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Os Lusíadas
Cantos I e II
Professora Carla Souto
Introdução
A obra Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões, é um poema épico
nos moldes clássicos, publicado em 1572. Seus dez cantos foram
todos escritos em oitavas (estrofes de 8 versos) com versos
decassílabos heroicos. Seu esquema de rimas para cada estrofe é
ABABABCC.
A narrativa, dedicada ao rei D. Sebastião e mais amplamente a
todo o povo português, conta a história da conquista da Índia pelo
herói Vasco da Gama, que representa os seus compatriotas que se
dedicaram às navegações e conquistas ultramarinas para dilatar a Fé
e o Império.
A narrativa inicia em media res, ou seja, no meio da história (como
ocorre na Odisseia ou na Eneida) e tem um narrador-poeta que passa
a palavra a múltiplos narradores.
Alvará Régio da Edição de 1572
Eu el Rey faço saber aos que este Aluara virem que eu ey por bem & me praz dar
licença a Luis de Camões pera que possa fazer imprimir nesta cidade de Lisboa,
hűa obra em Octaua rima chamada Os Lusiadas, que contem dez cantos perfeitos,
na qual por ordem poetica em versos se declarão os principaes feitos dos
Portugueses nas partes da India depois que se descobrio a nauegação pera ellas
por mãdado del Rey dom Manoel meu visauo que sancta gloria aja, & isto com
priuilégio pera que em tempo de dez anos que se começarão do dia que se a dita
obra acabar de empremir, em diãte, se não possa imprimir nẽ vender em meus
reinos & senhorios nem trazer a elles de fora, nem leuar aas ditas partes da India
pera se vender sem licẽça do dito Luis de Camões ou da pessoa que pera isso seu
poder tiuer sob pena de quẽ o contrario fizer pagar cinquoenta cruzados & perder
os volumes que imprimir, ou vender, a metade pera o dito Luis de Camões, & a
outra metade para quem os acusar.
Alvará Régio da Edição de 1572
E antes de se a dita obra vender lhe sera posto o preço na mesa do despacho dos
meus Desembargadores do paço, o qual se declarará & porá impresso na primeira
folha da dita obra pera ser a todos notorio, & antes de se imprimir sera vista
examinada na mesa do conselho geral do santo officio da Inquisição pera cő sua
licença se auer de imprimir, & se o dito Luis de Camões tiuer acrecentados mais
algűs Cantos, tambem se imprimirão auendo pera isso licença do santo officio,
como acima he dito. E este meu Aluara se imprimirá outrosi no principio da dita
obra, o qual ey por bem que valha & tenha força & vigor, como se fosse carta feita
em meu nome, por mim assinada & passada por minha Chancellaria em embargo
da Ordenação do segundo liuro, tit. xx. que diz que as cousas cujo effeito ouuer de
durar mais que hum ano passem per cartas, & passando por aluaras não valhão.
Gaspar de Seixas o fiz em Lisboa a XXIIII de Setembro de MDLXXI. Iorge de
Costa o fiz escrever.
Parecer do censor do Santo Ofício na edição de 1572
Vi por mandado da santa & geral inquisição estes dez Cantos dos Lusiadas de
Luis de Camões, dos valerosos feitos em armas que os Portugueses fizerão
em Asia & Europa, e não achey nelles cousa algűa escandalosa nem contrária
â fe & bõs custumes, somente me pareceo que era necessario aduertir os
Lectores que o Autor pera encarecer a difficuldade da nauegação & entrada
dos Portugueses na India, usa de hűa fição dos Deoses dos Gentios. E ainda
que sancto Augustinho nas sas Retractações se retracte de ter chamado nos
liuros que compos de Ordine, aas Musas Deosas. Toda via como isto he
Poesia & fingimento, & o Autor como poeta, não pretende mais que ornar o
estilo Poetico não tiuemos por inconueniente yr esta fabula dos Deoses na
obra, conhecendoa por tal, & ficando sempre salua a verdade de nossa sancta
fe, que todos os Deoses dos Gentios sam Demonios. E por isso me pareceo o
liuro digno de se imprimir, & o Autor mostra nelle muito engenho & muita
erudição nas sciencias humanas. Em fe do qual assiney aqui.
