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Maquiavel- Ordem política e

Estado
Livro: O Príncipe
Um renascentista
• Maquiavel nasce ao fim do século XV, numa Itália esplendorosa, mas
infeliz.
• O renascimento como movimento intelectual que se inicia ao fim do
século XV, busca sacudir as estruturas intelectuais da idade média,
questionando as teses humanistas e cristãs que dominavam.
• O país havia ficado para trás em relação aos outros que haviam
constituído seus estados nação desde o início do século XI. A Itália era
uma colcha de retalhos com pequenos estados divididos que
possuíam regimes econômicos, políticos e sociais muito distintos.
Um renascentista
• A partir desta alta fragmentação interna, o país era alvo constantes de
ataques de inimigos externos, como França e Espanha, sem contar com os
conflitos internos ocasionados entre os cinco maiores Estados que
controlavam o país.
• Neste contexto de alta instabilidade, onde os governantes não conseguiam
se sustentar no poder pode mais de 2 meses, Maquiavel vive sua infância.
• Passa a ser funcionário público com a instauração da república em 1498,
com a queda dos Médici, onde fica até 1512 após a dissolução da República
e instauração de um regime tirano pelos Médici, perde o posto de vai
preso.
• É solto em 1513 e se refugia em sua fazenda, onde passa a escrever suas
obras.
Estado como fundamento da ordem política
• A principal preocupação de Maquiavel em todas as suas obras é o
Estado. Não o Estado ideal muitas vezes venerado, mas nunca
existente, mas sim o Estado capaz de impor a ordem.
• Com isso, Maquiavel se afasta dos grandes pensadores gregos e do
período cristão, aproximando-se mais dos romanos, e abrindo uma
nova visão sobre o processo político e a história, analisando a
realidade concreta das coisas.
• Para entender como o poder pode ser distribuído e usado para
manter a ordem política, Maquiavel cria 2 categorias de formas de
governo; os Principados e a República. No texto o autor se dedica a
primeira forma.
Forma dos principados
• Assim, busca entender qual é a essência dos principados, quantas
formas possui e como são adquiridos e preservados.
• Principados podem ser hereditários, novos ou mistos.
• Em relação aos hereditários, há pouca consideração, já que a tarefa
para conservar a ordem política neles é mais simples.
• “Nos estados hereditários e acostumados a ver reinar a família do seu
príncipe, há dificuldades muito menores para mantê-los, do que nos
novos; porque basta apenas conservar neles a ordem estabelecida
por seus antepassados, e em seguida contemporizar com os
acontecimentos.” Cap I.
Principados Mistos
• A verdadeira habilidade de um líder político portanto está realmente
nos principados novos.
• Mas entre os novos existem os inteiramente novos e os que são
hereditários e unem um novo ao seu corpo, que pode ser chamado
misto.
• A dificuldade no modo de governar principados mistos, está em
escolher sua forma; despótica, aristocrática ou republicana.
A legitimidade das ações
• Os fundamentos e a legitimidade do Direito estão baseados
fundamentalmente na força. É a vitória dos mais fortes que é
essencial para a história humana.
• “Querer conquistar é realmente coisa muito natural e comum, e todas
as vezes que o façam os homens que o podem serão disso louvados e
não condenados. Mas quando não podem e querem fazê-lo seja
como for, aí há erro e cabe censura” Cap. III
• Portanto, ter forças suficientes para adquirir e preservar é a
necessidade central para um príncipe. A razão maior de todo o
governo é o emprego de força, portanto é a construção da arte da
guerra.
A arte da guerra
• “[...] se deduz que um príncipe não deve ter outro fito ou outro
pensamento, nem cultivar outra arte, a não ser a da guerra,
juntamente com as regras e a disciplina que ela requer;1 porque, só
esta arte se espera de quem manda, e é tão útil que, além de
conservar no poder os príncipes de nascimento, com frequência eleva
a tal altura simples cidadãos.2 Em contraste, os príncipes que
cuidaram mais das delícias da vida do que das armas perderam os
seus estados.3 E como o desprezo da arte da guerra determina esta
perda, assim o estar nela bem adestrado determina aquela ascensão.”
Cap. XIV.
Leis e armas
• Para todo o Estado (hereditário ou misto) deve haver boas leis e boas
armas que são sua base sólida.
