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KlQ D l JANEIRO,

NA T Y P O G R A P H I A A U S T R A L
O DOS QUARTÉIS N.° 21. .

856.
(REIMPRESSÃO.)

RIO DE JANEIRO}

NA TYPOGRAPHIA Á I W R A L

CECO DOS Q U A R T É I S N.« 21.

J 836.
RESUMO
D A

D A

A origem da Maçoneria he hum dos pontos


de maior diífículdade, que se podem discutir
aia historia; por que os Apologistas desta socie-
dade dos Framaçons remontão os primordios da
Ordem Maçónica á mais subida antiguidade an-
tediluviana; pelo contrario os inimigos dos Fra-
maçons tem-se esforçado em provar, que a ins-
tituição da Maçoneria he cousa moderníssima,
e tanto que alguns a referem ao século passado.
Seria cousa ridícula averiguar este ponto com
o calor fogoso dos inimigos da Ordem Maçónica,
quando se trata de examinar a bondade, ou
maldade intrínseca dos princípios legislativos, e
fins desta associação; porque se he b o a , que
importa que seja moderna? S e he má como lhe
muda a natureza a sua antiguidade?
Não lie porém exame ridículo, antes curioso,
A

#
— 4 —

c interessante , quando a antiguidade, e origem


da Ordem se investiga, para se poderem conhe-
cer as verdadeiras intelligencias dos symbolos,
e emblemas, que se usão na Maçoneria, e para
se entender se os seus princípios de moral são
ou não conformes ás idéas dos differentes povos,
onde se cultivou a maçoneria, na antiguidade,
e onde se cultiva hoje em dia; porque tal exa-
me he tão curioso, e cheio de variedade, que
se faz agradavel ainda a qualquer profano, que
lenha algum amor ás sciencias, c litteratura.
Que a Maçoneria estivesse em pratica no an-
tigo Egypto he opinião commuin dos homens
mais instruídos, nesta materia: c tem esta opi-
nião a seu favor, entre outros argumentos, a
constante tradição, que desta origem conservão
os maçons. Mas todos os que tem produzido
monumentos antigos para mostrar, que a arte
de edificar lie mais antiga que os Egypcios^ e
tração a historia da Àrchitectura nos tempos
antediluvianos; devião lembrar-se que se encar-
regão de huma discussão fóra do nosso ponto ;
por que a questão versa sobre a sociedade dos
Framaçons, como Pedreiros, ou A r c h i t e c t s
theoricos (segundo a frase da Ordem) c não so-
bre os práticos constructores de edifícios malc-
nacs. lie verdade que houve tempo em que a
scicnçia da moral andou annexa ás sciencias phy-
5 —

sicas , mas pareço racionavel, que a epocha em


que se começarão a separar , e cm que se for-
mou hum a sociedade de homens que applicarão
á moral os conhecimentos theorecticos, e prá-
ticos da Geometria, e Architectura, lie o tempo
em que se deve fixar a primeira instituição da
ordem Maçónica. "
Mas para conhecer se a tradição dos Frama-
çons , que atribuo a instituição da Maçoneria
aos E-rypcios, he mui conforme aos monumen-
tos historicos j que destes povos nos restão lcin-
brar-nos-hemos do estado das sciencias, o artes
no Egypto, do tempo dos Pharaòs, e Ptolomeus,
que sendo as duas ultimas raças dos R e i s , que
a que 11a Nação teve, antes de ser conquistada,
e reduzida a Província dos Romanos, o que se
concluio com a morte de Cleopatra, quasi trinta
annos antes da era Christãa; he também o
espaço menos mal averiguado na historia dos
seus conhecimentos.
As sciencias, e artes, 110 E g y p t o , erão ensi-
nadas, e cultivadas cm certos collegios de sacer-
dotes , que faz ião parte de algum Templo de-
dicado á divindade, que se reputava protectora
ou inventora daquella scicncia; c nestes col-
legios não só se ensinava a theoria, mas ató
se reduzião a pratica os princípios thcoricos.
Assim, por exemplo, o C o l l e g í o , ou convento
— 6 —

de Vulcano não só ensinava, e Cultivava todas


as theorias chimicas, mas continha dentro ía-
bricas de fundições de metaes, de preparação
de tintas, de porçolainas, e em geral laborató-
rios de todas as artes, e manufacturas, cuia
perfeição dependo desta sciencia.
Por semelhante methodo erão cultivadas, em
conventos de Sacerdotes, a Astronomia, a P h y -
sica, a Architectura , a Moral, e todos os mais
ramos de conhecimentos humanos, que são ne-
cessários ou úteis na vida dos homens.
Estes Sacerdotes occultavão de tal sorte os
seus conhecimentos, que nenhuma pessoa era
admittida a estes collegios, sem passar por hum
curso de iniciações, provas, e estudos prelimi-
nares, que d ura vão muitos annos; e mui pou-
cos chegavão ao gráo de Mestres ,• porque sendo
estes os que guardavão o deposito dos mais i m -
portantes segredos, devião também ser pessoas
da mais conhecida applicaçSo, e capacidade.
Alguns Estrangeiros erão admittidos a estudar
nestes collegios, taes forão os maiores philoso-
phos que a Grécia teve, sendo hum facto cer-
tíssimo na historia, que ainda no tempo em que
as s cie li cias na Grécia estarão no seu maior auge,
os Sábios Gregos e das outras nações viajavão
sempre ao E g y p t o , para se aperfeiçoarem na
sciencia.
-* ^ —

He porém de conjecturar,, que mui poucos


destes estrangeiros chegarião a ser admittidos
aos mais interessantes segredos; visto o grande
cuidado com que estes Sacerdotes Egypcios
occultavüo os seus mysterios. Entretanto o pou-
co que sabemos, do estado das sciencias no
E g y p t o , a esses Gregos, e outros estrangeiros
o devemos; porque estes, depois de voltarem
ás suas terras, publicarão alguns livros, que
ainda nos restão, e onde se achão os únicos tra-
ços, que temos da sciencia Egypcia; e os sacer-
dotes Egypcios nunca publicarão nem escreverão
nada sobre as suas descubertas, para que se não
divulgassem: assim tradicionalmente passavão»
os seus conhecimentos de huns a outros sacer-
dotes; e quando era cousa de tal natureza, que
se não pudesse inteiramente encommendar á
memoria, então o escrevião, ou para melhor
dizer, o representavão, corn jeroglypliicos, nas
pedras das paredes, das columnas, e dos tectos
dos Templos.
D'aqui se conhece bem a summa difficuldade
que ha em averiguar o ponto de perfeição a que
chegarão as artes no E g y p t o ; mas a pezar desta
impenetrável obscuridade, não tem desanimado
os sábios nas suas curiosas indagações, e tem
chegado a desenterrar desta obscura antiguidade
estimáveis preciosidades»
— 8 —

