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DELEGADO 2018.1
CONCURSOS PÚBLICOS

PROCESSO PENAL

@professor_bello (21)97434-1978

1. Questões Discursivas (Abertas)


2. Atribuições da Polícia Federal
3. Jurisprudência STF 2018.1
4. Jurisprudência STJ 2018.1
5. Gabarito das Questões
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Questões Discursivas - Abertas


Questão 01: Com base na doutrina e na ordem constitucional, convencional e legal vigentes,
discorra, fundamentadamente sobre a cláusula de reserva de jurisdição absoluta e a cláusula
de reserva de jurisdição relativa, bem como suas relações nas atribuições do Delegado de
Polícia na condução da investigação criminal.

Questão 02: Há diferença entre condução coercitiva de testemunha e condução coercitiva de


acusado ou investigado? Justifique sua resposta abordando aspectos teóricos constitucionais
penais e processuais penais.

Questão 03: Indique o momento constitucionalmente adequado para a realização do


interrogatório no procedimento penal ordinário militar, da lei 8.038/90 e na lei de Drogas
(11.343/06) abordando os aspectos legais e a jurisprudência do STJ e do STF sobre o tema.

Questão 04: Durante uma reunião em que se discutia a aplicação à empresa Alfa Ltda. de
penalidade de impedimento de licitar — que fora sugerida em parecer elaborado por Marcelo,
advogado da União —, o proprietário da empresa, João, com a intenção de atingir a honra do
referido servidor público, acusou-o falsamente de estar utilizando seu cargo para beneficiar
sua concorrente, a empresa Beta S.A., já que, com a aplicação da penalidade sugerida, a
empresa Beta seria a única no mercado nacional apta a fornecer o objeto do contrato.

Redija um texto dissertativo a respeito da conduta de João, proprietário da empresa Alfa Ltda.
Em seu texto, aborde

1 o crime cometido por João; [valor: 2,00 pontos]

2 o objeto jurídico tutelado pelo Código Penal com a tipificação do crime cometido e os
requisitos para a configuração desse delito; [valor: 3,00 pontos]

3 a legitimação para a propositura da ação penal, considerando a doutrina e a jurisprudência


do Supremo Tribunal Federal. [valor: 4,50 pontos]

Questão 05: À noite, no retorno para a delegacia, depois de cumpridas outras diligências,
policiais civis suspeitaram, com razões justificáveis, da ocorrência de tráfico de drogas em
determinada residência. Imediatamente, entraram à força no local e realizaram busca e
apreensão no domicílio.

Considerando o entendimento do STF, responda, de forma fundamentada, aos seguintes


questionamentos a respeito da legalidade da entrada na residência e da busca e apreensão
realizada na situação hipotética acima descrita.

1 Ao entrarem na residência, naquele momento, os policiais agiram de maneira legal? [valor:


1,60 ponto]

2 Ao realizarem busca e apreensão no domicílio, os policiais agiram legalmente? Em que


momento ocorre o controle judicial desse tipo de ação? [valor: 4,00 pontos]
3

3 Caso a ação dos policiais seja considerada ilícita, quais serão as consequências dessa ação?
[valor: 2,00 pontos]

Questão 06: O art. 1.º da Lei n.º 9.296/1996 disciplina que “A interceptação de comunicações
telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução
processual penal, observará o disposto nesta lei e dependerá de ordem do juiz competente da
ação principal, sob segredo de justiça”.

Com base nas disposições da referida norma legal, no entendimento dos tribunais superiores e
na conceituação doutrinária dos diversos fluxos de comunicação, faça o que se pede a seguir.

1 Conceitue e diferencie interceptação telefônica, escuta telefônica, gravação telefônica e


quebra de sigilo de dados telefônicos e esclareça sobre a sujeição, ou não, de cada uma dessas
medidas ao regime da Lei n.º 9.296/1996. [valor: 4,00 pontos]

2 Discorra acerca da legalidade ou não do acesso, sem ordem judicial, a arquivos de ligações
realizadas e recebidas e à agenda de contatos em aparelho telefônico do indiciado apreendido
regularmente pela autoridade policial e esclareça sobre a sujeição, ou não, dessas medidas ao
regime da Lei n.º 9.296/1996. [valor: 3,60 pontos]

Questão 07: Considerando os dispositivos da Lei n.º 12.403/2011, que promoveu alterações no
Código de Processo Penal relativas à prisão processual, discorra sobre a natureza jurídica da
prisão em flagrante diante da nova roupagem processual penal, abordando, necessária e
fundamentadamente, as justificativas doutrinárias que defendem a sua cautelaridade [valor:
4,00 pontos] e as que defendem a sua pré-cautelaridade [valor: 3,60 pontos].

Questão 08: No curso de inquérito policial, um investigado apresentou documentos e


testemunhas que comprovavam a participação de parlamentar federal em práticas delituosas
no curso do mandato. Diante dos fatos, o delegado de polícia indiciou o referido congressista,
que, inconformado, requereu judicialmente a anulação de seu indiciamento.

A partir da situação hipotética acima apresentada, responda aos seguintes questionamentos.


Fundamente suas respostas no entendimento do STF acerca da instauração de inquéritos e
indiciamentos.

1 O indiciamento é ato privativo de delegado de polícia? O que esse ato deve indicar? [valor:
2,00 pontos]

2 O delegado de polícia pode indiciar, de ofício, parlamentar? [valor: 2,80 pontos]

3 Na hipótese considerada, qual deve ser a providência correta com relação ao ato de
indiciamento do parlamentar? [valor: 2,80 pontos]

Questão 09: Dois homens — um empunhando um revólver; o outro, uma faca — abordaram,
por volta de 20 h 30 min de determinado dia, duas moças que caminhavam em uma rua e as
ameaçaram, exigindo que lhes entregassem seus telefones celulares, tendo sido prontamente
atendidos. Comunicado o fato, a autoridade policial instaurou inquérito policial e, dois dias
depois, os investigadores chegaram aos dois suspeitos, conhecidos pela contumácia na prática
dessa ação criminosa. Levados os suspeitos à delegacia, as vítimas prontamente os
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reconheceram como autores dos roubos, mas sem que a autoridade policial observasse as
normas do Código de Processo Penal que regulam o procedimento de reconhecimento de
pessoas (art. 226 do Código de Processo Penal).

A partir da situação hipotética acima apresentada, elabore um texto fundamentado no


posicionamento dos tribunais superiores, respondendo aos seguintes questionamentos. 1 Em
que consiste o reconhecimento de pessoa? [valor: 4,25 pontos]

2 Em que fase da persecução penal deve ocorrer o reconhecimento de pessoa? [valor: 5,00
pontos]

3 Dadas as circunstâncias descritas na situação hipotética em apreço, poderá haver nulidade


no auto de reconhecimento de pessoa e, em consequência disso, a anulação do processo penal
instaurado com base no inquérito policial? [valor: 5,00 pontos]

Questão 10: A Lei n.º 11.340/2006, também conhecida como Lei Maria da Penha, criou
mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher,
estabelecendo, entre outras, medidas de proteção às mulheres em situações de abuso e de
agressões.

Considerando as disposições da lei em referência e o entendimento dos tribunais superiores,


discorra sobre os seguintes tópicos.

1 Procedimento a ser instaurado pela autoridade policial nos crimes de lesão corporal leve, de
ameaça e de injúria cometidos contra a mulher em situação de violência doméstica, levando-
se em consideração a natureza da ação penal nos respectivos crimes. [valor: 5,25 pontos]

2 Possibilidade de retratação da vítima, no âmbito policial, quanto aos crimes indicados. [valor:
5,00 pontos]

3 Possibilidade de aplicação da Lei n.º 9.099/1995 e de seus institutos despenalizadores nos


casos dos referidos crimes cometidos em âmbito doméstico contra a mulher. [valor: 4,00
pontos]
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Atribuições da Polícia Federal

Bruno Zampier – 2018.1


Resumo feito por Rodrigo Bello

04.07.2018

Art. 144 CF

Departamento de Polícia Federal – Órgão da Administração Direta (medida provisória


821/2018 – atualmente lei 13.690/181) – Vinculado ao Ministério Extraordinário de Segurança
Pública

O caput do Art. 144 CF legitima o flagrante facultativo (Art. 301 CPP), já que segurança pública
é direito e responsabilidade de todos.

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado,


direito e responsabilidade de todos, é exercida para a
preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros
militares.

A Polícia Federal sempre foi subordinada ao Ministério da Justiça, só que em fevereiro de


2018, a Medida Provisória 821 (aprovada nas casas e já para sanção presidencial – agora a lei
13.690/18), separou o Ministério da Justiça e criando o Ministério Extraordinário da Segurança
Pública. Esta medida foi na mesma época da intervenção federal no Rio de Janeiro.

Ministro da Justiça não é o chefe da PF. O DPF é dirigido pelo DG – Diretor Geral. Quem pode
ocupar tal cargo? Apenas delegados de polícia de carreira da última classe da carreira –
exigência de 2014 em diante. (Art. 2º-C da lei 9.266/96). Escolha da presidência.

Atualmente Romeu Tuma (ex-Delegado de Polícia de SP e que já foi DG) não poderia ser DG, já
que nunca foi Delegado de Polícia.

1
LEI Nº 13.690, DE 10 DE JULHO DE 2018 (lei na íntegra no final) : Altera a Lei nº 13.502, de 1º de
novembro de 2017, que dispõe sobre a organização básica da Presidência da República e dos
Ministérios, para criar o Ministério da Segurança Pública, e as Leis nos 11.134, de 15 de julho de 2005, e
9.264, de 7 de fevereiro de 1996; e revoga dispositivos da Lei nº 11.483, de 31 de maio de 2007.
Art. 1o Fica criado o Ministério da Segurança Pública e transformado o Ministério da Justiça e
Segurança Pública em Ministério da Justiça.
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Fundamental para a prova da PF (9.266/96 – Lei que organiza a polícia federal – alterada pela
lei 13.047/14).

Art. 2o-C. O cargo de Diretor-Geral, nomeado pelo


Presidente da República, é privativo de delegado de
Polícia Federal integrante da classe especial.

Carreiras Policiais (não se confunde com agentes administrativos e contratados Ex:


Funcionários do setor de imigração nos aeroportos, passaportes na DPF).

 Delegado (Correto: Delegado DE Polícia – Delegado de uma atividade – presidir


Inquérito Policial e gerir órgão)
 Agente (APF – auxiliar na condução das investigações)
 Escrivão (EPF - Exercício de atividades cartorárias nos moldes da Justiça)
 Papiloscopista (PPF – realizar perícias papiloscópicas - digitais)
 Perito (PCF – realizar perícia – médica, contábil, engenharia, química – mesma
remuneração inicial dos Delegados)

Delegado: Chefia do órgão e presidência do Inquérito Polícia.

Delegado é um gestor de pessoas, “cuidar” de agentes, escrivães, gerir o dinheiro público do


órgão.

Curiosidade: Remoções dentro da PF é feito através de um concurso interno por critérios bem
objetivos de pontuação. Dependendo da localidade da lotação, maior a pontuação. Ficar no
Norte do país, pontua mais que um policial que fica nos grandes centros. Remoções são feitas
quando dos novos integrantes ingressarem na carreira.

Geralmente no início o Policial vai para a fronteira, onde temos uma verdadeira escola, pois
equipara-se ao “médico clínico geral”. O policial investiga contrabando, drogas, prefeito etc.
Tudo pode acontecer.

Lotação:

Norte / Fronteira – A escolha é feita por classificação na Academia Nacional de Polícia.

3ª Classe – Inicial  depois de 3 anos  2ª Classe  depois de 5 anos  1ª Classe

Desafios:

 Volume de Trabalho
 Autonomia de Trabalho, de investigação (melhorou com a lei 12.830/13)
 Interesses Investigados

*Atribuições (Art. 144 §1º CF/88) vs. Competência (Art. 109 CF/88)

Polícia Federal é órgão de Poder Executivo.


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Comuns – Residual

Especiais – Expressa (CF/88, Leis e Tratados) Papel de Polícia Judiciária e Polícia


Administrativa.2

Atribuições:

Polícia Judiciária – Atuar na investigação através de um Inquérito Policial (não existe Inquérito
Policial Federal, o que temos é um inquérito que tramita na polícia federal).

Polícia Administrativa – prestação do serviço público remunerado por taxa. (Ex: taxa de
emissão de passaporte, taxa de fiscalização da empresa de segurança).

 Polícia Judiciária:

1) Apurar Infrações contra a ordem política e social (Art. 144 §1º I CF/88):
a) Lei de Segurança Nacional (Art. 7.170/83)
b) Lei de Combate ao Terrorismo (Art. 13.260/16)

2) Apurar infrações penais em detrimento de bens, serviços ou interesses da UF,


entidades autárquicas, fundações públicas, empresas públicas federais

3) Apurar infrações penais cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional


e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei. (Lei 10.446/023 - Dispõe sobre
infrações penais de repercussão interestadual ou internacional que exigem repressão
uniforme, para os fins do disposto no inciso I do § 1o do art. 144 da Constituição.)

Art. 1o Na forma do inciso I do § 1o do art. 144 da


Constituição, quando houver repercussão
interestadual ou internacional que exija repressão
uniforme, poderá o Departamento de Polícia Federal
do Ministério da Justiça, sem prejuízo da
responsabilidade dos órgãos de segurança pública
arrolados no art. 144 da Constituição Federal, em
especial das Polícias Militares e Civis dos Estados,
proceder à investigação, dentre outras, das seguintes
infrações penais:

I – seqüestro, cárcere privado e extorsão mediante


seqüestro (arts. 148 e 159 do Código Penal), se o
agente foi impelido por motivação política ou quando
praticado em razão da função pública exercida pela
vítima;

2
Início do Bloco 04
3
Toda prova da Polícia Federal cai essa lei!
8

II – formação de cartel (incisos I, a, II, III e VII do art.


4º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990); e

III – relativas à violação a direitos humanos, que a


República Federativa do Brasil se comprometeu a
reprimir em decorrência de tratados internacionais
de que seja parte; e

IV – furto, roubo ou receptação de cargas, inclusive


bens e valores, transportadas em operação
interestadual ou internacional, quando houver
indícios da atuação de quadrilha ou bando em mais
de um Estado da Federação.

V - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração


de produto destinado a fins terapêuticos ou
medicinais e venda, inclusive pela internet, depósito
ou distribuição do produto falsificado, corrompido,
adulterado ou alterado (art. 273 do Decreto-Lei nº
2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal).
(Incluído pela Lei nº 12.894, de 2013)

VI - furto, roubo ou dano contra instituições


financeiras, incluindo agências bancárias ou caixas
eletrônicos, quando houver indícios da atuação de
associação criminosa em mais de um Estado da
Federação. (Incluído pela Lei nº 13.124, de
2015)

VII – quaisquer crimes praticados por meio da rede


mundial de computadores que difundam conteúdo
misógino, definidos como aqueles que propagam o
ódio ou a aversão às mulheres. (Incluído pela
Lei nº 13.642, de 2018)

Parágrafo único. Atendidos os pressupostos do caput,


o Departamento de Polícia Federal procederá à
apuração de outros casos, desde que tal providência
seja autorizada ou determinada pelo Ministro de
Estado da Justiça.

Repercussão (produção de efeitos, consequências) Interestadual – Em mais de um


Estado, em locais distintos. Exemplo: Davi, Bruno e Vinícius montam uma associação
criminosa para roubo de carros nos Estados de Minas, São Paulo e Rio de Janeiro
(repercussão interestadual). Essa associação faz um esquema de receptação no
Paraguai, onde os paraguaios irão receber peças e carros roubados (repercussão
internacional).
9

A ideia de uma repressão uniforme na PF agiliza a mobilização e a repressão do delito


interestadual. Celeridade operacional. Imaginemos o Delegado do Rio mandar ofício
para o Delegado de Minas e que deve contactar o Delegado de São Paulo. Iria criar
morosidade persecutória.

4) Art. 1º inciso I da lei 10.446/02: I – seqüestro, cárcere privado e extorsão mediante


seqüestro (arts. 148 e 159 do Código Penal), se o agente foi impelido por motivação
política ou quando praticado em razão da função pública exercida pela vítima;

Lembrando que estas atribuições não excluem a atuação dos órgãos estaduais. Ler
Caput do art. 1º da lei. A ideia é a complementariedade.

5) Art. 1º inciso II da lei 10.446/02: II – formação de cartel (incisos I, a, II, III e VII do art.
4º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990); Exemplo: Se na greve dos
caminhoneiros tivesse comprovado a união das empresas de transportes de
caminhões, poderíamos verificar a formação de um cartel. Outro exemplo é a
formação de cartel para os crimes de relações de consumo.

