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DEL REY e a HOUSE colophon são marcas registradas da Penguin Random House
LLC.ISBN 9780345511539 / eBook ISBN 9780345536563
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Aos 15 anos...
— Kyrell! — O técnico de R&A, O técnico de Resistência e Agilidade.
Estava parado ao lado de Thane que ofegava deitado no chão. — Ou você se
mexe ou vai embora de uma vez!
Todos os meses, na trilha preparatória eles tinham de percorrer um
caminho com obstáculos diferentes. Aos poucos, os percursos se tornavam
mais difíceis e mais perigosos. Se candidatos a cadetes quebrassem o braço
ou uma perna ou ganhasse uma cicatriz. Era apenas uma prova de que não
eram aptos para estar ali.
Não terminar o percurso... não resultava em expulsão automática, mas
colocava a pessoa bem no topo da lista dos primeiros a sair.
Mas as costas e os ombros de Thane doíam tanto...
— Ei. — Ciena se ajoelhou ao lado dele. — Vamos, levanta Thane.
E balançou a cabeça. Os seus músculos tremiam de exaustão sobre o seu
equipamento frouxo de R&A, hematomas e cortes queimavam a cada
movimento que ele fazia. Ele dormira menos de duas horas. Todo o seu
corpo doía seus ombros pareciam mais pesados que Carbonita.
— Não consigo.
— Lógico que consegue.
Ele ergueu a cabeça da superfície vermelha emborrachada da sala de
R&A e a viu ajoelhada ao lado. No instante em que seus olhos se
encontraram Thane percebeu que não seria capaz de esconder a verdade
dela.
— Ontem à noite... meu pai...
Era comum Oris Kyrell brigar com os filhos. Muitas vezes ele batia nos
dois, mas apenas alguns tapas. Entretanto na noite anterior sua fúria tinha
sido maior do que nunca. Thane não havia percebido que precisava revidar
até estar machucado demais para conseguir os socos e chutes do pai. Não
pararam até Thane acabar sangrando no chão. Seus pais não ajudaram depois
nem se importaram com seus machucados, na manhã seguinte. Pareciam
determinados a fingir que o incidente jamais havia acontecido machucado e
dolorido.
Teve de guardar a verdade para si mesmo, pelo menos até Ciena
arregalar os olhos ao entender.
— Você ainda consegue. — Ela sussurrou. — Você chegou até aqui,
certo?
— Vou tentar. — Ele disse respirando profundamente.
— Mas se você precisa voltar à pista, está perdendo tempo.
— Estou em primeiro lugar em R&A esqueceu? Posso me dar ao luxo de
perder alguns minutos.
— Eu juro, Thane Kyrell, que carrego você até o fim da pista se for
preciso.
— Agradeço a oferta, mas acho que não vale.
Mais alunos passaram por eles saltando a próxima barreira elevada e os
que tocaram as bordas afiadas soltaram grunhidos. Eram os garotos mais
lentos ou quase isso. Ciena terminaria em último. Thane nem tinha mais
esperança de terminar.
O garoto rolou para encará-la de um modo que talvez ela visse o quanto
ele lamentava.
— Pode ir.
Ciena se aproximou mais dele.
— Thane... Não deixe o seu pai vencer.
O ódio pelo pai, fez o que a esperança não pôde. Impulsionado por pura
raiva, Thane lutou contra a dor até ficar de joelhos, depois em pé. Embora
cambaleasse no começo conseguiu se equilibrar.
— Pronto para correr? — Ciena começou a pular. Ansiosa para se mover.
— Sim. — Thane respirou fundo. — Estou pronto.
De algum modo, ele se jogou barreira acima embora tivesse chegado por
último... conseguiu terminar.
Mais tarde na privacidade da sala de equipamentos. Ele sentou no banco
tirou a camiseta com cuidado e deixou que a Ciena visse o pior. A vergonha
fazia seu rosto queimar. Embora soubesse que não era ele que devia estar
envergonhado... ali estava, mostrando a Ciena como tinha apanhado até
perto das costas a rasgar.
Se ela tivesse pena dele eu dissesse que se sentia muito, Thane não
suportaria. Mas Ciena não disse nada.
Em silêncio abriu o kit de primeiros socorros e começou a aplicar
pomada para tratar a pele fechando, um corte de cada vez, até voltar a se
sentir inteiro.
Aos 16 anos...
Pouquíssimos jovens de Jelucan conseguiam entrar em uma das
Academias Imperiais. Enquanto os mundos da orla interior tinham milhares
de candidatos inscritos as vagas ainda eram bastante limitadas para cidadãos
de antigos mundos separatistas. Os próprios instrutores das academias
selecionavam os alunos. No instante em que os candidatos eram informados
da aprovação ficavam sabendo para qual escola iam dali a duas semanas e
em qual planeta viveriam.
Ciena não estava ligando para a qual academia poderia ir a qualquer
planeta serviria, contanto que conseguisse se tornar uma cadete Imperial.
Na manhã em que os resultados seriam anunciados toda sua classe se
reuniu no pátio da escola. Os pais não tinham permissão para entrar no
colégio. Somente alunos e oficiais do Império, mas as famílias aguardavam
do lado de fora para depois receber os jovens com comemorações ou
conforto. Por ora Ciena, Thane e os outros candidatos só tinham uns aos
outros.
— Não consegui dormir. — Ela confessou ao melhor amigo. Enquanto
esperavam juntos parados próximos à extremidade esquerda do pátio
encarando a porta por onde a supervisor apareceria com os anúncios. —
Nenhum pouco.
— Eu também não. — Thane abriu um sorriso. — Isso me deu tempo
para pensar em alguns planos B, pra nós.
Ciena ergueu as mãos em protesto. Ela havia se recusado até mesmo a
levar em conta planos alternativos de carreira porque achava que podia dar
azar.
Thane riu em deboche.
— Qual é, Ciena? Nós já fizemos os testes. A decisão já foi tomada. Não
tem mais como dar azar.
Era verdade. Além do mais pelo tom de voz Thane, Ciena havia
percebido que aqueles planos... não eram pra valer.
— Ok tudo bem. Conte.
— Um. Viramos acrobatas famosos.
— …acrobatas?
— Acrobatas famosos. Não há glória em ser um acrobata medíocre
desconhecido, se formos fazer isso tem que ser bem feito.
O supervisor apareceria a qualquer momento o burburinho da multidão
ficava cada vez mais intenso. O coração de Ciena disparou, mas ela tentou
usar o mesmo tom de voz brincalhão de Thane.
— Dispenso. Alguma outra ideia brilhante para o nosso futuro? Você
disse que era a número um.
— Dois. Viajamos pela galáxia como uma dupla de artistas tocando
percussão e dançando ritmos exóticos.
Ela ergueu as sobrancelhas.
— Desculpa. Mas não vou virar uma dançarina exótica.
— Quem disse que seria você. Eu danço, você batuca.
Dessa vez a risada dela foi genuína.
— Só se você pode deixar escolher as suas roupas.
— Hummm. Talvez eu deva passar para o plano três...
Então Thane ficou rígido e arregalou os olhos. A porta se abriu e o
supervisor apareceu. Seu uniforme preto parecia absorver a luz do sol. O
estômago de Ciena deu um nó, mas assim como todos os outros estudantes,
ela se endireita ou de imediato permanecendo em silêncio na posição de
sentido.
Droides amplificadores flutuavam perto dele, captando a voz do
supervisor enquanto ele falava.
— A seguir uma lista de todos os candidatos da escola que passaram
para as diversas Academias do Império. Para a Academia Imperial em
Arkanis…
Ciena podia ter soltado um grupo unido eles se iam listar as escolas por
ordem alfabética. Talvez tivesse que esperar até o final para saber se haviam
conseguido passar ou não. Ela podia se imaginar ali parada ereta os minutos
passando enquanto a terrível consciência de seu fracasso aumentava. Então
teria de sair com o rabo entre as pernas humilhada. Fracasso não era a
mesma coisa que desonra, mas naquele momento bem que parecia.
Alguns minutos depois de iniciada a cerimônia... que já parecia durar
uma eternidade... o supervisor se endireitou ou ainda mais.
— Para a Real Academia Imperial em Coruscant…
Nenhuma escola em toda a galáxia era tão prestigiada. Nenhum outro
treinamento chegava perto de assegurar uma carreira de alto nível na Frota
Estelar Imperial.
Ciena havia sonhado com ela, por isso achou que tinha imaginado
quando o supervisor de seu nome.
Mas não. Ele tinha dito mesmo.
— Thane Kyrell e Ciena Ree. — Os dois juntos!
Ela continuou em posição de sentido, mas lançou um olhar para Thane e
também tinha ouvido a mesma coisa. Era para valer. Sim ele estava
sorrindo... mas é um sorriso cansado como o que ele dera ao terminar a
barreira final na aula de R&A. Thane fechou os olhos e sussurrou
aparentemente para si mesmo.
— Consegui escapar. Vou embora daqui.
Ciena sabia porque seu amigo queria tanto partir daquele planeta. Não
eram as mesmas razões dela. Ela adorava a beleza inóspita de Jelucan, a
camaradagem... entre as pessoas do vale. Tudo aquilo era lindo mas era sem
arrependimentos que ela deixaria o planeta natal.
Ela não estava fugindo de nada. Estava em busca de seu sonho de se
tornar uma oficial do Império lançando se alegre para o espaço.
O dia em que Thane deixou Jelucan o que parecia... perfeito. Como se não
pudesse dar nada errado como se todas as constelações tivessem se alinhado
para guiá-lo para fora dali. Seus pais não se deram ao trabalho de levá-lo ao
porto espacial. As despedidas aconteceram em casa. Foi um alívio.
Entrar a bordo da nave que o levaria a Coruscant. Foi ainda mais
prazeroso porque a Ciena também estava lá, mas ela ficou tanto tempo na
rampa de entrada abraçando os pais que o capitão ameaçou deixá-la para
trás. Thane e Ciena haviam se tornado uma equipe durante o treinamento
para entrar na academia. Nada mais justo que chegassem lá juntos. O melhor
de tudo foi o momento em que o transporte estremeceu e entrou no hiper
espaço... A primeira experiência dos dois na velocidade da luz... Eles
sorriram um para o outro totalmente encantados.
Então chegaram em Coruscant, e foi como levar um soco no estômago.
Thane sempre soube que Jelucan era um mundo atrasado hologramas
havia mostrado que a galáxia era bem maior e mais sofisticada do que em
qualquer lugar que já tiveram a chance de ver. Então achava que estava
preparado mas quando desembarcou da nave e viu Coruscant pela primeira
vez...
Os edifícios tinham a altura das montanhas de Jelucan. Embora a luz do
Sol atravessasse diversas estruturas de vidro o efeito era de profunda
claustrofobia. O terreno ficava lá embaixo e o céu estava cortado em finas
fatias. Centenas de naves menores se aproximavam ou pairavam entre
arranha céus num zumbido interminável de negociação e comércio. Todo
mundo parecia ter um objetivo e uma direção perfeitamente à vontade
naquela imensa gaiola de metal, naquela cidade que havia engolido um
planeta. Thane tentou não olhar mais pelas janelas porque a vista o fazia se
sentir pequeno.
No começo achou que se ela ficaria ainda mais abalada. Ela passara a
infância nos vales abertos com casas, apenas um pouco mais sofisticadas que
tendas. Decerto aquilo seria demais para ela.
Em vez disso ela estava empolgada.
— É aqui que tudo acontece. — Ela exclamou enquanto os dois
caminhavam pelos corredores do porto espacial droides boia flutuavam à
frente como faróis para guiá-los na direção da nave auxiliar da academia. —
É como... eletricidade, Uma energia incrível por toda parte. Você não está
sentindo?
— Com certeza. — Disse Thane. — Totalmente elétrico.
Ciena Ree lançou um olhar.
— Ei. Você está bem? — Mas eles já haviam chegado à nave auxiliar
junto com um punhado de outros novos cadetes e foram tomados pelo
turbilhão de atividades do primeiro dia de serviço: pegar chips com as
informações de que precisariam, se inteirar sobre a recepção daquela noite
para os cadetes e se apresentar aos colegas dos outros mundos. Oficiais do
Império empertigados em uniformes de gala que se movimentavam entre
eles enquanto a nave auxiliar decolava e se juntava ao tráfego aéreo
acelerado de Coruscant. Thane se esforçava para não se encolher toda vez
que uma nave passava raspando por outra, mas numa metrópole do tamanho
de um planeta aparentemente os pilotos estavam acostumados a pequenas
margens de erro.
A intensidade só aumentou quando enfim chegaram à academia
enquanto os novos cadetes desembarcavam da nave auxiliar Thane percebeu
que centenas de alunos já estavam lá e outras centenas pareciam sair das
naves que pousavam atrás deles durante todo o tempo de checagem de
entrada. Não conseguia evitar a sensação de estar perdido, quando olhou na
direção de Ciena. Ela sorria ainda mais. Logo, eles se separaram na onda de
gente tentando descobrir onde deveria estar.
O chip de Thane forneceu a localização de seu dormitório e informações
sobre seus dois colegas de quarto. Eles não devem ser piores que Dalven,
pensou, tentando ser otimista.
Mesmo assim ao levantar a mão para tocar a campainha Thane se sentiu
incrivelmente pequeno.
A porta deslizou para revelar um sujeito magro de cabelo preto com
rosto estreito... e postura tão rígida que Thane levou um momento para
perceber que não era nenhum administrador, mas um de seus colegas de
quarto.
— Então você é aquele, de como se chama mesmo, Jelucan? — Quando
Thane assentiu. O sujeito riu debochado.
— Porque se deu ao trabalho de tocar a campainha do próprio quarto,
que ridículo.
— Ele não é encantador? —Disse outro sujeito mais alto, um vara pau de
rosto comprido e um longo cabelo castanho amarrado num nó na nuca. Seu
sotaque era aristocrático, mas seu sorriso era contagiante . — Essa simpatia é
Ved Foslo, nativo de Coruscant...
— É claro. — Interrompeu Ved erguendo o queixo. — Meu pai General
Foslo trabalha na inteligência central.
— E como pode ver. Ele conseguiu inserir uma referência ao pai em
menos de um minuto de conversa. — Quando o Ved fez uma careta, o sujeito
alto deu um passo à frente para apertar a mão de Thane. — Sou Nash
Windrider de Alderaan, meu pai faz tapetes. Impressionante né?
— Muito. — Thane nem se deu conta de que tinha começado a sorrir. —
O meu faz contabilidade meio duvidosa.
— É sempre útil. — Nash disse — Nunca se sabe quando vai precisar
maquiar os números. Entre fique à vontade, quero dizer o máximo que puder
ficar à vontade no beliche de baixo. Já pegamos as duas melhores camas.
Descobriu que Nash tinha viajado para mais de uma dezena de planetas e
havia visitado Coruscant por diversas vezes. O garoto nem perguntou a
Thane se ele ficar intimidado ao chegar supôs isso de antemão. Imaginou
que todos se sentiam assim na primeira vez que pousavam lá.
— Eles deveriam distribuírem narradores nos portos espaciais. — Disse
Nash. Enquanto estavam super amados nas camas aguardando a cerimônia
de boas-vindas e o jantar. — Ou tranquilizadores se alguma coisa para ajudar
as pessoas a lidar com a situação.
— Não vejo o que há de tão estranho em Coruscant. — Ved permanecia
completamente rígido, mas não parecia tão mau. — Você nunca esteve numa
cidade de verdade antes ou em algum dos mundos do núcleo?
Thane, já sabia que ser honesto era a melhor política.
— Não. — Ele se esticou todo na cama embaixo da de Ved tentando se
acostumar ao colchão duro. Nunca estive numa cidade maior do que Valentia
a principal de Jelucan e acho que toda a população de Valentia preencheria
cerca de uns sete andares desse prédio.
Nash apoiou as mãos embaixo da cabeça.
— Você vai se acostumar, Thane. Logo, todos seremos oficiais do
Império e você terá viajado por uma centena de mundos. E quando vier para
cá vai ficar tão entediado quanto o Senhor Filho do General aqui.
Ved lançou um olhar cruel para Nash, mas Thane não pode deixar de rir.
— ...bons amigos. — Ciena disse ao sair da sala das artes marciais com
todos os músculos doendo. —Sempre foi assim, e sempre será. Não há mais
nada a dizer.
Jude assentiu em aprovação e depois fez uma careta provavelmente a
cabeça dela ainda doía desde a última vez que a Kendy a derrubou no
tatame.
— Muito sábio da sua parte considerando a proibição de namorar
cadetes. Nem você nem Thane iriam querer comprometer as suas carreiras
violando uma regra tão importante.
Kendy... sorrindo suada e triunfante... simplesmente riu das duas.
— Eu poderia quebrar as regras por um cara bonitão.
Por um momento Ciena sentiu uma pontada de ciúme. Não era assim que
queria se sentir em relação a Thane... no entanto aquilo queimava dentro
dela, uma brasa que se recusava a pagar.
Mas que a Kendy já tinha mudado de assunto.
— Aí, o que vamos fazer com o nosso dia livre?
— Por mim tanto faz. — disse Ciena. — Desde envolva comer comida
de verdade.
Em naves do Império oficiais eram incentivados a tomar bebidas
nutritivas em vez de comer era mais eficiente tanto em termos de recursos
quanto para economizar tempo. E os médicos insistiam que os nutritivos
eram mais saudáveis, também. Não eram ruins, mas definitivamente não
eram bons. O refeitório da Academia servia os nutritivos e como a maioria
dos estudantes, Ciena havia obedientemente começado a se acostumar com
eles. Mas se pudesse comer um pouco de comida gostosa de verdade sem
culpa, tinha toda a intenção de aproveitar.
— Acredito que seremos capazes de encontrar refeições aceitáveis em
qualquer destino. — Disse isso Jude e hesitou antes de dar a sua sugestão. —
Alguém mais estaria interessado em visitar um museu Muti espécie de
ciências?
Kendy soltou um grunhido e Ciena fuzilou com os olhos em repreensão.
Jude era a calma, paciente e fiz considerações. Merecia que as coisas fossem
do jeito dela de vez em quando.
— Talvez pudéssemos ir ao museu logo de manhã cedo, mas à tarde eu
preferia fazer algo menos... insuportavelmente chato? Ciena pensou. —
Cerebral. Já estudamos tanto aqui né. Queria tentar algo como sei lá um
mergulho no oceano.
— Mergulho. Isso.— Kendy se empolgou no mesmo instante. Nativa do
mundo tropical de Iloh ela aprender a nadar antes mesmo de andar. — Não
consigo acreditar que já faz seis meses desde a última vez que estive na
água! E não, Jude, nadar na piscina de ondas não conta.
Jude não respondeu a esse comentário enquanto estavam no elevador já
estava imersa em seus pensamentos.
— Mergulhar seria um desafio fascinante. Bespin é um gigante gasoso o
que significa que não temos oceanos nem lagos, piscinas são luxos raros.
Então minha experiência na água é limitada a chance de expandir minhas
habilidades, e observar a vida marítima seria bem agradável.
Quando o elevador parou no andar delas, Ciena teve de balançar a
cabeça e sorrir.
— Pra você, tudo vira um projeto de ciência, Jude.
— A ciência é estudo de todo o universo material. Logo tudo é ciência...
mesmo que você não se dê conta disso. — Só o mais leve sorriso nos lábios
finos de Jude, revelou que ela estava desenvolvendo a provocação.
Ciena não mencionou que poderiam fazer naquela noite livre. No fundo,
ela torcia para que fossem comemorar a sua conquista como a primeira da
classe, mas dizer isso em voz alta soava como manifestação exacerbada do
seu orgulho. O único outro candidato possível para o número um era... claro,
Thane. E se ele vencesse ela achava que ficaria feliz por ele.
Quem sabe comemorar com ele brindando o seu sucesso. Ela preferia
que ele brindasse a vitória dela. Mas…
— Ciena? — Kendy olhou feio para ela enquanto caminhavam na
direção do quarto. — Seu cérebro parecia fora de órbita.
— Desculpa acho que minha cabeça ainda está... zonza desde que você
me jogou no chão. — Ciena começou a desatar a faixa de seu traje de artes
marciais, quando a porta se abriu. — Me mostra como faz?
— De jeito nenhum. — Kendy disse rindo. — É uma das poucas coisas
que eu sou melhor que você.
Ela sempre fazia isso... o afastava friamente. Ele dizia assim mesmo que
estava acostumado que tinha parado de se importar havia muito tempo.
Mesmo assim, durante todo o caminho até o depósito Thane ele não
conseguia parar de pensar na fortaleza que haviam criados juntos e como ele
costumava ficar sentado esperando a sua única amiga de verdade.
Era sempre assim Thane se comportava bem, até Ciena se esquecer como ele
havia tratado mal, ela começava a contar seus segredos como de costume
depois lembrava como ele havia a ignorado completamente nos últimos
tempos.
Sentada com seu grupo de estudos observando o holo de invasões
anfíbias do passado. Ciena cismou com encontro estranho e breve com
Thane. Desejou não ter sido tão fria, mas era como se todas as vezes que
tentava ser ela mesma com Thane. Ele lhe desce as costas.
O que ela tinha feito de tão errado? Era ele que tinha ficado maluco,
depois daquele projeto imbecil de canhão dois anos e meio antes. Achando
que existiam grande conspiração acontecendo. Era ele que queria arrastá-los
arrumar audiência administrativa sem base nenhuma causando a expulsão
imediata dos dois. Às vezes Thane parecia tão ofendido quando ela ou
vencia a em testes ou desafios que Ciena sentia que ele não conseguia
acreditar que alguém tão inferior o havia superado. Será que ainda achava
que ela não era nada além de uma menina boba do Vale?
Talvez ele sempre tivesse encarado a amizade deles como caridade.
Talvez aqueles voos de treinamento, todas aquelas sessões de estudo com
CZ-1. Talvez eles não tivessem compartilhado aquela experiência como
amigos e tudo aquilo tivesse sido um presente do garoto tico para menininha
que ele esperava que o venerasse em retribuição.
Aquilo era demais e Ciena sabia disso. Ela e Thane haviam sido amigos
de verdade e ainda era um inseto nível, mas o nível que ela não conseguia
mais alcançar.
Ali dentro do seu grupo de estudos continuava falando, Ciena estava
sentada ouvindo sem escutar. Ela se lembrava de como ela e Thane ficavam
sentados na Fortaleza por horas compartilhando segredos e sonhando com as
estrelas.
Thane não tinha se dado conta de como a Estrela da Morte era enorme, até
voar pela primeira vez com seu TIE Fighter em patrulha. Precisou ajustar os
propulsores para a decolagem em uma atmosfera planetária não em uma
estação espacial, pois a enormidade da Estrela da Morte lhe conferia um
enorme empuxo gravitacional.
Pensar nisso fazia Thane sorrir. Ele nunca havia imaginado que a
construção de algo tão colossal fosse possível. No momento a estação
espacial havia se tornado o seu lar e ele já temia o dia em que seria mandado
para outro lugar. A Estrela da Morte fora criada para funcionar como um
planeta, o que significava que tinha conforto que a maioria dos outros postos
militares não tinha. Comida, decente, áreas recreativas, com droides garçons
de última geração, Comissários, com opções de divertimento ainda que com
preços salgados. Embora Thane vivesse um quartel comunitário,
aparentemente havia um bom número de quartos privados, então a maioria
das pessoas receberia acesso a um deles após um período de 3 a 6 meses.
Normalmente era preciso chegar a Capitão Tenente para viver naquele tipo
de luxo. Poder desfrutar de um posto tão confortável e ter a emoção de voo
no espaço todos os dias. Estavam além dos maiores sonhos de Thane.
Assim como a mensagem que ele recebeu naquela manhã.
— Você está vindo para cá hoje. — ele repetiu ao encarar o rosto de
Ciena na tela pequena. — Tipo agora?
— Viu como estamos nos comunicando sem atraso? O Devastador
deverá atracar em uma hora. — A ansiedade dela saltava pela tela. Thane
nem imaginou que a dele também. — Você terá algum tempo livre?
— Sim, com certeza, já fiz minha patrulha do dia. — Quanto a do dia
seguinte... bem, trocar de turnos não era contra as regras se você com
aprovação antes. Ele trocaria de turno com qualquer um, se significasse
poder passar o dia inteiro com Ciena. — Podíamos ir a uma dos bares, botar
a conversa em dia, né?
— Nash também mal pode esperar para ver você. — Ciena disse.
— Certo. Legal. Claro. — Nash podia ter sido um dos seus melhores
amigos, mas naquele momento Thane não tinha o menor interesse em sair
com ele. Felizmente o amigo era esperto o bastante para saber quando dar
um tempo. Ou pelo menos... Thane esperava.
— Quero ver Jude. — Ciena continuou . — Ela está a bordo, não está?
— Está sim. Jude Edivon foi designada para a Estrela da Morte, mas não
a encontrei nenhuma vez. Este lugar é do tamanho de uma lua... então é
como se ela estivesse do outro lado do planeta. — Quando Ciena fez uma
expressão triste, Thane em acrescentou rapidamente. — Mas quando disser
que está vindo ela vai achar um jeito de te encontrar. Pode apostar.
— Você também, certo?
— Com certeza. — ele disse sorrindo feito um idiota.
Talvez eu não pareça um idiota completo, Thane ele pensou várias horas
depois, durante o seu turno secundário como mecânico de manutenção.
Todos os pilotos tinham de ser capazes de manter e consertar todas as naves
para um e dois pilotos. A àquela altura os motores de íon duplos eram tão
familiares para Thane quanto as próprias mãos, então ele foi capaz de
repassar o seu check-list ajustando tudo mesmo com a mente voando longe.
Ela também estava sorrindo. É um bom sinal certo?
Thane não se questionou o que aquele bom sinal significava. A
empolgação que ele sentiu ao pensar em ver Ciena novamente parecia algo
que preferiu não analisar e nem nomear. Tudo o que sabia, era que não havia
sonhado em vê-la tão cedo e mesmo assim esperar mais um dia parecia
muito.
O Devastador já está aqui. Ciena está Estrela da Morte agora. Porque
tive de fazer este turno imbecil, troquei para poder ter o dia livre amanhã.
Mas se Ciena não conseguir uma folga?
Thane tentou não se preocupar, respirou fundo e voltou a trabalhar TIE
Fighter em frente. O painel de controle precisava de novos fios, uma tarefa
detalhada o bastante para mantê-lo ocupado por um tempo, mas quando
terminou de posicionar a placa do painel de volta no lugar ouvir um anúncio:
— Todos no Setor 417 para as portas de atracação auxiliares.
Era o seu setor, por sorte Thane já estava perto. Então foi capaz de entrar
primeiro na formação bem na frente. O seu macacão de mecânico tinha
algumas manchas de graxa. Mas isso não era inadequado para o meio de um
turno de trabalho. Mesmo assim, ele se sentiu desleixado em comparação
com os muitos oficiais ao redor que usavam uniforme oficial ou armadura de
reluzente stormtrooper.
O comandante, provavelmente não notaria. O oficial caminhou na frente
de todos e anunciou.
— A partir de hoje a Estrela da Morte está totalmente operacional e é
desejo do Imperador que demonstramos o seu poder para toda a galáxia!
Alguns soltaram um grito empolgados. Thane aplaudiu um pouco. Ele
imaginou que levariam à estação para perto da órbita planetária a fim de que
a população visse, o quê surpreenderia a todos. Ele tinha sentido os motores
principais funcionando, então obviamente a estação havia viajado para
algum lugar importante. Quem sabe Coruscant.…
As portas do hangar se abriram, embora Thane soubesse que havia
campos de força que mantinham atmosfera dentro da estação. E o frio hostil
do lado de fora. ele estremeceu assustado a observar a vasta escuridão, além.
Lentamente enquanto a porta se abria um mundo surgia. A esfera azul suave
parecia emitir sua própria luz, e como sempre Thane pensou em como os
planetas pareciam lindos ainda que frágeis quando vistos daquela distância.
— Contemplem o planeta Alderaan. — Disse o comandante.
O lar de Nash! Thane não podia deixar de sorrir. Que sorte estar perto
daquele mundo enquanto o Devastador visitava a Estação. Quantas vezes
Nash havia prometido mostrar a Thane todos os pontos turísticos. Na época
aquilo parecia apenas um sonho, mas agora Thane realmente poderia dar
uma olhada em Alderaan por conta própria. Se conseguisse um tempo livre.
Thane começou a lembrar de todas as histórias que Nash havia contado
sobre os melhores lugares para ir. A incrível beleza natural para qual o seu
mundo era nomeado. Para onde iremos primeiro? As Cataratas de
Nebulosas? A floresta Tropical de Isatabith?