Seria digressão demasiadamente remota, ten-


tar aqui fazer o parallelo da sciencia do Egypto,
com a da Europa actual: e por isso deverá con-
tentar huma Lrevissima lembrança dos poucos
monumentos, que das artes Egypcias nos res-
ino, dos quaes se pode concluir, que a meta
dos conhecimentos actuaes fica muito aquém da
dos Egypeios.
Por exemplo : a porçolaina, o xarão, as tin-
tas, que nos vem da China, são restos da chi-
mica dos Egypeios, que para lá passarão, e lá
se tem conservado, pela grande protecção que
o Governo Chim presta ás sciencias; e a chimi-
ca, que hoje sabemos na Europa, ainda não
checou a produzir obras semelhantes.
Os Elementos de Euclides, e a obra de A r -
chimedes , podem ser consideradas como o
resumo da Geometria dos Egypeios, e a nossa
Europa ainda não chegou a produzir, nesta
sciencia, cousa que igualasse estes escriptos;
a pesar de que os estudos mathematicos são dos
mais bem cultivados na Europa.
A Architectura entre nós he nada em com-
paração da dos Egypeios. Conservão-se ainda no
Egypto, entre as ruinas das suas desoladas, e
desertas cidades, vinte e cinco templos com-
pletos , não obstante estarem no maior desam-
paro ha mais de quatro mil ânuos; e quando
— 9 —

estes, e outros monumentos não fossem, bas-


íavão as celebres pyramides (lo Egypto para
servirem de padrão eterno á perfeição desta arte,
naquelle paiz. Que edifício entre nós, hoje em
dia fabricado, promette huma duração do mil
annos ?
Nas sciencias moraes; que comparação temos
nós com os Egypcios, ou com as Nações, que
compõem o Grande Império da China (que se
pôde considerar como a única das Nações antigas
existentes) tanto na legislação civil, governo,
economia politica, como em todos os mais ramos
das sciencias moraes?
Seria vergonhoso referir aqui os livros que
tem apparecido na Europa estes dous séculos,
com o titulo de moral. Pois cm Governo; onde
estão os princípios de legislação, que se conhe-
cião na Europa até o século passado ? Governo !
Que outra cousa tem sido, na Europa desde
a destruição do Império Romano senão huma
facção de huns poucos de homens, ambiciosos,
e audazes, que emprehendem não governar, ou
dirigir os negocios públicos da sua Nação, mas
sugeitar, e tyrannisar o resto dos seus concida-
dãos? Fallando claro; na Europa moderna; isto
he; desde a invasão dos Godos, nenhuma esco-
lha se fazia dos homens, para o Governo; es-
colhião-se elles a si mesmos: e nenhumas outras
B
JO

qualidades erão precisas senão coragem e hum


coração assaz depravado para calcar aos pós os
direitos mais sagrados da humanidade.
Comparemos agora estes Governos violentos-,
que necessariamente produzido rebeliões da par-
te dos súbditos, guerras civis , c todas as mais
calamidades, que dahi se costumão seguir, com
o governo tranquillo dosEgypcios, que durou
por milhares de annos, ou com o dos Chins,
que existe lia tantos séculos, hum e outro fun-
dados nos conhecimentos solidos, e systematica
da sciencia do Governo, e da legislação?
Não devemos porém desestimar os louváveis
trabalhos dos nossos Sábios Europcos, com que
tem adiantado as sciencias, e artes úteis em
tão manifesto beneficio da humanidade, estes
homens, que sacrificão as suas vigílias, estu-
dos , e incommodos ao bem dos seus semelhantes
merecem o nosso mais cordeal agradecimento-
tanto mais que a maior parte destes homens'
que tem procurado ilhiminar os seus compatrio'
J a s > e 0 M u i l d o > publicando as suas reflexões e
indagações sobre a sciencia dos costumes, e Go-
verno, nenhum outro premio tem recebido senão
as prisões, a infamia, a perseguição, o extermi-
n o : taes são os argumentos com que na nossa
Europa se custumão refutar as opiniões dos ho-
mens , que se esforcão por d e s c u k i r a verdade !
— 11 —

O que sepertende dizer he; que, como os


conhecimentos dos antigos se perderão, c o m a
invasão dos barbaros, e foi necessário recome-
çar de novo, por assim dizer, a serie de obser-
vações, e descubertas, que formão o corpo das
#
" 1 •
sciencias; não ha ainda tempo para que possa-
mos ter chegado ao ponto de perfeição, a que
essas nações antigas linhão chegado.
Aqui também se costuma accusar a avarenta
estimação que os Egypcios fazião dos seus co-
nhecimentos; porque he certo que se elles escre-
vessem e publicassem as suas sciencias , a huma-
nidade teria mais que lhe agradecer; visto que
com a destruição do Reino do Egypto, e morte
de seus sábios se não terião perdido os seus tra-
balhos e observações, por que os livros transmit-
tirião esses conhecimentos á posteridade.
Não se pretende defender aqui o systema mis-
terioso dos Egypcios, mas parece justo dizer,
que esta accusação contra elles não he tão bem
fundada como á primeira vista se representa.
Primeiramente, o escrupuloso segredo com
que os Egypcios occultavão as suas artes úteis,
he geralmente imputado aos princípios de R e -
ligião, ou como outros se exprimem, á supers-
tição dos Sacerdotes Egypcios; mas até agora
nao apparecerão as provas desta asserção; porque
razão não seria isto antes efTeito da Politica ?
Accaso nao vemos hoje, no Mundo todo, que
as Nações occultão as suas dcscubertas úteis ou
agra dáveis,, a fim de adquirir entre os seus visi-
nhos maior credito, respeito, e influencia? Este
systema he geralmente adoptado em todos os
Estados da Europa em huns mais, que outros :
e todo o mundo conhece que os princípios de
Religião não tem nisso a menor parte. Ora este
motivo de politica he tanto mais de attribuir
aos Egypcios, quanto nós sabemos, que os seus
Sacerdotes tinhão parte considerável no Go-
verno.
Além disto esta avareza scienlifíea não era
tão grande nos Egypcios, que hum dos seus
Reis, Ptolomeu Philadelpho, não ajuntasse a
mais considerável Biblioteca de que lia noticia :
c quando os Romanos invadirão o Egypto com-
mandados por Julio Cesar, havia além desta,
outra Biblioteca em Alexandria digna da maior
estimação: mas o fogo consumio este precioso
deposito; e os Soldados Romanos, ignorando o
valor do que conquistavão, invadirão os Tem-
plos; e bem longe de se aproveitarem, como
puderão ter feito dos conhecimentos litterarios,
e fabris dos Egypcios, levarão a morte, a deso-
larão, o roubo , e a destruição por onde quer
"que pass a vã o: e as oííicinas mais curiosas e esti-
máveis eruo tratadas, como inúteis empregos
— i3 —