Viagem de Vasco da Gama
Canto I
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i ó Profecia Armada tentativas Intervenção
ã ç do Olimpo do Índico Moçambique luar 56- régulo 59- (inspirado Baco Meditação
ç r de Júpiter da costa do Mouro de Vênus
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Preto - fatos reais, históricos, narrados diretamente pelo poeta e excursos pessoais; Verde – fatos míticos;
Azul – fatos históricos narrados pelo Gama; Vermelho – fatos proféticos.
Canto I – Proposição 1 a 3
As armas e os barões assinalados Se vão da lei da Morte libertando,
Que da Ocidental praia Lusitana Cantando espalharei por toda parte,
Por mares nunca dantes navegados Se a tanto me ajudar o engenho e arte.
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados Cessem do sábio Grego e do Troiano
Mais do que prometia a força humana, As navegações grandes que fizeram;
E entre gente remota edificaram Cale-se de Alexandro e de Trajano
Novo Reino, que tanto sublimaram; A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
E também as memórias gloriosas A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Daqueles Reis que foram dilatando Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
A Fé, o Império, e as terras viciosas Que outro valor mais alto se alevanta.
De África e de Ásia andaram devastando,
E aqueles que por obras valerosas
Eneida - proposição
Eu, que entoava na delgada avena
Rudes canções, e egresso das florestas,
Fiz que as vizinhas lavras contentassem
A avidez do colono, empresa grata
5 Aos aldeãos; de Marte ora as horríveis
Ouvi, que não vereis com vãs façanhas, Pois se a troco de Carlos, Rei de França,
Fantásticas, fingidas, mentirosas, Ou de César, quereis igual memória,
Louvar os vossos, como nas estranhas Vede o primeiro Afonso, cuja lança
Musas, de engrandecer-se desejosas: Escura faz qualquer estranha glória;
As verdadeiras vossas são tamanhas E aquele que a seu Reino a segurança
Que excedem as sonhadas, fabulosas, Deixou, com a grande e próspera vitória;
Que excedem Rodamonte e o vão Rugeiro Outro Joane, invicto cavaleiro;
E Orlando, inda que fora verdadeiro. O quarto e quinto Afonsos e o terceiro.
Canto I – Dedicatória 14 a 16
Nem deixarão meus versos esquecidos (Que polo mundo todo faça espanto)
Aqueles que nos Reinos lá da Aurora De exércitos e feitos singulares,
Se fizeram por armas tão subidos, De África as terras e do Oriente os mares.
Vossa bandeira sempre vencedora:
Um Pacheco fortíssimo e os temidos Em vós os olhos tem o Mouro frio,
Almeidas, por quem sempre o Tejo chora, Em quem vê seu exício afigurado;
Albuquerque terríbil, Castro forte, Só com vos ver, o bárbaro Gentio
E outros em quem poder não teve a morte. Mostra o pescoço ao jugo já inclinado;
Tétis todo o cerúleo senhorio
E, enquanto eu estes canto - e a vós não posso, Tem pera vós por dote aparelhado,
Sublime Rei, que não me atrevo a tanto - , Que, afeiçoada ao gesto belo e tento,
Tomai as rédeas vós do Reino vosso: Deseja de comprar-vos pera genro.
Dareis matéria a nunca ouvido canto.
Comecem a sentir o peso grosso
Canto I – Dedicatória 15 a 18
Em vós os olhos tem o Mouro frio, Em vós esperam ver-se renovada
Em quem vê seu exício afigurado; Sua memória e obras valerosas;
Só com vos ver, o bárbaro Gentio E lá vos têm lugar, no fim da idade,
Mostra o pescoço ao jugo já inclinado; No templo da suprema Eternidade.
Tétis todo o cerúleo senhorio
Tem pera vós por dote aparelhado, Mas, enquanto este tempo passa lento
Que, afeiçoada ao gesto belo e tento, De regerdes os povos, que o desejam,
Deseja de comprar-vos pera genro. Dai vós favor ao novo atrevimento,
Pera que estes meus versos vossos sejam,
Em vós se vêm, da Olímpica morada, E vereis ir cortando o salso argento
Dos dous avós as almas cá famosas; Os vossos Argonautas, por que vejam
üa, na paz angélica dourada, Que são vistos de vós no mar irado,
Outra, pelas batalhas sanguinosas. E costumai-vos já a ser invocado.
