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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

ARIANE MARIA MARTINS

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DIREITO FUNDAMENTAL


À LIBERDADE: A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA DO
CONSENTIMENTO DO CÔNJUGE PARA A ESTERILIZAÇÃO VOLUNTÁRIA

Palhoça
2019
ARIANE MARIA MARTINS

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DIREITO FUNDAMENTAL


À LIBERDADE: A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA DO
CONSENTIMENTO DO CÔNJUGE PARA A ESTERILIZAÇÃO VOLUNTÁRIA

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao Curso de Graduação em
Direito, da Universidade do Sul de Santa
Catarina, como requisito parcial para
obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientadora: Prof. Patrícia Rodrigues de Menezes Castagna, Esp.

Palhoça
2019
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DIREITO FUNDAMENTAL


À LIBERDADE: A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA DO
CONSENTIMENTO DO CÔNJUGE PARA A ESTERILIZAÇÃO VOLUNTÁRIA

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade


pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a
Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca
Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca deste Trabalho de
Conclusão de Curso.
Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente
em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Palhoça, 13 de novembro de 2019.

____________________________________
ARIANE MARIA MARTINS
Dedico este trabalho à minha avó materna,
Maria da Rosa Bernado, pelo auxílio e
incentivo durante toda minha vida
acadêmica e por ser meu alicerce e
exemplo de perseverança.
AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, por todo o carinho e apoio prestados durante todas as
etapas da minha vida, sem os quais nada disso seria possível.
À minha avó materna, por ter me ensinado que sou capaz de alcançar meus
objetivos e superar as adversidades, desde que eu nunca deixe de acreditar. Você é
minha inspiração.
À minha Professora orientadora, Patrícia Rodrigues de Menezes Castagna,
pelo admirável profissionalismo e zelo durante a elaboração desta pesquisa.
Ao meu namorado Guilherme, por todo o apoio e compreensão me
concedidos durante esse último ano de faculdade.
Às minhas amigas, Mariana, Michaelly e Raquel, por terem me
acompanhado durante esses 5 anos na universidade. Vocês foram fundamentais para
a conclusão deste trabalho.
“Que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa
própria substância, já que viver é ser livre.” (Simone de Beauvoir)
RESUMO

O presente trabalho monográfico tem como objetivo analisar a possível


(in)constitucionalidade o parágrafo quinto do artigo 10 da Lei n. 9.263/1996, que
determina que a pessoa interessada na esterilização voluntária depende do
consentimento expresso do seu cônjuge. Trata-se de pesquisa de metodologia
dedutiva e qualitativa, uma vez que se parte do estudo da Lei do Planejamento
Familiar e da Constituição Federal a fim de identificar-se a (in)constitucionalidade do
dispositivo legal acima citado. A técnica adota é bibliográfica e documental, em razão
de serem utilizadas doutrinas, artigos científicos, periódicos e a legislação. Concluiu-
se, por meio desta pesquisa, que a exigência do consentimento do cônjuge para a
esterilização voluntária, estabelecida na Lei do Planejamento familiar, fere princípios
assegurados pela Constituição Federal e tratados internacionais, sobretudo os
princípios da dignidade da pessoa humana e da liberdade.

Palavras-chave: Esterilização Voluntária. Consentimento do Cônjuge. Autonomia.


Constitucionalidade.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................................ 9
2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E DIREITOS FUNDAMENTAIS .................. 11
2.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ............................................ 12
2.2 PRINCÍPIO DA FRATERNIDADE .............................................................................. 15
2.3 PRINCÍPIO DA IGUALDADE ...................................................................................... 18
2.4 DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE ............................................................... 21
3 LEI DO PLANEJAMENTO FAMILIAR N. 9.263/1996 E ESTERILIZAÇÃO
VOLUNTÁRIA ........................................................................................................................ 25
3.1 BREVE HISTÓRICO DA ESTERILIZAÇÃO VOLUNTÁRIA NO BRASIL ............ 25
3.2 DIREITO AO PLANEJAMENTO FAMILIAR E DIREITOS REPRODUTIVOS ..... 26
3.3 CONCEITO DE ESTERILIZAÇÃO ............................................................................. 31
3.4 A ESTERILIZAÇÃO VOLUNTÁRIA NA LEI N. 9.263/96 ........................................ 33
3.4.1 Esterilização Voluntária e Situações Permitidas pela Lei N. 9.263/96 ....... 33
3.4.2 Esterilização Voluntária e Vedações Expressas Na Lei N. 9.263/96 ........... 35
3.4.3 Consentimento Expresso Dos Cônjuges Na Lei N. 9.263/96 Para A
Esterilização Voluntária ..................................................................................................... 36
4 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DIREITO
FUNDAMENTAL À LIBERDADE: A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA
DO CONSENTIMENTO DO CÔNJUGE PARA A ESTERILIZAÇÃO
VOLUNTÁRIA........................................................................................................................39
4.1 PROJETO DE LEI DA CÂMARA DOS DEPUTADOS N. 209, DE 06 DE MARÇO
DE 1991, CONVERTIDO NA LEI N. 9.263/96 .................................................................. 39
4.2 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 5097, DE 13 DE MARÇO
DE 2014................................................................................................................................... 41
4.3 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N 5.911, DE 08 DE MARÇO
DE 2018................................................................................................................................... 44
4.4 PROJETO DE LEI N. 406, DE 10 OUTUBRO DE 2018, NO SENADO
FEDERAL................................................................................................................................45
4.5 PROJETO DE LEI DA CÂMARA DOS DEPUTADOS N. 1.803, DE 27 DE
MARÇO DE 2019................................................................................................................... 47
5 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 50
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 52
9

1 INTRODUÇÃO

O direito ao Planejamento Familiar, disposto no artigo 226, parágrafo 7º, da


Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, é fundado nos princípios da
dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, sendo de livre decisão
do casal, cabendo ao Estado tão somente propiciar recursos educacionais e
científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte
de instituições oficiais ou privadas.
De modo a regulamentar tal disposição constitucional, foi promulgada a Lei
do Planejamento Familiar n. 9.263, de 12 de janeiro de 1996, cujo parágrafo quinto do
artigo 10 exige o consentimento expresso do cônjuge do indivíduo que pretende se
submeter ao procedimento da esterilização voluntária.
Dessa forma, surgiu a vontade de estudar de maneira mais aprofundada as
razões que motivaram a criação da Lei do Planejamento Familiar e os requisitos
estabelecidos por ela, bem como as Ações Diretas de Inconstitucionalidade
ingressadas no Supremo Tribunal Federal, que ainda não foram julgadas, e os
Projetos de Lei mais recentes que visam a alteração do dispositivo supracitado.
Considera-se que o tema objeto do presente estudo é de extrema
relevância tanto para a academia, quanto para a coletividade, pois além de apresentar
conflitos entre um dispositivo de lei, princípios e direitos fundamentais presentes no
nosso ordenamento jurídico, relaciona-se à garantia de um direito fundamental básico
de todo cidadão brasileiro: a liberdade.
Dessa forma, partindo-se da interpretação e aplicação do princípio da
dignidade da pessoa humana, bem como do direito fundamental à liberdade,
questiona-se se é (in)constitucional o parágrafo quinto do artigo 10 da Lei n.
9.263/1996, que determina que a pessoa interessada na esterilização voluntária
depende do consentimento expresso do seu cônjuge.
A metodologia de abordagem é de pensamento dedutivo e qualitativo, isto
é, partindo de uma contextualização e premissa geral chega-se a um estudo mais
específico. Neste caso, parte-se do estudo da Lei do Planejamento Familiar e da
Constituição Federal a fim de identificar-se a (in)constitucionalidade do dispositivo
legal acima citado.
Quanto ao método de pesquisa, é monográfico, uma vez que se trata de
pesquisa sobre tema especifico elaborado de forma escrita e sistemática. A técnica
10

adotada é a bibliográfica, em razão de serem utilizadas doutrinas, artigos científicos,


periódicos e legislação.
Para tanto, a presente pesquisa desenvolve-se em cinco capítulos,
estruturados de modo que possibilite verificar o planejamento familiar como direito
assegurado pela Constituição Federal e pela Lei n. 9.267/96.
No segundo capítulo apresentar-se-ão os princípios que se relacionam com
a problemática da pesquisa, nomeadamente os da dignidade da pessoa humana, da
fraternidade, da igualdade e da liberdade.
No terceiro capítulo trar-se-á um breve histórico acerca da esterilização
voluntária no Brasil, seguido do direito ao planejamento familiar e os direitos
reprodutivos, demonstrando a legislação relacionada ao tema e os documentos de
natureza internacional.
Além disso, no referido capítulo apresentar-se-á o conceito de esterilização,
além de serem abordadas as situações permitidas e vedações expressas para a
realização do procedimento cirúrgico da esterilização voluntária, com destaque na
exigência do consentimento do cônjuge, de acordo com os termos da Lei n.
9.263/1996.
No quarto capítulo expor-se-á o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados
n. 209, de 06 de março de 1991, convertido na Lei do Planejamento Familiar, n.
9.263/96, trazendo uma breve síntese das Ações Diretas de Inconstitucionalidade
5097 e 5911, ingressadas no Supremo Tribunal Federal nos anos de 2014 e 2018,
respectivamente, que tratam justamente do dispositivo abordado nesta pesquisa.
Por fim, discorrer-se-á acerca do Projeto de Lei n. 406, de 10 outubro de
2018, e do Projeto de Lei n. 1803, de 27 de março de 2019, que tramitam no Senado
e Câmara dos Deputados, respectivamente, os quais pretendem implementar
alterações no texto da Lei do Planejamento Familiar no tocante às regras dos
procedimentos de esterilização voluntária.
11

2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E DIREITOS FUNDAMENTAIS

Faz-se necessário, inicialmente, trazer a definição de princípios e direitos


fundamentais de acordo com a Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 e entendimentos doutrinários acerca do tema, a fim de que seja possível passar
à análise individual dos princípios constantes neste capítulo.
Segundo Barroso (2010, p. 12), “princípios são normas jurídicas com certa
carga axiológica, que consagram valores ou indicam fins a serem realizados, sem
explicitar comportamentos específicos.”
Da mesma forma, Magalhães (2009, p. 8) os conceitua como “normas
jurídicas de observância obrigatória e que devem ser interpretados diante dos casos
concretos para ganharem densidade e se desdobrarem em regras para o caso que
permitam resolver conflitos e garantir os direitos das pessoas.”
Acerca do conflito entre regra e princípio, explica Magalhães (2009, p. 8)
que “[...] caso alguma regra constitucional entre em conflito com os princípios
constitucionais em um caso concreto, a regra deve ceder espaço à aplicação do
princípio.”
No que se refere a direitos fundamentais, Novelino (2019, p. 311) ensina
que “a expressão direitos fundamentais surgiu na França durante o movimento político
e cultural que originou a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão,
de 1789.”
Os direitos fundamentais podem ser definidos como o conjunto oficializado
de direitos e garantias fundamentais da pessoa, cuja finalidade básica é o respeito a
sua dignidade, por meio da sua proteção contra a atuação arbitrária estatal e definição
de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.
(MORAES, 2013, p. 94)
No mesmo sentido, extrai-se dos ensinamentos de Marmelstein (2019, p.
18):

Os direitos fundamentais são normas jurídicas, intimamente ligadas à ideia


de dignidade da pessoa humana e de limitação do poder, positivadas no
plano constitucional de determinado Estado Democrático de Direito, que, por
sua importância axiológica, fundamentam e legitimam todo o ordenamento
jurídico.
12

Demonstra-se relevante, ainda, tratar da diferença entre os termos direitos


fundamentais e garantias fundamentais.
Lenza (2015, p. 1145) explica que “os direitos são bens e vantagens
prescritos na norma constitucional, enquanto as garantias são os instrumentos através
dos quais se assegura o exercício dos aludidos direitos.”
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 emprega o termo
direitos e garantias fundamentais no Título II para tratar de direitos e princípios nela
expressos e utiliza o termo direitos humanos em relação às normas e princípios
estabelecidos em tratados e convenções internacionais. (BRASIL, 1988)
Tartuce (2019, p. 81) esclarece que, no Título supra, a Constituição
Federal:

[...] traça as prerrogativas para garantir uma convivência digna, com liberdade
e com igualdade para todas as pessoas, sem distinção de raça, credo ou
origem. Tais garantias são genéricas, mas também são essenciais ao ser
humano, e sem elas a pessoa humana não pode atingir sua plenitude e, por
vezes, sequer pode sobreviver.