— Como alguns de vocês, sabem. — Disse o comandante. — Alderaan é
representado no senado Imperial por uma integrante da família Organa.
Entretanto, descobrimos que a senhora, seu pai e acreditamos todos os
escalões superiores do governo alderaaneano tem financiado e apoiado
secretamente Aliança Rebelde.
As palavras demoraram um pouco para serem absorvidas. Thane não
tinha certeza de que ouvir corretamente. Como a família real de Alderaan
podia estar envolvida com terroristas? A natureza cética de Thane lhe dizia
que ninguém era puro ou nobre demais para ser corrompido. Mas ao mesmo
tempo, pessoas que se beneficiavam do status quo, raramente tentavam
alterá-lo.
O comandante prosseguiu:
— Esta estação foi escolhida para enviar uma mensagem a toda a
galáxia. Vamos demonstrar que a força do Império a suprema agora e para
sempre. Vida longa ao Imperador!
— Vida longa ao Imperador! — Gritaram todos os oficiais em posição de
sentido, incluindo Thane. Ele mal prestava atenção nas palavras, que àquela
altura já estavam decoradas. A sua mente ainda tentava entender o que tinha
acabado de ouvir.
Então uma vibração bunda no núcleo da estação, diferente mais poderosa
do que qualquer coisa que Thane havia sentido antes percorreu a nave. Seus
cabelos se arrepiaram. Embora, ele não soubesse se era por medo ou pela
ionização da atmosfera.
O que está acontecendo? Ele se perguntou...
...então a Estrela da Morte atingiu Alderaan com um raio, e o planeta
inteiro explodiu diante dele.
EM ESTADO DE CHOQUE, QUASE ENTORPECIDA, Ciena pensou,
Veja pelos meus olhos.
Ela deveria deixar Wynnet ver tanto o terrível quanto o belo. Isso
significava que tinha de mostrar aquilo.
Na tela fragmentos do planeta Alderaan se dispersaram em mil direções.
Todos brilhando com o calor da Morte daquele mundo se ela pensou nos
bilhões de pessoas que haviam acabado de morrer diante dos seus olhos e
teve vontade de chorar. Mas então viu oficial ao seu lado na estação de
missão auxiliar.
Nash Windrider tinha ficado tão pálido, que ela achou que o amigo iria
desmaiar. Ele era nativo de Alderaan, toda a sua família... todos os lugares
onde havia estado... seu lar havia acabado de ser destruído diante dos seus
olhos por deslealdade.
No mesmo instante Ciena percebeu que se Nash desmaiasse, chorasse ou
demonstrasse qualquer emoção, aquilo seria interpretado como o protesto.
Ele seria considerado culpado da mesma traição dos Organa e poderia ser
jogado na prisão, senão expulso da Frota no ato.
Ela não poderia ajudar mais ninguém, então decidiu que ajudaria Nash.
Estendendo a mão se tocou o braço do amigo para servir de apoio. Ele
respondeu agarrando os dedos dela e apertando os com tanta força que doeu,
mas ela não soltou. Em vez disso, viu Nash se forçar a respirar fundo
segurando firme como mão da amiga fosse a corda de um rebocador o
levando para a praia.
Para casa, Ciena quase pensou. Mas se corrigiu a tempo.
Depois da explosão Ciena levou Nash até o elevador que o conduziria de
volta ao Devastador para que ele pudesse entrar na nave. E talvez ficasse um
pouco sozinho em seu alojamento. Nash ficou calado o tempo todo se quer
fez contato visual com Ciena. No último segundo, antes que as portas se
fechassem. Ela o ouviu se encostar com força na parede do elevador para
não cair.
Pelo menos ela tinha algumas horas livres para pensar e uma velha amiga
com quem conversar. Não, não era o velho amigo que ela mais queria ver,
mas ainda assim era um rosto bem-vindo.
— Naturalmente. eu sabia de todo o potencial do canhão. — Jude disse
para Ciena, enquanto as duas estavam sentadas num dos postos de
observação diante de uma fileira de janelas. — O super laser é alimentado
por uma série de cristais kyber gigantes, o que ele fornece energia quase
ilimitada. Mas achei que ele seria usado para destruições de asteroides, para
fins de mineração ou em mundos desabitados. Não assim.
Ciena observou ao redor para checar se alguém podia ouvi-las. Antes de
perguntar.
— Jude, você acha que... o que vimos hoje, o que a Estrela da Morte fez.
Você acha que existe alguma justificativa para isso? Será que pode haver
alguma justificativa?
Em vez de responder de imediato, Jude ficou muito quieta, pensando.
Ciena sempre gostou disso na amiga. À maneira, calma e racional como Jude
lidava com as coisas, quando eram jovens Cadetes, às vezes essa seriedade
era motivo de zombaria de suas colegas de quarto, mas agora, Ciena estava
grata pela personalidade da amiga.
— Embora, eu esteja na ativa apenas algumas semanas. — Jude
finalmente disse. — Já se tornou evidente pra mim e Aliança Rebelde é um
grupo muito maior e mais perigoso do que as transmissões oficiais admitem..
Não estamos operando como militares tem tempo de paz. Nossos
preparativos são mais adequados para Tempos de Guerra.
Ciena já tinha percebido parte disso sozinha, mas quando Jude colocou
em palavras, tudo ficou claro. A ameaça apresentada pela Aliança Rebelde
era muito real.
Jude continuou.
— Os Organa eram culpados de traição, mas a maioria dos cidadãos não.
Pelo menos foi rápido, Ciena pensou, mas a racionalização parecia
superficial, mesmo em pensamento. Imaginou como criança olhando para o
alto e vendo o céu azul virar vermelho. Se dando conta por um momento que
aquilo só podia ser o fim. O medo que as crianças de Alderaan teriam
sentido... o horror...
— Mas é incorreto pensar no que aconteceu a Alderaan como uma
punição para a população. — Disse Jude mais enérgica. — A única
justificativa para este ato extremo é que só ele é capaz de acabar com uma
ameaça ainda maior. Os Rebeldes devem ser responsáveis, tolos até, para
tentar vencer toda a frota do Império. Então como podemos fazer com que
caiam e si? ao compreenderem as limitações de seu poder e a inevitabilidade
da vitória do Império? Nada a não ser uma demonstração dessa escala
poderia conseguir isso. Agora com certeza os Rebeldes viram que seus
objetivos são impossíveis e suas táticas tolas. Agora estamos a salvo da
Guerra. Os bilhões de pessoas que morreram hoje podem ter salvado
incontáveis vidas com o seu sacrifício.
Isso tinha de ser verdade nem uma célula terrorista na galáxia por mais
dedicada ou sedenta de sangue podia acreditar que tinha o poder de derrotar
o Império. Mas esse foi um sacrifício que os habitantes de Alderaan nunca
escolheram fazer.
Jude suspirou e olhou para a sua bebida por um momento por algum
motivo, o jeito que luz caia ou a expressão perdida no rosto de Jude, amiga,
parecia jovem demais como quando se conheceram mais de três anos antes.
Seu uniforme passado e feito sob medida parecia uma fantasia para uma
brincadeira de criança. Talvez Ciena também se sentisse jovem demais para
ir a guerra.
Sem dúvida, todo mundo se sentia assim no começo.
Ciena começou.
— Então o que aconteceu hoje... O imenso número de pessoas mortas foi
para evitar que ainda mas morressem uma grande Guerra Galáctica.
— Exatamente. — Jude concordou. — Pense nos milhões que pereceram
nas Guerras Clônicas.
— Mas acabando com a guerra agora antes que ela começa de verdade a
Estrela da Morte salvará mais vidas do que tomou. — Era uma coisa difícil
de pensar, o tipo de cálculo sombrio que Ciena havia torcido para jamais ter
que fazer fora da Aula de Ética de comando. Agora, porém ela tinha que
enfrentar e cumprir o seu dever.
Se ao menos o Império não tivesse sido forçado a efetuar uma ação tão
drástica. Se Aliança Rebelde não tivesse surgido, seja lá por qual mistura de
descontentamento e arrogância que impulsionava seus líderes. Esses
terroristas acreditavam que o Império jamais contra-atacaria. Agora
finalmente eles viram que estavam errados, mas Ciena se perguntou se seus
líderes algum dia assumiriam a responsabilidade das terríveis medidas
necessárias para deter essa rebelião. Essa guerra antes que toda a galáxia
mergulhasse no caos. Provavelmente não.
A rebelião havia começado aquela situação, até mesmo provocado.
Ciena se sentia melhor agora que sabia a quem culpar.
Um anuncio ecoou nos alto-falantes e os oficiais ergueram na cabeça
para prestar atenção. — Atenção: o Devastador partirá dessa da Estação no
começo do próximo turno. Toda a tripulação deverá estar à bordo e
preparada para as novas ordens.
— Ah, não. — Ciena não queria deixar Jude justo quando a amiga está
fazendo o mundo voltar a ter sentido. A última coisa de que Nash precisava
agora era de mais um turno desgastante em vez de um tempo para se
recuperar e ela nem tinha visto Thane. Ao menos...
— Duvido que o Devastador demore a voltar. — Disse Jude. — Dizem
que o Lorde Vader pretende permanecer aqui até que a crise atual tenha sido
resolvida. O Devastador é a ponte de comando dele, então vocês fariam
apenas algumas poucas missões sem ele.
Com certeza . Ciena ficou animada. Fosse qual fosse missão que
guardava o Devastador, ela não poderia passar mais de duas semanas fora.
Não sem Darth Vader a bordo.
— Então, nos veremos em breve.
Elas se abraçaram e se despediram rápido antes de ser a seguir para o
corredor. Quase não percebeu a atividade ao redor, a enormidade da Estação
não a impressionou. A sua mente já estava no futuro, ajudar a Nash nos
próximos dias, voltar até Lorde Vader... Parecia provável que o Devastador
ia visitar a Estação com frequência. Então teria muitas chances de encontrar
Jude. Ela estaria de volta para ver Thane tão rápido que seria como se nunca
tivesse ido embora.
Depois de algumas horas em seu posto, as orelhas de Ciena doíam por causa
dos zunidos agudos de transmissões mal filtradas. Sua cabeça estava zonza
com as intermináveis quantidades de dados que ela tinha de processar
rapidamente. Por ora, ela devia dar à nave e ao Império tudo o que podia.
Os oficiais seniores do Devastador pareciam estar em conferência há
horas. Se algum deles sabia a razão por trás do súbito e aterrador silêncio da
Estrela da Morte, ainda não tinham compartilhado com a tripulação.
Por enquanto Ciena não podia fazer nada além de continuar a análise de
infinitos pacotes de dados enviados da Estrela da Morte antes do silêncio.
Muitos deles não continham qualquer informação útil, mas até que existisse
uma explicação concreta, ela não podia se dar ao luxo de ignorar nada.
Quando reconheceu o número de Jude em um dos pacotes, ela o abriu
imediatamente. Não se importava se aquelas informações eram importantes
ou não; Ciena precisava saber o que Jude estava fazendo antes que a Estrela
da Morte... fosse danificada ou infiltrada ou o que quer que tivesse dado
errado.
Mas os dados de Jude eram importantes. Ciena leu um relatório para seu
oficial superior e todos os comandantes locais, no qual Jude explicava que
sua análise havia demonstrado que o ataque rebelde com os pequenos caças
de fato ameaçava a Estrela da Morte. Ela tinha encontrado uma falha de que
ninguém mais havia suspeitado — algo a ver com uma saída de exaustão —
e havia previsto um ponto fraco onde todo mundo via invulnerabilidade.
“Embora a probabilidade de um ataque direto seja remota, as
consequências poderão ser altamente destrutivas para a estação, até mesmo
fatais”, Jude havia escrito.
Se alguém enviara uma resposta ao aviso de Jude, Ciena não encontrou.
Fatal para a estação? Para a Estrela da Morte? Não. Jude devia estar
dizendo apenas que oficiais seriam mortos em alguma pequena explosão.
Isso fazia muito mais sentido do que a ideia de que uma X-Wing poderia
destruir algo do tamanho de uma lua.
Entretanto, as trevas e o silêncio permaneciam.
Pouco depois de Ciena ter enviado essa informação ao comando, recebeu
uma mensagem para se apresentar ao hangar 47. Nash a encarou enquanto
ela saía, obviamente tão curioso quanto a amiga sobre o que poderia estar
acontecendo. Ciena esperava ser capaz de explicar em breve.
Em vez disso, descobriu que tinha uma nova missão.
Um comandante de rosto duro disse a ela e a outra pilota:
— Tenente Ree, tenente Sai, vocês devem pegar um cargueiro classe
Gozanti até o sistema de Yavin para encontrar Lorde Vader e trazê-lo de
volta ao Devastador.
Era como se faixas de aço que apertassem seu corpo fossem subitamente
soltas. Ciena se segurou para não suspirar em voz alta. Darth
Vader está vivo. Ele foi capaz de contatar nossa nave. Então seja lá o
que tenha acontecido na Estrela da Morte não foi o pior. Ela ainda não havia
se permitido imaginar o que poderia ser “o pior”.
— Vocês não devem falar de sua missão a ninguém, nem durante sua
jornada nem em qualquer momento posterior — o comandante continuou. —
Vocês manterão o silêncio de comunicações a menos que Lorde Vader
ordene o contrário... ou se o encontro não acontecer conforme o planejado.
O que significa isso? Ciena lançou um olhar para sua colega pilota, cuja
expressão era igualmente fria.
Mas assim que ficaram a sós na cabine de pilotagem do cargueiro, a
tenente Sai provou ser tudo menos rígida.
— O que vamos fazer? — ela disse assim que a nave entrou no
hiperespaço. — Voar até a Estrela da Morte em total silêncio, sem perguntar
nada? Nem sequer pedir permissão para atracar?
— Vai fazer mais sentido quando chegarmos lá — disse Ciena.
— Por que está tão certa disso?
— Porque não pode fazer menos sentido do que faz agora.
Isso rendeu uma risada da colega.
— É verdade. A propósito, meu nome é Berisse.
— Ciena.
Berisse havia se formado na academia em Lothal no ano anterior. Seu
sorriso brilhava, contrastando com sua pele bronzeada. Ela era tão
corpulenta quanto os regulamentos permitiam, com cabelos escuros e
lustrosos ainda mais trançados que os de Ciena. Quando descobriu que Ciena
só estava no Devastador havia poucas semanas, prometeu dar uma volta com
ela pela nave e até ofereceu um pouco de simpatia por Nash.
— Que situação difícil — ela disse. — Imagine descobrir que todo seu
planeta virou traidor?
Nem mesmo isso pode ser tão ruim quanto vê-lo ser completamente
destruído, Ciena quase disse, mas foi aí que os sensores começaram a soar.
— Yavin — ela disse, voltando para sua posição nos controles.
— Saindo do hiperespaço.
— Saindo do hiperespaço — confirmou Berisse. Ela também tinha
voltado ao seu modo oficial.
O medo que Ciena tinha deixado de lado enquanto conversava com
Berisse retornou mais forte do que antes. Ela pensou que pelo menos saberia
como realmente estava a estação. Não teria mais que se preocupar com Jude.
Nada podia ser pior do que a ignorância.
O cargueiro saiu do hiperdrive e caiu direto no meio do inferno.
Berisse engasgou. Ciena não conseguiu sequer respirar. Elas estavam nos
arredores de um vasto campo de escombros, metal retorcido flutuando em
todas as direções. Alguns pedaços eram enormes, do tamanho de um
cruzador leve, mas outros eram fragmentos menores que uma cabeça
humana. Lascas bateram nas janelas do cargueiro e grudaram, parecendo
gelo ou rachaduras.
— Não posso acreditar — Berisse disse com a voz trêmula.
— Desapareceu. Ela sumiu completamente.
A Estrela da Morte tinha sido destruída.
O aviso de Jude ecoou mais alto na cabeça de Ciena. Fatal. Agora ela
sabia que Jude estava morta.
Alguns outros colegas de classe tinham sido designados à Estrela da
Morte; pelo menos uma dúzia de pessoas que Ciena conhecia tinha sido
assassinada naquele dia. Milhares e milhares de soldados, a maioria deles
sequer em seus postos de combate — deviam estar dormindo, comendo,
tomando um drinque em um dos bares, sem ter ideia de que aquele momento
era o seu último. Mas Jude estivera ciente do perigo. Será que ela teve
medo? Em seus últimos e terríveis momentos, será que Jude soube que era o
fim? A ideia fez a garganta de Ciena apertar e seus olhos se encherem de
lágrimas.
— O sinal de Lorde Vader — Berisse saiu do estado de choque para
voltar ao trabalho. — Vamos lá.
Entorpecida, Ciena guiou o cargueiro tangenciando a margem do campo
de escombros. Ela queria chorar, gritar. Os comandantes deviam saber o que
havia acontecido. Por que não tinham contado à trota? A toda a galáxia? Mas
talvez tivessem acreditado tanto quanto ela que aquilo era impossível. Ciena
finalmente reconheceu que sua missão não era só recuperar Darth Vader
como também confirmar que o pior havia acontecido. Eles a haviam enviado
para ser testemunha de outro massacre.
Sua tristeza por Jude inundou sua mente até ela não conseguir sentir mais
nada. Ciena agiu no automático ao se aproximarem do TIE Fighter
danificado de Lorde Vader, feliz pelo treinamento que lhe havia ensinado a
reagir independente das condições emocionais.
A nave de Vader lentamente tomou forma na escuridão. Primeiro Ciena
viu a rotação estranha de várias peças de escombros, como se estivessem
sendo empurradas para longe por raios repulsores. Então viu a forma de um
TIE fighter com asas em ângulo. Vader estava voando logo além do campo
de escombros que se expandia.
— Iniciando sequência da comporta — disse Ciena. Ela estava feliz por
Berisse não conhecê-la muito bem ainda, porque não notaria como sua voz
tinha ficado tensa e estranha. — Três... dois... um.
Berisse apertou os controles que soltariam um dos quatro cabos de
atracação da quilha da nave. Com cuidado, elas estenderam o tubo até o topo
da cabine esférica do TIE Fighter.
— Já viu Lorde Vader pessoalmente? — Berisse perguntou com
suavidade.
— Eu... hã, não. — Ciena mal conseguia se concentrar para falar.
— Vou deixar você ir lá atrás cumprimentá-lo.
Normalmente, oficiais do Império lutavam para serem os primeiros a
falar com qualquer um em um posto mais elevado. Eram oportunidades de se
destacar. Ciena nunca havia ligado menos para isso do que naquele
momento. No entanto, tinha a impressão de que Berisse não estava lhe
fazendo um favor.
Dizem que ele é um grande homem, ela lembrou enquanto estava parada
na comporta, esperando o sinal de liberação para entrar no hangar. Que caiu
nas graças do Imperador. E dizem que ele próprio pode controlar a Força
como deseja. Embora Ciena acreditasse na Força, ela duvidava que alguém
pudesse controlá-la completamente. Ela se perguntou se alguém provaria que
ela estava errada.
Ciena precisava de um oficial superior a quem pudesse respeitar. Alguém
que assumisse o controle, alguém em quem ela pudesse depositar sua
confiança. Ela saiu para o corredor da comporta quando a porta de pressão
pressurizada abriu. Mais calma, ela avançou...
... e parou ao ver Vader pela primeira vez.
Ele estava totalmente envolto por uma armadura preta. Mas aquilo não
era o equipamento de um piloto de TIE Fighter. Ciena logo reconheceu um
traje de suporte vital, um dos mais completos que ela havia visto ou
imaginado. Nenhuma parte da pele de Vader era visível
sob sua carapaça reluzente, e uma capa preta o recobria dos ombros ao
chão como uma mortalha. Quando ele avançou, ela percebeu como era alto,
mais que qualquer outro humano que ela havia encontrado. No corredor
estreito, sua estatura era ainda mais intimidadora. Mas o pior de tudo era o
som de sua respiração. O ruído áspero de seu aparelho preenchia todo o
espaço.
O que ele é? Ciena se perguntou. Sua mente estava em dúvida e se
recusava a aceitar Lorde Vader como humano. Ele parecia mais uma visão
de pesadelo, ou uma criatura das histórias apavorantes que sua mãe
costumava contar em volta da fogueira na reunião de família. O mal parecia
emanar dele e se acumular no espaço ao redor. Ciena sentiu o colarinho do
uniforme apertar.
Apenas alguns momentos antes, ela estivera determinada a cumprimentar
seu oficial superior com dignidade. Agora ela apenas torcia para não
desmaiar.
Quando Darth Vader se afastou da comporta, ela ouviu sua voz metálica
e profunda pela primeira vez.
— Você está aqui por ordem do Imperador?
— Recebemos as ordens do comando do Devastador, senhor
— Ciena conseguiu responder. Ela teve de lutar contra a necessidade
instintiva de se afastar de Vader. — Não tenho informações sobre o contato
deles com o Imperador.
Vader ficou pensando nisso pelo que pareceu um bom tempo. O
nervosismo de Ciena continuou a aumentar até ele ordenar:
— Você e quem mais estava pilotando vão permanecer no porão pelo
resto da viagem. Eu assumirei o comando do cargueiro até voltarmos ao
Devastador.
— Sim, senhor.
Ela não se importava em ser levada de volta para o Star Destroier como
se fosse carga. Ciena estava feliz em afundar no chão, apoiar a cabeça nos
joelhos e respirar fundo. Pelo menos ela não precisava agir. Nem pensar.
Tentou esquecer que tinha visto Darth Vader e quase conseguiu. Sua mente
arrasada só conseguia pensar no cenário de devastação que havia
testemunhado e em seu luto por Jude.
Mil lembranças de sua amiga brilharam como velas na memória de
Ciena: momentos em que riam e conversavam em suas camas tarde da noite,
como Jude correra em sua defesa quando tinha sido acusada de sabotar o
canhão laser de Thane e como a reconfortara depois da briga entre os dois, e
até mesmo como parecera inesperadamente glamorosa na recepção. Uma das
melhores amigas que ela teve, ou jamais teria, havia sido aniquilada, virado
átomos.
Berisse se desculpou quando se juntou a Ciena.
— Lorde Vader pode ser um pouco... avassalador quando você o vê pela
primeira vez.
— É — Ciena disse, cansada.
— Não achei que eu pudesse aguentar. Não significa que seria mais fácil
para você. Desculpa. — Berisse se recostou contra a parede como uma
marionete livre de suas cordas. — Eu sei que ele está só vestindo um traje de
suporte vital e é idiota ficar com medo de alguém que tem necessidades
diferentes, certo? Mas aquele respirador...
— Ele pode estar nos monitorando agora — Ciena ressaltou. Berisse
ficou calada.
O plano de cinco anos de Thane caiu por terra oito dias mais tarde, enquanto
ele voava sobre a Província do Mar Inferior.
Ele fez mergulhos e piruetas dramáticos para obter um efeito melhor. O
grito característico dos motores de um TIE Fighter ecoaria nos desfiladeiros.
Ninguém que ouvisse aquilo poderia duvidar de que o Império continuava
forte e onipresente por toda a galáxia. Quando voltou a se encontrar com a
tropa local para pegar seu almoço, Thane estava muito satisfeito consigo
mesmo.
Ao caminhar na direção do quartel local, contudo, seu sorriso
desapareceu.
Uma fila de trabalhadores se arrastava ao longo da trilha vinda da
entrada da mina. Na maioria das minas de especiarias que Thane tinha visto
até então, droides e autômatos menores eram a principal força de trabalho.
Ah, porém, os mineiros eram todos seres sencientes, cuja espécie ele
reconheceu: um povo reptiliano pálido chamado bodach’i. O planeta desse
povo havia resistido constantemente aos regulamentos do Império. Todos
sabiam disso, pois os bodach’is haviam desafiado o Império abertamente.
Mas, alguns meses antes, o Império anunciara que a ordem tinha sido
restaurada e que novas
sanções foram executadas.
Thane imaginara que as tais “sanções” significavam multas ou
penalidades no comércio, não escravidão.
Os bodach’is usavam colares e pulseiras de restrição. Sozinhas, as
restrições apenas faziam peso e dificultavam a mobilidade. No entanto,
qualquer desvio das tarefas e dos caminhos programados resultaria em
choques elétricos ou até mesmo em pontas de metal que perfuravam a pele
do usuário.
Eu achava que essas restrições eram para criminosos violentos, não
para... gente comum, Thane pensou ao caminhar lentamente ao longo da
fronteira do posto imperial. Mais além, os bodach’is cambaleavam,
proibidos de parar para descansar. Eram monitorados por stormtroopers que
ficavam a muitos metros de distância um do outro ao longo da fila que
parecia se estender ao infinito. Alguns aldeões assistiam à cena, com medo
silencioso ou completa apatia — Thane não sabia distinguir.
A garganta dele ficou apertada e seu estômago embrulhou quando ele viu
os bodach’is lutando para conseguir caminhar. A maioria deles sequer era
adequada para trabalho. Havia crianças bodach’is, que não eram grandes o
bastante para levar a carga que tinham recebido. Anciãos também, com as
escamas secas pela idade.
Isso era errado. Pior que errado, era crueldade. Se os bodach’is haviam
desafiado o Imperador, sanções seriam apropriadas, mas não isso. Nada
justificava castigar toda uma espécie dessa maneira.
Escravizando-a.
Por que ninguém ajuda essas pessoas?, Thane se perguntou ao encarar
as expressões vazias dos nativos. Os colares dos bodach’is podiam ser soltos
durante a noite e suas fugas, ocultadas...
Então ele se deu conta: ninguém ajudava os bodach’is porque ,SE»dos
temiam o Império. Quando Thane voava acima das pessoas, exibindo o grito
dos motores de seu TIE Fighter, ele as assustava ainda .suais.
O peso esmagador dessa verdade caiu sobre ele, e por um momento
Thane pensou que fosse sufocar.
Uma criança nativa havia começado a zombar dos bodach’is.
— Isso é o que vocês merecem! Achavam que podiam enfrentar o
Imperador? Ele deu uma lição em vocês!
Um dos stormtroopers assentiu em aprovação, e deu palmadinhas suaves
na cabeça da criança. O garoto não podia ter mais que sete ou oito anos — a
idade que Thane tinha quando decidiu entrar para a frota do Império. Era
assim que o mal ganhava mais espaço: criava raízes nos jovens e crescia
junto com eles. Cada geração elevava o abuso a outro nível.
Estamos ensinando crianças a aprovar a escravidão. Estamos ensinando
a elas que crueldade é uma virtude.
Mas o pior era que... Thane havia sido aquele garoto. Ele tinha sentado
na cadeira do piloto de um transporte e sentido orgulho. Sentido grandeza.
Tudo porque ele poderia ser parte do Império um dia. Ele havia seguido
aquele caminho, e aonde isso o levara? Agora ele pilotava naves apenas para
assustar pessoas, em nome de um Império que destruía mundos inteiros. Se
pudesse voltar, teria a força de escolher um caminho diferente?
Será que eu teria a força de fazer isso agora?
Outro stormtrooper deu um tabefe em uma bodach’i, que cambaleou para
o lado. Com o golpe, ela perdeu muitas escamas e a sua cauda se arrastou
pela areia, embora o terreno áspero e acidentado já a tivesse ferido
incontáveis vezes àquela altura. A fraqueza da criatura atingiu Thane como
uma lança, especialmente porque não havia nada que ele pudesse fazer.
Absolutamente nada, não contra toda uma tropa de stormtroopers. Ele só
podia ficar ali e observar; reconhecer sua participação no mal que
testemunhava.
Naquela noite, ele pagou uma quantia exorbitante de créditos para comprar
uma mensagem na HoloNet. Se Ciena não recebesse o sinal a tempo ou não
estivesse livre para responder, ele teria que tentar de novo no dia seguinte.
Para o alívio de Thane, ela respondeu quase de imediato. Ele sentou na
holocabine escura e sentiu os raios quentes de luz escanearem seu corpo e
seu rosto...
... e Ciena se materializou diante dele.
O holograma dela era quase do tamanho natural. A luz azul suave
captava cada detalhe dela: os cachos meio soltos nas costas, os lábios
grossos, a maneira como ela sorriu ao vê-lo.
— Não estava esperando por isso — ela disse, a voz apenas um pouco
alterada pela transmissão. Vestia a calça do uniforme, mas havia tirado a
jaqueta. A regata expunha seus braços e ombros. — Nem acredito que você
tenha pagado tão caro só para usar a HoloNet, mas estou muito feliz por ter
feito isso! E tão bom te ver.
— Melhor ainda é ver você. — A visão dela naquele momento causava
tanta animação como quando ele a vira no Devastador. Thane se sentiu tão
agradecido e feliz pelo simples fato de ela estar viva. — Eu precisava
conversar. Espero não ter te acordado!
