Você está na página 1de 7

  CURSO ONLINE: PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO – AUGUSTUS NICODEMUS 

Aula 18: Tiago

INTRODUÇÃO 

1) A carta de Tiago é um dos livros mais práticos do Novo Testamento. É claro que por
detrás das muitas exortações e imperativos éticos de Tiago está uma sólida teologia
cristã apostólica. Contudo, essa ênfase na vida cristã e a pouca menção das doutrinas
características do período apostólico quase custaram a essa carta a entrada no cânon
do Novo Testamento.
2) É a carta que tem proporcionalmente mais imperativos entre os demais livros do Novo
Testamento. Tiago escreve com autoridade, comanda, ordena e exorta, com força de
apóstolo, ainda que não o seja.
3) Através dos séculos, Tiago tem sido usado como perfeito contrabalanço para
conclusões erradas quanto à doutrina da justificação pela fé sem as obras da lei. É
isso que veremos em nosso estudo.

I – GÊNERO LITERÁRIO

1) Apesar de seguir algumas das convenções literárias da época, Tiago se parece mais
com um sermão do que com uma carta. Ela foi escrita com este propósito, de ser lida
durante os cultos das igrejas, como um substitutivo da presença do autor.
2) Trata-se de uma exortação poderosa a cristãos que estavam passando por problemas
de ordem espiritual e prático, que precisavam de uma palavra pastoral de correção.
A ausência de temas doutrinários pode significar que esses cristãos não estavam
sofrendo com problemas doutrinários ou com a ameaça de falsos profetas
3) É notável o uso de muitas figuras tiradas da natureza, da agricultura, pecuária e a
vida no campo: sol que seca as flores do campo (1.1), as flores do campo (1.10-11),
chuva que cai no tempo próprio para a agricultura (5.7,18), enxerto (1.21), cevar
animais para serem abatidos (5.5), ondas agitadas pelo vento (1.6), fontes de água
(3.11), árvores frutíferas (3.12), diversos tipos de animais (3.7), o movimento dos
corpos celestes (1.17).
4) Uma outra característica da carta é o grande número de palavras que só ocorrem
uma única vez no Novo Testamento. Existem cerca de 54 ocorrências destas
palavras, o que torna a leitura de Tiago, no grego, difícil, exigindo frequentes
consultas ao dicionário.
Perguntar Não Ofende Comunicação Digital – Este material pode ser usado por você em sua igreja,
porém você não tem autorização para comercializar ou distribuir.
 
2    CURSO ONLINE: PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO – AUGUSTUS NICODEMUS 

5) Podemos mencionar ainda a tremenda dependência de Tiago para com o Antigo


Testamento, que embora não seja citado formalmente, é ecoado constantemente na
linguagem, nos exemplos e nas personagens empregadas por Tiago. Ele se refere à
Lei, aos Dez Mandamentos e faz alusões, nem sempre explícitas, a mais de 20 livros
do Antigo Testamento, entre eles os cinco livros do Pentateuco, Josué, 1Reis,
Salmos, Provérbios e Eclesiastes, Isaías, Jeremias, Ezequiel, Daniel e mais sete dos
profetas menores.
6) Ela é considerada como uma carta geral, visto parecer muito mais uma homilia ou um
sermão, encabeçada por uma saudação que lhe dá o tom de carta, mas sem
conclusão ou despedidas, sem menção de nomes ou lugares.
7) Contudo, como veremos mais adiante, apesar de ser uma das cartas gerais, Tiago
tem uma audiência definida em mente.