• “Os principais alicerces de qualquer Estado, seja ele novo, velho ou
misto, consistem nas boas leis e nos bons exércitos. E como não pode
haver boas leis onde não há bons exércitos, e onde há bons exércitos
é forçoso haver boas leis, eu deixarei de lado o assunto relativo às leis
para falar dos exércitos” Cap. XII.
• Como boas armas, pode-se entender a criação de um exército
nacional, criado pelos cidadãos que vivem no estado, e não por
mercenários, que abandonam o príncipe a primeira guerra que
houver.
Virtú x Fortuna
• O direito, como forma abstrata em sua formulação, fica de lado em
sua exposição. As principais formas de conquistar e conservar um
reino seriam 4; 1) por virtude, portanto por seus próprios braços. 2)
pela fortuna, ou seja, pela sorte de estar presente no momento certo.
3) pela fortuna e armas de outro. 4) por meio de crimes e ações
cruéis.
• As duas primeiras formas são as mais importantes; porque por mais
virtuoso que seja o príncipe, não está livre das incertezas da virtude, a
força exógena que gera acontecimentos inesperados.
Virtú x Fortuna
• “Comparo a fortuna a um daqueles rios que, quando se enfurecem ,
inundam as planícies, derribam árvores e casas, arrastam terra de um
ponto para pô-la em outro: diante deles não há quem não fuja, quem não
ceda ao seu ímpeto, sem meio algum de lhe obstar. Mas, apesar de ser isso
inevitável, nada impediria que os homens, nas épocas tranquilas,
construíssem diques e cais, de modo que as águas, ao transbordarem do
seu leito, corressem por estes canais ou, ao menos, viessem com fúria
atenuada produzindo menores estragos.” Cap. XXV.
• “Julgo, todavia, que é preferível ser arrebatado a cauteloso, porque a
fortuna é mulher e convém, se a queremos subjugar, batê-la e humilhá-la.
A experiência ensina que ela se deixa mais facilmente vencer pelos
indivíduos impetuosos do que pelos frios. Como mulher que é, ama os
jovens, porque são menos cautelosos, mais arrojados e sabem dominá-la
com mais audácia.” Cap. XXV.
A verdade efetiva das coisas como método
• Seu principal método é o da “verdade efetiva das coisas” que é ver e
examinar a realidade tal como ela é e não como se gostaria que fosse.
Essa substituição do dever ser pelo efetivo ser das coisas leva ao
questionamento central de Maquiavel, como fazer reinar a ordem,
com instaurar um Estado estável?
• Com essa explicação, Maquiavel buscava resolver o inevitável ciclo de
estabilidade e caos que dominava tão fortemente a política italiana.
• Ao formular sua explicação, Maquiavel rompe com todo o
conhecimento anteriormente construído, ao demonstrar que a ordem
não é fruto da natureza ou de uma vontade divina.
A ordem como produto humano
• A ordem como produto necessário da política não é natural nem dada
por uma vontade extraterrena e nem mesmo por um simples jogo do
destino.
• Muito pelo contrário, a ordem tem um imperativo; deve ser
construída pelos homens para que se evite o caos e a barbárie e uma
vez alcançada ela não é definitiva, pois há em seu germe um trabalho
negativo, como ameaça de que a ordem se desfaça.
• A questão política portanto é fruto das forças existentes em jogo, que
se conforma a partir de ações concretas dos indivíduos em sociedade
mesmo que nem todas as suas demonstrações concretas venham do
reino da racionalidade e sejam de imediato reconhecíveis.
A política como ação pública
• Assim, o mundo da política se torna contingente e incerto ao
determinar que o poder é fruto da instabilidade, demonstrando que o
mundo da política é bastante distinto da vida privada.
• Em sua famosa constatação, o mundo da política não leva aos céus,
mas a ausência da política é o pior dos infernos.
• Isso requer dizer que os indivíduos que possuem virtude mas deixam
a política ao acaso da sorte ou de divindades extraterrenas, abre mão
de construir uma ordem política viável.
A natureza humana
• Por conta desta natureza humana, a história se torna cíclica, já que
não há meios imperativos para dominar esta natureza. Assim, há um
círculo de desordem que precede a ordem e que vai ser substituída
novamente pela desordem.
