Você está na página 1de 3

A abolição da escravatura e os maçons

A Lei Áurea também foi assinada pelo maçom Rodrigo Augusto da Silva

Odálio Botelho

Oh! Maria, vês me curvo

Na face do presente escuro e turvo

E interrogo o porvir;

Ou levantando a voz sobre os montes, –

“Liberdade”, pergunto aos horizontes,

Quando enfim hás de vir?

(CASTRO ALVES)

Nas primitivas e verdejantes paisagens das férteis terras de Pindorama, mais


tarde chamada de Terra de Vera Cruz e/ou Terra de Santa Cruz, nos meados
do século XVI, os nativos viviam em harmonia com a dadivosa mãe Natureza,
que lhes propiciava o alimento de frutas silvestres, raízes e a caça e pesca
abundantes. Era uma conjugação perfeita, até que surgiram os portugueses,
ávidos por riquezas minerais das terras recém-descobertas. Não prosperaram
as inúteis tentativas de escravização dos silvícolas.Os colonizadores
portugueses viram, então, que a solução do uso da mão-de-obra seria valer-
se do trabalho escravo de nossos infelizes irmãos africanos Surgiram, em
consequência, os “navios negreiros” abarrotados de negros africanos,
delatados nas críticas e corajosas poesias do maçom baiano Castro Alves, o
“poeta dos escravos”.Os maçons engajados na luta pela abolição da
escravidão, batendo de frente com a poderosa aristocracia escravagista,
contam-se às centenas, maçons ilustres e maçons humildes, mas todos,
objetivando uma causa comum, a extinção dessa mancha da humanidade.
Mas, a dificuldade maior estava em casa, pois, essa aristocracia era formada,
em sua maioria, por maçons grandes fazendeiros. Aqui, neste acanhado
espaço, vou fazer um breve comentário sobre alguns poucos abolicionistas, os
quais, não ocupam lugar de destaque nos livros escolares e, que foram, para
mim, da maior significância:LUIS Gonzaga Pinto da GAMA: Filho duma escrava
livre e de um boêmio e jogador e, também, fidalgo português fracassado,
nasceu escravo e foi vendido pelo seu infeliz pai ao alferes Antônio Pereira
Cardoso, que pretendia revendê-lo. Porém, o fato de ser baiano (era uma
mancha no currículo) fazia de Luis Gama um indesejado. Não conseguindo
comercializá-lo, restou ao alferes levá-lo para sua propriedade em São
Paulo.Aprendeu a ler e escrever com a ajuda do jovem Antônio Rodrigues do
Prado Junior. Foge e ingressa na Marinha. Torna-se amanuense da Secretaria
de Polícia de São Paulo. Frequentou como ouvinte a Faculdade de Direito de
São Paulo, onde sofreu as agruras do preconceito e repulsa de professores e
estudantes. Então, como autodidata, tornou-se rábula, ou seja, advogado sem
formatura, libertando mais de quinhentos (500) presos pobres, a maioria
escravos, um feito inédito no mundo. Escrevia poemas e tornou-se jornalista
prático.Negro, o poeta, escritor, jornalista e advogado, ingressou na Ordem
Maçônica, na Loja América, tornando-se defensor dos oprimidos, pobre por
opção, pois gastava seus honorários nas despesas de alforria para os escravos
libertos. Os seus escritos incomodavam e ultrapassavam fronteiras. As
sucessivas vitórias no Tribunal do Júri e no foro, fizeram-no ser respeitado por
todos. A sua luta maior era contra os clérigos e magistrados. Os padres e
freiras usavam, sem nenhum pudor, os serviços dos escravos. Conta-se que
num convento havia 300 escravos. Os magistrados, por sua vez, impregnados
de laivos preconceituosos, relutavam em reconhecer direitos aos escravos.
Luis Gama morreu em 1882, com 52 anos de idade, seis anos antes da edição
da Lei Áurea, porém, deixando como legado a sua coragem e a sua
intelectualidade em livros e jornais daquela época. São do conhecimento de
todos as críticas ácidas de suas poesias e a famosa carta deixado ao filho,
pouco antes de sua morte, em 1886.

