Você está na página 1de 43

Capítulo 5.

Comportamento do Consumidor

Parte II – Teoria do Consumidor e Procura

Capítulo 5. Comportamento do Consumidor


5.1 Preferências do consumidor
1.1 Curvas de indiferença
1.2 Utilidade cardinal versus utilidade ordinal
5.2 Restrição orçamental
5.3 Decisão optima do consumidor
5.4 Aplicações
1
Capítulo 5. Comportamento do Consumidor

Parte II – Teoria do Consumidor e Procura

Capítulo 5. Comportamento do Consumidor

O objetivo da teoria do consumidor é analisar o comportamento do consumidor e,


consequentemente, a procura individual e de mercado.

Procura-se avaliar o modo como os consumidores efetuam as suas escolhas entre os


bens que se encontram à sua disposição. Pretende-se, pois, avaliar de que forma as
preferências individuais ou a utilidade retirada do consumo dos bens explicam o
comportamento do consumidor e a procura individual e de mercado.

Admite-se que os consumidores são racionais e, portanto, procuram maximizar a


satisfação (a utilidade total) que retiram do consumo dos bens. Embora não
completamente realista, este pressuposto funciona como ponto de partida da análise
económica do comportamento do consumidor ou do consumo.

A teoria do consumidor tem três pilares fundamentais:


- preferências do consumidor
- restrição orçamental
- decisão ótima
2
5.1 Preferências do consumidor

5.1 Preferências do consumidor


As preferências do consumidor são definidas em relação a combinações ou cabazes de
bens. O símbolo f representa preferível, o símbolo ~ representa indiferente, e
combinações alternativas de bens designam-se por A, B, C, 1

A teoria do consumidor parte dos seguintes postulados relativos às preferências do


consumidor:
1) As preferências dos consumidores são completas.
- O consumidor é capaz de comparar e ordenar quaisquer dois cabazes de bens quanto
à preferência no consumo.
- Considere-se quaisquer dois cabazes de bens A e B. Admite-se que o consumidor é
capaz de dizer se A f B , se B f A , ou se A ~ B .
2) O consumidor é coerente nas suas escolhas, ou seja, as preferências são:
- Transitivas: se A f B e B f C ⇒ A f C
ou se A ~ D e A ~ E ⇒ D ~ E
- Anti-simétricas: não pode acontecer simultaneamente A f B e B f A
- Reflexivas: A ~ A e A não pode ser estritamente preferível a A
Quando as preferências satisfazem estas duas propriedades (1 e 2), diz-se que o
consumidor é racional.
3
5.1 Preferências do consumidor

3) Hipótese da monotonicidade: os consumidores preferem sempre mais a menos.


- A hipótese comportamental tomada para efeitos de análise da procura é que os
consumidores obtêm uma maior utilidade do consumo de uma maior quantidade de bens
ou serviços.
- Ou seja, admite-se que os consumidores nunca atingem o ponto de saciação (ou
saciedade) no consumo.
- É de notar que a análise do efeito dos males (‘bads’) sobre o bem estar dos
consumidores não é objeto de interesse neste momento. Por ex., poluição,
congestionamento de trânsito, etc.

4) As combinações de bens intermédias são preferidas às extremas.


- O consumidor valoriza mais um cabaz de bem e serviços relativamente mais
diverso/compósito a outro menos diverso.
- Ou seja, entre um cabaz composto por um só bem (por ex., 2 kg de maçãs) e outro
composto por vários bens (por ex., 1 kg de maçãs e 1 kg de laranjas), a hipótese é que o
consumidor prefere o cabaz/combinação com vários bens ao outro com um só bem.

4
5.1 Preferências do consumidor

Questão: Que se pode afirmar, quanto à relação de preferência, quando se compara uma
qualquer combinação na figura ao lado com a combinação A?
- Combinações de quantidades alternativas dos dois bens X e Y que são preferidas à
combinação A.
- Combinações face às quais A é preferida.

Pelo princípio da monotonicidade: Y

D B
B f A

A
A f C
C E

Quanto à relação entre A e E e entre A e D nada se pode afirmar sem informação


adicional.

Informação adicional é dada pelas curvas de indiferença.

5
5.1 Preferências do consumidor

5.1.1 Curvas de indiferença

As curvas de indiferença permitem representar graficamente as preferências de um


consumidor em relação a um conjunto de combinações de bens.