• “Assim se faz concluir a própria a natureza dos homens. Estes são
geralmente ingratos, volúveis, simuladores, covardes ante os perigos,
ávidos de lucro. Nos tempos de bonança, e enquanto lhes fazemos o
bem, estão todos, como já tive ocasião de dizer, ao nosso lado,
oferecem-nos o sangue, os haveres, a vida, os filhos; mas quando a
tormenta se aproxima, revoltam-se.” Cap. XVII
Natureza humana e ordem política
• A natureza humana não muda, mas o poder político pode encontrar
formas de dominar tal natureza.
• O poder político, portanto, tem origem mundana e nasce da própria
malícia dos indivíduos.
• Por isso, o poder é o meio para enfrentar tal natureza, ainda que essa
domesticação da natureza humana seja sempre precária, já que a
perversidade das paixões humanas sempre volta a se apresentar
mesmo que fiquem escondidas por um tempo.
É melhor ser temido do que amado
• A “verdade efetiva” é que o Estado possui uma forma de poder
concentrado, fundamentada na violência.
• Apesar dos protestos em contrário, o papel principal do ator político é
dispensar a violência, porque a política é inevitavelmente
atormentada pela dilema de bens limitados e ambições ilimitadas.
• Sob diferenças superficiais, todos os sistemas políticos são dominados
pelo choque de interesses particulares, pela luta sem fim pela
vantagem bruta.
Dominados x dominantes
• Maquiavel entendeu, no entanto, que o impacto psicológico do poder
é suavizado se for feito para parecer o agente de um bem objetivo.
Conscientemente ou não, tecemos nossos elaborados véus de
eufemismo para esconder o fato feio da violência.
• Como fonte desta imutável natureza humana, as sociedades sempre
se veem dividas entre duas forças como as que quere dominar o povo
e as que não querem ser dominadas. Embora uma força sempre
vença, os dominados continuam não querendo ser dominados.
Correlação de forças
• “É que em qualquer cidade se encontram estas duas forças contrárias,
uma das quais provém de não desejar o povo ser dominado nem
oprimido pelos grandes, e a outra de quererem os grandes dominar e
oprimir o povo. Destas tendências opostas surge nas cidades, ou o
principado ou a liberdade ou a anarquia.” Cap. IX
• O problema político se torna encontrar uma espécie de mecanismo
que consiga gerar estabilidade nas relações, sustentadas por uma
determinada correlação de forças que possa se manter no
tempo/espaço.
Ordem como princípio para a justiça
• Há, portanto, duas respostas institucionais a anarquia causada pela
natureza humana; a República e o principado. Nenhuma destas,
porém, pode ser escolhida ao acaso, mas é sempre fruto das
condições reais do mundo político para que se estabeleçam.
• Quando uma nação se encontra em deterioração, há mais injustiças
do que justiça, é necessário um governo forte que consiga estabilizar
os efeitos desta crise.
• Deste ponto portanto, o príncipe não seria um mero ditador para
reestabelecer a ordem, mas um agente de transição na fundação do
Estado, numa fase em que a nação se encontra ameaçada.
A justiça republicana
• Quando o Estado consegue se estabilizar e constituir instituições que
dão fim a crise, o poder político atingiu sua missão central, qual seja,
se educar e regenerar os indivíduos para a vida na República.
• No regime republicano, com o qual Maquiavel considera o regime de
liberdade, o povo é virtuoso e as instituições são estáveis, garantindo
que as relações sociais tenham reciprocidade e segurança.
• Na República os conflitos são fonte de vigor, ligados a uma cidadania
ativa e, portanto, são desejáveis.
Fortuna
• Como a política é feita pela ação dos homens, estimulados por suas
condições históricas, era necessário demonstrar a contingência da
predestinação sobre a política.
• A fortuna não seria uma força maligna que domina o destino dos
indivíduos, ao contrário, seria uma deusa bondosa que possuía os
bens mais desejados; justiça, honra, glória, poder.
• Mas para que a deus pudesse favorecer a uns e não a outros com
estes bens, seria necessário dominá-la e seduzi-la.
Virtú
• A virtude, porém, não é apenas a vitória pela força bruta.
• O governante virtuoso, é o que além de força possui sabedoria para
dominar e conseguir manter seu domínio, mesmo que se não pelo
amor, pelo respeito/medo de seus dominados.
• “Voltando à questão de ser temido ou amado concluo que, visto
depender o amor dos homens da vontade deles mesmos e o seu
temor da vontade do príncipe, deve este, se é sábio, estribar-se no
que depende dele e não no que depende de outros, procurando
apenas, como já disse, evitar o ódio.” Cap. XVII.

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