— Não, meu turno acabou agora, e minha colega de quarto saiu.
Aquele termo pareceu peculiar a ele.
— Colega de quarto? No singular?
O sorriso de Ciena brilhou na escuridão da holocabine.
— Você está falando com a capitã tenente Ree. Fui promovida ontem!
— Isso é fantástico! — Ainda que os dois não ligassem muito para
promoções num momento como aquele, Thane conseguia apreciar o que a
nomeação significava para Ciena. Era a prova de que ela havia cumprido seu
dever de forma brilhante. — Mas não me surpreende. Não por ser alguém
tão bom quanto você.
O elogio fez Ciena ficar séria, porém.
— Não é só pelo meu desempenho. Isso não é sequer o principal motivo
para a promoção. Fui promovida porque o Império perdeu muita gente na
Estrela da Morte.
E claro. A estação abrigara muitos dos altos oficiais da frota e suas
equipes. Agora havia um vácuo na hierarquia de poder.
— Tudo mudou — ele disse, com cuidado.
Ciena assentiu. Uma alça da regata escorregou pelo ombro dela, e a
ilusão do holograma era tão intensa que Thane queria inclinar para a frente e
colocá-la de volta no lugar — ou, quem sabe, abaixar a outra também. Mas
ele tinha que se concentrar. Tinha que pensar. Mensagens na HoloNet como
aquela não seriam diretamente monitoradas, mas havia programas para
pesquisar o que fora dito e procurar palavras ou frases suspeitas.
Então Thane não podia simplesmente dizer o que estava pensando. Nem
ela. Mas talvez pudessem fazer com que o outro compreendesse.
Ciena estava sentada na beirada da cama, absorvendo a visão do
holograma de Thane na sua frente. Na escuridão, ela quase podia fingir que
ele estava mesmo ali.
— Está tudo bem com você? — ela perguntou, falando o mais baixo que
podia. — Por mais feliz que esteja por poder conversar, sei que não teria me
surpreendido assim sem motivo.
O rosto de Thane estava gravado em luz dourada, apenas um tom mais
claro que seu cabelo ruivo. Em suas feições, ela podia ler a mais profunda
preocupação e tristeza.
— É difícil saber como seguir em frente depois de uma tragédia dessas
— ele comentou.
Ciena voltou a pensar em Jude e teve que piscar para não chorar.
— Também não consigo tirar isso da cabeça. E como se a explosão
acontecesse toda hora na minha mente, e eu quero salvá-los, mas não
consigo. Simplesmente não consigo.
— Você acha que temos que esperar para ver o que acontece com esta
guerra? — Os olhos de Thane examinavam os dela com tanta intensidade
que era como Se ele realmente estivesse ali. — Ou será que isso muda como
pretendemos seguir a partir daqui?
O coração dela doía ao pensar que ele estava a sistemas de distância,
tentando imaginar em vão a estratégia que lhes daria uma vitória rápida e
evitaria mais banhos de sangue. Aqueles sonhos eram naturais, mas não
passavam de sonhos.
— Não podemos apenas ficar de fora e deixar essas coisas acontecerem
— Ciena lembrou. — Não quando podemos fazer a diferença. Não importa o
que a gente precise fazer nem sacrificar, vamos encarar o que vier. Juntos.
— Juntos — Thane repetiu com um sorriso tão triste que ela podia sentir
a fragilidade do garoto, que assim como a dela era real e doía como uma
ferida.
Ciena estendeu o braço para tocar a mão do holograma. Thane retribuiu
o gesto e a luz tremulante de seus dedos atravessou levemente a mão real
dela.
— Sinto sua falta — ela disse mais uma vez. As palavras eram tão
insuficientes; nada que pudesse dizer comunicaria o que sentia.
— Não vai demorar até ficarmos juntos de novo — Thane prometeu com
tanta confiança que ela teve de acreditar. Na verdade, ele parecia tão seguro
que Ciena se perguntou se já tinha recebido suas próximas ordens e sabia
algo que ela desconhecia.
Thane abaixou a cabeça e olhou para a mão dela, esculpida em luz azul
tremulante, estendida na direção dele.
— Espero que você tenha razão. — A voz de Ciena ecoou dentro da
cabine. — Gostaria que fossem apenas alguns dias. Pensando melhor...
gostaria que estivesse comigo agora.
— Eu também. — O medidor começou a piscar, sinal de que o tempo
dele estava acabando. Thane queria colocar mais créditos e comprar mais
alguns minutos, mas já haviam dito tudo o que era possível dizer, e agora,
mais do que nunca, ele precisava poupar dinheiro para coisas mais
importantes.
— Tenho que ir. Desculpa a ligação tão rápida, Ciena...
— Tudo bem. Estou muito feliz de ter visto você. — Ela beijou a ponta
dos dedos e os estendeu até que seu holograma tocasse o lábio dele. Thane
imaginou que podia sentir a energia dos feixes, elétricos e quentes. — Tchau.
— Tchau — ele disse um instante antes de a imagem dela desaparecer.
Enquanto caminhava da holocabine até seu alojamento, Thane ficou
repetindo mentalmente a conversa, maravilhado com o fato de que tinham
conseguido dizer tudo sem dizer nada. Ciena tinha concordado com ele a
respeito da tragédia de Alderaan e sentia o mesmo desejo desesperado e
inútil de salvar o que fora perdido. Mais do que isso, ela tinha concordado
que ele não podia simplesmente ficar por ali a serviço do Império, fazendo o
que mandassem. Eles tinham que agir imediatamente.
Thane já tinha em mente qual deveria ser seu caminho, mas, agora que
sabia que Ciena estava a seu lado, nada poderia detê-lo.
No dia seguinte, ele completou seu voo matinal como de costume, depois
conseguiu trocar sua missão seguinte para um voo noturno, em vez de
vespertino. Usou as horas da tarde para sacar o máximo de créditos possível
da conta, trocá-los por especiarias e depois trocar as especiarias por créditos
sem marcas. Com o dinheiro, Thane comprou roupas civis: uma jaqueta
azul-escura, calças e botas pretas e uma camisa cinza que passaria
despercebida em qualquer planeta da galáxia.
Mais tarde, foi para o porto espacial e encontrou um cargueiro
independente.
— Quero chegar ao terminal mais próximo — Thane disse, tentando soar
tão confiante e arrogante quanto os personagens dos holos que assistia
quando criança. — Isso é tudo que você precisa saber. Não faça perguntas e
receberá dois terços da taxa adiantados, e um terço no pouso.
O piloto reptiliano falleeniano riu.
— Humano bobo. Eu nunca faço perguntas. Está pronto para partir?
Decolamos em uma hora.
Thane pensou em Ciena e hesitou. Ela saberia onde encontrá-lo?
E claro que sim. Talvez ela até já tenha deixado o Império, talvez já
esteja lá. Nós dois vamos na mesma direção. Nada na galáxia pode nos
deter.
— Sim — disse Thane. — Estou pronto.
Uma hora depois, Ciena estava sentada com Thane no bar no térreo. Ela
tinha medo de que pudessem ser ouvidos, vistos, ou até denunciados, mas
Thane balançou a cabeça.
— Confie em mim — disse. — O tipo de pessoa que vem até aqui quer
distância dos oficiais do Império. Ninguém que conhecemos vai aparecer.
— Não vale o risco — ela disse.
Mas o maxilar de Thane havia travado do jeito que ela sabia que
indicava determinação completa — ou apenas teimosia.
— Se eu não saísse daquele quarto, ficaria louco. Confie em mim. É
seguro.
Eles de fato tinham um canto inteiro do lugar só pra eles. A maioria dos
frequentadores era de recém-chegados ao planeta, e não de nativos, e estava
aglomerada na frente, perto das telas. Ela e Thane ficaram sozinhos numa
mesinha. O simples fato de estar num bar de quinta categoria como aquele
teria deixado Ciena nervosa se ela não estivesse tão determinada a tentar
impedir Thane de cometer o maior erro de sua vida.
— Você pode voltar — ela repetiu. — Sei que pensa que vão prendê-lo, e
em qualquer outro momento eles fariam isso mesmo, mas precisam
desesperadamente de oficiais qualificados depois do que aconteceu.
— Não quero voltar — ele disse, e não pela primeira vez.
Ciena ainda se recusava a acreditar.
— Três anos na academia, todo aquele trabalho, todo aquele esforço...
por nada?
— Acha que estou feliz com isso? Não. Mas depois do que vi, o que o
Império está fazendo com os bodach’is, depois de Alderaan... não posso
mais usar esse uniforme. — Thane se curvou sobre seu copo de cerveja com
a mão na cabeça, como se estivesse com enxaqueca. — Achei que havíamos
concordado com isso.
— Achei que havíamos concordado que, depois do que aconteceu a
tantos amigos nossos a bordo da Estrela da Morte, precisávamos ficar juntos.
Os rebeldes mataram milhares de nossos colegas oficiais. Eles mataram o
Grão-Moff Tarkin...
— Tarkin foi bom para nós — Thane admitiu. — Conhecê-lo mudou
nossas vidas.
— ... e mataram Jude — Ciena continuou. — Você acha isso bom?
— Não estou entrando para a droga da Rebelião, Ciena. Não estou
defendendo o que aconteceu com a Estrela da Morte nem o que aconteceu
com Alderaan. Você está? Isso é impossível! Você nunca pensaria que
destruir um planeta inteiro era a coisa certa a se fazer.
Angustiada, ela balançou a cabeça.
— Não. Entendo o pensamento que levou ao ataque a Alderaan, mas não
defendo isso. A questão é que não preciso fazer isso. — Ciena se
aproximou, encarando os olhos azuis de Thane e desejando que ele
entendesse. — O Imperador e os Moffs têm que perceber que destruir
Alderaan não foi bom. Isso não parou a Rebelião. Talvez só tenha
desesperado os rebeldes ainda mais.
— Então dois bilhões de pessoas morreram em vão — disse Thane.
— E quase um milhão a bordo da Estrela da Morte. — Ciena se recusava
a ignorar a morte de Jude. Ela ainda tinha pesadelos em que corria pela
estação, gritando para Jude entrar numa nave auxiliar, sem nunca encontrar a
amiga. — Agora a Estrela de Morte se foi. O Imperador não poderia tomar
uma atitude tão drástica novamente mesmo se quisesse. Além do mais, o
único motivo para atacar Alderaan era impedir uma guerra ainda mais
devastadora. A guerra começou de qualquer maneira. E tarde demais para
salvar a galáxia disso. O que posso fazer é lutar do lado da lei, da ordem e da
estabilidade.
A risada de Thane foi ríspida.
— Tudo tem um fim, Ciena. Nossos pais viram a República se
autodestruir. O Império pode durar mais um ano ou mais uma década, mas
no fim das contas haverá uma nova ordem e uma nova lei. A quem você
servirá então?
— Você não precisa ser cruel só porque não vou... só porque não posso
desertar do meu posto. — Ela não conseguia sequer se zangar com Thane;
sua tristeza era grande demais para isso. É claro que ele estava com raiva por
causa da destruição de Alderaan, mas isso não tinha de mudar tudo. E é claro
que ele odiava a escravidão, ela também odiava, mas não fora o Império que
a inventara. O que estava em jogo no momento era maior do que qualquer
incidente individual, era uma questão do mais profundo princípio. — Nós
fizemos um juramento. Juramos servir o Império. Não podemos quebrar isso
nunca, jamais.
Thane balançou a cabeça. A iluminação âmbar do bar pintava seu cabelo
de um ruivo mais escuro e lançava sombras sobre seu rosto angustiado.
— Você ainda é a garota dos vales. Você não vai quebrar seu juramento,
mesmo depois de prometer servir um líder e uma frota que não te merecem.
— E você ainda é o cara da segunda leva. Você acha mais fácil quebrar
suas promessas do que cumpri-las. — Ciena sentiu vergonha das palavras
assim que as pronunciou. Era o preconceito do pai dela falando, além da
própria aflição com a ideia de perder Thane.
Ele não se ofendeu. Em vez disso, sussurrou:
— Para mim não é fácil deixar você. É a coisa mais difícil que já fiz.
Ela se virou, incapaz de continuar encarando-o.
Thane pareceu achar que ela estava reagindo daquela forma mais por
raiva que por tristeza, pois perguntou do modo mais formal que conseguia:
— Você vai me denunciar?
— Eu... — O que ela poderia fazer? Ela estava aprisionada entre sua
lealdade a Thane e sua lealdade ao Império. Por mais brava que estivesse
com Thane por desertar, ela não podia enviá-lo para a cadeia. Como poderia
fazer isso com a pessoa que amava? — Eu não sei.
— Você não sabe. Ótimo. — Ele passou a mão pelo cabelo. — Sabe pelo
menos se vai me denunciar esta noite?
Alguma coisa dentro dela quebrou.
— É claro que não.
A voz de Thane ficou ríspida e cortante.
— Então você não vai manter seu juramento? Sua preciosa honra?
— Às vezes somos leais a mais de uma coisa. Quando há conflito,
precisamos escolher qual lealdade vamos honrar. — Ciena estava tremendo.
Ela sentia como se estivesse sendo partida ao meio. — Não sei o que vou
fazer amanhã. Mas esta noite, agora, escolho minha lealdade a você.
Toda a raiva que Thane sentia desapareceu. Sua mão tocou o rosto dela,
e ela não conseguiu mais se conter. Ciena se inclinou e agarrou a jaqueta de
Thane para que ele não escapasse. A garota não queria nada a não ser que ele
ficasse com ela naquela noite, pelo máximo de tempo que pudessem. Ela
queria acreditar que ele não ia embora.
Thane voltou a beijá-la, mais forte que antes. Ciena fechou os olhos,
abraçou-o e torceu para que o tempo parasse. Aquele momento seria
cristalizado, eterno. O peito dele apertado contra o seu, o atrito suave da
barba por fazer contra seu rosto, o som baixo que ele fez quando tocou a
cintura dela.
Quando se afastaram, respirando com dificuldade, ela encostou a testa na
dele e sussurrou:
— Vamos lá pra cima.
Thane precisou tomar fôlego para responder.
— Tem certeza?
Naquele momento, ela sentiu que não podia ter certeza de nada. Thane,
que sempre fora uma das constantes em sua vida, sua estrela guia, estava
partindo para sempre. O mundo havia virado de cabeça pra baixo, e ela
suspeitava que nunca mais voltaria ao normal.
Mas era por isso que estava determinada a ter tudo o que estivesse a seu
alcance. Viver por completo aquele momento, aquela noite com Thane. Parar
o tempo.
— Sim — ela sussurrou encostando a boca na dele. — Sim.
Zeitooine era um planeta frio. Não um daqueles com inverno eterno, mas
frio o suficiente para que Thane e seus colegas de nave se deparassem com
uma geada forte. O porto espacial ficava na fronteira de uma cidade, então
ele podia avistar no horizonte as altas árvores perenes, todas sem suas
folhagens. A respiração dele soltava fumaça no ar.
— Nessas horas é bom ter pelos — disse Brill, a engenheira tarsunteana
que tinha tingido sua longa pelagem de cor-de-rosa. — Não entendo como
vocês humanos lidam com esse clima.
— As vezes me pergunto a mesma coisa. — Thane levantou a gola do
casaco. — Vamos só terminar o trabalho, certo?
Um ronronado abafado em concordância veio de Methwat Tann, o chefe
de manutenção ithoriano. Sua cabeça enorme e curvada e seu pescoço
estavam enrolados com um cachecol tricotado especialmente para ele por
Lohgarra, mas ele ainda tremia.
O trabalho em Zeitooine era bem simples: entregar vários droides
construtores. Thane ajudou Methwat e Brill a descarregar e depois se
apressou para encontrar um vendedor de peças usadas no porto espacial.
Normalmente dava para encontrar um ou dois por ali. Depois de alguns
minutos de azar, ele enfim teve coragem de perguntar para alguém, e
descobriu que o lugar mais próximo estava a dez minutos a pé. Thane
franziu a testa, checou o relógio e decidiu ir. Melhor chegar um pouco
atrasado e levar uma bronca do que trabalhar de novo com aquela célula de
energia surrada.
Então o copiloto caminhou pela cidade o mais rápido que podia até
chegar a um quarteirão cheio de pessoas... e parou. Ninguém estava andando
ou nem sequer se movendo, e finalmente ele viu por quê.
— Você está preso — um capitão stormtrooper disse com a voz
entediada enquanto uma dúzia de seus homens usavam pistolas para manter
todos afastados de uma casa da qual pessoas eram arrastadas para fora.
Uma família, Thane percebeu, chocado. Uma garota que não devia ter
mais do que treze anos chorava ao ser puxada pelos cabelos pelo
stormtrooper, tão rápido que ela mal conseguia acompanhar.
— Por favor! — a mãe pedia de joelhos diante do capitão. — Por favor!
Pagaremos as multas! Você pode vender nossa casa, tudo o que temos...
O capitão parecia entediado.
— A reincidência em violações à proibição de publicações
independentes é punida com prisão por tempo indeterminado.
Outro stormtrooper trouxe uma menina ainda mais nova, talvez de
apenas cinco anos, pequena o suficiente para ser carregada embaixo do
braço. A menininha não chorou, de tão apavorada. Em vez disso, os olhos
dela se voltavam para a multidão, como se estivesse procurando alguém para
ajudá-las.
Ninguém se mexeu. As pistolas laser dos stormtroopers garantiam isso.
Menos de um ano atrás, fiquei assistindo quando escravos foram
espancados, Thane pensou. Mais uma vez se lembrou de quando voava em
seu TIE fighter para amedrontar o povo de Kerev Doi.
— Não leve as crianças. — A mãe continuava implorando. — Meu
marido e eu que fizemos isso. As crianças são inocentes. Por que elas têm
que...?
As palavras engasgaram quando o capitão deu uma coronhada no rosto
dela. Ela caiu, aos prantos, enquanto outro stormtrooper abaixava para
algemá-la.
Faça alguma coisa! Mas Thane se sentia impotente. Ele não conseguiria
agir contra tantos homens armados. Ele não poderia nem falar. Ao desertar
da frota estelar imperial, ele se colocou numa posição em que jamais poderia
chamar atenção ou sair da linha novamente. Uma jaula invisível e nada por
ele mesmo.
Enojado, ele se virou e voltou para o porto espacial. Enquanto andava em
direção à Moa, Brill o avistou.
— Ei! E a nova célula de energia?
— Não tinham nada dentro do nosso orçamento, tá bom? — Thane
disparou.
Atrás dele, pôde ouvi-la murmurar:
— Desculpa por perguntar.
Esse não era o melhor jeito de fazer amizade com seus novos colegas de
nave. Mas Thane não queria fazer amigos. Ele queria se trancar no quarto,
apagar as luzes e tentar esquecer o que tinha visto ou o que tinha sido um
dia.
Ciena observou a cena diante de si no planeta Ivarujar e pensou que
aquilo só podia ser o inferno.
Longe dali, o vulcão continuava cuspindo cinzas tão alto que ninguém
naquele planeta seria capaz de enxergar o céu por anos. A lava brilhou
laranja e nefasta no horizonte; a capital já havia sido completamente tomada.
Quando Ciena olhou por seu quadróculo, viu mais prédios enegrecendo
conforme desmoronavam em cinzas com o calor.
Por ser a nave mais próxima do setor, o Devastador enviou vários
transportes para evacuar as tropas imperiais em Ivarujar. Aquelas naves
foram seriamente danificadas na erupção inicial, então eles estavam presos
— e, se Ciena não os alcançasse logo, condenados. Ela fora colocada no
comando do transporte que voava mais próximo do vulcão. Um trabalho
arriscado, mas ela se sentia eletrizada com a experiência. Não que não
gostasse de trabalhar na ponte de um Star Destroier, mas não via a hora de
pisar no chão.
— Capitã tenente Ree, temos contato visual — disse o piloto
stormtrooper.
Ela se virou da janela do transporte para ver numa tela a imagem dos
stormtroopers no topo de um edifício. Estavam em formação, rígidos e
parados enquanto aguardavam o resgate, apesar do calor insuportável que
deviam estar sentindo.
— Bom trabalho — ela disse. — Leve-nos até lá.
O piloto hesitou, então checou novamente os instrumentos. Ciena
compreendeu por que ele estava inseguro: o calor intenso estava causando
incêndios, criando ignições explosivas e chicoteando Às vezes, havia ventos
estranhos no alto das montanhas.
— Deixa comigo. Eu pego o leme. — Ciena fez sinal para o
stormtrooper levantar.
— Senhora, sou capaz de pilotar...
— Sei que é. Mas você é forte o bastante para carregar qualquer moldado
ferido para a nave, e eu não. — Bem, não aguentaria mais do que um ou
dois.
Seguro de que não seria punido por covardia, o piloto se juntou aos
outros stormtroopers no fundo. Ciena conduziu o transporte por baixo, pelos
cânions urbanos onde a lava cobrira o que pouco tempo antes eram ruas. As
luzes vermelhas infernais que vinham de baixo contrastavam com o céu
escuro. Foi uma viagem turbulenta, mas ainda assim ela os manteve estáveis
o suficiente.
Coisa desajeitada, ela pensou, desejando uma nave com mais
estabilidade por um instante. Ainda assim, o transporte conseguia aguentar o
calor, então nada mais importava.
Ela pousou no topo do prédio do quartel e, assim que abriu as portas, as
tropas começaram a entrar. Suas armaduras estavam da cor das cinzas
vulcânicas, e vários stormtroopers tossiam e cambaleavam. Se tivessem
ficado ali mais meia hora, ou até menos, teriam desmaiado ou morrido.
Ciena se lembrou deles firmes em formação, numa demonstração de
verdadeira disciplina, e sentiu tanto orgulho que seu coração podia explodir.
— Muito bem — ela disse. Estava prestes a dizer “decolando” quando
avistou outro prédio mais longe.
Pessoas tinham se juntado naquela cobertura também, cidadãos de
Ivarujar que deviam ter falhado na tentativa de chegar aos transportes civis.
Ou talvez não tivesse espaço suficiente para todos...
— Capitã tenente? — O piloto tinha voltado para a cabine. — Estamos
prontos para decolar?
— Sim — ela respondeu. — Vamos fazer uma parada rápida antes de
retornar ao Devastador.
— Uma... parada?
Nenhuma ordem a tinha autorizado a resgatar civis, mas nenhuma ordem
tinha proibido.
— Abra tanto espaço quanto conseguir lá trás. Vamos pegar mais
passageiros.
Quando Ciena decolou, podia sentir a instabilidade das correntes de ar ao
redor dela. Mordendo o lábio, levou o transporte mais para o alto, para
mergulhar na pior parte apenas no último instante. O vulcão rugiu de novo
tão alto que o som vibrou por toda a nave. Eles tinham recebido avisos sobre
uma potencial nova erupção, que poderia acontecer a qualquer instante.
Você não tem o direito de arriscar as vidas que estão sob sua
responsabilidade para salvar as que não estão, ela pensou; era seu
treinamento da academia falando. Depois de um momento, entretanto, Ciena
o ignorou. Vidas eram vidas. Além disso, ela era capaz de completar essa
tarefa.
Mais uma vez, ela pousou no topo do prédio e deixou a cabine para
ajudar os civis a embarcar. Eles tossiam ainda mais que os stormtroopers, já
que não usavam capacetes com máscaras de respiração; alguns estavam
quase inconscientes. Ciena estendeu os braços para um menininho, levando-
o para dentro da nave. Depois ajudou o pai da criança a entrar também. Em
volta dela, os stormtroopers fizeram o mesmo, como sempre seguindo a
liderança da oficial em comando, cabine, onde o piloto nem tentava mais
voar. Ele parou ao lado dela e disse:
— Com esse peso, não sei se vamos conseguir...
— Com certeza vamos conseguir — Ciena afirmou, mais confiante do
que se sentia.
O transporte de fato era capaz de carregar aquele peso, mas a capacidade
de manobra estaria comprometida, e aquilo era um risco sério quando se
lidava com ventanias superaquecidas.
Ciena ligou os motores em potência máxima e subiu para o ar. No
começo, o transporte chacoalhava com tanta violência que ela quase caiu do
assento. Podia ouvir os ivarujarianos gritando de medo no compartimento de
transporte. Naquele ponto, os edifícios estavam cobertos de chamas como
fósforos acesos. Mais um pouco e tudo se transformaria em um verdadeiro
incêndio... e a nave dela poderia ficar presa no meio.
Ciena apontou o transporte para cima. Estavam subindo mais devagar do
que deveriam, mas estavam se movendo.
No horizonte, via as chamas chicotearem mais e mais alto e começarem
a formar ciclones. Se o transporte fosse pego por um desses, todos
morreriam.
Mas ela se manteve firme, lutando contra os ventos terríveis a cada
centímetro do trajeto até, enfim, estarem fora de perigo. Ciena respirou
aliviada e ouviu a comemoração que vinha do fundo da nave.
Quem poderia culpá-la por não resistir e sorrir?
O capitão Ronnadam, no caso.
— Sua missão era resgatar os soldados naquele quartel, não civis — ele
disse, andando pela extensão da sala dele enquanto ela permanecia em
posição de sentido, com o uniforme ainda enegrecido pela fuligem.
— Minhas ordens não me proibiam de fazê-lo, senhor.
Os olhos de Ronnadam se estreitaram.
— Procurando brechas, Ree? Um caminho perigoso.
— Não, senhor! Quer dizer... reagi por instinto e não vi obstáculos para
fazê-lo.
— Você reagiu por instinto! — ele zombou. — Em outras palavras,
falhou em pedir permissão aos seus superiores!
Não tínhamos tempo, ela queria protestar, mas sabia que não devia. —
Peço desculpas, senhor. Eu devia ter informado minha missão antes de
assumi-la. Não cometerei esse erro de novo.
— E bom tomar cuidado para não cometer mesmo. — Ronnadam a
encarou de cima a baixo antes de adicionar secamente: — Você não tem
outras observações negativas no seu histórico, então sua punição será leve,
apenas cinco semanas de turnos dobrados. Na próxima vez não serei tão
piedoso.
— Não haverá próxima vez, senhor. — Cinco semanas de trabalho extra
eram um preço baixo por quarenta vidas.
Enquanto saía da sala, Ciena respirou aliviada. A princípio ficara brava
por quererem repreendê-la por salvar vidas, mas agora entendia que estavam
descontentes apenas porque ela não havia respeitado a cadeia de comando.
Não era como se ela realmente tivesse feito algo errado resgatando aquelas
pessoas. O Império nunca se oporia a algo assim.
Além disso, aquele tinha sido um dos melhores voos que já realizara na
vida. Se pelo menos pudesse falar com Thane sobre isso... Na cabeça de
Ciena, podia ver a expressão dele enquanto contava sobre o ciclone de fogo.
Ele ficaria com tanta inveja por não ter pilotado aquela nave.
Até as coisas de que ela mais se orgulhava pareciam sem graça se não
pudesse contar a Thane.
Dezoito meses depois da Batalha de Yavin
Depois das instruções rápidas da princesa Leia, levou apenas quatro minutos
para Thane vestir o uniforme e correr para uma snow- speeder. Quatro
minutos quase foram tempo demais.
— Arraste essa sua bunda Jelucana pra cá! — gritou Yendor, o copiloto
Twi'lek e companheiro de Thane no Esquadrão Corona. Ele já tinha
afivelado seu capacete feito sob medida, que permitia que seus lekku azuis
se alinhassem sobre suas costas. — Temos muitos Walkers imperiais
marchando para cá.
— Treinei em Walkers na academia. — Thane saltou para seu assento.
Nem tinha terminado de pôr o capacete e a cobertura da nave já estava
fechada. — Conheço eles de cabo a rabo.
— O que pode me dizer sobre essas coisas? — Yendor acionou os botões
que os preparariam para a decolagem.
— São veículos de solo com a blindagem mais pesada de todo o exército
imperial.
— Então você está dizendo que tem um conhecimento detalhado sobre
como estamos ferrados...
— Mais ou menos — Thane disse. — Veja pelo lado positivo: se até a
Estrela da Morte pôde ser destruída, não existe nada imbatível no Império.
Yendor liberou as travas.
— Vamos testar essa teoria.
Thane segurou os controles e sentiu os motores ganhando vida.
— Lá vamos nós.
A snowspeeder disparou para fora da base, rumo ao combate. Raios laser
rasgavam o céu prateado, e as naves rebeldes se espalharam para encarar
todo um exército invasor... porque era isso o que havia ali. Não era uma
equipe de ataque. No mínimo, enfrentavam toda a cavalaria do Império.
