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Geografia

Apostila 1º ano e 1º etapa / 2º Bimestre

Em A permanência das estruturas, a artista Rosana Paulino apresenta uma crítica à


violência histórica sofrida pela população negra no Brasil, desde o período colonial até os dias
atuais, em razão dos desdobramentos da escravidão.
A obra incita o olhar crítico do observador para o processo histórico de naturalização da
violência, do preconceito e da discriminação contra a população negra que se mantém ainda hoje
de forma velada, revelando o racismo estrutural na sociedade brasileira.

1. Dinâmica demográfica e estatísticas vitais

Os processos demográficos são dinâmicos e têm relação direta com os fatores históricos e
econômicos. Há algumas décadas, havia grande percentual de jovens na população brasileira,
mas, em poucas décadas, essa estrutura se alterou: a expectativa de vida das pessoas aumentou
e, consequentemente, elevou-se a população idosa – realidade que implicará em mudanças nas
políticas públicas do país. Esse processo pode ser identificado e analisado com base no censo
demográfico, que é a fonte de referência para conhecer as condições de vida da população.

A transição demográfica no Brasil

A transição demográfica consiste na passagem, de forma gradual, de uma situação com


altas taxas de natalidade e de mortalidade para uma situação em que essas taxas apresentam
índices reduzidos. Esse processo ocorre de forma comum na maioria dos países, porém em
tempos diferentes. Isso quer dizer que um país pode se encontrar no início da transição enquanto
outro já a completou.

Observa-se, no gráfico, que a taxa de mortalidade apresentou declínio acentuado a partir


da década de 1930, enquanto a taxa de natalidade permaneceu alta.
Dessa forma, o crescimento vegetativo tornou-se maior. Duas décadas depois, a partir de
1950, houve declínio na taxa de natalidade; entretanto, a população continuou a crescer. Isso se
explica pela conjugação das duas taxas, pois, quando a mortalidade cai, o contingente desse
grupo que teve a expectativa de vida ampliada será somado ao do grupo de pessoas que estão
nascendo. Assim, o total absoluto da população só deixará de aumentar décadas depois da
queda da natalidade, quando ocorrer o equilíbrio entre a taxa de mortalidade na idade idosa e o
percentual de nascimentos no mesmo período.
Estima-se que essa estabilização ocorrerá entre 2040 e 2050, quando as taxas de
natalidade e de mortalidade serão praticamente iguais. A partir daí, a perspectiva é que o país
entre em decréscimo populacional, pois a taxa de mortalidade será superior à de natalidade. Essa
estimativa, contudo, desconsidera os processos migratórios.
Quando um país entra em processo de declínio populacional, é esperado que a imigração
seja estimulada para suprir a força de trabalho necessária e/ou que sejam adotadas políticas de
incentivo à natalidade.

Fatores associados à transição demográfica

A transição demográfica precisa ser analisada com base nas mudanças socioeconômicas
estruturais que afetam diretamente o comportamento demográfico de uma sociedade, mas se
desenvolvem em contextos históricos específicos em cada país.
A queda da taxa de mortalidade é o primeiro indício da transição demográfica. Esse
processo ocorre quando há ampliação das políticas públicas de saneamento básico e
implementação de técnicas de controle de doenças infectocontagiosas, mediante a
disponibilização de medicamentos curativos e disseminação de estratégias de prevenção. No
Brasil, esse processo começou na década de 1930, quando passaram a ser usados no país
medicamentos para controle epidemiológico, como as vacinas, e, sobretudo, foram ampliadas as
políticas públicas de saneamento básico. Tais medidas se mostraram muito eficazes no controle
da mortalidade, sobretudo a infantil.
A taxa de natalidade no Brasil começou a cair na década de 1950 em razão de vários
fatores econômicos e sociais. Esse período foi marcado pela urbanização acelerada, associada à
industrialização intensificada durante os governos de Getúlio Vargas. A crescente oferta de
trabalho nas cidades, graças ao processo de industrialização e à expansão dos setores de
serviços e comércio, incentivou o êxodo rural. De modo geral, as condições de vida no meio
urbano induziram as famílias a realizar mudanças significativas em seu comportamento
reprodutivo. Os filhos, que na área rural eram considerados força de trabalho, passaram a ser
vistos na cidade como despesas, pois o custo de vida na cidade era maior do que no campo.
Mudou também o papel das mulheres. Se no campo elas desempenhavam um papel econômico
subalterno, na cidade passaram a participar mais da composição da renda familiar, ao ser
inseridas no mercado de trabalho formal.
Esses foram alguns dos fatores que contribuíram para a queda na taxa de fecundidade e,
consequentemente, para a redução no número de integrantes das famílias.
A transição demográfica em curso no Brasil não ocorre de forma homogênea em todo o
território. A queda nas taxas de mortalidade e de natalidade ocorreu primeiramente e com mais
intensidade nas regiões que contavam com melhor infraestrutura de serviços públicos, mais
acesso a atendimento médico e maiores níveis de escolarização e desenvolvimento
socioeconômico. Todavia, a mobilidade interna da população, com as migrações regionais,
possibilitou a ampliação desse processo, que afetou grande parte da população brasileira.
Mulheres no Brasil: comportamento reprodutivo
A taxa de fecundidade no Brasil está em queda há algumas décadas. Em 2019, a
estimativa era de 1,7 filho por mulher em idade fértil, abaixo do padrão de reposição populacional
considerado seguro para que o país mantenha taxas de crescimento populacional positivas: de
2,1 filhos por mulher. Quando a taxa de fecundidade fica abaixo desse valor, a população tende a
diminuir em algumas décadas.