Vamos considerar, em geral, o caso de dois bens apenas, X e Y.

Uma combinação de dois bens significa: uma dada quantidade do bem X e uma dada
quantidade do bem Y.

Curva de indiferença: lugar geométrico das combinações de dois bens que proporcionam
ao consumidor uma dada utilidade total (i.e., uma utilidade total igual).

Assim, se as combinações A e B pertencem à mesma curva de indiferença, então A ~ B.

Mapa de indiferença: conjunto de todas as curvas de indiferença para um dado


consumidor.
Ou seja, descreve as preferências do consumidor em relação a todas as combinações
alternativas dos bens considerados; no caso agora considerado, os bens X e Y.
6
5.1 Preferências do consumidor

Propriedades das curvas de indiferença.


1. Descendentes da esquerda para a direita.
Se aumentarmos a quantidade de um bem (o que, por si, leva a um aumento da utilidade
total), mantendo constante a utilidade total, teremos que diminuir a quantidade do outro
bem (o que, por si, leva a uma diminuição da utilidade total).
Esta propriedade resulta da hipótese da monotonicidade das preferências. Se temos
dois bens, e consideramos que aumentamos a quantidade consumida de um deles,
então, para que a utilidade total permaneça constante, a quantidade consumida do outro
bem terá forçosamente de diminuir.
Y

2. Duas curvas não se intersetam.


Esta propriedade resulta da transitividade
das preferências.
A
Se A ~ B e A ~ C , então B ~ C .
B
CI1
Mas, se B e C pertencem a curvas
de indiferença diferentes, então C
CI2
há uma contradição formal.
X 7
5.1 Preferências do consumidor

3. Quanto mais afastada da origem está uma CI, maior é o grau de satisfação que
representa.
Uma curva de indiferença mais afastada da origem significa que o consumidor tem mais
de um ou dos dois bens. De acordo com o postulado da monotonicidade, o consumidor
prefere sempre mais a menos. Consequentemente, quanto mais o consumidor tem de,
pelo menos um dos bens, maior a sua utilidade total.

4. Convexas em relação à origem.


Esta propriedade resulta da hipótese da preferência relativa por cabazes de bens
compósitos/diversos. Ou seja, de admitirmos que o consumidor atribui preferência a um
cabaz composto de diversos bens em relação a outro composto de um só bem.
Como podemos ver no gráfico: à medida que Y
a quantidade consumida de Y diminui
e a quantidade de X aumenta,
menor é a quantidade de Y de que
o consumidor está disposto a prescindir
para obter uma unidade adicional de X,
sem alterar o seu nível de satisfação,
ou utilidade total.
X
8
5.1 Preferências do consumidor

A TMS de Y por X mede a quantidade de Y de que o consumidor está disposto a


prescindir para obter uma unidade adicional de X, sem alterar o seu nível de satisfação,
ou utilidade total.

Consideremos dois pontos sobre uma dada CI. Cada um desses pontos representa uma
combinação de bens X e Y. Assim, a TMS de Y por X quando calculada entre dois
pontos sobre uma curva de indiferença é a seguinte:
∆Y
TMS XY =
∆X
Com a distância entre as sucessivas combinações a tender para zero, vem:
dY
TMS XY =
dX
dY
A TMS XY = representa a inclinação, em valor absoluto, da curva de
dX indiferença nesse ponto.

9
5.1 Preferências do consumidor

De acordo com a propriedade da convexidade em relação à origem das curvas de


indiferença, a taxa marginal de substituição de Y por X, diminui à medida que se substitui
o bem Y pelo bem X.

A TMS diminui quando a quantidade de X aumenta e a quantidade de Y diminui, ao longo


de uma dada CI.
Ou seja, à medida que a quantidade consumida de Y diminui e a quantidade consumida
de X aumenta, menor é a quantidade de Y de que o consumidor está disposto a prescindir
para consumir uma unidade adicional de X, mantendo-se constante o seu nível de
satisfação, ou utilidade total

Dito de outro modo, a inclinação, em valor absoluto, diminui ao longo de uma curva de
indiferença convexa relativamente à origem, da esquerda para a direita.

Nota: O verbo substituir em português conjuga-se como ‘replace by’ e ao contrário do


inglês ‘substitute for’. Por exemplo:
- ‘to substitute X for Y’ traduz-se por ‘substituir Y por X’
- ‘to replace Y by X’ traduz-se por ‘substituir Y por X’.

