolescentes atendidos,
de regras e rotinas fundamentadas no
projeto político pedagógico da entidade;
apoio na seleção dos cuidadores/
educadores residentes e demais
funcionários; apoio e acompanhamento
do trabalho dos educadores/cuidadores;
capacitação e acompanhamento dos
cuidadores/educadores residentes e
Equipe Técnica demais funcionários; encaminhamento,
discussão e planejamento conjunto
2 profissionais com outros atores da rede de
para atendimento Nível superior serviços e do SGD das intervenções
a até 20 crianças necessárias ao acompanhamento
e adolescentes Experiência no atendimento a das crianças e adolescentes e suas
acolhidos em até crianças, adolescentes e famílias famílias; organização das informações
3 Casas Lares. em situação de risco. das crianças e adolescentes e
respectivas famílias, na forma de
Carga Horária: prontuário individual; elaboração,
30 horas encaminhamento e discussão com
semanais autoridade judiciária e Ministério
Público de relatórios semestrais
sobre a situação de cada criança e
adolescente apontando: possibilidades
de reintegração familiar; necessidade de
aplicação de novas medidas; ou, quando
esgotados os recursos de manutenção
na família de origem, a necessidade
de encaminhamento para adoção;
preparação, da criança / adolescente
para o desligamento (em parceria
com o cuidador (a)/educador (a)
residentes); mediação, em parceria com
o cuidador (a) /educador (a) residente,
do processo de aproximação e (re)
construção do vínculo com a família de
origem ou adotiva, quando for o caso;
acompanhamento da família de origem
no período pós-reintegração familiar.

37
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

Organização da rotina
doméstica e do espaço residencial;
cuidados básicos com alimentação,
higiene e proteção; relação afetiva,
personalizada e individualizada
com cada criança e/ou adolescente;
organização do ambiente (espaço
físico e atividades adequadas ao grau
de desenvolvimento de cada criança
ou adolescente); auxílio à criança
e ao adolescente para lidar com
Educador/Cuidador sua história de vida, fortalecimento
residente23 Nível Fundamental e capacitação
específica da autoestima e construção da
identidade; organização de fotografias
1 profissional para e registros individuais sobre o
até 10 usuários. Desejável experiência em atendimento
a crianças e adolescentes. desenvolvimento de cada criança e/ou
adolescente, de modo a preservar sua
história de vida; acompanhamento
nos serviços de saúde, escola e outros
serviços requeridos no cotidiano.
Quando se mostrar necessário e
pertinente, um profissional de nível
superior (psicólogo ou assistente
social) deverá também participar
deste acompanhamento; apoio na
preparação da criança ou adolescente
para o desligamento, sendo para
tanto orientado e supervisionado por
um profissional de nível superior.

Auxiliar de
educador/cuidador Nível Fundamental e capacitação
Apoio às funções do cuidador;
específica cuidados com a moradia (organização
1 profissional para
atendimento a e limpeza do ambiente e preparação
Desejável experiência em atendimento dos alimentos, dentre outros).
até 10 crianças e a crianças e adolescentes.
adolescentes por
turno.

Fonte: Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes/2009. Elaboração Própria.

23 Se a Casa Lar atender pessoas com deficiência, com necessidades específicas de saúde ou idade
inferior a um ano, deverá adotar a seguinte relação:
a) 1 cuidador para cada 8 usuários, quando houver 1 usuário com demandas específicas;
b) 1 cuidador para cada 6 usuários, quando houver 2 ou mais usuários com demandas específicas.

38
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora


Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função
Gestão e supervisão do funcionamento
do serviço; organização da divulgação
do serviço e mobilização das famílias
Nível Superior e experiência em acolhedoras; organização da seleção
função congênere e contratação de pessoal e supervisão
Coordenador
dos trabalhos desenvolvidos;
Amplo conhecimento da rede de organização das informações das
1 profissional por proteção à infância e juventude,
serviço. crianças e adolescentes e respectivas
de políticas públicas e da rede de famílias; articulação com a rede de
serviços da cidade e região. serviços; articulação com o Sistema
de Garantia de Direitos.

Acolhida, avaliação, seleção,


capacitação, acompanhamento,
desligamento e supervisão das
famílias acolhedoras; articulação
com a rede de serviços e Sistema
de Garantia de Direitos; preparação
e acompanhamento psicossocial
das famílias de origem, com
vistas à reintegração familiar;
acompanhamento das crianças
e adolescentes; organização das
informações de cada caso atendido,
Equipe técnica
na forma de prontuário individual;
encaminhamento e discussão /
1 Assistente social Nível Superior
planejamento conjunto com outros
e 1 psicólogo (para
atores da rede de serviços e do
o atendimento de Experiência no atendimento a
Sistema de Garantia de Direitos
até 15 famílias crianças, adolescentes e famílias em
das intervenções necessárias ao
de origem e situação de risco.
acompanhamento das
15 famílias
crianças e adolescentes e suas
acolhedoras)
famílias; elaboração, encaminhamento
e discussão com a autoridade judiciária
e Ministério Público de relatórios,
com frequência bimestral ou
semestral, sobre a situação de cada
criança e adolescente, apontando:
possibilidades de reintegração
familiar; necessidade de aplicação de
novas medidas; ou, quando esgotados
os recursos de manutenção na
família de origem, a necessidade de
encaminhamento para adoção.

Fonte: Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes/2009. Elaboração Própria.

39
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Importante: No serviço de acolhimento a famílias acolhedoras, temos como equipe


de referência o coordenador, a equipe técnica (psicólogo e assistente social), para o
atendimento a até 15 (quinze) famílias. Essa modalidade não necessita de cuidador/
educador, pois as atribuições inerentes a essa função são realizadas pela própria família
que acolhe.

b. Público: jovens (18 a 21 anos)

Serviço de Acolhimento em Repúblicas

Nesta modalidade de acolhimento a equipe de referência é composta por


um coordenador para até quatro unidades de acolhimento, a equipe técnica para
atendimento a até 24 (vinte e quatro) jovens, em até quatro unidades. Na República,
é dispensável a função do cuidador/educador, pois esta modalidade de acolhimento
tem o caráter de gestão compartilhada de emancipação dos jovens e promoção da
autonomia. Assim, são os próprios jovens que realizam os cuidados com o espaço
físico e a gestão da unidade, em conjunto com a equipe de referência.

c. Público: pessoas idosas

Os serviços de acolhimento para pessoas idosas deverão compor sua equipe, em


conformidade com a NOB-RH /SUAS e a Resolução CNAS nº. 7, de 20 de junho de 2011.

Serviço de Acolhimento Institucional: Abrigo

Descrição Capacidade Recursos Humanos

• 1 Coordenador
• 1 Assistente Social
Unidade • 1 Psicólogo
institucional com Até 4 (quatro) pessoas idosas • 1 Profissional para desenvolvimento de
característica por quarto. atividades socioculturais
domiciliar. • Cuidadores sociais
• Profissional de limpeza
• Profissional de alimentação
• Profissional de lavanderia

Fonte: Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Suas NOB-RH/SUAS. Elaboração própria.

40
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Serviço de Acolhimento Institucional: Casa Lar

Descrição Capacidade Recursos Humanos

Coordenador: 1 para até 20 usuários (até


2 equipamentos)

Cuidador: nível médio e qualificação


específica; 1 profissional para até 10
usuários, por turno.

Auxiliar de cuidador: nível fundamental


e qualificação específica; 1 profissional
para até 10 usuários, por turno.

A quantidade de cuidador e auxiliar


Unidade de cuidador por usuário deverá ser
institucional com aumentada quando houver usuários que
característica Até 10 pessoas idosas. demandem atenção específica. Para
domiciliar. tanto, deverá ser adotada a seguinte
relação:

a) 1 auxiliar de cuidador para cada 8


usuários, quando houver 1 usuário com
demandas específicas;
b) 1 auxiliar de cuidador para cada 6
usuários, quando houver 2 ou mais
usuários com demandas específicas.

Equipe de Referência - atendimento


psicossocial:
Assistente social e psicólogo: 1
profissional para cada 20 usuários
acolhidos, em até dois equipamentos.

Fonte: Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Suas NOB-RH/SUAS. Elaboração própria.

41
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Serviço de Acolhimento Institucional: República

Descrição Capacidade Recursos Humanos

Coordenador: nível superior, 1profissional


Unidade para até 20 usuários.
institucional com
característica Até 10 pessoas idosas. Assistente social e psicólogo: nível
domiciliar. superior, 1 profissional para atendimento
a, no máximo, 20 usuários, em até dois
equipamentos.

Fonte: Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Suas NOB-RH/SUAS. Elaboração própria.

Vale destacar que os serviços de acolhimento para pessoas idosas ainda não foram
reordenados segundo os parâmetros do Suas, portanto, cumprem também o que determina
a Agência Nacional de Vigilância Sanitária- ANVISA, Resolução de Diretoria Colegiada
nº.283, de 26 de setembro de 2005 24.
Vide quadro comparativo com as equipes do acolhimento para pessoas idosas,
considerando o que determina o Suas e a Anvisa.

24 Especifica a equipe de referência de acordo com as atividades (responsável técnico, atividades de


lazer, de limpeza, alimentação) e cuidadores, conforme o grau de dependência dos usuários.

42
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Recursos Humanos – Istituição de Acolhimento – Idosos

RDC nº. 283/2005 – ANVISA NOB-RH/SUAS

Deve apresentar recursos humanos, com vínculo formal de


trabalho, que garantam a realização das seguintes atividades:

• Coordenação técnica: Responsável Técnico (RT) – carga


horária mínima de 20h/semana;
• Lazer: 1 profissional de nível superior para cada 40 idosos
(12h/semana);
• Limpeza: 1 profissional para cada 100m² de área interna ou Equipe de referência para
fração por turno, diariamente; atendimento direto
• Alimentação: 1 profissional para cada 20 idosos, garantindo
a cobertura de dois turnos de 8 horas; Nível fundamental:
• Lavanderia: 1 profissional para cada 30 idosos, ou fração,
diariamente. • Profissional de
limpeza
Em relação aos cuidadores, estes variam de acordo com • Profissional de
os graus de dependência, conforme pode ser verificado na alimentação
tabela a seguir: • Profissional de
lavanderia
Graus de
Nº. de cuidadores necessários
Dependência Nível médio:

1 para cada 20 idosos, ou fração, com Cuidadores sociais


Grau I carga horária de 8h/dia.
Nível superior:
Grau II 1 para cada 10 idosos, ou fração, por turno.
• 1 Coordenador
• 1 Assistente
Social
Grau III 1 para cada 6 idosos, ou fração, por turno.
• 1 Psicólogo
• 1 Profissional
para desenvolvimento de
• A instituição que possuir profissional de saúde vinculado à atividades socioculturais
sua equipe de trabalho deve exigir registro desse profissional no
seu respectivo Conselho de Classe.

• A instituição deve realizar atividades de educação


permanente na área de gerontologia, com objetivo de aprimorar
tecnicamente os recursos humanos envolvidos na prestação de
serviços aos idosos.

43
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

d. Público: jovens e adultos com deficiência


A equipe técnica do serviço de acolhimento para pessoas com deficiência –
Residência Inclusiva - deve basear-se nas orientações da Tipificação Nacional dos
Serviços Socioassistenciais e Resolução CNAS Nº. 17, de 20 de junho de 2011.
O quadro abaixo apresenta a composição da equipe de referência para o serviço de
acolhimento institucional na Residência Inclusiva:

Residência Inclusiva

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

Gestão do serviço; elaboração, em


conjunto com os técnicos e demais
colaboradores, do Plano Individual de
Nível superior em Ciências Humanas Atendimento, do Plano de Organização
e experiência na área de atenção às do Cotidiano; organização da seleção
pessoas com deficiência. e contratação de pessoal e supervisão
1 Coordenador
dos trabalhos desenvolvidos;
Experiência e amplo conhecimento articulação com a rede de serviços e
Para até 3
das políticas públicas na área de Conselhos de Direitos; mediação de
Residências
atenção às pessoas com deficiência, conflitos e interesses; gerenciamento
Inclusivas.
da rede socioassistencial e demais de dos cuidados relacionados às
serviços da cidade e região. residências; organização do cotidiano;
administração direta e/ou supervisão,
quando for o caso, dos benefícios ou
eventuais rendas dos moradores, em
conjunto com o cuidador de referência.

Elaboração, em conjunto com o


Equipe técnica coordenador e demais colaboradores,
do Plano Individual de Atendimento e
1 Psicólogo do Plano de Organização do Cotidiano;
(para até 3 acompanhamento psicossocial
Residências Nível Superior e do grau de desenvolvimento
Inclusivas) pessoal e funcional dos usuários;
Experiência no atendimento a acompanhamento psicossocial de
1 Assistente social pessoas com deficiência, em suas respectivas famílias, com vistas
(para até 3 situação de dependência, e famílias. à reintegração familiar, quando
Residências possível; apoio na seleção dos
Inclusivas) cuidadores e demais funcionários;
capacitação e supervisão técnica dos
1 Terapeuta cuidadores e demais funcionários;
ocupacional apoio e acompanhamento

44
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

do trabalho desenvolvido pelos


cuidadores; encaminhamento,
discussão e planejamento conjunto
com outros atores da rede de serviços
sobre encaminhamentos necessários
ao acompanhamento das pessoas
com deficiência e suas famílias;
organização das informações das
pessoas com deficiência e respectivas
famílias, na forma de prontuário
individual; construção conjunta com o
usuário na organização do cotidiano,
no desenvolvimento de adaptações, na
escolha de equipamentos de tecnologia
assistiva, e no desenvolvimento;
promoção do desenvolvimento dos
usuários como sujeitos de direitos a
partir de processos de emancipação,
inclusão social autonomia; elaboração,
encaminhamento e discussão com
a autoridade judiciária e Ministério
Público nas situações de tutela dos
moradores; preparação, quando for
o caso, da pessoa com deficiência
para o desligamento do serviço, em
parceria com o cuidador de referência;
mediação, em parceria com o
cuidador de referência, do processo
de reaproximação e fortalecimento
do vínculo com a família de origem,
quando for o caso.

Cuidados básicos com alimentação,


higiene e proteção; organização do
ambiente (espaço físico e atividades
adequadas com vistas à promoção do
Nível médio e capacitação grau de autonomia de cada indivíduo);
1 Educador/cuidador específica. apoio nas atividades da vida diária;
contribuição para desenvolver
(para até 6 usuários, Desejável experiência em a autonomia e a independência,
por turno). atendimento a pessoas com respeitando o processo de cada um;
deficiência, com dependência. organização de registros individuais
sobre o desenvolvimento pessoal de
cada usuário, de modo a preservar sua
história de vida; acompanhamento

45
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Cargo /
Formação/Habilidades Atribuições/Atividades
Função

aos serviços de saúde, educação,


profissionalização e outros
requeridos no cotidiano. Quando
se mostrar necessário e pertinente,
um profissional de nível superior
deverá também participar deste
acompanhamento; apoio na
preparação do usuário para
o desligamento, quando for o
caso, contando com orientação e
supervisão de um profissional de
nível superior.

Auxiliar de Cuidador Nível médio e capacitação específica.

(1 profissional para Desejável experiência em atendimento Apoio às funções do cuidador e auxílio


até 6 usuários, por a pessoas com deficiência, com no cuidado com a residência.
turno). dependência.

Trabalhador
Cuidados com a residência
doméstico
Nível médio e experiência específica (organização e limpeza do ambiente) e
no trabalho doméstico. preparação dos alimentos, lavanderia,
1 profissional para
dentre outros.
cada residência

Nível médio, com CNH há, pelo menos,


Motorista 5 anos e experiência comprovada de
2 anos.

Fonte: Orientações sobre o Serviço de Acolhimento Institucional para Jovens e Adultos com Deficiência em
Residências Inclusivas/2014. Elaboração Própria.