6) Art. 1º inciso III da lei 10.446/02: III – relativas à violação a direitos humanos, que a
República Federativa do Brasil se comprometeu a reprimir em decorrência de tratados
internacionais de que seja parte; Exemplo: A chacina do Carandiru; homicídio da irmã
Dorothy no Pará.4

7) Art. 1º inciso IV da lei 10.446/02: IV – furto, roubo ou receptação de cargas, inclusive


bens e valores, transportadas em operação interestadual ou internacional, quando
houver indícios da atuação de quadrilha ou bando 5em mais de um Estado da
Federação.

8) Art. 1º inciso V da lei 10.446/02: V 6- falsificação, corrupção, adulteração ou alteração


de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais e venda, inclusive pela
internet, depósito ou distribuição do produto falsificado, corrompido, adulterado ou
alterado (art. 273 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal).
(Incluído pela Lei nº 12.894, de 2013).

Fruto do Lobby das indústrias farmacêuticas.

9) Art. 1º inciso VI da lei 10.446/02: VI - furto, roubo ou dano contra instituições


financeiras, incluindo agências bancárias ou caixas eletrônicos, quando houver indícios
da atuação de associação criminosa em mais de um Estado da Federação.

Não necessariamente precisa ser CEF (empresa pública federal).

4
Verificar o IDC do Art. 109 V-A CF
5
O novo art. 288 CP traz a conduta de Associação Criminosa. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas,
para o fim específico de cometer crimes: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
6
A partir deste inciso alterações de lei em 2013.
10

10) Art. 1º inciso VII da lei 10.446/02: VII – quaisquer crimes praticados por meio da rede
mundial de computadores que difundam conteúdo misógino7, definidos como aqueles
que propagam o ódio ou a aversão às mulheres.

11) Art. 1º Parágrafo Único da lei 10.446/02: Parágrafo único. Atendidos os pressupostos
do caput, o Departamento de Polícia Federal procederá à apuração de outros casos,
desde que tal providência seja autorizada ou determinada pelo Ministro de Estado da
Justiça.8

12) Prevenir e Reprimir Tráfico de Drogas (Art. 144 §1º II CF/88) – não apenas o
internacional. São celebrados convênios9 entre Estados Membros e União Federal.

a) Tráfico internacional
b) Tráfico Interestadual
c) Trafico Intermunicipal
d) Tráfico Local

13) prevenir e reprimir o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e


de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência (Art. 144 §1º inciso II
CF/88).

14) exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras (Art. 144 §1º
inciso III CF/88).

15) exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. 10(Art. 144 §1º
inciso IV CF/88).

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Misoginia é a repulsa, desprezo ou ódio contra as mulheres. Esta forma de aversão mórbida e
patológica ao sexo feminino está diretamente relacionada com a violência que é praticada contra a
mulher.
A misoginia é a principal responsável por grande parte dos assassinatos de mulheres, também
conhecido por feminicídio, que configura-se como formas de agressões físicas e psicológicas,
mutilações, abusos sexuais, torturas, perseguições, entre outras violências relacionadas direta ou
indiretamente com o gênero feminino.
8
Referência ao superior hierárquico do DPF – Ministro Extraordinário da Segurança Pública.
9
Convênio entre a União Federal e o Rio de Janeiro: Cláusula primeira - O presente Convênio tem por
objetivo fixar, nos termos constitucionais, diretrizes e mecanismos de colaboração entre a União e o
Estado do Rio de Janeiro no que diz respeito à preservação da Lei, da ordem pública e da segurança do
cidadão, especialmente no que concerne à prevenção e repressão do contrabando de armas e do tráfico
de drogas;
Cláusula Segunda - Para os fins previstos neste Convênio, o Governo do Estado do Rio de Janeiro
promoverá, de imediato, a constituição de um órgão central para planejar, coordenar e unificar a
atuação das Secretarias de Estado da Justiça, da Polícia Militar, Polícia Civil, e da Defesa Civil, no
combate à criminalidade. Esse órgão atuará sob a direção do Comando Militar do Leste, que, ouvido o
presidente da República, indicará ao governador do Rio de Janeiro o comandante geral das operações.
Cláusula Terceira - Caberá à União prestar, ao órgão central a que se refere a Cláusula anterior,
orientação e assistência técnica, operacional e material;
10
Este seria um fundamento para impedir o MP investigar, mas a matéria já está consolidada pela
possibilidade.
11

16) Reprimir e apurar crimes políticos, eleitorais e exercer a função de polícia judiciária
eleitoral (CE e Lei 9.504/98).11

11
RESOLUÇÃO Nº 23.396 DA POLÍCIA JUDICIÁRIA ELEITORAL
Art. 1º O Departamento de Polícia Federal ficará à disposição da Justiça Eleitoral sempre que houver
eleições, gerais ou parciais, em qualquer parte do Território Nacional (Decreto-Lei nº 1.064/68).
Art. 2º A Polícia Federal exercerá, com prioridade sobre suas atribuições regulares, a função de polícia
judiciária em matéria eleitoral, limitada às instruções e requisições dos Tribunais e Juízes Eleitorais.
Parágrafo único. Quando no local da infração não existirem órgãos da Polícia Federal, a Polícia do
respectivo Estado terá atuação supletiva.

CAPÍTULO II
DA NOTÍCIA-CRIME ELEITORAL

Art. 3º Qualquer pessoa que tiver conhecimento da existência de infração penal eleitoral deverá,
verbalmente ou por escrito, comunicá-Ia ao Juiz Eleitoral (Código Eleitoral, art. 356).
Art. 4º Verificada a sua incompetência, o Juízo Eleitoral determinará a remessa dos autos ao Juízo
competente (Código de Processo Penal, art. 69).
Art. 5º Quando tiver conhecimento da prática da infração penal eleitoral, a autoridade policial deverá
informá-la imediatamente ao Juízo Eleitoral competente, a quem poderá requerer as medidas que
entender cabíveis, observadas as regras relativas a foro por prerrogativa de função.
Art. 6º Recebida a notícia-crime, o Juiz Eleitoral a encaminhará ao Ministério Público Eleitoral ou,
quando necessário, à polícia, com requisição para instauração de inquérito policial (Código Eleitoral, art.
356, § 1°).
Art. 7º As autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem for encontrado em flagrante
delito pela prática de infração eleitoral, salvo quando se tratar de crime de menor potencial ofensivo,
comunicando imediatamente o fato ao Juiz Eleitoral, ao Ministério Público Eleitoral e à família do preso
ou à pessoa por ele indicada (Código de Processo Penal, art. 306, caput).
§ 1º Em até 24 horas após a realização da prisão, será encaminhado ao Juiz Eleitoral o auto de prisão em
flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria
Pública (Código de Processo Penal, art. 306, § 1º).
§ 2º No mesmo prazo de até 24 horas após a realização da prisão, será entregue ao preso, mediante
recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade policial, com o motivo da prisão, o nome do condutor
e os nomes das testemunhas (Código de Processo Penal, art. 306, § 2º).
§ 3º A apresentação do preso ao Juiz Eleitoral, bem como os atos subsequentes, observarão o disposto
no art. 304 do Código de Processo Penal.
§ 4º Ao receber o auto de prisão em flagrante, o Juiz Eleitoral deverá fundamentadamente (Código de
Processo Penal, art. 310):
I – relaxar a prisão ilegal; ou
II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art.
312 do Código de Processo Penal e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares
diversas da prisão; ou
III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
§ 5º Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições
constantes dos incisos I a III do art. 23 do Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao
acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob
pena de revogação (Código de Processo Penal, art. 310, parágrafo único).
§ 6º Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o Juiz Eleitoral deverá
conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319,
observados os critérios constantes do art. 282, ambos do Código de Processo Penal (Código de Processo
Penal, art. 321).
§ 7º A fiança e as medidas cautelares serão aplicadas pela autoridade competente com a observância
das respectivas disposições do Código de Processo Penal.
§ 8º Quando a infração for de menor potencial ofensivo, a autoridade policial elaborará termo
circunstanciado de ocorrência e providenciará o encaminhamento ao Juiz Eleitoral.
12

Em municípios sem a presença da Polícia Federal, de caráter residual, cabe a Polícia


Civil a apuração e repressão de crimes eleitorais. No mais, a Justiça Eleitoral é mantida
pelos cofres públicos da União Federal.

17) Apurar infrações penais em sede de disputas de direitos indígenas. Crimes cometidos
contra uma coletividade indígena (Art. 231 CF).

18) Apurar infrações contra o meio ambiente e contra o patrimônio histórico e cultural (Lei
9.605/98). Delegacia especializada dentro da PF. Exemplo: roubo de imagens no
interior de Minas de imagens feitas pelo Aleijadinho pertencentes ao patrimônio da
União. Outro exemplo: tráfico de animais silvestres.

19) Qualquer ato de persecução penal internacional – inclusive as cooperações penais


internacionais. Exemplo: Sequestro de ativos no exterior.12

CAPÍTULO III
DO INQUÉRITO POLICIAL ELEITORAL

Art. 8º O inquérito policial eleitoral somente será instaurado mediante determinação da Justiça
Eleitoral, salvo a hipótese de prisão em flagrante.
Art. 9º Se o indiciado tiver sido preso em flagrante ou preventivamente, o inquérito policial eleitoral
será concluído em até 10 dias, contado o prazo a partir do dia em que se executar a ordem de prisão
(Código de Processo Penal, art. 10).
§ 1º Se o indiciado estiver solto, o inquérito policial eleitoral será concluído em até 30 dias, mediante
fiança ou sem ela (Código de Processo Penal, art. 10).
§ 2º A autoridade policial fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará os autos ao Juiz
Eleitoral (Código de Processo Penal, art. 10, § 1º).
§ 3º No relatório, poderá a autoridade policial indicar testemunhas que não tiverem sido inquiridas,
mencionando o lugar onde possam ser encontradas (Código de Processo Penal, art. 10, § 2º).
§ 4º Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade policial poderá
requerer ao Juiz Eleitoral a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no
prazo marcado pelo Juiz Eleitoral (Código de Processo Penal, art. 10, § 3º).
Art. 10. O Ministério Público Eleitoral poderá requerer novas diligências, desde que necessárias à
elucidação dos fatos.
Parágrafo único. Se o Ministério Público Eleitoral considerar necessários maiores esclarecimentos e
documentos complementares ou outros elementos de convicção, deverá requisitá-los diretamente de
quaisquer autoridades ou funcionários que possam fornecê-los, ressalvadas as informações submetidas
à reserva jurisdicional (Código Eleitoral, art. 356, § 2º).
Art. 11. Quando o inquérito for arquivado por falta de base para o oferecimento da denúncia, a
autoridade policial poderá proceder a nova investigação se de outras provas tiver notícia, desde que
haja nova requisição, nos termos dos artigos 5º e 6º desta resolução.
Art. 12. Aplica-se subsidiariamente ao inquérito policial eleitoral as disposições do Código de Processo
Penal, no que não houver sido contemplado nesta resolução.
Art. 13. A ação penal eleitoral observará os procedimentos previstos no Código Eleitoral, com a
aplicação obrigatória dos artigos 395, 396, 396-A, 397 e 400 do Código de Processo Penal, com redação
dada pela Lei nº 11.971, de 2008. Após esta fase, aplicar-se-ão os artigos 359 e seguintes do Código
Eleitoral.
Art. 14. Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 17 de dezembro de 2013.
12
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão na tarde desta quarta-feira (20), encerrou o
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5508 e considerou constitucional a
possibilidade de delegados de polícia realizarem acordos de colaboração premiada na fase do inquérito
13

20) Apurar infrações penais contra a ordem tributária federal (Lei 8.137/90).

21) Apurar infrações penais contra a organização do trabalho (Arts. 197 a 207 CP) – O STF
entende que o crime do art. 149 CP – redução à condição análoga a escravo também é
de competência da Justiça Federal.

22) Infrações contra o Sistema Financeiro Nacional (Lei 7.492/86).

23) Apurar infrações de ingresso e permanência irregular de estrangeiro em território


nacional (Lei de Migração – Lei 13.455/17 – medidas restritas compulsórias).

24) Apurar infrações penais cometidas a bordo de navios13 e aeronaves, ressalvada a


competência da Justiça Militar. (Art. 109 IX CF).

policial. Por maioria de votos, os ministros se posicionaram pela improcedência da ação, na qual a
Procuradoria-Geral da República (PGR) questionava dispositivos da Lei 12.850/2013 (Lei que define
organização criminosa e trata da colaboração premiada).
Na sessão desta tarde, votaram os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e
Cármen Lúcia (presidente), todos acompanhando o entendimento do relator, ministro Marco Aurélio.
Segundo ele, a formulação de proposta de colaboração premiada pela autoridade policial como meio de
obtenção de prova não interfere na atribuição constitucional do Ministério Público de ser titular da ação
penal e de decidir sobre o oferecimento da denúncia. Os ministros destacaram que, mesmo que o
delegado de polícia proponha ao colaborador a redução da pena ou o perdão judicial, a concretização
desses benefícios ocorre apenas judicialmente, pois se trata de pronunciamentos privativos do Poder
Judiciário.
De acordo com a decisão, embora não seja obrigatória a presença do Ministério Público em todas as
fases da elaboração dos acordos entre a autoridade policial e o colaborador, o MP deve
obrigatoriamente opinar. No entanto, cabe exclusivamente ao juiz a decisão homologar ou não o
acordo, depois de avaliar a proposta e efetuar o controle das cláusulas eventualmente
desproporcionais, abusivas ou ilegais.
Após o ministro Marco Aurélio ressaltar seu entendimento no sentido da impossibilidade de
interferência da autoridade policial na atribuição exclusiva do Ministério Público de oferecer denúncia,
os ministros Alexandre de Moraes e Roberto Barroso reajustaram os votos para acompanhar
integralmente o relator.
Os ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Luiz Fux divergiram parcialmente. Eles entendem que, embora
a autoridade policial possa formular acordo de colaboração, a manifestação do Ministério Público sobre
os termos da avença deve ser definitiva e vinculante.
Também divergindo parcialmente, o ministro Dias Toffoli entende que o delegado de polícia pode
submeter ao juiz o acordo firmado com colaborador desde que a proposta traga, de forma genérica,
somente as sanções premiais previstas no artigo 4º, caput e parágrafo 5º, da Lei 12.850/2013, com
manifestação do MP sem caráter vinculante. Ficaria a critério do juiz a concessão dos benefícios
previstos na lei, levando em consideração a efetividade da colaboração. O ministro entende ainda que a
autoridade policial, diante da relevância da colaboração prestada, pode representar ao juiz, nos autos
do inquérito policial, proposta de perdão judicial, ouvido previamente o MP.
13
PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME DE HOMICÍDIO CULPOSO. ART. 109, INCISO IX, DA CF/88.
CRIME COMETIDO A BORDO DE NAVIO. CIRCUNSTÂNCIA NÃO CONFIGURADA. COMPETÊNCIA DA
JUSTIÇA ESTADUAL.
1. A expressão "a bordo de navio", constante do art. 109, inciso IX, da CF/88, significa interior de
embarcação de grande porte.
2. Realizando-se uma interpretação teleológica da locução, tem-se que a norma visa abranger as
hipóteses em que tripulantes e passageiros, pelo potencial marítimo do navio, possam ser deslocados
para águas territoriais internacionais.
14

25) Apurar infrações penais cometidas contra a Previdência Social – crimes


previdenciários. Ex: estelionato previdenciário (171 §3º CP), inserção de dados falsos
na Previdência (Art. 313-A CP), apropriação indébita previdenciária (Art. 168-A CP),
Sonegação de contribuição previdenciária (Art. 337-A CP).

26) Coibir o esbulho e a turbação possessória de bens e prédios da UF e da Adm. Pública


Federal (Lei 10.683/03) Exemplo: MST invadindo prédio do INCRA.

27) Acompanhar e instaurar inquérito referente a conflitos agrários – desde que o crime
seja de competência da Justiça Federal.

28) Combater crimes contra a propriedade intelectual, a pornografia infantil, pedofilia,


fraudes eletrônicas, quando realizados exclusivamente pela internet.14

Atribuições de Polícia Administrativa

29) Controle e Fiscalização de produtos, insumos e precursores de drogas ilícitas (CPQ –


Controle de Produtos Químicos) – Lei 10.357/01. Efetividade para combate ao tráfico
de drogas. A ideia é coibir o refino, o trabalho de laboratório.

30) Representar a Interpol no Brasil.