10
5.1 Preferências do consumidor

A configuração das curvas de indiferença providencia informação sobre a relação


entre os bens de consumo.

(i) Bens substitutos perfeitos

O consumidor está disposto a trocar sempre um bem pelo outro na mesma razão,
independentemente da combinação de partida de que ele dispõe. Assim, qualquer que
seja o ponto da CI que se considere, a TMS de Y por X é constante.

Exemplo: Relativamente à utilidade obtida


no consumo dos bens, para um dado Y
consumidor, temos, por exemplo:
1 gr. manteiga = 2 gr. margarina
1 dl. de sumo de maçã = 1 dl. de sumo de laranja

Quando dois bens são perfeitamente substitutos


no consumo, a TMS é constante.
Neste caso, as CI do consumidor são linhas
retas. X

Nota: TMS constante não significa TMS unitária.

11
5.1 Preferências do consumidor

(ii) Bens complementares perfeitos

O aumento na quantidade consumida de um bem proporciona um aumento de satisfação


apenas se acompanhado por um aumento na quantidade consumida do outro bem.

Não há qualquer grau de substituibilidade entre os dois bens. O consumidor não está
disposto a abdicar de Y para ter mais de X (porque assim a utilidade total reduzir-se-ia).

Neste caso, ao longo de uma dada CI,


a TMS de Y por X tem dois segmentos distintos:
Y
Y
- TMS X nula :
no caso de combinações dos dois bens
no segmento horizontal da CI,

- TMS XY infinita :
no caso de combinações
no segmento vertical da CI.

X
12
5.1 Preferências do consumidor

(iii) Males (‘bads’)

Suponha-se que X é dinheiro e Y é o mal poluição. Se se aumentar a quantidade de


poluição a que o consumidor está sujeito, para que a utilidade deste permaneça igual,
este consumidor irá requerer uma certa quantidade de dinheiro. Neste caso, as CI têm
inclinação positiva.

Como consequência, neste caso, para um dado montante de dinheiro que se considere
(linha a tracejado), quanto maior a grandeza da poluição a que o consumidor está sujeito,
menor será a sua utilidade total.

.
13
5.1 Preferências do consumidor

(iv) Bens neutros

Suponha-se que o bem Y é um bem neutro.


A utilidade total do consumidor só depende da quantidade consumida do bem X.

X
.

14
5.1 Preferências do consumidor

Exemplo: Preferências quanto a características do bem ‘automóvel’: ‘espaço interior’ e


‘aceleração’ (Pyndick e Rubinfeld, pág. 75).
Admita duas curvas de indiferença, CI1 e CI2 , traduzindo as preferências de dois grupos
de consumidores quanto aos atributos: ‘espaço interior’ e ‘aceleração’.
- Os consumidores com preferências representadas pela CI2 estão dispostos a abdicar
de uma quantidade considerável de ‘espaço interior’, para ter mais ‘aceleração’. São
preferências relativamente enviesadas em favor de ‘aceleração’.
- No caso do outro grupo de consumidores, eles têm preferências relativamente
enviesadas em favor de ‘espaço interior’.

espaço espaço
interior interior

CI 1

. CI 2

aceleração aceleração
15
5.1 Preferências do consumidor

5.1.2 Utilidade cardinal versus utilidade ordinal


Abordagens da utilidade
a) Utilidade Cardinal: a utilidade como grandeza mensurável.

Quando o conceito de utilidade foi inicialmente introduzido na economia, representavam-


se as preferências do consumidor admitindo uma medida numérica da utilidade
proporcionada por um determinado bem, ou cabaz de bens.

Consideremos que essa unidade de medida é o util. E admitamos que a utilidade no


consumo do bem X é mensurável em unidades de utils.
Por ex.:
U (1 unid. X) = 4 utils Se assim é, quanto maior a quantidade
U (2 unids X) = 7 utils consumida do bem, maior é a medida da
U (3 unids X) = 9,5 utils satisfação do consumidor, expressa em
U (4 unids X) = 11,5 utils 1 unidades de utils.

Contudo: Pode ser muito difícil ao consumidor, senão mesmo impossível, atribuir uma
grandeza numérica (i.e., medir) à utilidade ou satisfação obtida no consumo de uma certa
quantidade de um bem, ou de um certo cabaz de bens. E, mesmo se se admitisse que a
utilidade seria mensurável pelo consumidor, essa medida não seria observável.