2.3.2 Aspectos importantes do trabalho da equipe técnica


A equipe técnica tem como atribuições a realização de intervenções cujo objetivo é o
fortalecimento e/ou reconstrução de vínculos familiares e comunitários. As ações técnicas
serão direcionadas para que se cumpra a provisoriedade do acolhimento, possibilitando
o retorno do acolhido para sua família de origem ou para uma família substituta (quando

46
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

esgotadas todas as possibilidades de reintegração/integração familiar), no caso de


crianças e adolescentes. No caso de pessoas idosas e pessoas com deficiência, o objetivo
é que os mesmos consigam autonomia para a sua reintegração familiar, quando possível,
ou que encontrem alternativas de moradias, compartilhadas ou não, garantindo a proteção
e os cuidados necessários para cada caso.
As intervenções e encaminhamentos deverão ser adequados a cada público,
considerando a faixa etária, as prioridades, condições de vida e demandas de cuidado.
Crianças e adolescentes deverão ser atendidos como sujeitos de direitos e em
condição peculiar de desenvolvimento, necessitando de cuidados direcionados ao seu
desenvolvimento físico, psicológico e educacional. Ações de inserção e acompanhamento
na área da saúde e educação deverão constar do Plano de Atendimento Individual.
As atividades que visem à potencialização da autonomia e à convivência familiar e
comunitária devem ser abarcadas pelo Plano, para todos os públicos atendidos.
Com relação às pessoas idosas e pessoas com deficiência, em especial àquelas
com maior grau de dependência, há uma demanda específica para a política de saúde,
necessitando, portanto, de estreita articulação com a mesma. Além disto, buscar-se-á a
emancipação desses indivíduos, de forma a torná-los, cada vez mais, sujeitos autônomos
com capacidade de realizar atividades de autocuidado, de forma independente.
A articulação com a rede de serviços socioassistenciais, com as demais políticas
setoriais e com o sistema judiciário será de grande importância, pois o que se espera é que
o acolhido não seja apenas responsabilidade do serviço de acolhimento. Ele é e continua
sendo um cidadão, que tem direito a acessar todas as políticas setoriais e rede de serviços
disponíveis na comunidade. Além dos serviços socioassistenciais, as políticas setoriais
deverão contribuir na construção e discussão dos casos, para que se torne possível não
só a manutenção e o fortalecimento de vínculos preexistentes, mas também a construção
de novos vínculos e a superação dos motivos que culminaram no acolhimento.
A equipe técnica deve atuar de forma interativa com os cuidadores/educadores,
buscando uma atuação em sintonia com esses profissionais, que são aqueles com os
quais os acolhidos estabelecem vínculos mais próximos. O trabalho em equipe possibilita
a construção de estratégias mais assertivas para o acompanhamento técnico.
Também compete a essa equipe, juntamente com a coordenação, capacitar tais
trabalhadores para a compreensão da política de acolhimento: a que público ela se
destina, quais são as violações de direitos mais comuns, formas de acesso ao serviço,
trabalho em rede, dentre outros temas que julgar pertinentes à qualificação continuada
desses trabalhadores.
Ações integradas e intersetoriais devem permear todo o acompanhamento técnico
ao acolhido e sua família por ser uma das premissas do Suas e também por permitir a
construção de novos vínculos e ampliação da rede de apoio a esses usuários.
Nos serviços de acolhimento de crianças e adolescentes há uma demanda
significativa para atendimentos psicoterápicos nas unidades, na tentativa de que esses
usuários ressignifiquem as violências sofridas. No entanto, percebe-se que há ainda
uma má compreensão do papel do técnico da psicologia nos serviços de acolhimento.
De forma recorrente, as demandas de acompanhamento psicoterápico encaminhadas
à política de saúde são recusadas, sob a alegação, feita por parte de profissionais de
alguns serviços, de que “se o abrigo tem em sua equipe um profissional da psicologia,
ele pode fazer esse atendimento”. Cabe então a todos reafirmar quais são as atribuições
do psicólogo no Suas e esclarecer que o trabalho realizado por esse profissional é o

47
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

atendimento psicossocial, e não clínico. A psicologia clínica é atribuição específica do


psicólogo que atua na saúde. O psicólogo do acolhimento identifica demandas, por meio
de uma escuta qualificada do acolhido, e realiza o encaminhamento para atendimento na
saúde, quando se fizer necessário.
Existem também alguns impasses com a relação interinstitucional entre a equipe
técnica do acolhimento e o Sistema de Justiça, assunto este que abordaremos em capítulo
específico neste caderno.
Sabemos que o trabalho nos serviços de acolhimento suscita desafios e dificuldades
peculiares. Nesse sentido, a equipe técnica, além de capacitações continuadas, deve
participar de espaços de discussão e construção coletiva, para que consiga, cada vez
mais, ofertar atendimento qualificado aos acolhidos e suas famílias, cumprindo os
objetivos do serviço.

Cuidador/Educador: atribuições, desafios e possibilidades

“Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador,
a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da
prática.” Paulo Freire

O educador é o profissional do acolhimento que mantém relação mais próxima com


os acolhidos. Por ser o responsável pelo espaço e pelas atividades de cuidado com os
acolhidos, muitas vezes é com ele que se estabelecem os vínculos mais positivos. Seu
papel é de fundamental importância e, por isso, torna-se necessário que esses profissionais
possuam motivação para a função; aptidão para o cuidado com o perfil do público
acolhido; capacidade de lidar com frustração e separação; habilidade para trabalhar em
grupo; disponibilidade afetiva; empatia; capacidade de lidar com conflitos; criatividade;
flexibilidade; tolerância; proatividade; capacidade de escuta; estabilidade emocional,
dentre outras habilidades.
É necessário que o acolhido possa encontrar no espaço do acolhimento um lugar
que o possibilite reparar os danos causados pelo abandono, a negligência e a violência que
vivenciou. Sabe-se que, embora esse espaço tenha que se assemelhar a uma residência
e acolher de forma humanizada, os cuidadores/educadores não podem ter a pretensão de
ocupar o lugar da família. O respeito à família do acolhido e um trabalho direcionado para
a promoção da mesma são também atribuições dos cuidadores/educadores.
Outro aspecto importante a ser considerado é que o acolhido não deve jamais ser
atendido de forma que se sinta uma pessoa de menor valia, “o coitado”. O trabalho dos
cuidadores/educadores deve se orientar em ações de promoção pessoal, de elevação da
autoestima, reconstrução de vida a partir da ampliação de laços significativos que foram
construídos e/ou reconstruídos no acolhimento.
Os cuidadores/educadores têm em sua rotina de trabalho as seguintes atribuições,
conforme previsto nas Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e
Adolescentes/2009 e Orientações sobre o Serviço de Acolhimento Institucional para
Jovens e Adultos com Deficiência em Residências Inclusivas/2014:

48
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

• Cuidados básicos com a alimentação e higiene;

• Organização do ambiente (espaço físico) - apoiar e monitorar os cuidados com a


moradia, como organização e limpeza do ambiente e preparação dos alimentos;

• Acompanhamento nos serviços de saúde, escolas e outros serviços;

• Desenvolver atividades recreativas e lúdicas;

• Apoio na preparação do acolhido para o seu desligamento da unidade, orientado e
supervisionado por um profissional de nível superior;

• Potencialização da convivência familiar e comunitária;

• Potencialização dos vínculos entre os usuários, profissionais e familiares.

Importante lembrar:

Sentimentos e comportamentos como ver o acolhido como aquele


que não pode e por isso necessita que se faça por ele, assim como
atitudes de tratamento que infantilizam o idoso ou deficiente,
devem ser eliminados


É necessário que o cuidador/educador, ao realizar atividades lúdicas e recreativas
com os acolhidos, sempre leve em consideração a participação e o desejo desses, bem
como escolhas que possam produzir a emancipação e o acesso a novas possibilidades
de aprendizado e conhecimento. Os sonhos e os desafios devem ser estimulados. Pensar
com e para, jamais pensar e decidir por eles.

Atividades lúdicas e recreativas para crianças e adolescentes

As atividades recreativas e lúdicas deverão estimular a criatividade e a


participação desse público, sendo indicado moderar o uso da televisão,
evitando-se assim a sua utilização frequente e diária. Brincadeiras, jogos,
atividades teatrais e musicais são os mais indicados.

49
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Atividades lúdicas e recreativas para pessoas idosos ou pessoas com deficiência

Priorizar atividades para as quais seja necessário o uso do corpo, como danças
e exercícios físicos leves, considerando sempre a capacidade e a saúde dos
mesmos. Dança sênior pode ser bem aceita por eles. Para tais atividades, faz-
se necessário considerar orientações médicas. Evite atividades repetitivas e
longas, além daquelas que os mantêm por muito tempo assentados.

Outro aspecto do trabalho do educador no acolhimento é a promoção e


potencialização da autonomia dos usuários, o que constitui um grande desafio,
principalmente naquelas unidades onde o público é composto por adolescentes.
Ao propor alternativas de atividades que tenham como objetivo desenvolver a
autonomia desses usuários, considerando que todo ser humano caminha sempre em
direção à sua independência e autonomia, não se pode desconsiderar a sua subjetividade,
capacidade e interesses pessoais, bem como o estágio de desenvolvimento dos acolhidos.
Como exemplo, para uma criança de dois anos, ensiná-la a comer sozinha é uma ação
direcionada a sua autonomia.
Ressalta-se que, para os adolescentes acima de 14 anos, o desenvolvimento da
autonomia implica em ações com foco em sua inserção no mercado de trabalho, não só
como fonte de geração de renda, mas como possibilidade de crescimento pessoal, que os
afirme como sujeitos que respondem por si. Assim, ações e atividades que visem preparar
os adolescentes para a vida adulta (responsabilização, disciplina, pontualidade, respeito a
regras, organização de rotinas, etc.) deverão compor seu Plano de Atendimento Individual.
No caso de pessoas idosas o que se busca, ao trabalhar sua autonomia, é que, na
medida do possível, consigam realizar atividades de autocuidado com maior independência
e que possam se autoproteger. A ação de estimular uma pessoa idosa a comer à mesa,
em vez de levar as refeições até sua cama, por mais simples que possa parecer, objetiva
trabalhar sua autonomia.
Para as pessoas com deficiência em situação de dependência é necessário que os
cuidadores/educadores lhes assegurem maior grau de autonomia, devendo desenvolver
estratégias de cuidados que potencializem o exercício das atividades básicas do cotidiano
e da vida diária, considerando:

• Capacidade de realizar atividades básicas do cotidiano, como alimentar-se, fazer a


higiene pessoal, locomover-se até o banheiro, tomar banho, vestir-se, etc;

• Capacidade de realizar atividades da vida diária como fazer e pagar contas, utilizar
meios de transporte, cozinhar, cuidar da própria saúde, manter sua própria segurança, etc.;

• Capacidade de se posicionar, de tomar decisões.

50
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

O cuidador/educador, por ser o profissional que mantém maior proximidade com


os acolhidos, responsabilizando-se por ajudá-los em suas tarefas diárias, deve atentar-
se para o que é dito e para os “não ditos”. Para esse aspecto, damos destaque ao sigilo
necessário ao que se ouve e se sabe sobre o acolhido e sua família, compartilhando apenas
aquelas informações que favoreçam ou não a sua reintegração familiar, apenas com a
equipe técnica do serviço de acolhimento, responsável pelo acompanhamento.
Em situações específicas deverá informar e/ou pedir auxílio à equipe técnica para
alguma questão com a qual não saiba lidar ou que necessite intervenções técnicas.
Por fim, ressalta-se a importância de que cuidadores/educadores se capacitem de
forma continuada, dada a importância de sua atuação frente às demandas de acolhimento
para pessoas e situações que envolvem sofrimento e violência.

Vale lembrar que a comunicação entre cuidadores/educadores é de


fundamental importância. Portanto, reservar alguns minutos do tempo
entre as trocas de turno/plantão, para atualizar o colega sobre aspectos
importantes/ocorrências/intercorrências a serem considerados por ele em
seu turno de trabalho, garante a continuidade dos cuidados necessários.
Exemplo: algum acolhido recusou a alimentação; a consulta médica
agendada foi desmarcada, etc...

E, por fim, lembramos que na história do nosso país os serviços de acolhimento


foram geridos e tinham o quadro de pessoal composto principalmente por pessoas
voluntárias, religiosos ou leigos. Aos poucos, essa realidade tem se modificado, mas
ainda hoje há quem equivocadamente diga que “basta o bom coração” para se trabalhar
nesses serviços.
O reconhecimento de que todos os profissionais que atuam em serviços de
acolhimento desempenham o papel de educador impõe a necessidade de seleção,
capacitação e acompanhamento de todos aqueles responsáveis pelo cuidado direto e
cotidiano dos acolhidos. Para isso, é necessário desenvolver ações de gestão do trabalho
e educação permanente, em consonância com o disposto na Norma Operacional Básica de
Recursos Humanos do Suas (NOB-RH/SUAS).
É importante dar ênfase, em especial, ao acompanhamento e capacitação
continuada dos cuidadores/educadores, assim como de toda a equipe que atua nos
serviços de acolhimento – incluindo coordenador, equipe técnica e equipe de apoio. Essas
ações possibilitarão que se alcance qualidade no atendimento, visto se tratar de uma
tarefa complexa, que exige não apenas espírito de solidariedade, afeto e boa vontade, mas
uma equipe com conhecimento técnico adequado.

51
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

2.3.3 Capacitação da Equipe


Todos os profissionais que irão trabalhar nos serviços de acolhimento deverão
participar de capacitação introdutória para compreender o serviço no qual irão atuar, o
público atendido por ele, a rede socioassistencial, etc., conforme previsto na Política de
Educação Permanente do Suas25:

Não se trata, portanto, de treinar trabalhadores e conselheiros em habilidades


técnicas pré-definidas. Trata-se de oferecer-lhes oportunidades de formação e
capacitação que permitam tanto a apreensão dos conhecimentos necessários
ao qualificado desempenho de suas funções laborais, como a construção de
conhecimentos novos, que permitam a melhoria contínua da qualidade do trabalho
que realiza e seu próprio desenvolvimento enquanto profissional, pessoa humana
e cidadão. Oportunidades de formação e capacitação que permitam a consciente e
sistemática reflexão dos trabalhadores quanto ao conteúdo teórico-metodológico
e ético-político das atitudes subjacentes às suas práticas profissionais (Política
Estadual de Educação Permanente do Suas PEP/Suas, 2013, p.40).

Após a contratação, para adaptação à rotina institucional, é fundamental o


acompanhamento sistemático do profissional pelo órgão gestor do Suas, incrementado
com capacitações continuadas.
As demandas de um serviço de acolhimento exigem resolutividade, rapidez e
mobilidade, pois, com o passar do tempo, pode-se gerar um automatismo nas respostas
dos profissionais. Ou seja, há grande probabilidade de se naturalizar as ações e atuar sem
realizar uma reflexão aprofundada sobre o atendimento que está sendo feito. Além disso,
os casos atendidos nesses serviços acabam influindo no emocional dos profissionais.
Para garantir a qualidade do atendimento nos serviços de acolhimento, a participação
de cuidadores/educadores, equipe técnica e demais funcionários em cursos, reuniões
de formação e seminários devem estar previstos no planejamento e na organização do
trabalho, inclusive no Projeto Político Pedagógico da Unidade – PPP, que trataremos de
forma mais detalhada ao longo do texto.
Por toda a complexidade do serviço e acolhimento, algumas atividades de
acompanhamento são extremamente importantes no sentido de melhorar o desempenho
do profissional, a qualidade do atendimento institucional e o bem-estar dos usuários
acolhidos. Citaremos algumas dessas atividades abaixo:

• Reuniões periódicas de equipe (discussão de casos; reavaliação do Projeto Político


Pedagógico, Plano de Atendimento Individual e Familiar, revisão e aprimoramento da metodologia),
dentre outros;

• Registro das atividades e atendimentos em prontuários;

• Formação continuada sobre temas recorrentes do cotidiano, bem como sobre temas já
trabalhados na fase de capacitação inicial, orientada pelas necessidades institucionais, promovida
pela própria instituição e/ou cursos externos;

25 A Política de Educação Permanente do Suas objetiva institucionalizar, no âmbito do Suas, a


perspectiva político-pedagógica e a cultura da educação permanente, estabelecendo suas diretrizes e
princípios e definindo os meios, mecanismos, instrumentos e arranjos institucionais necessários à sua
operacionalização e efetivação

52
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

• Estudos de caso;

• Revisão/atualização de Leis e Normativas que regem o serviço de acolhimento;

• Encontros diários de 15-20 minutos entre os profissionais dos diferentes turnos para troca
de informações;

• Grupo de escuta mútua;

• Espaço de escuta individual;

• Avaliação, orientação e apoio periódicos pela equipe técnica.

2.3.4 Contribuições ao trabalho da equipe do acolhimento


Este tópico tem como objetivo contribuir com a equipe dos acolhimentos,
considerando a complexidade do trabalho, públicos atendidos, fragilidade da rede de
atendimento e as questões decorrentes das relações estabelecidas com os diversos atores
que compõem essa rede (acolhidos, famílias, rede socioassistencial, políticas setoriais e
Sistema de Justiça).
Nossa intenção é ampliar as discussões sobre temas recorrentes no dia a dia
dos acolhimentos e pensarmos intervenções necessárias para se construir e reinventar
possibilidades e alternativas para o fazer cotidiano.

a. Sexualidade

A sexualidade nos acolhimentos tem sido um dos grandes desafios para as


equipes que atuam no serviço. Como lidar com algo tão pessoal e privado,
num espaço coletivo?