Quanto à abrangência dos direitos e das garantias fundamentais, não se


trata de um rol taxativo, mas sim exemplificativo, uma vez que os direitos e garantias
definidos pela Constituição não impedem a aplicação de outros decorrentes do regime
e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte. (LENZA, 2015, p. 1147),
E, por fim, acerca da aplicabilidade dos direitos e garantias fundamentais,
a CRFB/1988 assegura no § 1.º do artigo 5.º que “as normas definidoras dos direitos
e garantias fundamentais têm aplicação imediata.” (BRASIL, 1988)
Frente às considerações acima realizadas, passa-se a abordar, na
sequência, os princípios da dignidade da pessoa humana, fraternidade, igualdade,
direito fundamental à liberdade.

2.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

A Constituição Federal de 1988 em seu art. 1º estabeleceu os fundamentos


nos quais a República Federativa do Brasil deve estar pautada, dentre os quais se
encontra a dignidade da pessoa humana, in verbis:
13

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos


Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
[...] (BRASIL, 1988)

Em relação aos fundamentos da República, presentes no artigo 1º, incisos


I a V da CRFB/1988, explica Novelino (2019, p. 294):

Apesar de esses princípios fundamentais não possuírem qualquer tipo de


hierarquia normativa em relação às demais normas constitucionais, o elevado
grau axiológico de que são dotados e a posição de destaque atribuída pelo
Poder Constituinte Originário conferem peso elevado às razões por eles
fornecidas, a ser considerado diante de eventual colisão com outros
princípios constitucionais.

Acerca do princípio da dignidade da pessoa humana, Ramos (2019, p. 79)


explica que “não trata de um aspecto particular da existência, mas sim de uma
qualidade inerente a todo ser humano, [...]. Logo, o conceito de dignidade humana é
polissêmico e aberto, em permanente processo de desenvolvimento e construção.”
Para Novelino (2019, p. 297), a dignidade é:

[...] uma qualidade intrínseca de todo ser humano, e não um direito conferido
às pessoas pelo ordenamento jurídico. A sua consagração como fundamento
do Estado brasileiro não significa, portanto, a atribuição de dignidade às
pessoas, mas sim a imposição aos poderes públicos dos deveres de respeito,
proteção e promoção dos meios necessários a uma vida digna.

De acordo com Branco (2012, p. 159), o princípio da dignidade da pessoa


humana:

[...] inspira os típicos direitos fundamentais, atendendo à exigência do


respeito à vida, à liberdade, à integridade física e íntima de cada ser humano,
ao postulado da igualdade em dignidade de todos os homens e à segurança.
É o princípio da dignidade humana que demanda fórmulas de limitação do
poder, prevenindo o arbítrio e a injustiça.

Segundo Moraes (2013, p. 62), o princípio da dignidade da pessoa humana


traduz-se em uma dupla compreensão, uma vez que assegura um direito individual
diante do próprio Estado e dos demais indivíduos e, ainda, determina o dever
fundamental de tratamento igualitário de todos.
14

No dizer de Sarlet (2004, p. 27), “[...] o respeito e a proteção da dignidade


da pessoa (de cada uma e de todas as pessoas) constituem-se (ou, ao menos, assim
o deveriam) em meta permanentemente da humanidade, do Estado e do Direito.”
Do mesmo modo, ensina Sarlet (2004, p. 43-44):

[...] independente das circunstâncias concretas, já que inerente a toda e


qualquer pessoa humana, visto que, em princípio, todos – mesmo o maior
dos criminosos – são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos
como pessoas – ainda que não se portem de forma igualmente digna nas
suas relações com seus semelhantes, inclusive consigo mesmos.

Há uma relação de dependência recíproca entre a dignidade da pessoa


humana e os direitos fundamentais, segundo Novelino (2019, p. 298), uma vez que:

[...] ao mesmo tempo em que estes surgiram como uma exigência da


dignidade de proporcionar o pleno desenvolvimento da pessoa humana,
somente por meio da existência desses direitos a dignidade poderá ser
respeitada, protegida e promovida.

Dentre os diversos documentos em que o princípio da dignidade da pessoa


encontra-se disciplinado, destacam-se a Declaração Universal dos Direitos Humanos
e a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos. (ONU, 1948; BRASIL, 1992)
Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada em 10 de
dezembro de 1948 pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas,
identifica-se já no preâmbulo que “o reconhecimento da dignidade inerente a todos os
membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o
fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.” (ONU, 1948)
Na Convenção Americana Sobre Direitos Humanos de 22 de novembro de
1969, chamada também de Pacto de San José da Costa Rica, observa-se no artigo
11 a determinação de que “toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao
reconhecimento de sua dignidade.” (BRASIL, 1992)
Vale destacar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a
Convenção Americana Sobre Direitos Humanos foram ratificadas pelo Brasil em 10
de dezembro de 1948 e em 25 de setembro de 1992, respectivamente. (ONU, 1948;
BRASIL, 1992)
De acordo com Sarlet (2018, p. 286), “o documento seguramente mais
influente segue sendo a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU), de 10 de
15

dezembro de 1948, que trata do tema não apenas em seu Preâmbulo, mas também
em artigos subsequentes.”
No que se refere à dignidade da pessoa humana perante a Declaração
Universal, Piovesan (2018a, p. 231) explica:

Vale dizer, para a Declaração Universal a condição de pessoa é o requisito


único e exclusivo para a titularidade de direitos. [...] A dignidade humana
como fundamento dos direitos humanos e valor intrínseco à condição humana
é concepção que, posteriormente, viria a ser incorporada por todos os
tratados e declarações de direitos humanos, que passaram a integrar o
chamado Direito Internacional dos Direitos Humanos.

Acerca da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, Guerra (2017,


p. 163-164) ensina que, ao contrário da Declaração de 1948, “a Convenção de 1969
se apresenta como documento internacional que constitui uma série de obrigações
para os Estados-partes, isto é, produz vários efeitos jurídicos para os Estados que
venham a ratificar o referido tratado internacional.”
Diante disso, verifica-se que a Constituição Federal adotou o princípio da
dignidade da pessoa humana como alicerce no que tange aos direitos e garantias
fundamentais, de modo que veda expressamente a aplicação e edição de normas que
visem ferir tal princípio.

2.2 PRINCÍPIO DA FRATERNIDADE

O princípio da fraternidade encontra-se logo no preâmbulo da CFRB/88,


que muito embora não tenha força normativa, segundo Lenza (2015, p. 1175),
representa um norte interpretativo das normas constitucionais:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional


Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-
estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de
uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (BRASIL,
1988)

Diante disso, Oliveira e Langoski (2016, p. 45) ensinam que o preâmbulo


da Constituição Federal de 1988 foi o meio pelo qual “o legislador constituinte
comprometeu-se com a construção de uma sociedade fraterna, pluralista, sem
16

preconceitos e colocou como valores supremos a liberdade, a segurança, o bem-


estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça.”
Da mesma forma, estabeleceu no artigo 1º da Declaração Universal dos
Direitos Humanos de 1948 “todos os seres humanos nascem livres e iguais em
dignidade e em direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação
uns aos outros com espírito de fraternidade.” (ONU, 1948)
A Carta Magna brasileira determina no seu artigo 3º os objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil, podendo ser observado no seu inciso
I o objetivo de “construir uma sociedade livre, justa e solidária.” (BRASIL, 1988)
Diante de tal regra, a Constituição incorporou ao seu texto dimensões
materializadas em três valores distintos, porém intimamente ligados: uma dimensão
liberal, que corresponde a construir uma sociedade livre; uma dimensão social, que
se refere a construir uma sociedade justa; e, por fim, uma dimensão fraternal, que se
relaciona com a construção de uma sociedade solidária. (MACHADO, 2016, p. 70),
Para Castagna e Castagna (2016, p. 273), a fraternidade, enquanto
princípio jurídico, é:

[...] um desdobramento natural do axioma da dignidade da pessoa humana.


Em outras palavras, é a compreensão de que todos são merecedores do
tratamento mais digno possível (dignidade da pessoa humana) que conduz
ao entendimento de que se deve aproximar do outro num ambiente relacional
(fraternidade), perceber suas necessidades e problemas, envolver-se
verdadeiramente, assumindo responsabilidades e, assim, almejar uma
sociedade onde outros princípios igualmente relevantes, como a liberdade e
a igualdade, encontram concretização.

Nesse sentido, a fraternidade está relacionada aos princípios de liberdade


e de igualdade, eis que se pressupõe a liberdade individual e a igualdade de todos em
uma relação de interdependência mutua entre eles. (BERNHARD, 2008)
Segundo Oliveira e Langoski (2016, p. 51):

A fraternidade colabora para construir uma nova racionalidade humana, que


tem por escopo principal a cultura de alteridade, de tolerância, de não
violência, de racionalidade ecológica, com o fortalecimento de uma educação
voltada para os valores humanitários.

Nesse sentido, Ramos (2019, p. 58) descreve os direitos de terceira


geração como:
17

[...] aqueles de titularidade da comunidade, como o direito ao


desenvolvimento, direito à paz, direito à autodeterminação e, em especial, o
direito ao meio ambiente equilibrado. São chamados de direitos de
solidariedade. São oriundos da constatação da vinculação do homem ao
planeta Terra, com recursos finitos, divisão absolutamente desigual de
riquezas em verdadeiros círculos viciosos de miséria e ameaças cada vez
mais concretas à sobrevivência da espécie humana.

Nesse sentido, Camões (2019, p. 96) descreve a fraternidade como:

[...] um direito fundamental autônomo cujo centro axiológico repousa sobre a


dignidade da pessoa humana e desenvolve-se como valor com coloração
analítica própria, ao promover a realização harmônica e simultânea da
liberdade e da igualdade sem resultados excludentes e reconhecendo a
alteridade como característica intrínseca à sua operacionalização na práxis
jurídica.

Da mesma forma, extrai-se dos ensinamentos de Motta (2019, p. 174, grifo


do autor):
São, assim, direitos de titularidade difusa ou coletiva, que abrangem
destinatários indeterminados ou de difícil determinação. Vinculam-se
essencialmente aos valores da fraternidade ou solidariedade e são
tradução de um ideal intergeracional, que liga as gerações presentes às
futuras, a partir da percepção de que a qualidade de vida destas depende
sobremaneira do modo de vida daquelas.

Esses novos direitos buscam proteger todo o gênero humano e não apenas
um grupo de indivíduos, podendo ser citados, como exemplo, o direito ao
desenvolvimento, o direito à paz, o direito ao meio ambiente, o direito de propriedade
sobre o patrimônio comum da humanidade e o direito de comunicação.
(MARMELSTEIN, 2019, p. 50)
Camões (2019, p. 84) trata de uma relação entre o princípio da fraternidade
e da dignidade da pessoa humana, isso porque “a dignidade humana assume
capacidade estruturadora da fraternidade e é por ela estruturada, [...], haja vista que
se pressupõe o reconhecimento da condição humana a todo raciocínio em
conformidade com a fraternidade.”
Ademais, o artigo 4º da Constituição determina os princípios pelos quais a
República Federativa do Brasil se orienta nas suas relações internacionais, cujos
incisos VI e VII prescrevem a defesa da paz e a solução pacífica dos conflitos
(BRASIL, 1988).
Acerca desses dois incisos supracitados, Almeida (2018, p. 1426)
esclarece que tal imposição legal:
18

[...] aponta a tendência de alinhamento da Constituição brasileira com a


terceira geração de direitos do homem, que prestigia, como um dos direitos
de solidariedade entre os povos, o direito à paz. Assim, sendo a guerra a
solução exatamente oposta, haverá de ser tida como último recurso na
solução de conflitos pela Federação brasileira.