16
5.1 Preferências do consumidor

b) Utilidade Ordinal: a utilidade como grandeza ordenável mas não mensurável.

Considera-se, em alternativa, que a utilidade dos bens é atribuída de acordo com uma
classificação ou ordenação dessas utilidades. Suponha-se que o consumidor está
perante duas combinações alternativas de bens, em que cada uma dessas combinações
consiste em:
- uma certa quantidade do bem X mais uma certa quantidade do bem Y , ou
- um cabaz de bens, composto de certas quantidades de certos bens ( X, Y, Z, 1).
O que é importante para o consumidor saber, quando considera várias combinações
alternativas de bens no consumo, não é qual a medida da utilidade de cada uma dessas
combinações.
O que é importante para o consumidor, quando considera duas combinações alternativas
de bens, é qual a melhor combinação de bens no consumo, ou seja, é estabelecer entre
essas combinações alternativas de bens uma ordem de preferência.

Igualmente, o que nos interessa aqui para efeito de análise do comportamento do


consumidor é a ordenação de preferência das combinações ou cabazes de bens por
parte do consumidor e não o valor numérico das utilidades dessas combinações.

17
5.1 Preferências do consumidor

Função utilidade, utilidade total e utilidade marginal

Consideremos duas combinações. Sejam A e B duas combinações alternativas dos bens


X e Y. Cada uma dessas combinações inclui uma certa quantidade dos dois bens X e Y.

Função de utilidade, U(A), atribui um valor numérico à satisfação ou utilidade total obtida
no consumo de cada uma das combinações de bens, tal que:
A f B ⇔ U(A) > U(B)

A ~ B ⇔ U(A) = U(B).

Utilidade total: satisfação/utilidade retirada do consumo da combinação de bens A.

Exemplos: (i) U(A) ≡ U ( X , Y ) = XY


(ii) U(A) ≡ U(X,Y) = 3 X + 4Y

18
5.1 Preferências do consumidor

Utilidade marginal: é o acréscimo de satisfação/utilidade total resultante do consumo de


uma unidade adicional de um bem.
∆U ( X , Y ) ∆U ( X , Y )
UMg X = , UMg Y =
∆X ∆Y

À medida que se consome uma quantidade maior de um bem, a utilidade de cada unidade
adicional consumida desse bem diminui - Lei da Utilidade Marginal Decrescente.

Esta lei diz-nos que a utilidade marginal do consumo de um bem é decrescente.

Trata-se de uma regularidade comportamental, ou seja, aplica-se à maior parte das


situações de interesse no consumo.

Exemplo: U (X,Y) U Mg X

U ( X ,Y ) = XY

X 19
X
5.1 Preferências do consumidor

Consideremos uma dada CI. Então, ao longo desta CI, quanto mais se tem do bem X e
menos do bem Y, menor é a UMgX e maior a UMgY.

Questão: Qual a relação entre as grandezas da utilidade marginal dos dois bens X e Y,
ao longo de uma certa CI ? Vejamos:

∆U = ∆X UMg X + ∆Y UMgY

Ao longo de uma curva de indiferença, ∆U = 0 . Donde:

0 = ∆ X UMg X + ∆ Y UMg Y

∆Y UmgX
=
∆X UmgY

.
20
5.1 Preferências do consumidor

À medida que nos deslocamos ao longo de uma curva de indiferença, da esquerda para
a direita:
- a quantidade consumida do bem X aumenta e a do bem Y diminui,
- a UMgX diminui e a UMgY aumenta.

De acordo com a definição de TMS XY note-se que

dY UmgX
TMS XY = =
dX UmgY

Assim, conclui-se que:

a TMS Y pode ser interpretada como um rácio de utilidades marginais de dois bens, à
X
medida que o consumidor escolhe combinações alternativas ao longo de uma dada curva
de indiferença.
Y
a TMS X diminui à medida que nos deslocamos ao longo de uma dada curva de
indiferença, da esquerda para a direita, como já tínhamos concluído anteriormente.

21
5.2 Restrição orçamental

5.2 Restrição orçamental

Ao escolher entre dois bens X e Y, o consumidor enfrenta uma restrição.


Esta restrição que o consumidor enfrenta é colocada por dois elementos:
- R : o rendimento disponível desse consumidor para gastar nos dois bens,
- PX e PY , o preço de mercado dos bens X e Y.
Considera-se que o consumidor tem esta informação.