tia occiosidadc. Nestes termos parece, que não


será tão imputável aos Egypcios, como vulgar-
mente se diz, a perca dos conhecimentos, que
elles chegarão a adquirir, com tantos séculos
de observações, e estudos.
Às medalhas, pinturas, esculpturas, e outros
monumentos, que se tem descuberto no E g y -
pto, tem contribuído muito para manifestar os
custumcs , ritos, e sciencias dos Egypcios, e
quanto mais se examina o que sobre esta ma-
teria se tem escripto, maior he a persuasão de
que a Maçoneria tira a sua origem destes povos,
ou ao menos, que entre elles adquirio a sua
forma mais regular.
Em todas as descripções, e pinturas dos anti-
gos Templos doEgypto , se achão ornatos, escul-
pturas, e traços, que exprimem figuras de Geo-
metria como triângulos, quadrados, e outras:
e com estas figuras enchem os quadros, rema-
tes, .simalhas, c tectos; onde estão esculpidos
instrumentos de Architectura, e Maçoneria. As
figuras emblemáticas de homens, estão sempre
cm posições, que formão ângulos, rectângulos,
e posições de triplicadas relações, já com os
braços já com as pernas, já com todo o corpo.
(*) Ora quem sabe das praticas, e usos dos

(*) Veja-sc Sevary, Dcnon, c as Memorias


do Instituto Nacional cio Egypt o, publicadas pc~
- i4 -

Framações, c dos seus si-naes, e emblemas,


não pode deixar de reconhecer em tudo isto
huma grande analogia.
Os inimigos dos Franc Maçons, que tem pro -
curado degraduar a Maçoneria, attribuíndo a
sua instituição a tempos modernos, respondem
a isto; que os inventores da Maçoneria, no Sé-
culo X Y í í , procurarão imitar nos seus systemas
esses costumes dos Egypicios. (*)
Mas nenhum destes authores suppõem a Ma-
ç one ri a mais moderna , que o meado do século
dezesete; porque esta lie a epocha, que íixão
os que lhe dão por author a Cromwel; porém
só a iijnorancia poderia tal acreditar; por que
para se fazer o complicado systema da Ordem
da Maçoneria, fundado nos costumes, e ritos
dos antigos Egypeios, era necessário ter hum
completo conhecimento das antiguidades do
Egypto o que naquelle tempo ninguém podia
ter. Nenhum viajante escreveo observações so-
bre o Egypto antes daquella epocha, nenhum
historiador havia que, sobre o Egypto desse as

los Sábios, (juc acompanharão a ultima expedi-


ção do exercito Francez ao Egypto.
(*) Desta opinião fie o Bispo de Fintimilia,
Justimam, na sua Pastoral contra os Frama-
çons, e o author da obra intitulada Framacon
ü crase,
— i5 —

noções exactas, miúdas, e circunstanciadas, que


erão necessárias para estabelecer de novo huma
sociedade systematica, como a dos Framaçons,
tão conforme com os custumcs dos Egypcios:
sendo certo que, todos os conhecimentos, que
temos hoje em dia a este respeito, nos forão
comnmnicados por sábios, que viajarão oEgypto
depois daquella epocha; e a maior parte das
cousas nunca forão bem explicadas, e menos
entendidas antes da expedição dos Francezes ao
Egypto que succedeo nos nossos dias.
Mais rácio navel seria a opinião dos que atfcri-
buem a Maçoneria a outras Nações anteriores
aos Egypcios; pois he certo que estas forão co-
lonias de hum povo mais antigo, que habitou a
Etiópia ou Abissínia. As ultimas observações dos
sábios, que viajarão o E g y p t o , forão feitas com
tal exactidão, c discernimento que chegão a
demonstrar , que as colonias da Abissínia, que
vierão povoar o Egypto, descerão seguindo a
corrente do rio Nilo, e íizerão os seus estabe-
lecimentos , em diversos séculos , huns mais
abaixo dos outros, até estabelecerem a sua ulti-
ma capital, quasi na fóz do rio. O que se co-
nhece da differ ente forma de Architecture dos
edifícios, que se encontrão nas ruínas das cida-
des, que estão ao longo deste grandioso rio:
estes edifícios, e cidades á proporção que estão
— i6 —

mais proximos á foz, são construídos de melhor


fôrma, e de mais elegantes ornatos; c como
eslas alterações na architectura não se fazem se-
não com intervallos de séculos, fica evidente,
que a povoação do Egypto principiou da parte
da Abissínia, e se veio extendendo ao longo do
rio Nilo, até o m a r , mas com o decurso de
milhares de annos. Mais; até se reconhecerão
nos edifícios das cidades inferiores algumas pe-
dras , que tinhão já servido em outros edifícios
das cidades superiores, que estavão arruinados,
o que prova a todas as luzes, o progresso da
povoação, que se conjectura.
Mas ainda que estas, e outras razões, mos-
trem que os Egypcios tirarão a sua origem dos
povos da Abissínia, não he com tudo, igualmen-
te claro, que a Maçoneria de lá viesse também;
porque podia ser invenção destes povos: pois
não repugna que cm huma colonia se facão des-
cubertas, antes ignoradas da sua metropole. De
tudo isto, portanto, que fica ponderado, ha o
direito de concluir, em quanto não ha mais
observações nesta materia, que a Maçoneria tira
a sua origem do Egypto.
Todos os authores antigos convém (*) que os
sacerdotes do Egypto, bem como os Magos da

(*) Feja-se Lafitcau; Moeiws dcsSmvcige T, u


— 17 —

Persia, e os Philosophos de outras nações, fa-


zião recepções fiolcmncs aos seus iniciados,
aquém ensinavão os segredos, efazião conhecer
os mysterios, que erão impenetráveis a todos os
mais homens. Somente elles se encarregarão
da educação dos lieis, e dos Grandes da Nação;
porque também só elles conhcciao a Natureza ,
as artes, e as sciencias. (*) E sejão quaes forem
os prejuízos, que nós temos a este respeito, lie
indubitável, que a sua doutrina era a Thcologia
Natural, fundada no culto e adoração de huina
divindade suprema, como Arnobio já notou;
e depois delle Sancto Augustinho, e outros
theologos christãos o tem emprehendido mostrar.
Mas como entre estes póvos tudo era sym-
bolico, o grande numero de jeroglyphicos ,
ininteligíveis aos estrangeiros, fizerão com que
se lhes imputasse muitos erros de que elles erão
incapazes, o que bem se pôde conjecturar das
grandes luzes, que tinhão os seus sábios. E do
que a Escriptura Sagrada refere nas historias de
Abraham, J a c o b , J o s e p h , e principalmente de
Moysés, ha toda a razão de concluir, que estes
grandes homens deverão muitos dos seus conhe-
cimentos aos sábios do Egypto; c que seguirão
as suas maximas em tudo o que diz respeito á