Fatores associados à redução da fecundidade

Diversos fatores estão associados à mudança no comportamento reprodutivo das mulheres


do Brasil. A maioria deles tem relação direta com o processo de urbanização.
A vida urbana possibilita ampliar a relação interpessoal e difundir costumes pelos meios de
comunicação de massa, sobretudo a televisão, que se tornou muito popular entre as décadas de
1960 e 1970 no Brasil. Os programas de TV enfatizavam o modo de vida urbano, a inserção
feminina no mercado de trabalho e mais espaço para as mulheres nas decisões familiares.
Além da TV, outros meios de comunicação, como o rádio, os jornais impressos e as
revistas, expunham novos hábitos e contribuíam para a popularização de métodos contraceptivos,
como a pílula anticoncepcional, difundida a partir da década de 1960. Eles tiveram importante
papel na mudança de hábitos familiares que repercutiram no comportamento demográfico do
país.
Outro fator relevante associado à urbanização foi o acesso à educação formal. No espaço
urbano havia mais disponibilidade de serviços educacionais do que no campo, o que possibilitou
elevar o nível de escolarização da população. Em meio a esse processo, observou-se a
qualificação da participação das mulheres no mercado de trabalho, que passaram a competir por
postos antes ocupados apenas por homens. Cada vez mais, a carreira profissional se colocava
como uma das prioridades para muitas mulheres.
De acordo com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA ), quanto maior é a
escolarização das mulheres, menor é a taxa de fecundidade. No Brasil, essa tendência é
confirmada, sobretudo, quando se analisam situações extremas, como a que se verifica entre
grupos com menor e com maior tempo de escolarização, cuja relação com a fecundidade é
diretamente oposta.

A mudança na idade em que as mulheres decidem ter filhos é outro fator a ser
considerado. Diante da possibilidade de adiar a maternidade para a conclusão dos estudos e a
inserção profissional, a perspectiva é a de que as famílias tenham um número cada vez menor de
filhos.
Esse processo se insere no contexto do planejamento familiar, que possibilita escolhas
relativas à quantidade de filhos que se deseja ter, a idade mais oportuna para a gestação e o
intervalo entre uma gravidez e outra. Para que o planejamento familiar seja abrangente e abarque
a maior parte da população, é necessário que os métodos contraceptivos sejam eficientes e
acessíveis e que os programas de orientação relacionados à saúde sexual e reprodutiva
alcancem pessoas de todas as classes sociais.
O Brasil se comprometeu a seguir o plano de ações estabelecido na Conferência
Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD). Esse evento, realizado em 1994, foi
considerado um marco na mudança de paradigmas, pois nele foram reconhecidos os direitos
humanos e a ampliação do protagonismo feminino como condições para alcançar melhora na
qualidade de vida da população mundial.
Antes, as discussões recaíam quase exclusivamente no controle de natalidade como
ferramenta para o desenvolvimento social. A partir de então, admitiu-se a saúde sexual e
reprodutiva como um direito humano e também como meio para alcançar a igualdade de gênero.