II – AUTORIA E DATAÇÃO

1) O autor da carta se apresenta como “Tiago, servo de Deus e do Senhor Jesus Cristo”
(1.1). Tiago era um nome relativamente comum entre os judeus do primeiro século
d.C. Há várias pessoas com o nome de Tiago no Novo Testamento.
2) Contudo somente dois podem ser seriamente considerados como os autores. (1)
Tiago, o apóstolo, irmão de João, filho de Zebedeu, que juntamente com seu irmão
João e Pedro formavam o círculo mais íntimo ao redor de Jesus. Contudo, a morte
de Tiago apóstolo ocorreu logo no começo da Igreja, conforme o livro de Atos (At
12.2), em inícios da década de 40, fazendo com que seja praticamente impossível
que ele tenha escrito esta carta, mesmo que ela seja datada bem cedo. (2) Tiago,
irmão de José, Simão e Judas, e meio-irmão de Jesus, mencionado nos Evangelhos
juntamente com as suas irmãs (cf. Mt 13.55; Mc 6.3). Cremos que foi ele o autor da
carta.
3) A princípio, Tiago foi um descrente em Jesus como os demais irmãos (Jo 7.5), mas
posteriormente converteu-se à fé em Cristo, talvez mediante uma aparição específica
de Jesus a ele após a ressurreição (1Co 15.7). Tiago logo tornou-se uma das figuras
mais proeminentes da Igreja apostólica, considerado pelo apóstolo Paulo como uma
das colunas da Igreja de Jerusalém e contado entre os apóstolos (Gl 1.19; 2.9).
4) De fato, Tiago tornou-se líder da Igreja de Jerusalém, tendo aparentemente presidido
ali o famoso concílio que decidiu sobre a entrada dos gentios na Igreja (At 15.13; cf.
21.18; Gl 2.12).
Perguntar Não Ofende Comunicação Digital – Este material pode ser usado por você em sua igreja,
porém você não tem autorização para comercializar ou distribuir.
 
3    CURSO ONLINE: PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO – AUGUSTUS NICODEMUS 

5) Juntas a estas evidências, temos as evidências externas, o testemunho da Igreja


antiga. Orígenes, Eusébio, Cirilo de Jerusalém, Agostinho e Eutanásio, entre outros,
se referiram a Tiago, irmão de Jesus, como o autor desta epístola.
6) Ao final, considerando todas as evidências, adotamos aqui a posição histórica da
Igreja, de que foi Tiago, o meio-irmão de Jesus, quem escreveu esta carta.
7) Tudo isto considerado, não é impossível que esta carta tenha sido uma das primeiras
canônicas a serem escritas. Os estudiosos que aceitam a autoria de Tiago irmão de
Jesus, datam a carta em meados da década de 40.
8) Tiago não aparece entre as primeiras listas de livros canônicos pelo fato de seu autor
não se identificar como apóstolo e pela aparente contradição que ele faz da doutrina
da justificação pela fé.
9) Somente no século IV, debaixo da influência de Pais da Igreja como Jerônimo e
Agostinho, é que a igreja cristã reconheceu sua divina procedência, inspiração e
autoridade. A partir daí, Tiago tem ocupado seu lugar no cânon.

III – LUTERO E TIAGO

1) Lutero se referiu à carta de Tiago como “epístola de palha”, no prefácio à primeira


edição do seu Novo Testamento em 1522, após assumir como critério pessoal de sua
apreciação por determinados livros da Bíblia o princípio “was Christum treibet” (aquilo
que nos impulsiona a Cristo).
2) O que muitos não sabem é que Lutero, nas edições posteriores, não somente
abrandou sua crítica ferrenha contra a carta, como também eliminou boa parte dos
comentários negativos que havia feito contra ela na primeira edição de seu Novo
Testamento, inclusive este parágrafo em que a chama de “epístola de palha”.
3) Já Calvino, conforme escreveu em seu comentário de Tiago, não via qualquer motivo
para se rejeitar a sua autoridade e canonicidade. Para ele, não havia qualquer
incompatibilidade entre Tiago e Paulo na questão da justificação pela fé. Da mesma
forma, o fato de que Tiago não proclama o Evangelho com a mesma fartura que
outros autores neotestamentários, é explicado por Calvino como sendo simplesmente
parte da diversidade que caracteriza os autores bíblicos, como Salomão e Davi, por
exemplo.
4) Apesar da declaração injusta de Lutero e dos ataques dos liberais e católicos contra
sua autoria e autenticidade, Tiago continua a abençoar a Igreja de Cristo através da
História.
Perguntar Não Ofende Comunicação Digital – Este material pode ser usado por você em sua igreja,
porém você não tem autorização para comercializar ou distribuir.
 
