Você está na página 1de 3

Nome: Juliana Rodrigues Alves Costa

DRE: 118061370
Habilitação: Letras: Português/Literatura
Disciplina: Cultura Portuguesa
Professora: Mônica Genelhu Fagundes

PROPOSTA 02

Resenha crítica de “As causas da decadência dos povos peninsulares nos últimos
três séculos”, de Antero de Quental.

Importante expoente da literatura portuguesa, em “As causas da decadência dos


povos peninsulares nos últimos três séculos”, Antero de Quental busca voltar seus olhos
para o latente atraso social, político e econômico que assolava Espanha e Portugal,
países de grande importância na Península Ibérica. Acreditando que os fatores
motivadores de tal conjuntura incidiam sobre uma crise de proporções morais, o autor
elenca, pois, as razões que, segundo seu ponto de vista, foram as responsáveis por
desencadear com maior veemência a problemática do subdesenvolvimento dessas
nações frente às demais. Para tal, faz-se necessário, em um primeiro momento, ater-se
aos pontos que, conforme abordado pelo autor, seriam responsáveis por instaurar nessas
sociedades uma realidade que, para além de caótica, vê-se marcada por um processo de
dissolução de seus valores estruturais. Nesse sentido, Antero de Quental, optando por
um recorte que centra sua análise majoritariamente na sociedade lusitana, esclarece ao
leitor que havia três causas principais para o declínio de Portugal: a primeira conversa,
diretamente, com o processo de Contrarreforma; a segunda, com o sistema absolutista
monárquico; e a terceira, e não menos importante, com o método econômico
desenvolvido após as Grandes Navegações.

Seguindo a lógica por ele estabelecida, portanto, faz-se mister entender como,
nessa perspectiva, a Contrarreforma seria um dos elementos responsáveis por
intensificar o declínio português. Fruto das modificações alavancadas pelo Concílio de
Trento, a Contrarreforma surge como um movimento de afirmação das crenças cristãs
frente aos questionamentos vários da Reforma Protestante. Dessa forma, na tentativa de
validar a ideologia doutrinadora do Catolicismo, cuja força via-se particularmente
atingida pelos pensamentos contrastantes e contestadores do Protestantismo, a Igreja
desencadeia a técnica atroz da Inquisição, feito que confere à sociedade lusitana uma
incólume nódoa. Segundo Antero de Quental, então, a medida, que unia um método de
doutrinação ideológica, compreendido pela figura dos valores cristãos da moral e do
bom-costume, à instituição social do Catolicismo, extremamente dogmática e
normativa, incita o surgimento de uma sociedade hipócrita e de aparências. Buscando
atender às regras católicas, os portugueses exporiam tudo o que, por trás de suas
máscaras, não lhes dizia respeito; um ciclo eterno de dissimulação que marcaria para
sempre a tessitura social lusitana.

Para além da primeira motivação, o autor aclara ao expectador que Portugal


estava destinada a ser uma nação fracassada devido ao sistema absolutista monárquico.
Marcado pela centralização do poder na mão do rei, o Absolutismo é um sistema
político que, de acordo com Antero de Quental, assim como o Igreja Católica, doutrina
o pensamento do povo português de modo a criar uma ilusão de unidade nacional. Sabe-
se que o processo de fundação do sistema absolutista monárquico encontrou suas bases
de formação nas grandes guerras, travadas pelo então Condado Portucalense, contra a
invasão dos mouros na Península Ibérica. Por consequência, existe a idealização de uma
nação soberana cujas realizações estariam, inevitavelmente, atreladas às suas grandes
conquistas; cria-se o ideal de um povo heroico, destemido e escolhido por Deus para
alcançar a glória, portanto. Toda essa conjuntura seria, notadamente, a fomentadora de
uma dinâmica social em que os valores deturpados, difundidos pelos maiores
representantes de Portugal, os integrantes da monarquia, atingem toda a sociedade
lusitana e possibilitam, séculos depois, a manutenção de um pensamento arcaico que se
mantém vivo a partir da memorável história da conquista.

Por fim, o cenário construído a partir da Era das Grandes Navegações, marcado
por inúmeras conquistas dos países ibéricos, em especial, de Portugal, constitui as bases
para a fundamentação do Mercantilismo. Todo esse panorama, oriundo de uma série de
ideias que concebem que a prosperidade de um Estado está diretamente relacionada à
quantidade de capital por ele acumulado, defende que o desenvolvimento de uma nação
deveria atrelar-se ao comércio exterior. A consequência, pois, é a formação de um ideal
de estado-nação que seria responsável por ditar as políticas econômicas que seriam
seguidas a partir de um viés protecionista e exportador. Na sociedade lusitana, contudo,
mesmo a descobertas de metais preciosos em suas colônias não foi capaz de atender as
demandas de uma grande parcela da população que, saída dos campos, busca a chance
de riquezas trazidas com as especiarias. O que se nota, assim, é que, apesar da difusão
de um ideal de prosperidade e de desenvolvimento, as Grandes Navegações inflam o
peito do povo português com promessas vãs que, outra vez, fomentam a construção de
uma sociedade utópica. Sem a sua grande força motriz, a produção agrícola do interior
do país, Portugal vê-se inevitavelmente atrasada após anos à vanguarda de seu tempo.

É a partir da plena compreensão de uma dinâmica social moralmente deturpada,


portanto, que Antero de Quental, movido por uma forte ambição socialista, pondera a
necessidade de trazer à tona um olhar mais crítico sobre a sociedade portuguesa. Seria
apenas por meio de uma ótica avaliativa e ácida, pois, que Portugal poderia aceitar sua
condição de atraso para, dessa forma, podar as arestas que lhe impediam de evoluir a
fim de reformular uma visão arcaica e ultrapassada. Era preciso entender, então, que as
glórias do passado eram apenas memórias; há necessidade do que é novo. Faz-se de
suma importância, inevitavelmente, reformular as bases retrógradas de uma utopia para
que a identidade nacional lusitana se construa a partir de uma análise crítica. Nesse
sentido, o autor português vislumbra, nas entrelinhas, um discurso de modernização que
desfaz todo um pensamento tradicional que mantém Portugal presa às algemas de um
passado, para além de tudo, idealizado em uma crença de soberania que não se verifica
na prática da atualidade.

Você também pode gostar