3. Se à vitima não é implementado este potencial de deslocamento internacional, inexistindo o efetivo


ingresso no navio, resta afastada a competência da Justiça Federal.
4. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 6ª Vara Criminal da Comarca
de Santos/SP, suscitante.
(CC 43.404/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/02/2005, DJ
02/03/2005, p. 184)
14
Crime cometido pela internet deve ser julgado pelo Juízo do local onde a pessoa usou o computador
para cometer o ato ilícito. Esta foi a decisão da ministra Maria Thereza de Assis Moura, da 3ª Seção do
Superior Tribunal de Justiça, ao julgar um caso de pedofilia na rede mundial de computadores.
No caso em questão, um dos suspeitos mora em Santa Catarina e usava um endereço eletrônico com
sede em São Paulo para divulgar material pornográfico com menores. Sendo assim, a ministra, ao julgar
Conflito de Competência, determinou que o caso seja julgado pela justiça catarinense.
Segundo as investigações, dois homens teriam colocado imagens de pornografia infantil na internet
entre elas, a de um filme que envolve uma apresentadora de TV. O primeiro investigado reside em São
Lourenço do Sul (RS). Ele é acusado de veicular as imagens através de um site com sede em Florianópolis
(SC).
Para identificar o segundo suspeito, a Polícia Federal de Florianópolis pediu a quebra do sigilo eletrônico
do endereço usado por ele, com sede em São Paulo. O Juízo da Vara Federal Criminal de Santa Catarina
se julgou incompetente para analisar o pedido. Com isso, o processo foi encaminhado à 4ª Vara Federal
Criminal da Seção Judiciária de São Paulo.

A justiça paulista acolheu o pedido da Polícia Federal para a busca e apreensão de materiais e também
deferiu a solicitação de quebra do sigilo eletrônico da empresa. Foi quando se descobriu que o suspeito
era morador de Florianópolis (SC).
Diante dos fatos, o Juízo de São Paulo entendeu que a competência era do Juízo catarinense e enviou o
conflito de competência ao STJ.
15

31) Expedição de Documentos de viagem e cadastro de registro de estrangeiros (Nova Lei


de Migração – Lei 13.445/17).

32) Exercer o controle e fiscalização de segurança privada. (Lei 7.102/83). Todo vigilante
deve ser cadastrado na Polícia Federal. Não existe a profissão de segurança e sim de
vigilante.

33) Exercer a segurança de dignitários. Segurança de autoridades estrangeiras, não


celebridades.

34) Controle da aquisição, transferência, registro de armas de fogo – SINARM (Lei.


10.826/03 – Estatuto do Desarmamento).

35) Perícia Criminal oficial da União – INC – Instituto Nacional de Criminalística.

36) Implementar, controlar, coordenar o Sistema Nacional de Identificação Criminal.

37) Realizar o cadastro de entidades que atuem no âmbito de adoções internacionais (Art.
52 ECA – Lei 8.069/90).

LEI Nº 13.690, DE 10 DE JULHO DE 2018.

Altera a Lei nº 13.502, de 1º de novembro de


2017, que dispõe sobre a organização básica
da Presidência da República e dos Ministérios,
para criar o Ministério da Segurança Pública, e
as Leis nos 11.134, de 15 de julho de 2005, e
9.264, de 7 de fevereiro de 1996; e revoga
dispositivos da Lei nº 11.483, de 31 de maio
de 2007.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu


sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o Fica criado o Ministério da Segurança Pública e transformado o Ministério da


Justiça e Segurança Pública em Ministério da Justiça.

Art. 2º A Lei nº 13.502, de 1º de novembro de 2017, passa a vigorar com as seguintes


alterações:

“Art. 21. ...............................................................

XIII - da Justiça;

XXIII - da Segurança Pública.” (NR)

“Seção XXIII
16

Do Ministério da Segurança Pública

‘Art. 68-A. Compete ao Ministério da Segurança Pública:

I - coordenar e promover a integração da segurança pública em todo o território


nacional em cooperação com os demais entes federativos;

II - exercer:

a) a competência prevista nos incisos I, II, III e IV do § 1º do art. 144 da Constituição


Federal, por meio da polícia federal;

b) o patrulhamento ostensivo das rodovias federais, na forma do § 2º do art. 144 da


Constituição Federal, por meio da polícia rodoviária federal;

c) (VETADO);

d) a política de organização e manutenção da polícia civil, da polícia militar e do corpo


de bombeiros militar do Distrito Federal, nos termos do inciso XIV do caput do art. 21 da
Constituição Federal;

e) a função de ouvidoria das polícias federais;

f) a defesa dos bens e dos próprios da União e das entidades integrantes da


administração pública federal indireta; e

g) (VETADO);

III - planejar, coordenar e administrar a política penitenciária nacional;

IV - coordenar, em articulação com os órgãos e entidades competentes da


administração federal, a instituição de escola superior de altos estudos ou congêneres, ou de
programas, enquanto não instalada, em matérias de segurança pública, em instituição
existente;

V - promover a integração entre os órgãos federais, estaduais, distritais e municipais,


bem como articular-se com os órgãos e entidades de coordenação e supervisão das atividades
de segurança pública;

VI - estimular e propor aos órgãos federais, estaduais, distritais e municipais a


elaboração de planos e programas integrados de segurança pública, com o objetivo de
prevenção e repressão da violência e da criminalidade; e

VII - desenvolver estratégia comum baseada em modelos de gestão e de tecnologia que


permitam a integração e a interoperabilidade dos sistemas de tecnologia da informação dos
entes federativos.’

‘Art. 68-B. Integram a estrutura básica do Ministério da Segurança Pública:

I - o Departamento de Polícia Federal (DPF);


17

II - o Departamento de Polícia Rodoviária Federal (DPRF);

III - (VETADO);

IV - (VETADO);

V - o Departamento Penitenciário Nacional (Depen);

VI - o Conselho Nacional de Segurança Pública (Conasp);

VII - o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP);

VIII - a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp); e

IX - até 1 (uma) Secretaria.

Parágrafo único. (VETADO).’”

“Seção XIII
Do Ministério da Justiça

‘Art. 47. Constitui área de competência do Ministério da Justiça:

IV - políticas sobre drogas;

VI - (revogado);

IX - (revogado);

XI - (revogado);

§ 2º (Revogado).

§ 3º (Revogado).’ (NR)

‘Art. 48. Integram a estrutura básica do Ministério da Justiça:

I - (revogado);

II - (revogado);

VII - (revogado);

VIII - (revogado);

IX - (revogado);

XI - até 4 (quatro) Secretarias.’ (NR)”


18

Art. 3º É transferida do Ministério da Justiça e Segurança Pública para o Ministério da


Segurança Pública a gestão dos fundos relacionados com as unidades e as competências deste
Ministério.

Art. 4º Ficam transformados:

I - o cargo de Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública em cargo de Ministro de


Estado da Justiça;

II - o cargo de natureza especial de Secretário-Executivo do Ministério da Justiça e


Segurança Pública em cargo de natureza especial de Secretário-Executivo do Ministério da
Justiça;

III - 19 (dezenove) cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores


(DAS), de nível 1, nos cargos de:

a) Ministro de Estado da Segurança Pública; e

b) natureza especial de Secretário-Executivo do Ministério da Segurança Pública.

Art. 5º Aplica-se o disposto no art. 2º da Lei nº 9.007, de 17 de março de 1995, aos


servidores e aos empregados requisitados para o Ministério da Segurança Pública até 1º de
agosto de 2019.

Parágrafo único. (VETADO).

Art. 6º As competências e as incumbências relacionadas com o disposto no art. 68-A da


Lei nº 13.502, de 1º de novembro de 2017, estabelecidas em lei para o Ministério da Justiça e
para os seus agentes públicos ficam transferidas para o Ministério da Segurança Pública e para
os agentes públicos que receberem essas atribuições.

Art. 7º O acervo patrimonial e o quadro de servidores efetivos do Ministério da Justiça e


Segurança Pública, relativamente às competências que forem absorvidas, serão transferidos ao
Ministério da Segurança Pública, bem como os direitos, os créditos e as obrigações
decorrentes de lei, atos administrativos ou contratos, inclusive as receitas e as despesas.

Parágrafo único. O disposto no art. 52 da Lei nº 13.473, de 8 de agosto de 2017, aplica-


se às dotações orçamentárias dos órgãos de que trata o caput deste artigo.

Art. 8º A transferência de servidores efetivos por força de modificação nas


competências de órgão ou entidade da administração pública federal direta, autárquica ou
fundacional não implicará alteração remuneratória e não será obstada pela limitação de
exercício em outro órgão ou entidade por força de lei especial.

Art. 9º Até o prazo definido em decreto, caberá ao Ministério da Justiça prestar ao


Ministério da Segurança Pública apoio técnico, administrativo e jurídico necessário ao
desempenho das atribuições previstas no art. 68-A da Lei nº 13.502, de 1º de novembro de
2017.
19

Art. 10. Os cargos de que trata o art. 23 da Lei nº 11.483, de 31 de maio de 2007,
poderão ser utilizados para estruturar o Ministério da Segurança Pública.

Art. 11. A Lei nº 11.134, de 15 de julho de 2005, passa a vigorar acrescida do seguinte
art. 29-A:

“Art. 29-A. São considerados no exercício de função de natureza ou interesse policial


militar ou bombeiro militar os policiais militares e bombeiros militares da ativa nomeados ou
designados para os seguintes órgãos:

I - Presidência e Vice-Presidência da República, para o exercício de cargo em comissão


ou função de confiança;

II - Ministério ou órgão equivalente, para o exercício de cargo em comissão ou função de


confiança;

III - Supremo Tribunal Federal, demais Tribunais Superiores e Conselho Nacional de


Justiça, para o exercício de cargo em comissão cuja remuneração seja igual ou superior à de
cargo DAS-101.4 ou equivalente;

IV - órgãos do Tribunal Regional Federal da 1º Região situados no Distrito Federal,


Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal, órgãos do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª
Região situados no Distrito Federal e Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios,
para o exercício de cargo em comissão cuja remuneração seja igual ou superior à de cargo
DAS-101.4 ou equivalente;

V - órgãos do Ministério Público da União situados no Distrito Federal e Conselho


Nacional do Ministério Público, para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança;

VI - órgãos do Tribunal de Contas da União situados no Distrito Federal e Tribunal de


Contas do Distrito Federal, para o exercício de cargo em comissão cuja remuneração seja igual
ou superior à de cargo DAS-101.4 ou equivalente;

VII - Casa Militar do Distrito Federal, para o exercício de cargo em comissão ou função
de confiança;

VIII - Governadoria e Vice-Governadoria do Distrito Federal, para o exercício de cargo


em comissão ou função de confiança;

IX - Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Paz Social do Distrito Federal, para o


exercício de cargo em comissão ou função de confiança;

X - Defesa Civil do Distrito Federal ou órgão equivalente;

XI - Justiça Militar do Distrito Federal; e

XII - demais órgãos da administração pública do Distrito Federal considerados


estratégicos, a critério do Governador do Distrito Federal, para o exercício de cargo em
comissão cuja remuneração seja igual ou superior à de cargo DAS-101.4 ou equivalente.
20

§ 1º O ônus da remuneração do militar cedido será de responsabilidade do órgão


cessionário, salvo quando a cessão ocorrer para órgão da União, Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e dos Territórios, órgão da Justiça Militar Distrital, Casa Militar do Distrito Federal,
Vice-Governadoria do Distrito Federal, Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Paz
Social do Distrito Federal ou Defesa Civil do Distrito Federal ou órgão equivalente.

§ 2º O militar distrital só poderá ser cedido após completar 5 (cinco) anos de efetivo
serviço na corporação de origem.

§ 3º O número total de cessões de militares do Distrito Federal não poderá exceder 5%


(cinco por cento) do efetivo existente nas respectivas corporações.

§ 4º (VETADO).”

Art. 12. A Lei nº 9.264, de 7 de fevereiro de 1996, passa a vigorar acrescida do seguinte
art. 12-B:

“Art. 12-B. A cessão dos integrantes das carreiras de que trata esta Lei somente será
autorizada para:

I - Presidência da República e Vice-Presidência da República, para o exercício de cargo


em comissão ou função de confiança;

II - Ministério ou órgão equivalente, para o exercício de cargo em comissão ou função de


confiança;

III - Tribunais Superiores, órgãos do Tribunal Regional Federal da 1ª Região situados no


Distrito Federal, Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal, órgãos do Tribunal Regional do
Trabalho da 10ª Região situados no Distrito Federal e Tribunal de Justiça do Distrito Federal e
dos Territórios, para o exercício de cargo em comissão cuja remuneração seja igual ou superior
à de cargo DAS-101.4 ou equivalente;

IV - órgãos do Ministério Público da União situados no Distrito Federal, para o exercício


de cargo em comissão cuja remuneração seja igual ou superior à de cargo DAS-101.4 ou
equivalente;

V - órgãos do Tribunal de Contas da União situados no Distrito Federal e Tribunal de


Contas do Distrito Federal, para o exercício de cargo em comissão cuja remuneração seja igual
ou superior à de cargo DAS-101.4 ou equivalente;

VI - Governadoria e Vice-Governadoria do Distrito Federal, para o exercício de cargo em


comissão;

VII - Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Paz Social do Distrito Federal, para o
exercício de cargo em comissão ou função de confiança; e

VIII - demais órgãos da administração pública do Distrito Federal considerados


estratégicos, a critério do Governador do Distrito Federal, para o exercício de cargo em
comissão cuja remuneração seja igual ou superior à de cargo DAS-101.4 ou equivalente.
21

§ 1º É vedada a cessão de servidor que não tenha cumprido o estágio probatório de que
trata o art. 41 da Constituição Federal;

§ 2º É obrigatório o ressarcimento ao órgão cedente do valor correspondente à


remuneração do servidor cedido, salvo quando a cessão ocorrer para órgão da União,
Governadoria e Vice-Governadoria do Distrito Federal, ou Secretaria de Estado da Segurança
Pública e da Paz Social do Distrito Federal;

§ 3º A cessão à Presidência e Vice-Presidência da República, ao Gabinete de Segurança


Institucional da Presidência da República, ao Ministério da Justiça, ao Ministério da Segurança
Pública, à Presidência do Supremo Tribunal Federal, à Presidência do Tribunal de Justiça do
Distrito Federal e dos Territórios, à Governadoria e Vice-Governadoria do Distrito Federal, à
Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Paz Social do Distrito Federal e às unidades de
inteligência da administração pública federal e distrital e dos Tribunais de Contas da União e
do Distrito Federal é considerada de interesse policial civil, resguardados todos os direitos e
vantagens da carreira policial.”

Art. 13. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 14. Ficam revogados:

I - os §§ 1º e 2º do art. 23 da Lei nº 11.483, de 31 de maio de 2007; e

II - os seguintes dispositivos da Lei nº 13.502, de 1º de novembro de 2017:

a) incisos VI, IX e XI do caput e §§ 2º e 3º do art. 47; e

b) incisos I, II, VII, VIII e IX do caput do art. 48.

Brasília, 10 de julho de 2018; 197o da Independência e 130o da República.