Nesse sentido, Sarmento (2004, p. 338) ensina:

[...] embora cada um de nós componha uma individualidade, irredutível ao


todo, estamos também todos juntos, de alguma forma irmanados por um
destino comum. Ela significa que a sociedade não deve ser o locus da
concorrência entre indivíduos isolados, perseguindo projetos pessoais
antagônicos, mas sim um espaço de diálogo, cooperação e colaboração entre
pessoas livres e iguais, que se reconheçam como tais.

Diante de tais informações, percebe-se que a fraternidade se faz


necessária no mundo globalizado de hoje, uma vez que, em observância à dignidade
da pessoa humana, a individualidade de cada pessoa deve ser respeitada e
compreendida pelas demais, a fim de que possamos viver em harmonia e alcançar a
redução de desigualdades.

2.3 PRINCÍPIO DA IGUALDADE

A igualdade, consolidada ao centro do ordenamento jurídico, tornou-se


notória a partir da Revolução Francesa, pautada nos fundamentos de igualdade,
fraternidade e liberdade, conforme se extrai da lição de Mallet e Fava (2018, p. 1228).
Durante esse acontecimento, foi elaborada a Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão de 1789, cujo artigo 1º ordena, in verbis: “todos os homens
nascem livres e iguais em direito.” (FRANÇA, 1789).
A Constituição Federal de 1988, por sua vez, estabelece, no seu artigo 5º,
que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.” (BRASIL, 1988).
Já no âmbito internacional, Piovesan (2018b, p. 390-391) entende que:

A igualdade e a não discriminação passam a ser concebidas como um


princípio fundante do Direito Internacional do Direitos Humanos, como
condição e requisito para o pleno exercício dos direitos humanos. [...] A
igualdade e a não discriminação constituem um princípio fundamental que
19

ilumina e ampara todo sistema internacional de proteção aos direitos


humanos.

Segundo Bonavides (2016, p. 384), “de todos os direitos fundamentais a


igualdade é aquele que mais tem subido de importância no Direito Constitucional de
nossos dias, sendo, como não poderia deixar de ser, o direito-chave, o direito-
guardião do Estado social.”
Na lição de Motta (2019, p. 194), há de se destacar duas acepções quanto
à aplicação do princípio da isonomia:

Frente ao legislador (igualdade na lei), o qual está impedido de instituir


tratamento legislativo diferenciado, salvo se houver razoabilidade para tanto;
e frente ao aplicador da norma (igualdade perante a lei), que não pode, ao
aplicá-la a um caso concreto, fazê-lo de forma diferenciada com relação aos
seus destinatários.

Referente à insuficiência da concepção formal de igualdade, Novelino


(2019, p. 370) esclarece que:

A constatação de que o mero dever de igual tratamento para indivíduos e


situações com as mesmas características essenciais acaba por legitimar
arbitrariedades e injustiças revelou a necessidade de desenvolver uma
concepção material de igualdade, direcionada também ao conteúdo das
normas criadas pelo legislador.

Corroborando com o ensinamento do autor supra, Lenza (2015, p. 1158,


grifo do autor) explica que é necessário buscar não somente a igualdade formal, mas
sim a igualdade material, uma vez que “no Estado social ativo, efetivador dos direitos
humanos, imagina-se uma igualdade mais real perante os bens da vida, diversa
daquela apenas formalizada em face da lei.”
No que se refere ao aspecto formal e material, ensina Motta (2019, p.192,
grifo do autor):

Enquanto o princípio da legalidade constitui basicamente uma garantia formal


aos indivíduos, que só poderão ter seus direitos e obrigações criados por lei,
o princípio da igualdade tem caráter nitidamente material, pois ele se volta
para o conteúdo das normas da lei, para o teor de suas disposições.

Branco (2012, p. 156) se refere ao princípio da igualdade como “direitos de


segunda geração, por meio dos quais se intenta estabelecer uma liberdade real e igual
para todos, mediante a ação corretiva dos Poderes Públicos.”
20

No mesmo sentido, ensina Bonavides (2016, p. 386) que o Estado social é


produtor de igualdade de fato, comprometendo-se, se necessário, a atuar por meio de
ações positivas e eficazes a fim de concretizar comandos normativos de isonomia.
Martins (2018, p. 448-449) leciona:

A lei que em si atingir direitos fundamentais deverá ser compatível com o


parâmetro normativo constitucional. Para tanto, poderá e, em alguns
contextos, até deverá realizar distinções, quando elas forem necessárias à
proteção do direito fundamental à igualdade material.

Nesse sentido, Lenza (2015, p. 1159) apresenta na sequência algumas


hipóteses em que a própria Constituição Federal estabelece desigualdades, tais como
condições às presidiárias para que possam permanecer com os seus filhos durante o
período de amamentação, licença-maternidade e licença paternidade, serviço militar
obrigatório, regras sobre aposentadoria, dentre outros.
No dizer de Lenza (2015, p. 1159), “além dessas e outras hipóteses
expressamente previstas na CF/88, a grande dificuldade consiste em saber até que
ponto a desigualdade não gera inconstitucionalidade.”
Contudo, Moraes (2013, p. 112) elucida a questão levantada anteriormente:

A desigualdade na lei produz-se quando a norma distingue de forma não


razoável ou arbitrária um tratamento específico a pessoas diversas. [...]
Assim, os tratamentos normativos diferenciados são compatíveis com a
Constituição Federal, quando verificada a existência de uma finalidade
razoavelmente proporcional ao fim visado.

Quanto à igualdade entre homens e mulheres, a Constituição Federal, no


artigo 5º, I, disciplina especialmente nesse sentido que “homens e mulheres são iguais
em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.” (BRASIL, 1988)
Entretanto, em relação à correta interpretação do dispositivo supra,
segundo Moraes (2013, p. 125):

[...] torna inaceitável a utilização do discrimen sexo, sempre que o mesmo


seja eleito com o propósito de desnivelar materialmente o homem da mulher;
aceitando-o, porém, quando a finalidade pretendida for atenuar os desníveis.
Consequentemente, [...] poderá a legislação infraconstitucional pretender
atenuar os desníveis de tratamento em razão do sexo; nunca, porém,
beneficiando um deles.

Diante disso, observa-se a relevância de tratarmos do princípio em questão


a partir do entendimento da igualdade material, de modo a alcançar a efetiva isonomia
21

por meio de ações positivas do Estado, que deverá em algumas ocasiões utilizar-se
da desigualdade para tanto.

2.4 DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE

Assim como o princípio da fraternidade e da igualdade, o direito


fundamental à liberdade encontra-se no preâmbulo do texto constitucional brasileiro,
devendo ser considerado, portanto, como norte interpretativo.
Já no texto constitucional, o art. 5, caput e seu inciso II asseguram
expressamente a inviolabilidade do direito fundamental à liberdade, in verbis:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,


garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: [...] (BRASIL, 1988)

A disposição constitucional supracitada é denominada por Sarlet e Vale


(2018, p. 437-438) como um direito geral de liberdade, enquanto seus incisos tratam
das liberdades em espécie, como a liberdade de manifestação do pensamento, as
liberdades de informação e de imprensa, a liberdade de exercício profissional, as
liberdades religiosa, artística e cultural, a liberdade de associação etc.
Acerca do mesmo dispositivo, Sarmento (2016, p. 161) afirma que “se trata
de um direito residual, que incide quando não se aplicarem outras liberdades
específicas consagradas na Constituição.”
Conforme explica Ramos (2019, p. 57-58), os direitos de liberdade
classificam-se como direitos de primeira geração, que compreendem direitos às
prestações negativas, cabendo ao Estado proteger a esfera de autonomia do
indivíduo. São chamados também de “direitos de defesa”, uma vez que defendem o
indivíduo de intervenções indevidas do Estado, estabelecendo uma limitação entre o
seu poder e o ser humano.
No mesmo sentido, Bonavides (2016, p. 578) afirma:

Os direitos de primeira geração ou direitos da liberdade têm por titular o


indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou
atributos da pessoa e ostentam uma subjetividade que é seu traço mais
característico; enfim são direitos da resistência ou de oposição perante o
Estado.
22

O inciso II do artigo 5º da Constituição Federal, por sua vez, dispõe que


“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de
lei.” (BRASIL, 1988)
Diante disso, Ramos (2019, p. 644) explica que:

Essa sintonia entre liberdade e legalidade é fruto da consagração do Estado


de Direito. Fica superada a antiga submissão de todos à vontade do monarca,
substituída pela vontade da lei. Nesse sentido, entre o governo dos homens
ou o governo das leis, o Estado de Direito optou pelo segundo.

Além disso, Gagliano e Pamplona Filho (2015, p. 216-217) explicam que


há uma relação entre os direitos fundamentais e o exercício do direito à liberdade,
concluindo que “se é certo que a liberdade é algo inerente à condição humana, muito
mais evidente é que haverá certos tipos de atos que serão proibidos pela ordem
jurídica, por superiores razões de interesse público e conveniência social.”
Cabe ressaltar, ainda, que o inciso II do artigo 5º da CRFB/88 estabelece
como princípio a liberdade de fazer e agir. O princípio, portanto, é o de que todo
indivíduo tem liberdade de fazer e de não fazer, agindo conforme suas vontades,
exceto quando a lei vedar a prática daquela conduta. (SILVA, 2013, p. 237)
Referente ao dispositivo supracitado, extrai-se da lição de Silva (2013, p.
238, grifo do autor):

[...] esse dispositivo é um dos mais importantes do direito constitucional


brasileiro, porque, além de conter previsão da liberdade de ação (liberdade-
base das demais), confere fundamento jurídico às liberdades individuais e
correlaciona liberdade e legalidade. [...] Quer dizer: a liberdade só pode ser
condicionada por um sistema de legalidade legítima.

No mesmo sentido, Ramos (2019, p. 644) ensina que “o indivíduo é livre


para não exercer seus direitos: sua autonomia e autodeterminação são componentes
do direito à liberdade e da própria dignidade humana.”
No tocante à autonomia, segundo Sarmento (2016, p. 139), o termo “é de
origem grega: auto designa a própria pessoa, e nomos é a lei. Etimologicamente,
autonomia é a capacidade de ditar as normas que regem a própria conduta. Em outras
palavras, trata-se da autodeterminação.”
Tartuce (2019, p. 305) explica que, no Direito Civil Contemporâneo, a
autonomia pode ser definida como “o direito que a pessoa tem de regulamentar os
23

próprios interesses, o que decorre dos princípios constitucionais da liberdade e da


dignidade humana.”
Segundo Barroso (2010, p. 24), “a dignidade como autonomia envolve, em
primeiro lugar, a capacidade de autodeterminação, o direito do indivíduo de decidir os
rumos da própria vida e de desenvolver livremente sua personalidade.”
Para Marmelstein (2019, p. 107):

A ideia que inspira a proteção da autonomia privada é a de que o Estado deve


tratar as pessoas sob o seu domínio como agentes responsáveis e capazes
de tomar por si próprios as decisões que lhes dizem respeito. [...] Daí os
diversos direitos de liberdade: de locomoção, de religião, de associação e
reunião, de profissão, de expressão etc. Logo, o valor da autonomia de
escolha é inestimável, já que inúmeros direitos fundamentais decorrem
diretamente desse princípio.

