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Existem três argumentos principais contra a autoria de Tiago: (a) a linguagem e estilo

são supostamente elaborados demais para um camponês galileu; (b) sua humilde
identificação como um servo, quando poderia ter se apresentado como irmão do Senhor;
e (c) não há a ênfase forte na Lei que se poderia esperar do principal representante do
cristianismo judaico.
Estes argumentos podem ser respondidos da seguinte forma: (a) pessoas que usam
este argumento ignoram de forma deliberada o fato de que a maioria dos galileus era
bilíngüe,314 e que Tiago, o irmão do Senhor, sem sombra de dúvidas havia tido contatos
contínuos com os judeus helenistas em Jerusalém, sem dúvida aumentando sua
capacidade numa língua em que já era fluente; (b) este argumento, ao invés de negar
uma data do século I, contribui para isso, uma vez que é muito provável que um
falsário, ou mesmo um discípulo bem intencionado (assim propõe a teoria), buscaria
reconhecimento utilizando sua reivindicação mais elevada; (c) embora não exista
menção à Lei cerimonial (na qual, segundo a tradição cristã, Tiago, o justo, esteve tão
profundamente envolvido), e embora o conceito de Lei na epístola seja quase que
exclusivamente moral, evitando até mesmo a questão crítica da circuncisão, tal omissão
poderia se dever ao fato de que a carta foi escrita em qualquer uma de duas ocasiões -
ou antes do Concílio de Jerusalém, ou depois que a questão havia sido resolvida pelo
Concílio e deixou de atormentar os cristãos judeus. Além disso, conforme Guthrie
aponta,
O retrato que Atos e Gálatas pintam de Tiago é naturalmente influenciado pelo conflito
quanto ao cristianismo helenístico, mas é necessário lembrarmos que em ambas as
fontes Tiago é representado como um líder de ação conciliatória e, de maneira
nenhuma, como um fanático defensor das exigências rituais judaicas.315
Desta forma, estes argumentos contra a autoria de Tiago podem ser revertidos
perfeitamente a seu favor. Além disso, a carta contém tantas similaridades com o
discurso e a carta atribuídos a Tiago no livro de Atos (uma porção muito pequena deste)
que é muito difícil estabelecer qualquer conexão a não ser a autoria comum entre os
dois documentos. Além disso, as similaridades temáticas entre Tiago e o Sermão do
Monte (veja a tabela abaixo) sugerem reminescências pessoais de seu conteúdo ao invés
da dependência literária de formas escritas.

Uma comparação dos conteúdos de Tiago e o sermão do monte


Passagem
Passagem em
Conteúdos do livro em
Tiago
Mateus
Alegria em meio à provação. 1.2 5.10-12
Exortação à perfeição. 1.4 5.48
O pedido por dons. 1.5 7.7ss.
Condenação da ira. 1.20 5.22
Acerca do ouvir e do praticar. 1.22 7.24ss.
Necessidade de se cumprir toda a Lei. 2.10 5.19
Bênçãos por se demonstrar misericórdia. 2.13 5.7
Bênçãos por causa da pacificação. 3.18 5.9
Incompatibilidade entre o amor a Deus e o amor ao
4.4 6.24
mundo.
Bênção por causa da humildade. 4.10 5.5
Condenação do juízo contra outros. 4.11, 12 7.1-5
Traça e ferrugem corrompendo a riqueza terrena. 5.2ss. 6.19
Profetas como exemplos. 5.10 5.12
Condenação dos juramentos. 5.12 5.33-37
UMA COMPARAÇÃO DOS CONTEÚDOS DE TIAGO E DO SERMÃO DO MONTE
Desta forma, tanto a evidência externa (embora não maciça) quanto a interna
confirmam a visão de que Tiago, o irmão de nosso Senhor, foi o autor desta epístola.
O AUTOR
Tiago, que era o irmão mais velho de Jesus (a julgar por sua prioridade em tais listas
familiares), aparentemente não creu em Cristo até depois de Sua ressurreição e aparição
(cf. Jo 7.5 e 1Co 15.7). Ele e seus irmãos estavam entre os crentes que aguardavam a
vinda do Espírito Santo (At 1.14). Logo ele foi reconhecido como um dos líderes da
igreja de Jerusalém (At 12.17; Gl 2.9, 12), e exerceu um papel de liderança no Concílio
de Jerusalém (At 15). Ele era um judeu cristão que continuou a observar a Lei Mosaica
como testemunho aos outros judeus até depois da terceira viagem missionária de Paulo
(a.D. 57; At 21.18-25); ao fazê-lo, entretanto, sua maior preocupação era manter abertas
as linhas de comunicação para a proclamação do Evangelho entre os judeus, ao invés de
considerar a observância da Lei como parte da mensagem do Evangelho.
Tiago foi louvado como homem justo tanto na tradição judaica como na cristã,
conforme conservadas por Josefo e Eusébio. Josefo, descrevendo o apedrejamento de
Tiago sob o sumo sacerdote Anano II em a.D. 62., diz que esse ato foi abertamente
lamentado pela população judaica;316 Eusébio, citando Hegesipo, fala da vida piedosa
de Tiago, que lhe rendeu o títu
317

ORIGEM, DATA E DESTINO


Uma vez que Tiago viveu a maior parte de sua vida adulta em Jerusalém, é muito
provável que sua epístola tenha sido escrita de lá.
Uma data recuada para a carta também é bem provável, desde que a autoria de Tiago
seja reconhecida. A morte de Tiago em 62 teria feito dessa data o terminus ad quem
para a composição da carta, mas existem motivos para que se postule uma data bem
anterior.
A ausência de referências a qualquer outro autor do Novo Testamento sugere que
Tiago foi a primeira das epístolas a ser escrita. A ausência de qualquer referência ao
Concílio de Jerusalém parece empurrar a data para antes de 49, embora o assunto da
discussão ali seja pouco relevante para a epístola, presumindo que ela tenha sido escrita
para cristãos judeus. A referência à necessidade de vestimentas e alimento sugere o
paralelo histórico com a fome que atingiu a Palestina de forma avassaladora por volta de
46, durante o reinado de Cláudio (cf. Atos 11.27-28).
Um argumento final acerca da data da epístola é o sabor judaico das assembléias
mencionado nela. Seu local de encontro é chamado de [ ] (2.2), seus
oficiais são simplesmente chamados de [ ] (5.14) e de
[ ] (3.1).

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