A redução da fecundidade por regiões e estratos socioeconômicos

O padrão reprodutivo atual do Brasil é considerado baixo por causa da redução na taxa de
fecundidade, mas existem variações desse processo quando se analisam os dados por região,
nível de instrução e estratos socioeconômicos.
Atualmente, as taxas de fecundidade são mais elevadas nas regiões Norte e Centro-Oeste,
embora com diferenças interestaduais.
As regiões Sul, Nordeste e Sudeste apresentam taxas de fecundidade mais baixas. Essa
diferença ocorre em função das desigualdades socioespaciais que ainda persistem no território
brasileiro, relacionadas ao nível de instrução, à disponibilidade de infraestrutura, às oportunidades
de emprego, à urbanização, entre outras variáveis. Contudo, é importante observar que as taxas
projetadas sinalizam uma hipótese de convergência entre as regiões – o que pode ser um
indicativo de diminuição dessas desigualdades socioeconômicas da população.
Sobre a relação entre o nível de instrução e a taxa de fecundidade, constata-se que,
independentemente da região, quanto maior é o tempo de estudo, menos filhos as mulheres têm.
Já a estratificação social é reconhecidamente um fator determinante para a desigualdade
no comportamento reprodutivo.
As mulheres dos estratos sociais mais pobres correspondem ao grupo mais vulnerável à
gravidez indesejada.
Em geral, têm menos acesso aos serviços de saúde e, portanto, a orientações sobre a
utilização de métodos contraceptivos, os quais também nem sempre são acessíveis.
A intercalação dos dados sobre renda com os de escolarização indica que as mulheres
mais pobres são as que têm menos anos de estudo, condições determinantes para a manutenção
de altas taxas de fecundidade.

Transformações na estrutura etária

A pirâmide etária do Brasil, de 1940, apresentava a base larga. Isso indicava a alta
natalidade no país naquele período. Em contrapartida, o topo da pirâmide era bastante estreito,
indicando que a expectativa de vida era baixa e a taxa de mortalidade, elevada. Esses dados
demonstram que o país ainda não havia iniciado sua transição demográfica.
As mudanças nas taxas de natalidade e mortalidade foram expressivas nas décadas
seguintes, repercutindo em uma estrutura de pirâmide diferente na década de 1980, apesar de
ainda reproduzir um padrão típico de países com baixo nível de desenvolvimento
socioeconômico.
Observa-se queda da natalidade, pelo estreitamento da base, e uma ligeira alteração no
topo.
Com a transição demográfica em curso, a pirâmide etária de 2018 exibia, de forma mais
evidente, as transformações no perfil demográfico brasileiro. A base se encontrava bem mais
estreita que a da pirâmide de 1940. Isso demonstra a grande queda na taxa de fecundidade, que
já ocorria desde a década de 1960. O topo da pirâmide era mais largo, mostrando a elevação da
expectativa de vida e o processo de envelhecimento da população brasileira.
A pirâmide estimada para 2060 apresenta a estabilização das taxas de natalidade e de
mortalidade e evidencia o envelhecimento da população brasileira.
Mortalidade no Brasil

A melhora das condições de saúde da população, proporcionada pela ampliação dos


serviços médico-sanitários a partir da década de 1940, resultou na queda expressiva da
mortalidade no Brasil, especialmente a infantil.
A urbanização colaborou para ampliar o atendimento médico, além de facilitar a cobertura
das campanhas de vacinação e o controle de epidemias. As doenças infecciosas, responsáveis
por quase metade das mortes na década de 1930, foram controladas, vitimando um percentual
inferior a 5% da população em 2015. Todavia, nesse mesmo período houve aumento de outras
causas de mortalidade, relacionadas principalmente a doenças degenerativas. Doenças
cardiovasculares, neoplasias e fatores externos se tornaram os principais responsáveis pelas
mortes a partir da década de 1980. Esse processo de mudança no perfil da mortalidade é
chamado transição epidemiológica.
A transição epidemiológica se apresenta de forma desigual no território brasileiro. Em
áreas deficientes em infraestrutura de saneamento e com baixa oferta de serviços de saúde, que
em geral concentram populações de baixa renda, há maior incidência de doenças infecciosas.
Contudo, mesmo em áreas onde a transição epidemiológica já se completou, têm ocorrido surtos
de doenças infecciosas, como a dengue e a febre amarela.

Mortes de mulheres por homicídio

Com relação à violência contra as mulheres, a realidade também é alarmante no Brasil.


Segundo dados do SIM, 4.936 mulheres foram assassinadas em 2017, o maior número em dez
anos. Desse total, cerca de 66% eram negras, revelando que o componente
racial também está presente na violência contra as mulheres. O percentual de vítimas
negras cresceu 29,9% entre 2007 e 2017, enquanto o percentual de vítimas não negras teve
aumento de 4,5%. Entre 2012 e 2017, o número de vítimas mortas em suas residências cresceu
17,1%, enquanto os homicídios fora da residência caíram 3,3% – um indício do aumento de
feminicídios.
A violência contra as mulheres inclui ações de assédio e abusos físicos. A maior parte dos
feminicídios é praticada por pessoas próximas da vítima, normalmente o companheiro, o
namorado ou o ex-namorado. Pessoas conhecidas relatam que, antes de ser mortas, as vítimas
já sofriam algum tipo de violência, como os descritos no infográfico a seguir.
Feminicídio
O termo feminicídio foi criado pela socióloga sul-africana Diana Russel, em 1976, para
definir os assassinatos de mulheres pelo fato de serem do sexo feminino. Ela tipificou essa
modalidade de crime para diferenciá-la dos outros tipos de assassinato, que não dependem da
motivação ou da idade da vítima.
No crime de feminicídio há um viés de gênero, e o agressor tem intenção de subjugar a
vítima e depois matá-la. O assassinato ocorre após o fim do relacionamento ou após a mulher
rejeitar um convite do agressor, que entende que sua vontade tem de prevalecer sobre a da
vítima.
O Brasil instituiu a Lei do Feminicídio em 2015, tornando-o crime qualificado e hediondo,
com penas mais severas para o agressor. Ainda assim, o Brasil ocupa o quinto lugar no ranking
mundial de mortes violentas de mulheres.