(*) Bossuct: Dicours sitr 1'histoire universel,


c
— i8 —

policia, governo, guerra, officios, providencias


publicas, & c .
Estes Magos, principalmente os da Cidade de
Memphis, erão tão respeitados , e obrado de seu
nome chegava tão longe, que os maiores guer-
reiros , os philosophos, e os estrangeiros mais
graduados em riqueza, sciencia, e poder vinhão
ao E g y p t o , para se fazerem iniciar por estes
Sacerdotes, e aprender os segredos, e myste-
rios do Saccrdocio.
Cada hum destes iniciados, que voltava â
sua patria, se utilisava dos conhecimentos, que
tinha adquirido, fazendo-os servir aos seus in-
teresses, ou ao seu amor propria : hum instituía
doutrinas; outro, jogos^ e festasj aquelle esta-
3)elecia mysterios; este escolas de sciencias; e
cada hum seguindo as suas vistas e sentimentos.
Os famosos legisladores da Grécia, Lieurgo,
e Solon, dos Egypcios tirarão grande parte da
sua moral. Orféo aprendeo no Egypto, e se fez
iniciar nos Mysterios dos Magos: e isto lhe
subministrou os meios de instituir as festas na
sua patria, e deo origem á mythologia grega.
Thales também se instruio no Egypto; e Pi-
lhagoras de lá trouxe as suas idéas sobre a Mc-
tempsicosis, se he que a não aprendeo dos
Gimnosophistas da índia, ou Bactriana. Hero-
doto no Egypto oh teve quasi todos os seus conhe-
— i9 —

cimentos: Democrito, os seus segredos; e inu-


meráveis outros.
Moysés, educado com estes Magos, como
todos sabem, aproveitou-se das luzes que delles
recebeo, para libertar os seu compatriotas Israe-
litas da escravidão, em que os tinhão os Egyp-
cios: e muito principalmente para estabelecer
o culto do verdadeiro Deos.
Ile bem conhecido o trabalho que teve Moy-
s é s , para manter o povo na obediencia, em
quanto o conduzio pelo deserto: e nada menos
era bastante para o conseguir do que huma mo-
ral puríssima, acompanhada de todos os conhe-
cimentos que os Magos lhe podião dar, sobre a
Physica, Astronomia, e mais sciencias. Verdade
h e , que a ignorancia dos Israelitas contribiiio
não pouco para o complemento dos desejos de
Moysés; porque, em fim, que luzes podião ter
huns homens , que havião sempre vivido na
escravidão; e o que mais h e , escravos de huma
Nação onde todos os conhecimentos estavão
escondidos nas mãos dos Padres ?
Sabe-se também que Moysés fez uso das ex-
periências, para os Levitas; que os segredos de
Sacerdocio erão impenetráveis a todos os mais
Israelitas, e que estas maximas se conservarão
até o tempo de Salomão: e ainda depois delle,
segundo refere a Escriptura Sagrada, tudo o
—- 20

que havia no Templo era emblemático; por


exemplo o cancliciro de sete braços , os doze
novilhos, os pães de proposição, o livro dos
sele sellos, &c.
A fundação do Templo de Salomão parece
ser o principio da segunda epocha da Maçone-
ria; porque o ceremonial de recepção em alguns
grãos maçonicos assim o dá claramente a enten-
der : e a necessidade de Architectos, e moralis-
tas, que Salomao devia ter para edificar o Templo
e governar o seu povo com tanta sabedoria,
que o foz huma das Nações mais prosperas , e
respeitadas do seu tempo; dão lodo o lii^ar a
presumir a estimação que este sábio devia fazer
da Maçoneria, e que os estatutos, que elle de
novo deo á Ordem, a fez susceptível de poder
existir entre todas as nações do Universo.
A denominação de livres, de que usão os
Framaçons, ou Pedreiros livres, foi introduzida
nesta occasião. Os pedreiros, architectos, e mais
arliíiccs, que Salomão cscolheo para trabalhar
no Templo, forao declarados livres, c isentos
de todos os tributos, elles e seus descendentes,
e li verão mais o privilegio de trazer armas. Iíe
verdade que no anno (do Mundo) 0 0 9 8 , segun-
do a chronologia mais vulgar, Nabucodonosor
tomando Jerusalem fez destruir o Templo, e
todos os Pedreiros livres forão reduzidos a escra-
• 21 —-

vidão: mas no anno 5/, 6 8 , C y r o , que havia


tomado Babylonia, os restabeleceo cm todos
os seus direito. A Escriptura Sagrada refere
mais, que C y r o , desejando recompensar a vir-
tude de Zorobabel, lhe permit tio voltar a Jeru-
salem com os Israelitas, e reedificar o Templo :
c em signal da sua estimação jantou com Zoro-
babel , antes que este partisse, chamou-lhe seu
amigo, c seu irmão; deo-lhc o osculo de paz,
e o encheo de honras, e favores.
Mas depois da destruição de Jerusalem o povo
Judaico, já vagamundo, e errante, já escravo,
sempre disperso cm paizes estrangeiros, não
pode obstar a que os gentios se instruíssem dos
restos dos seus segredos , c das expericncias que
elles empregavão, para melhor julgar das pessoas
a quem confiavão os seus mysterios. Então he que
se aproveitarão todos os meios de acreditar as no-
vas instituições, ainda as mais ridículas, e infa-
mes; e ha disso claros monumentos na historia
Romana, nas descripções, que alguns authorcs
nos deixarão, de certas festas instituídas em
honra de algumas divindades. D'aqui se seguio,
que os estabelecimentos , destinados , na sua
origem, para estudar os sentimentos dos homens
a fim de os illuminar, vierão a servir unica-
mente de pretexto para capear as paixões mais
escandalosas.
22

Esta desolação de custumes era quasi geral,


no Mundo conhecido, ao tempo em que come-
çou o Christianismo; e bem depressa os homens
sábios de todas as nações, se reunirão em pres-
tar veneração á moral do Evangelho. Estes
poucos sectários do Christianismo, respeitando
os bons custumes, attrahirão logo sobre si o
odio dos homens máos, que sempre olhão para
a virtude, como huma tacita reprchenção das
suas maldades; e d'aqui se seguio a persegui-
ção contra os Christaos, acompanhada de todas
as calumnias, que o vicio sabe inventar em taes
occasiões.
A necessidade forçou então os Christaos a
restabelecer o antigo system a dos Magos, sym-
bolizando a pratica das virtudes, eas suas regras
de moral; a ílm de as subtrahir ao conheci-
mento dos seus perseguidores: e assim estabe-
lecerão de novo todo o rigor das experiencias ,
no curso das iniciações; para se assegurarem da
fé dos seus confrades, c precaver os traidores.
Estabelecerão entre si leis severas, para manter
a igualdade entre os irmãos; e como a união
era essencial para oppôr algum dique á torrente
da perseguição, chegarão a pôr os seus hens
em commum para soccorrer melhor os viajan-
tes , e necessitados. D'aqui se vê a necessidade ,
que clles então terião de não relaxarem de fór-
~~ 25 —

