Com este trabalho procuramos explicar a relação Histórica do actual
museu com o local, contemplando todas as intervenções feitas ao longo dos anos. A sua história remonta ao século XIII e tal implicação acabará por moldar o espaço museológico, por dentro e por fora, transformando- o no espaço que é hoje.
Contexto histórico desde a origem do espaço conventual à sua
desagregação.
A ordem de São Francisco de Assis fundada em Alenquer, por
insistência de Dona Sancha , veio no ano de 1217 com permissão do rei D. Afonso 2 fundar outra casa da mesma ordem em Lisboa. O local escolhido situava-se sobre o monte fragoso, zona de precipícios rochosos apartada da cidade onde só se sabia da existência de uma pequena ermida de nossa senhora dos mártires, local com óptima vista sobre a baixa da cidade e o rio, sendo ao mesmo tempo isolada, as condições eram propicias. Nos 500 anos que se seguiram ,o espaço conventual sofreu diversas partilhas ,em grande parte pela nobreza, também várias catástrofes nomeadamente 2 terramotos e 3 incêndios foram factores que levaram os franciscanos a verem a área conventual sendo reduzida ao longo dos anos. O ultimo terramoto, o de 1755 e o incêndio que se lhe seguiu, destinaram o grande convento de são Francisco a uma irremediável decadência. Enquanto instituição religiosa e social, o convento perdeu para sempre a sua importância; o seu espaço físico e arquitectónico foi sendo constantemente transformado até aos dias de hoje, quando poucos são os vestígios reconhecíveis do que foi a poderosa casa dos terceiros franciscanos.
Toda a área que os
alinhamentos pós-terramoto reformularam foi reconstituída de raiz, criando novas funções para o espaço conventual. A partir dos anos 70 do sec. XVIII, recomeçou no mesmo chão sagrado a edificação da igreja, projectada para Ser "um dos mais sumptuosos templos de Lisboa “que nunca chegou a ser concluída.
No inicio do sec. XIX foi edificado em volta da abside da igreja
nova, e como parte laica da propriedade dos padres franciscanos, um conjunto de seis construções abobadadas de aparelho tipicamente pombalino e carácter funcional. Estes edifícios de abóbadas de tijolo fino, sustentadas por grossos pilares de pedra e divididos em dois andares, estendem-se pela Rua Serra Pinto para sul precisamente desde o actual local de entrada do Museu do Chiado até a esquina com a rua Vítor Córdon, com excepção de uma parede cega que protegia a capela mor da igreja do convento. Continuam na Rua Vítor Córdon em repetição, até aproximadamente ao espaço que a igreja dos mártires preenchia. A maior parte destas estruturas já não estão visíveis; pode contudo observar-se a sua existência nos projectos de alterações que os prédios sitos naquela zona da esquina foram sofrendo, nos respectivos processos de obras.
Constituídas por lojas e um piso superior, estas construções
foram arrendadas desde 1801,na sua maioria com armazéns. O edifício que é hoje o piso de entrada do Museu do Chiado, com duas portas e um primeiro andar, recebeu diversas ocupações ao longo de 33 anos que antecederam a extinção das ordens religiosas: foi armazém de vinhos e taberna, casa de habitação no andar superior, e local de guardar gado.
Com a extinção das ordens religiosas em 1834 o ex convento
é, apropriado como bem nacional e logo ocupado na sua maior parte por serviços públicos .Em 1836,lado oriental incluía a biblioteca pública (biblioteca nacional)e a igreja. A academia de belas artes ,mais a sul localizada na zona correspondente à antiga portaria e livraria, foi criada em substituição da escola da irmandade de São Lucas. A escola de belas artes (faculdade de belas artes de Lisboa ) recebeu para as suas instalações a zona a ocidente da academia e biblioteca, em voltado pátio grande da cisterna. Todo a restante área foi vendida em asta pública. O ultimo grupo de vendas é para nós o mais interessante, já que abarca a área correspondente á entrada do actual museu. As propriedades foram designadas como seis armazéns com um primeiro andar cada, e com um terraço por cima, que correspondem às já referidas construções pombalinas. Os edifícios foram vendidos a dois estrangeiros residentes em Portugal. Estevão Seimond que ficou com a esquina propriamente dita com os números 10 a 12 e 11 a 9, das Ruas Vítor Córdon e Serpa Pinto respectivamente.
O proprietário do imóvel que passou a constituir a entrada e
livraria do museu do Chiado, foi Abraham Wheelhouse, também apelidado de “HABRÃO PADEIRO”. Era um edifício com quatro portas de entrada e dois andares correspondendo ao piso térreo de hoje, sendo que as marcas da existência do pavimento de divisão dos dois pisos, estão ainda visíveis nos pilares de sustentação das abóbadas.