Tema tabu em nossa sociedade, as expressões da sexualidade são alvo de normas


morais, religiosas ou científicas, que vão sendo aprendidas pelas pessoas desde a infância.
É quase sempre associada ao ato sexual e embora essa seja, sem dúvida, a dimensão
mais importante da sexualidade, não é a única. Desde que nascemos e até a nossa morte,
expressamos nossa sexualidade na busca pelo prazer e, isso se dá de forma e intensidade
diferentes, de acordo com nosso desenvolvimento biopsicossocial e nossa cultura. Assim,
desde a criança de três anos que toca seu corpo e já faz perguntas sobre a vida sexual dos
adultos, até o(a) idoso(a) de 80 anos, que deseja estabelecer uma relação afetiva sexual
com um(a) parceiro(a), ambos estão vivendo sua sexualidade.
A sexualidade contempla aspectos físicos, psicoemocionais e socioculturais.

53
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a sexualidade é vivida e expressa por


meio de pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, valores, comportamentos,
práticas, papéis e relacionamentos. (BRASIL, 2010).
Considerando a realidade das pessoas acolhidas e tendo o acolhimento a função de
garantir direitos, fortalecer a construção de novos vínculos, é preciso que os trabalhadores
saibam lidar com o tema sexualidade, de forma a não coibir sua expressão, considerando
as peculiaridades de cada público atendido. Portanto, garantir o direito sexual aos
adolescentes, às pessoas idosas e às pessoas com deficiência deve permear o trabalho
técnico nos acolhimentos.
Ao adolescente, além da garantia desse direito, é necessário prepará-lo para exercê-
lo com responsabilidade, promovendo o acesso a informações que o permitam fazer
escolhas adequadas, o uso de métodos de proteção e contraceptivos que evitem uma
gravidez indesejada e a contaminação por Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs).
Entendemos que há uma visão equivocada sobre a capacidade de exercer seu direito
à sexualidade no que diz respeito a pessoas com deficiência. A deficiência não exclui o
desejo sexual da pessoa e a deficiência e não a incapacita para a atividade sexual, cabendo
refletir que o corpo como um todo é fonte de prazer, pelo fato de propiciar, desde nosso
nascimento, o sentir, o perceber e o comunicar com o mundo. A pessoa com deficiência
tem o direito de exercer sua sexualidade da forma que considerar mais adequada a si,
levando em conta que a atividade sexual não se limita à genitalidade ou a uma função
biológica responsável pela reprodução (NEGREIROS, 2004). A sexualidade envolve, além
do corpo, os sentimentos, a história de vida, os costumes, as relações afetivas e a cultura.
Ainda com relação ao exercício da sexualidade pela pessoa com deficiência como
um direito, menciona-se a Lei n.º 13.146/2015, que institui o Estatuto da Pessoa com
Deficiência. O art. 6º desta Lei assim dispõe:

Art. 6o A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:
I - casar-se e constituir união estável;
II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;
III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações
adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;
IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;
V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e
VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou
adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

Já para o público idoso, o que se apresenta é a negação do direito de expressar


sua sexualidade, o que pode ser constatado em atitudes preconceituosas que consideram
que o idoso “não tem mais idade para essas coisas”. No imaginário da grande maioria,
a pessoa idosa não tem mais desejo sexual, o que é uma inverdade. Pode ser fato para
alguns a perda do desejo pelo ato sexual, mas não o é para todos. São pessoas com
singularidades, cabendo somente ao idoso dizer e manifestar sua sexualidade da forma que
julgar conveniente, sendo papel do acolhimento respeitá-lo e apoiá-lo em suas decisões e
escolhas pessoais.
Assim, adolescentes, pessoas idosas, pessoas com deficiência podem estabelecer
relações afetivas com seus pares, cabendo aqui entender de que forma isso é possível,
levando em consideração que essas pessoas se encontram sob a proteção do Estado.

54
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

b. Deficiência não significa dependência


Devemos ficar atentos ao que é, de fato, a dependência para as pessoas com
deficiência, pois como sabemos a deficiência pode se dar em graus de complexidade e,
nem sempre, incapacita o indivíduo para todas as funções.
Conforme preleciona o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n.º 13.146/2015):
Art.2o Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo
prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com
uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas.

Entende-se que, em razão da deficiência, pode haver alguma limitação para a


realização de determinadas atividades, mas, salvo em casos excepcionais, o deficiente
tem condições de se responsabilizar por muitas atividades de autocuidado e até mesmo
de cuidados com o ambiente ao seu redor.
Assim, é de fundamental importância que os trabalhadores das unidades de
acolhimento tenham um olhar sensível para esses indivíduos, respeitando-os em
sua capacidade e, acima de tudo, estimulando-os para outras atividades que tenham
capacidade de realizar. Nunca se deve ver o deficiente como aquele a quem temos de servir,
aquele que não dá conta, que é incapaz. O apoio é sempre bem-vindo, desde que não seja
para além do que o indivíduo necessita e solicita. Apostar na capacidade de superação da
pessoa com deficiência é possibilitar a melhoria de sua autoestima, é dar-lhe o estímulo
necessário para avançar em seu desenvolvimento e autonomia.

c. Adolescências: ato infracional ou ato indisciplinar?

As unidades que acolhem crianças e adolescentes são convocadas a propiciar aos


mesmos a oportunidade de se reafirmarem como indivíduos, como sujeitos de direitos que
são. Isso implica em um processo de crescimento pessoal, que perpassa o enfrentamento
das referências de autoridade e da não submissão às regras e limites que visam a sua
proteção. No caso dos adolescentes, o fazem como forma de se reafirmarem enquanto
sujeitos e descobrirem sua nova identidade. É, por vezes, um exercício para adentrarem o
“mundo dos adultos”.
Considerando essa realidade, é comum os trabalhadores das unidades de
acolhimento tratarem as atitudes de indisciplina cometidas pelos adolescentes como atos
infracionais. E a cada acontecimento dessa natureza registram boletins de ocorrência, o
que resulta muitas vezes na instauração de um processo judicial e, como consequência, o
adolescente poderá vir a responder por uma medida socioeducativa.
O ECA, em seu Art.103, estabelece como ato infracional a conduta descrita como
crime ou contravenção penal praticada por adolescente. Já atos de indisciplina devem ser
regulamentados pelas normas que regem a unidade de acolhimento, constantes Projeto
Político Pedagógico/Regimento Interno da Unidade, construído com a participação de
profissionais e usuários do serviço de acolhimento. Nesses documentos deverão constar,
inclusive, as sanções previstas para cada ato indisciplinar. Vale destacar que as sanções
nunca podem ser castigos físicos e de caráter vexatório.

55
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Características
Descumprimento das normas da unidade (regimento interno, regras
ou convenções escritas) e de legislações aplicadas.

Ato de Indisciplina Decorre de desobediência ofensiva ou desconhecimento,


provocado pelo caos dos comportamentos ou pela desorganização
das relações.

Motivos: carências sociais, falta de interesse, agressividade,


imaturidade, desafio da autoridade do cuidador/equipe, uso de drogas.

Conduta prevista como crime ou contravenção penal praticada por


criança ou adolescente.

Pode ser de menor potencial ofensivo (lesão corporal leve, dano


simples, furto simples); ou grave potencial ofensivo (roubo, lesão
Ato Infracional corporal grave, tráfico de drogas).
Nem todo ato indisciplinar configura ato infracional (Ato infracional
possui previsão legal).

Providências: competência de averiguação e responsabilização da


Segurança Pública e do Sistema de Justiça.

Fonte: Indisciplina e Ato Infracional nas Escolas – Ministério Público do Estado do Estado de Goiás; Centro
de Apoio Operacional da Infância e Juventude. Elaboração própria, adaptado.

Como exemplos de possíveis atos que podem ser considerados como ato infracional
dentro de unidades de acolhimento, citamos:

• Lesão corporal em que a vítima apresenta sinais da agressão;

• Porte de drogas para uso ou tráfico de entorpecentes;

• Porte de arma;

• Dano intencional ao patrimônio público ou particular, em que deverá ser efetuado o


levantamento do local.

Na avaliação do fato ocorrido, considerar-se-á, além da ilicitude ou não do ato, o


bom senso e leituras sensatas sobre a ocorrência, circunstâncias e intensidade de sua
gravidade, indicando a melhor forma de agir nessas situações, definindo bem aquelas
que são passíveis de serem consideradas como ato infracional e aquelas que são apenas
atos de indisciplina.
Lembramos que sempre que uma criança ou adolescente repete atos de indisciplina,
na grande maioria das vezes, está atuando sobre alguma situação que lhe é difícil, que o

56
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

mobiliza. É necessário o diálogo e a escuta qualificada dessa criança ou adolescente, que


darão indicativos da intervenção técnica necessária.

d. Quem acompanha a família do acolhido: o serviço de acolhimento ou o Creas?


Essa tem sido uma dúvida recorrente nos momentos de apoio técnico ofertado pela
Sedese aos trabalhadores do Suas, em especial àqueles dos serviços de acolhimento de
crianças e adolescentes.
Em relação a essa atribuição, recorremos mais uma vez às Orientações Técnicas do
Serviço de Acolhimento, à Tipificação dos Serviços Socioassistenciais do Suas e também
às Orientações Técnicas: Centro de Referência Especializado de Assistência Social.
O Centro de Referência Especializado de Assistência Social - Creas26, equipamento
público da Assistência Social, é responsável pela oferta do Serviço de Proteção e
Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (Paefi). Compete aos profissionais desse
serviço prestar apoio, orientação e acompanhamento a famílias com um ou mais de seus
membros em situação de ameaça ou violação de direitos. Os usuários deste serviço são
famílias e indivíduos que vivenciam violações de direitos por ocorrência de violência física,
psicológica e negligência; violência sexual (abuso e/ou exploração sexual); afastamento
do convívio familiar devido à aplicação de medida socioeducativa ou medida de proteção;
tráfico de pessoas; situação de rua e mendicância; abandono; vivência de trabalho infantil;
discriminação em decorrência da orientação sexual e/ou raça/etnia e outras formas
de violação de direitos decorrentes de discriminações/submissões a situações que
provocam danos e agravos a sua condição de vida e os impedem de usufruir de autonomia
e bem-estar. Famílias e indivíduos que vivenciam violações de direitos por ocorrência de
descumprimento de condicionalidades do PBF e do Peti também são usuários do Paefi.
Segundo a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, dentre as ações
que competem à equipe do Paefi, no que tange ao trabalho social essencial ao serviço,
estão a mobilização e a identificação da família extensa ou ampliada.
Segundo as Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e
Adolescentes (2009):

[...] nos municípios que possuam CREAS e naqueles atendidos por CREAS
regionais quando o motivo do afastamento do convívio familiar envolver violência
intrafamiliar (física, psicológica, sexual, negligência grave), exploração sexual ou
outras situações de violação de direitos que estejam sob o escopo de ação dos
serviços desenvolvidos no CREAS, as crianças e adolescentes acolhidos e seus
familiares devem ser inseridos em seus serviços. (BRASIL, 2009, p. 44)

Neste sentido, entende-se que o serviço prestado pelo Creas, até por sua característica
territorial, deverá empreender ações com relação à família, com vistas à superação da
violação cometida, razão pela qual houve o afastamento familiar. Essas ações deverão
constar no Plano de Atendimento Individual e Familiar (PIA) – instrumento metodológico

26 O Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) - Unidade pública estatal de


prestação de serviços especializados e continuados a indivíduos e famílias com seus direitos violados -
deve articular os serviços de média complexidade do Suas e operar a referência e a contrarreferência com a
rede de serviços socioassistenciais da Proteção Social Básica e Especial, com as demais políticas públicas
e instituições que compõem o Sistema de Garantia de Direitos, bem como com os movimentos sociais.

57
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

por meio do qual será realizado o planejamento conjunto entre os indivíduos e/ou famílias
em acompanhamento e os serviços que as acompanham. Assim, constarão no PIA as
ações e responsabilidades dos profissionais do Creas e do Serviço de Acolhimento, no
acompanhando dessas famílias.
O acolhimento é uma medida protetiva aplicada a quem sofreu violação de direitos
e seu objetivo maior é trabalhar para a reintegração segura desse acolhido em seu núcleo
familiar. A equipe do acolhimento deverá priorizar ações que fortaleçam a convivência
familiar e a reconstrução e/ou fortalecimento dos vínculos. Para tanto, deve atuar
conjuntamente com a equipe técnica do Paefi na superação dos motivos que culminaram
no acolhimento e acompanhar o trabalho desenvolvido com a família na rede local.
É importante que as equipes técnicas do serviço de acolhimento e do Creas atuem
de forma articulada – por meio do planejamento conjunto de ações e reuniões periódicas
para o acompanhamento dos casos –, de modo a garantir uma atuação intersetorial e
integral, complementar e sinérgica, evitando sobreposições e ações contraditórias. A
implementação de uma sistemática de acompanhamento familiar, iniciada imediatamente
após o acolhimento, é fundamental, pois, com o passar do tempo, tanto as possibilidades
de reintegração familiar, quanto de adoção podem tornar-se mais difíceis.

e. Direito à educação: a escola como um “não espaço”


A criança e o adolescente, bem como pessoas com deficiências, por vezes, ainda na
companhia de sua família têm seu direito à educação violado, violação esta que se manifesta
pela infrequência escolar, dificuldades de aprendizagem, episódios de afastamento da sala
de aula, dentre outros. Tão logo a criança e o adolescente sejam acolhidos, a equipe deve
providenciar sua matrícula em escola regular, cuidar e garantir ao mesmo tempo seu pleno
desenvolvimento educacional. Igual providência deve ser avaliada pela equipe, junto com
o acolhido, nos casos de pessoas com deficiência e idosos que demostrem interesse pelo
retorno escolar.
Pensar acerca do atendimento educacional a adolescentes e jovens, jovens e
adultos com deficiência e idosos com históricos de defasagem escolar, representa um
grande desafio frente a uma sociedade seletiva e desigual, sendo que a Educação de
Jovens e Adultos - EJA pode se tornar uma possibilidade de ressignificação de um percurso
interditado por barreiras e privações sociais. A convivência com histórias de exclusão, por
meio de sujeitos de distintas histórias pessoais e sociais, pode provocar lampejos para
uma cidadania a ser conquistada frente a uma diversidade que busca um elo comum na
luta pelo seu pertencimento.
[...] Pensar os sujeitos da EJA significa trabalhar para, com e na diversidade. A
diversidade é constituída das diferenças entre os sujeitos, que os distinguem
uns dos outros – mulheres, homens, crianças, adolescentes, jovens, adultos,
idosos, pessoas com necessidades especiais, privados de liberdade, indígenas,
afrodescendentes, descendentes de europeus, de asiáticos, de latino-americanos e
migrantes, entre outros. A diversidade que constitui a sociedade brasileira abrange
formas de ser, de viver, de pensar e de agir que se enfrentam, entre tensões, com
modos distintos de construir identidades sociais e étnico-raciais e cidadania – ou
seja, em situações-limite. (BRASIL, 2016, p.72-74)

Neste ponto, gostaríamos de chamar a atenção para a essencialidade de

58
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

articulação à política de educação para o atendimento de crianças e adolescentes, além


das possibilidades quanto a pessoas com deficiência e idosos.
Em razão de possível desconhecimento da política de acolhimento e da visão
equivocada de quem são esses usuários do serviço de acolhimento, são comuns as
unidades de acolhimento enfrentarem dificuldades na relação com a escola, uma vez
que a abordagem e o tratamento aos chamados de “os meninos de abrigo” são por vezes
excludentes e preconceituosas.
O serviço de acolhimento, sempre que for solicitado a intervir na relação aluno-escola,
deverá se colocar à disposição para auxiliar a escola no enfrentamento dessas dificuldades.
Ressaltamos que compete ao serviço de acolhimento ser o facilitador dessas relações entre
a escola e o acolhido, por meio de sua participação no universo escolar, do diálogo e da
busca pela resolução dos conflitos que possam comprometer o direito à educação.
O diálogo entre o serviço de acolhimento, escola e aluno, deverá proporcionar a
compreensão de quais as dificuldades se apresentam, quais são as ações necessárias
para a resolução dos conflitos e a quem cabe tratá-los, sendo possível, assim, superar
essas intercorrências, garantindo não só acesso, mas a permanência dessas crianças e
adolescentes, jovens e adultos com deficiência e idosos na sala de aula e seu aprendizado
de forma plena.

f. Participação na vida comunitária


O direito à convivência comunitária é um dos princípios dos serviços de acolhimento
e se concretiza não só quando os acolhidos têm garantido o acesso a serviços e políticas
no território mas, também, quando é propiciada a participação em atividades diversas,
festas tradicionais, comemorações, campeonatos, carnaval, festa junina, etc.
Logo, deve-se permitir que uma adolescente vá à festa de 15 anos de sua colega
de escola, por exemplo, assim como que a pessoa idosa participe do baile que aconteça
na cidade e que a pessoa com deficiência vá a um estádio de futebol para assistir ao jogo
de seu time.
Enfatizamos que a circulação dos acolhidos pela comunidade e a participação em
eventos festivos, de lazer e cultura são permitidos sempre, porém há que se observar a
segurança dos mesmos. Assim, se a equipe técnica avaliar que essa adolescente, esse
idoso ou a pessoa com deficiência necessite ser acompanhada, deverá identificar o
profissional que o fará, mas nunca impedir esse convívio comunitário. A participação na
vida comunitária significa utilizar os espaços e serviços públicos em outros espaços que
não no serviço de acolhimento.

g. Relação da equipe técnica com o Judiciário


A discussão sobre a relação da equipe técnica do acolhimento com o Poder Judiciário
tem sido feita pelos trabalhadores dos serviços de acolhimento e seus respectivos
Conselhos Profissionais.