4    CURSO ONLINE: PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO – AUGUSTUS NICODEMUS 

IV – DESTINATÁRIOS E OCASIÃO

1) Tiago endereça a carta às “doze tribos que se encontram na Dispersão” (1.1). Há


duas maneiras de entendermos a expressão. (1) Uma referência a todos os cristãos,
judeus e gentios, vistos aqui como o verdadeiro Israel. (2) Uma referência aos judeus
dispersos pelo Império romano, que haviam se convertido ao Cristianismo, e que
eram, portanto, o verdadeiro Israel de Deus (cf. 1Pe 1.1; Jo 7.35; At 26.7).
2) Alguns estudiosos acham que estes a quem Tiago escreve moravam na região
oriental do Império, na Babilônia e na Mesopotâmia.
3) Onde quer que estivessem, Tiago se dirige a eles como as doze tribos dispersas, não
somente para assegurar-lhes que eles são o verdadeiro Israel de Deus, mas também
para lembrar-lhes sua condição de peregrinos e forasteiros aqui neste mundo,
conforme a expressão “Dispersão” sugere.
4) Transparece da carta que estes judeus cristãos a quem Tiago escreve estavam
passando por diversas provações da sua fé (1.1b).
a. Não sabemos ao certo que eram resultantes de perseguições, embora não
seja impossível – e até provável. Estas perseguições estariam sendo movidas
por seus patrícios judeus. pelos gentios em geral ou pelos romanos.
b. O primeiro caso é muito mais provável, pois à altura em que a carta foi escrita,
Roma ainda não havia começado a perseguir os cristãos.
5) Os destinatários da carta eram, na maioria, cristãos pobres, a julgar pelas denúncias
contra a discriminação contra os pobres e a opressão dos patrões ricos (1.9-11; 2.1-
6; 5.1-6).
6) Também eram imaturos espiritualmente, por causa da falta de prática da Palavra de
Deus que ouviam regularmente em seus cultos (1.22-25). Havia entre eles disputas
amargas (4.1-4; 3.14-15) e estavam impacientes diante das provações e assim
tentados a murmurar e a falar mal dos outros (3.9; 4.11; 5.7-8).
7) Também haviam compreendido erroneamente o ensinamento acerca da justificação
pela fé, levando Tiago a corrigi-los com o fito de mostrar que fé e obras andam juntas
(2.14-26).
8) Tiago demonstra estar a par da real situação deles. E escreve para confortá-los,
fortalecê-los e orientá-los nas diversas áreas da vida em que se encontravam
deficientes e necessitados.

V – PROPÓSITOS
Perguntar Não Ofende Comunicação Digital – Este material pode ser usado por você em sua igreja,
porém você não tem autorização para comercializar ou distribuir.
 
5    CURSO ONLINE: PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO – AUGUSTUS NICODEMUS 

 Diante de tudo o que vimos acima, não é difícil perceber os propósitos com que Tiago
escreveu essa carta.
1) Primeiro, ele deseja orientar e instruir seus leitores a enfrentar os seus sofrimentos
da maneira correta, como servos de Deus, imitando aqueles que no passado haviam
sofrido pela palavra do Senhor.
2) Segundo, Tiago deseja corrigir a superficialidade de seus leitores e incoerência de
seus leitores.
a. Não estavam praticando aquilo que haviam ouvido dos pastores e pregadores
(1:21-27).
b. Faziam acepção de pessoas, favorecendo os ricos e desprezando os pobres
(2:1-13).
c. Tinham fé mas não tinham obras (2:14-26).
d. Tinham uma compreensão errada da doutrina da justificação pela fé sem as
obras da lei.
e. Incoerência dos mestres entre o falar e o praticar (3:1-18).
f. Mundanismo (4:1-17).
3) Por isso Tiago insiste na prática de obras, na prática da verdade e condena
declarações de fé vazias e o simples ouvir sermões.
4) Além disso, Tiago usa a carta para abordar diversas questões práticas, que inclui o
comportamento dos ricos, dos que sofrem, dos que estão doentes e dos que estão
desviados da fé. Não é sem razão que é considerada uma das cartas mais práticas
do cânon do Novo Testamento.

VI – DIVISÕES

I. Autor, destinatários e saudação (1:1) 
II. Provas e Tentações (1:2‐18) 
A. Superando as Provas (1:2–12) 
B. A Fonte da Tentação (1:13‐18) 
III. Colocando a Palavra em Prática (1:19—2:26) 
A. Ouvir e Fazer (1:19‐27) 
B. Favoritismo Proibido (2:1–13) 
C. Fé e obras (2:14‐26) 
IV. Palavras e Sabedoria (3:1—4:12) 
A. Domar a Língua (3:1–12) 
Perguntar Não Ofende Comunicação Digital – Este material pode ser usado por você em sua igreja,
porém você não tem autorização para comercializar ou distribuir.
 