Nota: Estes elementos são aqui considerados como informação que este consumidor
obtém do mercado; como vimos no capítulo 2, é na articulação entre os vários mercados
descentralizados que se vai produzir um sistema de preços; e é também através da
participação do consumidor nos mercados que se vai gerar o valor do seu rendimento.

R ≥ PX X + PY Y R/PY

Despesa total: PX X + PY Y
PX X: despesa no bem X
PY Y: despesa no bem Y
X
R/Px
Conjunto das possibilidades de consumo, dados Px , Py e R 22
5.2 Restrição orçamental

R ≥ PX X + PY Y ⇔ Y ≤
R − PX X
PY PY
Traduz a quantidade máxima de Y que é possível consumir para cada quantidade
consumida do bem X, dados: - o rendimento do consumidor: R
- o preço relativo dos dois bens X e Y : PX / PY .

Admite-se que todo o rendimento é utilizado no consumo dos dois bens considerados.
Pela propriedade da monotonicidade, o consumidor racional vai usar o rendimento todo na
aquisição de bens. Explicação: Esta análise é estática e considera somente o período
atual. Estamos a construir instrumentos analíticos e para isso fazem-se simplificações. O
estudo de decisões de aplicação de recursos entre hoje e datas futuras será realizado
noutras disciplinas.
Vamos então considerar a restrição orçamental do consumidor, para efeito da sua tomada
de decisão de consumo atual. Supondo, então, que todo o rendimento é utilizado no
consumo de bens, admitimos também que, na sua escolha de consumo, o consumidor
não desperdiça os bens adquiridos, ou seja, utiliza-os no consumo.

Vamos então representar a restrição orçamental, considerando que todo o rendimento é


gasto no consumo dos dois bens:
R = PX X + P Y Y é a reta orçamental do consumidor na aquisição dos bens X e Y.
23
5.2 Restrição orçamental

R PX
R = PX X + PY Y Y = − X
PY PY
A reta orçamental é o lugar geométrico das combinações dos dois bens que igualam a
despesa total ao rendimento do consumidor, dados os preços de mercado dos bens.
dY PX
O valor absoluto do declive é: =
dX PY
Na expressão analítica da reta orçamental, temos que o valor absoluto do declive tem o
significado de preço relativo do bem X em termos do bem Y.
Y

R/PY

.
R/Px 24
X
5.2 Restrição orçamental

Deste modo, a expressão:

dY PX
= = preço relativo do bem X expresso em termos do bemY
dX PY
Esta expressão representa a razão de troca em termos de quantidades, em concreto, a
quantidade do bem Y que o consumidor tem de dar na troca no mercado para adquirir
uma unidade adicional do bem X, mantendo-se constante a despesa total gasta nos
dois bens.

dY PX
Dito de outro modo, = representa o custo de oportunidade marginal
dX PY do bem X expresso em unidades do bem Y.

Nota: Dado que consideramos, no modelo de concorrência perfeita, que o consumidor


toma os preços de mercado como uma variável fora do seu controlo, tomamos este
custo de oportunidade marginal como dado.

25
5.2 Restrição orçamental

Aplicação: Suponha-se os seguintes dados, para um consumidor:

R = 80 u.m. PX = 1 u.m. PY = 2 u.m.

R = PX X + PY Y ⇔ 80 = X + 2 Y ⇔ Y = 40 − 0,5 X

A razão de troca no mercado, expressa em termos de quantidades do bem X e do bem Y,


e em módulo, é a seguinte:

│ dY │ = PX
dX PY

ou seja: │ − 0,5 │ = 1u .m .
2 u .m .
Para obter uma unidade adicional de X, o consumidor tem que dar na troca o equivalente
a 0,5 unidades de Y, mantendo constante a despesa total.
Ou seja, o custo de oportunidade de obter uma unidade adicional de X é igual a 0,5
unidades de Y.
Porquê? Uma unidade de X custa 1 u.m. e uma unidade de Y custa 2 u.m.
26
5.2 Restrição orçamental

A restrição orçamental depende do rendimento e dos preços dos dois bens. Se algum ou
alguns destes fatores se alterar, de que forma isso afeta a restrição orçamental?