59
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Reportar-nos-emos aqui à Nota Técnica SNAS/MDS nº. 02/16 de 11 de maio de


2016, instrumento que orienta a relação dos técnicos do Suas e o Poder Judiciário. Esse
documento recomenda utilizar os instrumentos já construídos na relação entre o Suas e
Sistemas de Justiça (provimentos, resoluções e notas técnicas), que orientam a atuação
dos serviços nos territórios.
A intersetorialidade, um dos eixos estruturantes do Suas, já abordado neste Caderno
de Orientações, tem sua materialização na articulação de serviços sociassistenciais
com as demais políticas e órgãos setoriais, bem como a relação interinstitucional com o
Sistema de Justiça. Na articulação em rede, deve-se observar alguns pressupostos, dentre
os quais destacamos:

• A importância de se conhecer todos os órgãos que compõem a rede, funções e


atribuições dos mesmos, atribuições e especificidades de atuação dos diversos órgãos e
instituições envolvidas;

• Identificação dos pontos de interseção entre os órgãos que compõem essa rede,
evitando a sobreposição do atendimento;

• Horizontalidade nas relações e no diálogo entre os envolvidos;

Portanto, é importante a construção de fluxos e estratégias de trabalho, visando à


complementaridade das ações.
Serviços de acolhimento, inseridos em um sistema mais amplo, que é o Suas, e
Sistema de Justiça, visam à garantia de direitos aos cidadãos. O diálogo, a interlocução
e o respeito ao papel de cada um devem orientar a construção coletiva de estratégias de
trabalho, em prol dos usuários.
Nos últimos anos, os órgãos do Sistema de Justiça têm requerido que os profissionais
que atuam no Suas e, neste caso especificamente, no serviço de acolhimento, realizem
procedimentos que extrapolam sua competência profissional.
Ressaltamos que não são atribuições dos técnicos do acolhimento:

• Realização de perícias;

• Inquirição de vítimas e acusados;

• Oitiva para fins judiciais;

• Produção de provas de acusação;

• Guarda ou tutela de crianças ou adolescentes de forma impositiva aos profissionais;

• Curatela de idosos e pessoas com deficiência, ou transtorno mental, aos profissionais


dos serviços de acolhimento ou ao órgão gestor da assistência social, salvo nas previsões
estabelecidas em lei;

• Adoção de crianças e adolescentes;

60
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

• Averiguação de denúncias de maus tratos contra crianças, idosos ou pessoas


com deficiência.

É importante frisar que não é de competência das equipes de referência dos


serviços do Suas verificar denúncias, atestar veracidade de fatos ou produzir provas de
acusação, pois os profissionais dos serviços socioassistenciais trabalham no viés de
construção de vínculos e de relação de confiança e respeito com os usuários, ou seja, na
garantia da proteção social. Assim, colocar-se no papel de quem denuncia ou averigua
alguma denúncia, pode ocasionar o rompimento dos vínculos de confiança que o usuário
estabelece com a equipe técnica, fragilizando ou comprometendo de forma considerável o
trabalho social desenvolvido com as famílias e indivíduos.
Ainda no que tange à relação entre os profissionais que atuam no Suas e no
Sistema de Justiça, ressalta-se o Termo de Cooperação Técnica n.º 100/2017, firmado
entre a Secretaria de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social (Sedese) e o Ministério
Público de Minas Gerais. Trata-se de um termo de cooperação interinstitucional no âmbito
da política de assistência social, na área de promoção e defesa dos direitos de crianças e
adolescentes, tendo como objeto o fortalecimento e a qualificação interinstitucional entre
a Sedese e o Ministério Público.
Dentre os objetivos previstos nesse termo, destaca-se: a clarificação das
competências e atribuições da Sedese e do Ministério Público, no que concerne às ações
desse órgão que tenham interface com a política da assistência social; a construção
de normativas e protocolos que disponham sobre fluxos operacionais, objetivando
o intercâmbio de informações e o aperfeiçoamento das ações dos profissionais que
atuam no Ministério Público e na política de assistência social; o fortalecimento do
diálogo entre esses profissionais, visando ao debate sobre as normativas do Suas e
legislação pertinente.
A construção desse termo representa um marco importante para o Estado na relação
interinstitucional entre as instituições e órgãos que compõem a política de assistência
social e o Ministério Público, visando ao clareamento e à distinção das atribuições dos
profissionais que atuam em diferentes instituições, sob o escopo de qualificar o trabalho e
o fluxo das ações, em defesa dos direitos dos usuários do Suas.

2.4 Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora


O serviço de acolhimento em família acolhedora, objeto de regulação pela Lei
nº. 12.010/2009, organiza o acolhimento de crianças e adolescentes em cumprimento
de medida protetiva de afastamento familiar, em residências de famílias acolhedoras
previamente cadastradas para esse fim. Essa alternativa de proteção integral visa oferecer
à criança e ao adolescente a proteção e a atenção individualizada em ambiente familiar que
lhe proporcione os cuidados básicos necessários, construção de novos vínculos afetivos,
sentimento de pertencimento e convivência familiar e comunitária.
Esse serviço é particularmente adequado às crianças e adolescentes cuja avaliação
criteriosa da equipe técnica do serviço e da rede de garantia de direitos aponte para a
possibilidade de retorno à família de origem, extensa ou ampliada, salvo em casos
emergenciais, nos quais não existem alternativas de acolhimento e proteção.

61
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

São objetivos do acolhimento familiar:

• Fortalecer a função protetiva da família de origem, extensa ou responsável legal,


com vistas à preservação do direito à convivência familiar e comunitária, por meio do
acompanhamento da equipe técnica;

• Preservar vínculo com a família de origem e/ou extensa, salvo determinação judicial
em contrário;

• Possibilitar a convivência familiar e comunitária e o acesso à rede;

• Apoiar o retorno da criança e do adolescente à família de origem.

Atenção: O acolhimento familiar é diferente de adoção. Na adoção, ocorre a


transferência dos direitos parentais, de forma total e irrevogável, ao passo que no
acolhimento familiar, a transferência de direitos e deveres da família de origem
para a outra família é temporária, por meio do Termo de Guarda Provisória,
expedido pela Vara da Infância e Juventude.

Famílias acolhedoras: perfil, requisitos e responsabilidades


Configuram-se como famílias acolhedoras aquelas que se propõem a cuidar
provisoriamente e em caráter integral de crianças e/ou adolescentes afastados de seu
convívio familiar e social por meio de medida protetiva previamente aplicada. No que
concerne ao conceito de família, é importante destacar que:

Considera-se como famílias não apenas os grupos formados por pais ou qualquer
um deles e seus dependentes, mas os diferentes arranjos familiares resultantes de
agregados sociais por relações consanguíneas ou afetivas, ou de subsistência e
que assumam a função de cuidar dos membros. (Orientações Técnicas: Serviços
de Acolhimento para Crianças e Adolescentes, 2012, p.108).

Para ser habilitada enquanto família acolhedora, o indivíduo e/ou grupo familiar
que se propõe a essa tarefa não deve possuir laços familiares ou afetivos anteriores com
a família de origem e com as crianças e/ou adolescentes os quais irá acolher, tampouco
possuir intenção de adotá-las.

Importante: família acolhedora não pode ser a família extensa, pois o vínculo
de parentesco colide com a proposta do acolhimento familiar, configurando-se
como reintegração familiar.

62
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

A família acolhedora deverá ainda participar de processos de seleção e preparação


para o acolhimento e somente depois poderá ser habilitada pelo serviço para acolher uma
criança ou adolescente em sua residência.
Considerando as especificidades dessa modalidade de acolhimento, especialmente
a atenção individualizada, a possibilidade de construção de novos vínculos afetivos e o
favorecimento da convivência familiar, é previsto que cada família selecionada acolha uma
criança/adolescente por vez. No entanto, para a garantia da preservação da convivência e
vínculos afetivos, a família acolhedora poderá acolher grupo de irmãos, de acordo com a
avaliação da equipe técnica e concordância da família.
O acolhimento da criança e/ou adolescente deve ter caráter provisório, até que
seja viabilizada uma alternativa para a reintegração familiar ou, na impossibilidade,
encaminhamento para família substituta. O desligamento da criança e/ou adolescente
do serviço deve ocorrer mediante conhecimento e autorização do Juizado da Infância
e Juventude, que deve estar devidamente informado das ações do serviço e atuar em
conjunto com a equipe técnica deste. A família acolhedora deverá contribuir no processo
de desligamento da criança e/ou adolescente, em conjunto com a equipe técnica.
O acolhimento familiar deverá ocorrer no mesmo município onde reside a criança e/
ou adolescente, de modo a favorecer a reintegração familiar.
De acordo com as normativas e orientações do Suas, a oferta de serviços de
acolhimento pode ter abrangência regional. Essa estratégia é voltada, principalmente, para
os municípios de pequeno porte, devido à baixa demanda municipal por esse serviço ou
aos altos custos envolvidos na implantação de serviços municipais. Porém, no caso da
oferta regional do serviço de acolhimento em família acolhedora, cada município abrangido
pelo serviço regional deve ter famílias cadastradas, de modo a viabilizar o acolhimento da
criança ou adolescente no seu próprio município de origem.
As famílias acolhedoras atuam pelos princípios da voluntariedade e receberão
subsídio financeiro regulamentado em lei, enquanto durar o acolhimento, para garantir os
cuidados necessários à criança e/ou ao adolescente.

Seleção das famílias
A seleção das famílias deve-se efetuar por meio de um processo permanente que
pressupõe um primeiro momento de acolhida e avaliação inicial por parte das equipes
técnicas. Nesse momento, serão apresentados às famílias os critérios mínimos para a
função do acolhimento, a metodologia do serviço, bem como as informações sobre a
documentação necessária para a adesão. É um momento de esclarecimento de dúvidas,
dedicado também a uma escuta qualificada dos elementos motivadores que levaram a
família a se propor à prática do acolhimento.
Após esse momento inicial de apresentação e acolhimento das famílias, são
apresentados os requisitos básicos27 para que essas se candidatem à função, a saber:

• O responsável pela guarda deve possuir no mínimo de 21 anos de idade, sem


restrição de gênero ou estado civil;

27 Os requisitos básicos para que as famílias acolhedoras se candidatem ao acolhimento familiar


poderão ser definidos, considerando a realidade do município que oferta o Serviço, lembrando que desses
aqui citados, alguns deverão constar como obrigatórios.

63
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

• Residir há pelo menos 2 (dois) anos no município e nele permanecer durante todo o
período de acolhimento;
• Possuir residência fixa;

• Residir em imóvel que ofereça ambiente físico adequado ao acolhimento;

• Aceitação e comprometimento com a metodologia do serviço;

• Possuir disponibilidade para participação das atividades e momentos de formação


do serviço;

• Apresentar boas condições de saúde física e mental;

• Inexistência de dependentes de substâncias psicoativas entre os membros da


família;

• Disponibilidade de tempo dispensado aos cuidados e capacidade de dar e receber


afeto;

• Concordância dos membros da família no acolhimento;

• Não apresentarem interesse na adoção da criança e do adolescente participante do


serviço.

Após a etapa de avaliação inicial, as famílias acolhedoras consideradas aptas ao


acolhimento formalizarão sua inscrição no serviço, por meio do preenchimento da ficha
de cadastro, na qual constam os documentos necessários, informações essenciais sobre
a família e indicação do perfil de crianças ou adolescentes que se sentem aptas a acolher.
Nesse momento, é necessária a apresentação da seguinte documentação de todos os
membros maiores de idade do núcleo familiar:

• Carteira de Identidade – RG – ou Carteira de Trabalho – CTPS;

• Cadastro de Pessoas Físicas – CPF;

• Comprovante de Residência;

• Certidão de Antecedentes Criminais.

As famílias que se apresentarem como potenciais acolhedoras serão submetidas a


estudo psicossocial, realizado pela equipe técnica do serviço, com o objetivo de analisar
aspectos objetivos e subjetivos que qualifiquem ou não a família para o acolhimento.

64
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Estudo psicossocial
A avaliação psicossocial contempla não só a pessoa ou casal que se responsabilizará
pelo acolhimento da criança e/ou adolescente, mas todos aqueles que compõem o núcleo
familiar do qual fará parte, ainda que provisoriamente. Para tal, poderão ser utilizados os
instrumentos metodológicos que a equipe identificar como os mais adequados, podendo
se dar através de entrevistas, visitas domiciliares, encontros, dinâmicas de grupo, dentre
outros.
Durante essa avaliação, a equipe técnica observará aspectos objetivos e subjetivos
que qualifiquem a família como família acolhedora, que receberá a criança e/ou adolescente
de forma protetiva e cuidadosa. Esse momento também possibilita à equipe avaliar como
a família lida com os sentimentos de apego e desapego, considerando que o objetivo do
acolhimento familiar é que a criança permaneça na família acolhedora pelo menor tempo
possível, retornando para sua família de origem. O Estatuto da Criança e do Adolescente
nos indica que os acolhimentos não devem ultrapassar 18 (dezoito) meses 28.

Aspectos a serem observadas no Estudo Psicossocial
• Disponibilidade afetiva e emocional;

• Padrão saudável das relações de apego e desapego;

• Relações familiares e comunitárias;

• Rotina familiar;

• Não envolvimento de nenhum membro da família com o uso abusivo de substâncias


químicas;

• Capacidade de lidar com separação;

• Flexibilidade;

• Tolerância;

• Proatividade;

• Capacidade de escuta;

• Estabilidade emocional;

• Capacidade de pedir e aceitar ajuda e de colaborar com equipe técnica, dentre outros.

Após o parecer psicossocial favorável à inclusão da família no serviço, a mesma
assinará o Termo de Adesão e iniciará o processo de formação.

28 Lei nº. 13.059/2017, de 22 de novembro de 2017, que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente.

65
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Formação das famílias acolhedoras


Com o objetivo de preparar as famílias para o acolhimento de crianças e/ou
adolescentes que passaram por situações delicadas, com histórico de violação de direitos,
e com os quais ainda não se tem vínculos em seu convívio familiar, torna-se necessário que
o serviço de acolhimento familiar promova encontros de preparação, discussão e troca com
essas famílias. Tais encontros, aqui denominados de “formação”, irão permitir às famílias
compreender a dinâmica do acolhimento: quem são essas crianças e/ou adolescentes que
demandam o acolhimento, quais são suas responsabilidades para com essas, com a família
de origem e com o serviço, conhecer as legislações pertinentes ao acolhimento e temáticas
afetas ao público alvo do serviço.
Lembramos, no entanto, que essa formação sempre será direcionada não só pelo perfil
das famílias acolhedoras, mas também pelas experiências de acolhimentos anteriores.
Como sugestão, elencamos alguns temas que poderão ser abordados nos encontros
de formação:

• Direitos da criança e do adolescente;

• Novas configurações familiares;

• Realidade das famílias em situação de vulnerabilidade social;

• Etapas do desenvolvimento da criança e do adolescente;

• Comportamentos observados em crianças/adolescentes separados da família de


origem;

• Práticas educativas, estratégias para auxiliar a criança/adolescente a conhecer


e a lidar com sentimentos, fortalecer a autoestima e contribuir para a construção da sua
identidade;

• Políticas públicas, direitos humanos e cidadania;

• Papel da família acolhedora, da equipe técnica do serviço e da família de origem,


dentre outros.

Essa formação deverá ser continuada, pois não se consegue abarcar todos os conteúdos
em uma capacitação inicial. Além disso, a cada acolhimento, a família trará novas demandas,
frutos da relação que se construiu entre os membros da família e a criança ou adolescente
acolhido, da interação com as famílias de origem da criança e/ou adolescente, quando isso
for possível, e também a relação da família acolhedora com o serviço. É importante também
que se promovam encontros de socialização entre as famílias que já acolheram ou que estão
em processo de acolhimento, com aquelas que aguardam pelo acolhimento, pois a troca entre
elas trará elementos que apontam para as dificuldades e estratégias desenvolvidas por cada
uma delas, na busca pela superação de suas dificuldades, contribuindo para desmistificar o
acolhimento familiar como algo extremamente difícil.