Canto I – Início da Narração -
Já no largo Oceano navegavam,
As inquietas ondas apartando;
Os ventos brandamente respiravam,
Das naus as velas côncavas inchando;
Da branca escuma os mares se mostravam
Cobertos, onde as proas vão cortando
As marítimas águas consagradas,
Que do gado de Próteu são cortadas,
Eneida - Narração
De Sicília amarando, mal velejam
Ledos e o cobre rompe a salsa espuma,
Juno, dentro guardada eterna chaga:
Canto I – profecias de Júpiter- 24 a 26
- «Eternos moradores do luzente, Pois contra o Castelhano ao temido Sempre
Estelífero Pólo e claro Assento: alcançou favor do Céu sereno:
Se do grande valor da forte gente Assi que sempre, enfim, com fama e glória.
De Luso não perdeis o pensamento, Teve os troféus pendentes da vitória.
Deveis de ter sabido claramente
Como é dos Fados grandes certo intento «Deixo, Deuses, atrás a fama antiga,
Que por ela se esqueçam os humanos Que co a gente de Rómulo alcançaram,
De Assírios, Persas, Gregos e Romanos. Quando com Viriato, na inimiga
Guerra Romana, tanto se afamaram;
«Já lhe foi (bem o vistes) concedido, Também deixo a memória que os obriga
Cum poder tão singelo e ao pequeno, A grande nome, quando alevantaram
Tomar ao Mouro forte e guarnecido Um por seu capitão, que, peregrino,
Toda a terra que rega o Tejo ameno. Fingiu na cerva espírito divino.
Canto I – profecias de Júpiter- 27 a 29
«Agora vedes bem que, cometendo A gente vem perdida e trabalhada;
O duvidoso mar num lenho leve, Já parece bem feito que lhe seja
Por vias nunca usadas, não temendo Mostrada a nova terra que deseja.
de Áfrico e Noto a força, a mais s'atreve:
Que, havendo tanto já que as partes vendo «E porque, como vistes, têm passados
Onde o dia é comprido e onde breve, Na viagem tão ásperos perigos,
Inclinam seu propósito e perfia Tantos climas e céus exprimentados,
A ver os berços onde nasce o dia. Tanto furor de ventos inimigos,
Que sejam, determino, agasalhados
«Prometido lhe está do Fado eterno, Nesta costa Africana como amigos;
Cuja alta lei não pode ser quebrada, E, tendo guarnecida a lassa frota,
Que tenham longos tempos o governo Tornarão a seguir sua longa rota.
Do mar que vê do Sol a roxa entrada.
Nas águas têm passado o duro Inverno;
Excursos Canto I
Preto - fatos reais, históricos, narrados diretamente pelo poeta e excursos pessoais; Verde – fatos míticos;
Azul – fatos históricos narrados pelo Gama; Vermelho – fatos proféticos.
Canto II – Vênus interfere 18-19
As âncoras tenaces vão levando Das águas o poder lhe obedecia.
Com a náutica grita costumada; E propondo-lhe a causa a que desceu,
Da proa as velas sós ao vento dando Com todas juntamente se partia,
Inclinam para a barra abalizada. Para estorvar que a armada não chegasse
Mas a linda Ericina, que guardando
Andava sempre a gente assinalada,
Vendo a cilada grande, e tão secreta,
Voa do Céu ao mar como uma seta.
Guerras tem de mover e amansar povos, Da nutriz loba em fulva pele ovante,
E instituir cidades e costumes, Rômulo há de erigir mavórcios muros,
280 Ao passo que reinando o vir no Lácio E à recebida gente impor seu nome.
Terceiro estio, e os Rútulos domados,
Forem-se três invernos. Posto ao leme
Ascânio, que hoje Iulo cognominam
(Ilo, enquanto florente Ílion se teve),
Canto II – Pedido do rei de Melinde a Vasco
da Gama - 109
"Mas antes, valeroso Capitão,
Nos conta, lhe dizia, diligente,
Da terra tua o clima, e região
Do mundo onde morais distintamente;
E assim de vossa antiga geração,
E o princípio do Reino tão potente,
Co'os sucessos das guerras do começo,
Que, sem sabê-las, sei que são de preço.
Eneida – Dido pede a Enéas que conte a sua
história
A infeliz Dido, e longo o amor bebia,
Muito de Príamo, inquirindo muito
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