Quantos stormtroopers estão aqui?, Thane se admirou. E eles provavelmente
vão enviar flametroopers para dentro da base para queimar tudo e todos
que ainda estiverem lá dentro. E o pior: ele já conseguia ver cinco Walkers
AT-AT no horizonte. Cada um deles carregaria dezenas de soldados e
incontáveis armamentos, sem mencionar os canhões mortais na frente.
Não importava onde os Walkers chegassem se os rebeldes conseguissem
mandar os transportes para longe antes, Thane lembrou a si mesmo. Destruir
um desses monstros no caminho seria um bônus.
— Suas aulas na academia ensinaram como lidar com um Walker
fortemente blindado? — Yendor perguntou. — Porque as nossas armas laser
não adiantam nada contra essas coisas.
Thane manteve o speeder rápido e baixo, arrancando rajadas de neve
abaixo deles.
— Nem todos os lugares podem ser completamente blindados. Pense. As
pernas são vulneráveis exatamente onde as pernas de qualquer criatura
seriam.
— Saquei — respondeu Yendor. — E pra mirar nas articulações.
A snowspeeder inteira vibrou com o poder de fogo que eles lançaram
contra um dos Walkers, bem onde seriam os tornozelos dele. Apesar de os
lasers não serem potentes o bastante para destruir aquelas ligas metálicas,
talvez pudessem enfraquecer os parafusos e fritar alguns circuitos.
Podemos desestabilizá-los. Atrasá-los. Qualquer coisa pra ajudar os
transportes a escapar em segurança.
Cada um dos transportes levaria quase uma centena de soldados
rebeldes, o coração da frota deles. Se o Império triunfasse naquele momento,
poderia realmente ser o fim da Rebelião.
Mas a mira de Yendor era certeira. Ele continuou atingindo as juntas
inferiores do AT-AT exatamente nos mesmos pontos, maximizando os danos.
Quando Thane ampliou a imagem de seus sensores, percebeu que eles até
tinham uma chance de arrancar um dos pés da coisa, o que a pararia de vez.
— Continue! — Thane gritou para Yendor. — Estou levando a gente pra
dentro com tudo!
— Na verdade, consigo mirar muito bem dessa distância, sabia? —
Yendor fazia a piada conforme começava a atirar mais rápido.
Naquele momento, o setor mais baixo do Walker agigantava-se na tela.
Thane olhou para cima para ver a coisa ao vivo. A princípio, desejou que
não tivesse feito isso — os monstros já pareciam grandes o suficiente
quando você estava dentro de um deles; olhando por baixo, então, pareciam
encobrir todo o céu.
Eles não são tão grandes quanto as montanhas lá em casa, ele disse a si
mesmo. Você voou por elas. Consegue voar por isso.
Ele acelerou até que a paisagem coberta de neve não fosse nada além de
um borrão, levando-os o mais rápido possível. Yendor continuou atirando
com precisão milimétrica. Cada acerto ganhava um jorro de fumaça preta ou
uma chuva de faíscas.
Eles estavam a menos de duzentos metros... Cem metros...
Thane tomou a decisão em um instante. No último segundo, ele poderia
ter desviado, mas não.
Yendor uivou, ainda atirando, enquanto Thane manobrava a snowspeeder
diretamente para o pé do AT-AT. Logo antes do impacto, ele jogou o speeder
para o lado até que ficasse perpendicular ao solo, deslizando entre as pernas
do AT-AT até sair girando por trás dele, ainda inteiro.
Já o Walker não podia dizer o mesmo: agora mancava com um pé
danificado. A perna levantou e então congelou. Aquele AT-AT não ia mais a
lugar nenhum.
— Então essa não era uma missão suicida?! — Yendor perguntou.
Thane riu enquanto levava a snowspeeder em círculos para outra
volta.
— Eu fazia manobras rentes todos os dias pelas estalactites das
montanhas lá em casa. Você estava seguro como um bebê.
— Me lembre de nunca contratá-lo como babá.
Thane focou a tela em direção ao conflito, e percebeu que mais alguém
tinha dado um jeito de derrotar um Walker — pra valer, derrubando-o no
chão. A cabeça do AT-AT explodiu, e uma nuvem de fumaça preta
contrastou com o chão branco. Por um momento Thane se imaginou dentro
do Walker. Teria sido um calor insuportável antes da explosão; a alta
temperatura devia ter cozinhado aqueles caras dentro da própria armadura
deles...
É isso aí, ele disse a si mesmo com ferocidade. Estamos aqui para matá-
los, da mesma forma que eles estão aqui para nos matar. Antes eles do que
nós.
— Recebi uma mensagem do comandante Skywalker. Eles laçaram as
pernas do Walker com um cabo de reboque — Yendor contou.
— Isso é mais rápido — Thane disse. — E economiza nossa energia para
mais tarde.
— E não nos obriga a fazer aquele maldito mergulho mortal.
— Não menospreze a manobra que salvou nossas vidas — Thane disse
enquanto seguia para o próximo Walker. — Apronte o cabo de reboque.
Conforme corriam de volta para o coração da batalha, Thane viu um
transporte atravessar a atmosfera, preparando seu salto para o hiperespaço.
Eles realmente escapariam dessa bagunça?
Alguns deles sim. Mas havia snowspeeders quebradas no solo, e cinzas
voavam ao redor. Não importava quantos transportes conseguissem escapar,
a Rebelião tinha que deixar para trás uma quantidade tremenda de naves e
materiais. E todo o trabalho gasto na construção da base acabou
desperdiçado. Agora teriam que vagar pela galáxia de novo, procurando
algum lugar ainda mais obscuro e inviável que Hoth... isso se ao menos
existisse um planeta assim. Talvez o alto- -comando da Rebelião tivesse um
plano a longo prazo que tornaria as batalhas diárias insignificantes, mas, por
enquanto, o Império os fazia pagar caro por seu desacato.
Thane rangeu os dentes. A estratégia da Rebelião não cabia a ele. Ele só
tinha um trabalho: dar cobertura para os transportes.
Por um longo período, ele não se permitiu pensar em nada além dos
alvos, não se deixou fazer nada além de voar o mais perto possível dos
Walkers para que Yendor pudesse acertar todos os tiros. As tropas que
seguiam abaixo do speeder deles não passavam de sombras, e as armaduras
brancas cios stormtrooper os tornavam quase invisíveis na paisagem
invernal. Assim que o último Walker caiu, os outros rebeldes comemoraram.
Thane observou o céu escuro. O que eles vão mandar agora?
Nada veio. Nenhuma outra nave imperial desceu, o que significava que
eles estavam esperando acima da atmosfera para combater os caças rebeldes.
No momento em que o último transporte se lançou em direção ao céu,
Thane e Yendor voaram correndo de volta para a base. Eles tiveram poucos
minutos para tirar os caças individuais do chão.
Tudo o que Thane tinha que fazer era voar em segurança para fora da
atmosfera planetária antes de entrar na velocidade da luz. Mas primeiro teria
de escapar dos TIE fighters que tinham acabado de aparecer no radar dele.
Droga! Se tivesse decolado cinco minutos antes, os caças nem o teriam
visto. Agora Thane teria que abrir o caminho para a liberdade a tiros.
Os TIE fighters, porém, não eram robustos como os Walkers. Eles
praticamente não ofereciam proteção nenhuma para os pilotos, por isso ser
um piloto de TIE era algo tão reverenciado na frota estelar imperial. Pilotar
uma daquelas coisas exigia coragem.
Saber isso não tornava mais fácil para Thane abater os TIE fighters, mas
ele o fez mesmo assim. Conforme seus disparos de laser rasgavam um dos
TIE, uma chuva de faíscas verdes invadiu o ar, e então a nave saiu girando
pelos ares, as asas podadas, caindo para sua ruína.
Thane tinha sentido aquilo nos simuladores de TIE fighter. Ele sabia
como era a visão de quem estava dentro.
Aquilo era uma guerra. Todos tinham escolhido um lado. Thane acelerou
para cima, sem se importar em assistir o TIE fighter se chocar contra o solo.
Assim que o espaço em volta da sua X-Wing se tornara escuro e os
sensores mostraram que tudo estava livre, ele ajustou as coordenadas para o
ponto de encontro e se preparou para o salto. Só no último instante viu a
frota imperial que se acumulava a estibordo, tão grande que mesmo a
escuridão do espaço não a diminuía. Não houve tempo para estudar com
detalhes, não mais que um flash prateado antes das estrelas se transformarem
em um túnel e de seus motores gritarem enquanto a nave saltava para a
velocidade da luz.
Thane sentiu como se não pudesse respirar. Sabia o que tinha visto na
frota imperial na última fração de segundo: um Super Star Destroier.
Quando eu desertei, Ciena havia sido designada para o Devastador. Eles
nunca mais a colocariam em qualquer nave menor que um Star Destroier. A
essa altura, ela provavelmente não é mais designada com frequência para
patrulhar com um TIE, mas não ê impossível. Ela se voluntariaria só pelo
prazer de voar.
Ele estava sendo ridículo. Dos muitos Star Destroiers sob o controle do
Império, quais seriam as chances de justamente o dela ser designando para
aquela batalha?
Por mais remota que as chances fossem, contudo, a possibilidade era
real. E agora, nauseado pelo medo, Thane percebeu que o piloto TIE que
acabara de matar podia ser Ciena. Podia ser tanto ela quanto qualquer outro
piloto da frota. E ele não tinha nem se importado em assistir à morte dela.
A pior parte era que ele nunca saberia.
O SOM METÁLICO DA RESPIRAÇÃO de lorde Vader ecoou pela ponte
do Executor. Ciena sabia que era melhor não se virar nem dar qualquer outra
indicação de que tinha percebido que ele estava lá, parado no nível mais alto,
alguns metros acima. Apesar de não acreditar em alguns dos rumores sobre o
lado vingativo de Darth Vader, àquela altura ela sabia que era mais
inteligente não atrair a atenção dele por qualquer razão que fosse. A irritação
dele quando ficava descontente era lendária.
Naquele momento, ele devia estar descontente ao extremo. Como tantos
transportes rebeldes podiam ter escapado? Ainda que tivessem saído do
hiperespaço muito cedo, isso não devia ter minado todo o ataque. A frota
imperial tinha enviado uma força de ataque que deveria ter sido capaz de
paralisar as defesas do inimigo. Em vez da vitória, porém, tiveram três AT-
ATS derrubados, um muito danificado, várias dezenas de TIE fighters
destruídos e várias centenas de stormtroopers mortos. O número alto de
baixas entre os rebeldes era um pequeno consolo.
Ciena decidiu que mais tarde assistiria às gravações da Batalha de Hoth e
estudaria em detalhes as táticas rebeldes. O Império possuía todas as
vantagens em termos de número de soldados e poder de fogo. Aquele
deveria ter sido o dia em que dariam um golpe final na Rebelião. Em vez
disso, a vitória deles foi incompleta. Se os rebeldes conseguiam evitar serem
totalmente destruídos por uma força de ataque imperial liderada por seis Star
Destroiers, então possuíam movimentos táticos superiores ou
surpreendentes, no mínimo. Analisar as técnicas rebeldes mais
detalhadamente poderia dar aos imperiais a informação de que precisavam
para enfim encerrar essa guerra medonha.
Por enquanto, contudo, Ciena e todos os outros no Executor tinham outra
prioridade, ainda mais vital: capturar a Millennium Falcon.
Se alguém na ponte entendia por que era tão importante agarrar aquele
pedaço velho de sucata espacial, não tinha dito nada. Lorde Vader queria que
trouxessem a nave a bordo e que seus passageiros fossem capturados com
vida. Então, em vez de simplesmente explodir a Millennium Falcon, o que
poderiam ter feito em um instante, tinham que tentar arrancá-la do espaço.
Infelizmente, quem quer que estivesse manobrando a Falcon era um
baita piloto. Ele entrou em um campo de asteroides, aparentemente
preferindo o suicídio à captura. Nenhuma nave pequena poderia esperar sair
intacta de um campo como aquele. A nave rebelde pelo menos tinha
escudos; os TIE fighters nem ao menos tinham essa proteção mínima.
Ainda assim, quatro deles foram enviados. Enquanto Ciena tentava
entender o propósito daquela missão suicida, o capitão Piett disse:
— Ree, ofereça assistência navegacional auxiliar.
Já com um aperto no peito, ela respondeu:
— Sim, senhor.
Ela foi para o posto de navegação auxiliar na cabine de dados e observou
as quatro telas que mostravam as designações e as coordenadas dos caças.
Qualquer assistência que ela podia oferecer seria mínima, mas, se pudesse
dar àqueles pilotos uma chance, ela o faria. Seus dedos voavam enquanto
determinava a triangulação entre as naves e a Millennium Falcon, e então
pegou o fone que a permitiria falar diretamente com os pilotos.
— OL701, ajuste trinta e sete graus a estibordo e para baixo. NA811,
prossiga, mas suba um pouco...
NA811 era um cara chamado Penrie, um graduado da academia em
Lothal com quem Ciena conversava de vez em quando. Quando ele ria,
ninguém era capaz de não acompanhá-lo e, como parecia •ti liar as piadas de
todo mundo hilárias, o riso era constante. Apesar de Penrie ter dois anos a
mais de serviço que ela, ele parecia mais jovem quando disse:
— Afirmativo.
— CR978, suba, suba! — Mas a ordem de Ciena chegou tarde demais;
um dos TIE fighters desapareceu do mapa.
Um homem morto em seu turno. Por favor, mais nenhum.
— OL701, nova trajetória ativada no seu computador de bordo.
— Recebido.
— JA189, seu computador não está sincronizando...
— Não consigo! — Então uma explosão de estática seguiu o giro
selvagem de outro TIE fighter na tela. — Perdi um dos motores! Não
Consigo manobrar. Preciso de um reboque!
Outra estática mais alta foi seguida de silêncio enquanto a imagem do
TIE fighter de JAI89 se apagava para sempre.
O suor fez o macacão cinza de Ciena grudar na pele. Ela mantinha os
olhos travados na tela e a voz mais neutra que conseguia.
— OL701, NA811, vocês estão se aproximando muito de um dos
maiores asteroides.
— O alvo parece estar buscando cobertura. Estamos em cima dele. —
Esse foi o OL701. Através da ligação com o NA811, Ciena ouvia apenas
uma respiração muito profunda, acelerada. Penrie tinha acabado de ver
outros dois pilotos explodirem diante de seus olhos.
Para o capitão Piett, ela disse:
— Senhor, se a Millennium Falcon pousar em um asteroide grande,
podemos mirar nossos canhões laser e explodi-los. Derrubaríamos a Falcon
no processo. Posso ordenar que os TIE fighters retornem?
Piett ficou parado, obviamente aguardando que lorde Vader negasse a
ordem. Vader não disse nada. Ele nem ao menos se virou. Por fim, Piett
disse:
— Muito bem, Ree.
A esperança dela aumentou. Pelo menos poderia salvar dois dos pilotos.
— NA811, OL701, abortar perseguição. Trace a rota mais segura de
volta e...
— Estão em um dos cânions — OL701 respondeu. — Estão quase
presos.
Ciena esperou para ouvir a resposta de Penrie. Em vez disso, ele gritou
— um grito terrível, interrompido cedo demais. Naquele instante, ambos os
TIE fighters remanescentes desapareceram da tela, que ficou escura.
Quatro pilotos mortos, e isso era em parte responsabilidade dela. Piett a
repreenderia? Ou pior... Vader?
E se fossem verdadeiros os rumores sobre como Vader tratava quem o
desagradava?
Mas ninguém prestou atenção nela. Piett e Vader agiram como se Ciena
não tivesse decepcionado ninguém, como se quatro oficiais leais não
tivessem morrido em vão. Não havia nada que Ciena podia fazer além de
retornar para a estação original de trabalho e monitorar a situação.
— Por que não estamos sequer atirando no asteroide? — ela sussurrou
para o comandante que sentava ao lado dela na cabine de dados.
— Estamos sem visão. O alvo pode muito bem ter mudado de curso. Não
aparece mais na tela ou nos sensores.
Uma onda de náusea a tomou. Aqueles quatro pilotos tinham morrido
por nada. Ninguém nunca mais poderia ouvir a risada de Penrie. Nos cursos
de comando na academia, os professores os aconselhavam a não pensar nas
tropas como indivíduos; fazer isso apenas os faria hesitar, o que, por
consequência, os levaria à derrota. Em vez disso, deveriam vê-los como
peças em um jogo vasto e elaborado. Essa era a única parte do treinamento
de comando que tinha feito Ciena travar. Agora ela sabia que nunca seria
capaz de fazer aquilo, não da forma que Piett e Vader faziam.
No entanto, Vader talvez não fosse totalmente desprovido de emoção,
porque inacreditavelmente ordenou que o Executor também entrasse no
campo de asteroides.
Os impactos começaram a causar tremores na nave. Ciena sentia como se
estivesse sendo fisicamente ferida. O que o Star Destroier tinha de força
bruta faltava-lhe em capacidade de manobra; eles levariam incontáveis
impactos. O que era registrado como um dano menor em um Super Star
Destroier poderia significar a destruição de milhares de metros de dois
andares inteiros, e, consequentemente, de todas as pessoas designadas para
esses postos. Mais oficiais e stormtroopers morreriam sem necessidade, tudo
porque lorde Vader não podia deixar uma porcaria de uma nave velha
escapar.
Não, Ciena se lembrou, determinada. As mortes que tinha acabado de
ver, o risco e os danos inúteis... tudo isso acontecera porque a Aliança
Rebelde tinha começado uma guerra.
Isso não pode ser Jelucan, Ciena queria dizer para o piloto do transporte.
Você me trouxe para o planeta errado.
Ainda assim, ela sabia que estava no lugar certo. Só que tudo tinha
mudado.
O nevoeiro grosso parecia ter assentado permanentemente na terra, e o ar
estava espesso, encardido de fuligem. As minas, verdadeiras crateras nas
montanhas, não tentavam filtrar os resíduos do seu trabalho, então as pessoas
simplesmente andavam em meio à poeira, tossindo, algumas com lenços ou
máscaras sobre a boca e o nariz.
A princípio, Ciena pensou que as máscaras estavam dificultando a
diferenciação do povo do vale e do pessoal da segunda leva. Apesar de ter
visto mais roupas industrializadas na última vez em que estivera em casa, os
dois grupos ainda eram distintos. Agora era impossível distingui-los. Nunca
pensara que sentiria falta dos longos casacos espalhafatosos que as pessoas
da segunda leva usavam, mas procurou em vão por pelo menos um brilho
carmesim ou cobalto. Não havia mais nenhum muunyak desgrenhado
vagando pelas ruas; as pessoas andavam em escaladores de encostas ou
caminhavam.
Valentia parecera muito mudada para ela três anos antes, mas fora
reconhecível na época. Agora, as cabanas de trabalhadores migrantes tinham
se multiplicado tanto que os prédios originais esculpidos na rocha eram
quase invisíveis. O prédio do Senado se tornara o quartel do Império, um
posto militar avançado, cercado por um campo de força verde doentio e por
cujos portões passava um fluxo constante de oficiais e stormtroopers.
Ciena notou que o povo de Jelucan andava mais rápido ao passar pelo posto.
Não queriam chamar atenção. Ninguém a encararia nos olhos.
— Não devia ter pedido pra você voltar — Paron Ree repetiu, do lado de
fora do antigo quarto de Ciena. — Pensei em mim, não em você. O que os
seus superiores dirão?
— Dirão que foi tudo um engano, porque foi. — Ciena jogou de lado a
jaqueta do uniforme, que pousou em cima de sua calça e botas. Suas roupas
velhas ainda serviam, só estavam um pouco mofadas. As calças e túnicas
roxas pareciam incrivelmente macias. Ela realmente se vestira com peças
daquele jeito todos os dias? Abriu a porta e entrou no cômodo principal,
onde o pai estava parado com as mãos entrelaçadas, como se estivesse
preparado para apresentar um relatório formal. Ela apertou os ombros dele.
— Está tudo bem, pai. A verdade virá à tona.
A expressão do pai permanecia tensa e insegura.
— E improvável que o verdadeiro culpado seja identificado pelas
autoridades.
— Por que ainda não o encontraram? Bem, daremos um jeito nisso. —
Se pelo menos ela já fosse comandante! A patente poderia ajudar quando
fosse talar com o magistrado no dia seguinte. — Sinto muito por dizer, pai,
mas você não parece bem. Tem se alimentado?
— Sem sua mãe, eu... perco a noção do tempo.
Ciena pausou. Não tinha percebido até algumas horas antes que a mãe
continuava presa, e não conseguia acreditar que visitas eram proibidas.
Aquela era outra questão para cuidar com o magistrado. Ela requisitara uma
audiência no primeiro horário do dia seguinte, então certamente receberia
notícias da equipe dele em breve.
Certamente.
O pai tinha um pouco de carne e algumas raízes na unidade de
refrigeração, então ela começou a fazer uma sopa básica. Não cozinhava
havia muito tempo, mas ainda se lembrava de quais ervas devia misturar e
como o perfume delas ficava nos dedos. O estômago de Ciena roncou,
faminto por qualquer coisa que não fossem os nutritivos imperiais. (Ela
trouxera duas garrafas de bebida nutritiva com ela, mas... era melhor guardá-
las para a viagem de volta.)
Quando o caldo começou a borbulhar, Ciena se afastou do fogo e sentou
nas almofadas no chão ao lado da mesa baixa, em frente ao pai. Só depois
que se ajeitou percebeu que não se sentia nem um pouco estranha, mesmo
após anos comendo em mesas altas e sentando em bancos ou cadeiras. A
casa ainda era seu lar.
Paron balançou a cabeça devagar.
— E bom te ver de novo, minha menina. — Ele tocou de leve a
bochecha dela.
— Devia ter vindo antes.
— Não. Sei que há uma guerra em curso. Você fez o que tinha que fazer.
Os fios de cabelo grisalhos nas têmporas do pai surpreenderam Ciena,
mas não tanto quanto seu comportamento. Ele sempre fora seu porto seguro:
inflexível e muitas vezes duro, mas invariavelmente justo. Sempre forte.
Agora o espírito dele tinha enfraquecido, o que era tão perceptível quanto as
novas rugas em seu rosto.
— Não tem nenhuma bandeira na trincheira em frente de casa
— Ciena percebeu. — E porque o povo está se recusando a reconhecer
as acusações? — Isso seria um ato de rebeldia contra as autoridades, que
podia causar repreensões severas para as pessoas do vale; ainda assim,
acusações verdadeiramente injustas às vezes mereciam uma resposta como
aquela.
— Eles reconhecem — o pai respondeu angustiado. — Não há bandeiras
porque ninguém está do nosso lado.
Não era possível.
— Ninguém?
Ele assentiu.
Ciena se lembrou dos dias que passara na casa da família Nierre num
momento tão sombrio para eles. Todos celebraram quando os acusadores
recuaram e finalmente aceitaram a versão imperial dos fatos... Essa
lembrança, porém, fez Ciena refletir melhor sobre a situação da mãe.
— Como alguém que conhece a mamãe pode pensar que ela seja capaz
de roubar alguma coisa?
— Eles sabem que ela não pegou o dinheiro! — o pai explodiu.
— Todos sabem, mas ninguém fala nada.
— Mas se recusar a apoiar alguém acusado injustamente...
— Esta acusação foi feita pelo Império. E devemos lealdade ao Império.
Levantar-se contra ele seria a maior desonra possível!
— Você não pode ficar contra a mamãe. — Ciena encarou o pai,
chocada. — Pode?
— Sua mãe entende as exigências da honra, assim como você. Ou será
que as esqueceu, Ciena? — O olhar penetrante dele a pegou desprevenida, e
ela não ousou dizer mais nada.
Mas e a verdade?, pensou. Como a verdade pode não importar mais que
tudo? Quando se tomou honrado aceitar mentiras descaradas?
— Perdoe meu temperamento. — Ele parecia ainda mais exausto do que
antes. — Esses dias têm sido difíceis.
— Eu sei. Desculpa. Mas estou aqui agora.
Uma hora se passou. Eles comeram sopa e pão em silêncio, e nem todo o
medo e toda a preocupação puderam impedir Ciena de apreciar o sabor da
comida de verdade. Sentar perto do próprio forno, estar com o pai, ouvir o
corvejar dos falcões de sal... de repente imaginou que nunca tinha se tornado
uma oficial, que nunca nem tinha deixado Jelucan, que tudo aquilo era um
sonho.
Mas ela não podia se permitir sonhar acordada por muito tempo. A
realidade pesava mais a cada minuto, porque a resposta dos oficiais do
magistrado nunca chegava — e nem ninguém do povo do vale. Nenhuma
alma viva. A pequena trincheira de areia do lado de fora da casa deles
permanecia vazia, anunciando o tamanho da vergonha da família Ree.
O céu tinha ficado completamente escuro antes de Ciena ousar
perguntar:
— Pai, por que você acha que não vão encontrar quem realmente fez
isso?
— Você sabe a resposta. Não nos insulte me obrigando a falar.
Ela já tinha chegado à conclusão mais lógica: o corrupto era um oficial
do Império, alguém com patente alta o suficiente para falsificar os registros.
— O magistrado não vai interrogar publicamente os oficiais imperiais?
Nem mesmo no processo contra a mamãe...?
— Ciena, ouça. Você é integrante da frota estelar imperial e me orgulho
disso. Tudo o que é bom no Império vem de você e de pessoas como você.
— Ele acariciou a mão dela. — Mas toda lei e todo legislador tem seu lado
mim também. Aqui em Jelucan, nós... temos visto mais o lado mim. Ainda
assim não devemos fraquejar em nossa lealdade.
Ela pensou nos céus cobertos de fuligem, nas montanhas dilaceradas
com talhos profundos que pareciam marcas de garras de alguma criatura
monstruosa. O pai se recusava a desistir mesmo quando tudo ao redor
gritava corrupção e ruína.
Isso acontece só em Jelucan, é o resultado de um governador desonesto.
Os oficiais superiores não sabem a verdade, porque, se soubessem,
tomariam uma atitude, Ciena disse a si mesma.
Mas, mesmo para ela, o raciocínio soava tão risível que não conseguia
acreditar nele, muito menos dizê-lo em voz alta. Então lembrou a expressão
de Ronnadam ao conceder sua licença, como ele estivera tão seguro de que
as cortes imperiais tomariam a decisão certa. Ele sabia que a decisão “certa”
não seria aquela proporcionada pela verdade, mas uma que justificaria
quaisquer atos realizados por oficiais imperiais. A aura de justiça importava
mais do que a realidade.
Mesmo assim...
— Ninguém do povo, papai?
Ele apontou em direção à areia vazia, sem bandeiras.
Depois disso, não parecia haver mais nada a ser dito. Ciena andou pela
casa como se estivesse em transe, guardando a sopa que sobrou em potes
limpos. De novo, parte dela parecia estar sonhando, mas agora era seu
próprio lar que não parecia real. Como ela poderia estar em um ambiente tão
amado e ainda se sentir tão pequena e enojada? Ela quase ansiou por voltar
ao Executor, onde o ar reciclado cheirava a ozônio e ninguém nunca
infringia as regras de segurança.
A viagem final para Jelucan tinha levado dez horas. Ciena estivera
agitada demais até para dormir durante o percurso. Agora, passadas outras
dez horas, a exaustão tinha tomado conta dela. Sua cabeça girava e os olhos
doíam. Durante períodos de julgamentos, era tradição alguém sempre ficar
acordado na casa do acusado. Normalmente amigos leais e membros da
família se revezavam para as vigílias noturnas, mas Ciena e o pai estavam
sozinhos. Por mais cansada que estivesse, sabia que o pai estava ainda mais
esgotado.
— Vá pra cama — ela disse com serenidade. — Fico de vigília.
— Você precisa descansar.
— E você não?
— Mas você viajou até aqui... — A voz do pai fraquejou. Faltavam-lhe
forças até para discutir com a filha.
Do lado de fora, ela ouviu o zunido de um escalador de encostas.
Ansiava tanto pela chegada de um amigo que aquele som a deixou alerta.
Porém, imediatamente se repreendeu. Muitas pessoas viajam para o fundo
dos vales por esse caminho. Não vieram por você.
Mas o escalador de encostas parou. Então Ciena ouviu passos e o som
inconfundível de um mastro sendo fincado na terra.
Com um sorriso triunfante, ela chamou o pai, tocando-lhe o ombro, e
correu para a porta. Pelo menos uma pessoa tinha fé. Uma pessoa se
levantaria por eles sem se importar com nada. Seria um dos Nierre, pálidos,
mas com as bochechas coradas enquanto se desculpavam por vir tão tarde?
Seria um dos anciãos, dizendo que assumia o risco de desafiar os oficiais do
Império em nome de todo o povoado?