De acordo com Sarmento (2016, p. 158):

[...] a autonomia perseguida pelo princípio da dignidade da pessoa humana


não se resume à mera ausência de obstáculos externos à atuação estatal.
Trata-se de uma liberdade positiva, que visa não só a impedir a imposição de
barreiras às escolhas individuais, mas objetiva também empoderar as
pessoas para que possam realmente exercer a plenitude da sua liberdade.

Do mesmo modo, extrai-se dos ensinamentos de Barroso (2010, p. 24):

No plano dos direitos individuais, a dignidade se manifesta, sobretudo, como


autonomia privada, presente no conteúdo essencial da liberdade, no direito
de autodeterminação sem interferências externas ilegítimas. É preciso que
também estejam presentes, todavia, as condições para a autodeterminação,
as possibilidades objetivas de decisão e escolha, o que traz para esse
domínio, também, o direito à igualdade, em sua dimensão material [...].

Quanto à inexistência de um dispositivo que assegure expressamente o


direito à autonomia na CFRB/88, segundo Marmelstein (2019, p. 106), “é inegável que
ela está presente, de modo implícito, em diversos dispositivos do texto constitucional,
sobretudo nos direitos relativos à liberdade e à personalidade.”
No mesmo sentido, extrai-se da lição de Sarmento (2005, p. 205) que:

A tutela da autonomia privada, entendida no sentido mais amplo, também foi


significativamente fortalecida pela Carta de 1988, em razão da riqueza do
catálogo de direitos fundamentais inscritos no texto constitucional de modo
não exaustivo e dos inúmeros remédios judiciais e garantias materiais
instituídos para a sua defesa. Sua privilegiada localização no corpo da
24

Constituição é também reveladora da relevância ímpar atribuída pelo


constituinte às liberdades fundamentais.

Por outro lado, Sarmento (2005, p. 208) ressalva que as liberdades não são
absolutas, uma vez que:

[...] em caso de conflito, elas podem ser ponderadas com outros direitos e
princípios constitucionais. Significa, sim, que não cabe ao Estado avaliar se
as liberdades existenciais estão ou não sendo exercidas no sentido que ele
considerar mais apropriado, já que tal concepção esvaziaria o poder da
pessoa humana de se autogovernar, de fazer escolhas existenciais e de viver
de acordo com elas, desde que não lese direitos de terceiros.

No entanto, ressalva Marmelstein (2019, p. 439) que é necessário saber


se o exercício da liberdade de escolha é autêntico, sendo que se essa decisão for
legítima, “o máximo que o Estado pode fazer é desenvolver mecanismos para que o
indivíduo tenha perfeita consciência da consequência do seu ato, mas jamais interferir
na sua escolha, sobretudo quando a decisão não atingirá a dignidade de outras
pessoas.”
No que se refere à autonomia de dispor sobre o próprio corpo, tem-se o
pensamento de Marmelstein (2019, p. 440):

[...] toda pessoa que esteja em pleno gozo de suas faculdades mentais e
tenha condições concretas e autênticas de tomar por si própria as decisões
que lhe dizem respeito tem o direito fundamental de dispor do próprio corpo
da forma como bem entender, desde que não prejudique o direito de
terceiros, não podendo o Estado, ressalvadas algumas situações bem
peculiares, interferir no exercício desse direito.

A liberdade, portanto, corresponde a um direito fundamental assegurado


pela Constituição brasileira, a fim de garantir o exercício dos direitos de autonomia
inerentes ao ser humano e, assim, preservá-lo de possíveis arbitrariedades a serem
praticadas pelo Estado, que hoje se mostram muito além do direito de locomoção.
25

3 LEI DO PLANEJAMENTO FAMILIAR N. 9.263/1996 E ESTERILIZAÇÃO


VOLUNTÁRIA

A esterilização voluntária encontra-se disciplinada pela Lei n. 9.263 de 12


de janeiro de 1996, intitulada Lei do Planejamento Familiar, visando regulamentar uma
intervenção cirúrgica já realizada com frequência no Brasil que, no entanto, não
dispunha de qualquer controle ou orientação normativa capaz de trazer legitimidade
para o procedimento.
No presente capítulo, será apresentado um breve histórico da esterilização
voluntária no Brasil, seguido do direito ao planejamento familiar e os direitos
reprodutivos, demonstrando-se a legislação pertinente ao tema e destacando-se os
documentos de natureza internacional.
Por fim, será tratado acerca dos requisitos impostos pela Lei do
Planejamento Familiar para a realização do procedimento de esterilização voluntária,
com destaque na exigência do consentimento do cônjuge.

3.1 BREVE HISTÓRICO DA ESTERILIZAÇÃO VOLUNTÁRIA NO BRASIL

Antes do advento da Lei do Planejamento Familiar em 1996 não havia no


Brasil legislação específica regulamentando o procedimento da esterilização
voluntária, de modo que a intervenção cirúrgica para esse fim poderia chegar a ser
interpretada como uma ofensa criminal, uma vez que resulta em perda ou
incapacidade reprodutiva.
Isso porque considerando a inexistência de qualquer lei específica que
proibisse a realização da esterilização voluntária, tal prática não era permitida, com
base no art. 128, § 2º, inciso III do Código Penal Brasileiro, o qual diz que qualquer
lesão corporal de natureza grave, resultando em debilidade permanente de membro,
sentido ou função do corpo é considerada como crime. (BRASIL, 1940)
Conforme extrai-se dos ensinamentos de Vieira (1994), havia de fato uma
insegurança quanto à realização do procedimento de esterilização cirúrgica por parte
dos médicos em razão da ausência de normas que o regulamentasse, sendo essa
ausência:

[...] provavelmente outro fator estimulador da disseminação da esterilização,


já que facilita a clandestinidade em que esta é praticada. O Conselho Federal
26

de Medicina e suas regionais não recomendam a esterilização baseando-se


na ausência de regulamentação, ou mesmo na ilegalidade do procedimento
[...].

Segundo Berquo e Cavenahi (2003, p. 2), do mesmo modo que a


esterilização voluntária não era legalizada, também o planejamento familiar no Brasil
não era regulamentado, sendo apenas recentemente aprovada a legislação relativa à
saúde e a direitos reprodutivos.
Desse modo, até a promulgação da Lei n. 9.263/96, o planejamento familiar
encontrava-se regulado apenas pelo artigo 226, § 7º, da Constituição Federal,
conforme abaixo mencionado, sem que houvesse, no entanto, uma norma específica
que o regulamentasse. Veja-se:
Dentre outras regras pertinentes à família contidas no artigo 226, da
CFRB/1988, o seu § 7º dispõe:

Art. 226, § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da


paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal,
competindo ao Estado propiciar recursos para o exercício desse direito,
vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou
privadas. (BRASIL, 1988)

Resta, portanto, evidente a expressiva inovação normativa ocasionada com


o advento da Lei do Planejamento Familiar n. 9.263/96, de modo que regulamentou o
artigo 226 § 7º da CRFB/88 e assegurou direitos ao indivíduo e impôs deveres ao
Estado quanto ao exercício dos direitos reprodutivos no Brasil, que antes carecia de
uma disciplina legal específica tratando do tema.

3.2 DIREITO AO PLANEJAMENTO FAMILIAR E DIREITOS REPRODUTIVOS

A Constituição Federal de 1988, no Título VII da Ordem Social, no Capítulo


VII Da Família, Da Criança, Do Adolescente, Do Jovem e Do Idoso, elencou uma série
de deveres e direitos a eles conferidos, sendo o artigo 226, § 7º fundamento
constitucional do objeto de estudo do presente tópico. (BRASIL, 1988)
Moraes (2013, p. 62) ensina que o princípio da dignidade da pessoa
humana “encontra no novo texto constitucional total aplicabilidade em relação ao
planejamento familiar, considerada a família célula da sociedade, seja derivada do
casamento, seja de união estável entre homem e mulher, [...].”
27

No mesmo sentido, Gagliano e Pamplona Filho (2012, p. 288)


compreendem que “a promoção da dignidade da pessoa humana, no Brasil, para que
se construa, de fato, um Estado Social e Democrático de Direito, passa,
inexoravelmente, pelo planejamento familiar.”
No tocante ao princípio da paternidade responsável, extrai-se dos
ensinamentos de Moraes e Teixeira (2018, p. 2222) que o dispositivo busca:

[...] proteger a pessoa do filho, impondo limites à liberdade dos pais, quais
sejam aqueles decorrentes da responsabilidade com a criação e o sustento
da prole. Como não há responsabilidade sem liberdade, garante-se a
liberdade de decisão de planejar a dimensão da família e dessa liberdade faz-
se decorrer a responsabilidade parental de assisti-la material e moralmente.

Dessa forma, em respeito à paternidade responsável, há necessidade da


intervenção do Estado em adotar políticas eficientes de controle de natalidade,
mediante campanhas publicitárias, promoção do acesso aos meios contraceptivos,
incentivo ao aumento controlado da prole por meio de benefícios fiscais e, sobretudo,
por meio da educação de base com ênfase nos benefícios da reprodução planejada.
(GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p. 288)
Ademais, Moraes e Teixeira (2018, p. 2222) explicam que, além de afirmar
uma série de princípios, o referido dispositivo constitucional:

[...] destina-se a evitar, coerentemente com os princípios fundamentais, que


possam ser adotadas políticas coercitivas de esterilização, como já se havia
proposto no passado. Ignorar a autonomia individual neste particular,
mediante práticas forçadas, significaria dar à pessoa humana um tratamento
de coisificação, oposto, portanto, ao da dignificação. Não convencido, porém,
da suficiência da menção ao princípio da dignidade humana, o dispositivo
veda expressamente “qualquer forma coercitiva por parte de instituições
oficiais ou privadas”.

Em consonância com o § 7º do artigo 226 da Constituição Federal, a


legislação infraconstitucional também tratou do tema, conforme prescreve o artigo
1.513 do Código Civil de 2002, in verbis: “é defeso a qualquer pessoa de direito público
ou direito privado interferir na comunhão de vida instituída pela família.” (BRASIL,
2002c).
Em análise do artigo supracitado, Tartuce (2019, p. 163) ressalva que sua
leitura exige cautela, isso porque “o real sentido do texto legal é que o Estado ou
mesmo um ente privado não pode intervir coativamente nas relações de família.
28

Porém, o Estado poderá incentivar o controle da natalidade e o planejamento familiar


por meio de políticas públicas.”
Ainda, segundo Tartuce (2019, p. 1062-1063):

Trata-se da consagração do princípio da liberdade ou da não intervenção na


ótica do Direito de Família. [...] Por certo que o princípio em questão mantém
relação direta com o princípio da autonomia privada, que deve existir no
âmbito do Direito de Família. O fundamento constitucional da autonomia
privada é a liberdade, um dos principais atributos do ser humano (art. 1º, III,
da CF/1988).

Além disso, o objetivo principal da regra é tornar inconstitucional qualquer


tentativa de imposição coercitiva que venha a limitar o número de filhos do casal,
sendo que a função do Poder Público, nesse caso, é orientadora e assistencial, de
forma imperativa. (MOTTA, 2019, p. 1092)
Acerca do artigo 1.565, § 2º, Sampaio (2018, p. 565) entende que:

Essa liberdade cria obrigações negativas e positivas ao Estado. Dentre estas,


a de propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício daquela
liberdade; dentre aquelas, a vedação de qualquer forma coercitiva por parte
de instituições oficiais ou privadas.