2. Distribuição da população: diversidade étnico-cultural e segregação socioespacial

O Brasil é o quinto país mais extenso do mundo. Com 8.515.767 quilômetros quadrados, é
menor apenas que a Rússia, o Canadá, a China e os Estados Unidos. Seu vasto território abarca
a quinta maior população do planeta, estimada em 210.147.125 pessoas, em 2019.
A população brasileira se distribui de forma irregular no território. A maior parte vive em
áreas urbanas (cerca de 85%, em 2015), próximo à faixa litorânea. Nessa porção do território
concentra-se a maior densidade demográfica do país, característica que foi imposta desde a
colonização, quando os portugueses iniciaram a exploração econômica da colônia pelo litoral,
onde fundaram as primeiras vilas e cidades. Também nessa faixa estão os principais centros
urbanos do país: São Paulo, Rio de Janeiro e outras capitais.
Com relação à composição populacional por cor ou raça, de acordo com o IBGE, em 2015
a parcela negra da população representava cerca de 54%, enquanto as pessoas brancas
correspondiam a 45,1%. Já pessoas que se declaravam amarelas e indígenas representavam
0,5% e 0,4%, respectivamente.
A população brasileira, que apresenta grande diversidade étnica e cultural, também
carrega em seu processo de formação um histórico de muita violência contra povos de origem
indígena e africana. No Brasil, o preconceito e a discriminação em relação à cor da pele mantêm-
se na forma de racismo estrutural.

Padrões diferenciados de composição da população

A entrada de imigrantes contribuiu para a diversidade étnico-cultural do Brasil, mas


reafirmou a visão preconceituosa em relação a negros e indígenas. Tanto que as oportunidades
de acesso à terra e de inserção social por meio do trabalho não foram garantidas com igualdade
para o conjunto da população. Para a parcela negra da população, restou o trabalho de baixa
remuneração, sobretudo nas áreas economicamente deprimidas do espaço rural, caracterizadas
por baixo crescimento econômico e elevados índices de pobreza.
A discriminação racial impôs a segregação socioeconômica e, consequentemente, a
espacial. O mapa abaixo evidencia aspectos do processo de formação territorial e populacional
do Brasil. A Região Sul apresenta a maior parte das pessoas autodeclaradas brancas.
Essas pessoas, em grande parte, são descendentes das famílias de imigrantes que foram
atraídas para a região por um modelo de colonização diferente do adotado no restante do país.
Com garantia de acesso à propriedade da terra, os imigrantes se estabeleceram em pequenas e
médias propriedades, onde iniciaram o cultivo de vários produtos, com mão de obra familiar,
voltado ao mercado interno.
Esse modelo de ocupação gerou menos desigualdade social do que a verificada em outras
regiões do país, onde o acesso à propriedade da terra não foi incentivado e garantido com o
mesmo tipo de política.
A Região Nordeste foi a que recebeu a maior quantidade de africanos escravizados
durante os períodos colonial e imperial. Esse histórico de descendência se reflete hoje na
composição de sua população, com maior proporção de pessoas de cor preta ou parda.
As regiões Norte e Centro-Oeste abrigam populações majoritariamente autodeclaradas
pardas. Nessas áreas, foram implantados programas governamentais de incentivo à ocupação no
decorrer do século XX, tendo recebido migrantes das demais regiões brasileiras.
A Região Sudeste não tem um padrão definido de cor nos estados que a compõem. É a
região mais populosa do Brasil e, por isso, apresenta o mosaico de cores das matrizes étnicas
que formaram o povo brasileiro. Isso decorre do desenvolvimento econômico-industrial da região,
que atrai migrantes de várias partes do país.
A presença de indígenas não é evidenciada no mapa em razão de sua pequena proporção
no total da população.
Estima-se que, antes da colonização, havia de 2 a 4 milhões de indígenas nas terras que
formariam o Brasil. No censo demográfico de 2010, o total de pessoas que se declaravam ou se
consideravam indígenas era 896 mil, pertencentes a 305 etnias.

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