Ela correu para abrir a porta antes que o visitante pudesse bater e, então,
paralisou com o choque. Era impossível se mover ou mesmo dizer qualquer
palavra além do nome dele.
— Thane? — sussurrou Ciena.
POR MAIS QUE Ciena sempre pensasse em Thane, por mais que ele
continuasse sendo uma parte dela, ela realmente acreditava que nunca mais o
veria. E ali estava ele, na sua frente, incerto de que seria bem-vindo e com
seus olhos azul claros impenetráveis.
— Sim? — o pai de Ciena falou.
— Sr. Ree. Sou eu, Thane Kyrell. Ouvi sobre a mãe de Ciena e... quero
ficar de vigília com vocês. Se permitirem. — Thane apontou em direção à
bandeira solitária. — Ciena uma vez me contou que pessoas de fora do
vilarejo poderiam trazer uma bandeira vermelha, já que não têm brasões de
família. Pelo menos... acho que foi isso que ela me disse. — Ele hesitou pela
primeira vez, e a incerteza que ela vislumbrou brevemente fez Thane parecer
mais com o garoto de quem ela se lembrava. Mas aquele momento não
durou muito. Aquele garoto desapareceu, deixando um estranho no lugar. —
E assim mesmo?
— Sim. — A resposta saiu mais neutra do que Ciena pensou que seria
capaz.
Thane assentiu, acatando a resposta dela com tanta rigidez quanto
acatara ordens um dia.
— Então, posso acompanhar vocês? Ou devo partir?
Nas entrelinhas: “Você vai me entregar para o Império?”.
Ela tinha jurado fazê-lo. Seu juramento de lealdade não exigia nada
menos, especialmente agora que sabia que Thane havia se juntado à Aliança
Rebelde.
Mas a santidade da vigília era suprema. Qualquer um que apostasse a
própria honra em nome da honra de outra família merecia a proteção da casa
deles. Então, quando o pai a encarou, com a sobrancelha erguida, Ciena
assentiu e deu um passo para trás para que Thane pudesse entrar.
Thane prestara mais atenção do que Ciena pensara na época da Fortaleza,
quando ela havia tentado explicar as crenças e os rituais do povo do vale a
ele. Thane se dirigiu ao pai dela apropriadamente, inclinando de leve a
cabeça em respeito.
— Paron Ree, eu acredito na honra da sua família.
— Agradeço sua decisão de ficar em vigília conosco. — O pai dela
hesitou. Ele tinha se encontrado com Thane apenas algumas poucas vezes e
nunca o vira como nada além de um garoto rico mimado que travara seu
caminho para o sucesso apoiando-se nas costas de Ciena. Com certeza ele
nunca apertara a mão de Thane antes, mas o fez agora.
Ciena se atrapalhou com a maçaneta, mas conseguiu fechar a porta. As
mãos dela tremiam pela surpresa. Tinham se passado três anos desde que se
despediram. Naquela noite, ela conseguiu chegar até o térreo antes de
começar a chorar, e duvidava que Thane tivesse segurado por muito mais
tempo.
Disse a ele que o denunciaria se o visse novamente. Disse que, se ele
alguma vez retornasse para Jelucan, seria capturado. Aprisionado.
Possivelmente morto.
Até traições menores tinham se tornado crimes capitais nos últimos anos.
Mas ele voltou mesmo assim.
— Tudo bem. — Thane estava no centro da sala principal, alto e
imponente em um espaço que parecia pequeno demais para ele. — O que
vocês precisam que eu faça?
O pai dela apontou para a mesa.
— Sua presença é o suficiente. Você comeu? Temos sopa, graças a
Ciena.
— Não quero dar trabalho...
— Você está participando da vigília — Ciena disse, mais afiada do que
pretendia. — Você está apoiando nossa casa. Isso significa que tem direito a
nossa hospitalidade e proteção... enquanto estiver aqui.
— Então aceito a sopa. Muito obrigado. — Thane se abaixou até o chão,
dobrando com dificuldade suas pernas longas embaixo da mesa.
O pai tomou como sua obrigação trazer a refeição de Thane, tanto corno
parte do ritual de boas-vindas do único aliado deles quanto porque devia ter
sentido que Ciena e Thane queriam conversar. Eles deveriam conversar;
Ciena sabia disso, mas não tinha ideia de por onde começar.
Melhor começar com o que mais importava.
— Obrigada — ela disse. — For apoiar minha família.
Thane indicou a frente da casa com a cabeça.
— Não vi outras bandeiras.
— O povo nos abandonou. — A boca dela formou um sorriso amargo.
— Ninguém mais veio. Só você.
Ele hesitou antes de dizer:
— Sei que sua mãe é inocente. Ninguém dos vales jamais faria
algo assim... muito menos alguém ligado a você.
O olhar deles se encontrou por um longo momento antes de virarem o
rosto.
Quando o sr. Ree deixou a tigela de sopa na frente de Thane, Ciena
percebeu como o pai se movia devagar. Não conseguira ter um momento de
paz desde que a mãe dela tinha sido presa, mais de uma semana antes.
— Lembre-se que estou na vigília esta noite — Ciena disse ao pai,
tocando-lhe o braço. — Vá dormir.
— Eu posso fazer a vigília — Thane disse. — Alguém tem que ficar
acordado até o amanhecer, não é? Se for isso, tem que ser eu.
O pai, aparentemente presumindo que a questão estava decidida, beijou a
bochecha da filha e foi para o quarto sem dizer nada. Ciena esperava que ele
deitasse e dormisse instantaneamente — ele precisava descansar e ela não
queria que ouvisse nada do que os dois jovens estavam prestes a dizer.
Eles permaneceram em silêncio até ouvirem a porta do quarto do pai
fechar. Os joelhos de Ciena amoleceram enquanto ela sentava na almofada
ao lado de Thane. Estar tão perto dele a lembrava daquela única noite que
passaram juntos. Ele perdera o restante da inocência da juventude e, no
lugar, adquirira uma masculinidade quase agressiva: ombros largos,
músculos sólidos e uma sombra grossa de barba ruiva por fazer no maxilar
definido. Ela se virou até não poder ver o rosto dele e disse:
— Sabe que aqui é perigoso para você.
— Fui cuidadoso — ele garantiu. — Não saí do meu transporte até
escurecer. Aluguei um escalador de encostas com um nome falso e vim
direto pra cá. Partirei à noite, também. Então não verei ninguém que não
venha à sua casa. Estou seguro... a menos que você me entregue.
— Porque tenho direito à proteção desta casa? — Thane perguntou. Nas
entrelinhas: “Ou você tem outro motivo?”.
Ela não respondeu diretamente. Abraçou a si mesma e disse:
— Ficarei de vigília esta noite.
— Você está claramente exausta — ele disse de forma tão dura que
parecia um julgamento. — Dormi no transporte, então posso ficar acordado
por um tempo.
— Não posso deixar que faça isso.
— Imagino que não seja uma regra do ritual, senão seu pai teria dito algo
a respeito. Então por quê?
Ela estava cansada o suficiente para dizer a verdade.
— Porque não quero dever nada a você.
Thane riu, não por achar graça, mas por estar surpreso. Não havia
esperado encontrá-la tão furiosa; obviamente não fazia ideia de que Ciena
sabia sobre o envolvimento dele com a Aliança Rebelde, mas àquela altura
já suspeitava. Porém Thane parecia quase tão bravo quanto ela — não
importava o quanto tivesse sido difícil a separação na última vez em que se
viram.
— Veja desta forma: já estou devendo uma a você, por forjar meu
suicídio em vez de me entregar — Thane falou com muita serenidade, e
Ciena o encarou quase contra a vontade. — Então, se eu fizer a vigília esta
noite, ficamos quites, e ninguém deverá nada a ninguém. O que acha?
Na infância, Ciena lera histórias horríveis sobre punições cruéis usadas
nos velhos tempos, antes mesmo de o povo dela ter deixado seu planeta de
origem ou de saberem que outras pessoas viviam entre as estrelas. Ela tivera
pesadelos sobre uma em particular, na qual os braços e as pernas de uma
pessoa eram amarrados cada um a um animal. Os quatro animais correriam
em direções opostas até que o corpo da vítima fosse dilacerado. Essa tortura
a assombrara e era grata por isso nunca poder acontecer com ela.
Mas agora era exatamente o que estava acontecendo; não com o corpo,
mas com a sua alma.
Tinha jurado lealdade ao Império, tinha feito amigos na frota imperial
com quem estaria junto por toda a vida, e tinha servido com distinção. Ainda
assim, as sombras que vislumbrara havia muito tempo tinham crescido e
escurecido: as mortes de tantos pilotos em vão, a pressão crescente para
deixar de lado tudo o que já fora um dia, a corrupção e a assolação em
Jelucan. Acima de tudo, não podia esquecer Alderaan, um planeta destruído
em um esforço para prevenir uma guerra, esforço esse que falhara por
completo.
Nada disso dividia o coração dela tão brutalmente quanto o simples fato
de estar com Thane de novo. Ele não só tinha abandonado o serviço (e ela),
mas também se juntara à Rebelião, o grupo responsável pela morte de Jude e
por essa guerra miserável. Era a maior traição que ela podia imaginar.
Entretanto, quando todos a tinham deixado na mão, Thane arriscou a
vida para ficar ao lado dela.
Ciena levantou.
— Boa noite, Thane. — Não o agradeceu por manter a vigília.
Simplesmente caminhou até o quarto e fechou a porta sem olhar para trás.
Exausta, Ciena pensou que cairia no sono de imediato, mas ficou
acordada por quase uma hora, deitada, ouvindo os sons que Thane fazia
enquanto se movia pela casa. Ciena sabia que ele não viria até o quarto
dela, e nem queria que viesse, mas não conseguia parar de desejar ouvir
sua presença. De saber onde ele estava e ter certeza de que era perto.
Ciena conduziu o seu TIE fighter sem trocar mais nenhuma palavra com
Nash Windrider. Sem dúvida ele estava furioso, e com certeza a denunciaria
para Piett.
Felizmente, ela poderia dizer que estava agindo conforme as ordens e
Piett nunca saberia a diferença. Ocorreu a ela, contudo, que Piett poderia não
admitir as ordens dadas a ela. Se o objetivo da missão tinha que permanecer
em completo sigilo, ela seria sacrificada também? O Império executaria uma
oficial por sua lealdade se isso atendesse seus objetivos?
Antes, Ciena acreditava que isso era impossível. Não mais.
Tirou o capacete, respirou fundo e abriu a cabine. O que quer que
acontecesse em seguida, não tinha escolha senão encarar.
Saltou do caça, viu Nash andando a passos largos na direção dela, seus
olhos em chamas de raiva. Ciena desejava ter uma pistola laser. Mas ela se
manteve no lugar enquanto Nash se aproximou, encarou-a c a segurou nos
braços.
— Não posso acreditar que ele fez isso com você — Nash disse.
— Sabendo que você o amava, abandonou você desse jeito, forjou a
própria morte e fez você passar por anos de angústia! Isso está abaixo de
desprezo.
Ciena simplesmente abraçou Nash de volta, tanto quanto era possível
com os dois ainda de armadura. Estava grata pela chance de esconder o rosto
no peito dele.
— Desculpa por ter gritado. Agora percebo que você devia estar abalada,
com o coração partido... Bem. isso afetaria o voo de qualquer um, até o seu.
Você estava ainda mais sedenta para matar
Thane do que eu! — Nash suspirou enquanto se afastava o suficiente
para encará-la. A raiva que ela vira antes tinha se transformado em pena. —
Devia ter deixado você ter a honra. Se estivesse pensando direito, deixaria.
— Simplesmente não posso acreditar — Ciena disse, uma verdade
segura de se dizer.
— Aquele miserável! Nunca o conhecemos realmente, não é?
— Nash se endireitou. — Certo. Temos que apresentar nosso relatório.
Isso não vai ser nada bom.
Não foi. Gritaram com eles pelo fracasso em destruir todas as naves
rebeldes. Piett reconheceu o sucesso secreto de Ciena apenas com um aceno
no final, quando ninguém mais estava olhando. Depois, Ciena tirou a
armadura, tomou uma ducha rápida e tentou acalmar os pensamentos.
Thane poderia ter morrido hoje. Nash o mataria.
Ciena tremia pelo encontro com Thane em combate, mas se confortou
em saber que ele tinha escapado em segurança. Se nunca se encontrassem de
novo, a última memória dele seria o momento que ela salvara sua vida.
Debaixo da água quente, apoiando as mãos na parede de metal, decidiu que
poderia suportar aquilo.
Mas Nash? Como ele pôde ter partido com uma fúria tão homicida
contra Thane? Ela entendia a sensação de traição, tinha sentido o mesmo no
dia em que percebera que Thane se juntara à Aliança Rebelde. Mas mesmo
quando ela quase o odiou, ainda o amara. Ao passo que Nash, que lamentara
a morte do amigo por anos, ao descobrir que ele estava vivo
instantaneamente se dispôs a matá-lo.
Aquilo não era lealdade ao Império. Aquilo era... fanatismo.
Os motores alternaram de novo, mudando levemente a vibração sob os
pés dela. Eles tinham acabado tie sair do hiperespaço. Ciena estava
desapontada por perceber que estivera tão presa em seus próprios
pensamentos que nem tinha notado a entrada no hiperespaço.
Ela se enxugou e vestiu o macacão de folga para ver o que estava
acontecendo. Uma fila de janelas triangulares se alinhava na parede mais
próxima â proa. então Ciena podia simplesmente olhar para o lado de fora.
Ao que parecia, nenhuma outra nave fizera a jornada com eles. Por que eles
se separariam do comboio imperial?
Para preparar algo para a chegada do Imperador. Essa era a respos ta
óbvia. Mas o que seria? Ciena estudou todo o campo estelar e viu que
estavam se aproximando de um planeta, orbitado por uma lua enorme tão
verde e nublada que presumiu ter uma floresta rica. E alguma coisa ainda
parecia orbitar aquela lua, uma coisa enorme e escura...
Ciena engasgou ao perceber para o que estava olhando.
Não pode ser. Eles não fariam isso de novo.
Mas tinham feito. Ciena não podia negar o que via...
Era uma segunda Estrela da Morte.
As mãos de Ciena ficaram dormentes, mas ela ainda estava parada,
apoiada na janela, olhando para uma nova Estrela da Morte.
Por que construiriam mais uma? A primeira foi feita apenas para
terminar a guerra antes que começasse... e falhou! Então por que?!
Ela sabia a resposta, mas ainda não era capaz de aceitá-la. Em vez disso,
olhou fixamente para aquela estação espacial gigante, que parecia crescer
mais conforme o Executor se aproximava. Ciena frequentemente se
impressionava com a rapidez com que uma estrutura tão imensa podia ser
erguida. Mesmo os recursos do Império deviam ficar escassos com a
construção de uma estação do tamanho de uma lua grande. Agora podia ver
o processo pessoalmente, porque essa Estrela da Morte ainda não estava
pronta. Grandes setores permaneciam incompletos, e ela podia observar as
entranhas da coisa, uma maçaroca pavorosa de vigas e estruturas cercando a
escuridão profunda e vazia.
Suas próprias palavras em um bar em Valentia ecoaram na memória dela,
provocando-a: O Imperador e os Moffs tem de perceber que destruir
Alderaan não foi bom. Isso não parou a Rebelião:.. O único motivo para
atacar Alderaan era impedir uma guerra ainda mais devastadora. A guerra
começou de qualquer maneira. É tarde demais para salvar a galáxia disso.
Nenhuma outra razão jamais poderia justificar a destruição de um
planeta inteiro ou a morte de bilhões de pessoas. O Império só poderia se
redimir daquelas mortes se restaurasse a paz galáctica.
Mas agora mais mundos seriam destruídos sem nenhum motivo... a não
ser causar dor e medo.
Talvez estejam fazendo isso para finalmente encerrar a guerra, Ciena
pensou. Mas a desculpa era fraca demais para ela acreditar sequer por um
instante. Se a Rebelião não tinha se acovardado diante do fim de Alderaan,
então a destruição de outros planetas não a pararia também. Pelo contrário:
incitaria mais pessoas a se juntarem à causa rebelde. Isso não encerraria a
guerra, mas a intensificaria além do imaginável.
Sempre que Ciena tinha um pesadelo sobre Alderaan, apagava suas
dúvidas se lembrando de Jude. A perda da amiga sempre a ajudara a
equilibrar a situação — lembrava que aquela chacina tinha sido causada
pelos dois lados. Naquele dia, contudo, ela só podia pensar que, se Jude
tivesse visto a segunda Estrela da Morte, teria recuado diante da visão.
Ela nunca iria querer isso feito em seu nome. Nunca.
O frio tinha tomado conta do corpo de Ciena. Finalmente, tirou as mãos
doloridas da janela, esfregando-as na esperança de restaurar a circulação
sanguínea. Mas não importava o quanto tentasse, não conseguia se aquecer.
Assim que o transporte dela atracara na Estrela da Morte, Ciena pôde ver
com os próprios olhos o quanto aquilo de fato já estava completo. Do lado
de fora, o enorme hemisfério ainda por terminar dominava a visão. Por
dentro, contudo, foram ancorados por um raio trator totalmente funcional,
desembarcaram em um deque que não apenas estava terminado como
também polido, e andaram em direção a uma estação espacial tão avançada
quanto qualquer outra da frota estelar imperial. Tinham se preparado bem
para a chegada do Imperador.
— Então finalmente temos patente para ver o Imperador ao vivo. —
Berisse cobriu a boca com os dedos, tentando sem sucesso esconder um
sorriso. — Não sei por que estou tão animada. Vamos ficar amontoados com
outros milhares de oficiais. Provavelmente teremos uma visão pior do que a
última fileira de uma pista de corrida.
Nash tinha andado até elas, como sempre. Desde o combate aéreo no
sistema Hudalla, ele estava sendo mais atencioso com Ciena do que nunca.
— Mas pelo menos poderemos contar aos nossos netos sobre o dia que
vimos Palpatine pessoalmente. E, bem, uma cerimônia grande é uma
mudança mais do que bem-vinda, não? Exatamente do que você precisa,
Ciena. Algo pra animá-la.
Ela tinha ouvido variações disso desde Hudalla. A ironia era que ela de
fato estava com o coração partido, só não pelas razões que ele acreditava.
Ainda assim, a pequena irritação que sentia quase não importava diante
do que a perturbava. Como podem falar sobre a cerimônia do Imperador?
Como algo assim tem importância em comparação ao fato de que estamos
dentro de uma nova Estrela da Morte?
Então verificou por si própria. Sim, estavam dentro de uma Estrela da
Morte, cercados por centenas de outros oficiais — algum designados para
aquele local, outros de naves avançadas enviadas para preparar uma
cerimônia adequada à chegada do Imperador. Certamente alguns deles
compactuavam com as dúvidas de Ciena, outros não. Mas divulgar
publicamente sua contrariedade a mandaria direto para a prisão. Ela podia
aprender algo com o autocontrole dos amigos.
Então Ciena permaneceu em silêncio até que os três ficassem
milagrosamente sozinhos em um elevador. O treinamento de comando a
tinha ensinado que escutas raramente eram instaladas em elevadores
militares devido à variação de frequências, então falar ali provavelmente era
seguro. Assim que as portas fecharam, ela disse:
— Não posso acreditar que construíram outra Estrela da Morte. Berisse
deu de ombros enquanto se apoiava na parede, saindo da postura militar.
— Não posso acreditar que fizeram isso tão rápido. Quanto tempo leva
para construir uma dessas? Devem ter começado imediatamente após a
Batalha de Yavin. Bom pra eles.
Ciena se recusava a acreditar no que tinha ouvido.
— Bom para eles?
— Bem, tínhamos que reconstruir a Estrela da Morte. Quer dizer,
caramba! — A expressão de Berisse revelou o quanto estava confusa com a
reação de Ciena. — A maior e mais poderosa de todas as estações já
construídas na história da galáxia explodida pela escória rebelde? Uma nova
Estrela da Morte era a única maneira de honrar os oficiais que morreram em
Yavin. Sc não tivéssemos reconstruído, os terroristas teriam vencido.
— Você não parece concordar, Ciena. — O tom de Nash ora suave, mas
podia perceber como ele a observava atento. — O que acha?
Ela percebeu que estava suando.
— Acho... acho que, se construímos outra Estrela da Morte, planejamos
usá-la. Isso significa que outro planeta será destruído, exatamente como
Alderaan.
— Sem chance — Berisse zombou. — Depois que a estação estiver
pronta e todos souberem dela? Ninguém nunca desafiaria o Imperador
daquela forma de novo. A Rebelião vai se dissolver. Espera só pra ver.
Mesmo com as dúvidas mais dolorosas de Ciena sobre as táticas
imperiais, ela acreditara que ser regida pela lei era sempre melhor do que
pelo caos, mesmo quando a lei era dura. Mas o futuro que Berisse descrevia
não era regido pela lei. Era controlado pelo medo e, portanto, era uma
tirania. Mesmo as atrocidades mais sombrias das Guerras Clônicas não se
comparavam à destruição de um mundo habitado.
E por que Ciena tinha tanto medo de falar isso em voz alta, mesmo entre
seus amigos mais próximos?
Ela tentou encontrar as palavras certas para que entendessem.
— Quando Alderaan foi destruído, pensamos que isso forçaria a
Rebelião a se render, que teria prevenido esta guerra. Mesmo assim, estamos
em conflito há três anos. — E, se alguém tão cético quanto Thane pôde
encontrar líderes rebeldes para seguir e admirar, a Aliança Rebelde não
desaparecerá tão facilmente quanto pensam. — Vocês entendem? Aquela
tática não funcionou. Se esta estação não será usada para proteger os
cidadãos do Império da guerra, como podemos justificá-la?
Nash se endireitou, os olhos semicerrados. Quando respondeu, a voz dele
causou arrepios nela.
— Está dizendo que Alderaan foi destruído em vão? Por nada? Ciena
levantou as mãos.
— Nash, por favor, não quis...
— Ouça — ele começou —, Alderaan tinha que morrer para que o
verdadeiro poder do Império fosse reconhecido. O fim do meu planeta natal
foi também o fim do Senado imperial, o fim de incontáveis lutas mesquinhas
por poder, pragas do início do reinado de Palpatine. Só então o verdadeiro
poder do Império foi revelado.
O olhar dele se tornara perdido, quase sem foco, como alguém em estado
febril. Seu rosto devia ter ficado daquele jeito durante o combate aéreo em
Hudalla.
— Esta guerra é apenas o resultado dos conflitos que têm atormentado a
galáxia durante o último século, o inútil suspiro final daqueles que se opõem
a nós — Nash continuou. — Foi pela mais pura e estúpida sorte que os
rebeldes conseguiram destruir a primeira Estrela da Morte. Ao reconstruir a
estação e usá-la quantas vezes forem necessárias para restaurar a ordem,
provaremos que a sorte não os levará longe. Provaremos que somos e
sempre seremos a única autoridade galáctica.
As portas do elevador se abriram no setor de pouso menor, onde em
breve o Imperador seria recebido. Incontáveis oficiais lotavam os corredores,
uma aglomeração que impedia qualquer esperança de conversar sem ser
ouvido. Ciena se sentiu vulnerável. Qualquer uma daquelas pessoas podia
expô-la como uma traidora, até mesmo seus dois melhores amigos.
Então as mãos de Nash se fecharam gentilmente nos ombros dela. —
Você ainda não se recuperou — ele disse. — Depois de descobrir como
Thane mentiu pra você, é claro que está questionando em quem pode
confiar, talvez até o que é real.
— Aquele combate foi um dos piores momentos da minha vida — ela
disse. Pelo menos podia dizer isso com honestidade.
— Confie no seu trabalho. Confie em nós. Acima de tudo, confie no
juramento que você fez quando saímos da academia. Sua integridade a
define, Ciena. Você não errará se permanecer verdadeira.
Nash sorriu para ela de um jeito que normalmente a faria inventar uma
desculpa para sair do recinto. A mesma paixão que ela tentara desencorajar
com tanto afinco se tomara seu melhor escudo contra a acusação de traição.
Berisse, enquanto isso, já tinha mudado de assunto.
— O que estamos esperando? O transporte do Imperador vai chegar
logo. Vamos!
Durante as próximas duas horas de instruções e formações, Ciena ficou
separada dos amigos. Comandantes tinham um posicionamento um pouco
melhor, mas centenas de capitães, almirantes e atiradores de elite ainda
estivam á frente dela. Anestesiada, fazia o que lhe era pedido, mudando de
posição conforme os organizadores pediam. Pelo menos fazia alguma coisa.
Ela tentou ocupar a cabeça observando o jogo de poder entre os vários
membros do alto escalão, mas nem aquilo ajudava. Ver o quanto as
preocupações deles eram mesquinhas e como era frequente se traírem por
medo da ira de lorde Vader apenas lembrava Ciena que a frota estelar
imperial a que servia não era a mesma na qual acreditara esse tempo todo.
Enfim, a hora chegou. Lorde Vader passou, a capa preta esvoaçante atrás
dele. De longe, a nave de transporte branca parecia uma estrela. Conforme se
aproximava, Ciena pôde ver a faixa cinza característica na nave, a marca que
informava a todos que realmente era o Imperador.
Para a surpresa de Ciena, lorde Vader ajoelhou conforme as pessoas
começavam a descer do transporte. Não era exigido que nenhum dos outros
oficiais ajoelhasse. O que isso significava? Mas a questão foi varrida da
cabeça de Ciena quando o Imperador Palpatine entrou em seu campo de
visão.
O rosto de Palpatine aparecia em incontáveis hologramas todos os dias.
Como qualquer outra pessoa do Império, ela podia descrevê-lo muito bem,
como se fosse alguém da própria família. Cabelo quase inteiramente
grisalho, mas ainda volumoso, o rosto traído apenas pelas menores linhas da
idade, a postura ereta, o olhar afiado. Mas o que viam não tinha nada a ver
com a realidade. Os olhos de Ciena se arregalaram quando se deparou com o
rosto que o pesado capuz dele não ocultava completamente: a palidez
anormal, dobras e rugas inumanas. Ele andou pelo hangar com as costas
corcundas e nem dirigiu uma palavra ou um olhar para as centenas de
oficiais reunidos para recebê-lo.
Não seja tola. E daí que ele envelheceu? Isso é natural! E certamente o
Imperador tem outras coisas para se preocupar além de uma cerimônia
boba...
O raciocínio não funcionou. O que abalava Ciena não era meramente a
aparência do Imperador; era a sensação de maldade quase sem fim que
irradiava dele, tão forte que ela podia ter estremecido. Mesmo à distância,
Palpatine despertava um terror fisico, instintos primitivos dizendo para
escapar ou lutar.
Só outra pessoa já a tinha feito se sentir assim: Darth Vader.
Ciena sempre dissera a si mesma que Vader era uma aberração, um ser
único no Império. Até certo ponto, isso era verdade. Mas a característica
mais terrível sobre ele, a sensação constante de maldade e perigo que ele
exalava, isso era compartilhado com a pessoa mais poderosa na galáxia.
É a isso que tenho servido todo este tempo?
É um pesadelo.
Não funcionou. Thane podia sentir o banco de metal sob ele, o cheiro de
graxa e ozônio do setor de reparos. Todos os detalhes mundanos deixavam
claro que estava bem acordado.
É um teste. Um treino. Os líderes da Aliança querem saber o que
faríamos se confrontados com o pior cenário possível.
Sem chance. Eles não arriscariam reunir toda a armada rebelde para um
simples treino.
Mas se não era um pesadelo nem um treino, era inegavelmente uma
verdade horrível: o Império tinha construído uma segunda Estrela da Morte.
Thane podia pensar em palavras em três dezenas de idiomas para
descrever como se sentia, cada expressão mais obscena que a anterior.
Contudo, não tinha fôlego para pronunciar nenhuma delas. Podia apenas
observar o holograma rotativo à frente enquanto o esquadrão de X-Wings
recebia suas ordens do general Madine.
— Mas como exatamente vão dar um jeito no gerador do escudo de
energia? — Kendy perguntou. — Eles terão dúzias de storm- troopers na
floresta da lua de Endor, se não centenas...
— O general Solo assumirá o lugar do major Lokmarcha, que foi morto
em batalha. O time de Solo lidará com o gerador na lua de Endor. Cada
pessoa envolvida neste ataque tem serviço o suficiente para não ter de se
preocupar com o trabalho tios outros, Corona Cinco — Madine disse com
firmeza.
— Quem diabos é o general Solo? — Thane sussurrou para Yendor.
— Você sabe, Han Solo! O capitão da Millennium Falcon!
O nome da nave soava vagamente familiar, mas Thane não lembrava
bem onde já o ouvira.