MICHEL TEMER
Gilson Libório de Oliveira Mendes
Joaquim Silva e Luna
Valter Casimiro Silveira
Gleisson Cardoso Rubin
Eliseu Padilha
Grace Maria Fernandes Mendonça
22

STF JURISPRUDÊNCIA PROCESSUAL PENAL

2018 1º SEMESTRE:
907
Acordo de colaboração premiada e delegado de polícia

O Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta para assentar a
constitucionalidade dos §§ 2º e 6º do art. 4º (1) da Lei 12.850/2013, a qual define organização criminosa e
dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o
procedimento criminal.
A ação impugnava as expressões ―e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação
do Ministério Público‖ e ―entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do
Ministério Público, ou, conforme o caso‖, contidas nos referidos dispositivos, que conferem legitimidade ao
delegado de polícia para conduzir e firmar acordos de colaboração premiada (Informativo 888).
Prevaleceu o voto do ministro Marco Aurélio (relator), no sentido de que o delegado de polícia pode formalizar
acordos de colaboração premiada, na fase de inquérito policial, respeitadas as prerrogativas do Ministério
Público, o qual deverá se manifestar, sem caráter vinculante, previamente à decisão judicial.
No que se refere ao § 2º do art. 4º da Lei 12.850/2013, o relator esclareceu que o texto confere ao delegado de
polícia, no decorrer das investigações, exclusivamente no curso do inquérito policial, a faculdade de representar
ao juiz, ouvido o Ministério Público, pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício
não haja sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 (2) do Código de Processo
Penal (CPP). O perdão judicial é instituto que possibilita ao juiz deixar de impor sanção diante da existência de
determinadas circunstâncias expressamente previstas em lei.
Considerou que o dispositivo, portanto, traz nova causa de perdão judicial, admitido a depender da efetividade
da colaboração. Não se trata de questão afeta ao modelo acusatório, deixando de caracterizar ofensa ao art.
129, I (3), da Constituição Federal (CF), relacionada, apenas, ao direito de punir do Estado, que se manifesta
por intermédio do Poder Judiciário.
A representação pelo perdão judicial, proposta pelo delegado de polícia, ante colaboração premiada, ouvido o
Ministério Público, não é causa impeditiva do oferecimento da denúncia pelo órgão acusador. Uma vez
comprovada a eficácia do acordo, será extinta pelo juiz, a punibilidade do delator.
Quanto ao § 6º do art. 4º da mesma lei, asseverou que o ato normativo em nenhum ponto afasta a participação
do Ministério Público em acordo de colaboração premiada, ainda que ocorrido entre o delegado de polícia, o
investigado e o defensor. Não há, portanto, afronta à titularidade da ação penal. Ao contrário, a legitimidade da
autoridade policial para realizar as tratativas de colaboração premiada desburocratiza o instituto, sem importar
ofensa a regras atinentes ao Estado Democrático de Direito, uma vez submetido o acordo à apreciação do
Ministério Público e à homologação pelo Judiciário.
Embora o Ministério Público seja o titular da ação penal de iniciativa pública, não o é do direito de punir. A
delação premiada não retira do órgão a exclusividade da ação penal.
A norma fixa as balizas a serem observadas na realização do acordo. Estas, porque decorrem de lei, vinculam
tanto a polícia quanto o Ministério Público, tendo em vista que a nenhum outro órgão senão ao Judiciário é
conferido o direito de punir.
O acordo originado da delação não fixa pena ou regime de cumprimento da sanção. Ao Poder Judiciário, com
exclusividade, compete, nos termos do § 1º do art. 4º (4) da Lei 12.850/2013, para fins de concessão de
vantagens, levar em conta a personalidade do delator, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a
repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração.
Os benefícios que tenham sido ajustados não obrigam o órgão julgador, devendo ser reconhecida, na cláusula
que os retrata, inspiração, presente a eficácia da delação no esclarecimento da prática delituosa, para o juiz
atuar, mantendo a higidez desse instituto que, na quadra atual, tem-se mostrado importantíssimo. Longe fica o
julgador de estar atrelado à dicção do Ministério Público, como se concentrasse a arte de proceder na
persecução criminal, na titularidade da ação penal e, também, o julgamento, embora parte nessa mesma ação
penal.
A norma legal prevê que, na prolação da sentença, serão estipulados os benefícios. Não se confunde essa
definição, que só cabe a órgão julgador, com a propositura ou não da ação penal. No campo, é soberano o
Ministério Público. Mas, quanto ao julgamento e à observância do que se contém na legislação em termos de
vantagens, surge o primado do Judiciário. Para redução da pena, adoção de regime de cumprimento menos
gravoso ou concessão do perdão judicial, há de ter-se instaurado o processo, garantindo-se a ampla defesa e o
contraditório. Na sentença o juiz, ao verificar a eficácia da colaboração, fixa, em gradação adequada, os
benefícios a que tem direito o delator.
Concluiu que os textos impugnados versam regras claras sobre a legitimidade do delegado de polícia na
realização de acordos de colaboração premiada, estabelecendo a fase de investigações, no curso do inquérito
policial, como sendo o momento em que é possível a utilização do instrumento pela autoridade policial.
Há previsão específica da manifestação do Ministério Público em todos os acordos entabulados no âmbito da
23

polícia judiciária, garantindo-se, com isso, o devido controle externo da atividade policial já ocorrida e, se for o
caso, adoção de providências e objeções.
As normas legais encontram-se em conformidade com as disposições constitucionais alusivas às polícias
judiciárias e, especialmente, às atribuições conferidas aos delegados de polícia. Interpretação que vise
concentrar poder no órgão acusador desvirtua a própria razão de ser da Lei 12.850/2013.
A supremacia do interesse público conduz a que o debate constitucional não seja pautado por interesses
corporativos, mas por argumentos normativos acerca do desempenho das instituições no combate à
criminalidade. A atuação conjunta, a cooperação entre órgãos de investigação e de persecução penal, é de
relevância maior.
Vencidos, em parte, os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux e Dias Toffoli.
O ministro Edson Fachin julgou parcialmente procedente a ação, para, sem redução de texto, excluir a
interpretação aos §§ 2º e 6º do art. 4º da Lei 12.850/2013 que contemple poderes aos delegados de polícia
para celebrar, sem a manifestação do Ministério Público, acordo de colaboração premiada em que se estabeleça
transação envolvendo o poder punitivo estatal. E, por arrastamento, declarar como excluído da expressão ―ou do
delegado de polícia‖, constante do inciso IV do art. 6º (5) da referida lei, o sentido de firmar, sem manifestação
do Ministério Público, acordo de colaboração premiada.
Os ministros Rosa Weber e Luiz Fux julgaram improcedente o pedido principal, quanto à declaração da
inconstitucionalidade das expressões impugnadas nos §§ 2º e 6º do art. 4º da Lei 12.850/2013, e julgaram
parcialmente procedente o pedido sucessivo para dar interpretação conforme no sentido de que manifestação
positiva, ou seja, a anuência do Ministério Público aos termos de colaboração premiada celebrado pelo delegado
de Polícia é uma condição de procedibilidade da própria colaboração, ou seja, o juiz sequer dela conhece se não
houver a anuência do Ministério Público.
O ministro Dias Toffoli julgou parcialmente procedente a ação para: 1) dar interpretação conforme ao art. 4º, §
2º, da Lei 12.850/2013, para assentar a legitimidade da autoridade policial para, diante da relevância da
colaboração prestada, representar nos autos do inquérito policial ao juiz, para a concessão de perdão judicial ao
colaborador, ouvido, previamente, o Ministério Público; 2) dar interpretação conforme ao art. 4º, § 6º, da Lei
12.850/2013, para assentar a legitimidade da autoridade policial para firmar acordos de colaboração premiada,
desde de que, nas condições de sua proposta — art. 6º, II (6), da Lei 12.850/2013 —, somente figurem, de
modo genérico, as sanções premiais expressamente previstas no art. 4º, ―caput‖ e seu § 5º (7), da Lei
12.850/2013, a que poderá fazer jus o colaborador, a critério do juiz, em razão da efetividade de sua
cooperação, exigindo-se, antes de sua homologação, a manifestação, sem caráter vinculante, do Ministério
Público.

906
Condução coercitiva para interrogatório e recepção pela Constituição Federal de 1988 - 2

O Plenário, por maioria, julgou procedente o pedido formulado em arguições de descumprimento de preceito
fundamental para declarar a não recepção da expressão "para o interrogatório" constante do art. 260 (1) do
CPP, e a incompatibilidade com a Constituição Federal da condução coercitiva de investigados ou de réus para
interrogatório, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de ilicitude
das provas obtidas, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado ((Informativo 905)).
O Tribunal destacou que a decisão não desconstitui interrogatórios realizados até a data desse julgamento,
ainda que os interrogados tenham sido coercitivamente conduzidos para o referido ato processual.
Prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes (relator).
De início, o relator esclareceu que a hipótese de condução coercitiva objeto das arguições restringe-se, tão
somente, àquela destinada à condução de investigados e réus à presença da autoridade policial ou judicial para
serem interrogados. Assim, não foi analisada a condução de outras pessoas como testemunhas, ou mesmo de
investigados ou réus para atos diversos do interrogatório, como o reconhecimento.
Fixado o objeto da controvérsia, afirmou que a condução coercitiva no curso da ação penal tornou-se obsoleta.
Isso porque, a partir da Constituição Federal de 1988, foi consagrado o direito do réu de deixar de responder às
perguntas, sem ser prejudicado (direito ao silêncio). A condução coercitiva para o interrogatório foi substituída
pelo simples prosseguimento da marcha processual, à revelia do acusado [CPP, art. 367 (2)].
Entretanto, o art. 260 do CPP — conjugado ao poder do juiz de decretar medidas cautelares pessoais — vem
sendo utilizado para fundamentar a condução coercitiva de investigados para interrogatório, especialmente
durante a investigação policial, no bojo de engenhosa construção que passou a fazer parte do procedimento
padrão das investigações policiais dos últimos anos. Nessa medida, as conduções coercitivas tornaram-se um
novo capítulo na espetacularização da investigação, inseridas em um contexto de violação a direitos
fundamentais por meio da exposição de pessoas que gozam da presunção de inocência como se culpados
fossem.
Quanto à presunção de não culpabilidade (CF, art. 5º, LVII), seu aspecto relevante ao caso é a vedação de
tratar pessoas não condenadas como culpadas.
A condução coercitiva consiste em capturar o investigado ou acusado e levá-lo, sob custódia policial, à presença
da autoridade, para ser submetido a interrogatório. A restrição temporária da liberdade mediante condução sob
custódia por forças policiais em vias públicas não é tratamento que possa normalmente ser aplicado a pessoas
inocentes. Assim, o conduzido é claramente tratado como culpado.
Por outro lado, a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), prevista entre os princípios fundamentais do
estado democrático de direito, orienta seus efeitos a todo o sistema normativo, constituindo, inclusive, princípio
24

de aplicação subsidiária às garantias constitucionais atinentes aos processos judiciais.

No contexto da condução coercitiva para interrogatório, faz-se evidente que o investigado ou réu é conduzido,
eminentemente, para demonstrar sua submissão à força. Não há finalidade instrutória clara, na medida em que
o arguido não é obrigado a declarar, ou mesmo a se fazer presente ao interrogatório. Desse modo, a condução
coercitiva desrespeita a dignidade da pessoa humana.
Igualmente, a liberdade de locomoção é vulnerada pela condução coercitiva para interrogatório.
A Constituição Federal consagra o direito à liberdade de locomoção, de forma genérica, ao enunciá-lo no ―caput‖
do art. 5º. Tal direito pode ser restringido apenas se observado o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) e
obedecido o regramento estrito sobre a prisão (CF, art. 5º, LXI, LXV, LXVI, LXVII). A Constituição também
enfatiza a liberdade de locomoção ao consagrar a ação especial de ―habeas corpus‖ como remédio contra
restrições e ameaças ilegais (CF, art. 5º, LXVIII).
A condução coercitiva representa uma supressão absoluta, ainda que temporária, da liberdade de locomoção. O
investigado ou réu é capturado e levado sob custódia ao local da inquirição. Portanto, há uma clara interferência
na liberdade de locomoção, ainda que por um período determinado e limitado no tempo.
Ademais, a expressão ―para o interrogatório‖, constante do art. 260 do CPP, tampouco foi recepcionada pela
Constituição Federal, na medida em que representa restrição desproporcional da liberdade, visto que busca
finalidade não adequada ao sistema processual em vigor.
Por fim, em relação à manutenção dos interrogatórios realizados até a data desse julgamento, mesmo que o
interrogado tenha sido coercitivamente conduzido para o ato, o relator consignou ser necessário reconhecer a
inadequação do tratamento dado ao imputado, não do interrogatório em si. Argumentos internos ao processo,
como a violação ao direito ao silêncio, devem ser refutados.
Assim, não há necessidade de debater qualquer relação da decisão tomada pelo STF com os casos pretéritos,
inexistindo espaço para a modulação dos seus efeitos.
O ministro Celso de Mello acrescentou que a impossibilidade constitucional de constranger-se o indiciado ou o
réu a comparecer, mediante condução coercitiva, perante a autoridade policial ou a autoridade judiciária, para
fins de interrogatório, resulta não só do sistema de proteção das liberdades fundamentais, mas, também, da
própria natureza jurídica de que se reveste o ato de interrogatório.
Referido ato processual é qualificável como meio de defesa do acusado, especialmente em face do novo
tratamento normativo que lhe conferiu a Lei 10.792/2003. Essa particular qualificação do interrogatório como
meio de defesa permite que nele se reconheça a condição de instrumento viabilizador do exercício das
prerrogativas constitucionais do contraditório e da plenitude de defesa.
De todo modo, a ausência de colaboração do indiciado ou réu com as autoridades públicas e o exercício da
prerrogativa constitucional contra a autoincriminação não podem erigir-se em fatores subordinantes da
decretação de prisão cautelar ou da adoção de medidas que restrinjam ou afetem a esfera de liberdade jurídica
do réu.
Por fim, afirmou que não haveria como concluir que a condução coercitiva do indiciado ou do réu para
interrogatório, independentemente de prévia e regular intimação, justificar-se-ia em face do poder geral de
cautela do magistrado penal. Isso porque, diante do postulado constitucional da legalidade estrita em matéria
processual penal, inexiste, no processo penal, o poder geral de cautela dos juízes.
Vencidos, parcialmente, os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen
Lúcia (Presidente).
O ministro Alexandre de Moraes julgou parcialmente procedente o pedido formulado nas arguições para declarar
a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 260 do CPP, unicamente para excluir a
possibilidade de decretação direta da condução coercitiva sem a prévia intimação com base no poder geral de
cautela do juiz.
Considerou, assim, legitima a utilização do instituto da condução coercitiva para interrogatório, porém, desde
que o investigado não tenha atendido, injustificadamente, prévia intimação, permitida a participação do defensor
do investigado e resguardados os direitos ao silêncio e a não-autoincriminação.
O ministro Edson Fachin julgou parcialmente procedente o pedido para atribuir interpretação conforme a
Constituição Federal ao art. 260 do CPP no sentido de ressalvar a possibilidade de decretação judicial e
fundamentada da condução coercitiva em substituição a medidas cautelares típicas mais graves, como a prisão
preventiva ou a prisão temporária, desde que integralmente presentes os requisitos legais e constitucionais
dessas medidas.
Ademais, declarou a inconstitucionalidade da interpretação ampliativa do dispositivo impugnado, impondo-se a
prévia intimação e o não comparecimento injustificado do intimado para a realização da condução coercitiva.
Os ministros Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia (Presidente) acompanharam o ministro Edson Fachin.

Arresto e requisitos - 2

A Primeira Turma retomou julgamento de agravo regimental em que se discute a possibilidade de arresto prévio
de bens dos agravados, acusados da suposta prática de crime único de corrupção passiva em concurso de
agentes ((Informativo 903)).
O Ministério Público sustenta o cabimento do arresto como medida preliminar e preparatória à especialização da
hipoteca legal para assegurar que o patrimônio encontrado em nome dos agravados garanta a reparação do
dano moral e material causado pela conduta.
Em voto-vista, o ministro Roberto Barroso divergiu, em parte, do relator e deu provimento parcial ao agravo, no
que foi acompanhado pela ministra Rosa Weber.
25

Admitiu a indisponibilidade dos bens dos agravados para efeito de arresto assecuratório do pagamento de multa
penal na eventual condenação dos réus.
As medidas assecuratórias têm por objetivo assegurar não apenas a reparação do dano, mas também o
pagamento das despesas processuais e as penas pecuniárias em caso de eventual condenação [CPP, art. 140
(1)]. Deste modo, é razoável a incidência do arresto em relação ao valor da multa. Essas medidas levam em
conta o risco da ineficácia da sanção judicial, diante da possibilidade de o futuro condenado dilapidar seu
patrimônio antes da cobrança judicial.
Para que seja autorizada a decretação da medida não é necessária a prática de atos concretos de desfazimento
de bens. Porém, é imperiosa a demonstração da plausibilidade do direito e do perigo na demora. A
indisponibilidade dos bens não trará prejuízos desarrazoados aos réus, pois, se absolvidos ao fim do processo,
terão seus bens desbloqueados.
No que se refere ao arresto dos bens em relação aos possíveis danos morais coletivos, o ministro Roberto
Barroso acompanhou o relator. Afirmou não haver pronunciamento do Supremo Tribunal Federal a respeito da
possibilidade jurídica de reparação de danos morais coletivos, notadamente quando decorrentes de atos de
improbidade administrativa ou de corrupção. Assim, não é, por hora, cabível a medida assecuratória em relação
a essa espécie de dano.
Em seguida, o ministro Luiz Fux pediu vista dos autos.