Sendo assim, verifica-se que o Estado tem o dever de ofertar informação e


acesso aos meios necessários a fim de que o casal possa evitar a procriação ou obter
os filhos que tenham planejado, desde que observados a ética e o respeito aos direitos
fundamentais, dentro da razoabilidade jurídica. (PEREIRA JÚNIOR, 2009, p. 2384)
Com o advento da Lei n. 9.263, de 12 de janeiro de 1996, o planejamento
familiar passou a ser regulamentado, de modo que a Lei o conceituou no seu artigo
2º, caput, como “o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta
direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem
ou pelo casal.”
Piovesan e Pirotta (2018, p. 491) afirmam que “essa lei é de fundamental
importância para o campo dos direitos reprodutivos e sexuais, sendo seus vinte e
cinco artigos diretamente afetos a tais direitos.”
O artigo 1º da referida Lei assegura que “o planejamento familiar é direito
de todo cidadão, observado o disposto nesta Lei.” (BRASIL, 1996)
29

Além disso, o artigo 3º considera o planejamento familiar como “parte


integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro
de uma visão de atendimento global e integral à saúde.” (BRASIL, 1996)
É importante, também, apresentar algumas anotações trazidas pelo manual
técnico de assistência em planejamento familiar no tocante à Lei n. 9.263/96, onde
consta que:

Do ponto de vista formal, essa medida democratiza o acesso aos meios de


anticoncepção ou de concepção nos serviços públicos de saúde, ao mesmo
tempo que regulamenta essas práticas na rede privada, sob o controle do
SUS. Neste sentido, o Planejamento Familiar deve ser tratado dentro do
contexto dos direitos reprodutivos, tendo, portanto, como principal objetivo
garantir às mulheres e aos homens um direito básico de cidadania, previsto
na Constituição Brasileira: o direito de ter ou não filhos/as. (BRASIL, 2002a)

Cumpre esclarecer, no entanto, que as considerações mais aprofundadas


referentes aos demais dispositivos da Lei n. 9.263/96 serão apresentadas no tópico
seguinte, de modo a alcançar uma melhor compreensão acerca do tema.
Dando prosseguimento ao segundo objeto de estudo deste tópico, passam
a ser apresentados ensinamentos referentes aos direitos reprodutivos, os quais,
segundo Ramos (2019, p. 920) “consistem no conjunto de direitos relacionados ao
exercício da capacidade reprodutiva do ser humano.”
Ainda, de acordo com Ramos (2019, p. 920), os direitos reprodutivos
abrangem:

- O direito de escolha, de forma livre e informada, sobre ter ou não ter filhos,
sobre o intervalo entre eles, sobre o número de filhos e em que momento de
suas vidas;
- O direito de acesso a receber informações e o acesso a meios, métodos e
técnicas para ter ou não ter filhos;
- O direito de exercer a reprodução, sem sofrer discriminação, temor ou
violência.

Conforme ensinam Piovesan e Pirotta (2018, p. 479), os direitos


reprodutivos compreendem:

[...] ao conjunto dos direitos básicos relacionados ao livre exercício da


sexualidade e da reprodução humana, [...] o acesso a um serviço de saúde
que assegure informação, educação e meio, tanto para o controle de
natalidade quanto para a procriação sem riscos para a saúde.
30

No capítulo VII da Conferência Internacional sobre População e


Desenvolvimento do Cairo, de 1994, os direitos reprodutivos se baseiam:

[...] no reconhecido direito básico de todo casal e de todo indivíduo de decidir


livre e responsavelmente sobre o número, o espaçamento e a oportunidade
de seus filhos e de ter a informação e os meios de assim o fazer, e o direito
de gozar do mais alto padrão de saúde sexual e de reprodução. Inclui também
seu direito de tomar decisões sobre a reprodução, livre de discriminação,
coerção ou violência, conforme expresso em documentos sobre direitos
humanos. (ONU, 1994)

Já na IV Conferência Mundial sobre a Mulher, em Pequim, 1995,


retificaram-se os termos trazidos no Cairo e avançou-se na compreensão dos direitos
reprodutivos e dos direitos sexuais como direitos humanos, além de que os direitos
sexuais foram definidos de maneira mais autônoma em relação aos direitos
reprodutivos. (BRASIL, 2005)
A Conferência de Pequim firmou no parágrafo 96 que “os direitos humanos
das mulheres incluem os seus direitos a ter controle sobre as questões relativas à sua
sexualidade, inclusive sua saúde sexual e reprodutiva, e a decidir livremente a respeito
dessas questões, livres de coerção, discriminação e violência.” (ONU, 1995)
Segundo a cartilha de direitos sexuais e direitos reprodutivos elaborada
pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2005, p. 7), na Conferência Internacional sobre
População e Desenvolvimento do Cairo e na IV Conferência Mundial Sobre a Mulher:

[...] os governos de vários países, entre os quais se inclui o Brasil, assumiram


o compromisso de basear nos direitos sexuais e nos direitos reprodutivos
todas as políticas e os programas nacionais dedicados à população e ao
desenvolvimento, inclusive os programas de planejamento familiar. Os
princípios de Cairo e Pequim opõem-se radicalmente à imposição de metas
populacionais, conceptivas e contraceptivas.

Conforme lecionam Piovesan e Pirotta (2018, p. 508), no que se refere aos


direitos reprodutivos, há um duplo papel imposto ao Estado:

De um lado, demanda políticas públicas voltadas a assegurar a toda e


qualquer pessoa um elevado padrão de saúde sexual e reprodutiva, o que
implica garantir acesso a informações, meios, recursos, dentre outras
medidas. Por outro lado, exige a omissão do Estado em área reservada à
decisão livre e responsável dos indivíduos acerca de sua vida sexual e
reprodutivas, de forma a vedar a interferência estatal, coerção, discriminação
e violência em domínio da liberdade, autonomia e privacidade do indivíduo.
31

Observa-se, portanto, que compete ao Estado assegurar o exercício de


direitos referentes ao planejamento familiar e à reprodução por meio de uma atuação
positiva e eficiente, mediante políticas públicas e leis que disciplinam o apoio e a
assistência à família e aos cidadãos, respeitando, no entanto, a autonomia dos
indivíduos.

3.3 CONCEITO DE ESTERILIZAÇÃO

Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2002b), a esterilização “é um


método contraceptivo cirúrgico, definitivo, que pode ser realizado na mulher por meio
da ligadura das trompas (laqueadura ou ligadura tubária) e no homem, através da
ligadura dos canais deferentes (vasectomia).”
Muito embora existam outros procedimentos e métodos cirúrgicos capazes
de resultar na esterilização, a Lei n. 9.263/96 permite que tal método contraceptivo
seja realizado somente por meio da laqueadura tubária ou de outro método
cientificamente aceito, sendo vedada por meio da histerectomia e ooforectomia, nos
termos do § 4º da referida lei. (BRASIL, 1996)
Portanto, de acordo com Coelho (2009, p. 203), é vedada, de modo
expresso, a extirpação do útero (histerectomia) ou dos ovários (ooforectomia).
No tocante à esterilização feminina, Molina (1999) explica que se trata de:

[...] um procedimento médico (cirúrgico, químico ou radioativo) que termina


com a possibilidade de fertilização, por intermédio de alterações anatômicas
ou funcionais em qualquer parte do sistema reprodutivo da mulher. A técnica
mais comum de esterilização é a laqueadura tubária, ou esterilização tubária,
que envolve o bloqueio das trompas de Falópio. Este bloqueio geralmente é
conseguido pela oclusão das tubas com ligaduras (pontos), clips, anéis ou
eletrocoagulação.

No Manual Global para Prestadores de Serviços de Saúde desenvolvido


pela Organização Mundial da Saúde, consta que há duas abordagens cirúrgicas
utilizadas com maior frequência, sendo elas:

- A minilaparotomia envolve a realização de uma pequena incisão no


abdômen. As trompas de falópio são trazidas até a incisão para serem
cortadas ou bloqueadas.
- A laparoscopia envolve a introdução de um tubo longo e fino com lentes no
abdômen por meio de uma pequena incisão. Este laparoscópio permite que
o médico observe e bloqueie ou corte as trompas de falópio no abdômen.
(OMS; JOHNS HOPKINS; USAID, 2007, p. 165)
32

O mesmo Manual apresenta ainda a informação de que o procedimento é


realizado “através do corte ou bloqueio das trompas de falópio. Os óvulos liberados
pelos ovários não conseguem se deslocar pelas trompas e, por este motivo, não
encontram o espermatozoide.” (OMS; JOHNS HOPKINS; USAID, 2007, p. 165)
A esterilização masculina, por sua vez, se trata de “um procedimento
cirúrgico que impede o homem de ter filhos. A cirurgia interrompe a circulação dos
espermatozoides produzidos pelos testículos e conduzidos para os canais que
desembocam na uretra, impedindo a gravidez.” (BRASIL, 2009)
Quanto à técnica de realização do procedimento da vasectomia, o médico
procederá aplicando:

[...] uma anestesia local e retira um fragmento de cada um dos dois canais
que levam os espermatozoides dos testículos ao pênis. O procedimento leva
de 15 a 20 minutos e não há necessidade de internação hospitalar, podendo
ser realizada no próprio consultório médico. (BRASIL, 2009)

Acerca do mesmo procedimento, o Manual da Organização Mundial da


Saúde explica o como a operação cirúrgica é realizada. Veja-se:

Através de uma punctura ou pequena incisão no escroto, o profissional


localiza cada um dos 2 tubos por onde o esperma é transportado até o pênis
(vaso deferente) e corta e bloqueia o mesmo, cortando e amarrando-o de
modo a fecha-lo ou aplicando calor ou eletricidade (cautério). (OMS; JOHNS
HOPKINS; USAID, 2007, p. 183)

Portanto, verifica-se que o procedimento no homem consiste em impedir a


presença dos espermatozoides no ejaculado, por meio da obstrução dos canais
deferentes, e na mulher em evitar a fecundação mediante impedimento de encontro
dos gametas, devido à obstrução das trompas. (BRASIL, 2002b)
Após trazidas informações pertinentes acerca dos procedimentos
cirúrgicos de esterilização permitidos e vedados pela legislação brasileira, serão
tratados, na sequência, as demais regras impostas pela Lei do Planejamento Familiar
n. 9.623/96 para a realização dessa intervenção cirúrgica.
33

3.4 A ESTERILIZAÇÃO VOLUNTÁRIA NA LEI N. 9.263/96

Consoante o entendimento de Coelho (2009, p. 203), a esterilização


voluntária é uma forma do indivíduo exercer o direito sobre seu próprio corpo, além
de que:

A ordem jurídica reconhece como legítimo o interesse de a pessoa tratar


separadamente, em seu corpo, duas dimensões da função sexual: a
reprodução da espécie e o prazer; especificamente, o interesse de tratar
separadamente essas dimensões com o objetivo de neutralizar a primeira e
otimizar a outra. Quem deseja usufruir o prazer sexual sem correr o risco de
procriar pode submeter-se a procedimentos cirúrgicos de esterilização.

Com o advento da Lei do Planejamento Familiar, passaram a ser inseridas


práticas da laqueadura de trompas e da vasectomia como alternativas de
anticoncepção, definindo critérios para sua utilização e sanções aos profissionais de
saúde que as realizarem de maneira inadequada e/ou insegura. (BRASIL, 2002a)
Dessa forma, serão apresentadas nos tópicos seguintes as exigências
instituídas pela Lei do Planejamento Familiar n. 9.263/1996 que limitam e regulam o
procedimento cirúrgico de esterilização voluntária no Brasil, dando ênfase, por fim, ao
tópico que trata da exigência do consentimento do cônjuge.