66
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Acompanhamento das famílias e dos acolhidos


Para a realização de um trabalho efetivo de garantia de direitos das crianças e/ou
adolescentes acolhidos no serviço, são necessárias intervenções/acompanhamentos
simultâneos por parte da equipe técnica aos envolvidos nesse processo. Nesse sentido,
o acompanhamento psicossocial da criança e/ou adolescente, da família de origem e da
família acolhedora será iniciado pela equipe técnica assim que o acolhimento for efetivado e
deverá ser orientado pelo Plano de Acompanhamento Individual e Familiar. As intervenções
podem ocorrer por meio de ações, tais como:

• Com a família acolhedora

O acompanhamento às famílias acolhedoras deve ser sistemático e cumprir a


função não só de garantir o cuidado e a proteção à criança e/ou adolescente acolhido, mas
também apoiar tecnicamente as famílias acolhedoras na aproximação com o acolhido,
encaminhar algumas ações mais urgentes e que necessitam de intervenção do serviço
e também contribuir para que o acolhimento aconteça de forma prazerosa para o grupo
familiar que acolhe.
Ressalta-se ainda que o acompanhamento às famílias acolhedoras deverá acontecer
em duas etapas distintas, enquanto durar o acolhimento e quando ocorrer o desligamento
da criança e/ou adolescente do núcleo familiar. O acompanhamento pós-desligamento
tem como finalidade cuidar da família, ajudando-a nas questões relacionadas ao luto pelo
afastamento da criança do convívio diário com o núcleo familiar.
No processo de acompanhamento são previstas ações técnicas, tais como:

• Preparação da família acolhedora para a recepção da criança/adolescente, inclusive


informando a situação sociojurídica do caso e, quando possível, previsão inicial do tempo
de acolhimento;

• Aproximação supervisionada entre a criança/adolescente e a família acolhedora;

• Construção de um plano de acompanhamento da família acolhedora, em


conformidade com as necessidades do acolhimento de cada criança/adolescente,
respeitando-se as características das famílias e do acolhido;

• Acompanhamento da família acolhedora, com entrevistas e visitas domiciliares


com foco na adaptação e no desenvolvimento do acolhimento, com frequência mínima
quinzenal ou de acordo com a avaliação do caso;

• Construção de espaço para troca de experiências entre famílias acolhedoras.

É indicado que a família acolhedora não acolha novas crianças e/ou adolescentes
logo após o desligamento de um acolhido, para que possa elaborar a experiência e se
preparar para um próximo acolhimento.

67
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

• Com a família de origem


• Contato inicial com a família de origem (salvo em situações de restrição
judicial) para esclarecimento acerca do acolhimento familiar, seus termos e regras,
assim como para convidá-la a participar do processo de adaptação da criança/
adolescente na família acolhedora, fornecendo informações sobre seus hábitos e
costumes. Se possível, possibilitar o encontro da família de origem com seu filho (a);

• Acompanhamento da família de origem, com entrevistas e visitas domiciliares


periódicas, articuladas com o planejamento realizado para superação das
vulnerabilidades da família;

• Construção de um plano de acompanhamento da família de origem em


conformidade com as necessidades do acolhimento de cada criança/adolescente,
respeitando-se as características das famílias e do acolhido, com vistas à
superação das violações praticadas;

• Construção de espaço para troca de experiências entre famílias de origem.

• Com a criança e /ou adolescente acolhido


• Preparação da criança/adolescente para a entrada no serviço, buscando-se
estabelecer um vínculo de confiança, fornecendo a ela explicação da situação e
esclarecimentos quanto ao acolhimento familiar. Essa ação deve ser partilhada com
o órgão que encaminhou a criança ou adolescente;

• Aproximação supervisionada entre a criança/adolescente e a família acolhedora;

• Escuta individual da criança/adolescente, com foco na adaptação à família


acolhedora;

• Acompanhamento do desempenho escolar da criança e sua situação de saúde;

• Viabilização de encontro semanal entre a família de origem e a criança e/ou


adolescente, o qual deverá ser acompanhado pela equipe técnica.

Subsídio financeiro
Para fins de custeio de despesas com a criança ou adolescente acolhido, será
destinado à família acolhedora um valor mensal, a ser definido em lei, durante o período
efetivo de acolhimento.
Recomenda-se o subsídio financeiro diferenciado quando se tratar de acolhimento a
mais de uma criança e/ou adolescente e em caso de acolhimento de pessoas com deficiência.
Cabe à equipe técnica, durante o acompanhamento da família acolhedora e da
criança e/ou adolescente, avaliar a utilização correta do recurso, orientando sempre que
necessário que o recurso é público e passível de prestação de contas, se solicitado, nos

68
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

casos em que se identificar que o mesmo não está sendo utilizado de forma a atender as
necessidades do acolhido.

Importante: A utilização do subsídio financeiro deverá ser discutida com a família


acolhedora, durante a elaboração do Plano de Atendimento Individual e Familiar,
construído pela equipe do serviço, juntamente com a família acolhedora, levando
sempre em consideração as necessidades da criança e/ou adolescente acolhido.

69
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Capítulo 3
3.1 Orientações Metodológicas
3.1.1 Instrumentais

a. Projeto Político Pedagógico – PPP


O Projeto Político Pedagógico é um instrumental que deve orientar a proposta de
funcionamento do serviço como um todo, tanto no que se refere ao seu funcionamento
interno, quanto seu relacionamento com a rede local, as famílias e a comunidade. Deve
ser elaborado coletivamente, de modo a envolver as famílias e vários profissionais dos
órgãos das diversas políticas de atendimento: saúde, educação, cultura, assistência social,
habitação, previdência social, transporte e Sistema de Garantia de Direitos.
Sua construção deve considerar duas dimensões de grande importância neste
processo, quais sejam: a dimensão política e dimensão pedagógica.
A dimensão política refere-se à garantia do direito inclusive à proteção, à convivência
familiar e comunitária – distante da caridade, da benevolência e do assistencialismo. Essa
dimensão permite a participação, escolhas, tomadas de posição e de decisões, levando
em consideração princípios e valores. Expressa o posicionamento da instituição diante de
sua tarefa de garantir direitos.
A dimensão pedagógica refere-se à concepção metodológica, ou seja, quais
as metodologias a serem construídas para levar os sujeitos, que atuarão individual e
coletivamente na sociedade, a serem participativos, responsáveis, críticos e criativos. O
Projeto não é estático. Depois de implantado, deve ser avaliado e aprimorado a partir de
uma análise da prática cotidiana.
No Projeto Político Pedagógico deverão constar vários conteúdos considerados
relevantes, tais como:

1. Fundamentos teórico-metodológicos que orientam o serviço;

2. Os objetivos do serviço;

3. A qual público-alvo se destina;

4. A capacidade de atendimento do serviço;

5. Recursos humanos;

6. Recursos financeiros;

7. Estrutura física;

70
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

8. Regimento interno;

9. Proposta para elaboração do PIA;

10. Descrição do acompanhamento;

11. Articulação e intersetorialidade com a rede socioassistencial e demais políticas públicas;

12. Monitoramento e avaliação do serviço.

O PPP deve ser elaborado de forma participativa


pelos usuários e todos os profissionais do serviço.

É um instrumental dinâmico, pois trata da


realidade das unidades de acolhimento, portanto
é passível de revisões e adequações a partir das
vivências cotidianas.

O Projeto Político Pedagógico deverá discorrer sobre todos os itens a seguir:

• Histórico do serviço de acolhimento: histórico, atual composição da diretoria,


os principais momentos do serviço, mudanças ocorridas ao longo dos anos, dentre
outros. O conhecimento da história do serviço é fundamental para a manutenção,
problematização ou transformação de determinadas ações e práticas. Retomar a
origem de determinados fatos ocorridos permite compreender dinâmicas estabelecidas
e planejar novas estratégias de intervenção.

• Valores do serviço de acolhimento: valores que permeiam o trabalho e ação de


todos os envolvidos no cotidiano na instituição;

• Justificativa da oferta do serviço: razão de ser do serviço de acolhimento dentro do


contexto social e objetivos desse serviço;

• Organização do serviço de acolhimento: físico, atividades, responsabilidades, etc.;

71
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

• Organograma e quadro de pessoal: recursos humanos, cargos, funções, turnos,


funcionários, competências e habilidades necessárias para o exercício da função; vínculo
empregatício, estratégias para capacitação e supervisão;

• Atividades psicossociais: as ações que são realizadas visando trabalhar questões


relativas ao autocuidado, autoestima, fortalecimento da autonomia, resiliência com os
acolhidos e com as famílias visando a reintegração familiar. Também é necessário descrever
ações/estratégias para preservação dos vínculos fraternos e de parentesco do acolhido
com sua família, pessoas que lhes são significativas e comunidade, que contribuirão para
a formação e preservação de sua identidade, da história de vida e referências familiares.

• Fluxo de atendimento: qual o caminho a ser percorrido internamente, no serviço de


acolhimento, e externamente por meio da articulação com outros serviços que compõem
o Sistema de Garantia de Direitos, a fim de garantir a proteção integral.

• Monitoramento e avaliação do atendimento: métodos de monitoramento e avaliação


do serviço que incluam a participação de funcionários, voluntários, famílias e atendidos
durante o acolhimento e após o desligamento.

• Regras de convivência: essas deverão ser construídas com participação de todos


os atores e usuários do acolhimento, estabelecendo normas de respeito, cordialidade, bem
como as sanções previstas no caso de descumprimento das mesmas.

Ao construir o PPP, as equipes devem ter a preocupação de elencar todas as


situações do cotidiano do acolhimento, os possíveis entraves com a rede de serviços
socioassistenciais, políticas setoriais e Sistema de Garantia de Direitos, construindo
estratégias e direcionando as ações a serem realizadas para cada situação, garantindo
assim a eficácia e a sintonia no atendimento por todos os trabalhadores do acolhimento.
Para ilustrar de forma mais didática, citaremos dois exemplos de situações reais
que podem acontecer no serviço de acolhimento e que, por não constar no Projeto Político
Pedagógico, as equipes podem vir a apresentar dificuldades no trato com essas questões.
Os exemplos aqui citados são situações reais com as quais os profissionais do
serviço de acolhimento não souberem lidar, por não constarem no PPP.
O primeiro exemplo trata-se de serviço de acolhimento de crianças e adolescentes
que se depararam com a gravidez de uma das acolhidas, uma adolescente com 15 anos. A
equipe técnica apresentou as seguintes dúvidas:

a) A quem compete acompanhar a adolescente na hora do parto?



b) O que fazer após o nascimento do bebê?

c) A medida de proteção se estende ao bebê?

d) É necessário solicitar guia de acolhimento para o bebê? A quem compete solicitar


a referida guia ao Judiciário?

Essa é uma situação que, por exemplo, deveria estar prevista no PPP, pois a gravidez

72
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

é um evento possível de acontecer em unidades que acolhem adolescentes.


Se houvesse a previsão de ocorrência de evento dessa natureza no PPP do serviço
de acolhimento, os profissionais teriam nesse instrumental todas as orientações a
serem seguidas nesse caso. Há que se prever inclusive ações emergenciais no caso de a
adolescente entrar em trabalho de parto no período noturno, quando geralmente a equipe
é reduzida e não se conta com a presença da equipe técnica.
A título de ilustração, seguem algumas sugestões de ações que a equipe deve
prever para a proteção e o cuidado com essa adolescente nos diferentes momentos de
sua maternidade. Considerando que a adolescente entre em trabalho de parto à noite, faz-
se necessário prever:

• Definição de quem se deve acionar, nesse caso, já que a equipe técnica não se
encontra na unidade à noite;

• Definição de qual transporte será utilizado para o deslocamento e a quem solicitar


quando a unidade de acolhimento não dispuser de um veículo;

• Definição de atribuições para cada componente da equipe;

• Definição do profissional que acompanhará a adolescente até a maternidade;

• Definição de quem permanecerá na maternidade acompanhando a adolescente;

• Definição de quem e de que forma a casa/ambiente será organizada para receber o


bebê e a mãe;

• Definição dos responsáveis por informar ao Juizado da Infância e da Juventude


sobre o nascimento da criança e em qual período deve ocorrer essa comunicação; dentre
outras ações.

O segundo exemplo trata-se do falecimento de pessoa idosa em unidade de


acolhimento, situação esta que não estava prevista no PPP da unidade, o que ocasionou
os seguintes questionamentos:

a) O que fazer primeiro?

b) A quem devo comunicar o falecimento?

c)A quem compete realizar os serviços funerários?

d) A quem cabe providenciar o encerramento da conta bancária do idoso? Quais os


procedimentos para o encerramento da referida conta?

Nesse caso, lembramos que são várias as situações de uma pessoa idosa em
acolhimento: ela pode ter referência familiar ou não; pode ser beneficiária do Benefício
de Prestação Continuada - BPC ou até ter outras posses ou recursos. Ela pode ou não ser
considerada incapaz; sua família, caso ainda tenha vínculos com o acolhido (a), pode não

73
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

ter recursos para a realização dos serviços funerários, etc. Para cada uma das situações
citadas, deverão ser previstos no PPP procedimentos diferenciados.
Situações como evasão da unidade de acolhimento, namoro entre os acolhidos ou
com outras pessoas, serviço voluntário, dentre outras, são algumas das questões para as
quais se devem atentar ao elaborar o PPP, descrevendo detalhadamente quais procedimentos
deverão ser adotados em cada circunstância. Quanto maior o detalhamento das situações
e a previsão de ações no PPP, menos dificuldades de atuação os profissionais terão.
Por se tratar de um instrumento dinâmico, ou seja, que deve ser monitorado
e readequado/atualizado, sempre que for necessário, novas situações surgidas no
acolhimento passarão a compor o PPP, de forma que o mesmo consiga expressar a
realidade do acolhimento da maneira mais completa e atual possível. Assim também,
uma situação vivenciada poderá trazer elementos novos, com novas possibilidades de
soluções e/ou encaminhamentos mais adequados.

b. Plano Individual de Atendimento - PIA

O Plano Individual de Atendimento– PIA é o instrumento metodológico que orienta


o trabalho de intervenção junto aos usuários acolhidos e suas famílias a fim de garantir
a proteção integral, a reinserção familiar e comunitária, autonomia e emancipação dos
sujeitos afastados dos cuidados parentais e sob a proteção de serviços de acolhimento.
O PIA reúne informações de natureza objetiva e subjetiva, que deverão ser
atualizadas em vários momentos do acolhimento para se conhecer as razões, motivos
e circunstâncias em que ocorreu a situação de afastamento do usuário do convívio
familiar, as particularidades, potencialidades e necessidades específicas dos usuários e
do seu grupo familiar. Permite também avaliar as condições da família para a superação
das violações e provimento de proteção e cuidado, bem como fornecer e organizar as
informações necessárias ao planejamento das ações cotidianas visando promover a
reparação da violação e consequente fortalecimento de vínculos familiares, proteção
integral, autonomia, emancipação e reinserção familiar.
São objetivos específicos do PIA:

• Planejar ações que promovam a reintegração familiar;

• Fortalecer os vínculos familiares e comunitários;

• Identificar as potencialidades dos acolhidos e suas famílias;

• Identificar a necessidade de articulação/encaminhamentos para outros serviços


socioassistenciais, programas de transferência de renda e outras políticas públicas;

• Estreitar a relação entre acolhidos, suas famílias e a equipe de referência do serviço;

• Prevenir o agravamento das situações de vulnerabilidade e risco sociofamiliares;

• Prevenir futuros afastamentos do convívio familiar evitando novas formas de vitimização;

74
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

• Preservar a história de vida dos usuários;

• Prever ações de fortalecimento da autonomia;

• Garantir acesso às políticas setoriais (saúde, educação, esporte e lazer, dentre outras).

Os profissionais dos serviços de acolhimento devem construir uma sistemática de


atendimento que possibilite o início da elaboração do Plano de Atendimento Individual e
Familiar imediatamente após o acolhimento do usuário, para que se alcancem, no menor
tempo possível, soluções de caráter mais definitivo com vistas à desinstitucionalização.
Porém, há de se considerar que um PIA bem elaborado requer conhecimento
aprofundado do acolhido, de sua família, de sua história de vida, das situações que ensejaram
o acolhimento, das redes pessoais e sociais as quais acessava e de sua comunidade de
origem. Visitas domiciliares, entrevistas, reuniões e levantamento de informações com
outros serviços que acompanham ou já acompanharam o núcleo familiar, dentre outros,
requer tempo. Assim, num primeiro momento, após o acolhimento, a equipe deverá construí-
lo com as informações preliminares e pensar em ações/intervenções mais urgentes.
Posteriormente, deverá ser aprimorado, tão logo se obtenha mais informações e outras
ações se tornem necessárias ao acompanhamento.