(i) Variação no rendimento


A reta orçamental desloca-se paralelamente.
Se o rendimento aumentar, trata-se de um alargamento do conjunto das possibilidades de
consumo. A reta orçamental desloca-se para a direita (esquerda) quando o rendimento
aumenta (diminui). A variação no rendimento corresponde a uma variação no poder de
compra ou rendimento real do consumidor.
Contudo, a inclinação da reta orçamental não se altera porque os preços não se
alteraram.

(ii) Variação no preço monetário do bem X


A quantidade máxima do bem X que o consumidor pode adquirir altera-se. Esta
quantidade aumenta se o preço do bem diminui, e vice-versa.
A reta orçamental sofre uma rotação apoiada no eixo do bem Y, porque no caso de o
consumidor apenas consumir Y, o máximo que pode consumir de Y não é afetado por
alterações no preço monetário do bem X. O custo de oportunidade de X em termos de Y
diminui (aumenta) se o preço do bem X diminui (aumenta).
Note-se que quando o preço de um bem diminui (aumenta), o conjunto de possibilidades
de consumo expande-se (ou diminui), porque o poder de compra aumenta (diminui).

27
5.2 Restrição orçamental

(iii) Casos particulares:

# Px ’ = t Px
Py ’ = t Py t>0.
No caso de os preços monetários dos dois bens se alterarem na mesma proporção, a reta
orçamental sofre uma deslocação paralela:
- para a direita se se tratar de uma diminuição (aumento do poder de compra do
consumidor),
- para a esquerda se se tratar de um aumento (diminuição do poder de compra do
consumidor).

# Px ’ = t Px
Py ’ = t Py
R’ =tR t>0.
No caso de, quer os preços monetários dos dois bens, quer o rendimento monetário se
alterarem na mesma proporção, a reta orçamental não se altera.
Ou seja, o poder de compra do consumidor não se altera neste caso, quer na aquisição do
bem X, quer na aquisição do bem Y, quer na aquisição de qualquer combinação sobre a
reta orçamental.

28
5.3 Decisão ótima do consumidor

5.3 Decisão ótima do consumidor.

Para o consumidor racional, o objetivo consiste em maximizar a sua utilidade total,


dados:
- as suas preferências por bens,
- o seu rendimento e
- os preços de mercado dos bens que considera consumir.

Em termos algébricos, o problema é o seguinte:

Max U (X,Y) s. a. R = Px X + Py Y
(X,Y)

A combinação ótima deve satisfazer duas condições:


- deve pertencer à reta de restrição orçamental porque um consumidor racional não
desperdiça rendimento;
- deve corresponder ao ponto de tangência entre a reta de restrição orçamental e a
curva de indiferença mais afastada da origem de modo a maximizar a utilidade total.

. 29
5.3 Decisão ótima do consumidor

A solução encontra-se deste modo:


Y

TMS XY
PX
= B
PY
R PX
Y = − X A
PY PY D

C
O problema é representado
na Figura ao lado:
X
Geometricamente, observa-se que a combinação de bens (X,Y), representada no ponto A,
é o ótimo do consumidor, dados as preferências do consumidor, o rendimento do
consumidor e o preço relativo dos bens no mercado.

Em termos analíticos, no ótimo do consumidor observa-se a seguinte condição:

TMS XY =
P X

PY
30
5.3 Decisão ótima do consumidor

Em resumo:
Vimos que, por definição de curva de indiferença, ao longo de uma curva de indiferença
∆U = 0. Donde resulta:
dY UmgX
TMS XY = | | =
dX UmgY
dY PX
Vimos que, sobre a restrição orçamental, temos por definição que: | | =
dX PY
Vimos ainda que, no ótimo do consumidor, se verifica a seguinte condição:

Y PX
TMS X =
PY
Conclui-se então que, no ótimo do consumidor, se observa a seguinte equivalência:

UmgX PX UmgX UmgY


= ⇔ =
UmgY PY PX PY
Ou seja, a escolha da combinação ótima de bens no consumo será tal que a utilidade
marginal de um euro gasto no bem X é igual à utilidade marginal de um euro gasto no
bem Y.
31
5.3 Decisão ótima do consumidor

Escolha ótima do consumidor:

Dado que a utilidade marginal de cada bem é decrescente,


e dados o rendimento e os preços dos bens,
para maximizar a utilidade total,
o consumidor racional deve consumir certas quantidades dos vários bens tal que
o acréscimo de utilidade total proporcionado pela última unidade de rendimento
gasto em cada um desses bens seja igual para todos os bens.