3.4.1 Esterilização Voluntária e Situações Permitidas pela Lei N. 9.263/96

Segundo leciona Coelho (2009, p. 203), “a exemplo das demais normas


atinentes ao direito sobre o corpo, também se restringem legalmente as hipóteses em
que a esterilização voluntária está permitida.”
Diante disso, a Lei do Planejamento Familiar n. 9.263/96 elencou no artigo
10 uma série de requisitos que devem ser atendidos para que o procedimento da
esterilização voluntária seja devidamente realizado no indivíduo interessado, tratando
nos incisos I e II, in verbis:

Art. 10. Somente é permitida a esterilização voluntária nas seguintes


situações:
I - em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte e
cinco anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que
observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade
e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa interessada
acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo aconselhamento por
equipe multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização precoce;
34

II - risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, testemunhado


em relatório escrito e assinado por dois médicos. (BRASIL, 1996)

Uma vez que o inciso supracitado faz menção à capacidade civil plena de
homens e mulher como requisito para que se submetam à esterilização voluntária,
demonstra-se necessário tecer breves esclarecimentos acerca do tema.
Em regra, o artigo 1º do Código Civil de 2002 estabelece que “toda pessoa
é capaz de direitos e deveres na ordem civil”. Contudo, encontram-se disciplinadas
nos artigos 3º e 4º do mesmo diploma legal as exceções relativas à capacidade civil
dos indivíduos, in verbis:

Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da


vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.
Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir
sua vontade;
IV - os pródigos.
[...] (BRASIL, 2002c)

Logo, não sendo verificadas as caraterísticas acima apresentadas, o


indivíduo considerado plenamente capaz de exercer os atos da vida civil estará apto
a se submeter à cirurgia de esterilização voluntária, desde que preenchidos os demais
requisitos previstos na lei.
De acordo com o inciso I do artigo 10, exige-se ainda que a pessoa
interessada tenha mais de 25 (vinte e cinco) anos de idade ou possua, pelo menos,
dois filhos vivos. (BRASIL, 1996)
Portanto, segundo Coelho (2009, p. 204):

[...] atendida uma ou outra dessas condições, ela já pode sopesar


convenientemente seu interesse na neutralização da função sexual de
procriação”, desde que seja observado o prazo de 60 (sessenta) dias entre a
manifestação da vontade e o ato cirúrgico.

Quanto ao disposto no inciso II do artigo 10, Bottega (2007, p. 53) ensina


que se trata da esterilização terapêutica, onde há recomendação médica, e esta “[...]
somente poderá ser realizada quando apresente risco de vida à mulher ou risco de
vida ao futuro concepto.”
Referente ao disposto no § 1º do artigo 10, Coelho (2009, p. 204)
compreende que:
35

[...] a vontade de se tornar infértil deve ser manifestada por escrito, após a
pessoa interessada ser devidamente informada a respeito dos riscos da
cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldades de sua reversão e opções
de métodos contraceptivos reversíveis.

Ainda, segundo o autor, é especialmente importante o amadurecimento da


decisão, considerando-se os seus desdobramentos psicológicos e sociais, bem como
a impossibilidade de reverter o resultado da esterilização dos procedimentos
utilizados. (COELHO, 2009)
Por fim, o § 6º da referida Lei determina que a esterilização cirúrgica em
pessoas absolutamente incapazes somente poderá ser realizada mediante
autorização judicial, regulamentada na forma da Lei.
Assim, verificadas imposições legais no que se refere à idade do
interessado, ao número de filhos e, ainda, ao método cirúrgico utilizado para que se
concretize a esterilização, passa-se a verificar as vedações expressas na Lei do
Planejamento Familiar.

3.4.2 Esterilização Voluntária e Vedações Expressas Na Lei N. 9.263/96

O parágrafo único do artigo 2º da Lei n. 9.263/96 veda expressamente a


utilização das ações a que se refere o caput para qualquer tipo de controle
demográfico. (BRASIL, 1996)
Para Piovesan e Pirotta (2018, p. 491), essa proibição “vem de encontro à
posição mais moderna sobre o tema, visto que as políticas visando ao estímulo do
aumento ou diminuição da natalidade têm sido consideradas dissonantes com os
princípios democráticos.”
No tocante à manifestação de vontade do indivíduo interessado na
esterilização voluntária, dispõe o parágrafo § 3º do artigo 10 que:

Art. 10, § 3º Não será considerada a manifestação de vontade, na forma do


§ 1º, expressa durante ocorrência de alterações na capacidade de
discernimento por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados
ou incapacidade mental temporária ou permanente.
36

Nos exatos termos do § 2º do artigo 10, a Lei veda “a esterilização cirúrgica


em mulher durante os períodos de parto ou aborto, exceto nos casos de comprovada
necessidade, por cesarianas sucessivas anteriores.” (BRASIL, 1996)
Essa disposição trazida pela lei, segundo o entendimento de Piovesan e
Pirotta (2018, p. 493):

[...] revela o intuito do legislador de dissociar a prática da esterilização da


realização de cesariana por ocasião do parto e de preservar o livre
consentimento da mulher com relação à esterilização, que poderia sofrer
pressões psicológicas advindas da situação enfrentada.

Como já tratado no tópico anterior, o disposto no artigo 10, § 4º traz que “a


esterilização cirúrgica como método contraceptivo somente será executada através
da laqueadura tubária, vasectomia ou de outro método cientificamente aceito, sendo
vedada através da histerectomia e ooforectomia.”
Diante disso, Bottega (2007, p. 53) ensina que é:

[...] vedada a retirada do útero e dos ovários para atender ao fim de impedir
a gravidez, uma vez que tais procedimentos são entendidos como violadores
da integridade física da mulher, vez que é procedimentos menos invasivos
para se atingir o mesmo objetivo; isso ainda, sem ressaltar as questões
biológicas que envolvem a retirada do útero ou dos ovários no que tange à
famosa reposição hormonal.

A Lei 9.263/96 nos artigos 12 e 13 veda, ainda, a indução ou instigamento


individual ou coletivo à prática da esterilização cirúrgica e a exigência de atestado de
esterilização ou de teste de gravidez para quaisquer fins. (BRASIL, 1996)

3.4.3 Consentimento Expresso Dos Cônjuges Na Lei N. 9.263/96 Para A


Esterilização Voluntária

Além dos demais critérios estabelecidos pela Lei do Planejamento Familiar


como condição para realizar o procedimento da esterilização voluntária, encontra-se
no artigo 10, §5º da Lei do Planejamento Familiar a exigência de que “na vigência de
sociedade conjugal, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os
cônjuges.” (BRASIL, 1996)
37

Isso significa que a pessoa interessada em se submeter à esterilização


voluntária deverá obter o consentimento expresso de seu cônjuge, caso contrário, não
poderá realizar o procedimento. (BRASIL, 1996)
A Lei também traz penalidades aplicáveis àquele que agem em desacordo
com as determinações do art. 10, de modo que se configura crime a conduta prevista
no art. 15 da Lei 9.263/96, in verbis: “realizar esterilização cirúrgica em desacordo com
o estabelecido no art. 10 desta Lei. Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, se
a prática não constitui crime mais grave.” (BRASIL, 1996)
Acerca da exigência do consentimento do cônjuge para a realização do
procedimento da esterilização voluntária, pela dicção do art. 10, § 5º da Lei n.
9.263/96, Dias (2016, p. 172) compreende que:

[...] é exigida a concordância expressa de um dos cônjuges para o outro


submeter-se a procedimento de esterilização (art. 10 § 5.º). Porém, não há a
mesma exigência na união estável. De qualquer modo, nada justifica limitar a
liberdade da mulher de escolher a extensão de sua prole, mesmo estando
casada.

No mesmo sentido, segundo o entendimento de Moraes e Teixeira (2018,


p. 2222), a Lei n. 9.263/96, criada visando regular o planejamento familiar, parece ter
ido além do poder incumbido ao Estado na circunstância.
Os autores explicam que:

A lei tem o grave defeito da excessiva ingerência na vida pessoal, ao criar


parâmetros para o exercício do direito ao planejamento familiar que em muito
ultrapassam o papel ativo do Estado, como estabelecido pelo §7º do art. 226
da Constituição. Exemplo disto é a exigência de consentimento expresso do
cônjuge para que haja esterilização do outro, caso se dê na constância do
casamento, segundo dispõe o §5º do art. 10 da referida lei, em flagrante
limitação ao direito à disposição do próprio corpo. (MORAES; TEIXEIRA,
2018, p. 2222)

Da mesma forma, Bottega (2007, p. 53) ensina que “[...] a lei valoriza as
decisões do casal, entretanto, como sabemos, esse requisito em verdade condiciona
os atos de disposição sobre o próprio corpo, colocando a necessidade de um terceiro
intervir para a tomada da decisão.”
Verifica-se, portanto, que muito embora a Lei do Planejamento Familiar
tenha apresentado uma série de requisitos para que a esterilização cirúrgica seja
38

devidamente realizada, há de serem observados, no entanto, os princípios da


dignidade da pessoa humana e a paternidade responsável.
39

4 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DIREITO


FUNDAMENTAL À LIBERDADE: A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA
EXIGÊNCIA DO CONSENTIMENTO DO CÔNJUGE PARA A ESTERILIZAÇÃO
VOLUNTÁRIA

O presente capítulo apresentará o Projeto de Lei da Câmara dos


Deputados n. 209 de 1991, convertido na Lei n. 9.263/96, bem como trará, em síntese,
as razões levantadas na peça inicial das Ações Diretas de Inconstitucionalidade n.
5.097 e n. 5.911, que argumentam em face de dispositivos da Lei do Planejamento
Familiar.
Importante esclarecer que, até o presente momento, as referidas ADIs se
encontram em tramitação no Superior Tribunal Federal, aguardando julgamento.
Além disso, serão demonstrados os Projetos de Lei n. 406/2018 e n.
1.803/2019, que tramitam no Senado Federal e na Câmara dos Deputados,
respectivamente.

4.1 PROJETO DE LEI DA CÂMARA DOS DEPUTADOS N. 209, DE 06 DE MARÇO


DE 1991, CONVERTIDO NA LEI N. 9.263/96

A Lei Ordinária n. 9.263/96 teve como origem o Projeto de Lei n. 209


apresentado na Câmara dos Deputados em 06 de março de 1991, de autoria do então
Deputado Federal Eduardo Jorge Martins Alves Sobrinho, do Partido dos
Trabalhadores.
Consta na ementa original do Projeto de Lei o seguinte: “estabelece normas
e condições para o exercício dos direitos referentes à saúde reprodutiva e coíbe o
atual processo de esterilização indiscriminada da população brasileira e determina
outras providências.” (BRASIL, 1991)
Verifica-se pela justificativa apresentada pelo Deputado Federal a
preocupação com a regulamentação da fertilidade, que se encontra no âmbito da
saúde reprodutiva. O deputado explica que:

O tema regulação de fertilidade é assunto focalizado na Constituição


Brasileira, no parágrafo 7º do artigo 226, do Capítulo da Família, de Criança,
do Adolescente e do Idoso, bem como vem sendo objeto de polêmica nos
espaços do Governo, do Congresso e da Sociedade, no País, desde meados
dos anos 60. A proposta aqui defendida procura preencher esse vazio legal
40

e percebe a regulação da fertilidade como um direito das pessoas, direito este


que envolve a constituição da prole, sua limitação ou aumento. (BRASIL,
1991)

O Projeto de Lei contava inicialmente com apenas 13 artigos, dentre os


quais não se incluía a condição da anuência do cônjuge para que a esterilização
voluntária fosse realizada. (BRASIL, 1991)
No artigo 1º do projeto já se encontrava assegurado a todas as pessoas o
direito ao exercício pleno da regulação da fertilidade, nos termos dessa lei. Além disso,
no mesmo artigo, eram garantidos direitos iguais de constituição, limitação ou
aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal, no que se refere à
regulação da fertilidade. (BRASIL, 1991)
O artigo 2º do PL 209/1991 determinava o dever do Estado, por meio do
Sistema Único de Saúde, de prover condições e recursos informativos, educacionais,
técnicos e científicos, que assegurem o livre exercício da regulação da fertilidade, para
ambos os sexos. Seus incisos I, II e parágrafo único tinha a seguinte redação:

I - Disponibilidade aos interessados de informações técnicas fidedignas e


orientações médicas eficientes, isentas de caráter propagandístico, relativas
aos vários aspectos da regulação da fertilidade;
II – Acesso igualitário e gratuito aos serviços de saúde da rede pública direta
e indireta para fins de assistência medica à esterelidade e a regulação da
fertilidade, incluindo informações sobre os riscos e contra-indicações de cada
procedimento.
Parágrafo Único – O serviço de assistência à concepção, bem como à
limitação da natalidade, devem ser oferecidos juntamente com as demais
ações de saúde à mulher, ao homem e ao casal, numa visão integral de
atendimento à saúde. (BRASIL, 1991)

Percebe-se que há correspondência entre o art. 3º do projeto e o art. 10, §


4º da Lei do Planejamento Familiar, uma vez que ambos asseguram a realização da
esterilização voluntária somente por meio laqueadura tubária, vasectomia ou de outro
método cientificamente aceito, não sendo permitida a esterilização por histerectomia.
(BRASIL, 1991)
A Lei n. 9.263/96, por sua vez, complementou a norma no sentido de vedar
também a realização do procedimento por meio da ooforectomia, nos termos do seu
art. 10, § 4º.
Quanto ao requisito da idade mínima para que o procedimento cirúrgico
fosse executado, o Projeto de Lei n. 209/91 previa que somente poderia ser submetido
41

à esterilização voluntária homens e mulheres com idade superior a 30 anos, idade


reduzida posteriormente para 25 anos. (BRASIL, 1991)
O prazo entre a manifestação da vontade e a o ato cirúrgico, diferente dos
60 dias estipulados atualmente pela Lei do Planejamento Familiar, era previsto pelo
PL como no mínimo de 6 meses, assegurado ao indivíduo interessado “acesso aos
serviços de regulação da fertilidade incluindo aconse1hamento por equipe
multidisciplinar, visando desencorajar a prática da esterilização precoce.” (BRASIL,
1991)
O projeto inicial previa, ainda, que a pessoa interessada na esterilização:

[...] deve ser perfeitamente informada dos riscos da cirurgia, das dificuldades
da sua reversão e das opções de contracepção reversíveis, legais, existentes
no Brasil, registrando expressa manifestação de vontade, em documento
escrito e devidamente firmado. (BRASIL, 1991)

Há correspondência, também, entre o art. 7º do projeto e o art. 13 da Lei n.


9.263/96. Muito embora tenha havido alteração na redação do artigo, ambos
determinam a vedação à exigência de atestado de esterilização para quaisquer fins.
(BRASIL, 1991)
Após serem incorporadas emendas ao Projeto de Lei inicialmente
apresentado e seguido em tramitação no Senado Federal sob o número 114/1994, a
Lei do Planejamento Familiar teve seus artigos. 10, 11, 14, parágrafo único, e 15
vetados pelo então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso.
No entanto, em 1997, segundo Piovesan e Pirotta (2018, p.491), “tais vetos
foram afastados, retornando à lei os dispositivos referentes à esterilização cirúrgica
do homem e da mulher, que constituem sua maior inovação.”
Desse modo, tendo a Lei n. 9.263/96 entrado em vigor no dia 12 de março
de 1996, foi ajuizada em 2014, no Supremo Tribunal Federal, a primeira Ação Direta
de Inconstitucionalidade tratando do tema, conforme traz-se na sequência.

4.2 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 5097, DE 13 DE MARÇO


DE 2014

A Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.097 foi ajuizada pela


Associação Nacional de Defensores Públicos (ANADEP), em março de 2014, no
Supremo Tribunal Federal, tendo por objeto o parágrafo 5º, do artigo 10, da Lei do
42

Planejamento Familiar, que estabelece como condição para a esterilização voluntária


o consentimento do cônjuge. (BRASIL, 2014)
A ANADEP sustenta na demanda que muito embora o legislador, ao
disciplinar a matéria, tenha buscado evitar a esterilização precoce, “indiretamente,
acabou também por desestimular tal prática, o que vai de encontro ao artigo 226, §7º,
da CF/88 e aos documentos internacionais de direitos humanos.” (BRASIL, 2014)
A autora do pleito alega que a exigência do consentimento do cônjuge “[...]
vai de encontro à liberdade de escolha e de disposição do próprio corpo, à autonomia
privada e à dignidade humana (artigo 1º, III, e artigo 5º, caput, da Constituição Federal,
bem como ao conteúdo do artigo 226, §7º da nossa Constituição.)” (BRASIL, 2014)
No mesmo sentido, alegou que:

Não deve o Estado estimular ou desestimular condutas relativas ao exercício


do direito ao planejamento reprodutivo; cabe a ele, tão somente, proporcionar
ao indivíduo os recursos educacionais e de saúde para que tal direito possa
ser adequadamente exercido. Da mesma maneira, será indevida qualquer
ingerência de outro individuo sobre o exercício do direito ao planejamento
reprodutivo. (BRASIL, 2014)

Segundo a ANADEP, tal assertiva é corroborada pelo art. 7º, inciso III, da
Lei n. 11.340/2006 - Lei Maria da Penha - o qual prevê, in verbis:

Art. 7º. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre
outras:
[...]
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio,
à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem,
suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos
sexuais e reprodutivos. (BRASIL, 2006, grifo do autor)

No tocante à exigência do consentimento do cônjuge para realizar a


esterilização, a ANADEP aduz que “condicionar a realização da cirurgia [...] à anuência
de terceiro (no caso, do cônjuge) constitui ato atentatório à autonomia corporal e ao
direito ao planejamento reprodutivo, constitucionalmente assegurado pelo artigo 226,
§ 7º da Constituição Federal.” (BRASIL, 2014)
Por fim, pela ANADEP foi apresentado o argumento de que “o atual modelo
de família não mais guarda compatibilidade com a necessidade de procriação, nem
43

com a indevida ingerência entre seus membros, no sentido de limitar a plena garantia
da liberdade, da igualdade, da dignidade e da busca da felicidade.” (BRASIL, 2014)
Ademais, cumpre ressaltar que, a Procuradoria Geral da República, por
meio de seu então representante, Rodrigo Janot Monteiro de Barros, se manifestou
no mérito pela procedência do pedido, sob o argumento de que não cabe ao Estado
de Direito impor restrições à autodeterminação da pessoa em seu aspecto mais
essencial, qual seja, a liberdade de dispor do próprio corpo, sob pena de afastar-se
de seu centro de identidade. (BRASIL, 2014)
A PGR sustenta que a exigência do consentimento do cônjuge para a
esterilização voluntária de pessoa maior e capaz viola o princípio da dignidade do ser
humano e o direito à liberdade e à autonomia privada. (BRASIL, 2014)
Acerca das consequências da decisão do indivíduo se tornar estéril sem o
consentimento do cônjuge, a PGR afirma que “se é certo que pode frustrar um deles
a decisão do outro de fazer-se esterilizar, será possivelmente muito mais negativa nas
consequências a imposição de gravidez indesejada, tanto para o pai ou mãe quanto,
em muitos casos, sobretudo, para a criança.” (BRASIL, 2014)
No mesmo sentido, aduziu no sentido de que a Constituição Federal impõe
ao Estado o dever de desenvolver instrumentos que priorizem as manifestações de
vontade daqueles que formem núcleo familiar. Dessa forma:

[...] não lhe cabe tolher ou rechaçar escolhas legítimas feitas pelos indivíduos
capazes, como seres autodeterminantes que são, sob propósito de res
guardar a família (até porque o próprio art. 2º, parágrafo único, da lei prevê
as ações ali previstas não podem ser empregadas para controle
demográfico). (BRASIL, 2014)

Por fim, a PGR argumenta que “o exercício da liberdade e da


disponibilidade física do corpo do indivíduo não deve depender de consentimento de
terceiros, sob pena de ser, sem justificativa legítima, severamente debilitado.”
(BRASIL, 2014)
Uma vez apresentados os argumentos pelos quais a Ação Direta de
Inconstitucionalidade n. 5.097 de 2014 se fundamenta, bem como trechos do parecer
emitido pela Procuradoria Geral da República, na sequência verificar-se-á a ADI n.
5.911 de 2018.
44

4.3 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N 5.911, DE 08 DE MARÇO


DE 2018

Ajuizada em março de 2018 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), a ADI


n. 5.911, por sua vez, pleiteia no Supremo Tribunal Federal a declaração da
inconstitucionalidade parcial do inciso I e integral do parágrafo 5º, ambos do art. 10 da
Lei do Planejamento Familiar. (BRASIL, 2018)
Veja-se que além de questionar o objeto da ADI 5097, que trata do §5º do
artigo 10 da Lei n. 9.263/96, a ação proposta pelo Partido Socialista Brasileiro
compreende também o inciso I da referida lei.
Dessa forma, são questionados os dispositivos que tratam das imposições
de idade superior a 25 anos ou a existência de dois filhos vivos e do consentimento
expresso de ambos os cônjuges para a realização da esterilização cirúrgica.
O PSB, por meio da ADI n. 5.911, busca demonstrar que os dispositivos
em questão afrontam direitos fundamentais, contrariam tratados internacionais
firmados pelo Brasil, além de divergir dos principais ordenamentos jurídicos
estrangeiros. (BRASIL, 2018)
No tocante à autorização expressa de ambos os cônjuges, a parte autora
argumenta no sentido de que “a autonomia da vontade individual, reflexo direto da
dignidade da pessoa humana, pressupõe que decisões personalíssimas, tais quais as
que envolvem direitos reprodutivos, não podem sujeitar-se à anuência de terceiros,
nem mesmo de um cônjuge.” (BRASIL, 2018)
Acerca do mesmo dispositivo, o PSB sustenta que há uma manifesta
contradição entre o parágrafo 5º do art. 10 e o ordenamento jurídico. Isso porque, ao
estabelecer tal restrição, o dispositivo representa verdadeira violação da Lei n.
11.340/06, cuja preocupação era a de resguardar a autonomia e a liberdade da mulher
no que se refere aos seus direitos reprodutivos. (BRASIL, 2018)
No mesmo sentido, a parte requerente apresentou argumentos que versam
sobre o art. 7, inciso III, da Lei Maria da Penha, o qual estabelece o ato de impedir a
mulher de usar qualquer método contraceptivo como forma de violência sexual contra
a mulher (BRASIL, 2006). Veja-se:

O dispositivo foi certamente um grande passo no sentido de se reconhecer à


mulher a liberdade de exercitar seus direitos sexuais e reprodutivos, cujo
âmbito de proteção comporta a opção por não ter filhos, bem como de
45

exercitar sua sexualidade sem a possibilidade da gravidez indesejada. Ora,


como pode então o ordenamento jurídico reconhecer que o impedimento ao
uso de método contraceptivo é uma violência contra a mulher e, ao mesmo
tempo, exigir que a mulher obtenha do cônjuge a concordância à realização
de procedimento de laqueadura? (BRASIL, 2018)

A partir de uma análise do direito comparado, a parte autora argumentou


que as legislações de países como Argentina, Chile, Uruguai e Portugal não adotam
os critérios questionados para a realização da esterilização voluntária, de modo que
essas imposições trazidas pela legislação brasileira não encontram nenhum paralelo
nas legislações de países de cultura muito próxima à brasileira. (BRASIL, 2018)
Especificamente em relação à exigência da idade mínima de 25 anos,
dentre outros argumentos, o PSB alega que tal requisito revela “verdadeira
incongruência com nosso sistema jurídico, uma vez que o art. 5º do Código Civil
estabelece que a menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa
fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.” (BRASIL, 2002c)
Tendo em vista o disposto no art. 42 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, o qual dispõe que “podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos,
independentemente do estado civil.” (BRASIL, 1990), a parte autora sustenta que:

[...] não se pode vislumbrar que a opção de um indivíduo por adotar seja de
importância e gravidade menores que a opção de não se ter filhos em vista
dos mesmos deveres e responsabilidades que surgem para o adotante. [...]
Dessa forma, evidencia-se que, ao submeter os cidadãos que não desejam
ter filhos ao uso de outros métodos contraceptivos, notadamente as pílulas
anticoncepcionais, a norma questionada acaba por prejudicar o direito
fundamental à saúde, insculpido no art. 6º da Constituição Federal. (BRASIL,
2018)

Por fim, a requerente conclui que ambos os dispositivos questionados


vulneram o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), a liberdade
individual e o direito à autonomia privada (art. 5º, caput, CF).