Os olhos de Yendor arregalaram, descrentes.
— Não é possível que não saiba! Ele é um dos caras que resgataram a
princesa Leia da primeira Estrela da Morte. Você se lembra disso, certo?
— Não estava com a Rebelião naquela época. Só me juntei um pouco
antes de Hoth.
— Ah... Acho que o general Solo foi capturado por um caçador de
recompensas logo depois de Hoth. — Os lekku de Yendor caíram. — Então
você não o conheceu... mas, ei, ele é um dos melhores.
— De fato ele é — interrompeu o general Madine, que aparentemente
ouvira toda a conversa deles. Tanto Thane quanto Yendor viraram para a
frente e ajeitaram a postura. — O general Solo será acompanhado pela
princesa Leia Organa e por Lukc Skywalker. Eles derrubarão os escudos.
Luke Skywalker de novo. Thane deu um jeito de não revirar os olhos.
Mas a princesa Leia ele admirava. Sabia que podia confiar nela. O general
Madine continuou:
— Enquanto isso, o general Calrissian liderará os caças estelares
que mergulharão direto no núcleo da Estrela da Morte. A dispersão da
frota imperial nos dá uma chance de ataque sem precedentes. Devido â
construção inacabada, o reator principal da estação está exposto e
vulnerável. Uma força de ataque deve ser capaz de penetrar na Estrela da
Morte e atirar dentro do reator, iniciando uma reação em cadeia que destruirá
a estação antes mesmo que tenha a chance de se tornar operacional.
E quem é esse general Calrissian? Thane decidiu não perguntar em voz
alta. Se a Aliança Rebelde estava feliz entregando duas das missões mais
críticas de todos os tempos para um bando de generais novinhos em folha,
certo, ótimo...
— Esquadrão Corona, sua missão é dar cobertura ao general Calrissian
na Millennium Falcon e aos outros caças estelares dos Esquadrões Dourado,
Vermelho, Verde e Cinza conforme eles adentrarem a Estrela da Morte. —
Madine continuou: — Quanto menos TIE fighters eles tiverem que enfrentar
no caminho, maiores as chances de um tiro direto e de uma fuga da frota
toda. Isso significa que vocês estarão lidando com rajadas dos TIE tanto de
dentro quanto de fora da estação espacial, além de ataques em potencial a
longa distância de qualquer nave grande que o Império possa despachar.
Thane imaginou que surtaria completamente com a ideia de partir para a
batalha contra a Estrela da Morte a qualquer instante. No momento, ele mal
podia compreender a existência de tal maldição.
Havia chamado Ciena de ingênua por achar que o Império nunca mais
tentaria destruir outro mundo. Só agora Thane percebia que, em algum nível,
ele também tinha acreditado naquilo. A ideia de outro planeta destruído
como Alderaan era demais para entrar na cabeça dele. Não importava o
quanto a sorte estivesse contra eles, a Rebelião tinha que atacar. De agora em
diante, não era apenas a batalha mais importante que tinham que enfrentar,
era também a única batalha que importava.
Depois das instruções, ele caminhou pelo hangar principal, que tinha
entrado em atividade frenética. Apesar de muitos pilotos estarem verificando
suas naves, outros faziam questão de abraçar amigos e dar as mãos, dizendo
adeus, só por precaução.
Thane parou na Moa primeiro, onde apertou a pata de Brill e a mão com
dedos longos de Metlnvat. Abraçou Lohgarra com tanta força quanto ela o
abraçou. Mas um membro da tripulação da Moa tinha ido parar no
Esquadrão Corona.
— Estava precisando de um novo astromecânico já fazia um tempo —
Yendor disse enquanto JJH2 era posicionado a bordo da X-Wing. — Você
disse que este cara é o melhor.
JJH2 apitou questionador e Thane sorriu para o pequeno droide.
— Sim, eu disse, e é verdade. Cuidem um do outro, certo? Conforme
Yendor e JJH2 verificavam os sistemas juntos, Thane subiu na nave. Já tinha
feito uma revisão detalhada na X-Wing depois da batalha em Hudalla; não
tinha nada para fazer além de sentar na cabine e esperar a ordem para voar
para o combate contra a Estrela da Morte, o que soava muito parecido com
suicídio.
A Aliança Rebelde tinha dado um jeito de destruir a primeira Estrela da
Morte, mas tiveram sorte e deviam saber disso. Uma falha de projeto em um
exaustor? Quais eram as chances? Thane balançou a cabeça enquanto
imaginava aquilo. Sendo um ex-oficial do Império, sabia muito bem que
punição seria dada àquele tipo de descuido. Nenhum engenheiro que
trabalhasse na segunda Estrela da Morte cometeria um erro parecido. Essa
estação seria ainda mais forte que a primeira.
Por um momento, lembrou de quando era um recém-graduado da
Academia Real em Coruscant, voando em direção ao seu posto na Estrela da
Morte. Quando vira a estação pela primeira vez, o tamanho gigantesco o
tinha espantado mais do que qualquer outra coisa. Ainda achava difícil
acreditar que a primeira Estrela da Morte tinha sido destruída ou que a
segunda também seria em algum momento.
A velha voz cética na cabeça dele sussurrava: Você sabe que pode cair
fora a hora que quiser, li um militar voluntário, lembra?
Mas Thane já não dava ouvidos àquela voz. Os outros membros do
Esquadrão Corona e a tripulação da Moa eram o mais próximo que tinha de
uma família agora — talvez o mais próximo que já chegara a ter. Ele podia
não compactuar com a filosofia sonhadora dos companheiros, mas se
amaldiçoaria se os abandonasse na véspera da batalha mais perigosa que já
enfrentaram.
E se o Império vencesse, condenando a galáxia a uma eternidade do seu
governo duro e corrupto?
Thane decidiu que preferia morrer lutando.
Passaram-se dois dias desde que Ciena vira a Estrela da Morte e o Imperador
pela primeira vez; e esses dois dias não fizeram nada além de destruí-la.
Cada descoberta horrível a atingia em um momento diferente. Antes que
pudesse superar uma, outra vinha e acabava com ela: a presença apavorante
do Imperador; a condenação injusta da mãe; a aceitação sem
questionamentos de genocídio como tática militar
por Nash e Berisse; os muitos pilotos que morreram sem motivo
Ele estava certo em tantas coisas, ela pensou desanimada conforme
passava pelos procedimentos de seu exame médico mensal. Os sensores
frios do droide médico a permitiram fingir que seus tremores eram arrepios.
Gostaria de poder dizer a ele.
Ciena ainda não tinha perdoado a Rebelião pela morte de Jude. Nem
acreditava que eles ofereciam qualquer esperança de um governo eficiente.
Entretanto, mesmo que nunca pensasse em se juntar aos rebeldes, agora
entendia como Thane pôde fazê-lo.
— Isto não é sobre manter ou não nossa fé no Império. — Thane dissera
enquanto a abraçava forte na Fortaleza. — A questão é se o Império
manteve ou não a fé em nós.
Um juramento de lealdade permanecia válido mesmo quando o objeto
dele se provava desmerecedor. Apenas se tomava mais difícil.
Conforme Ciena vestia o uniforme mais uma vez, um alerta começou a
ecoar pela nave.
— Todos os pilotos para os TIE fighters imediatamente.
Do que se tratava? Ciena não achava que os rebeldes já sabiam da
estação, uma vez que o segredo tinha sido guardado com tanta eficiência que
atê os oficiais de alta patente no Executor não tinham esse conhecimento.
Provavelmente era um exercício ou alguma outra exibição de poder de fogo
para Palpatine. Não fazia diferença; queria fazer parte daquilo. Precisava
voar mais do que tudo.
A essa altura, o trabalho de Ciena raramente requeria que ela pilotasse
qualquer coisa menor que uma nave de transporte e, mesmo assim, só era
convocada em raras ocasiões. Mas ela sempre mantivera as suas habilidades
afiadas e podia se oferecer como voluntária para voar um caça a qualquer
momento.
De imediato, foi para o comandante de voo da nave, que parecia
estranhamente... presunçoso.
— Entendo, comandante — ele disse, com um sorriso fino serpenteando
o rosto. — E claro que você quer fazer parte disto. Algo para contar aos
netos, não é?
É, pra contar que urna vez me exibi para o imperador nojento e
repulsivo que explodia planetas inteiros. Mas Ciena apenas disse:
— Meu próximo turno é só daqui a seis horas, senhor. Estou pronta para
trabalhar agora.
— A sua coragem não passará sem reconhecimento, comandante Ree.
Apresente-se na pista de lançamento nove imediatamente.
Conforme Ciena vestiu sua armadura preta de piloto TIE, disse a si
mesma que tudo ficaria bem em breve, porque estaria voando. Voar ainda era
seu maior prazer e sua única fuga. Assim que estivesse no ar, cruzando o
espaço, estaria livre de todas as dúvidas massacrantes. Durante aqueles
poucos minutos, seria ela mesma novamente.
Na bagunça da preparação, viu Nash de relance, que abriu um sorriso.
Ele ainda acreditava nela. Mas a pontada de culpa desaparecera mesmo antes
de Ciena subir na cabine. Independente do que acontecesse no futuro, ela
pretendia manter distância de qualquer um que conhecera antes. Talvez
pudesse se inscrever para algum posto isolado no fim do mundo — o tipo de
trabalho que ninguém queria, algo fácil de conseguir — ou talvez um lugar
onde ela realmente fizesse algum bem.
Capacete travado. Motores em potência máxima. Ciena esperou pelo
sinal do esquadrão e então voou para fora do hangar. Centenas de outros
caças a cercavam, tornando a precisão de voo necessária. Ainda assim ela
achava tudo relaxante, até mesmo a vibração e o barulho dentro da cabine.
Decolar sempre a fazia sentir como se suas algemas fossem retiradas e ela
estivesse livre.
Por um momento se lembrou de quando voava sobre as montanhas de
Jelucan no velho V-171, Thane atrás dela, os dois voando como um só...
Então mudou os sensores para longo alcance e engasgou.
Ciena percebera que centenas de caças TIE haviam decolado. O que não
adivinhara era que incontáveis outras naves imperiais estavam reunidas por
perto, inclusive vários Star Destroiers. Era algo além de qualquer coisa que
esperara, maior até que a força de ataque enviada a Hoth.
Então as peças se juntaram.
Estamos esperando um grande combate, e logo. O que significa que os
rebeldes estão vindo.
Se os rebeldes estão vindo, eles sabem sobre a Estrela da Morte e o
Imperador. E, se temos esta tremenda força esperando por eles, nós
queremos que eles saibam.
Foi por isso que Piett me deu ordens para garantir que uma das X-Wings
escapasse. Ele precisava que alguém relatasse os movimentos do Imperador
para a Rebelião. Estávamos preparando uma armadilha esse tempo todo.
De alguma forma, ela sempre soubera disso. Afinal, por qual outro
motivo deixariam os rebeldes livres se não para encher a cabeça deles com
informações falsas? Mas imaginara que só tinha sido uma jogada para
encobrir a localização do Imperador. Contudo, a armadilha que o Império
preparara devia ser maior e mais elaborada; ela era apenas uma pequena
parte disso. Essa não era uma ação militar comum. Esse era o dia em que o
Império planejava destruir a Rebelião de vez.
Mesmo antes das mãos de Ciena se firmarem nos controles, o monitor
dela ficou louco, disparando tanta informação que ela mal podia processar
tudo. No espaço em volta da Estrela da Morte e da lua de Endor, milhares de
naves tinham se materializado.
A Aliança Rebelde havia chegado, e o Império estava pronto para
enfrentá-la.
— QUE A FORÇA ESTEJA CONOSCO.
A voz do almirante Ackbar crepitou pelos comunicadores enquanto a
armada rebelde se dirigia para a Estrela da Morte. Thane tinha que acreditar
na existência da nova estação agora que a via pessoalmente, ainda que
incompleta. Não estavam investindo contra uma Estrela da Morte, apenas
contra a casca de uma. Pensar desse jeito ajudava.
Certo, não ajudava tanto assim. Mas naquele momento Thane se apegaria
ao que pudesse.
O gerador do escudo já devia ter sido desativado, disse a si mesmo
enquanto verificava os sensores. Receberemos a ordem para prosseguir a
qualquer segundo.
A ordem não veio.
E não estava recebendo nenhum tipo de leitura do escudo; não havia
indicação de que estava ligado nem desligado. Thane fez uma careta
enquanto batia nos controles. Esse seria um péssimo momento para ter uma
falha de sistemas.
Então a voz do general Calrissian chegou brusca:
— Interrompam o ataque! O escudo ainda está ativo!
Thane xingou cm silêncio. O que tinha acontecido com a equipe em
Endor?
— Recuem! — Calrissian continuou. — Todas as naves, recuem!
Conforme desviavam da Estrela da Morte, Thane se preparou para saltar de
volta para o hiperespaço para uma fuga humilhante, mas necessária. Então
ouviu novamente a voz do almirante Ackbar:
— Tomem medidas evasivas!
— Setor 47... eles estão aqui — Kendy falou em seguida.
Thane ficou gelado quando viu o que os esperava: aproximadamente
metade da frota imperial, inclusive dezenas de Star Destroiers. A Aliança
Rebelde tinha acabado de chegar à própria execução.
Pelo menos vai ser rápido, pensou Ciena.
O TIE fighter dela avançou com os outros para enfrentar a frota rebelde.
A incrível disparidade de força a convencia de que o Império podia vencer a
batalha em questão de minutos. Enquanto obedecia às ordens para cercar a
fragata médica, notou que os Star Destroiers não estavam se movimentando
para entrar em combate. Por que reunir tanto poder de fogo e se conter?
Então viu o laser da Estrela da Morte começar a brilhar em um tom
esverdeado e obteve sua resposta.
Ela ficou tensa, esperando Endor ou sua lua explodirem. Em vez disso, o
laser atingiu um dos grandes cruzadores rebeldes. A nave foi destruída
instantaneamente.
Se a estação está operacional, por que se dar ao trabalho de nos enviar
para a luta?
Mais uma vez era apenas uma encenação. Apenas um espetáculo.
Dezenas de pilotos TIE morreriam, talvez milhares, sendo que nenhum deles
era realmente necessário ali. A Estrela da Morte poderia eliminar os rebeldes
sozinha. Mas Palpatine quis que cada almirante e general testemunhasse esse
momento e acreditasse que seu Imperador era irrefreável.
Morremos pela glória dele, pensou amargurada. O que significa que
morremos por nada. De novo.
— Por que vocês não estão dando cobertura para os motores? — Ciena
gritou para os pilotos TIE idiotas que tinham deixado algum rebelde imbecil
danificar o Subjugador. — Voltem lá! Se mexam!
Os rebeldes estavam cercados e sabiam disso, porém era óbvio que
pretendiam matar tantos imperiais quanto possível antes de serem
derrotados. O espaço já estava sujo com os destroços de um cruzador
inimigo atingido pelo raio da Estrela da Morte. Ciena sentiu a mesma onda
de raiva com o desperdício da vida de pilotos por comandantes insensíveis,
mas agora sua fúria era direcionada a seja lá quem fosse o líder rebelde que
arrastara Thane de volta para essa guerra.
Só que, no fundo, estava mais brava consigo mesma. Thane seria apenas
um dos rebeldes que morreriam por causa da armadilha que
involuntariamente tinha ajudado a preparar. Tanto ela quanto Thane foram
vítimas de um esquema maligno do Imperador e do terrível massacre que ele
tinha iniciado.
Ciena subiu seu interceptador TIE até acima da ponte principal do
Aniquilador, só por preocupação, para o caso de algum piloto rebelde decidir
voar direto para lá e morrer na glória da batalha. Os outros caças seguiam
com rigidez as posições estabelecidas nas formações de ataque, mas a
patente dela lhe dava a liberdade e a responsabilidade para avaliar a batalha
e ir aonde quer que achasse necessário. Conforme abria caminho para o topo
do Star Destroier, deu um giro com a nave, verificando os sensores para
determinar quais alvos viriam a seguir... então paralisou.
As tropas na lua de Endor tinham falhado. O gerador do escudo fora
desligado.
Os sensores dela mostravam que a frota rebelde estava ciente da virada.
Vetores de voo mudaram instantaneamente e a nuvem de X-Wings em volta
dela se transformou em dardos apontando diretamente para a parte mais
vulnerável e escancarada da Estrela da Morte incompleta: o largo fosso que
levava direto para o reator principal.
Mas o que os rebeldes esperavam conseguir? Sim, poderiam fazer alguns
estragos no caminho, mas o labirinto de vigas e cabos certamente iria
destruir qualquer nave invasora. Ciena via os TIE fighters se aproximando
da estação espacial, rumo à mesma área para acabar com os rebeldes. Era
tudo um desperdício sem sentido.
Voltou sua atenção para o Star Destroier mais próximo, sua própria nave,
o Executor. Só agora o Destroier começava a enfrentar as naves rebeldes
diretamente. Todos os almirantes tinham esperado a Estrela da Morte atacar
primeiro, outra demonstração da predileção de Palpatine pela teatralidade a
despeito das táticas sólidas.
Então ela viu uma X-Wing rebelde rodopiando fora de controle, indo
diretamente para os escudos defletores da ponte do Executor. Xingando,
tentou mirá-la, mas a nave estava muito distante e voando muito rápido...
Uma chama laranja marcou o impacto e, horrorizada, Ciena imaginou a
extensão dos danos. Nem aquele ataque, nem o dano anterior aos motores da
nave poderiam por si só destruir um Star Destroier, mas a combinação se
provou fatal. De queixo caído, viu o Executor perder seu motor principal e
começar a flutuar à deriva em direção ao objeto mais próximo com maior
campo gravitacional — a Estrela da Morte.
Mesmo um Star Destroier não pode destruir a Estrela da Morte sozinho,
ela se lembrou. Foque no alvo!
Mas a destruição do Executor significava a morte de Berisse...
Foque no alvo!
A respiração de Ciena estava tão acelerada e densa que o visor do seu
capacete começou a ficar levemente embaçado. Ela tentou se acalmar
focando no voo. Se pensasse nos ataques como um desafio de pilotagem,
como uma fuga para o céu, poderia fizer isso.
Ajustou as coordenadas para um cruzador Mon Calamari enorme. Se
pudesse derrubar os defletores da ponte, poderia empatar o placar.
Eu poderia voar para dentro dele exatamente como aquela nave rebelde
fez, mas de propósito, para tennirtar esta batalha. Talvez pudesse acabar
com a guerra.
Esse pensamento era... tentador.
Ainda assim, enquanto Ciena inseria as coordenadas, ordens vieram
pelos comunicadores.
— Todas as naves, reagrupar nas coordenadas pré batalha. Reagrupar
imediatamente.
— Quê?! — Ela não podia entender por que alguém daria tal ordem. As
coordenadas pré batalha ficavam muito longe dos rebeldes e da Estrela da
Morte para que fossem eficientes. Os dedos dela voaram pelos sensores,
ampliando a visibilidade para que pudesse ter uma ideia do que estava
acontecendo.
O que viu foi a tropa rebelde batendo em retirada da Estrela da Morte.
Ou estavam recuando ou...
Ciena não terminou o raciocínio. Nada importava além de seguir as
ordens. Não pense. Apenas reaja.
Enquanto se afastava do Aniquilador, viu dois TIE fighters se movendo
mais devagar que o restante; tinham sido danificados, mas ainda podiam
voar. No treinamento, era dito aos pilotos TIE que ajudar seus companheiros
de voo era a menor das prioridades, uma tarefa que só deveria ser assumida
se não houvesse nada mais a ser feito. Ciena decidiu ignorar o que
aprendera. Posicionou-se atrás deles, dando cobertura contra qualquer ataque
rebelde enquanto se dirigiam para a frota imperial em segurança.
Conforme o tempo passava, porém, eles ficavam cada vez mais para trás.
A essa altura ela deduzira que os rebeldes estavam se retirando em outra
direção; encará-los tinha se tomado menos importante do que permanecer
vivo.
— Vamos — sussurrou para os caças que se arrastavam na frente dela.
Precisavam ir mais rápido...
— Ciena?
Por que alguém queria falar com ela? Ela não queria falar. Tudo o que
queria era dormir.
— Ciena, pode abrir os olhos? Por favor, tente.
Ela obedeceu, piscando com a claridade. Conforme a visão clareou, viu
Nash com um pequeno curativo na testa ao lado da cama, vestindo o
macacão de folga. Três droides médicos circulavam em volta do pé da cama,
todos apitando e assobiando conforme faziam leituras.
— Bom. — Nash sorriu da forma que as pessoas sorriem quando tentam
não chorar. — Você conseguiu.
— Por que eu...?
Ciena tentou levantar para ver seu tronco, mas o movimento causou uma
dor terrível que se espalhou por todo o corpo. Respirando com dificuldade,
afundou mais uma vez no leito hospitalar.
Nash filou com a voz grave e calma, como um treinador tranquilizando
um animal ferido.
— Você sobreviveu à cirurgia, mas disseram que foi por muito pouco.
Tiveram que retirar seu fígado. O estrago estava além de qualquer
tratamento.
A maioria dos membros ou órgãos podia ser reposta por peças robóticas
de alta qualidade. O fígado era uma das únicas exceções, pois suas funções
eram muito delicadas para serem reproduzidas.
— Por enquanto você está conectada a um cinto de suporte vital,
parecido com o da armadura de lorde Vader, mas só precisa usá-lo em volta
do tronco. Terá que passar por terapia regenerativa intensiva. Pode demorar
meses para crescer um novo fígado, porém é possível. — Ele tentou sorrir.
— Só você mesma pra dar um jeito de tirar meses de licença sem ser
repreendida.
Ciena engoliu, mas sua boca e garganta estavam muito secas.
— O que aconteceu com a frota?
O sorriso de Nash desapareceu em um instante.
— A Estrela da Morte foi destruída. O Imperador Palpatine, Lorde Vader
e o Moff Jerjerrod, todos pereceram... Berisse também. — Ele gaguejou o
nome da amiga. — A Rebelião está enviando um comunicado em massa
alegando ser o novo poder na galáxia. A frota estelar imperial está se
reagrupando para planejar o próximo ataque e nomear o novo Imperador.
— Novo Imperador?
— Você não imagina os abusos de poder que estão acontecendo. Revolta
civil em toda a galáxia, até mesmo em Coruscant. Mas o mais forte
prevalecerá, e teremos o líder de que precisamos para estes tempos difíceis.
O mais perverso e cruel dos Moffs ou almirantes tomará o poder. Não
teremos um Imperador melhor, capaz de endireitar nosso curso. Em vez
disso, afundaremos mais ainda.
— Não chore — Nash disse. — Você está cansada. Não devia se exaurir
forçando-se a falar. Volte a dormir. Precisa descansar.
Ciena virou a cabeça no travesseiro em vez de se despedir.
Ela não percebeu que tinha ficado inconsciente até acordar. A julgar
pelas luzes baixas e a falta de funcionários humanos, devia ser o equivalente
à noite na enfermaria. O cinto de suporte vital em volta da cintura dela era
pesado e duro, e os conectores injetados em sua pele davam a sensação de
agulhas na sua barriga. Provavelmente continuariam a machucar enquanto
tivesse que usar aquela coisa. Ciena levantou a mão, e um droide rodou
prontamente para o lado dela com um pouco de água.
Depois de sugar por um canudo, disse:
— Quando minha armadura foi removida... Eu tinha uma pequena
bolsa... Com um bracelete de couro dentro, gravado...
— Os itens foram destruídos — o droide anunciou. Era um dos modelos
sem olhos. — Eram contra o regulamento.
Não e contra o regulamento carregar alguma coisa no bolso!, ela queria
protestar, mas permaneceu em silêncio. Somente agora percebera que seu
bracelete tinha sido sua rebeldia solitária e silenciosa contra o Império, o
único ponto em que se recusara a ser totalmente um deles. Agora tinham
arrancado aquilo dela. Mais do que isso, tiraram a janela de Wynnet para o
universo. Ciena não viveria mais pela irmã; Wynnet caíra na escuridão para
sempre.
Ciena não tinha fé no Império, nem lealdade, nem amigos e nenhuma
posse que a ligasse ao seu mundo natal. A galáxia estava novamente caindo
no caos e na anarquia. E ela não veria Thane de novo. Tudo o que podia
fazer era ficar deitada ali, impotente, enquanto as máquinas trabalhassem por
meses tortuosos para deixá-la pronta novamente para servir em uma força
militar da qual ela não queria mais fazer parte.
Fechou os olhos e entrou no espaço estranho entre a imaginação e o
sonho. Na sua cabeça, mais uma vez pegou o TIE fighter, mas, agora, mirou
para o deque. Se ela pudesse se chocar contra o deque com força suficiente,
o seu caça explodiria e poderia acabar com a preocupação, parar a dor. Ela
poderia simplesmente parar.
A LICENÇA MÉDICA não exigia absolutamente nada dos oficiais do
Império, até porque os que não se recuperavam depressa eram, em sua
maioria, declarados inaptos para o serviço. Diziam que os droides médicos
também tratavam por último aqueles com ferimentos severos que
demandavam uma recuperação longa, para dedicar os recursos àqueles que
poderiam voltar a servir o Império antes.
Ciena estava na situação quase única de passar vários meses em licença
médica, sem responsabilidades. Foi designada para a estação espacial Wrath
basicamente porque eles tinham lugar para uma pessoa alheia a tudo. Nash
havia brincado com ela sobre a oportunidade de ouro para ver holonovelas
ou assistir a velhos filmes picantes, mas Ciena não queria tanto tempo livre.
Isso apenas a faria pensar.
Pelo menos podia se submeter à terapia com baeta. Eles a submergiam
num líquido pegajoso por pelo menos duas horas ao dia, às vezes mais.
Sedativos sempre eram aplicados antes, para evitar a claustrofobia severa
que algumas vezes levava os pacientes a entrar em pânico e a se machucar
de novo. Ciena agradecia o momento em que o maldito cinto de suporte vital
era tirado do corpo dela. Agradecia ainda mais quando a agulha entrava em
seu braço e a escuridão resultante dos sedativos tomava conta. As vezes a
letargia posterior durava horas.
Contudo, durante breves períodos quando estava acordada e forte,
insistia em trabalhar.
O trabalho na ponte estava além da capacidade dela; pilotar era
impossível. Então Ciena se voluntariou para uma das tarefas mais
complicadas e caóticas enfrentadas pela frota estelar imperial, que surgiu por
causa dos acontecimentos em Endor e um dos únicos trabalhos que Ciena
não se importava em fazer. Sua missão era confirmar quais oficiais imperiais
estavam vivos ou mortos, descobrir a localização precisa de todos os
sobreviventes e informar os familiares.
(Supostamente, notificar os falecimentos era a tarefa de menor
importância. Mas Ciena passou bem mais tempo entrando em contato com
aquelas famílias do que procurando por sobreviventes desaparecidos que
poderiam ter desertado. Usando um pouco de criatividade na manutenção
dos registros e sempre com muita cautela, ela pôde evitar ter de localizá-los.)
Após o falecimento do Imperador, a galáxia passou por um período de
caos ainda mais intenso do que Ciena imaginara possível. Coruscam
permaneceu em um turbilhão; o grão-vizir Mas Amedda tentou manter o
Império unido enquanto outras forças ameaçavam estraçalhá-lo. Consolidar
e confirmar informações sobre os soldados estava longe de ser uma
prioridade. Então os Star Destroiers mantinham apenas seus próprios
registros liberados para acesso e, mesmo quando essa informação estava
sintetizada, era difícil ter uma visão geral.
Para complicar ainda mais a situação, nem Ciena nem qualquer outro
oficial sabiam ao certo a quem exatamente estavam servindo.
As declarações de um novo Imperador eram frequentes e sem sentido.
Nenhuma figura parecia capaz de consolidar o poder. As propagandas na
HoloNet falavam sobre “conflitos” ou “motins”. A verdade era que os
pretensos Imperadores forçavam os soldados imperiais a lutar uns contra os
outros, derramando sangue não a serviço da lei e da ordem, mas pela pura
ambição. Com desprezo, Ciena pensou que pareciam mais dispostos a
despedaçar o Império do que a abrir mão de sua autoridade. O setor Anoat já
tinha sido cortado completamente. Quais planetas cairiam na sequência?
Já os rebeldes consolidaram sua autoridade em seus próprios mundos. Os
únicos informes que surgiam soavam tão perfeitos que Ciena acreditava que
também eram propagandas, mas do outro lado.
Pelo menos agora existem sistemas inteiros que são seguros para Thane,
ela às vezes pensava. Ele não é mais um homem procurado. Ele ainda estava
na frota rebelde? Ciena não tinha certeza. Dependia se decidira confiar nessa
“Nova República” tanto quanto confiara na Rebelião. Ou morrera na Batalha
de Endor.