905
Condução coercitiva para interrogatório e recepção pela Constituição Federal de 1988

O Plenário iniciou julgamento de arguições de descumprimento de preceito fundamental em que se discute a


legitimidade de decisões judiciais que determinam a condução coercitiva de investigados ou réus para serem
interrogados em procedimentos criminais, na forma do art. 260(1) do Código de Processo Penal (CPP).
O ministro Gilmar Mendes (relator) julgou procedentes os pedidos formulados nas arguições para declarar a não
recepção da expressão ―para o interrogatório‖, constante do art. 260 do CPP, e a incompatibilidade com a
Constituição Federal (CF) da condução coercitiva de investigados ou de réus para interrogatório, sob pena de
responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de ilicitude das provas obtidas, sem
prejuízo da responsabilidade civil do Estado.
De início, o relator esclareceu que a hipótese de condução coercitiva objeto das arguições em comento
restringe-se, tão somente, àquela destinada à condução de investigados e réus à presença da autoridade policial
ou judicial para serem interrogados. Assim, não será analisada a condução de outras pessoas como
testemunhas, ou mesmo de investigados ou réus para atos diversos do interrogatório, como o reconhecimento.
Fixado o objeto da controvérsia, afirmou que a condução coercitiva no curso da ação penal tornou-se obsoleta.
Isso porque, a partir da Constituição Federal de 1988, foi consagrado o direito do réu de deixar de responder às
perguntas, sem ser prejudicado (direito ao silêncio). A condução coercitiva para o interrogatório foi substituída
pelo simples prosseguimento da marcha processual, à revelia do acusado [CPP, art. 367(2)].
Entretanto, o art. 260 do CPP — conjugado ao poder do juiz de decretar medidas cautelares pessoais — vem
sendo utilizado para fundamentar a condução coercitiva de investigados para interrogatório, especialmente
durante a investigação policial, no bojo de engenhosa construção que passou a fazer parte do procedimento
padrão das investigações policiais dos últimos anos. Nessa medida, as conduções coercitivas tornaram-se um
novo capítulo na espetacularização da investigação, inserida num contexto de violação a direitos fundamentais
por meio da exposição de pessoas que gozam da presunção de inocência como se culpados fossem.
Quanto à presunção de não culpabilidade (CF, art. 5º, LVII), seu aspecto relevante ao caso é a vedação de
tratar pessoas não condenadas como culpadas.
A condução coercitiva consiste em capturar o investigado ou acusado e levá-lo sob custódia policial à presença
da autoridade, para ser submetido a interrogatório. A restrição temporária da liberdade mediante condução sob
custódia por forças policiais em vias públicas não é tratamento que normalmente possa ser aplicado a pessoas
inocentes. Assim, o conduzido é claramente tratado como culpado.
Por outro lado, a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), prevista entre os princípios fundamentais do
estado democrático de direito, orienta seus efeitos a todo o sistema normativo, constituindo, inclusive, princípio
de aplicação subsidiária às garantias constitucionais atinentes aos processos judiciais.
No contexto da condução coercitiva para interrogatório, faz-se evidente que o investigado ou réu é conduzido
eminentemente para demonstrar sua submissão à força. Não há finalidade instrutória clara, na medida em que o
arguido não é obrigado a declarar, ou mesmo a se fazer presente ao interrogatório. Desse modo, a condução
coercitiva desrespeita a dignidade da pessoa humana.
Igualmente, a liberdade de locomoção é vulnerada pela condução coercitiva para interrogatório.
A Constituição Federal consagra o direito à liberdade de locomoção, de forma genérica, ao enunciá-lo no ―caput‖
do art. 5º. Tal direito pode ser restringido apenas se observado o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) e
obedecido o regramento estrito sobre a prisão (CF, art. 5º, LXI, LXV, LXVI, LXVII). A Constituição também
enfatiza a liberdade de locomoção ao consagrar a ação especial de ―habeas corpus‖ como remédio contra
restrições e ameaças ilegais (CF, art. 5º, LXVIII).
A condução coercitiva representa uma supressão absoluta, ainda que temporária, da liberdade de locomoção. O
investigado ou réu é capturado e levado sob custódia ao local da inquirição. Portanto, há uma clara interferência
na liberdade de locomoção, ainda que por um período determinado e limitado no tempo.
Ademais, a expressão ―para o interrogatório‖, constante do art. 260 do CPP, tampouco foi recepcionada pela
Constituição Federal, na medida em que representa uma restrição desproporcional da liberdade, visto que busca
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uma finalidade não adequada ao sistema processual em vigor.

Além disso, mesmo para quem considere a condução coercitiva para interrogatório possível, há que se exigir a
rigorosa observância da integralidade do art. 260 do CPP, ou seja, intimação prévia para comparecimento não
atendida.
Por fim, o relator registrou que a declaração de não recepção da condução coercitiva de investigados ou de réus
para interrogatório não tem o condão de desconstituir interrogatórios realizados até a data do julgamento em
questão, mesmo que o interrogado tenha sido coercitivamente conduzido para o ato. Há que se reconhecer a
inadequação do tratamento dado ao imputado, não do interrogatório em si. Argumentos internos ao processo,
como a violação ao direito ao silêncio, devem ser refutados.
Assim, não há necessidade de debater qualquer relação da decisão eventualmente tomada pelo STF com os
casos pretéritos, inexistindo espaço para a modulação dos seus efeitos. Em seguida, o julgamento foi suspenso.

Legitimidade ativa do Ministério Público e crime de estupro sem lesão corporal

Trata-se de recurso ordinário em ―habeas corpus‖, interposto contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça, em
que se discute a nulidade do processo por ilegitimidade do Ministério Público (MP) para propor ação penal nos
casos de crime de estupro sem lesão corporal [art. 213(1), Código Penal].
A defesa alegou que, de acordo com o Enunciado 608(2) da Súmula do Supremo Tribunal Federal, a violência
real praticada no crime de estupro estaria vinculada à existência de lesão corporal, a qual não ficou comprovada
no exame de corpo de delito. O MP não teria, assim, legitimidade para ajuizar a ação penal, pois, nos crimes
contra a liberdade sexual sem violência real, a ação penal pública está condicionada à representação. O processo
seria, portanto, nulo desde o início.
Com base nas especificidades do caso, a Segunda Turma negou provimento ao recurso.

904
Homicídio na direção de veículo automotor e competência do tribunal do júri

A Primeira Turma, por maioria, denegou a ordem de ―habeas corpus‖ em que se pleiteava a reforma da decisão
que reconheceu a ocorrência de dolo eventual em relação a homicídio cometido por motorista embriagado na
direção de veículo automotor, firmada a competência do tribunal do júri.
O impetrante apontava equívoco no enquadramento legal realizado na origem. Pleiteava a desclassificação da
conduta para o crime previsto no art. 302(1) do Código de Trânsito Brasileiro.
O Colegiado considerou legítima a tipificação da conduta como crime doloso, de competência do tribunal do júri,
ante o reconhecimento da evolução jurisprudencial na análise do que vem a ser dolo eventual e culpa
consciente.
No caso, verifica-se a existência de dolo eventual no ato de dirigir veículo automotor sob a influência de álcool,
além de fazê-lo na contramão. Esse é, portanto, um caso específico que evidencia a diferença entre a culpa
consciente e o dolo eventual. O condutor assumiu o risco ou, no mínimo, não se preocupou com o risco de,
eventualmente, causar lesões ou mesmo a morte de outrem.
Vencidos, em parte, os ministros Marco Aurélio (relator) e Luiz Fux, que deferiram a ordem para desclassificar a
conduta imputada ao paciente para a prevista no art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro, ante a aplicação dos
princípios da especialidade e da legalidade.

Corrupção passiva e lavagem de dinheiro - 3

A Segunda Turma, em conclusão de julgamento, condenou parlamentar pela prática dos crimes de corrupção
passiva [Código Penal (CP), art. 317(1) ] e lavagem de dinheiro [Lei 9.613/1998, art. 1º, § 4º(2)], e seus filhos
pelo segundo delito (Informativo 902 e Informativo 903).
Na denúncia, o parlamentar, na qualidade de integrante de cúpula partidária, foi acusado de ter concorrido para
desvios de recursos realizados na estatal, por meio de apoio político à indicação e manutenção de diretor
naquela entidade, o qual lhe teria repassado valores ilícitos, como contraprestação.
Para o Colegiado, os acusados efetivamente cometeram os crimes cuja prática lhes foi atribuída, embora em
extensão menor do que a descrita na denúncia. O juízo condenatório se impõe, considerada a existência de
provas da autoria e da materialidade dos fatos delituosos, bem como do nexo de causalidade entre a conduta
desses acusados e os resultados.
Ressaltou que o regime presidencialista brasileiro confere aos parlamentares um espectro de poder que vai além
da mera deliberação de atos legislativos, com participação nas decisões de governo, inclusive por meio da
indicação de cargos no Poder Executivo. Essa dinâmica é própria do sistema presidencialista brasileiro, que exige
uma coalizão para viabilizar a governabilidade.
A despeito desse ―presidencialismo de coalizão‖, a Constituição Federal (CF) atribui ao Congresso Nacional (CN)
competência exclusiva para fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do
Executivo, incluídos os da Administração Indireta [CF, art. 49, X(3)].
Nesse âmbito, o CN foi dotado de poderes próprios de autoridade judicial, quando instituídas comissões
parlamentares de inquérito para apuração de fatos determinados, com encaminhamento de suas conclusões ao
Ministério Público para responsabilização civil e criminal de infratores [CF, art. 58, § 3º(4)].
Ademais, para evitar conflitos de interesses, aos deputados e senadores é constitucionalmente vedado, desde a
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expedição do diploma: ―a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa
pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato
obedecer a cláusulas uniformes; e b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de
que sejam demissíveis "ad nutum", nas entidades constantes da alínea anterior.‖ [CF, art. 54, I, ―a‖ e ―b‖(5)].
Nesse contexto institucional, a percepção de vantagens indevidas, oriundas de desvios perpetrados no âmbito de
entidades da Administração Indireta, em troca de sustentação política a detentores de poder de gestão nessas
instituições, implica evidente ato omissivo quanto à função parlamentar de fiscalizar a lisura dos atos do Poder
Executivo.
Quanto à corrupção passiva, a integral realização de sua estrutura típica exige uma relação entre a conduta do
agente — que solicita, ou que recebe, ou que aceita a promessa de vantagem indevida — e a prática, que até
pode não ocorrer, de um ato determinado de seu ofício.
O exercício ilegítimo da atividade parlamentar, mesmo num governo de coalizão, é apto a caracterizar o ato de
ofício viciado que tipifica o delito, se motivado pela solicitação, aceitação ou recebimento de vantagem indevida.
Esse tipo penal tutela a moralidade administrativa e tem por finalidade coibir e reprimir a mercancia da função
pública, cujo exercício deve ser pautado exclusivamente pelo interesse público. Não se trata simplesmente de
criminalizar a atividade político-partidária, mas de responsabilizar os atos que transbordam os limites do
exercício legítimo da representação popular.
No caso, a Turma entendeu ter ficado comprovado que a sustentação política assegurada pelo parlamentar, em
favor da manutenção do diretor da estatal, configurou ato de ofício para fins de enquadramento no crime de
corrupção passiva.
A denúncia apontou que os réus teriam praticado diversos atos de corrupção. De um lado, o parlamentar teria
concorrido, em concurso de pessoas, com todos os desvios praticados pelo diretor da companhia. De outro, os
réus teriam recebido vantagens indevidas por meio de pagamentos: (a) periódicos (ordinários); (b) esporádico
(extraordinário); e (c) por meio de doação eleitoral oficial.
Quanto à coautoria, o conjunto probatório produzido nos autos é insuficiente para confirmar a adesão subjetiva
do parlamentar aos atos de corrupção praticados pelo diretor, embora tenha se beneficiado de vantagens
indevidas, e ainda que seja provável a sua ciência do estratagema criminoso. Essa circunstância impede a
incidência da norma de extensão prevista no art. 29(6) do CP.
No tocante à imputação de recebimentos periódicos (ordinários) de vantagens indevidas, o quadro probatório é
diverso e robusto. Os depoimentos prestados em juízo por colaboradores são uníssonos, coesos e firmes em
afirmar que o deputado recebeu vantagens indevidas, que lhes eram disponibilizadas mediante a entrega de
dinheiro em espécie.
Embora apenas as declarações dos colaboradores, de forma isolada, não sirvam para fundamentar um decreto
condenatório, nos exatos termos do que preceitua o art. 4º, § 16(7), da Lei 12.850/2013, os fatos retratados
encontram consistente suporte em outros elementos de prova (cruzamento de dados de companhias aéreas;
afastamento de sigilo bancário; perícias em sistemas de contabilidade de pagamentos de propina; depoimentos
de testemunhas; e quebra e disponibilização de dados telefônicos), produzidos sob o crivo do contraditório.
Esse conjunto de provas atesta e reforça a veracidade das declarações prestadas no âmbito de colaboração
premiada e autoriza a sua utilização como fundamento à resolução do mérito da causa penal.
Desse modo, a Segunda Turma concluiu que tais provas confirmam a tese acusatória exposta na exordial e
afastam qualquer dúvida acerca do efetivo recebimento pelo parlamentar de vantagens indevidas de forma
ordinária e periódica, o qual contou com o auxílio de seus filhos em algumas oportunidades.
No que se refere ao recebimento esporádico (extraordinário), a Procuradoria-Geral da República (PGR) apontou
que o parlamentar teria recebido pagamento vultoso destinado a campanha eleitoral.
Embora coerente com as descrições fáticas prestadas pelos colaboradores, essa acusação não encontra respaldo
em outras provas produzidas na instrução criminal, circunstância que encaminha à dúvida, o que impede o seu
uso para a formação do juízo de mérito da causa penal, conforme vedação legal (7).
Nesse ponto, portanto, a PGR não se desincumbiu do ônus que lhe é imposto pelo art. 156(8) do Código de
Processo Penal (CPP), sendo inviável o acolhimento da pretensão requerida na exordial acusatória.
Por fim, o Colegiado, por maioria, absolveu o parlamentar da acusação relativa ao recebimento de doação
eleitoral oficial, que foi materializada de acordo com a legislação aplicável e regularmente declarada na
prestação de contas eleitoral. Ao contrário do apontado na denúncia, não se trata de negócio jurídico simulado,
o qual teria sido realizado para encobrir a verdadeira finalidade da transferência de recursos.
Com relação ao crime de lavagem de dinheiro, o ―Parquet‖ apontou que os réus teriam contribuído para as
ações de lavagem de capitais, tanto nos desvios operacionalizados no âmbito da diretoria da Petrobras quanto
nas vantagens indevidas por eles percebidas em consequência dos atos de corrupção passiva supostamente
praticados.
De início, a Turma reafirmou a jurisprudência deste STF no sentido de que a percepção de valor indevido, por
parte do próprio sujeito ativo do delito de corrupção passiva ou por interposta pessoa pode configurar o delito
de lavagem de capitais. Esse enquadramento pressupõe a prática de atos autônomos de ocultação do produto
do crime antecedente, já consumado (INQ 2.471; AP 470 e AP 694).
Impende destacar que o crime de lavagem de dinheiro é autônomo em relação à infração penal antecedente,
sendo perfeitamente possível que o autor do ilícito anterior seja o mesmo do crime de lavagem de capitais,
tendo em vista que não há, na legislação brasileira, qualquer vedação à chamada ―autolavagem‖ (HC 92.279).
O parlamentar, entretanto, foi absolvido no que tange à participação em todos os crimes de lavagem de dinheiro
praticados em decorrência de contratos celebrados por empresas cartelizadas no âmbito de diretoria da estatal
[CPP, art. 386, VII(9)].
Nos casos em que se atribui determinada prática delitiva em concurso de pessoas, é imprescindível que se
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verifique a existência do vínculo subjetivo na conduta dos agentes consorciados, bem como a relevância causal
da atuação de cada um deles na violação do bem jurídico tutelado pela norma penal, sob pena de não incidência
do referido preceito extensivo, diante da impossibilidade de responsabilização penal objetiva.
No que se refere à apontada lavagem do produto da corrupção passiva correspondente aos recebimentos
periódicos (ordinários) de vantagens indevidas, o conjunto cognitivo dos autos não permite a escorreita
identificação de todos os atos de branqueamento atribuídos aos acusados.
De um lado, os réus foram absolvidos das imputações relativas aos crimes de lavagem de capitais
consubstanciados nos recebimentos em dinheiro em espécie [CPP, art. 386, III(10)]. O ato de mero recebimento
de valores em dinheiro não tipifica o delito de lavagem, seja quando recebido por interposta pessoa ou pelo
próprio agente público que acolhe a remuneração indevida.
Por outro lado, a Turma entendeu que o depósito fracionado do dinheiro em conta corrente, em valores que não
atingem os limites estabelecidos pelas autoridades monetárias à comunicação compulsória dessas operações, é
meio idôneo para a consumação do crime de lavagem. Trata-se de modalidade de ocultação da origem e da
localização de vantagem pecuniária recebida pela prática de delito anterior.
Nesse escopo, ficou demonstrado que o deputado, logo após receber recursos em espécie a título de propina,
praticou, de modo autônomo e com finalidade distinta, novos atos aptos a violar o bem jurídico tutelado pelo art.
1º(2) da Lei 9.613/1998, consistentes na realização de depósitos fracionados em conta de sua titularidade, cujo
somatório perfaz a exata quantia que lhe fora disponibilizada.
No mais, pontuou que ficou demonstrada a incompatibilidade entre os rendimentos auferidos pelo parlamentar
com as quantias movimentadas em suas contas-correntes e os valores em espécie declarados à Receita Federal,
o que caracteriza a formação dolosa de patrimônio supostamente ―lícito‖, conduta que se amolda perfeitamente
ao delito de lavagem de dinheiro.
A apresentação de informações falsas em declarações de ajuste anual de imposto de renda foi uma forma de
tentar dar um ar de licitude a patrimônio oriundo de práticas delituosas.
Por último, o parlamentar foi absolvido da acusação de lavagem de capitais em decorrência de doação eleitoral.
Ainda que eventualmente o valor oficialmente doado fosse produto de crime contra a administração pública, não
há prova segura de que: (a) o réu tivesse ciência de sua origem espúria e (b) tivesse agido com o dolo de
dissimular essa origem e de promover sua reintegração na economia formal.
Em relação aos efeitos da condenação, a Turma fixou danos materiais, mas indeferiu pedido de danos morais
coletivos. Ademais, determinou: (a) a perda de bens e direitos objeto da condenação, ressalvado o direito de
lesado ou terceiro de boa-fé [Lei 9.613/1998, art. 7º, I(11)]; e (b) a interdição para o exercício de cargo ou
função pública [Lei 9.613/1998, art. 7º, II(12)].
Por fim, quanto à perda do mandato parlamentar, o Colegiado, por maioria, deliberou que a perda do mandato
não é automática. Após o trânsito em julgado, cumpre a esta Corte oficiar à Mesa Diretora da Câmara dos
Deputados para que delibere a respeito do disposto no art. 55, VI, § 2º(13), da CF. A perda do mandato é
medida excepcional e o modo de sua extinção é regulado expressamente na CF.
Vencidos, parcialmente, os ministros Edson Fachin e Celso de Mello, que também condenaram o deputado pelo
crime de corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo recebimento de doação eleitoral oficial. Para eles, a
doação eleitoral oficial, quando comprovadamente destituída da gratuidade que a qualifica, configura não só o
delito de corrupção passiva, mas também o de lavagem de capitais, pois materializa a ação de ocultar ou
dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou
valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.
Vencido, também parcialmente, o ministro Ricardo Lewandowski, que condenou o parlamentar em menor
extensão, apenas com relação aos delitos de corrupção passiva praticados ao tempo em que exercia liderança
partidária (de 1º.2.2011 a 11.8.2011), quando teria efetivo poder para praticar os atos de ofício imputados, sob
pena de responsabilização objetiva.