ma alguma a lei maçónica, que exclue da so-


ciedade os homens fracos e pusilânimes.
As novas constituições, que neste tempo se
fizer ão, fixão a terceira epocha da Maçoneria;
pelas alterações que a Ordem teve; porque se
estes maçons Christãos puzerão em vigor as an-
tigas constituições dos Sacerdotes de Memphis,
também lhe addicionarão cousas tiradas da Reli-
gião Christãa: tal lie por exemplo, a pergunta
no Cathecismo de Companheiro « d'onde vindes
vós? » a que se responde « da loja de S. João. »
Esta resposta queria dizer; venho de abraçar
a doutrina dos Christãos, cujo principio he o
baptismo, praticado primeiramente por S. J o ã o
Baptista. Antigamente a resposta era « venho
do Templo da virtude onde trabalhei como
Companheiro.»
Estes novos Estatutos se conservão em origi-
nal pelos Religiosos Gregos Maçons, que , talvez
por esta causa, são chamados scismaticos, e
ofíicião em Jerusalem 110 famoso Templo, edi-
ficado pelo Imperador Constantino. (*)
As experiencias, dirigidas a sondar a capa-
cidade , e valor dos neophitos, ou novos inicia-
dos, que nestes estatutos se prescrevem, são
com pouca diíferença as mesmas dos Sacerdotes
de Memphis; e são estas.

(*) Veja-se Jovet: Cultos Religiosos l. 1 , e 2,


- a4 -

O Aspirante ou novo proselyla devia passar


pelas provas dos quatro elementos , depois do
se haverem tirado todas as informações possíveis,
sobre o seu comportamento: c por mais cora-
gem que mostrasse nestas quatro experíencias,,
não lhe erão descobertos mysterios alguns, em
quanto não se conhecião também os seus senti-
mentos.
Logo que o Aspirante se apresentava á assem-
bléa, depois das experíencias, era interrogado
pelo juízo que fazia dessas mesmas experíencias
porque havia passado, e julgava-se da sua capa-
cidade e espirito pela applicação moral que elle
fazia das experíencias.
Devião decorrer tres annos, sem que o novo
proselyta tivesse o menor conhecimento sobre
outra cousa da Ordem : havendo o cuidado de
lhe occultar os segredos mais insignificantes, a
fim de tentar a sua prudência, e exercitar a
sua discrição. De maneira que, em iodos estes
tres annos, o Neophito não ouvia outra cousa
mais, que a informação ordinaria de ser a socie-
dade huma assemble a de homens valorosos, vir-
tuosos, e na qual só o tempo fazia alcançar as
prerogatives que se podião obter entre os socios,
Os principaes Cavalleiros da Ordem se encar-
rega vão de estudar com attenção os custmes,
e sentimentos do Aspirante, durante este tempo ,
— 25 —

c estando convencidos da sua sabedoria, e vir-


tude admittião-no então a Companheiro; isto
he comcçavão a descobrir-lhe alguns dos mys-
terios, que se occultavão tenazmente aos mais;
como se deixa ver da obrigação de companheiro.
Esta disciplina padecco, como era natural,
grande relaxação logo que os Christãos íbrão pu-
blicamente tolerados, e tiverão seus Templos;
mas nem por isso deixárão de haver lojas, em
que se exccutavão os estatutos da Ordem com
mais ou menos exactidão.
A quarta epocha da Maçoneria se pode con -
tar desde as celebres cruzadas, ou guerras da
Palestina. A opinião dos tempos conduzio a
flor da mocidade, e nobreza Europea á Pales-
tina, com o desígnio de conquistar aos Maho-
metanos estes paizes, de que estavão em posse.
E a torrente levou também com sigo muitos dos
Framaçons Europcos, que fizerão logo estreita
amizade com os seus confrades, residentes já
na Palestina; e como os perigos das viagens, e
mais incommodos, que esta desastrada guerra
trouxe com sigo, fazia necessário aos Maçons
a execução dos Estatutos da O r d e m , tornarão
a reviver a antiga disciplina, e lhe fizerão algu-
mas poucas alterações, que as circunstancias
do tempo exigião.
Alguns dos gráos superiores liverão origem
D
'— âf> —•

nestas guerras; mas também enlâo se introdu-


zirão algumas mudanças, que deteriorarão a
pureza da instituição primitiva. A Europa toda
estava então submergida no mais profundo cháos
de ignorancia, e nestes termos lie claro, que
as reformas que se fizessem nao podião dar es-
peranças de melhorar os antigos Estatutos da
Ordem.
Não obstante; o Systema geral do Governo
da Ordem, c as maxim as fundament aes da sua
moral, permanecerão inalteráveis, por que tal
he a natureza da verdade, q u e , huma vez co-
nhecida, tira a liberdade de a desprezar.
A quinta e ultima época da Maçoneria he a
do restabelecimento das sciencias na E u r o p a ,
nos dous últimos séculos passados; porque , á
proporção que a Europa foi restabelecendo o es-
tudo das sciencias, foi também a Maçoneria ad-
quirindo maior credito , e tomando melhor fôr-
ma. Os inimigos dos Framaçons erão, e são
justamente, os mesmos inimigos das sciencias ,
e dos homens sábios; quero dizer os que tem in-
teresse em perpetuar a ignorancia: nenhum h a ,
hoje cm dia na Europa , que se declare aberta-
mente contra as sciencias, os inimigos dos sá-
bios conhecem muito bem as más consequências
que terião tacs declarações; porém como lhes
lie manifesta a diminuição da sua consideração,
— 27 —1

a respeito , que a instrucção dos povos occasio-


na , não cessa de maquinar em occulto, a ruina
de todos os homens sábios , que executão sem
perda de tempo , logo que se offerece algum pre-
texto plausivel para sacrificar a victima, sem se
expor ao odio dos homens bem intencionados >
ou do publico em geral.
A maior parte das Religiões, que se tem co-
nhecido no Mundo, liverão por íim, o objecto
principal a reforma dos costumes; atacando o
vicio c a licenciosidade; mas os Patriarchas des-
sas Religiões , quasi todos, cahirão no extremo
oppôsto, rccommendando a pratica da virtude
com tal austeridade, que não só a fazião odiosa >
mas de facto impraticável.
Os sectários de huma Religião , que não só
reprova o vicio, mas ordena a pratica da virtude
com demasiada austeridade , são necessariamen-
te ou hypocrilas, ou victimas martyrisadas, que
vivem no continuo tormento de supprimir os sen
timentos indeléveis da natureza, que sem cessar
clamão ao coração do homem, e que nenhum
tempo lie capaz de fazer prescrever.
A Maçoneria porém he , de todas as institui-
ções, dirigidas á reforma dos costumes, a unira
onde se concorda a pratica das virtudes sociaes
com os prazeres , dignos do homem racionavel;
c que fazendo o bom homem ? não o o b n L - a u -
— 30 —