Importante: O PIA é um instrumento que facilita o trabalho técnico, pois além


de orientar o trabalho com o acolhido e sua família, permite, por meio do
monitoramento das ações propostas, redirecionar e/ou propor ações mais eficazes
na tentativa de se promover a reintegração familiar. Deverá ser atualizado sempre
que o acompanhamento técnico sinalizar esta necessidade e sempre estar em
consonância com a evolução do caso.

É necessária a realização de um estudo diagnóstico que permita o conhecimento


da situação do acolhido, de sua família e/ou da pessoa que lhe seja significativa.
Poderão ser desenvolvidas diversas estratégias para a realização desse estudo, tais
como: atendimentos, visitas domiciliares, reuniões e levantamento de informações com
outros serviços da rede intersetorial (saúde, educação, habitação, cultura, lazer, esporte,
profissionalização, programas de trabalho e geração de renda, dentre outros).
A partir da contextualização e considerações identificadas no estudo diagnóstico
da pessoa acolhida, o PIA será elaborado, considerando as dimensões da avaliação
interdisciplinar, definindo objetivos, estratégias e ações a serem desenvolvidas, visando
a superação dos motivos que ocasionaram o acolhimento e, por consequência, a
reintegração familiar.

75
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Importante: Instrumento que determina os compromissos assumidos pelo


acolhimento, pelas políticas setoriais, pelo acolhido e por sua família, o PIA deverá
prever a definição de metas, estratégias, compromissos, responsabilidades e
prazos que precisam ser acordados entre as partes para ser viável e alcançar sua
finalidade. Deverá contemplar não só o planejamento das ações/intervenções
técnicas para o período de acolhimento, mas também conter um planejamento para
o pós-desligamento do acolhido do serviço.

Responsáveis pela elaboração do PIA:


A equipe técnica do serviço de acolhimento é responsável pela elaboração do PIA,
considerando e incluindo as informações dos cuidadores do serviço. Deve contemplar uma
escuta qualificada do acolhido e de sua família, bem como de pessoas de referência, da
rede de apoio e da comunidade onde viviam, de modo a compreender a dinâmica familiar
e as relações estabelecidas com o contexto.
É importante que cada acolhido e as famílias tenham papel ativo nesse processo e
possam, junto aos técnicos e demais integrantes da rede, pensar nos caminhos possíveis
para a superação das situações de risco e de violação de direitos, participando da definição
dos encaminhamentos, intervenções e procedimentos propostos.
O trabalho deverá ser conduzido, de modo a contribuir para a reconstrução e/ou
fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, defesa de direitos, fortalecimento das
potencialidades e aquisições e a proteção das famílias e indivíduos para o enfrentamento
das situações de violações de direitos.
O PIA é o instrumental que prevê e organiza estratégias para o atendimento e
acompanhamento do caso, não se trata de uma mera formalidade, tampouco se limita
às estratégias inicialmente propostas, é dinâmico e aberto a mudanças, reformulações e
aprimoramento, baseado nas intervenções realizadas e em seus resultados.
A elaboração do PIA deve ser realizada em parceria com diversos profissionais da
rede de serviços acessados pelo usuário – Cras, Creas, UBS, Caps, Sistema de Justiça, ONG’s
envolvidas no atendimento à família e ao acolhido, e demais órgãos e serviços de outras
políticas públicas (saúde, educação, habitação, cultura, lazer, esporte, profissionalização,
programas de geração de trabalho e renda, dentre outros). Devem ser ouvidos todos os
profissionais que porventura estejam atendendo ou tenham atendido o usuário acolhido
ou sua família.

Outros aspectos importantes a serem observados:
• Motivos que levaram ao acolhimento e se já esteve acolhido neste ou em outro
serviço anteriormente;

• Configuração e dinâmica familiar, relacionamentos afetivos na família nuclear e extensa,


ciclo de vida familiar, dificuldades e potencialidades da família no exercício de seu papel;

76
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

• Condições socioeconômicas, acesso a recursos, informações e serviços das


diversas políticas públicas;

• Demandas específicas do acolhido e de sua família que requeiram encaminhamentos


imediatos para a rede (sofrimento psíquico, abuso ou dependência de álcool e outras
drogas, etc.), bem como potencialidades que possam ser estimuladas e desenvolvidas;

• Rede de relacionamentos sociais e vínculos institucionais do acolhido, composta


por pessoas significativas na comunidade, colegas, grupos de pertencimento, atividades
coletivas que participa na comunidade, escola, instituições religiosas, etc;

• Violência e outras formas e violação de direitos na família, seus significados e


possível transgeracionalidade;

• Significado do afastamento do convívio e do serviço de acolhimento para o acolhido


e a família, dentre outros.

O Plano Individual de Atendimento, além de orientar as intervenções a serem


desenvolvidas para o acompanhamento de cada caso, deve contemplar ainda:

Desenvolvimento saudável durante o período de acolhimento: planejar


encaminhamentos necessários para serviços da rede (saúde, educação, assistência
social, esporte, cultura e outros); atividades para o desenvolvimento da autonomia;
acompanhamento da situação escolar (quando for o caso); preservação e fortalecimento
da convivência comunitária e das redes sociais de apoio; construção de projetos de vida;
relacionamentos e interação no serviço de acolhimento – educadores/cuidadores, demais
profissionais e colegas; preparação para ingresso no mundo do trabalho, etc.

Investimento nas possibilidades de reintegração familiar: fortalecimento dos


vínculos familiares e das redes sociais de apoio; acompanhamento da família, em parceria
com a rede, visando à superação dos motivos que levaram ao acolhimento; potencialização
da capacidade para o desempenho do papel de cuidado e proteção. Nos casos de acolhidos
em processo de saída da rua deve-se buscar a identificação dos familiares, dos motivos
que conduziram à situação de rua e se há motivação e possibilidades para a retomada
da convivência familiar; acesso da família do acolhido a serviços, programas e ações das
diversas políticas públicas e do terceiro setor que contribuam para o alcance de condições
favoráveis ao retorno ao convívio familiar; investimento nos vínculos afetivos com a família
extensa e de pessoas significativas da comunidade.

Potencialização da autonomia: é importante a realização de ações que promovam


a autonomia do acolhido para que este possa ser capaz de fazer escolhas pessoais,
políticas e afetivas, trazendo-lhe a possibilidade de
[...] Assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante,
transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque é capaz de
amar. [...] (FREIRE, 2002, p. 41).

77
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Preparação para o desligamento: um dos princípios do acolhimento é a


provisoriedade, portanto, desde a chegada do acolhido no serviço, ações que o preparem
para seu desligamento deverão nortear todo o trabalho técnico.

E lembre-se: Mesmo que os acolhidos sejam de uma mesma família e encontrem-


se na mesma unidade de acolhimento, constrói-se um PIA para cada um,
considerando e respeitando as singularidades e necessidades de cada usuário.

Plano de Ação do PIA


Para planejar as intervenções necessárias a cada caso é importante fazer uma
avaliação técnica criteriosa da realidade do acolhido e de sua família, a partir das
informações e dados apurados no diagnóstico prévio e nos estudos de casos realizados
com a rede de serviços, indicando as necessidades específicas do caso.
O plano de ação deverá ser construído, considerando especialmente os motivos
que culminaram no acolhimento, bem como contemplar ações para cada violação ou
fragilidade apontada no diagnóstico, tanto para o usuário quanto para sua família, com
vistas à superação dos motivos que levaram ao acolhimento, fortalecimento dos vínculos
familiares e comunitários possibilitando, assim, a reintegração/integração familiar.
Essas estratégias devem primar pelo fortalecimento dos recursos pessoais e sociais,
potencialidades do usuário acolhido, bem como de sua família (nuclear ou extensa).
Para melhor acompanhar o desenvolvimento das intervenções propostas, sugere-
se elaborar dois planos de ação, um voltado para o acolhido e outro à sua família.

A participação do acolhido e de sua família no processo de compreensão


de sua realidade e construção do Plano de Atendimento Individual e
Familiar construído é fundamental para a reintegração familiar.

Exemplo de Planos de Ação:

78
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Plano de Ação para o Acolhido

Demanda / Ações propostas/


Eixo/Área Prazo
Vulnerabilidades Encaminhamentos

Consulta com Agendar consulta no


Saúde Até 30 dias
ginecologista Centro de Saúde

Educação Apoio psicopedagógico Reunião com a escola Até 30 dias

Regularizar
Assistência Benefício de Prestação documentação/
Até 60 dias
Social Continuada protocolar pedido de
BPC

Localizar, junto aos


Localizar filho(a), com equipamentos de
Convivência
a qual o usuário residia saúde, assistência e Indeterminado
Familiar
antes do acolhimento outros, o endereço da
filho(a).

Participação nas
Convivência
Atividade física atividades da Imediatamente
Comunitária
Academia da Cidade

Matrícula do
Geração Inserção no mercado
adolescente em cursos Até 60 dias
de Renda de trabalho
profissionalizantes

Contatar o suposto
genitor e orientá-lo a
Omissão do nome encaminhar processo
Documentação do pai na certidão de de reconhecimento de Indeterminado
nascimento paternidade, se for o
caso. Contato com a
defensoria pública.

79
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Plano de Ação para o Família

Demanda / Ações propostas/


Eixo/Área Prazo
Vulnerabilidades Encaminhamentos

Agendar consulta
Saúde Depressão psiquiátrica e Imediatamente
atendimento psicológico.

Encaminhar a família
para Programa de
Assistência
Insuficiência de renda Transferência de Até 30 dias
Social
Renda (Bolsa família)
e geração de renda.

Família não comparece


Convivência
à unidade de Busca ativa da família. Imediatamente
Familiar
acolhimento

Trabalho Genitora sem trabalho Capacitação. Até 90 dias

Agendar atendimento
Providenciar 2ª via da
Documentação para obtenção de Imediatamente
carteira de identidade
documentação.

Acompanhamento do Plano Individual de Atendimento


Toda e qualquer ação do plano de ação do PIA deverá ser acompanhada com o
objetivo de que se possa revisar/ampliar ações, bem como adequar as mesmas de forma a
qualificar cada vez mais o atendimento ofertado. Portanto, deverão ser realizadas reuniões
periódicas de estudo de caso pelos profissionais envolvidos para acompanhamento da
evolução do atendimento, verificação do alcance dos objetivos acordados, avaliação da
necessidade de revisão do Plano de Atendimento e elaboração de estratégias que possam
responder às novas situações surgidas durante o atendimento. As conclusões resultantes
de tais reuniões servirão, inclusive, de subsídio para a elaboração de relatórios a serem
enviados aos diversos órgãos envolvidos no acompanhamento (Judiciário, Ministério
Público, Defensoria Pública, etc.)

80
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

c) Prontuário Individual: organização de registros sobre a história de vida e


desenvolvimento dos acolhidos
A equipe técnica do serviço de acolhimento deverá organizar prontuários individuais
com registros sistemáticos que incluam: histórico de vida, motivo do acolhimento, data de
entrada e desligamento, documentação pessoal, informações sobre o desenvolvimento
físico, psicológico e intelectual, condições de saúde, Plano Individual de Atendimento, etc.
Pessoas idosas e pessoas com deficiência acolhidas com graus de dependência,
transtornos mentais e necessidades específicas de saúde devem ter registros e informações
que favoreçam a prestação de cuidados adequados, inclusive, relativos à sua saúde, bem
como a evolução de seu quadro.
Devem ser organizados registros dos acolhidos, nos quais conste relato sintético
sobre a rotina, progressos observados, socialização, necessidades emergenciais,
mudanças, encontro com familiares, dados de saúde, etc.
Tais registros devem conter, ainda, informações sobre a família, sobre o trabalho
desenvolvido (visitas, encaminhamentos, atendimentos individuais ao acolhido e a sua
família, atividades em grupo, encontros com a família ou pessoa significativa, preparação
para a reintegração, quando for o caso, etc.).
Esses registros devem ser consultados apenas por profissionais devidamente
autorizados, devendo os serviços de acolhimento ter uma política clara de confidencialidade
desses dados, a ser observada por todos os profissionais. A transmissão pelos técnicos a
outros profissionais de informações necessárias ao atendimento dos acolhidos deve estar
pautada em princípios éticos.

3.1.2 Acompanhamento psicossocial


É o conjunto de atividades propostas e realizadas pela equipe de referência
(psicólogo e assistente social) responsável pelo acompanhamento do caso, com o
objetivo de atender às demandas da família de origem e/ou extensa e do acolhido. O
acompanhamento psicossocial realizado com os usuários possibilita ao técnico promover
o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários e a superação dos motivos que
culminaram no acolhimento.
A definição quanto às técnicas adotadas em sua efetivação, bem como a
periodicidade e evolução desse acompanhamento, será de acordo com a avaliação do
técnico que realiza o acompanhamento.
O acompanhamento psicossocial tem desdobramentos que implicam a articulação
com os serviços de outras políticas públicas setoriais e de defesa de direitos, bem como
com a rede de serviços socioassistenciais. Na intervenção técnica, esses desdobramentos
se viabilizam por meio de encaminhamentos, orientações, referenciamento e
contrarreferenciamento, entre outros. Constituem como eixos de trabalho: acolhida,
estudo de caso, acompanhamento familiar, elaboração de relatórios, fortalecimento da
convivência familiar e comunitária, visitas domiciliares, articulação em rede, preparação
para o desligamento, desligamento e contrarreferenciamento.

81
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

a. Acolhida
A chegada a uma unidade de acolhimento é sempre um momento delicado, tanto
para a pessoa que chega, quanto para os profissionais e demais acolhidos. O acolhimento,
na maioria das vezes, acontece por aplicação de medidas judiciais ou desejo e indicação
de terceiros, e nem sempre é um acolhimento desejado. Portanto, é necessário todo
cuidado e atenção a esse momento. É importante que os profissionais sejam capacitados
para a realização da acolhida, que saibam compreender as manifestações do acolhido no
momento de chegada, que envolvem sentimentos de incerteza, insegurança, abandono,
dentre outros, que podem ser manifestados por meio do silêncio, tristeza, choro ou
agressividade, por exemplo.

Na chegada ao acolhimento

Tudo ao mesmo tempo ...

Revoltados

Tristes Não
amados

Desamparados Como se sentem Amedrontados

Inseguros Confusos

Aprisionados

82
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Para que os efeitos da separação de seus familiares possam ser minimizados,


no momento da chegada do acolhido espera-se do profissional que o recebe atitudes
humanizadas e esclarecedoras sobre a casa, a rotina institucional, sobre a família (quando
se tratar de acolhimento familiar), dentre outros.

• O tratamento deve ser respeitoso e afetuoso. O acolhido poderá não compreender o


motivo do acolhimento e encará-lo como uma medida de punição e despertar sentimentos
de insegurança, agressividade, revolta, abandono e outros.

• Recomenda-se que haja um espaço físico adequado destinado à acolhida inicial.


Deve-se apresentar o espaço físico, os funcionários, educador/cuidador de referência, seu
espaço privado (cama, armário, objetos pessoais, etc.).

• Esclarecer sobre possibilidades do convívio familiar e comunitário (visitas à


instituição, recebimento de ligações, etc.).

• É importante que os preceitos de convívio no novo ambiente sejam explicados


gradativamente, respeitando as capacidades de compreensão dos acolhidos.

• Dirigir-se ao acolhido falando o nome dele.

• Estar atento às suas manifestações e necessidades imediatas: a fome, o machucado,


a necessidade de higiene pessoal imediata, dentre outras.

• Conversar sobre o que está acontecendo, se for seu desejo, respeitando seus
sentimentos.

• Sempre que possível, os órgãos encaminhadores deverão comunicar previamente


ao serviço acerca de cada novo acolhimento para que a equipe possa preparar o ambiente,
e aqueles que já se encontram acolhidos para a chegada do novo integrante.

b. A importância da construção de vínculo entre acolhido e equipe do acolhimento

Durante o período de acolhimento, deve-se favorecer a construção do vínculo


de afeto e confiança com a equipe técnica, educador/cuidador e demais integrantes
do acolhimento. É importante, ainda, que ao longo do acolhimento o acolhido tenha a
possibilidade de dialogar com a equipe técnica e com educador/cuidador de referência
sobre suas impressões e sentimentos relacionados ao fato de estar afastado do convívio
com a família e com a comunidade. Nessas conversas é importante que o interlocutor
possibilite uma expressão livre, oportunizando-lhe espaço no qual possa falar sobre sua
história de vida, sentimentos, desejos, angústias e dúvidas quanto às vivências pregressas,
ao afastamento de sua família, da comunidade e sua situação familiar. O interlocutor deve
mostrar-se disponível e manter postura acolhedora e respeitosa, sem culpabilização ou
julgamentos dos envolvidos. Nessas oportunidades, deve-se esclarecer também que o
serviço de acolhimento é organizado para a sua proteção e constitui um direito seu.