6    CURSO ONLINE: PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO – AUGUSTUS NICODEMUS 

B. Dois Tipos de Sabedoria (3:13‐18) 
C. Submeta‐se a Deus (4:1–12) 
V. Uma Perspectiva Cristã sobre o Mundo (4:13—5:12) 
A. Vangloriando‐se do Amanhã (4:13–17) 
B. Advertência aos Opressores Ricos (5:1–6) 
C. Paciência no Sofrimento (5:7‐12) 
VI. A Oração da Fé (5:13‐20) 
VII – TEMAS MAIS IMPORTANTES 

1) Uma vez que a carta tratar de diversos assuntos práticos, fica difícil achar um tema
que unifique todos eles. Mas acredito que dois princípios norteiam o total da carta.
2) Primeiro, a necessidade de coerência quanto a vida cristã. Os leitores de Tiago
deveriam colocar em prática tudo aquilo que já haviam aprendido em suas reuniões
e livrar-se da ideia de que a conduta deles não tinha qualquer relevância para com a
situação deles diante de Deus.
3) Segundo, o enfrentamento dos sofrimentos da maneira correta. Não com ira,
ressentimentos e desânimo, mas entendendo o propósito das provações de Deus em
nossa vida.
4) Em linhas gerais, Tiago deseja que seus leitores sejam crentes praticantes, discípulos
comprometidos, vivendo como cristãos em todas as áreas da vida.

VIII – PASSAGENS DIFÍCEIS DE INTERPRETAR

A passagem polêmica clássica de Tiago é 2.14‐26, onde o autor trata de fé e obras. Em resumo, as 
seguintes linhas de interpretação têm sido propostas para a interpretação desta seção de Tiago. 

1) Tiago, como líder do cristianismo judaico sediado em Jerusalém, estaria reagindo ao


ensino de Paulo que a salvação era pela fé somente, sem as obras da lei. Ele aqui
combate frontalmente a doutrina paulina da justificação pela fé sem as obras da lei.
2) Nunca houve qualquer incompatibilidade entre esta seção de Tiago e a doutrina
paulina da justificação pela fé sem as obras da lei.
a. A fé que Tiago condena não é a mesma que Paulo recomenda, e as obras que
Tiago recomenda não são as mesmas que Paulo condena.
b. Tanto Paulo quanto Tiago condenam uma fé hipócrita, teórica, da boca para
fora, ao mesmo tempo que declaram que a fé salvadora se expressa por meio

Perguntar Não Ofende Comunicação Digital – Este material pode ser usado por você em sua igreja,
porém você não tem autorização para comercializar ou distribuir.
 
7    CURSO ONLINE: PANORAMA DO NOVO TESTAMENTO – AUGUSTUS NICODEMUS 

de obras, atos de obediência, da prática (veja em Paulo: Gl 5.6,13; 1Ts 1.3;


1Tm 1.5; Tt 1.6; 3.8; Ef 2.8-10; 1co 15.2; ).
3) Tiago estava combatendo um cristianismo teórico, superficial, enquanto Paulo
combatia o legalismo judaico. Os alvos diferentes requerem ênfases distintas. Daí, a
contradição entre Tiago e Paulo é apenas aparente.
4) O homem é justificado diante de Deus pela fé somente. Contudo, ele é justificado
diante dos homens pelas obras que pratica em decorrência da fé. Assim, num certo
sentido, o homem é também justificado pelas obras, uma vez entendidas como
decorrentes da fé salvadora. Ou seja, as obras fazem parte integrante da fé que salva,
sendo apenas o outro lado da moeda.

IX – COMO LER ESSE LIVRO

1) Pedindo a Deus que ele use as palavras do Tiago para corrigir atitudes e
comportamentos errados em sua vida.
2) Sondando o seu coração para ver se existe alguma tentativa de defender
comportamentos errados baseado na doutrina da graça.
3) Agradecendo a Deus por homens como Tiago, E a princípio eram incrédulos em
Jesus Cristo, mas que depois foi transformado pelo poder do Evangelho e se tornou
um dos grandes líderes da igreja cristã apostólica.

Até a próxima aula!

LINKS ÚTEIS:

Para acessar as aulas, acesse o link: https://augustusnicodemus.com/portal e selecione seu


curso e turma para fazer login.

Perguntar Não Ofende Comunicação Digital – Este material pode ser usado por você em sua igreja,
porém você não tem autorização para comercializar ou distribuir.
 

Você também pode gostar