903
Arresto e requisitos

A Primeira Turma iniciou julgamento de agravo regimental em que se discute a possibilidade de arresto de bens
dos agravados, acusados da suposta prática de crime único de corrupção passiva em concurso de agentes.
O Ministério Público sustenta cabível o arresto como medida preliminar e preparatória à especialização da
hipoteca legal para assegurar que o patrimônio encontrado em nome dos agravados garanta a reparação do
dano moral e material causado pela conduta.
O ministro Marco Aurélio (relator) desproveu o agravo. Em relação ao pedido de arresto, considerou não haver
indicativos de que os agravados estão praticando atos voltados a obstar o ressarcimento de eventuais prejuízos,
requisito necessário ao implemento da medida.
Em seguida, o ministro Roberto Barroso pediu vista dos autos.
Pet 7069 AgR/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 22.5.2018. (Pet-7069)

Corrupção passiva e lavagem de dinheiro - 2

A Segunda Turma retomou julgamento de ação penal em que se imputa a prática dos crimes de corrupção
passiva [Código Penal (CP), art. 317 (1)] e lavagem de dinheiro [Lei 9.613/1998, art. 1º, § 4º (2)] a deputado
federal e seus dois filhos, pelo suposto recebimento de vantagens ilícitas provenientes de contratos de
29

empreiteiras com a Petrobras (Informativo 902).

No caso, o parlamentar, na qualidade de integrante de cúpula partidária, foi acusado de ter concorrido para
desvios de recursos realizados na estatal, por meio de apoio político à indicação e manutenção de diretor
naquela entidade, o qual lhe teria repassado valores ilícitos, como contraprestação.
De início, o Colegiado rejeitou as alegadas preliminares de cerceamento de defesa e violação ao devido processo
legal, tendo em vista que as decisões proferidas no curso deste processo estão em consonância com a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).
Quanto ao mérito, os ministros Edson Fachin (relator) e Celso de Mello (revisor) julgaram procedente a
denúncia, em parte, para condenar o parlamentar pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, e os
demais réus pelo segundo delito.
Para eles, os acusados efetivamente cometeram os crimes cuja prática lhes foi atribuída, embora em extensão
menor do que a descrita na denúncia. O juízo condenatório se impõe, considerada a existência de provas da
autoria e da materialidade dos fatos delituosos, bem como do nexo de causalidade entre a conduta desses
acusados e os resultados.
Ressaltaram que o regime presidencialista brasileiro confere aos parlamentares um espectro de poder que vai
além da mera deliberação de atos legislativos, com participação nas decisões de governo, inclusive por meio da
indicação de cargos no Poder Executivo. Essa dinâmica é própria do sistema presidencialista brasileiro, que exige
uma coalizão para viabilizar a governabilidade.
A despeito desse ―presidencialismo de coalizão‖, a Constituição Federal (CF) atribui ao Congresso Nacional (CN)
competência exclusiva para fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do
Executivo, incluídos os da Administração Indireta [CF, art. 49, X (3)].
Nesse âmbito, o CN foi dotado de poderes próprios de autoridade judicial, quando instituídas comissões
parlamentares de inquérito para apuração de fatos determinados, com encaminhamento de suas conclusões ao
Ministério Público para responsabilização civil e criminal de infratores [CF, art. 58, § 3º (4)].
Ademais, para evitar conflitos de interesses, aos deputados e senadores é constitucionalmente vedado, desde a
expedição do diploma: ―a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa
pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato
obedecer a cláusulas uniformes; e b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de
que sejam demissíveis "ad nutum", nas entidades constantes da alínea anterior.‖ [CF, art. 54, I, ―a‖ e ―b‖ (5)].
Nesse contexto institucional, a percepção de vantagens indevidas, oriundas de desvios perpetrados no âmbito de
entidades da Administração Indireta, em troca de sustentação política a detentores de poder de gestão nessas
instituições, implica evidente ato omissivo quanto à função parlamentar de fiscalizar a lisura dos atos do Poder
Executivo.
Quanto à corrupção passiva, a integral realização de sua estrutura típica exige uma relação entre a conduta do
agente – que solicita, ou que recebe, ou que aceita a promessa de vantagem indevida – e a prática, que até
pode não ocorrer, de um ato determinado de seu ofício.
O exercício ilegítimo da atividade parlamentar, mesmo num governo de coalizão, é apto a caracterizar o ato de
ofício viciado que tipifica o delito, se motivado pela solicitação, aceitação ou recebimento de vantagem indevida.
Esse tipo penal tutela a moralidade administrativa e tem por finalidade coibir e reprimir a mercancia da função
pública, cujo exercício deve ser pautado exclusivamente pelo interesse público. Não se trata simplesmente de
criminalizar a atividade político-partidária, mas de responsabilizar os atos que transbordam os limites do
exercício legítimo da representação popular.
No caso, tanto o relator quanto o revisor entenderam ter ficado comprovado que a sustentação política
assegurada pelo parlamentar, em favor da manutenção do diretor da estatal, configurou ato de ofício para fins
de tipificação do crime de corrupção passiva.
A denúncia apontou que os réus teriam praticado diversos atos de corrupção. De um lado, o parlamentar teria
concorrido, em concurso de pessoas, com todos os desvios praticados pelo diretor da companhia. De outro, os
réus teriam recebido vantagens indevidas por meio de pagamentos: (a) periódicos (ordinários); (b) esporádico
(extraordinário); e (c) por meio de doação eleitoral oficial.
Quanto à coautoria, os ministros entenderam que o conjunto probatório produzido nos autos é insuficiente para
confirmar a adesão subjetiva do parlamentar aos atos de corrupção praticados pelo diretor, embora tenha se
beneficiado de vantagens indevidas, e ainda que seja provável a sua ciência do estratagema criminoso. Essa
circunstância impede a incidência da norma de extensão prevista no art. 29 (6) do CP.
No tocante à imputação de recebimentos periódicos (ordinários) de vantagens indevidas, o quadro probatório é
diverso e robusto. Os depoimentos prestados em juízo por colaboradores são uníssonos, coesos e firmes em
afirmar que o deputado recebeu vantagens indevidas, que lhes eram disponibilizadas mediante a entrega de
dinheiro em espécie.
Embora apenas as declarações dos colaboradores, de forma isolada, não sirvam para fundamentar um decreto
condenatório, nos exatos termos do que preceitua o art. 4º, § 16 (7), da Lei 12.850/2013, os fatos retratados
encontram consistente suporte em outros elementos de prova (cruzamento de dados de companhias aéreas;
afastamento de sigilo bancário; perícias em sistemas de contabilidade de pagamentos de propina; depoimentos
de testemunhas; e quebra e disponibilização de dados telefônicos), produzidos sob o crivo do contraditório.
Esse conjunto de provas atesta e reforça a veracidade das declarações prestadas no âmbito de colaboração
premiada e autoriza a sua utilização como fundamento à resolução do mérito da causa penal.
Desse modo, os ministros concluíram que tais provas confirmam a tese acusatória exposta na exordial e afastam
qualquer dúvida acerca do efetivo recebimento pelo parlamentar de vantagens indevidas de forma ordinária e
periódica, o qual contou com o auxílio de seus filhos em algumas oportunidades.
30

No que se refere ao recebimento esporádico (extraordinário), a Procuradoria-Geral da República (PGR) apontou


que o parlamentar teria recebido pagamento vultoso destinado a campanha eleitoral.
Embora coerente com as descrições fáticas prestadas pelos colaboradores, essa acusação não encontra respaldo
em outras provas produzidas na instrução criminal, circunstância que encaminha à dúvida, o que impede o seu
uso para a formação do juízo de mérito da causa penal, conforme vedação legal (7).
Nesse ponto, portanto, a PGR não se desincumbiu do ônus que lhe é imposto pelo art. 156 (8) do Código de
Processo Penal (CPP), sendo inviável o acolhimento da pretensão requerida na exordial acusatória.
Por fim, os ministros concordaram que o recebimento de doação eleitoral oficial representou um negócio jurídico
simulado, realizado para encobrir a verdadeira finalidade da transferência de recursos, que seria a de pagar
vantagem indevida com vistas a manter cartel de empreiteiras no âmbito da estatal. Essa conclusão está
lastreada em farto conjunto probatório.
À época dos fatos, ainda que fosse permitida doação eleitoral feita por pessoa jurídica, a legitimidade do ato
pressupunha a livre manifestação de vontade do doador em apoiar ideias e projetos divulgados pelo candidato
donatário, como corolário do exercício da cidadania que fundamenta o Estado Democrático de Direito em que se
constitui a República Federativa do Brasil.
Se os motivos que derem ensejo à doação violarem determinado bem jurídico tutelado, o fato de ter sido
registrada e chancelada pela Justiça Eleitoral não afasta a incidência do tipo penal. Caso a doação represente
adimplemento de vantagem negociada no contexto de prática delitiva, passa a ser qualificada como liberalidade
indevida, pois viciada pela simulação que a nulifica, nos termos do art. 167, § 1º, II (9), do Código Civil (CC).
Com relação ao crime de lavagem de dinheiro (2), o ―Parquet‖ apontou que os réus teriam contribuído para as
ações de lavagem de capitais, tanto nos desvios operacionalizados no âmbito da diretoria da Petrobras quanto
nas vantagens indevidas por eles percebidas, em consequência dos atos de corrupção passiva supostamente
praticados.
Os ministros relator e revisor reafirmaram jurisprudência deste STF no sentido de que a percepção de valor
indevido, por parte do próprio sujeito ativo do delito de corrupção passiva ou por interposta pessoa pode
configurar o delito de lavagem de capitais. Esse enquadramento pressupõe a prática de atos autônomos de
ocultação do produto do crime antecedente, já consumado (INQ 2.471/SP; AP 470/MG; e AP 694/MT).
Impende destacar que o crime de lavagem de dinheiro é autônomo em relação à infração penal antecedente,
sendo perfeitamente possível que o autor do ilícito anterior seja o mesmo do crime de lavagem de capitais,
tendo em vista que não há, na legislação brasileira, qualquer vedação à chamada ―autolavagem‖ (HC
92.279/RN).
Com base nesses entendimentos, os ministros refutaram a denúncia na parte relativa à suposta lavagem
praticada em coautoria com diretor da Petrobras. Nos casos em que se atribui determinada prática delitiva em
concurso de pessoas, é imprescindível que se verifique a existência do vínculo subjetivo na conduta dos agentes
consorciados, bem como a relevância causal da atuação de cada um deles na violação do bem jurídico tutelado
pela norma penal, sob pena de não incidência do referido preceito extensivo, diante da impossibilidade de
responsabilização penal objetiva.
No que se refere à apontada lavagem do produto da corrupção passiva correspondente aos recebimentos
periódicos (ordinários) de vantagens indevidas, o conjunto cognitivo dos autos não permite a escorreita
identificação de todos os atos de branqueamento atribuídos aos acusados.
De um lado, o ato de mero recebimento de valores em espécie não tipifica o delito de lavagem, seja quando
recebido por interposta pessoa ou pelo próprio agente público que acolhe a remuneração indevida.
Por outro lado, o depósito fracionado do dinheiro em conta corrente, em valores que não atingem os limites
estabelecidos pelas autoridades monetárias à comunicação compulsória dessas operações, é meio idôneo para a
consumação do crime de lavagem. Trata-se de modalidade de ocultação da origem e da localização de vantagem
pecuniária recebida pela prática de delito anterior.
Nesse escopo, ficou demonstrado que o acusado, logo após receber recursos em espécie a título de propina,
praticou, de modo autônomo e com finalidade distinta, novos atos aptos a violar o bem jurídico tutelado pelo art.
1º (2) da Lei 9.613/1998, consistentes na realização de depósitos fracionados em conta de sua titularidade, cujo
somatório perfaz a exata quantia que lhe fora disponibilizada.
No mais, os ministros convergiram para considerar que ficou demonstrada a incompatibilidade entre os
rendimentos auferidos pelo parlamentar com as quantias movimentadas em suas contas-correntes e os valores
em espécie declarados à Receita Federal, o que caracteriza a formação dolosa de patrimônio supostamente
―lícito‖, conduta que se amolda perfeitamente ao delito de lavagem de dinheiro.
A apresentação de informações falsas em declarações de ajuste anual de imposto de renda era uma forma de
tentar dar um ar de licitude a um patrimônio que, na verdade, era oriundo de práticas delituosas.
Por último, consideraram que a doação eleitoral oficial, quando comprovadamente destituída da gratuidade que
a qualifica, configura não só o delito de corrupção passiva, mas também o de lavagem de capitais, pois
materializa a ação de ―ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou
propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal‖ (Lei
9.613/1998; art. 1º, ―caput‖ (2)).
Apesar de reconhecerem a divergência existente sobre o tema no âmbito do STF, os ministros entenderam que
se cuida de delito por meio do qual o agente, em razão da vantagem indevida obtida como produto de prática
ilícita anterior, busca dar-lhe ares de licitude para viabilizar a sua fruição, a par de qualquer embaraço legal.
É plenamente viável que o agente corrompido negocie com o seu corruptor e que o adimplemento da vantagem
indevida se dê mediante a prática de ato aparentemente lícito, como é o caso de uma doação eleitoral oficial.
Nessa hipótese, de forma induvidosa, estaria configurado o crime de lavagem de capitais, diante da flagrante
31

inexistência da predisposição do particular em efetuar a liberalidade.

Com base nessas premissas, entenderam que a conduta atribuída ao parlamentar se amolda perfeitamente ao
delito de lavagem de dinheiro, pois ficou demonstrado que recebeu vantagem indevida para a prática de ato de
ofício sob a roupagem de doação eleitoral oficial.
Em seguida, o julgamento foi suspenso.

902
Ministério Público e tempestividade de agravo em processo criminal

A Primeira Turma concedeu a ordem de ―habeas corpus‖, com base no art. 39 (1) da Lei 8.038/1990, para
declarar a intempestividade de agravo regimental interposto pelo Ministério Público no Superior Tribunal de
Justiça (STJ) e reestabelecer as penas impostas pelo juízo de segundo grau, que foram aumentadas a partir do
acolhimento do recurso.
A Turma afirmou que o prazo para interposição de agravo pelo Estado-acusador em processo criminal é de cinco
dias (RE 94.013/DF). O Ministério Público não possui, em matéria criminal, ao contrário da Defensoria Pública, a
prerrogativa de prazo recursal em dobro.