Nota: No caso de indivisibilidade de um ou mais bens, é possível que esta regra não
possa ser aplicada na igualdade; neste caso, a regra deverá ser aproximada, tanto quanto
possível.

32
5.3 Decisão ótima do consumidor

Questão: Relativamente aos pontos B, C, e D, explique por que é que o consumidor não
está a otimizar a utilidade no consumo.

PX
No ponto B, temos: TMS YX (B) >
PY
Neste ponto, a satisfação proporcionada pela última u.m. gasta em X é superior à
satisfação proporcionada pela última u.m. gasta no bem Y.
Um consumidor racional deve escolher uma combinação de bens com uma quantidade
maior de X e uma quantidade menor de Y.

Y
PX
No ponto C, temos: TMS (C) <
X PY
Neste ponto, a satisfação proporcionada pela última u.m. gasta em X é inferior à
satisfação proporcionada pela última u.m. gasta no bem Y.
Um consumidor racional deve escolher uma combinação de bens com uma quantidade
maior de Y e uma quantidade menor de X.

O ponto D é inatingível, dados o rendimento do consumidor e os preços dos dois bens.

33
5.3 Decisão ótima do consumidor

Soluções de canto:

Em determinadas situações, dependendo das preferências do consumidor, a solução


ótima pode não ser uma solução interior (i.e., X>0 e Y>0) mas sim uma solução de canto,
isto é, uma solução ótima em que apenas um dos bens é consumido.
Y
Nestes casos, em geral, não se verifica a igualdade entre a TMS X e o preço relativo
do bem X. Ainda assim, é a combinação que permite maximizar a satisfação, dados as
preferências e o rendimento do consumidor e os preços de ambos os bens.

Y Y

X X 34
5.3 Decisão ótima do consumidor

Considere-se a combinação representada no ponto A:

PX
TMS Y
X
<
PY
Se o consumidor pudesse aumentar o seu nível de satisfação total no consumo dos dois
bens ao prescindir de certa quantidade do bem X para ter mais do bem Y, fá-lo-ia.
Contudo, partindo do ponto A, o consumidor não tem possibilidade de aumentar o seu
nível de utilidade, dada a restrição orçamental.

Por outro lado, partindo do ponto A, não é possível diminuir mais a quantidade de X.

Mas, em caso de uma diminuição substancial do preço de mercado de X, o consumidor


decidiria consumir um cabaz composto pelos dois bens.

35
5.4 Aplicações

Exercício 1.
Suponha que a função utilidade de um consumidor é dada por: U ( X ,Y ) = XY
Suponha que o rendimento do consumidor é igual a 10 u.m. e que os preços dos bens X
e Y são os seguintes: PX = 0,5 u.m.
PY = 1 u.m..

1.1 Calcule a expressão analítica da restrição orçamental. Qual o significado económico da


inclinação da reta orçamental?

1.2 Defina conjunto de possibilidades de consumo e represente-o graficamente.

1.3 Defina curva de indiferença e represente graficamente as curvas correspondentes aos


seguintes níveis de utilidade: U = 18
U = 32
U = 50

1.4 Calcule a escolha de combinação de bens ótima do consumidor e represente-a


graficamente.

1.5 O que distingue esta combinação ótima de outras combinações possíveis?

36
5.4 Aplicações

Resolução:
Suponha que a função utilidade de um consumidor é dada por: U ( X , Y ) = XY .
Suponha que o rendimento do consumidor é igual a 10 u.m. e que os preços dos bens X e Y são
os seguintes: PX = 0,5 u.m. e PY = 1 u.m..

1.1 Calcule a expressão analítica da restrição orçamental. Qual o significado económico da


inclinação da reta orçamental?

R = PX X + PY Y ⇔ 10 = 0,5 X + Y ⇔ Y = 10 − 0,5 X

| −
P X | = 0,5
PY
Preço relativo do bem X: número de unidades do bem Y que o consumidor terá que
renunciar, para adquirir 1 unidade adicional do bem X, mantendo-se a despesa total
constante.