ANTÔNIO BENTO de Souza e Castro: Juiz de Direito, formado pela


Faculdade de Direito do Largo de São Francisco em São Paulo, ex-Promotor, o
qual, diante do túmulo de Luis Gama, jurou continuar sua obra
abolicionista.Para cumprir tal mister, ele organizou uma radical sociedade
secreta que denominou de “Os Caifazes”, cujos membros eram recrutados em
todas as camadas sociais e, principalmente, nas três principais lojas maçônicas
de São Paulo: “América”, “Piratininga” e “Amizade”.Essa sociedade retirava à
força das fazendas paulistas os escravos e encaminhava-os para o Quilombo
de Jabaquara, em Santos, ou então, para os quilombos do Rio de Janeiro.

Francisco Barbosa Gê Acayaba MONTEZUMA: Médico e advogado, negro,


chegou a ser a maior autoridade maçônica do seu tempo, ao ocupar o cargo de
Grande Comendador Soberano do Supremo Conselho do Grau 33 do Rito
Escocês Antigo e Aceito, organismo que ele trouxe da Bélgica e que disciplinou
a maçonaria brasileira, ainda em ascensão à época, no século XIX.Em data de
17 de maio de 1865, o maçom Acayaba, então Senador e agraciado com o
título de Visconde de Jequitinhonha, apresentou aos seus pares no Senado
vários projetos de extinção gradual da escravidão. Tratava-se de propostas de
cunho conciliatório, tímidas, bem peculiar aos liberais da época, os quais, não
queriam se indispor com os poderosos senhores de escravos.Político
conservador e “caramuru”, ou seja, um partidário do imperador Pedro I no
período das regências, Montezuma foi ministro de estado por duas vezes e
fundou o IAB – Instituto dos Advogados do Brasil e o Instituto Histórico e
Geográfico do Brasil.
Adolfo BEZERRA DE MENEZES: Cearense radicado no Rio de Janeiro, era
conhecido como o “médico dos pobres”, foi político, mas notabilizou-se pelo
seu excelente trabalho na divulgação da doutrina espírita. Era maçom.
Escreveu o livro “A ESCRAVIDÃO NO BRASIL”, publicado pela Tipografia
Progresso, Rio de Janeiro, em 1869, onde, no preâmbulo, sob o título “AO
PÚBLICO”, resume toda a temática do livro: “Nenhuma questão, segundo
penso, reclama tão serenamente a atenção de quem se interessa pelo bem
estar e futuro do paíz, como a da emancipação da escravatura”. A obra é um
libelo contra a escravidão e, tenho certeza, influenciou em muito os leitores e
admiradores do autor.

Aqui, nesse findar de tópico, a explicação porque omiti os nomes dos


“medalhões”. Muitos eram políticos e, por isso, são bastante homenageados
com os seus nomes estampados nos logradouros públicos. Estes que ora
homenageio, não se vê os nomes deles em obras públicas, não obstante os
seus valorosos trabalhos. Alguém conhece uma rua com o nome de Luis
Gama?Importante ressaltar que a Lei Áurea, assinada pela Princesa Izabel, em
13 de maio de 1888 e que extinguiu a escravidão no país, também foi assinada
pelo maçom Rodrigo Augusto da Silva, então Ministro da Agricultura.

Fontes:

“A maçonaria e a libertação dos escravos”, ALBUQUERQUE Tenório de,


Editora Aurora, Rio de Janeiro, 1999;

“Maçonaria Negra”, Editora A Trolha, Londrina-PR, 1999;

“Os maçons e a abolição da escravatura”, Editora A Trolha, Londrina-PR.

Você também pode gostar