83
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

c. Estudo de caso

Atividade de natureza técnica que subsidia análises, avaliações, elaboração do Plano


Individual de Atendimento (PIA), bem como pareceres técnicos. Inclui coleta de dados
sobre a história pessoal e social dos usuários, seu trânsito pela rede socioassistencial,
sistematização das informações e produção de conhecimento.
O estudo de caso é realizado com informações obtidas junto à rede socioassistencial e
intersetorial, Sistema de Garantia de Direitos e durante os atendimentos socioassistenciais.
Estas servirão de base para a programação de intervenções com o acolhido e sua família
de origem/extensa, com vistas à melhoria das relações sociofamiliares e superação de
violações que levaram ao acolhimento.

d. Relatórios

Uma das atividades da equipe técnica dos serviços de acolhimento é a produção de


relatórios que, ao descrever a trajetória do usuário e de seu grupo familiar durante o período
de acolhimento, servirão para indicar qual é a melhor alternativa para garantir a convivência
familiar daquele acolhido. No caso do serviço de acolhimento de crianças e adolescentes,
tais relatórios subsidiam decisões do Poder judiciário e apontam para encaminhamentos
que atendam ao melhor interesse desse público. Assim, em cumprimento à legislação,
as unidades que acolhem crianças, adolescentes e jovens, deverão encaminhar ao Poder
Judiciário os relatórios, no máximo a cada três meses, conforme disposto na Lei nº. 13.509,
de 22 de novembro de 2017, que alterou o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA.
No caso de pessoas idosas e pessoas com deficiência, embora não haja normativa
que determine a obrigatoriedade de se encaminhar relatórios periódicos para as instâncias
jurídicas, recomenda-se que os mesmos sejam elaborados, contendo a evolução dos
acolhidos, as atividades propostas com foco na reintegração familiar, acompanhamentos
da saúde, encaminhamentos para outras políticas setoriais e socialização dos mesmos
com a comunidade e com os profissionais do acolhimento.
Os relatórios deverão ser elaborados de forma clara, evitando a linguagem
excessivamente técnica, avaliações preconceituosas e emissão de juízo de valor. Deve ser
o produto da reflexão técnica, após estudo rigoroso do caso, com o objetivo de orientar e
subsidiar a tomada de decisões.

e. Acompanhamento familiar

Ação que ocorre desde o momento de inserção dos usuários na unidade de


acolhimento até o seu desligamento e se estende para o período pós-desligamento
garantindo, assim, a continuidade da proteção e cuidado aos acolhidos.
No contexto do acompanhamento, a equipe técnica escuta e identifica demandas,
potencialidades e vulnerabilidades do grupo familiar a fim de elaborar o Plano de
Atendimento Individual (PIA). Também deverão ser previstos atendimentos psicossociais
a serem realizados, considerando as peculiaridades de cada usuário. Orientações
socioassistenciais e informações sobre a oferta de bens e serviços das políticas públicas
e forma de acessá-los fazem parte dos atendimentos previstos.

84
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

O acompanhamento familiar requer do técnico um conjunto de informações


relevantes e, para isso, é necessário realizar uma escuta qualificada procurando identificar
sentimentos e opiniões sobre a medida de proteção aplicada ao acolhido, quando for o caso,
bem como identificar outras demandas que surgirem, e prestar informações pertinentes
ao caso.
Nesse sentido, destacam-se, a seguir, orientações à equipe técnica para o período
em que os usuários permanecerem em atendimento.
O atendimento às famílias deverá considerar:

• Conhecimento/esclarecimento sobre o motivo que determinou o afastamento da


pessoa de seu núcleo familiar, por meio de orientações cabíveis em relação ao processo
de acolhimento;

• Incentivo à autoavaliação e reconhecimento da família sobre os motivos que


resultaram no acolhimento, bem como a possibilidade de superá-los;

• Compreensão de que o acolhimento visa ao melhor interesse do acolhido, mas que


tem o caráter de provisoriedade;

• Compreensão da importância de aderir ao acompanhamento e encaminhamentos


propostos pela equipe;

• Compreensão de que a convivência entre a família e o acolhido é de fundamental


importância no processo de reintegração.

Em se tratando de acolhimento familiar, o acompanhamento se desdobra


em acompanhamento à família de origem/extensa das crianças e adolescentes e
acompanhamento à família acolhedora.
O acompanhamento às famílias acolhedoras deverá considerar:

• Observação dos aspectos referentes ao estado emocional da família, a compreensão


do seu papel e o cuidado com a criança e/ou adolescente;

• Preparação da família para o desligamento da criança e/ou adolescente, seja


para reintegração/integração na família de origem/extensa para colocação em família
substituta, seja para sua transferência para outra modalidade de acolhimento;

• Reflexão permanente sobre a forma com que cada integrante do grupo familiar
percebe e lida com a questão do apego e desapego;

• Avaliação permanente quanto ao cumprimento do plano de ação do PIA;

• Avaliação sobre a percepção da família com relação aos aspectos físicos e


emocionais da criança e/ou adolescente no processo de acolhimento;

• Acompanhamento da utilização do subsídio financeiro, sempre de acordo com

85
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

o plano de ação e considerando as necessidades e o melhor interesse da criança e/ou


adolescente acolhido;

• Atualização de todas as informações sobre o caso;

• Percepção de dificuldades e demandas inerentes ao processo de acolhimento do


grupo familiar, dentre outras.

Nos serviços de acolhimento que atendem pessoas com deficiência e pessoas


idosas, nem sempre é possível realizar ações técnicas de acompanhamento familiar com
foco na reintegração. No entanto, o direcionamento do trabalho deve ter o objetivo de, pelo
menos, proporcionar a convivência familiar estimulando a participação da família na vida
do acolhido, as visitas da família ao acolhido e, sendo possível, do acolhido à sua família.
É importante destacar que o Protocolo de Gestão Integrada de Serviços, Benefícios
e Transferências de Renda no âmbito do Sistema Único de Assistência Social – Suas
acorda procedimentos para a gestão integrada dos serviços, benefícios socioassistenciais
e transferências de renda para o atendimento de indivíduos e de famílias beneficiárias
do PBF, PETI, BPC e benefícios eventuais, e tem como objetivo final a atenção integral às
famílias e aos indivíduos.

[...]
Art. 16. Nos casos em que for identificada a necessidade de acompanhamento pelo
PAIF no CRAS ou pela equipe técnica da PSB, o atendimento terá como objetivo
enfrentar as situações de vulnerabilidade social, prevenir riscos e identificar e
estimular as potencialidades das famílias e dos territórios, fortalecendo seus
vínculos familiares e comunitários.

Art. 17. Nos casos em que for identificada a necessidade de acompanhamento pelos
serviços do CREAS ou equipe técnica da PSE, o atendimento terá como objetivo
o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, a superação de padrões
de relacionamento violadores de direitos, a potencialização da função protetiva
da família e sua inserção em uma rede de proteção que favoreça a superação da
situação vivenciada e a construção de novos projetos de vida. (BRASIL, 2009, p.19).

Há de se considerar que o atendimento às famílias deve compreender a garantia dos


direitos socioassistenciais, o acesso à rede de serviços socioassistenciais e às demais
políticas públicas, o desenvolvimento do protagonismo, da autonomia e a convivência
familiar e comunitária, a partir do perfil da família e suas potencialidades, e a situação de
vulnerabilidade e risco social em que se encontra.

f. Acompanhamento pós-desligamento
Deve ser direcionado pelo plano de ação construído especificamente para essa
finalidade, após o retorno do acolhido para sua família. Tem como objetivo assegurar
a continuidade da garantia de direitos, da proteção e do cuidado. Para os serviços de
acolhimento de crianças e adolescentes, o prazo de acompanhamento é por, no mínimo,
seis meses 29 após o retorno da criança ou adolescente ao convívio com sua família.

29 Caderno de Orientações Técnicas dos Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes, p. 43.

86
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

A equipe deverá avaliar por quanto tempo esse acompanhamento deverá ser feito,
evitando-se a tutela da família por tempo além do necessário. Ações de articulação feitas
com políticas e/ou serviços do território para o qual o acolhido retornou deverão ser
monitoradas para que sejam devidamente adequadas à necessidade do acolhido e de sua
família.
[...] A definição quanto ao órgão responsável pelo acompanhamento no período
após a reintegração familiar deverá ser objeto de acordo formal entre os serviços
de acolhimento, o órgão gestor da Assistência Social e a Justiça da Infância e da
Juventude. Tal definição deve levar em consideração a estrutura e a capacidade
técnica dos serviços da rede local, podendo ser designada para esse fim a equipe
técnica dos serviços de acolhimento, a equipe responsável pela supervisão dos
serviços de acolhimento, o CREAS, ou até mesmo o CRAS ou outro serviço de
atendimento sociofamiliar existente no Município. (BRASIL, 2009, p. 42,43).

g. Convivência familiar e comunitária - preservação e fortalecimento dos vínculos


afetivos com a família e convivência comunitária
Uma das causas do acolhimento é a fragilidade, quando não o rompimento dos
vínculos familiares. Para que se torne possível a reintegração familiar, esforços têm que
ser empreendidos no sentido de fortalecer/reconstruir esses vínculos.
Ao elaborar o PIA, ações específicas que envolvem a participação da família na
superação das violações cometidas, assim como ações que visam à reintegração
familiar do acolhido, que devem ser assumidas pela família, serão avaliadas durante o
acompanhamento, devendo ser adequadas, quando necessário.
Cabe à unidade de acolhimento garantir a manutenção de vínculos e a convivência
familiar, possibilitando e incentivando as visitas da família ao acolhido e também
proporcionando condições para que o mesmo visite sua família, desde que não haja
determinação judicial que a impeça. Assim, as equipes devem estar atentas à realidade do
grupo familiar e as dificuldades de acesso da família à unidade de acolhimento (horários de
trabalho, distância, transporte, etc.) a fim de planejar os horários e periodicidade das visitas
da família e/ou pessoa significativa para o acolhido. Destaca-se que o planejamento das
visitas deve constar no PPP e, caso haja necessidade, essas regras devem ser flexibilizadas
para melhor atender o interesse dos acolhidos e garantir a convivência familiar.
Os momentos de visita da família do acolhido, assim como as visitas do mesmo à sua
família, precisam de acompanhamento técnico observando sempre a qualidade dos vínculos
e a capacidade protetiva dos responsáveis. Outro aspecto importante a se avaliar, nesses
momentos, é o desejo do acolhido e da família de que a reintegração familiar se efetive.
Atividades que promovam a convivência familiar e comunitária deverão acontecer
dentro e fora da unidade de acolhimento. Podem ser organizadas, ainda, atividades que
incluam a participação da família na rotina da unidade de acolhimento, por exemplo,
almoço dominical com e para os familiares e pessoas significativas na vida dos acolhidos.
No que diz respeito à convivência comunitária, as unidades de acolhimento se
utilizarão dos serviços da rede socioassistencial e de outras políticas setoriais locais para
os encaminhamentos e atendimentos que se façam necessários. É importante também
que seja oportunizada aos acolhidos, dos diferentes públicos, a participação na vida diária
da comunidade e nas atividades lúdicas, de lazer e cultura, respeitadas suas limitações,
possibilitando a interação com outras pessoas e a construção de laços de afetividade.

87
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

No acesso a atividades culturais e de lazer, deve-se observar o interesse, as


habilidades e a capacidade física de cada acolhido. No caso do acolhimento de crianças e
adolescentes, as crianças deverão sempre estar acompanhadas de um cuidador/educador
quando em circulação pela comunidade. Quanto aos adolescentes, é importante que a
equipe técnica avalie a necessidade desse acompanhamento, respeitando sua autonomia,
estabelecendo regras para a participação dos mesmos nas atividades e nos espaços da
comunidade com o propósito de responsabilizá-los por sua segurança e cuidado.
O acolhimento deve favorecer a realização de atividades recreativas, lúdicas e
culturais com os acolhidos, com os profissionais do serviço, família e pessoas que lhes
são significativas. Em algumas ocasiões, pessoas do entorno e da comunidade, de forma
geral, poderão ser convidadas a participar desses eventos. Citamos aqui, como exemplo,
as festas folclóricas, como a Junina, que acontecem nas unidades de acolhimento.

São ainda ações que promovem a convivência familiar e comunitária:

• A realização de “Oficinas de Talentos” nas quais os acolhidos difundam


seus saberes e habilidades específicas (artesanato, brincadeiras, pequenos consertos,
aproveitamento de alimentos e materiais, etc.) também fortalece a convivência entre os
acolhidos, profissionais do acolhimento e pessoas convidadas;

• Rodas de conversas abordando temas de interesse dos acolhidos. É
recomendado que, nesses eventos, pessoas que detenham expertise sobre o tema
escolhido sejam convidadas;

• Participação de atividades ofertadas pelo Serviço de Convivência e


Fortalecimento de Vínculos e pelo Centro-Dia.

Além de favorecer a aproximação entre os acolhidos e suas famílias e a comunidade


local, essas atividades podem favorecer, ainda, a aproximação das famílias entre si,
construindo uma rede de apoio mútuo. Para pessoas com deficiência, uma das estratégias
do Suas para contemplá-las em seus direitos é o Centro-Dia. As “Orientações técnicas:
serviço de proteção social especial para pessoas com deficiência e suas famílias, ofertado
em Centro-Dia de Referência”(2013), define:

[...] O Centro-Dia de Referência é um equipamento social destinado à atenção
diurna de pessoas com deficiência em situação de dependência em que uma
equipe multidisciplinar presta serviço de proteção social especial e de cuidados
pessoais, fortalecimento de vínculos, autonomia e inclusão social, por meio de
ações de acolhida; escuta, informação e orientação; elaboração de um Plano
Individual e/ou Familiar de Atendimento, orientação e apoio nos autocuidados;
apoio ao desenvolvimento do convívio familiar, grupal e social; identificação e
fortalecimento de redes comunitárias de apoio; identificação e acesso a tecnologias
assistivas e/ou ajudas técnicas de autonomia no serviço, no domicílio, e na
comunidade; apoio e orientação aos cuidadores familiares com vistas a favorecer
a autonomia da dupla pessoa cuidada e cuidador familiar. Os cuidados cotidianos
com os usuários durante o atendimento no Centro-Dia incluem acompanhamento e
assessoramento em todas as atividades da vida diária; apoio na administração de
medicamentos indicados por via oral e de uso externo, prescrito por profissionais;
ingestão assistida de alimentos; higiene e cuidados pessoais; ações preventivas de

88
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

acidentes; atividades recreativas e ocupacionais de acordo com as possibilidades;


colaboração nas práticas indicadas por profissionais (fonoaudiólogo, fisioterapeuta,
terapeutas ocupacionais, dentre outros); difusão de ações de promoção de saúde
e inclusão social, acompanhamento nos deslocamentos e locomoção do seu
cotidiano, orientação às famílias sobre cuidados, dentre outras atividades.
(BRASIL, 2013.p 20,21).

Ainda que o acolhido chegue à unidade de acolhimento com laços familiares


rompidos, a equipe, a todo tempo, realizará investimentos na retomada dessa convivência,
desde que não haja impedimento legal. As famílias são dinâmicas e, por vezes, uma
família que rompeu vínculos com o acolhido poderá ser estimulada a retomar os vínculos
e responder positivamente.

h. Visitas domiciliares
A visita domiciliar é um instrumento metodológico de fundamental importância
por possibilitar a observação in loco de aspectos relevantes para o acompanhamento
psicossocial. Por ser uma atividade de natureza técnica, deve-se pautar nos princípios de
respeito à privacidade das famílias, dialogicidade e protagonismo, tanto no que diz respeito
à receptividade, quanto à disponibilidade para responder às perguntas.
Caberá à equipe construir uma relação de confiança com os familiares do acolhido
garantindo, assim, que as visitas aos seus domicílios cumpram a função de contribuir para
a reintegração familiar e que não sejam vistas como ferramenta de “controle” da família.
Com relação ao número de visitas domiciliares e sua periodicidade é o estudo de
caso que irá orientar. Algumas famílias respondem melhor ao acompanhamento quando
visitadas pela equipe técnica. Por outro lado, outras se sentem desconfortáveis com essas
visitas. Assim, espera-se que as intervenções técnicas sensibilizem as famílias para que
compreendam a real necessidade e importância das visitas domiciliares.
Destacamos que a visita não deve ter caráter policialesco e ou conotação vexatória.
Sempre que possível, faça o agendamento prévio da visita e respeite os limites de cada família.

i. Visita institucional
Atividade utilizada para buscar informações e respostas mais abrangentes
e adequadas às necessidades dos envolvidos no processo de acompanhamento,
complementando as ações da assistência social na direção da proteção integral e garantia
de direitos. Pode contribuir para aprofundamento e revisão do estudo de caso, à medida
que ocorre interação/troca de informações da equipe com técnicos de outros serviços do
Suas e/ou de outras políticas públicas e com a rede local.
A visita institucional será realizada em função da demanda de cada caso, podendo
ocorrer em unidades de atendimento da assistência social, em unidades de outras políticas
públicas (escolas, delegacias, hospitais, etc.) ou ainda em organizações da sociedade civil.

j. Articulação em rede
Conforme descrito na Resolução nº. 109/2009 do Conselho Nacional de Assistência
Social (CNAS), que institui a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais e já

89
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

mencionado neste caderno de orientações, os serviços de acolhimento devem se articular


com os demais serviços socioassistenciais e com as políticas públicas setoriais; programas
e projetos de formação para o trabalho de profissionalização e de inclusão produtiva;
serviços, programas e projetos de instituições não governamentais e comunitárias, e
demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos.
A articulação em rede pressupõe o conhecimento da trajetória do acolhido e de sua
família na rede de serviços, facilitando os encaminhamentos que se fizerem necessários.
É importante que as intervenções em rede sejam planejadas para que se complementem
no processo de acompanhamento do acolhido e sua família, evitando orientações e
ações antagônicas.
O trabalho em rede deve contemplar um olhar multissetorial, pautado em algumas
referências conceituais:

• As diversas dimensões do ser humano repercutem em várias necessidades e


demandas cotidianas, o que significa que nenhuma política, serviço ou órgão, por si só,
atende à diversidade de necessidades do indivíduo e da família;

• As situações de vulnerabilidade e riscos pessoais e sociais são multidimensionais,


envolvem vários fatores;

• A integralidade da proteção social da assistência social pressupõe a integração dos


serviços, programas, projetos e benefícios socioassistenciais;

• A proteção integral dos indivíduos e das famílias requer a integração e a articulação


da rede Suas com as demais políticas públicas e órgãos setoriais.