Os rebeldes podiam ter ganhado, mas também tiveram perdas terríveis.
Ciena acreditava — sem nenhum motivo lógico, mas com certeza absoluta
— que teria reconhecido Thane no meio da briga. Sabia exatamente como
ele voava, e isso era tão particular a ele quanto sua impressão digital ou seu
código genético.
Mas, se fosse verdade, só significava que ela mesma não tinha matado
Thane.
Qualquer outro dos vários pilotos TIE teria tido a chance de matá-lo. Ou
ele poderia estar próximo demais de um dos cruzadores quando o laser da
Estrela da Morte foi disparado. Talvez estivesse entre os pilotos que voaram
para dentro da estação e foram esmagados pela estrutura metálica.
Não pense nisso, ela dizia a si mesma enquanto sentava na frente do
terminal de dados portátil instalado em uma cama hospitalar. Deitar a
ajudava a aguentar a sensação perfurante do cinto de suporte vital que fazia
o trabalho de seu fígado.
Você tem que acreditar que ele está vivo em algum lugar. Se não puder
ter fé em mais nada, ainda pode acreditar em Thane.
Mesmo assim, de tempos em tempos, Ciena sentia que ele estava morto.
A galáxia só podia parecer tão vazia e sem sentido se ele não estivesse mais
nela.
Então ela mergulhou no trabalho, desembaraçando cada nó burocrático
com paciência, localizando e resgatando naves e tropas isoladas e ajudando
famílias a velar seus mortos. Dessa fornia, poderia manter um pouco de lei e
ordem no caos. Nada mais parecia importar. Seus únicos confortos eram a
sedação do tanque de baeta e o sono. Ciena podia ignorar tudo o mais por
dias a fio.
Depois por semanas.
Depois por meses.
Thane não esperava que o Império entrasse em colapso do dia para a noite.
Alguns, com um otimismo cego, tinham acordado na manhã seguinte à
destruição da Estrela da Morte falando sobre como finalmente viviam em
uma galáxia livre, respirando ar puro e outras bobagens sem sentido. Já ele
tinha remendado sua X-Wing e aguardava pelo inevitável chamado para a
próxima batalha.
Contudo, jamais esperara lutar em uma grande guerra quase um ano após
a Batalha de Endor.
— Estão se aproximando! —Yendor gritou pelos comunicadores.
Thane jogou a X-Wing para o lado para ver outro grupo de
TIE fighters acelerando na direção deles sobre os picos dos penhascos
em Naboo. Esses deviam ser os retardatários da força de ataque que havia
descido no planeta no dia anterior. For sorte, a frota da Nova República tinha
recebido um aviso de desertores. Quando as naves imperiais saíram do
hiperespaço, o esquadrão de Thane e várias outras dezenas de caças estelares
estavam esperando por eles. Desde que chegaram ele os tinha destruído, um
a um, exatamente como fazia naquele instante. Atirou mesmo voando de
lado com a nave, e sentiu uma satisfação impiedosa ao ver três dos TIE
fighters explodirem.
Os outros do Esquadrão Corona cuidaram do restante. O planeta agora
estava livre, ou perto disso. A asa de estibordo de Kendy foi atingida, mas
ela ainda deu um jeito de pousar suavemente ao lado dos outros no amplo
pavilhão na parte exterior do palácio real de Theed. Kendy saltou da cabine
xingando, o que fez os outros rirem.
— Calma — disse Thane. — Você já levou tiros piores que esse.
— E verdade... E estou de saco cheio disso! — Ela pegou o kit de
ferramentas e começou a trabalhar.
Os demais tiveram um momento para descansar. O Esquadrão Corona
era diferente agora: a Condessa tinha voltado ao seu planeta natal para se
candidatar à presidência. (Todos prometeram aparecer para a cerimônia de
posse se ela fosse eleita.) Yendor assumira o posto de líder do Corona, e dois
novos pilotos se juntaram a eles: um novato de Nea Dajanam e um exilado
de Coruscant. Thane gostava de ambos e se sentia bem com a união da
equipe. Ele se apoiou na lateral da nave, aproveitando o calor do sol no
rosto. Momentos de paz como aquele eram raros.
Naboo era o planeta natal de Palpatine. Dessa forma, tornara-se um
ponto de encontro para os simpatizantes imperiais. Além da importância
simbólica, Naboo era um mundo próspero da Orla Média, e sua economia e
seus recursos naturais eram bem mais saudáveis que da maioria dos planetas
sob o governo imperial. Assim, era um dos locais mais disputados em toda a
galáxia.
Em três ocasiões o Império enviara tropas invasoras; em três ocasiões
elas foram expulsas. Thane pensava quanto tempo demoraria até a quarta
tentativa.
— Ei — Yendor chamou enquanto ajudava JJI12 na nave. — Eu e mais
uns colegas vamos para Otoh Gunga hoje à noite. Quer dizer, se não
recebermos mais alertas. Parece que tem uma sobremesa que eles fazem lá
que precisa de pelo menos quatro humanoides pra comer. Dizem que derrete
na boca e causa um glorioso coma glicêmico. Não quer ir também?
— Não, obrigado. — Thane, contudo, sorria. Seus amigos se
empenhavam muito em cuidar dele, mas precisava lidar com algumas coisas
sozinho. — Divirtam-se. Eu fico no turno noturno no hangar.
Yendor balançou a cabeça, sacudindo seus longos lekku azuis, mas foi
embora sem maiores discussões.
Jelucan tinha rituais de luto bem específicos. Pelo menos o povo do vale
tinha. Thane aprendera sobre eles com Ciena; não tinha certeza se lembrava
de todos os detalhes corretamente, mas estava fazendo o seu melhor.
(Jelucan permanecia sob controle imperial, então Thane não podia pedir
conselhos a Paron Ree ou mesmo lhe oferecer condolências.) Ele queria
tecer e usar um bracelete para que Ciena pudesse ver pelos olhos dele, mas
ela dissera que essa honra era reservada à família. Por mais que se lembrasse
vagamente dos rituais para amigos, eles pareciam elaborados o suficiente
para durar um ano inteiro após a morte da pessoa. Ele vestia uma faixa
amarrada em volta do braço e não a retiraria até que um ano inteiro se
passasse. Para marcar os primeiros seis meses, preparara a refeição
costumeira de vinho e pão que devia ser deixada à noite para os espíritos.
Ele esperava que não tivesse que ser um pão especial ou algum vinho em
particular; fizera o melhor que podia com o que tinha em mãos. Até onde
Thane sabia, não teria que se abster de todas as atividades de lazer, mas o
ritual requeria que meditasse várias horas por semana.
Certo, ele não era exatamente bom no lance da meditação, mas se
esforçava.
Grandes gestos simbólicos não eram exatamente o estilo de Thane.
Entretanto, depois de Endor, tinha que encarar a realidade de alguma forma e
não fazia ideia de por onde começar. No desespero, buscara Ciena nos rituais
do povo dela. Para sua surpresa, a experiência se revelara uma boa forma de
cura espiritual.
Ele guardou luto por todos que tinha perdido: Smikes, Dak Ralter, os
gentis Mon Calamari da Liberdade, incontáveis pilotos que conhecera... e
por Jude Edivon e outros cadetes com quem convivera na academia e que
morreram em uma das Estrelas da Morte ou em outras batalhas. O Império
podia ter exigido que sacrificassem suas almas, mas, em algum momento, a
maioria deles fora tão boa quanto qualquer outra pessoa. Tudo o que era bom
nelas tinha sido perdido para o Império e para a guerra; certamente isso era
algo que merecia um período de luto.
Suas meditações o levaram a um lugar inesperado, um ponto de vista que
nunca imaginara que teria: a Nova República realmente era algo pelo qual
valia a pena lutar.
Claro, a transição fora complicada. Com a guerra ainda em andamento,
Mon Mothma, a princesa Leia Organa, Sondiv Sella e outros do alto escalão
não puderam instituir a estabilidade total. Mesmo assim, o Senado Galáctico
era formado apenas por representantes escolhidos pelo povo, e as primeiras
leis que aprovaram corrigiram as piores injustiças do Império. Até as
discussões nos noticiários sobre os méritos de cada proposta eram
maravilhosas, porque significavam que as pessoas estavam livres para
expressar suas opiniões sem medo de represálias. Os recursos não eram mais
direcionados apenas para a força militar; a limpeza maciça dos mundos
poluídos já começara, bem como as indenizações para as espécies
escravizadas durante o governo imperial. (Lohgarra disse que ia gastar sua
parte em novos motores para a Mighty Oak Apocalypse. Mesmo que ainda
fosse imperfeito, o rumo da galáxia parecia seguir cm direção à justiça e,
talvez algum dia, à paz.
Thane nunca quisera ser um idealista, mas estava começando a pegar o
jeito da coisa.
Conforme se preparava para uma longa noite no hangar, Kendy veio da
X-Wing dela.
— Tudo certo? — Thane perguntou.
— Quase tudo. Preciso de uma pinça louariana pra terminar, mas posso
pegar uma do Yendor emprestada amanhã cedo. — Ela se apoiou na parede,
com os braços cruzados no peito. O cabelo verde-escuro caía sobre os
ombros. — Então, vai ficar aqui hoje à noite?
— Como sempre.
— Você vai ficar aqui sozinho por horas.
— E, vou. Vou sentar nesta cadeira confortável com uma boa
holonovela, sob um dos céus mais lindos que já vi, em um mundo onde o ar
ainda é limpo e os pássaros ainda cantam. Ninguém vai disparar um laser
contra mim nenhuma vez. Depois de anos de guerra, uma noite tranquila
como esta é minha definição de diversão.
— Parabéns pelo aniversário de oitenta anos, aliás.
— Ah, por favor... — Thane sorriu. — Você precisa admitir que tenho
razão.
Kendy riu.
— Eu sei. E só... estranho você virar todo místico e espiritual e essas
coisas.
— Não virei. — Muitos dos rituais o faziam se sentir estranho e falso,
mas Thane acreditava que a tentativa era válida mesmo assim. — Isso é só
uma coisa que eu tenho que fazer.
— Compreendo. Mas posso perguntar uma coisa? — Thane assentiu. —
Até quando você vai usar isso?
Ela apontou para a faixa de tecido azul acinzentado que ainda estava
amarrada na parte superior do braço direito dele. Aquela era a cor Jelucana
do luto, a escuridão dos céus onde enterravam seus mortos.
— Quando completar um ano eu tiro — Thane disse.
— Faltam só algumas semanas para completar um ano da Batalha de
Endor. Só então você finalmente vai superar a morte de Ciena?
Ela não tinha entendido nada.
— Não. Vai ser o dia em que vou parar de seguir os rituais de luto. Mas
não superei a morte da Ciena. Nunca vou superar.
— Isso é... mais melodramático do que eu esperava de você, Thane
Kyrell.
Ele deu de ombros.
— Não é melodrama, é a verdade. — Como poderia superar a morte
dela? Thane explicou devagar: — O que éramos um pro outro... Quando
perdi Ciena, perdi uma parte de mim. Não é possível superar isso. Sempre
haverá um vazio onde ela costumava ficar.
Seja lá o que Ciena Ree fosse, não era uma traidora. Durante as poucas
semanas que servira como capitã do Infligidor, cumprira seu trabalho com a
maior habilidade possível. Se não sentia mais lealdade ao Império, entendia
sua responsabilidade para com centenas de milhares de vidas sob seu
comando. Então não dera nada menos do que seu melhor durante a Batalha
de Jakku.
Se outros oficiais pudessem dizer o mesmo, talvez não estivessem à beira
da aniquilação.
— Relatório da situação! — Ciena solicitou conforme se aproximava das
cabines de dados.
— O motor três está com apenas sessenta por cento da capacidade,
capitã. — O jovem recruta virou o rosto para encará-la, e sua pele corada
empalideceu em pânico. — Motor um e cinco estão completamente
desligados. Dois, quatro e seis estão abaixo de trinta por cento da potência.
Droga. Se as equipes de manutenção conseguissem fazer que dois
motores voltassem a ficar acima dos oitenta e cinco por cento, então
poderiam saltar para o hiperespaço e escapar da batalha. Se não pudessem
consertar, ou se o motor três ficasse mais danificado, o Infligidor estaria
enrascado. A única chance de sobreviver seria bater em retirada.
O monitor principal mostrava um panorama desastroso. Centenas de
naves estavam sobre a superfície dourada de Jakku, tanto imperiais quanto
rebeldes, desde fragatas e outros Star Destroiers até incontáveis caças. As
telas menores mostravam cenas da batalha no solo, que se provava ainda
mais conturbada. Enquanto assistia, um Walker levou mais ataques do que
aguentava, cambaleou e caiu de lado, tão pesado que levantou uma grande
onda de areia. Para todos os lados que Ciena olhava, os rebeldes estavam
atacando enquanto os imperiais tentavam em vão se defender. A vantagem
era da Aliança desde o começo, de forma que Ciena imaginou amargamente
se a batalha não tinha sido uma armadilha. Talvez os planos imperiais de
criar um grande confronto em Jakku tivessem sido vazados por algum
almirante ou Grão Moff cujo jogo de poder fora frustrado.
— Precisamos de uma mudança estratégica — ela disse para si mesma.
As táticas imperiais de batalha quase sempre exigiam um planejamento
em conjunto, um esforço simultâneo de todas as naves em combate
rigidamente controlado por uma central de comando. Quando o Império
possuía vantagem numérica e de poder de fogo, essas táticas faziam sentido.
Agora Ciena pensava que estavam se agarrando a regras de um jogo que
tinha acabado havia mais de um ano.
Os rebeldes provaram que forças de ataque menores podiam ser eficazes,
até letais. Com frequência atacavam em múltiplas frentes de uma vez só,
segmentando suas forças. Essa abordagem era mais arriscada, mas estava
dando resultado em Jakku.
O Infligidor estremeceu. Apesar da sensação não ser maior do que uma
pequena vibração sob a cadeira dela, Ciena sabia o que o dano significava
antes mesmo de os monitores de controle acenderem a luz vermelha.
— Descompressão explosiva à popa de estibordo! — choramingou um
novato. — Perdendo atmosfera...
— Sele todos os deques afetados! — Com essas palavras Ciena sabia que
tinha salvado a nave... mas condenado centenas, se não milhares, à morte por
asfixia.
Não podemos continuar lutando seguindo as antigas regras. E inútil.
Ciena foi até o monitor e puxou uma visão tridimensional em miniatura
da batalha. Se pudesse convencer o Grão-Moíf Randd a dividir a frota para
atacar o cruzador rebelde a partir de múltiplas direções, talvez até enviar
uma das naves maiores de ataque para a atmosfera para dar apoio aos TIE
fighters em combate próximo à superfície do planeta, no mínimo
desestabilizariam os rebeldes. E eles precisavam desesperadamente de
qualquer vantagem.
Randd a ouviria? Podia ser capitã de um Star Destroier, mas ele era um
Grão Moff, e sutilmente tinha deixado claro que ela devia sua ascensão de
patente a ele.
Mais uma vez a incomodou o quanto era absurdo — o quanto era tolo,
ineficaz, estúpido — que a patente importasse mais do que ideias na frota
imperial. Isso a enfureceu, a enojou. Ela odiou o Império a que servia, os
valores que ele representava, a fornia como todos falavam de Palpatine como
se ele fosse um mártir virtuoso. Odiou a si mesma por já ter acreditado em
tudo isso. Principalmente, odiou por aquilo ser tudo o que lhe restara.
Mas então viu os outros oficiais reunidos em volta dela, esforçando-se
muito para cumprir seu dever e para sobreviver. Ciena devia a eles, no
mínimo, fazer o seu melhor. Se não tivesse nenhuma outra tarefa digna de
ser feita, podia simplesmente tentar levá-los para casa.
— Abra um canal de comunicação com o Grão Moff Ra... — ela
começou a dizer.
A nave inteira estremeceu com intensidade suficiente para derrubar os
quepes da cabeça dos oficias e jogar pelo menos dois analistas no chão.
Ciena se apoiou na parede.
— O que foi isso?
— Capitã, estamos com outro rompimento na fuselagem, a bombordo,
dos deques RR até ZZ. — O rosto da jovem oficial revelava o quanto estava
confusa. Ela encarou Ciena com a pele tingida pelas luzes vermelhas. —
Mas os sensores não revelam sinal de vácuo.
Então o Infligidor estremeceu mais uma vez. E mais uma. E uma quarta
vez. Cada impacto gerava as mesmas leituras bizarras: buracos na nave que
não resultavam em vácuo. Só podia haver uma explicação.
Os instintos de Ciena dispararam. Apesar de ela nunca ter estado a bordo
de uma nave quando isso acontecera, aprendera na academia os sinais e os
revivera em alguns dos seus pesadelos.
— Fomos invadidos.
Invadidos. No meio de uma batalha, isso significava apenas uma coisa: a
nave dela tinha que ser destruída.
— Tomem o centro de controle do motor três — Thane ordenou pelo
comunicador enquanto seguia para o canto do corredor que já estava turvo
com a fumaça. — Se pudermos derrubar o último motor principal em
funcionamento, teremos uma chance.
O trabalho de Thane era mais simples e bem mais crítico. Tinha que
desconectar os sistemas de autodestruição o quanto antes. Nenhum oficial
imperial hesitaria antes de ordenar o suicídio em massa necessário para
manter um Star Destroier longe das mãos da Nova República.
A frente dele, no corredor perpendicular, Thane viu disparos de laser. O
eco de cada tiro ricocheteava nos seus ouvidos com uma intensidade
dolorosa. Em meio ao leve zunido na cabeça, o rebelde podia ouvir os
relatórios que chegavam. Contrariando as previsões de Rieekan, a tripulação
do Infligidor era bem resistente. As tropas imperiais a bordo da nave
pareciam mais dedicadas do que a maioria das outras. Puro azar de Thane.
Os tiros à frente pararam, e a cabeça de Kendy apareceu no canto.
— Abri caminho pra vocês, rapazes. Vamos! Rápido!
Thane correu na frente do batalhão, torcendo para que pudessem avançar
até a ponte auxiliar a bombordo. Se tomassem o controle de lá, estariam em
uma posição bem melhor para ajudar os outros soldados da Nova República
espalhados pela nave.
Conforme avançavam para o próximo setor, porém, outro grupo de
stormtroopers os encontrou, com suas pistolas laser ardendo. Thane encostou
na parede. O ar cheirava a ozônio e fumaça e ele não via saída. O que eu
faço?
Não podiam chegar até os sistemas de autodestruição, não desse jeito.
O que significava que, em questão de minutos, o Infligidor explodiria e
mataria a todos.
Passe no meio disso, ordenou a si mesmo. Vá!
— Capitã Ree, você não pode fazer isso! — protestou uma das novatas.
Ela não devia ter mais de dezessete anos. A frota imperial trazia os
remanescentes da academia, mesmo que ainda fossem muito jovens.
— Não só posso como devo. — Ciena assumiu seu assento enquanto se
preparava mentalmente para o que ia fazer. Com um tom mais gentil,
acrescentou: — Não tenha medo, recruta Perrin. Teremos tempo para chegar
aos módulos de fuga, e cada um deles está equipado com um sistema de
retorno que nos levará direto para a nave imperial mais próxima.
Perrin sorriu trêmula; em volta dela, outros oficiais também pareciam ter
se acalmado. Por que os regulamentos não encorajavam a falar com qualquer
senso de moderação ou compaixão se isso funcionava tão bem?
Pelo menos a brutalidade do Império a ajudaria depois da batalha. Assim
que isso estivesse encerrado — presumindo que eles não estariam todos em
um campo de prisioneiros da Nova República —, Ciena seria chamada para
justificar a ativação da autodestruição de um Star Destroier, uma das naves
mais poderosas e valiosas da frota estelar imperial. Ela conhecia o jogo bem
o suficiente para saber que qualquer explicação seria considerada
inadequada. Antes de Endor, isso resultaria em uma sentença de prisão longa
e penosa em Kessel. Agora, ou seria expulsa do cargo ou seria executada na
hora. Ciena descobriu que não se importava com nenhuma das alternativas.
— Ao meu sinal — Ciena disse. — Preparem-se para a autodestruição.
Iniciando em dez... nove... oito...
O Infligidor tremeu novamente. Mesmo desprezando o Império, Ciena
ainda era uma capitã e sentia uma pontada a cada ferimento em sua nave.
— Três... dois... um. Iniciar.
A recruta Perrin abaixou a alavanca que iniciaria a autodestruição. Ciena
esperou pelas luzes vermelhas, as sirenes e o anúncio automático que
mandava todos os tripulantes para os módulos de fuga, o sinal para ela selar
as portas, mas nada aconteceu. Depois de o silêncio durar tempo demais, ela
se levantou da cadeira e puxou as plantas da nave. Luzes de danos piscavam
em todos os lugares errados, em particular em uma área não muito longe da
ponte auxiliar a bombordo.
— Eles focaram os sistemas de autodestruição — Ciena disse quase sem
acreditar. — Tiraram especificamente isso do ar.
Apenas um ex-oficial do Império saberia como fazer isso. Na cabeça
dela, ouviu a frase que o pai dissera uma vez quando ela era criança: Todos
os traidores são detestáveis.
— Aguardando as suas ordens, capitã — disse um tenente parado no
posto de dados.
Ela percebeu que todos na ponte, e provavelmente em toda a nave, não
tinham ideia do que fazer.
Mas ela sim.
A constatação brilhou dentro de Ciena como o dia mais bonito que já
vira. Podia cumprir suas obrigações, manter seu juramento e se livrar dessa
loucura para sempre.
Voltou para a cadeira e apertou os botões que projetariam a voz dela em
todas as estações e para cada caça a bordo do Infligidor.
— Todos os tripulantes, abandonar a nave. Todos os caças, apre- sentem-
se à nave imperial mais próxima. Todos os tripulantes, abandonar a nave.
Vocês têm dez minutos.
Em volta dela, o restante dos oficiais estava chocado. Pela primeira vez
durante seu comando, Ciena gritou com eles:
— O que estão esperando?! Vão para os módulos de fuga! Rápido!
Conforme todos saíam, os comunicadores chiaram e apitaram.
Ciena sabia quem era antes mesmo de ouvir a voz — apenas um
tripulante seu ousaria questioná-la agora.
— Você ficou louca? — gritou Nash.
— Não sei do que está falando, comandante Windrider.
— Não venha com essa de “comandante Windrider” pro meu lado. Não
agora. Se a autodestruição estivesse ativada, teríamos ouvido o sinal
automático. O que me diz que você está planejando destruir a nave por...
outros meios...
Ciena se encostou na cadeira de couro preto, tão exausta como se não
tivesse dormido por anos.
— Diga logo.
— Você vai chocar o Infligidor contra o planeta.
Ela começou a digitar as coordenadas que a levariam direto para a
superfície de Jakku. Já podia imaginar o fogo, o calor e o fim.
Dessa forma, teria cumprido sua obrigação até o final, e ainda escaparia
de todos os laços que a prendiam ao Império para sempre.
— Tenho que manter o Infligidor longe das mãos dos rebeldes, não
importa como. — Ciena tentou se imaginar falando com o garoto que
conhecera na academia, cujo cabelo longo era trançado à moda de Alderaan
e cujo senso de humor endiabrado fazia todos rirem. — Esse é o único jeito,
Nash.
— De jeito nenhum. Você pode ajustar as coordenadas e sair daí.
— E deixar a nave para os rebeldes? Eles tomariam a ponte, mudariam o
curso e voariam pra longe com seu novo Star Destroier.
Ela ajeitou a cabeça para trás e observou o teto de placas de metal, tão
absurdamente alto. As dimensões da ponte eram feitas para representar
algum tipo de grandiosidade? Em vez disso, apenas faziam o espaço parecer
vazio e frio.
— Ciena, por favor. — Ela podia ouvir a voz de Nash falhando sobre o
ronco distante dos motores do seu caça. — Feio menos me diga que vai
tentar.
Essa era a última coisa que ela queria fazer. Agora que tinha encontrado
sua saída, sentia apenas alívio. A simples dor de existir dia após dia se
tornara totalmente clara agora que tinha sido removida e que não tinha que
suportá-la nem por mais uma hora.
— Tenho que travar as portas agora — ela disse. — Adeus.
Com isso, desligou a conexão com todos os TIE fighters. Nunca mais
ouviria a voz de Nash.
Enquanto executava os procedimentos para fechar as travas de segurança
da ponte, Ciena pensou sobre as outras coisas que nunca vivenciaria
novamente. Ver os pais. Pilotar um caça estelar ou, melhor ainda, um V-171
que pudesse chegar acima das nuvens de Jelucan. Rir de uma das piadas
sujas de Berisse. Tentar acordar Jude pela manhã e ouvir seu choramingar
lógico e amigável no travesseiro. Pilotar uma speederbike pelos Aros de
Reitgen. Comer os bolos glaciados do sr. Nierre. Correr na Loop Celeste
enquanto Coruscant brilhava abaixo dela.
Ficar com Thane. Dormir com ele. Voar com ele.
— Adeus — ela repetiu com suavidade, despedindo-se de tudo.
Assim que Thane caiu no chão, Ciena arrancou a pistola laser do coldre dele.
Ela parou em cima de Thane e ele a encarou, tentando recuperar o fôlego.
— Então é isso? — ele perguntou. — Você vai atirar em mim?
— Claro que não — ela disse. — Vou te deixar inconsciente e te arrastar
para um módulo de fuga. Mas você sabe que só estou fazendo isso para te
salvar, não sa...
Thane a chutou na perna tão forte que ela cambaleou mais de um metro
antes de cair de costas. A pistola escorregou pelo chão inclinado para longe
dos dois, e Ciena teve que lutar para ficar de pé de novo.
Thane estava de pé também, em postura de luta, os olhos azuis
faiscando.
— Quer pegar pesado? Tudo bem. Vamos pegar pesado.
Uma memória passou pela cabeça dela, sobre como se conheceram
quando eram crianças: lutando um pelo outro.
Parecia que iriam morrer do mesmo jeito.
Ciena correu até ele e Thane não pôde desviar o suficiente para impedi-la
de derrubá-lo. Enquanto batia a cabeça dele de novo na tela de metal do
chão, gritava:
— Saia já da minha ponte, rebelde!
Thane se livrou dela, empurrando-a para o lado. Enquanto ela rolava em
direção à parede, ele disse:
— Vou te resgatar quer queira ou não.
Ele não entendia? Ele não via? Por que estava tentando roubar a única
chance dela de escapar daquele inferno e morrer com honra? Era como se
Thane nunca a tivesse conhecido de verdade.
Ela o chutou com brutalidade. O salto da bota atingiu o queixo dele e o
fez cambalear. Ciena levantou e viu de relance na tela que Jakku estava
terrivelmente perto, mas a imagem começava a embaçar e escurecer. Os
sensores externos estavam queimando com o calor da entrada na atmosfera.
As janelas estavam com uma cor laranja brilhante, bloqueando a visão
conforme a nave se cobria de chamas. As facções de guerreiros na atmosfera
e no solo seriam capazes de ver o Infligidor rasgando o céu com uma linha
de fogo, como um meteoro.
Thane agarrou a perna de Ciena e a puxou para o chão. O impacto da
queda causou uma nova pontada de dor no ferimento nas suas entranhas.
Enquanto Ciena recuperava o fôlego, Thane aproveitou a vantagem,
segurando os dois pulsos dela.
— Só venha comigo — ele disse, ofegante. — Você tem que vir comigo
agora.
Ela levantou a perna para dar uma joelhada nele e libertar as mãos. Ciena
queria dizer para ele parar de ser um idiota, para ir para um módulo
imediatamente, porque logo seria tarde demais, se já não fosse, mas tudo o
que podia dizer era:
— Me solta.
Então ela juntou os punhos e golpeou o queixo dele. Se tivesse que
nocauteá-lo do jeito mais difícil, então o faria.
Mesmo com a dor rachando a cabeça, Thane viu o monitor ficar borrado e
depois preto. Não tinham mais tempo.
Então ele fez algo que nunca achou que seria capaz na vida. Bateu de
volta em Ciena.
Mas Ciena era uma mulher pequena e ele, um homem grande. O mesmo
golpe no queixo que o tinha feito cambalear a derrubou. A culpa o açoitou,
mas não podia parar, não agora...
Ela se esforçou para levantar; o ombro dela o atingiu no tronco, abaixo
das costelas, e lhe tirou o ar. Enquanto os dois caíam sobre um painel de
controle, ele pensou: Qualquer um que estivesse vendo isso pensaria que
estamos tentando nos matar, não salvar um ao outro.