nunciar e combater os direitos, e inclinações ,


que o Grande Architecto do Universo gravou no
(.Oi cl Ç tl O do homem, com indeleveis caracteres.
Não foi precisa outra reflexão, para que as
pessoas sensatas, c instruídas buscassem alistar-
se cm huma sociedade, cujos princípios consis-
tem em adaptar a moral aos princípios eternos
da razão, c leis immutaveis da natureza.
Só isto faz o elogio da Maçoneria, que cila
não só conta, entre os seus membros, os mais
brilhantes talentos de todas as nações; mas que
á proporção que a Europa se vai adiantando
nas sciencias, e na civilisação, vai também a
Sociedade dos Maçons fazendo novos progressos.
Porém como antes deste ultimo restabeleci-
mento da Maçoneria se suscitarão contra cila
muitas perseguições consideráveis, foi isto mo-
tivo de suspenderem por algum tempo as assem-
blers: estas interrupções derão occasião a que
se esquecessem os catliecismos, e mais Estatu-
tos da Ordem ao ponto de q u e , quando foi
necessário continuar os trabalhos, muitos Vene-
ráveis os copiarão de memoria; e isto deu lugar
a introduzirem-se nelles erros, alguns dos quaes
são de tanta importancía, que admira poderem
ser admit tidos por homens sensatos.
Não foi porém esta a única, e singular causa
dos errados, e apocriphos calhecismos, que se
— 29 —

publicarão cm diversas línguas, nos tempos mo


dernos, e ainda nos nossos dias.
São bem conhecidas as perseguições que se
suscitarão contra os Irmãos Roza cruzes em
1 6 0 0 , e dc que Jovet faz menção na sua obra
dos costumes Religiosos de differentes povos.
A de Paris desde 1 7 2 8 até i 7 5 o . A perse-
guição de Vienna em i 7 / , o ; em Roma durante
o Papado de Clemente X I I c seus succcssores :
cm Nápoles, em 1 7 7 9 ; e em Cleves quasi ao
mesmo tempo, e muitas outras. Os instigadores
destas perseguições, fizerão dous planos de ata-
que ao mesmo tempo; porque maquinavão, com
os Governos, as prisões, extermínios, e outros
castigos, que se inílígião aos Framaçons, c ao
mesmo tempo publicavão e faziao imprimir
cathccismos com o nome dc Framaçons cheios
dc imposturas, e erros, para deste modo voltar
a opinião publica contra os Framaçons, capaci-
tando as pessoas simples , dc que erão verda-
deiras as falsas accusações, que se íazião á
sociedade, visto que aqucües livros publicados
ern seu nome servião de propria confissão. O
mais he que o artificio, em alguns destes sup-
p o s e s cathccismos, foi tão subtil, que chegarão
a illudir-se com clles certos Framaçons, igno-
rantes dos seus deveres, e a transcrever e seguir
muitos absurdos, dos que assim se publicarão.
— 00
w

lie para evitar este dam n o , que se lemLrão


aqui algumas passagens, que devem impreteri-
velmente ser emendadas cm todos os catheeis-
ínos, que se acharem com taes corrupções.
A luz, que fôrma o mais principal symbolo
dos Maçons, foi motivo da perversão de varias
passagens do Cathecismo. Este symbolo teve
origem na historia de Aaram; porque diz a Es-
criptura, que no dia em que clle, e seus fdlios
forão dedicados ao Sacerdocio desceo o fogo do
Ceo para consumir a victima que estava sobre
o altar. Mas a verdade he que a maior parte dos
povos antigos do Oriente, notando a incompre-
hensivel acção, que o fogo linha em todos os cor-
pos, e a utilidade geral, que este elemento mos-
trava no universo; escolherão este symbolo para
representar, ou dar alguma fraca idéa do Ente
Supremo. Sancto Augustinho diz expressamente ,
que os povos do Oriente que crão accusados de
idolatria por adorar o fogo, ou a luz, nada mais
fazião do que symbolisar neste elemento a Om-
nipoíencia, e Incomprelicnsibilidadc do Creador
do Universo. Os Christãos começarão também
a colocar nos altares três luzes, para symboli-
cal-, a triplico essencia de Deos, e ao depois
encherão os Templos de luzes para denotar a
innnensidade do Ente Supremo. Os Maçons con-
servão csle symbolo dos Magos, que o usavão
ff
— 01

para denotar a verdade, que he a conveniência


das cousas existentes com as ideas eternas do
Creadon e por comparação, para denotarem
com esta luz a verdade, que deve illuminar, e
guiar os homens, pela tocha da razão, que o
Author da Natureza lhe concedeo para sua guia.
O avental, que impreterivelmente trazem to-
dos os Maçons, não serve senão para designar
o amor á occupação e trabalho; e o desprezo
da occiosidade, mãi de vicios cm lodos os tem-
pos. O trazer cada hum a divisa da sua occu-
pação he cm muitas nações,, e já foi na anti 'ui-
' íj
dade hum signal de honra, como quem mostra
aquillo de que vive, ou o serviço que faz áPatria.
Existe hum a carta , que o Imperador Marco
Aurelio escreveo a hum seu amigo, Pulio, na
qual se declara, que por hum antiquíssimo cos-
tume , nos tempos mais florentes da Republica
Romana, nenhum Romano apparecia em publico
sem insignia que denotasse a sua occupação;
porque aquelle que a não trazia era reputado
vadio, e por consequência infame: assim, diz
Marco Aurelio, que o Imperador fazia levar
diante de si hum brandão acezo: o Consul hu-
mas fachas de armas: os Sacerdotes trazião,
hum pileos, ou barretes; os Senadores humas
conchas nos braços; os Censores hum peso
pequeno na mão; os Tribunos humas macas;
— 52 —

os Régulos hum sceptro : os Pontífices huma gri-


nalda : os Oradores hum livro : os gladiadores
huma espada: os ourives hum c r y s o l ; e assim
todos os officios. He logo o avental de instituição
muito antiga , e que os maçons devem estimar ,
como aquelle que designa o amor ao trabalho,
e o aborrecimento da occiosidade; qualidades
summamente interessantes na sociedade civil.
A comparação do Aprendiz á pedra bruta foi
também sinistramente interpretada; mas eis aqui
o genuíno sentido dos maçons a este respeito. Os
antigos Framaçons, como fica d i t o , ensinavão
aos seus iniciados, não somente a moral, mas
também todos os conhecimentos úteis ao gene-
ro humano; e comparavão os homens a pedra
bruta , querendo explicar que , assim como a for-
ma mais ou menos bella de huma pedra lavrada
depende dos golpes, e talhos do artista; assim os
bons hábitosj as virtudes praticas, e a polidez
dos homens depende das primeiras impressões de
seus mestres, e da bondade de sua educação.
Platão e muitos outros philosophos usarão
desta expressão; e este lie o sentido em que os
Maçons comparão a pedra bruta os seus apren-
dizes , susceptíveis das boas impressões de huma
educação virtuosa.
Do mesmo modo se compara, na Maçoneria
o Companheiro á pedra cubica, e de amolar;
— óo —