4.4 PROJETO DE LEI N. 406, DE 10 OUTUBRO DE 2018, NO SENADO FEDERAL

O Projeto de Lei n. 406/2018, de autoria de Ione Guimarães, senadora do


Partido Trabalhista Brasileiro eleita pelo estado de Goiás, tem por objetivo:

[...] desburocratizar o oferecimento da esterilização voluntária e facilitar a


realização do procedimento nos serviços de saúde, removendo todos os
46

empecilhos que impedem as usuárias do SUS de se submeterem à


laqueadura tubária quando assim o desejarem.” (BRASIL, 2018)

A proposta, além de alterar dois dispositivos da Lei do Planejamento


Familiar, também revoga os artigos 10, 11, 16 e o parágrafo único do art. 14, uma vez
que se tratam de “exigências que desencorajam a opção pela esterilização cirúrgica
como método contraceptivo e impõem dificuldades para a realização do procedimento
nos serviços de saúde.” (BRASIL, 2018)
Os artigos que o projeto pretende revogar tratam, dentre outras exigências
e vedações, da condição do interessado à esterilização voluntária ter 25 anos ou pelo
menos dois filhos vivos, o prazo de 60 dias entre a manifestação da vontade e a
realização do procedimento, a vedação à cirurgia na mulher durante períodos de parto
ou aborto e também o consentimento do cônjuge para tanto.
Ione Guimarães apresenta na justificação do seu projeto diversas razões
pelas quais as alterações se fundamentam e são consideradas relevantes para a
população.
Para a autora do projeto, em que pese a esterilização cirúrgica consista na
opção mais segura para as mulheres que já tiveram os filhos que desejam, “a Lei do
Planejamento Familiar criou inúmeros obstáculos e antepôs significativas dificuldades
à realização do procedimento de laqueadura nos serviços do SUS.” (BRASIL, 2018)
No tocante ao requisito da pessoa ter 25 anos ou dois filhos vivos, a
senadora defende que tal imposição não faz mais sentido nos dias de hoje. Esclarece
que “ao atingir sua capacidade civil plena, homens e mulheres deveriam ter o direito
de optar por nunca ter filhos, caso não os desejem.” (BRASIL, 2018)
A autora do projeto compreende que o prazo de 60 dias estipulado pela Lei
do Planejamento Familiar obriga a mulher a se submeter a:

[...] uma fila interminável de consultas com diferentes profissionais –


ginecologista, psicólogo, assistente social – e a aguardar pelo menos
sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período em
que, não raro, ela acaba engravidando novamente. (BRASIL, 2018)

Ela cita também, como exemplo, a vedação que a Lei estabelece à


realização do procedimento de esterilização da mulher durante os períodos de parto
ou aborto. Explica, dessa forma, que:
47

Isso obriga a paciente a passar por duas internações, uma para o parto e
outra para a esterilização, o que aumenta sua exposição ao ambiente
hospitalar e às infecções hospitalares, força a lactante a abandonar o
acompanhamento do bebê e acarreta maiores custos para os serviços de
saúde. (BRASIL, 2018)

Com a revogação dos artigos supracitados, o projeto extingue também a


necessidade de haver consentimento do cônjuge para que a pessoa interessada seja
submetida à esterilização voluntária. (BRASIL, 2018)
Na análise de Ione Guimarães, a exigência do consentimento do cônjuge
para que seja realizado tal procedimento cirúrgico “é descabida, porque desrespeita a
autonomia da vontade individual e o princípio da dignidade humana, a qual pressupõe
que as decisões pessoais, inclusive sobre os direitos reprodutivos, não se podem
sujeitar à vontade de terceiros”. (BRASIL, 2018)
A senadora ressalta que a referida exigência estabelecida pela Lei n.
9.263/96:

[...] prejudica as conquistas sexuais e reprodutivas da mulher brasileira e


configura um atraso da nossa lei em comparação com as normas vigentes
em outras partes do mundo: a grande maioria dos países dispensa qualquer
consentimento adicional àquele fornecido pelo próprio indivíduo.

O Projeto de Lei n. 406/2018 atualmente encontra-se em tramitação no


Senado Federal, assim como o PL n. 291/2018 e o PL n. 107/2018, que da mesma
forma buscam a revogação do consentimento do cônjuge como requisito para a
realização da esterilização voluntária. Dessa forma, passa-se a ser abordado, na
sequência, o Projeto de Lei n. 1.803/2019 que tramita na Câmara dos Deputados.

4.5 PROJETO DE LEI DA CÂMARA DOS DEPUTADOS N. 1.803, DE 27 DE


MARÇO DE 2019

O Projeto de Lei n. 1.803 foi apresentado pelo Deputado Federal Rogério


Teixeira Júnior, do Partido Democratas, em março de 2019, e trata, da vedação à
obrigatoriedade do consenso do cônjuge para realizar a esterilização. (BRASIL, 2019)
Diferente de alguns outros Projetos de Lei que se encontram em tramitação
no Congresso Nacional, o projeto apresentado pelo Deputado do DEM pretende, tão
somente, extinguir a exigência do consentimento do cônjuge para a esterilização
48

voluntária, que se encontra estabelecida pelo art. 10, § 5º da Lei do Planejamento


Familiar. (BRASIL, 2019)
No seu Projeto de Lei, além de revogar o disposto no art. 10, § 5º da Lei
9.263/96, o Deputado pretende alterá-lo de modo que passe a vigorar a vedação
expressa ao consentimento do cônjuge para a realização do procedimento. (BRASIL,
2019)
Dessa forma, segundo o Projeto de Lei n. 1.803/2019, o art. 10, § 5º da Lei
do Planejamento Familiar passaria a vigorar com a seguinte redação: “a esterilização
independe de consentimento do cônjuge.” (BRASIL, 2019)
Consta na justificativa do projeto, inicialmente, que a compreensão de
planejamento familiar não se restringe à procriação. Isso porque “planejar os aspectos
referentes à família envolve resoluções como a decisão por uma descendência, ter ou
não filhos, quantos gerar, definir a diferença de idade entre eles, a programação
econômica relacionada à criação e à educação deles.” (BRASIL, 2019)
O autor do projeto menciona um levantamento realizado pela Organização
Mundial da Saúde que trata do benefício dos métodos contraceptivos, segundo o qual:

A disponibilização poderia prevenir, no Brasil, 54 milhões de gravidezes


indesejadas, 26 milhões de abortos, dos quais cerca de 61% inseguros, e 7
milhões de abortos espontâneos. Além disso, possibilitaria a prevenção de
79 mil mortes maternas e 1,1 milhão de mortes infantis por ano. (BRASIL,
2019)

Para o Deputado Federal, “a esterilização voluntária é decisão individual


para anular a capacidade reprodutora, seja por opção, seja por orientação médica.”
(BRASIL, 2019)
O autor do projeto também aponta o parecer do então procurador-geral da
república Rodrigo Janot na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.097, onde afirma
que “essa concordância usurpa o direito de dispor do próprio corpo, sendo, portanto,
a esterilização voluntária vontade única daquele que se submete ao procedimento
cirúrgico.” (BRASIL, 2019)
O Deputado completou ainda que “essas exigências afrontam direitos
fundamentais, contrariam tratados internacionais firmados pelo Brasil, além de
divergirem dos principais ordenamentos jurídicos estrangeiros.” (BRASIL, 2019)
Por fim, cabe mencionar que se encontram em trâmite outros Projetos de
Lei na Câmara dos Deputados objetivando a extinção do disposto no § 5º, do artigo
49

10, da Lei do Planejamento Familiar, tais como o PL n. 313/2007, o PL n. 3637/2012,


o PL n. 4909/2016 e o PL n. 3233/2015.
Logo, observa-se que se trata de uma discussão atual que vai ao encontro
das mudanças sociais ocorridas desde a vigência da Lei n. 9.263/96, sendo
fundamental, portanto, que o legislador e o Poder Judiciário se manifestem sobre a
manutenção das condições previstas na Lei para a esterilização voluntária.
50

5 CONCLUSÃO

O presente trabalho propôs-se a confrontar o texto normativo da Lei n.


9.263/96, concernente ao Planejamento Familiar, com princípios constitucionais,
sobretudo com a dignidade da pessoa humana e com a liberdade.
A Constituição Federal adotou o princípio da dignidade da pessoa humana
como um dos fundamentos da República, de modo que se considera inconstitucional
a aplicação e edição de normas que visem ferir tal princípio.
Com o advento da Lei n. 9.263/96, o Planejamento Familiar, que antes era
apenas assegurado por força do art. 226, § 7º da Constituição Federal, passou a ser
regulamentado de forma minuciosa.
Conforme demonstrado, além da Constituição Federal e da Lei n. 9.263/96,
documentos internacionais de direitos humanos também disciplinam os direitos
reprodutivos e o planejamento familiar, de modo que asseguram o direito dos
indivíduos de tomar decisões sobre a reprodução, livre de discriminação, coerção ou
violência.
Ainda que o Estado tenha a obrigação de esclarecer a sociedade quanto
às consequências referentes à irreversibilidade do procedimento, tem-se que este não
deve interferir na decisão final do indivíduo, eis que se trata de sua única e exclusiva
decisão o exercício do seu direito à liberdade e à autonomia.
Apesar de demonstrarem-se controversas algumas das exigências
definidas pela Lei do Planejamento Familiar, conforme argumentos apresentados na
ADI 5911 e PL 406/2018, o presente trabalho se limitou a tratar especificamente a
(in)constitucionalidade do consentimento do cônjuge.
Desse modo, verifica-se que, ao estabelecer o consentimento do cônjuge
para a esterilização voluntária, a Lei do Planejamento Familiar condicionou à vontade
de outrem a possibilidade de exercer ou não um direito reprodutivo.
Importa destacar a relevância de discutir-se a constitucionalidade da
exigência do consentimento do cônjuge para a esterilização, uma vez que se trata de
legislação infraconstitucional, e esta deverá sempre observar os princípios e
disposições contidas na Carta Magna.
No entanto, a autonomia do indivíduo consiste no seu direito de determinar
o rumo que sua vida irá seguir, desde que plenamente capaz e ciente de seus atos.
51

Não há que se falar, portanto, em autonomia, quando esta encontra-se vinculada ao


consentimento de um terceiro, ainda que seja de seu próprio cônjuge.
Há de se considerar, ainda, a gravidade das consequências que poderão
decorrer dessa escolha, sobretudo quando se trata de pessoas que se encontram na
constância da sociedade conjugal. Contudo, a autonomia, como direito do indivíduo,
também se trata do dever do Estado em considerar as pessoas como agentes
responsáveis e capazes de tomar decisões que lhes dizem respeito e,
consequentemente, dos efeitos de tais atos.
Por fim, verifica-se que os Projetos de Lei mais recentes já se manifestam
no sentido de revogar a exigência do consentimento do cônjuge para a esterilização
voluntária no Brasil, respeitando a dignidade e liberdade de cada pessoa.
A partir do problema proposto para esta pesquisa, conclui-se que o disposto
no art. 10, § 5º da Lei do Planejamento Familiar viola o art. 226 da Constituição Federal
e o direito à liberdade, culminando com a violação do princípio da dignidade humana,
princípio norteador do ordenamento jurídico.
52

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