A energia começou a falhar conforme mais componentes pegavam fogo.
Ele ouviu um ronco profundo e terrível... uma grande parte da estrutura
metálica do Star Destroier se retorcendo conforme o calor derretia o metal da
fuselagem. Pelas pequenas janelas ele não podia ver Jakku ou o céu, apenas
chamas.
Ciena o empurrou para longe assim que o chão se inclinou novamente.
Agora os dois estavam esparramados, incapazes de levantar. Thane juntou
suas forças para agarrar o braço de uma das cadeiras, algum apoio, qualquer
coisa que o ajudasse a ficar de pé...
... quando viu o reflexo de um metal preto deslizando pela parede.
Se jogou naquilo. Enquanto rolava, ouviu as botas de Ciena no deque;
ela conseguira ficar de pé de alguma forma. Ela correu na direção dele, o
barulho dos passos ficando mais rápidos, exatamente no momento em que
Thane pegou a pistola.
Só um tiro ajustado para atordoar e... agora!
Ele vislumbrou por um segundo o horror no rosto de Ciena antes de o
raio azul a atingir. Ela se estatelou no chão com tanta força que por um
instante Thane temeu ter ajustado acidentalmente o laser para matar. Mas
quando rastejou pelo chão inclinado para alcançá-la, viu que ela respirava.
— Peço desculpas depois — sussurrou. De joelhos, deu um jeito de rolar
Ciena e colocá-la sobre os ombros. Sentiu o gosto de sangue enquanto se
forçava a levantar e seguir para o módulo de fuga mais próximo.
Sua corrida arriscada pelos túneis de serviço tinha refrescado a memória
de Thane sobre a aula de projetos de grandes naves, então estava bem certo
de onde os módulos estavam. O que não sabia era se conseguiria lançar um
deles. Se as braçadeiras de metal tivessem derretido com o calor da entrada
na atmosfera, o módulo de fuga não teria outra utilidade além de servir de
caixão.
E, claro, os imperiais em fuga e os soldados da Nova República podiam
já ter lançado todos os módulos...
Vai, vai, vai, vai, vai, ele gritava em sua cabeça conforme corria
cambaleando pelos corredores do Star Destroier. A primeira estação de
módulo que ele alcançou estava vazia; aquela já tinha sido
disparada para o espaço havia muito tempo. Mas, assim que Thane sentiu
o pânico tomar conta, chegou à segunda estação e viu que o
módulo de fuga ainda estava lá, esperando.
Bateu no painel de controle com o joelho e as portas abriram. Era um dos
módulos pequenos, mas duas pessoas caberiam. Thane jogou Ciena dentro.
Enquanto rastejava pela entrada para acompanhá-la, as luzes se apagaram de
repente. Ele estava na escuridão total, exceto pela luz escarlate de
lançamento na pequena entrada do módulo de fuga que piscava em volta do
corpo caído de Ciena.
A energia tinha acabado. As portas fechariam? O módulo seria lançado?
Se os ferrolhos tiverem derretido em vez de estourar, estavam presos.
Thane bateu na alavanca de lançamento com força. Nunca tinha visto
nada mais bonito do que aquelas portas fechando. Assim que travaram, um
rosnado profundo e terrível estremeceu pela nave, como o último rugido de
alguma fera gigante à beira da morte.
Então o módulo foi lançado, arremessando-os para longe do Infligidor.
O solavanco o arremessou contra a parede curva do módulo e Ciena
rolou para o lado. Thane rastejou ao lado dela para que a pudesse proteger
com o corpo. Os repulsores limitados e os redutores de aceleração no
módulo de fuga indicavam que teriam uma viagem turbulenta pela frente.
Thane nem estava certo se o mecanismo de pouso ia ao menos funcionar tão
perto do chão. Pela pequena janela, via apenas luzes azuis, depois douradas,
depois azuis, depois douradas — o céu e a areia girando sem parar. O
impacto seria em alguns segundos.
Ele se curvou em volta de Ciena, enterrou sua cabeça na nuca dela e se
segurou para a batida.
O módulo atingiu o chão com um solavanco brutal, depois outro e mais
outro. Estava deslizando pela areia, Thane percebeu. Ele e Ciena foram
arremessados contra a parede, não com força suficiente para matá-los, mas o
bastante para machucá-los. Finalmente, um impacto os firmou, fazendo com
que ficassem aos poucos enquanto formavam um túnel pelo deserto de Jakku
e paravam bem devagar.
Estamos seguros? Acho que estamos...
O módulo sacudiu para a frente com tanta força que Thane acreditou que
outra carga de explosivos tinha sido disparada. Mas o rugido profundo que
ouvira revelava a verdade. O Infligidor tinha acabado de se chocar com o
planeta e o módulo de fuga fora arremessado para a frente junto com o
tsunami de sujeira e areia.
Ele abraçou Ciena mais forte enquanto o módulo girava sem parar. A
pequena janela de vidro não mostrava nada além de areia vermelha
alaranjada. E se ficassem soterrados? O que aconteceria se o módulo já
danificado não aguentasse mais um impacto e se abrisse? Ele não queria que
sufocassem ali, enterrados vivos...
Mas lentamente o módulo rolou para cima de novo, dessa vez parecia
que tinha mesmo parado.
Depois de um tempo. Thane se permitiu acreditar que tinham
sobrevivido ao pouso. Mas e se estivessem muito abaixo da terra? O
sinalizador dele seria capaz de enviar um pedido de resgate para a Nova
República?
Ele ligou o sinalizador, esperou um bom tempo... então viu o indicador
ficar verde. Sinal enviado.
— Conseguimos — sussurrou para Ciena, que estava desmaiada no
ombro dele. Talvez, em seu sono, o inconsciente dela o ouvisse e
transmitisse que ia ficar tudo bem.
Uma pequena linha de sangue escorria de um corte na testa dela. Thane
tirou a faixa de luto para usá-la como uma bandagem improvisada, olhando
para ela maravilhado.
De todas as naves na galáxia, eu invadi justo a dela, pensou.
Talvez... talvez Ciena e Luke Skywalker e os outros tradicionalistas
estivessem certos sobre a Força. Talvez existisse algum poder que mantinha
a galáxia unida e conduzia as pessoas de forma infalível para o seu destino.
A Força devia ter guiado Thane para que pudesse salvar a vida dela e eles
pudessem prosseguir juntos.
Isso o fez sentir como se todo o ceticismo e a raiva da sua antiga vida
tivessem finalmente desaparecido. Ele viveu sob a autoridade de líderes que
eram justos e corretos; lutou uma guerra nobre e que estavam prestes a
vencer; serviu ao lado de pessoas de que gostava e as quais respeitava. Ciena
estava livre das algemas que a prendiam ao Império e, de agora em diante,
ela não tinha limites. Nenhum deles tinha. Como era possível que um cara
como ele — sem esperança, sem fé — tivesse achado seu caminho até ali?
Encostou a testa na dela. Apesar dos machucados inchando o rosto e o
corpo, apesar do sangue na boca, apesar do terrível estado em que Ciena se
encontrava e do calor insuportável do módulo de fuga, pensou que esse
podia ser o momento mais feliz de sua vida.
Thane ouviu os sons de pás sobre ele e levantou o rosto para ver as
portas do módulo de fuga estremecerem. Então elas se abriram, enviando
uma pequena cascata de areia que escorria para os pés deles e revelando a
silhueta de um grupo de resgate da Nova República.
— Estou feliz em vê-los, pessoal. — Ele levantou Ciena nos braços. —
Uma mãozinha aqui?
— Claro, Corona Quatro. — Um membro do grupo se inclinou para
puxar Ciena pela abertura; Thane rastejou para fora e caiu na areia ao lado
dela.
Um médico se inclinou.
— Você precisa de ajuda?
— Cuide dela primeiro — Thane disse.
Ele esperava que o médico começasse a examinar os ferimentos de
Ciena. Em vez disso, os outros membros do grupo sacaram suas pistolas
enquanto o líder se ajoelhava com um par de algemas magnéticas para ela.
— O que...? — As palavras morreram na boca de Thane quando
percebeu que os soldados da Nova República estavam fazendo exatamente o
que deveriam fazer. Estavam capturando uma oficial do Império de alta
patente que seria julgada por seus crimes.
Ele pensara que a estava resgatando, que a Força tinha milagrosamente
intervindo e protegido ambos. Mas tudo que Thane tinha feito era entregá-la
para a prisão.
CIENA ESTAVA PARADA na cela, as mãos na frente do corpo. O campo
de força que a separava do restante da prisão era quase perfeitamente
incolor, tingindo levemente o mundo além da cela de prateado. Ela não tinha
se dado ao trabalho de olhar para fora durante a maior parte da reclusão —
algumas vezes estivera tão deprimida que lhe faltava vontade até para sair da
cama.
Naquele dia, contudo, tinha um visitante.
Sabia que era Thane só pelos passos pesados das botas, ou talvez fosse
apenas seu desejo falando. Ciena ficara tensa a cada barulhinho externo o dia
todo, mesmo que não estivesse na hora de ele chegar.
Mas agora era ele.
Thane sorriu quando a viu, apesar de a angústia nos olhos dele ser
perceptível. Ele se sentia culpado por enjaulá-la como uni pássaro? Ótimo,
ela pensou. Mas provavelmente ele estava mais abalado pela visão dela
parada ali, usando o vestido fino e liso de prisioneira, que era quase da
mesma cor da pele dela.
— Folha de outono — ele disse, mais para si mesmo do que para ela,
então continuou: — Ciena. Obrigado por finalmente concordar em me ver.
Ela apenas assentiu. Não havia razão para contar a ele que havia cedido
depois de apenas uma semana, mas descobrira que ele já tinha partido em
uma missão. Aquele fora um momento de fraqueza. Agora ela finalmente
estava pronta para falar.
— Temos muito para conversar — ela disse. — E difícil saber por onde
começar.
— Diga por que você não quis me ver antes.
Ciena virou o rosto, sem coragem de encará-lo ao dizer:
— Queria que você tivesse me deixado no Infligidor.
— Se você está esperando que eu me desculpe por salvar sua vida, vai
esperar um bom tempo. — Depois de um breve silêncio, ele acrescentou: —
Mas entendo por que se sente assim.
— Entende mesmo?
— Você queria cumprir seu dever e escapar do Império ao mesmo
tempo. Suicídio era o único jeito de fazer isso, de acertar as contas. Mas
você não deveria se comparar ao Império. Você vale muito mais.
Ciena lançou um olhar para ele, tocada, apesar de tudo. Ele parecia ainda
mais bonito do que nos devaneios dela. O cabelo tinha escurecido um pouco,
mais vermelho que loiro. Alguém que não o visse desde a infância talvez não
o reconhecesse.
Mas ela achava que sempre ia saber que era ele, por seu passo ou seu voo
ou seus olhos. Algo nos olhos dele nunca mudava.
— Você realmente entende — ela disse baixinho. — Mas meu desejo era
que você respeitasse minha decisão.
— Você está feliz por estar viva, apesar disso, certo? — Thane deu um
passo em direção à barreira enquanto acrescentava, mais hesitante: — Não
está?
Por um momento, Ciena não podia responder. Finalmente ela deu um
jeito de falar:
— E muito cedo para dizer.
Ele parecia não ter uma resposta para aquilo. Ela não o culpava. Havia
momentos em que ela realmente preferia ter morrido a enfrentar essa
humilhação. Em outros, porém, Ciena se pegava apreciando os pequenos
prazeres de existir — os únicos disponíveis dentro de sua cela. E então sentia
que não estava pronta para morrer ainda. Olhar para Thane era um desses
momentos.
— E difícil — ela disse. — Tudo pelo que eu trabalhei minha vida toda
está sendo destruído. Tudo pelo que lutei é uma mentira.
— Nem tudo. No final, você lutou por mim. — Ele abriu um sorriso. —
Isso deve valer alguma coisa.
A garganta dela se apertou enquanto segurava as lágrimas que se
recusava a deixar cair.
— Essa é a única parte que ainda vale alguma coisa.
— Ciena...
— Era a armadilha perfeita, sabia? — Ela tinha que cerrar o punho com
força para cravar as unhas na palma da mão, focando na dor para não
desabar por completo. — Fui tão dedicada à honra que me tomei uma
criminosa de guerra.
— Existe mais de um tipo de armadilha. Por um segundo me convenci de
que tínhamos consertado toda a galáxia, que a verdade e a justiça haviam
prevalecido e por aí vai... Até tinha começado a acreditar na Força... — Ele
riu com sua própria tolice. — Então tive esperança suficiente para me
arriscar naquela chance impossível e ir atrás de você. Mas no fim te salvei
apenas para isso, e agora você está presa aqui, onde não podemos nem nos
tocar...
— Pare. Por favor, pare. — Ciena cobriu o rosto. Ela sabia que ele havia
desviado o olhar.
Por alguns instantes, ambos permaneceram em silêncio, lutando para se
controlar. Ciena pensara que sua própria tristeza era muito para suportar, mas
agora tinha que suportar a de Thane também. Era demais para ambos... e,
ainda assim, não tinham escolha. Enquanto um estava ferido, o outro
sangrava. Ele era parte dela, para sempre.
Ela foi capaz de respirar mais devagar e recuperar a compostura. Quando
Ciena ergueu a cabeça de novo, Thane também já estava mais calmo.
— Então está tudo bem com você? Estão te tratando bem? — ele
perguntou, inspecionando o interior da cela.
Ela precisava dizer a verdade.
— Sim. Eles me deram holonovelas e jogos simples. Tenho direito a sete
horas por semana de exercícios no pátio. Sob supervisão, claro, mas os
médicos disseram que não posso me esforçar muito até estar completamente
curada. — Ela passou a mão pelo abdómen, tentando protegê-lo
inconscientemente.
Thane estremeceu.
— Você sabe que eu teria sido mais cuidadoso com você se tivesse
percebido o quanto estava ferida, não sabe?
— Sim, eu sei. — Embora possivelmente teria matado os dois, já que
teria dado muito mais trabalho para dominá-la. Ciena se sentiu
estranhamente orgulhosa disso. — De qualquer forma, eu durmo bastante. A
cama aqui não é grande coisa, mas é razoavelmente confortável. Tenho sido
tratada com civilidade pelos oficiais da Rebelião... quer dizer, da Nova
República. — Ela tirou um cacho de cabelo da frente do rosto, ciente da sua
próxima confissão. — Esperava interrogatórios com tortura. O Império me
ensinou que esse era o procedimento padrão para os prisioneiros. Em vez
disso, tive tratamento médico e informações sobre meus direitos legais.
— Você disse alguma coisa para eles voluntariamente? — Thane se
apressou para acrescentar. — Não estou te pressionando. Não estou aqui
como representante da Nova República e nunca estarei, certo? Você nunca
terá que se perguntar se me mandaram aqui para mexer com você.
Ciena cultivava pensamentos sombrios sobre essa questão tarde da noite
quando se deitava. Mas agora ela respondia com completa honestidade:
— Acredito em você.
Claramente aliviado, Thane continuou:
— Perguntei só porque... você sabe, eles fariam um acordo se você
falasse.
Como se isso pudesse persuadi-la.
— Meu juramento ainda permanece. Thane. Mesmo que eu admita que
vejo a Nova República de outra perspectiva agora, não sou uma traidora.
Nem aceitarei o governo deles. Pelo que tenho ouvido, a guerra continua
tensa, o caos retornou à galáxia...
— É a desordem normal dos planetas tentando retomar seus governos
depois de anos de... — Thane suspirou. — Deixa pra lá. Nós sabemos o que
o outro pensa.
— De qualquer forma, não adianta nada — ela disse. — Não vão fazer
“um acordo”, não importa o que eu diga. Sou uma criminosa de guerra,
lembra? A Nova República me fará pagar pelo meu serviço ao Império.
Talvez aquilo fosse o mínimo que ela merecia.
Thane a encarou por um momento. Então, para o assombro dela,
começou a sorrir e balançar a cabeça.
— Você vai sair daí logo, mesmo se não falar. Se você compartilhasse
alguma informação, aposto que nem teria que passar por um julgamento.
— Do que você está falando? — O defensor designado a ela tinha
mostrado uma lista muito longa de acusações. Era uma lista elaborada, com
muitos detalhes sobre suas atividades nas batalhas de Hoth, Endor e Jakku.
Ela não podia negar que era responsável por cada ato. — Nós dois sabemos
que sou culpada. A Nova República vai me usar como exemplo. Eles
precisam provar que a lei e a ordem prevaleceram, justamente porque é uma
nova lei e uma nova ordem. As linhas foram redesenhadas e estou do lado
errado — Ciena contou seu pior medo em voz alta. — Posso ficar nesta cela
pelo resto da vida.
— Tivemos essa discussão antes também, sabia? — Ele se inclinou
próximo do campo de força. — Minha fase idealista acabou. Eu lembrei
como o mundo realmente funciona. E, Ciena, a verdade é que as coisas
desmoronam. Pessoas demais tiveram que trabalhar para o Império, não é
possível mandar todos pra cadeia. São literalmente centenas de bilhões de
pessoas, isso sem contar as tropas que desapareceram com o resto da frota
estelar imperial. Você acha mesmo que a Nova República pode punir cada
um deles?
— Eles libertarão os faxineiros e escriturários. Não uma capitã de um
Star Destroier.
Thane não estava convencido.
— Você tem talentos úteis. Essa é uma das coisas que a Nova República
vai começar a procurar, cedo ou tarde. Além disso, você tem amigos no alto
escalão... ou eu tenho, e pretendo ter uma longa conversa com cada um que
possa ajudar.
— Não quero que você peça tratamento especial pra mim — ela
protestou.
— Que pena — ele disse. — Porque as cartas estão sempre na mesa,
Ciena. Tudo que podemos fazer é embaralhá-las a nosso favor.
Ciena lembrou da primeira vez que discutiram sobre isso. Estavam em
um bar em Valentia, o destino os dividindo como nunca. Eles brigaram e
imploraram até que finalmente desistiram e foram para o quarto. Aquilo
parecia ter acontecido em outra vida — deitar ao lado dele, puxá-lo para
mais perto... — e, ainda assim, parecia ter sido ontem. Ela nunca seria capaz
de esquecer o que sentira por Thane naquele dia e nunca ia querer esquecer.
— Então aqui estamos de novo — ela disse com um sorriso cheio de
pesar. — Debatendo a ordem contra o caos.
— Talvez o destino finalmente resolva essa questão por nós. Se você
estiver certa, então terá alguns anos difíceis pela frente. Mas se eu estiver
certo e a Nova República escolher a liberdade em vez da vingança, você
sairá daqui antes do que imagina. — Mesmo pela luz prateada trêmula do
campo de força, ela podia ver a ternura no olhar dele. — De qualquer forma,
você sabe que estarei aqui esperando por você, certo? Ciena teria dado
qualquer coisa para abraçá-lo, mesmo ao dizer: — Não deveria.
— Você esperaria, se fosse o contrário.
— Sim, esperaria.
Lentamente, ela levantou a mão, abrindo a palma na beirada do campo
de força. Thane fez o mesmo. As mãos ficaram espelhadas, quase se
tocando, mas para sempre separadas.
— No mês que se seguiu à Batalha de Jakku, o Império não tentou mais
ofensivas de larga escala. Fontes informam que todas as naves imperais
estão nos Mundos do Núcleo ou na Orla Interior, dentro dos limites
definidos pelo tratado. — A mulher no jornal da HoloNet sorria enquanto
falava. — Alguns membros proeminentes do Senado Provisório especulam
que a guerra da Nova República com os remanescentes do Império
finalmente chegou ao fim, e que a rendição final é eminente. Contudo, em
seu discurso de hoje, a chanceler alertou que todos os planetas devem
permanecer em alerta e a frota estelar da Nova República deve ser mantida
em estado de guerra pelo futuro próximo. Para discutir os dois lados dessa
questão, aqui estão...
Nash se irritou com a propaganda rebelde do sistema Hosnian. Ele já vira
tudo que precisava saber — ou seja, que a autoproclamada Nova República
acreditava que o Império estava derrotado. Idiotas.
Deixe-os ficar gordos e preguiçosos, pensou. Deixe-os se
parabenizarem. Que fiquem negligentes.
O comandante Nash Windrider deixou o seu escritório e caminhou para a
doca principal de sua nova nave, o cruzador de ataque Garrote. Todos os
subordinados se endireitaram ao ouvir o som das botas de Nash. Nenhum
deles se desviou do trabalho para sequer olhar de relance na direção de Nash.
Ótimo. Ele já tinha sido capaz de restabelecer a disciplina apropriada.
Para alguém que passara anos designado a um Star Destroier, um posto
em um cruzador de ataque parecia um retrocesso, mas o Império tinha
poucos Destróieres sobrando. Ele era comandante de voo em uma nave com
importância estratégica, o que era um passo em direção a eventualmente
receber seu próprio comando. Nash se orgulhava de preparar a Garrote para
o próximo estágio da guerra, o próximo ataque.
Um ataque em que os rebeldes seriam pegos de surpresa.
Ele circulou entre a longa fila de TIE fighters, todos sendo carregados
com armas mais fortes, de última geração. Seriam capazes de perfurar
escudos de força e a fuselagem dos caças estelares com um único disparo, o
que significava que a única vantagem que os rebeldes tinham sobre os TIE
— os seus escudos — desapareceria. Mudanças como essa poderiam vencer
a guerra.
Era um tanto detestável pensar que Ved Foslo tivesse inventado essas
armas. Nash sempre presumira que a ascensão de Ved pelas patentes era
devida unicamente à interferência do pai dele. No fim, revelou-se que seu
antigo colega de quarto tinha algum talento afinal. Sem dúvida sua
arrogância adolescente se tornara completamente insuportável agora que era
adulto.
Nash suspirou enquanto se lembrava de que, dos seus dois colegas de
quarto na academia, Ved Foslo era de longe o menos repulsivo.
Pensar que Thane Kyrell podia ter sobrevivido à guerra, que podia até
mesmo estar lá fora agora, celebrando com presunção a vantagem
temporária da Rebelião... Isso o enojava. Por que Ciena deveria morrer
enquanto Thane vivera?
Mas não se pode procurar justiça no destino. Era preciso ser responsável
pela vingança. O Império tinha lhe ensinado isso.
— Senhor? Comandante Windrider? — O assistente de Nash tinha
começado a segui-lo, como de costume. — Uma pergunta, se me permite?
— Sim, tenente Kyrell.
Dalven Kyrell parou na frente dele com seu datapad; visivelmente
nervoso. Ele não fazia ideia de que o irmão fazia parte da Rebelião; Nash
tinha optado por ocultar essa verdade dele e tratava Kyrell como um
indivíduo à parte. Parecia quase justo. Contudo, avaliado pelos próprios
méritos, Dalven era fraco e vacilante, capaz apenas de cumprir tarefas
básicas. Felizmente o serviço não exigia muito do assistente.
— Quero perguntar sobre a lista de oficiais que o senhor nomeou para as
principais comendas.
Dalven ia perguntar por que ele não estava na lista? Se sim, Nash
pretendia dizer a ele.
— Qual sua dúvida?
— O senhor nomeou a capitã Ciena Ree para a medalha de notável honra
imperial. Acho que o senhor quis dizer a mais tradicional medalha de
honra...
— Sei precisamente o que quis dizer, tenente Kyrell. — Nash gostava de
dizer o sobrenome dele com um leve tom de desprezo. — A medalha de
notável honra imperial é a maior medalha que podemos conceder e não
posso pensar em ninguém mais merecedor do que a capitã Ree. Por ter
permanecido a bordo da nave quando a autodestruição falhou, por chocá-la
pessoalmente na superfície do planeta para impedir que o Star Destroier
caísse em mãos inimigas, pagando com a própria vida.
— Sim, senhor — Dalven disse, vacilando, mas continuou: — Só quis
dizer... nomear alguém para essa honra é um grande passo, um que outros
podem considerar um sinal de parcialidade.
— Normalmente, sim. Neste caso, contudo, sei por fontes seguras que
um grande número de capitães, generais e almirantes pretendem nomeá-la
também. Até o Grão Moff Randd quer fazê-lo. O Império está sofrendo
conflitos internos, mas todos concordamos com isso. A falecida capitã Ree
morreu como uma heroína.
— Absolutamente — Dalven acrescentou de imediato. — Uma forma
terrível de morrer.
— Terrível? Eu chamaria de gloriosa. Todos gostaríamos que ela ainda
estivesse conosco, mas isso não muda o fato de que não existe destino
melhor do que morrer pelo Império. Espero que eu mesmo tenha essa honra
um dia.
— Claro, senhor. Sim, senhor. — Dalven saiu furtivamente. Thane
sempre dissera que Dalven zoava Ciena quando eram crianças, fazendo
piadas sobre a pobreza e os modos antiquados dela, como se qualquer um em
Jelucan não fosse um caipira retrógrado. Algumas vezes, quando Nash se
lembrava disso e pensava em Dalven ridicularizando uma jovem e indefesa
Ciena, queria encontrar a missão suicida apropriada para o sujeito.
Mas não podia confiar que o antigo colega de quarto tinha dito a
verdade. Aparentemente, Thane Kyrell era um mestre da manipulação.
Nash caminhou em direção à saída da doca. Sentiu o leve arrepio do
escudo de energia que mantinha a pressão atmosférica contra sua pele — um
sinal de que estava parado perto demais. Permaneceu próximo mesmo assim,
o melhor lugar para admirar a vista à frente dele.
Dentro de uma gigantesca nuvem da Nebulosa de Queluhan, escondido
nas profundezas dos reluzentes rastros de gás ionizado que confundia os
sensores inimigos, Nash esperava a frota estelar imperial. Enquanto os
sabichões rebeldes confiavam que o Império desapareceria e se renderia, que
estava dividido e indefeso, os imperiais na verdade estavam se reunindo e se
fortalecendo ainda mais do que antes.
Na opinião de Nash, tinha demorado demais para se unirem como uma
frente única novamente. As lutas internas tinham permitido aos rebeldes
ganhar territórios que eles não poderiam ter esperanças de conquistar de
outra forma. Agora, contudo, a frota estelar imperial tinha restabelecido a
hierarquia de comando. Tinham desenvolvido uma estratégia de longo prazo.
O velho facciosismo tinha acabado, e finalmente estavam unidos novamente.
Gostava de pensar que Ciena Ree tinha algo a ver com aquilo. Talvez
fosse só um sentimento, mas não tinha como negar que o ato altruísta dela
tinha inspirado a todos.
Você nos lembrou o que a disciplina realmente significa, Nash pensou.
Você nos lembrou que nenhum preço é alto demais para a vitória.
Na frente dele, no brilho azul e violeta da nebulosa, podia ver pelo
menos dez Star Destroiers e ainda mais cruzadores leves. Cada um abrigava
incontáveis TIE fighters, que seriam pilotados principalmente por novos
recrutas. O treinamento tinha que ser rápido e mais duro em tempos como
aquele, mas os pilotos estavam se saindo bem. A frota estelar imperial podia
não ser tão grande quanto já fora um dia, mas Nash acreditava que poderiam
ressurgir ainda mais fortes.
E dessa vez não parariam por nada até a Rebelião ser permanentemente
esmagada. Thane e os outros pagariam por forçar Ciena a sacrificar a própria
vida. Pagariam por tudo.
Nash sussurrou:
— Você será vingada... quando o Império ressurgir.
FIM.
STAR WARS / ESTRELAS PERDIDAS
TÍTULO ORIGINAL: Star Wars / Lost Stars
PREPARAÇÃO: Tradutores dos Whills
REVISÃO: Tradutores dos Whills
DIAGRAMAÇÃO: Tradutores dos Whills
ARTE E ADAPTAÇÃO: Tradutores dos Whills
ILUSTRAÇÃO: Tradutores dos Whills
GERENTE EDITORIAL: Tradutores dos Whills
DIREÇÃO EDITORIAL: Tradutores dos Whills
ASSISTENTES EDITORIAIS: Tradutores dos Whills
ESTRELAS PERDIDAS É UM LIVRO DE FICÇÃO. TODOS OS PERSONAGENS, LUGARES E ACONTECIMENTOS SÃO FICCIONAIS.
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
Angélica Ilacqua CRB-8/7057
K28s Gray, Claudia
LOST STARS [recurso eletrônico] / Claudia Gray ; traduzido por Guilherme Summa. - São Paulo : Seguinte, 2020-1618
352 p. : 2.0 MB.
Tradução de: Lost Stars
ISBN: 978-85-503-0515-8 (Ebook)
1. Literatura norte-americana. 2. Ficção científica. I.Summa, Guilherme CF. II. Título.
20.1618