1.2 Defina conjunto de possibilidades de consumo e represente-o graficamente.


O conjunto de possibilidades de consumo corresponde ao conjunto de combinações de
bens (X,Y) ao alcance do consumidor, dados o rendimento do consumidor e os preços de
mercado dos dois bens. São as combinações de bens que se traduzem numa despesa
menor ou igual ao rendimento do consumidor.
37
5.4 Aplicações

U = 18
1.3 Defina curva de indiferença e represente graficamente
U = 32
as curvas correspondentes aos seguintes níveis de utilidade:
U = 50

Curva de indiferença é o conjunto das combinações (X,Y) que proporcionam ao


consumidor o mesmo nível de utilidade total.
18 = XY ⇔ 18 = X .Y ⇔ Y = 18 / X (6 ; 3) (3 ; 6)
32 = XY ⇔ 32 = X .Y ⇔ Y = 32 / X (8 ; 4) (4 ; 8)
50 = XY ⇔ 50 = X .Y ⇔ Y = 50 / X (10 ; 5) (5 ; 10)

1.4 Calcule a escolha de combinação de bens ótima do consumidor e represente-a graficamente.

Partindo das condições de otimização:

PX
TMS XY = P Y Y / X = 0,5 X = 10

R PX
Y = − X Y = 10 – 0,5 X Y = 5
PY PY

38
5.4 Aplicações

1.5 O que distingue esta combinação ótima no consumo de outras combinações possíveis?

É a única combinação pertencente ao conjunto de possibilidades de consumo que


maximiza a satisfação, dados:
- as preferências do consumidor,
- o rendimento do consumidor, e
- os preços dos bens no mercado.

10

7.5

2.5 U = 50
U = 32
U = 18
0
0 5 10 15 20
. x

39
5.4 Aplicações

Exercício 2:
Um consumidor gosta de café (C) e chá (T).
A sua função utilidade é dada por: U(C,T) = 3C + 4T
Suponha que os preços do café e do chá são iguais a 3 u.m. e o rendimento de que o
consumidor dispõe para gastar nestes dois bens é igual a 12 u.m..

T
2.1 Calcule a taxa marginal de substituição de chá por café, TMS C ? Interprete o valor obtido.
De acordo com estes dados, como classifica estes bens?

2.2 Represente graficamente as curvas de indiferença correspondentes aos seguintes níveis


de utilidade: U = 12, U = 16, U = 18 .

2.3 Represente graficamente o conjunto de possibilidades de consumo destes dois bens.

2.4 Identifique graficamente a combinação ótima de café e chá para este consumidor

2.5 Suponha que o preço do café diminui para 2 u.m. Qual é agora a combinação ótima de
café e chá para este consumidor?

40
5.4 Aplicações

Resolução:

Um consumidor gosta de café (C) e chá (T).


A sua função utilidade é dada por: U(C,T) = 3C + 4T .
Suponha que os preços do café e do chá são iguais a 3 u.m. e o rendimento de que o
consumidor dispõe para gastar nestes dois bens é igual a 12 u.m..

2.1 Calcule a taxa marginal de substituição de chá por café e interprete o valor obtido. De acordo
com estes dados, como classifica estes bens?
T
Tomando por base a seguinte expressão, podemos calcular a TMS C

TMS CT = UMgC = 0,75


UMgT
Café e chá são bens substitutos perfeitos.

O consumidor está disposto a prescindir de 0,75 unidades de chá para consumir uma
unidade adicional de café, mantendo-se o nível de utilidade total constante.

41
5.4 Aplicações

2.2 Represente graficamente as curvas de indiferença correspondentes aos seguintes níveis de


utilidade:
U = 12, U = 16, U = 18 .

12 − 3C
U (C,T) = 12 ⇔ 12 = 3 C + 4 T ⇔ T=
4
16 − 3C
U (C,T) = 16 ⇔ 16 = 3 C + 4 T ⇔ T= 4
18 − 3 C
U (C,T) = 18 ⇔ 18 = 3 C + 4 T ⇔ T=
4

42
5.4 Aplicações

2.3 Represente graficamente o conjunto de possibilidades de consumo destes dois bens.


12 − 3C
R ≥ C PC + T PT ⇔ 12 ≥ 3C+3T ⇔ T ≤
3
ou seja : T ≤ 4−C

2.4 Identifique graficamente a combinação ótima de café e chá para este consumidor.

C=0 e T =4

2.5 Suponha que o preço do café diminui para 2 u.m. Qual a combinação ótima de café e chá para
este consumidor?
12 − 2C 2
R = C PC’ + T PT ⇔ 12 = 2C + 3T ⇔ T= = 4− C
3 3
Conforme se pode observar graficamente, a combinação óptima é a seguinte:

C=6 e T=0

43

Você também pode gostar