O trabalho em rede pode resguardar as seguintes dimensões interligadas:

• Dimensão Política: inclui a articulação e a pactuação de fluxos e


responsabilidades para o atendimento adequado às famílias e aos indivíduos,
assegurando que as normas estabelecidas pelas políticas – decretos, portarias e
resoluções – sejam postas em prática.

• Dimensão Ética: diz respeito ao compromisso direto com os direitos humanos,


com a pessoa humana, seus potenciais e suas limitações. É transversal às outras
dimensões, cabendo a ela resguardar o respeito, a dignidade e a relevância das histórias
de vida dos usuários dos serviços.

• Dimensão Técnica: resguarda a qualidade e o compromisso com o atendimento


ao usuário, observando a flexibilidade necessária ao atendimento de cada caso. Requer
um trabalho fluido e pressupõe articulação entre as unidades e serviços, bem como uma
relação dialógica entre os profissionais.

O trabalho em rede baseia-se, sobretudo, na corresponsabilidade,


complementariedade e na colaboração institucional e individual por parte das equipes,
cabendo à gestão incentivar essa prática.

90
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Nesse sentido, as possibilidades de ações devem contemplar a elaboração e


pactuação de fluxos que incluam a proteção e o cuidado às pessoas inseridas nos serviços
de acolhimento. Desse modo, é importante que as equipes de referência das unidades
de acolhimento conheçam efetivamente a rede existente no seu território de atuação,
serviços e unidades de atendimento, público atendido, atividades desenvolvidas, dentre
outras informações que permitam estabelecer e fortalecer o desenvolvimento de ações
articuladas e complementares.
Logo, o órgão gestor de assistência social tem um papel preponderante na
interlocução com outras políticas e órgãos de defesa de direitos e na consolidação da
articulação dos serviços de acolhimento com a rede, inclusive, por meio da construção e
pactuação de fluxos de articulação e protocolos de atendimento, via Sistema de Informação.

k. Preparação para o desligamento


Por ser a provisoriedade um dos princípios do acolhimento, espera-se que as equipes
iniciem a preparação para o desligamento desde a chegada do indivíduo à unidade de
acolhimento. A preparação para o desligamento consiste na identificação de expectativas
em relação a essa reintegração/integração na família, bem como a reintegração na
comunidade/território, ou quando for o caso, na inserção em outra modalidade de
acolhimento previsto no Suas para crianças e adolescentes sem possibilidades de
reintegração/integração em suas famílias ou a inserção dos mesmos em famílias
substituas, por meio da adoção.
Pessoas idosas e pessoas com deficiência, quando são desligadas da unidade de
acolhimento, necessitam ser ouvidas em suas escolhas e orientadas para a adaptação às
novas moradias e relações que serão estabelecidas, bem como às condições de proteção
e cuidado que são oferecidas a partir de seu desligamento.

l. Desligamento
O desligamento das unidades de acolhimento é possível em menor ou maior
proporção, considerando os públicos atendidos. Poderá ocorrer por meio da reintegração/
integração familiar ou quando outras possibilidades de moradia segura e protegida foram
possíveis. Nesse sentido, é fundamental que tanto os acolhidos quanto suas famílias sejam
preparadas para a efetivação do desligamento. Em se tratando de crianças e adolescentes,
estas são desligadas das unidades de acolhimento pelos seguintes motivos:

• Reintegração à família de origem;


• Integração em família extensa;
• Colocação em família substituta;
• Maioridade ou emancipação.

Quando se trata de pessoas idosas e pessoas com deficiência, o foco é sempre a

91
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

reintegração familiar, cabendo à equipe técnica provocar e acompanhar as famílias para


que ofereçam a convivência familiar, proteção e cuidado. Porém, o que se percebe é que ao
indicar o acolhimento para seus parentes, as famílias já esgotaram as possibilidades de
ofertar aos mesmos os cuidados e a proteção necessária, seja por incapacidade financeira,
seja por ausência de pessoas de referência para o cuidado.
Ao se discutir a reintegração familiar desses públicos, deve-se respeitar:

• O interesse da pessoa idosa ou com deficiência, que pode não desejar essa
reintegração;

• Os motivos que levaram ao acolhimento podem estar relacionados com violência


intrafamiliar, que necessitam ser superados, sob risco de revitimização;

• O desejo e o interesse da família, bem como a capacidade da mesma em proteger e


prestar os cuidados integrais.

O desligamento desses dois públicos (idosos e pessoas com deficiência) das


unidades de acolhimento se dá em menor proporção, em função da ausência de familiares
ou dificuldades destes em se organizar para prestar os cuidados necessários. Assim,
em muitos casos, esses públicos permanecem nas unidades de acolhimento por longos
períodos, contrariando o princípio da provisoriedade dos serviços de acolhimento.
É importante ainda que o desligamento seja trabalhado de forma coletiva nas
unidades, minimizando os sentimentos de tristeza e desânimo que podem acometer os
demais acolhidos em virtude do desligado de outrem.

m. Contrarrerefenciamento
Por ocasião do desligamento do acolhido desse serviço, ainda pode haver
vulnerabilidades que demandem atenção e, por isso, destaca-se a importância de
contrarreferenciar as famílias nos serviços socioassistenciais da Proteção Social Básica,
Proteção Social Especial de Média Complexidade e demais projetos, programas e serviços
de outras políticas públicas. Nesse sentido, o técnico deverá realizar contatos com a rede
socioassistencial para garantir que a família continue sendo acompanhada, de forma que
não haja reincidência da violação de direito e novo afastamento familiar.

n. Acompanhamento pós-desligamento
Esse acompanhamento é recomendado para todos os públicos e tem como foco
o fortalecimento da função protetiva familiar a fim de evitar a reincidência da violação que
culminou na necessidade de afastamento do indivíduo de sua família. Para tanto, faz-se
necessário dar continuidade às atividades do serviço de forma mais integrada com a rede
socioassistencial e os serviços da Proteção Social Básica ou Proteção Social Especial de
Média Complexidade, conforme o caso, buscando maior protagonismo das famílias atendidas.
Não há determinação legal de quem tem a competência do acompanhamento
pós-reintegração. Assim, deve ser considerada a organização do município, serviços
existentes e capacidade de atendimento destes. No entanto, ressaltamos a importância de

92
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

que o acompanhamento familiar aconteça e que as equipes do acolhimento e dos serviços


socioassistenciais do território estabeleçam interlocução, anterior ao desligamento,
visando assegurar ações que antecedem a chegada do acolhido em seu território.
Deverá haver previsão no PIA da equipe que irá acompanhar a família no período
de pós-desligamento, determinando as ações a serem realizadas, a competência de cada
ator da rede e a forma do monitoramento garantindo, assim, a permanência do acolhido no
seio familiar.
Nos casos de reintegração de crianças e adolescentes à família de origem ou
integração em família extensa, é previsto um período mínimo de acompanhamento, seis
meses, após finalização do acolhimento, com vistas à consolidação da reintegração/
integração familiar.

3.2 Fluxos do Acolhimento no SUAS


Público: Idosos e pessoas com deficiência

1. Identificação de caso

93
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

2. Acolhimento

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

3. Acompanhamento do plano de ação do PIA atualizado

Monitoramento do PIA

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

Público: crianças e adolescentes

1. Identificação do caso

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

2. Acolhimento

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

3. Acompanhamento do Plano de Ação do PIA atualizado

Monitoramento do PIA

Importante:
O presente fluxo foi construído para o acolhimento institucional de crianças e
adolescentes. No acolhimento familiar o fluxo é o mesmo, porém o acompanhamento
familiar contempla também ações para a família acolhedora.
A cada três meses, o serviço de acolhimento deverá protocolar relatório no Judiciário,
em conformidade com a evolução do caso e respostas aos acompanhamentos previstos
no PIA, tanto para a família quanto para o acolhido.

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

3.3 Entraves e Desafios para os Serviços de Acolhimento


Elencamos a seguir alguns entraves e desafios que perpassam os serviços de
acolhimento do Suas destinados aos públicos citados neste Caderno.

• Maior respeito à individualidade e à história do usuário


É necessário que as equipes tenham um olhar cada vez mais direcionado
para o acolhido, respeitando a individualidade e a história do mesmo durante todo
o acompanhamento. Ainda se fazem atendimentos coletivizados, com propostas de
mesma natureza, para todos, sem considerar as subjetividades dos acolhidos e de suas
famílias. Incorre-se no equívoco de ver a todos os usuários das unidades de acolhimento
como “iguais” e não como um sujeito único. Mesmo que a violação de direitos enseje
a mesma medida, ou seja, no acolhimento é importante que sejam feitas intervenções
individualizadas com cada usuário a fim de reparar a violação cometida/sofrida.

• Falta de atuação articulada:


Nenhuma política traz em si toda a capacidade de atendimento para o usuário. Há
uma incompletude institucional em todos os serviços do Suas, tanto que a intersetorialidade
é uma das dimensões do trabalho como forma de complementar as ações das diversas
políticas.
Ainda nos falta a capacidade de articular de forma exitosa toda a rede
socioassistencial em interface com as demais políticas públicas setoriais e os órgãos de
garantia de direitos.

• Grupos familiares - Acolhidos na mesma unidade


A garantia da manutenção da convivência familiar, por meio da não separação do
grupo familiar (irmãos, casais de idosos ou de pessoas com deficiência, mães e seus filhos)
dentre outros vínculos de parentesco ou afinidade, nas unidades de acolhimento, ainda
não é respeitada integralmente por diversas razões. A principal delas reside na capacidade
de atendimento das unidades e a segmentação do atendimento por sexo ou faixa etária
como forma de facilitação do atendimento.

• Judicialização das demandas


Entendemos que a intervenção dos órgãos de justiça junto aos gestores da
assistência social é uma ação legítima em defesa dos cidadãos, conferida legalmente. No
entanto, tem-se observado um vasto número de solicitações dos órgãos que compõem
o Sistema de Justiça aos técnicos e gestores da assistência social que extrapolam suas
funções, não sendo previstas e regulamentadas nas normativas da política de assistência
social. Faz-se necessário que, na utilização de instrumentos jurídicos para se corrigir
possíveis irregularidades constatadas pelos órgãos fiscalizadores ou Poder Judiciário, as

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

normativas sobre a política de assistência social e as atribuições de seus trabalhadores


sejam observadas sob pena de esses atores e gestores serem responsabilizados por algo
que não está entre as suas atribuições.

• O crescente envelhecimento da população: a idade como motivo explícito e


simbólico de discriminação, afetando o exercício de todos os direitos humanos na velhice
Culturalmente, as pessoas idosas no Brasil são vistas como aquelas que não
produzem e que a partir de certa idade são consideradas como “o problema” da família.
Quase sempre não se tem, no grupo familiar, alguém que possa responsabilizar-se pelos
cuidados e proteção da pessoa idosa e até aquelas com nível adequado de independência são
indesejadas junto às suas famílias. Não queremos desconsiderar dificuldades reais, como
as condições socioeconômicas, necessidade de sobrevivência da família, as demandas da
saúde, que por vezes comprometem a vida da pessoa idosa, deixando-a dependente e/ou
debilitada, além dos conflitos familiares, dentre outros. Mas, ainda necessitamos avançar
a nossa compreensão acerca do direito desse idoso e do compromisso que a família e, não
só o Estado, tem para com a pessoa idosa.
As estatísticas do IBGE mostram que a população idosa cresce a cada dia, que
as famílias estão cada vez com menos condições e desejo de cuidar de seus idosos.
Isso é, de fato, um grande desafio para a política pública que tem o dever de proteger e
cuidar desses indivíduos ainda que esse dever constitua também um dever da família e
da sociedade. Aumentar o número de unidades de acolhimento para pessoas idosas vai
de encontro ao que preconiza o Suas, política que busca fortalecer vínculos familiares e
manter o indivíduo no seio de sua família. Há que se pensar em estratégias de mudança
cultural para que possamos nos responsabilizar pelas pessoas idosas, de forma que estas
tenham a sua autonomia e vontade respeitadas e possam ser protegidas, junto às suas
famílias, caso seja esta a sua vontade.

• Residência inclusiva / Residência terapêutica


É importante destacar a diferença entre residência inclusiva e residência terapêutica.
As residências inclusivas são equipamentos do Suas que ofertam acolhimento para jovens
e adultos com deficiência, cujos vínculos familiares estejam rompidos ou fragilizados. Já
as residências terapêuticas são afetadas pela política de saúde, conforme descrito no guia
“Residências Terapêuticas o que são, para que servem”:

[...] O Serviço Residencial Terapêutico (SRT) – ou residência terapêutica ou


simplesmente “moradia” – são casas localizadas no espaço urbano, constituídas
para responder às necessidades de moradia de pessoas portadoras de transtornos
mentais graves, institucionalizadas ou não. (BRASIL, 2004, p. 6).

• Conflitos e lacunas na legislação


No atendimento às pessoas idosas, há ainda uma carência de normatização da
assistência social. As atribuições e responsabilidades das políticas envolvidas não são
bem definidas, o que por vezes inviabiliza a atuação da assistência social em consonância

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Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

com seus princípios e diretrizes.

• Infantilização dos acolhidos


Esse tema ao qual já nos referimos neste Caderno nos convoca a uma mudança
de paradigma no atendimento às pessoas idosas e com deficiência. Os profissionais que
atuam nas unidades de acolhimento deverão estar atentos, no sentido de inverter a lógica
perversa que considera as pessoas com deficiência e as pessoas idosas como “coitadinhas”
ou “dignas de pena”. Tratá-los de forma infantilizada, decidir e fazer por eles são atitudes
que não devem ocorrer e em nada contribuem para a autonomia destes. A deficiência e/ou
a idade nem sempre lhes tira a condição de decidir, opinar e fazer escolhas.

• Participação social como exercício de cidadania
Todos os usuários dos serviços de acolhimento do Suas devem ser estimulados
a exercer sua cidadania. Assim, sempre que possível, deverão participar de discussões
em espaços coletivos e políticos, contribuindo por meio de suas opiniões e vivências.
Esta ainda não é uma realidade dos serviços de acolhimento, que pouco estimulam o
protagonismo de seus usuários.

• Acesso ao mercado de trabalho


Atividades que tenham como objetivo capacitar e favorecer o acesso ao mercado
de trabalho deverão compor os Planos de Atendimento Individual e Familiar de todos os
acolhidos, sejam adolescentes, idosos e pessoas com deficiência, observada as exceções
que as impossibilitam. O trabalho tem fundamental importância para a independência
desses usuários e contribui significativamente para fortalecer a autoestima e autonomia
dos mesmos.

• Acessibilidade “além da rampa”


O termo acessibilidade vai muito além da possibilidade de deslocamento e
circulação pelos espaços pela existência de rampas nos equipamentos. Acessibilidade é
um atributo do ambiente que assegura a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Deve
estar presente nos espaços, no meio físico, no transporte, na informação e comunicação,
inclusive nos sistemas de tecnologias da informação e comunicação, bem como em outros
serviços e instalações abertos ao público ou de uso público.
Esforços devem ser empreendidos na busca de todas as possibilidades de se
melhorar a qualidade de vida das pessoas garantindo-as o que lhes é de direito.

101
Caderno de Orientações dos Serviços de Acolhimento

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