porque esses mesmos philosophos acharão o


symbolo conveniente; pois, o cubo he hum so-
lido mui regular, que pôde ser applicavel a mui-
tas obras: e alguns antigamente, reduzião este
emblema a huma pyramide quadrangular, a f i m
de que comprehendesse todos os números sagra-
dos; isto he: unidade, cinco, quatro, tres°ve-
zes tres, e por consequência nove. Gomo para
se cortar huma p e d r a , com tal figura he neces-
sário o uso do compasso , esquadria , uivei,
prumo; e estes instrumentos são o symbolo das
sciencias, e das virtudes, e erão estes os meios
que empregavão aquelles philosophos, para fazer
o que nós chamamos hum companheiro, vinha
esta comparação moral a ser exactíssima: tanto
mais que a ferramenta, ou instrumentos, nada
mais significao senão os cuidados, e os desejos
da applicação.
O ramo da acacia, motivo também de algu-
mas intelíigencías pouco racionáveis, teve esta
origem. Acha-se nas Constituições dos Religio-
sos Gregos, que refere J o v e t , o costume dos
christãos, captivos entre os infiéis, os quaes so
ajuntavão com diversos pretextos, nas suas as-
scmbléas, e tomando diversos nomes: entre
estas differentes a s s e m b l e s houve huma, com-
posta dos Cavalleiros mais instruídos, e virtuo-
sos, na qual era costume dar o Grão Mestre
- 54 -

ao confrade que se apresentava de novo hum


ramo de acacia: servia esta ceremonia, entre
estes christãos para trazer á memoria a cruz de
Christo, que se julga ser feita desta madeira.
Mas supposto que os christãos dessem esta
explicação áceremonia, ella em si era mais antiga
porque isto mesmo praticavão os sacerdotes de
Memphis, com os seus iniciados, usando porém
do ramo de murta. Sem duvida o ramo de ouro
que Virgilio faz dar ao seu Enéas, para descer
aos Infernos, se refere a este custume. À entre-
«ga
D do ramo de acacia he huma das ceremonias
da installação do hum Mestre Maçon, que se não
deve omittir, e de que todos os cathecismos
correctos fazem menção.
O triangulo, desde os tempos mais remotos
da antiguidade, sérvio sempre para designar o
primeiro Principio, ou Author da Natureza. O
Christianismo adoptou também o mesmo sym~
bolo, para representar a triplicada essencia, ou
tríplice unidade do Creador, e os Mestres Ma-
çons convierão em trazer, para o mesmo fim o
triangulo equilátero. No principio do Christia-
nismo esta figura era ao mesmo tempo o signal
do Ghristão, e do Maçon : c fazia-se este signal
no principio e fim de todas as acções; para in-
dicar que se implorava no começo, o auxilio
da divindade; e se lhe dava g r a ç a s , no f i m ?
a
'Z I
00 —-

pelo bom exilo do succcsso. Esta he a verda-


deira origem do exercício da meza.
O commandante dos cavallciros, de que fa-
zem menção as constituições maçónicas dos
Religiosos Gregos, devia trazer huma medalha
triangular, que encerrava hum circulo, o qual,
em lugar de Jchova, representava sem duvida
a eternidade do Ente Supremo.
Sobre a explicação dos nomes das columnas ,
houve também alguma confusão nos cathecis-
mos , que se achão corruptos; e posto que es-
teja esse defeito já corrigido, sempre he bom
advertir, que a columna I pertence aos Apren-
dizes, e symbolisa a Sabedoria de Dcos: que a
columna B he a dos Companheiros, e significa
F o r ç a , ou a Fortaleza , e Omnipotência de Dcos :
ao Mestre petence a intelligencia da belleza: as-
sim ao Maçou Aprendiz se lhe ensina por estes
symbolos, que hum Ente infinitamente sábio
creou o Universo; em Companheiro aprende o
Maçon que hum Ente infinitamente poderoso he
necessário para conservar o creado : cm Mestre
chega o Maçon a contemplar, a belleza e syme-
tria da ordem da Natureza.
A descripção da loja do valle de Josaphat, que
se faz n o cathecismo de companheiro, deixa ver
claramente, não só que as perguntas dos cathe-
cismos maçomeos são todas ôfíiblematicas; mas
— 36 —

também que a maçoneria teve sempre por obje-


cto o conhecimento da maquina do Universo; e
das leis immutaveis da Natureza, para dahi de-
duzir as regras primordiaes da m o r a l , que para
serem constantes só podem ser ordenadas pela
razão, e nunca pelo capricho dos homens.
Ultimamente deve observar-se que a varieda-
de e disputas, que tem havido sobre os nomes de
Hiram e Àdonhiram , foi também introduzida,
pelos motivos a cima ditos : e ainda que a disputa
de hum nome não he nem deve ser nunca cou-
sa digna de occupar a h o m e n s c u j o íim prin-
cipal he estabelecer a sãa m o r a l ; com tudo ,
dir-se-hão aqui as razões , que ha para se se-
guir o que se acha nos cathecismos, e não o que
em algumas lojas se pratica: tornando a adver-
t i r ; que isto serve para instrucção., e não para
occasionar disputas.
Àdonhiram lie palavra hebrea composta de
A d o n , que significa Senhor; e Hiram , alteza,
ou altura da vida. Designa-se com este nome o
Architocto do Templo; isto he o Supremo Au-
thor do Universo; porque os Maçons adoptarão
sempre o principio de (pie sendo os homens parte
deste todo do Universo deve cada hum servir,
o melhor que couber nas suas faculdades, na-
quella parte do Templo para que o Grande Ar-
c h i t e c t o designou i e o homem teria tanta razão
- 37 -