HC 120275/PR, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 15.5.2018. (HC-120275)

Pronúncia e devido processo legal

A Primeira Turma indeferiu a ordem de ―habeas corpus‖ em que se discutia a nulidade absoluta de pronúncia.
A defesa sustentava a nulidade absoluta do feito, em razão da ausência das alegações finais por abandono da
causa pelo advogado. Sustentava, também, a violação ao devido processo legal, diante da modificação da tese
acusatória em plenário, sem que tivesse sido oportunizado o exercício do contraditório.
A Turma entendeu não ter ocorrido nulidade processual, tendo em vista que, na audiência de instrução, a defesa
técnica postulou a impronúncia. Além disso, não constatou ilegalidade. Afirmou haver correlação entre o que foi
arguido pelo Estado-acusador em plenário e a pronúncia.
HC 129.263/RS, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 15.5.2018. (HC-129263)

Corrupção passiva e lavagem de dinheiro

A Segunda Turma iniciou julgamento de ação penal em que se imputa a prática dos crimes de corrupção passiva
[Código Penal (CP), art. 317 (1)] e lavagem de dinheiro [Lei 9613/1998, art. 1º, § 4º (2)] a parlamentar e seus
filhos, pelo suposto recebimento de vantagens ilícitas provenientes de contratos de empreiteiras com a
Petrobras.
A denúncia fora recebida, em parte, por esta Turma, com exclusão apenas da causa geral de aumento de pena
prevista no art. 327, § 2º (3), do CP, incabível pelo mero exercício do mandato popular (Inq 3.997/DF).
Na sessão de hoje, os ministros Edson Fachin (relator) e Celso de Mello (revisor) votaram pela rejeição de todas
as questões preliminares arguidas pela defesa, por meio das quais apontou cerceamento de defesa e violação ao
devido processo legal. Para eles, as decisões proferidas no curso deste processo estão em consonância com a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).
De início, entenderam que não houve quebra da paridade de armas nem afronta ao tratamento isonômico na
concessão de prazos distintos às partes para apresentação de alegações finais (sucessivo para o Ministério
Público e o assistente de acusação; e comum para a defesa).
Essa diferenciação não causou desequilíbrio à relação processual, nem resultou em prejuízo para a defesa [CPP,
art. 563 (4)]. Ao contrário, a defesa técnica suscitou, nas alegações finais, substanciosas teses defensivas
contrapostas à versão acusatória exposta na denúncia, as quais abordam todo o conjunto probatório produzido
no decorrer da instrução criminal.
Também foi afastada a alegação de violação ao princípio do devido processo legal, com relação ao indeferimento
dos pedidos de (a) substituição de testemunhas, (b) produção de prova pericial; e (c) diligências
complementares.
Operada a preclusão consumativa da pretensão probatória com a apresentação do rol de testemunhas, a sua
posterior substituição só é permitida nos casos de não localização, falecimento ou enfermidade que inviabilize o
depoimento. Essa questão já havia sido resolvida quando do desprovimento dos agravos internos interpostos
pelos réus (AP 996-AGR/DF).
Quanto à prova pericial, o pedido foi protocolado intempestivamente, além de se revelar medida impertinente ou
desnecessária para a resolução da ação penal. Pretendia-se demonstrar a valorização econômica de um imóvel
para justificar o incremento patrimonial de um dos réus.
Igualmente, não há violação ao devido processo legal com relação à rejeição do pedido de diligências
complementares, voltado à inquirição de testemunhas referidas durante a produção da prova oral. Isso porque o
relator possui discricionariedade para apreciar diligência formulada com base no art. 10 (5) da Lei 8.038/1990
[correspondente ao art. 402 (6) do CPP]. No mesmo sentido, a discricionariedade conferida ao juiz encontra
suporte no art. 209, § 1º (7), do CPP.
No mais, os ministros entenderam desnecessária a reunião desta ação penal com os Inquéritos 3.980/DF e
3.989/DF. Ainda que haja conexão entre as demandas, o art. 80 (8) do CPP faculta a separação ou cisão do
32

feito, quando presente motivo relevante que torne conveniente a sua adoção. Ademais, o desmembramento não
causou prejuízo à defesa. De todo modo, essa preliminar está preclusa, pois fora rejeitada por ocasião do
recebimento da denúncia (Inq 3.997/DF).
Em seguida, entenderam não haver violação à paridade de armas entre os sujeitos processuais no acolhimento,
em juízo, da contradita suscitada pela acusação para que o depoimento de testemunha fosse tomado sem a
prestação do compromisso de dizer a verdade.
A testemunha em questão responde a outro processo com base no mesmo contexto delinquencial. Nessas
circunstâncias, o juiz fará consignar a contradita, bem assim a resposta da testemunha, impedindo-a de depor
nos casos em que for ela proibida de fazê-lo [CPP, art. 207 (9)]ou, então, não lhe deferindo o compromisso nas
hipóteses a que se refere o art. 208 (10) do estatuto processual penal, conforme jurisprudência desta Corte.
Por fim, o julgamento foi suspenso para continuidade na próxima sessão corrente, com a colheita dos demais
votos.

901
Oitiva de testemunhas e devido processo legal

A Segunda Turma, com base no Enunciado 691 da Súmula do Supremo Tribunal Federal (1), não conheceu de
impetração, mas concedeu a ordem de ofício para, por força da matriz constitucional do ―devido processo legal‖
(CF, art. 5º, inciso LIV), assegurar a oitiva das testemunhas arroladas pela defesa dos pacientes.
Na espécie, em fase de defesa prévia, a oitiva de todas as testemunhas indicadas pela defesa dos pacientes fora
indeferida, ao fundamento de que o requerimento seria protelatório, haja vista que as testemunhas não teriam,
em tese, vinculação com os fatos criminosos imputados aos pacientes.
A Turma entendeu que as circunstâncias expostas nos autos encerravam situação de constrangimento ilegal
apta a justificar a concessão da ordem de ofício.
O ministro Celso de Mello, ao se reportar aos fundamentos do voto do relator, acentuou que o direito à prova é
expressão de uma inderrogável prerrogativa jurídica, que não pode ser, arbitrariamente, negada ao réu.
O ministro Edson Fachin, também ao fazer referência ao voto do relator, destacou o princípio do livre
convencimento motivado (CPP, art. 400, § 1º), que faculta ao juiz o indeferimento das provas consideradas
irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Afirmou ser recomendável, em um juízo de discricionariedade
regrada, haver a possibilidade de limitar uma expansão demasiadamente criativa que adentre o campo da
protelação. No entanto, observou que, no caso, teria havido o indeferimento de todas as testemunhas de
defesa.
Dessa forma, evidente a infringência à matriz constitucional do devido processo legal, visto que frustrou a
possibilidade de os acusados produzirem as provas que reputam necessárias à demonstração de suas alegações.

900
Prerrogativa de foro e interpretação restritiva - 3

O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e
relacionados às funções desempenhadas.
Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de
alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o
agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo.
Esse é o entendimento do Plenário, ao resolver questão de ordem para determinar a baixa de ação penal ao
juízo da zona eleitoral para posterior julgamento, tendo em vista que: a) os crimes imputados ao réu não foram
cometidos no cargo de deputado federal ou em razão dele; b) o réu renunciou ao cargo para assumir a função
de prefeito; e c) a instrução processual se encerrou perante a 1ª instância, antes do deslocamento de
competência para o Supremo Tribunal Federal (STF) (Informativos 867 e 885).
Prevaleceu o voto do ministro Roberto Barroso (relator), o qual registrou que a quantidade de pessoas
beneficiadas pelo foro e a extensão que se tem dado a ele, a abarcar fatos ocorridos antes de o indivíduo ser
investido no cargo beneficiado pelo foro por prerrogativa de função ou atos praticados sem qualquer conexão
com o exercício do mandato que se deseja proteger, têm resultado em múltiplas disfuncionalidades.
A primeira delas é atribuir ao STF uma competência para a qual ele não é vocacionado. Nenhuma corte
constitucional no mundo tem a quantidade de processos de competência originária, em matéria penal, como tem
a do Brasil. E, evidentemente, na medida em que desempenha esse papel de jurisdição penal de primeiro grau,
o STF se afasta da sua missão primordial de guardião da Constituição e de equacionamento das grandes
questões nacionais.
O procedimento no Supremo é muito mais complexo do que no juízo de primeiro grau, por essa razão leva-se
muito mais tempo para apreciar a denúncia, processar e julgar a ação penal. Consequentemente, é comum a
ocorrência de prescrição, o que nem sempre acontece por responsabilidade do Tribunal, mas por conta do
próprio sistema.
Portanto, o mau funcionamento do sistema traz, além de impunidade, desprestígio para o STF. Como
consequência, perde o Direito Penal o seu principal papel, qual seja, o de atuar como prevenção geral.
O relator frisou que a situação atual revela a necessidade de mutação constitucional. Isso ocorre quando a corte
constitucional muda um entendimento consolidado, não porque o anterior fosse propriamente errado, mas
porque: a) a realidade fática mudou; b) a percepção social do Direito mudou; ou c) as consequências práticas de
uma orientação jurisprudencial se revelaram negativas. As três hipóteses que justificam a alteração de uma linha
33

de interpretação constitucional estão presentes na hipótese dos autos.

A nova interpretação prestigia os princípios da igualdade e republicano, além de assegurar às pessoas o


desempenho de mandato livre de interferências, que é o fim pretendido pela norma constitucional. Ademais,
viola o princípio da igualdade proteger, com foro de prerrogativa, o agente público por atos praticados sem
relação com a função para a qual se quer resguardar sua independência, o que constitui a atribuição de um
privilégio.
Além disso, o princípio republicano tem como uma das suas dimensões mais importantes a possibilidade de
responsabilização dos agentes públicos. A prescrição, o excessivo retardamento e a impunidade, que resultam
do modelo de foro por prerrogativa de função, não se amoldam ao referido princípio.
A Corte registrou que essa nova linha interpretativa deve ser aplicada imediatamente aos processos em curso,
com a ressalva de todos os atos praticados e decisões proferidas pelo STF e pelos demais juízos com base na
jurisprudência anterior, conforme precedente firmado no Inq 687 QO/SP (DJU de 25.8.1999).
Vencidos, em parte, os ministros Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski, apenas quanto à restrição do
foro aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. Ambos
consideraram que a expressão ―nas infrações penais comuns‖, prevista no art. 102, I, ―b‖, da Constituição
Federal, alcança todos os tipos de infrações penais, ligadas ou não ao exercício do mandato.
Vencido, em parte, o ministro Marco Aurélio, tão somente quanto à prorrogação da competência para processar
e julgar ações penais após a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais.
Vencido, em parte, o ministro Dias Toffoli, que, em voto reajustado, resolveu a questão de ordem no sentido de:
a) fixar a competência do STF para processar e julgar os membros do Congresso Nacional exclusivamente
quanto aos crimes praticados após a diplomação, independentemente de sua relação ou não com a função
pública em questão; b) fixar a competência por prerrogativa de foro, prevista na Constituição Federal, quanto
aos demais cargos, exclusivamente quanto aos crimes praticados após a diplomação ou a nomeação (conforme
o caso), independentemente de sua relação ou não com a função pública em questão; c) serem inaplicáveis as
regras constitucionais de prerrogativa de foro quanto aos crimes praticados anteriormente à diplomação ou à
nomeação (conforme o caso), hipótese em que os processos deverão ser remetidos ao juízo de primeira
instância competente, independentemente da fase em que se encontrem; d) reconhecer a inconstitucionalidade
das normas previstas nas Constituições estaduais e na Lei Orgânica do Distrito Federal que contemplem
hipóteses de prerrogativa de foro não previstas expressamente na Constituição Federal, vedada a invocação de
simetria; e) estabelecer, quando aplicável a competência por prerrogativa de foro, que a renúncia ou a cessação,
por qualquer outro motivo, da função pública que atraia a causa penal ao foro especial, após o encerramento da
fase do art. 10 da Lei 8.038/1990, com a determinação de abertura de vista às partes para alegações finais, não
altera a competência para o julgamento da ação penal.
Por fim, vencido, também parcialmente, o ministro Gilmar Mendes, que assentou que a prerrogativa de foro
alcança todos os delitos imputados ao destinatário da prerrogativa, desde que durante a investidura, sendo
desnecessária a ligação com o ofício. Ao final, propôs o início de procedimento para a adoção de Enunciado da
Súmula Vinculante em que restasse assentada a inconstitucionalidade de normas de Constituições Estaduais que
disponham sobre a competência do Tribunal de Justiça para julgar autoridades sem cargo similar contemplado
pela Constituição Federal e a declaração incidental de inconstitucionalidade dos incisos II e VII do art. 22 da Lei
13.502/2017; dos incisos II e III e parágrafo único do art. 33 da Lei Complementar 35/1979; dos artigos 40, III,
V, e 41, II, parágrafo único, da Lei 8.625/1993; e do art. 18, II, ―d‖, ―e‖, ―f‖, parágrafo único, da Lei
Complementar 75/1993.

AP 937 QO/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 2 e 3.5.2018. (AP-937)

899
CNMP: competência normativa e interceptação telefônica

O Plenário, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado em ação direta ajuizada em face da Resolução
36/2009 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que dispõe sobre o pedido e a utilização de
interceptações telefônicas, no âmbito do Ministério Público (MP), nos termos da Lei 9.296/1996.
De início, as preliminares de não conhecimento foram rejeitadas pelos seguintes argumentos: (a) o ato
normativo, de caráter geral e abstrato, foi editado pelo Conselho no exercício de sua competência constitucional
e constitui ato primário, sujeito a controle de constitucionalidade, por ação direta, no Supremo Tribunal Federal
(STF); e (b) as mudanças promovidas no ato impugnado, por resolução posterior, não implicaram na perda do
objeto desta demanda. No que tange à alegação de inépcia apresentada pela Advocacia-Geral da União (AGU), a
petição inicial foi considerada suficientemente clara e não contém vícios formais.
No mérito, ao reconhecer sua constitucionalidade, o Colegiado asseverou que a norma foi editada pelo CNMP no
exercício das atribuições previstas diretamente no art. 130-A, § 2º, I e II, da Constituição Federal (CF) (1).
Nesse contexto, apenas regulamentou questões administrativas e disciplinares relacionadas ao procedimento de
interceptação telefônica, sem adentrar em matéria de direito penal, processual ou relativa a nulidades.
O ato em apreço regulamentou a Lei 9.296/1996 para estabelecer um conjunto de limites à atuação do Parquet,
como forma de proteger o jurisdicionado no que se refere (a) ao requerimento de interceptação; (b) ao pedido
de prorrogação; e (c) à conclusão do procedimento.
De um lado, em cumprimento ao dever funcional de sigilo (2) (3) (4), o ato normativo enumerou validamente os
critérios a serem observados pelos membros do Parquet nos casos de interceptação telefônica, com a finalidade
34

de evitar excessos.

Não foram criados novos ―requisitos formais de validade‖ das interceptações. Tampouco a inobservância dos
preceitos contidos na resolução constitui causa de nulidade, mas sim motivo para a instauração de procedimento
administrativo disciplinar contra o agente público infrator, pois trata-se de regras ligadas aos deveres funcionais
de sigilo na atuação ministerial.
A Corte ressaltou, ainda, que o CNMP possui competência para regular os parâmetros a serem utilizados na
análise de processos disciplinares submetidos ao órgão. Em realidade, trata-se de medida conveniente e
desejável que confere previsibilidade à atuação do Conselho, bem como oferece segurança jurídica e tratamento
isonômico àqueles sujeitos a seu controle.
Por outro lado, padronizou procedimentos formais sobre a matéria, de modo a concretizar o princípio da
eficiência (CF, art. 37, caput) (5), cuja observância deve ser tutelada pelo Conselho (CF, art. 130-A, § 2º, II) (1).
A existência de um grau mínimo de uniformização atende ao princípio da eficiência, além de ser conveniente
para a continuidade das investigações, especialmente ao se considerar a possibilidade de atuação de mais de um
membro do Parquet no mesmo processo e em momentos distintos.
Ademais, ressaltou que o ato questionado está em consonância com a jurisprudência do STF no sentido de que
(a) o pedido de prorrogação de interceptação telefônica, para ser válido, deve estar devidamente justificado e
fundamentado; e (b) é necessário transcrever o trecho completo da conversa, a fim de permitir sua
contextualização, vedada a edição, ainda que dispensada a transcrição completa da interceptação.
Por fim, entendeu que a independência funcional do MP foi preservada. A resolução não impõe uma linha de
atuação ministerial, apenas promove a padronização formal mínima dos ritos adotados nos procedimentos
relacionados a interceptações telefônicas, em consonância com as regras previstas na Lei 9.296/1996.
Vencido o ministro Marco Aurélio, que acolheu integralmente o pedido inicial, por considerar que o CNMP (a)
disciplinou matéria processual penal, cuja competência é privativa da União (CF, art. 22, I) (6); e (b) feriu a
independência funcional do MP, em afronta à cláusula constitucional que exige lei complementar para a fixação
de suas atribuições.
Vencidos, em parte, os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que
julgavam parcialmente procedente o pedido formulado.

