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CASO 1) Há várias formas que um remédio e fármaco de via oral pode se apresentar,
isto é, desde cápsulas duras, cápsulas gelatinosas, comprimidos, drágeas etc. No caso 1,
nota-se que o antidepressivo descrito vinha em formato de uma cápsula, uma vez que é
explicito que a mulher a “abriu”. É importante ressaltar que essa variação de formatos
que os remédios apresentam se deve principalmente à forma como estes serão
desintegrados e absorvidos no sistema digestivo para seguir caminho para o plasma
sanguíneo e, posteriormente, para órgãos responsáveis pelo metabolismo e excreção.
Assim, a diversidade de formatos causa uma desintegração, absorção e distribuição em
ritmos, eficiência e velocidade diferentes. Logo, é provável que a diferença de
miligramas do antidepressivo entre a mulher (150mg) e sua amiga (50mg) se devia ao
fato dos remédios de cada uma vir em formatos diferentes, o que poderia justificar a
divergência das quantidades, mesmo que o efeito terapêutico buscado fosse o mesmo.
Além disso, a indicação de dosagem do fármaco é particular e própria para cada
paciente, uma vez que envolve diversos aspectos, como a idade, massa corpórea,
gênero, entre outros. Dessa forma, ao se basear na dosagem administrada por sua amiga
para alterar a sua própria, a paciente desconsidera essas especificidades
(farmacocinéticas) e provoca uma alteração significativa na relação dose-efeito do
fármaco. Acrescenta-se a isso o fato de que a concentração das drogas no plasma
apresenta um gradiente de efeito, o que explica a possibilidade de que a redução da
dosagem fez com que essa concentração não atingisse a faixa terapêutica, sendo apenas
subterapêutica e, portanto, ineficiente, podendo acarretar em efeitos colaterais e/ou
ausência de efeitos ao invés dos terapêuticos desejados. Devido a essa série de
questões, a mulher não precisava se preocupar com a “diferença de quantidades” entre
os remédios, uma vez que provavelmente eles se referiam a processos de eficiência e a
condições diferentes.
Com isso em mente, é possível sugerir que o fato da mulher abrir a cápsula do
seu antidepressivo, somado com o fato de ela ter tomado apenas metade da dose,
tornou a absorção deste remédio ineficiente com relação ao esperado. As formas sólidas
de administração oral são particularmente pensadas para serem absorvidas e
metabolizadas nos locais apropriados do organismo de acordo com suas variações e
especificidades (por exemplo, pH). A cápsula, por exemplo, exige sua desintegração
antes que se inicie a absorção e distribuição, o que permite que esse fármaco seja
absorvido no local apropriado. Ao quebrar a cápsula, perdeu-se essas características de
liberação do fármaco, alterando o local de absorção e, portanto, o efeito produzido. O
seu remédio veio justamente nesta quantidade e neste formato, pois esperava-se que
ele fosse desintegrado no estômago e absorvido em etapas pelo seu estômago e
intestino, como se espera de uma cápsula. Como a mulher consumiu-o já desintegrado
e em uma quantidade menor que o solicitado, o remédio provavelmente foi absorvido,
distribuído e metabolizado em uma taxa mais acelerada e, portanto, excretado e
eliminado pelo organismo em uma velocidade muito mais rápida do que devia e se
esperava, fazendo com que os seus efeitos fossem improdutivos ou apenas
parcialmente eficientes, levando a um quadro de não melhora da paciente.
É digno mencionar também que o tratamento antidepressivo envolve,
inicialmente, a fase aguda, em que a paciente se encontra. Essa fase visa à remissão dos
sintomas, buscando a recuperação dos níveis normais de funcionamento e de bem-estar
da paciente. É também na fase aguda que a psiquiatra avalia a efetividade do tratamento
e o redireciona conforme os efeitos observados em contraste com os desejados. A
condução dessa primeira fase do tratamento envolve, claramente, a expectativa de que
a dosagem indicada pelo profissional de saúde seja respeitada. Ao alterar essa dosagem,
a paciente, portanto, inviabiliza a avaliação médica do tratamento já que compromete
as contingências iniciais.
Por último, é importante lembrar que hipóteses relativas à eficiência metabólica
da paciente como causas do não funcionamento do antidepressivo não devem ser
levadas em conta, uma vez que é explicito que os seus exames laboratoriais indicaram
resultados normais.
Com isso em mente, o caso da paciente pode ser melhor analisado. Seu
antidepressivo vem em um formato de cápsula, ou seja, espera-se que a droga seja
absorvida parte no estômago, onde sofre sua desintegração, e parte no intestino. Logo,
se a eficiência da absorção está intimamente ligada com o pH da droga, esta não poderia
ter um caráter muito ácido, uma vez que boa parte dela provavelmente seria ainda
absorvida no intestino, onde o pH é básico. Assim, espera-se, como hipótese, que a
droga tenha um caráter básico. Como a paciente não encontra tempo para seu almoço,
seu café da manhã é visivelmente reforçado. Esta ingestão significativa de comida pela
manhã, composta de uma fonte de principalmente proteínas e carboidratos, ao chegar
no estômago faz com que suas glândulas produzam uma quantidade grande de suco
gástrico, que possui um pH ácido para tornar eficiente a digestão dos alimentos
proteicos e dos carboidratos. Uma vez que a droga entra em contato com o estômago
em um momento em que há uma quantidade significativa de suco gástrico (pois ocorre
logo após a ingestão de alimentos ricos em carboidratos e proteínas), a cápsula
provavelmente é desintegrada num ritmo acelerado demais, fazendo com que a droga
sofra o processo de ionização no estômago, tornando o processo de absorção
ineficiente.
Além da primeira hipótese, é possível que, na situação especificada, a
alimentação em quantidade exagerada antes da tomada do antidepressivo fez com que
a cápsula com a droga tenha tido dificuldade de encontrar espaço para chegar ao
intestino no momento certo, ou seja, fazendo com que o fármaco ficasse mais tempo
no estômago do que deveria. Durante esse tempo excessivo, o meio ácido estomacal,
então, levaria à desintegração da cápsula e posterior ionização do composto
provavelmente básico do antidepressivo, impossibilitando sua absorção no intestino de
forma apropriada.
Nos parece incongruente poder considerar a droga como sendo ácida, pois, se
assim fosse, esta seria desintegrada e absorvida no meio ácido do estômago sem
maiores problemas. Neste cenário, a alimentação reforçada antes da ingestão do
remédio não pareceria, a princípio, um empecilho para a eficiência dos efeitos do
fármaco na paciente.