de perguntar a D e o s , porque es lá nesta ou


naquella situação da vida humana; como huma
pedra de hum edifício teria direito de pergun-
tar ao seu architecto, porque a collocou antes
nesta do que naquella posição.
Hi ram foi hum sábio artista, que Salomão e m -
pregou nas obras metalicas do Templo: a Escri-
ptura refere que elle foi filho de Hur, Tyrio de
nação, e de huma viuva da Tribu de Nephtali.
Neste quizerão alguns Maçons pouco instruídos,
fundar o üráo da Mestranca : e outros, com imial
ignorancia , referião as cercmonias do gráo de
Mestre a Hiram , Rei de Tyro; e esta diííerença
deo lugar a hum scisma , entre os Maçons.
Hum calhecismo impresso em 1744 > com o
titulo de Calhecismo dos Framaçons; ou o Se-
gredo dos Framaçons, e reimpresso em 1 7 4 7 ?
restituía o nome emblemático dc Adonhiram;
mas o Author, que se julga ser certo Abbade
Francez, que occultou o seu nome debaixo da
assignatura de Leonardo Gabaon; ignorava intei-
ramente a significação desta palavra; ou, se a sa-
bia , quiz ridicularisar a Maçoneria , dando huma
interpretação material, tanto a esta palavra co-
mo ás de mais perguntas c respostas symbolicas.
Os mesmos Maçons, que seguião a palavra
Adonhiram, tinhão para si que Adon era hum
prenome titular dado ao Artista Hiram depois
— 38 —

que elle acabou as obras do Templo, ou depois


da sua morte, em memoria dos seus raros ta-
lentos: assim íundavão nisto as ceremonias da
Mestrança.
Esta diversidade de sentimentos subsiste ain-
d a , pelas inconsideradas copias, que se tem
impresso dos cathecismos errados, os quaes são
de tal maneira deííeituosos, que para se verifi-
car a pouca estimação que merecem basta com-
para-los com os da Collecção Preciosa da Maçone-
ria Adonliirainila; ou com a Escriptura Sagrada
no Liv. o.° dos Re is, Cap. 5.° vers. 1 4 , e Cap.
y.° vers. 1 4 , e Liv. 2. 0 das Chronicas Cap. 2. 0
vers 1 0 , e 14.
E tal e a negligencia de alguns Veneráveis,
que ainda em 1 7 8 0 consentirão que se reimpri-
misse, em Paris, hum Cathecismo onde se en-
contrão os mesmos erros, sendo evidente que
a Escriptura no Liv. 3.° dos Reis Cap. 5.° vers.
14 diz positivamente, que Adonhiram foi o Ar-
chitecto do Templo. Jozepho Hebreu, nas suas
Antiguidades Judaicas, assevera o m e s m o , e to-
dos os mais historiadores, que nisto fallão, dis-
tinguem Adonhiram o Architecto do T e m p l o ,
de Hiram artista metalúrgico, e de Hiram Rei
de Tyro. O emblema por tanto de Adonhiram
Architecto do Templo, e o deste nome symbo-
lico, indicativo do Grande Architecto do Uni-
— 39 —

verso, he o que sempre foi, e deve s e r , o fun-


damento das ceremonias do gráo de Mestre.
Quanto aos gráos altos, he opinião c omnium
que fôrão instituídos pelos Cavalleiros Cruza -
dos , no tempo das guerras da Palestina; tendo
a maior parte nestas instituições o famoso G o -
thofredo de Bulhões. Costumão os Historiado-
res assignar a estes estabelecimentos o anno
de i 5 5 o da era Christãa, como epocha em que
se completarão; porque a decadencia, em que
se achavão então as armas Christãas, obrigou
aos Cavalleiros cruzados a usar destes necessá-
rios soccorros, contra os perigos a que se vião
expostos, com a superioridade em que íicárão
os Sarracenos, seus implacaveis inimigos.
A innumeravel multidão de Europeos, que
nesta epocha, e principalmente no fim do sé-
culo treze, passou â Palestina, com o nome
de cruzados, para reconquistar estas terras dos
Sarracenos, ou Árabes Mahometanos, q u e d e i -
las se tinhão empossado, promettia aos espí-
ritos inconsiderados a mais rapida e segura re -
cuperação da Terra Sancta. Mas estas facções
mal emprehendidas, e peior executadas, só
servirão de cobrir de gloria os Mahometanos,
pelas frequentes occasiões que lhes derão de
alcançar victorias, c de se adestrarem na dis-
ciplina militar Europea, que os fez em f i m ,
- 4o -

Senhores do império do Oriente, e de Cons-


tantinopla.
Os restos dos desbaratados exercitos Chris-
tãos, ou ficárão captivos, ou refugiados em
lugares pouco accessiveis aos seus inimigos;
mas em toda a parte opprimidos: e como erão
obrigados a occultar as suas praticas Religiosas
com mais cuidado que os Christãos primitivos,
no tempo das suas maiores perseguições; da-
qui veio o cuidado que ti verão, os que d'entre
elles erao Maçons de restabelecer a antiga dis-
ciplina Maçónica; e além disto instituir novos
gráos, com o f a v o r , e protecção das primeiras
personagens, que neste negocio figuravão.
Para se saber', que a instituição destes novos
gráos da Maçoneria Alta não data de tempos
anteriores a estes, he bastante reflectir nos
nomes, títulos, e arranjamento destes g r á o s :
onde se acha toda a pompa de graduações, fi-
lha das idéas cavalleitescas daquelle século; e
na verdade bem distante da pacifica, e virtuosa
mediocridade de séculos mais illuminados ,
quaes erão aquelles fclices, em que a Maçone-
ria Azul íloreceo no Egypto.
Não he logo de admirar , que os princípios
da Rei igião Christãa entrem nestes altos gráos,
quasi como parte principal; porque não obstan-
te, que o systema, e ordem dos gráos todos,
- 4i -

seja maçonico, os cavalleiros que os dispuzerão


tinhão em vista principalmente, que elies lhes
servissem na pratica do Christianismo.
Esta reforma da Maçoneria passou da Pales-
tina para a E u r o p a , algum tempo depois da
sua instituição; e a loja Capital, e Metropole
foi situada nas montanhas de Heredon, as quaes
jazem entre o Oeste e Norte da Escossia ses-
senta milhas distante de Edimburgo. Esta l o j a ,
que foi a primeira da E u r o p a , existe ainda em
todo o seu explendor, nella se conserva o Con-
selho G e r a l , c he a residencia do Soberano
Grão Mestre em exercício.
Estes novos gráos fôrão ao diante admittidos
por quasi todas as Grandes-Lojas-Provinciaes
de Maçons, que existem na Europa, e nas ou-
tras partes do Mundo: mas isto não foi tão uni-
versal, que não haja muitas lojas onde alguns,
ou todos estes grãos superiores sejão desconhe-
cidos. Tal h e , por exemplo, a Grande-Loja-
Ingleza, residente cm L o n d r e s , a qual não
admitte nem reconhece mais gráos que os da
Maçoneria A z u l , não obstante permittir que,
debaixo do seu Oriente, trabalhem algumas lo-
jas de gráos superiores.

F I M.

I*1
ADVERTENCIA,

Este RESUMO DA H I S T O R I A DA MAÇONERIA foi


Adado para servir de Instrucçao á COLLECÇAO

PRECIOSA DA MAÇONERIA ADOMH&AMITA., com-

posta de treze Gráos,

R i o DE J A N E I R O 1836. — na TYP. v AUSTRAL,,


BISCO DOS QUARTÉIS K. 21,

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