Abraham Whellhouse estava estabelecido na freguesia dos Martires
desde aproximadamente 1814 explorava uma pequena industria panificadora destinada ao fornecimento do exército britânico residente em Portugal. Por volta dos anos 40 do sec. XIX Abraham Wellhouse compra o edifício e faz construir no próprio, um terceiro andar(actual segundo piso-sala de exposições temporárias), onde instalou quatro fornos marcados por um aparelho regular resistente e pela presença de vigas em L ,elemento de moderna tecnologia para a época, e de provável origem inglesa. ”A CASA E FORNOS DE ABRAAM”, estava destinada ao fabrico e comercialização de bolachas. As clara bóias ou aberturas que estão posicionadas entre os dois pisos superiores, terão servido para facilitar o transporte das matérias primas utilizadas. Em 1854 quando o proprietário era já George Wellhouse, a entrada do edifício funcionava como loja onde se vendiam bolachas e farinhas. Desde os finais do sec. XIX até cerca de 1974, o segundo e terceiro pisos foram ocupados pela litografia Salles, enquanto que o rés-do-chão foi utilizado para garagem e armazém da refinaria brasileira, embora o imóvel tivesse permanecido propriedade da família de Abraham até aos anos 60 do passado século. Mau grado a sua inutilidade para litografia ,e apesar dos projectos para a sua demolição, os quatro fornos permaneceram intactos até aos nossos dias. A abertura do museu do chiado possibilitou a feliz reabilitação deste edifício ,impedindo a destruição da estrutura abobadada, dos fornos e clarabóias, as marcas do tempo que o ex convento reteve.
Principio de Século
- As primeiras alterações do Museu Nacional de Arte Antiga ao
museu do Chiado.
O espaço actual do museu começa por ser, desde 1868,
parcialmente ocupado pela Galeria Nacional de pintura onde se depositavam as obras da Academia Nacional de Belas Artes, fundada em 1836.
A abertura do Museu Nacional de Arte Contemporânea em
1911 é resultado da divisão do Museu das Janelas Verdes- Arte Antiga , Janelas Verdes, e Arte Moderna, novo museu. A escolha de parte do Convento de S. Francisco para instalação do museu seria já na época uma solução de recurso, provisória, que se manteve, não obstante as inúmeras queixas de directores e público, relativas á dimensão, falta de luz, aquecimento e excesso de humidade. O acesso ao museu era também problemático pois era feito pelo interior da Escola de Belas Artes.
Columbano Bordalo Pinheiro, director do MNAC entre 1914 e 1929,
levou a cabo as primeiras alterações. De quatro pequenas salas para cinco e mais três de umas antigas arrecadações.
Em 1944 é criado um acesso autónomo pela Rua Serpa Pinto,
com um jardim ou pátio de entrada, correspondentes aos actuais portão de serviço e jardim, tornando assim independentes a escola do museu.
É assim demolido o barracão que se encontrava no pátio; um
pequeno espaço não utilizado foi transformado em sala de escultura; a antiga primeira sala foi ainda aumentada por serem suprimidos os dois lanços de escadas da anterior entrada. Resultados: mais luz, arejamento e segurança
Em 1968 a Biblioteca Nacional abandona o Convento para se ir
instalar no Campo Grande, ficando o 2º piso para uma extensão da ESBAL.
Já na década de 70 Raul Lino então presidente do MNAC
encomenda a Cristino da Silva um estudo com vista a encontrar soluções para a falta de espaço e incompatibilidade das várias instituições forçadas a coexistir no Convento provisoriamente, já desde o terramoto de 1755.,
Este estudo reflecte assim sobre as possibilidades de
resolução para um problema já secular, e que mesmo de pois de algumas intervenções, permanecia insolúvel. São assim apresentadas três hipóteses de solução:
A 1ª contempla a construção de um corpo anexo ao convento (
opção privilegiada pela relação histórica com o local assim com pela ênfase cultural atribuída á zona).
A 2ª passa pela adaptação de um velho palácio Municipal ou
Particular (S. Roque, Rosa, Pimenta).
A 3ª visa a construção de um novo edifício num local
apropriado, onde se propõe a transferência da E.B.A.L, para a Cidade Universitária e da Academia para o Parque Eduardo VII que era na altura o centro social da cidade, e á semelhança dos principais centros urbanos europeus, permitia um convívio diário entre a população e a arte. Assim e depois de mais uma década de indecisão marcada por profundas alterações do ponto de vista político-social, inicia-se em 1979 o processo de compra do edifício anexo ( 1ª opção) estando este maioritariamente abandonado, visto que a litografia já não funcionava, com exepção do primeiro piso que se mantinha armazém da Refinaria Brasileira.
Em 1981 realizam-se obras mínimas de recuperação do edifício
com vista á sua incorporação, tendo passado a funcionar como reserva do museu. De 1981 a 1988 dá-se uma enorme degradação no museu chegando mesmo a fechar as suas portas em 88. Altura em que se dá o incêndio do Chiado e novas consciências despertam.
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