Quebra de sigilo e divulgação em site oficial

Os dados obtidos por meio da quebra dos sigilos bancário, telefônico e fiscal devem ser mantidos sob reserva.
Com base nesse entendimento, o Plenário concedeu mandado de segurança para determinar ao Senado Federal
que retire de sua página na Internet os dados obtidos por meio da quebra de sigilo determinada por comissão
parlamentar de inquérito (CPI).

CNJ: competência normativa e interceptação telefônica

O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado em ação direta para declarar a
inconstitucionalidade do § 1º (1) do art. 13 da Resolução 59/2008 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o qual
dispõe que não será admitido pedido de prorrogação de prazo de medida cautelar de interceptação de
comunicação telefônica, telemática ou de informática durante o plantão judiciário, ressalvada a hipótese de risco
iminente e grave à integridade ou à vida de terceiros.
A Resolução 59/2008 do CNJ disciplina e uniformiza o procedimento de interceptação de comunicações
telefônicas e de sistemas de informática e telemática nos órgãos jurisdicionais do Poder Judiciário.
O Requerente pleiteou a declaração de inconstitucionalidade da totalidade da referida norma, sustentando que o
CNJ, ao editá-la, teria extrapolado sua competência regulamentar, e violado os artigos 2º; 5º, II e XII; 22, I; 48;
84, IV e 103-B, § 4º, da Constituição Federal.
O Plenário, inicialmente, assentou a constitucionalidade da Resolução 59/2008 — exceto pelo § 1º do art. 13 —,
na medida em que o CNJ, órgão que não possui natureza jurisdicional, não desborda dos limites de sua atuação
quando disciplina as obrigações que incumbem aos agentes do Poder Judiciário nas rotinas e trâmites cartoriais
de pedidos de interceptação telefônica.
O CNJ é órgão interno de controle administrativo, financeiro e disciplinar da magistratura, possuindo natureza
meramente administrativa. No âmbito de sua competência normativa, lhe é possível regular as rotinas
cartorárias dos órgãos do Poder Judiciário, desde que isso não implique estender, para além da reserva legal, as
hipóteses legalmente autorizadas de interceptação das comunicações. Por outro lado, o CNJ não pode criar
obrigações que se estendam a órgãos estranhos ao Poder Judiciário.
O ato normativo em questão, de modo geral, observa tais premissas. Entretanto, em relação ao § 1º do art. 13
da Resolução 59/2008, o CNJ extrapolou sua competência normativa, adentrando em seara que lhe é imprópria.
Assim, desrespeitou: (a) a competência legislativa estadual, no que concerne à edição das leis de organização
judiciária locais (CF, art. 125, § 1º); (b) a competência legislativa na União para a edição de normas processuais
(CF, art. 22, I); e (c) a norma constante do art. 5º, XXXV, da CF, no que respeita à inafastabilidade da
jurisdição.
Vencidos, tão somente em relação à declaração de inconstitucionalidade do § 1º do art. 13, os ministros Edson
Fachin (relator), Roberto Barroso, Rosa Weber e Gilmar Mendes, que julgaram improcedente o pedido, e, em
menor extensão, o ministro Alexandre de Moraes, que julgou inconstitucional também o art. 14, ―caput‖, da
norma impugnada.
Vencido, em maior extensão, o ministro Marco Aurélio, que julgou o pedido totalmente procedente, por
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considerar que o ato normativo questionado invadiu seara normativa de competência da União.

898
Embargos infringentes e pressupostos

O Plenário, por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto em face de decisão monocrática que
inadmitiu embargos infringentes opostos contra acórdão condenatório proferido pela Primeira Turma do
Supremo Tribunal Federal (STF).
Preliminarmente, o Tribunal entendeu cabíveis embargos infringentes contra decisão proferida em sede de ação
penal de competência originária das Turmas, e, por maioria, fixou como requisito de cabimento desse recurso a
existência de dois votos minoritários absolutórios em sentido próprio.
O Plenário reiterou entendimento exarado quando do julgamento da AP 470 AgR-vigésimo sexto/MG (DJe de
17.2.2014), no sentido de que o art. 333, I (1), do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RI/STF),
que prevê o cabimento de embargos infringentes, não foi revogado de modo expresso pela Lei 8.038/1990, não
havendo incompatibilidade entre os dois diplomas normativos. Desse modo, subsiste no ordenamento jurídico o
referido recurso.
Entretanto, ao tempo em que elaborado o RI/STF, as ações penais eram julgadas tão somente pelo Plenário.
Não havia previsão expressa quanto ao cabimento de embargos infringentes contra decisão das Turmas. Por
isso, a Corte deve construir uma solução, levando em conta os precedentes mais próximos, a analogia e os
princípios gerais do Direito.
Nessa linha, considerada a existência de certa lógica processual, os embargos infringentes são cabíveis quando
caracterizada divergência relevante, a ponto de gerar dúvida razoável sobre o acerto de determinada decisão.
No julgamento da AP 409 EI-AgR-segundo/CE (DJe de 1º.9.2015), o Tribunal decidiu que a oposição de
embargos infringentes depende, quanto à sua admissibilidade, da existência, em favor do réu, de, pelo menos,
quatro votos vencidos de conteúdo absolutório em sentido próprio, não se revelando possível, para efeito de
compor esse número mínimo, a soma de votos minoritários de conteúdo diverso, como, por exemplo, o eventual
reconhecimento de prescrição.
O art. 333, parágrafo único (2), do RI/STF, prevê a exigência de quatro votos para o cabimento de embargos
infringentes — ao tempo em que só eram cabíveis de decisões do Plenário —, a caracterizar, assim, a existência
de divergência relevante.
No entanto, ante a falta de disposição expressa para o cabimento de embargos infringentes de decisão das
Turmas, há que se estabelecer algum critério para a verificação da existência de divergência relevante, o ponto
de justificar a interposição do recurso.
À medida em que, para a oposição de embargos infringentes em face de decisão do Plenário são necessários
quatro votos divergentes no sentido da absolvição em sentido próprio, em relação às decisões da Turma, há que
se verificar a existência de dois votos divergentes, também no sentido da absolvição própria.
Na espécie, são manifestamente inadmissíveis os embargos infringentes. Isso porque, de um lado, não se
verificou no acórdão embargado a ocorrência de dois votos absolutórios; de outro, o único voto divergente
apresentado não tratou de absolvição em sentido próprio, ou seja, não expressou juízo de improcedência da
pretensão executória, apenas reconheceu a existência de nulidade processual e a ocorrência de prescrição da
pretensão punitiva. Ademais, no mérito, o juízo condenatório foi assentado à unanimidade pela Turma.
A despeito da insurgência do agravante quanto à decisão monocrática que rejeitou os embargos infringentes, é
necessário registrar que o próprio Plenário, ao julgar a AP 470 QO-décima primeira/MG (DJe de 30.4.2009),
decidiu que cabe ao relator da ação penal originária analisar monocraticamente a admissibilidade dos embargos
infringentes opostos em face de decisões condenatórias. O presente caso demandou solução idêntica. Assim, a
manifesta inadmissibilidade dos embargos, na esteira da jurisprudência da Corte, revelou o caráter meramente
protelatório dos infringentes, razão por que não impediu o imediato cumprimento da decisão condenatória.
Vencidos os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, e, em menor extensão,
o ministro Alexandre de Moraes, que deram provimento ao agravo. Consideraram presentes os pressupostos dos
embargos infringentes e impossível cogitar-se da exigência de dois votos minoritários absolutórios como
requisito de cabimento do recurso. O ministro Alexandre de Moraes, por outro lado, entendeu que o
reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva constitui preliminar de mérito, configurada, na espécie, a
hipótese disciplinada no art. 333, I, do RI/STF.
Por fim, o ministro Edson Fachin (relator) concedeu, de ofício, prisão domiciliar ao agravante, restando
prejudicada a pretensão formulada no HC 152.707/DF.

Recebimento de denúncia: corrupção passiva e obstrução à justiça

A Primeira Turma recebeu denúncia contra senador da república pela suposta prática de crime de corrupção
passiva [art. 317 do Código Penal (CP)] (1) e tentativa de obstrução à justiça (art. 2º, § 1º, da Lei 12.850/2013
(2) c/c artigo 14, II, do CP (3)). O Colegiado recebeu, também, a denúncia em relação a outros imputados pelo
crime de corrupção passiva em coautoria (art. 317 do CP c/c art. 29 do CP (4)).
A denúncia foi oferecida com base em depoimentos prestados no âmbito de acordos de delação premiada, bem
como em gravações telefônicas e ambientais, que apontam indícios da prática, pelos denunciados, de atos
voltados ao recebimento de valores a título de vantagem indevida, além de conduta, por senador da república,
de atos voltados a impedir ou embaraçar investigações relacionadas à operação Lava Jato.
36

Inicialmente, a Turma negou provimento a agravo regimental interposto de decisão que indeferiu pedido de
devolução do prazo de resposta para juntada de documentos complementares pela defesa. Pelo princípio da
eventualidade, viabilizada a apresentação de defesa prévia, competia ao investigado trazer todos os argumentos
e documentos de que dispunha, em oposição ao narrado na peça acusatória.
Na sequência, reafirmou a impossibilidade de desmembramento do inquérito quanto aos envolvidos sem
prerrogativa de foro, por se tratar de investigação sobre fato único. As condutas estão de tal forma interligadas
que não é possível a realização de um julgamento cindido de maneira adequada (Informativo 885).
No mais, as preliminares suscitadas foram rejeitadas com base nos seguintes fundamentos: (A) é desnecessária
a submissão desse processo ao Plenário, pois os delitos não foram praticados em concurso ou coautoria com o
Presidente da República, nem mesmo em conexão com algum suposto crime por ele cometido; (B) a rescisão do
acordo de delação não é causa de nulidade das provas, nem impede a investigação dos fatos noticiados pelos
colaboradores, considerados os requisitos do artigo 4º, § 7º, da Lei 12.850/2013 (5); (C) não está caracterizada,
nos autos, a apontada provocação do cometimento do crime de corrupção por membro do Ministério Público
Federal, e (D) não houve violação ao princípio do juiz natural no procedimento de livre distribuição deste
inquérito, resultante da cisão do Inquérito 4.483/DF com relação aos ora denunciados.
No mérito, o Colegiado asseverou que a denúncia atende às exigências do art. 41 do Código de Processo Penal
(CPP) (6): contém descrição do cometimento, em tese, de crime e das circunstâncias, com a individualização das
condutas imputadas a cada um dos acusados. Foram colhidos, na fase do inquérito, indícios de autoria e
materialidade relativamente aos crimes imputados, que autorizam o recebimento da peça acusatória.
No momento da denúncia, o princípio que prevalece é ―in dubio pro societate‖. Ademais, a versão do Ministério
Público apresenta uma solidez de verossimilhança maior do que a da defesa, além de não haver nenhum
fundamento que possibilite a rejeição da denúncia por atipicidade ou falta de justa causa.
Quanto ao crime de corrupção passiva (1), considerou haver indicativos de solicitação e percepção de vantagem
indevida pelo detentor de mandato eletivo, com o auxílio dos demais denunciados. A integralidade dos valores
foi apreendida pela Polícia Federal, a revelar a corrupção.
No que se refere ao delito de obstrução de justiça (2), entendeu estarem presentes indícios da prática, por
senador da república, de atos voltados a impedir ou embaraçar investigações que envolvam organização
criminosa. O parlamentar supostamente (A) atuou na tentativa de aprovação de anistia ao crime de ―caixa dois‖
eleitoral – falsidade ideológica eleitoral (artigo 350 do Código Eleitoral) (7), e (B) tentou influenciar na escolha
de delegados de Polícia Federal para conduzir inquéritos alusivos à operação Lava Jato, buscando assegurar a
impunidade de autoridades políticas.
Por fim, esclareceu que as alegações da defesa atinentes à ausência de comprovação dos elementos objetivos
do tipo, de formalização de ato de ofício e de dolo dizem respeito ao mérito e serão examinadas após a
instrução do processo-crime. Sob o crivo do contraditório, cumpre viabilizar a instrução processual para que os
temas de fundo da imputação sejam analisados.
Vencidos, apenas quanto ao delito de obstrução à justiça, os ministros Alexandre de Moraes, que considerou
genérica a imputação, e o ministro Marco Aurélio, em menor extensão, por entender que a denúncia não deve
ser recebida especificamente quanto à suposta atuação do senador visando à aprovação de anistia a caixa dois
eleitoral, porque a atividade de articulação política não pode ser criminalizada, sob pena de ofensa à imunidade
material dos parlamentares.

897
“Habeas corpus” e prisão preventiva

O Plenário, por maioria, não conheceu de ―habeas corpus‖ em que se discutiu a higidez de prisão preventiva
decretada no âmbito de ação penal e, posteriormente, confirmada em sentença condenatória.
Preliminarmente, o Tribunal, também por maioria, entendeu possível a remessa de ―habeas corpus‖ ao Plenário,
pelo relator, de forma discricionária, com fundamento no art. 21, XI (1), do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal (RI/STF), em linha com o entendimento manifestado pelo ministro Edson Fachin (relator).
O relator registrou que a Constituição Federal (CF) atribui aos Tribunais a elaboração de seus regimentos
internos (CF, art. 96, I, ―a‖ (2)), os quais configuram normas de idêntica categoria que as leis, solucionando-se
eventual antinomia não pela categoria normativa, mas, sim, pela substância regulada (ADI 1.105 MC, DJU de
24/04/2001).
Nesta senda, o RI/STF confere ao relator a atribuição de remeter processos ao Tribunal Pleno (RI/STF, artigos
6º, II, ―c‖; 21, XI; 22, § único, ―a‖ e ―b‖ (3)), ato esse que sequer desafia impugnação recursal (RI/STF, art. 305
(4)).
Determinadas matérias são naturalmente vocacionadas ao crivo do Tribunal, em sua composição Plenária, ou
mesmo ao órgão especial que detenha competência para tanto (CF, artigos 97; 102, § 3º e 103-A; e Enunciado
10 da Súmula Vinculante do STF). Ou seja, mesmo no que toca ao funcionamento e organização interna, os
Tribunais não detêm competência normativa ilimitada, na medida em que devem ser observadas as restrições
constitucionais próprias.
O STF encontra, em sua composição Plenária, a unidade sinérgica à qual incumbe, por excelência, a guarda da
Constituição e o exercício integral de sua competência. Embora, regimentalmente, sejam admitidas e legítimas
diversas atuações fracionárias e unipessoais, é no colegiado maior que a missão constitucional da Corte resta
exercitada em sua inteireza.
Vencidos, no ponto, os Ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, os quais ressaltaram a necessidade de
37

que o deslocamento de processos ao Plenário se dê motivadamente, na forma do art. 93, IX, da Constituição
Federal.
Quanto ao conhecimento do ―writ‖, prevaleceu o voto do relator, que não conheceu do ―habeas corpus‖,
porquanto a superveniência de sentença condenatória acarreta a modificação do debate processual, bem como a
alteração do título prisional originário.
Isso enseja o advento de uma realidade processual de maior amplitude em relação à considerada no momento
da formalização da impetração em julgamento.
Nessa medida, a superveniente prolação de sentença condenatória impõe uma alteração do campo
argumentativo, exigindo-se que o exame das questões articuladas pelo impetrante opere-se à luz de um
espectro processual não coincidente com o inicialmente impugnado.
Vencidos os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello, que
conheceram do ―writ‖.
Em seguida, o Tribunal analisou a possibilidade de concessão da ordem de ―habeas corpus‖ de ofício.
Prevaleceu, no ponto, também o voto do relator, o qual não verificou a ocorrência de constrangimento ilegal
apto a ensejar a concessão da ordem.
Registrou que, para fins de decretação da prisão preventiva, são necessárias a prova da existência do crime e a
existência de indícios suficientes de autoria, sendo indispensável também a presença de algum dos requisitos
previstos no art. 312 (5) do Código de Processo Penal (CPP).
A compreensão do STF é no sentido de que o fundado receio da prática de novos delitos pode configurar risco à
ordem pública e, por consequência, legitimar a adoção da medida prisional (HC 140.215 AgR, DJe de
27/04/2017 e HC 136.298, DJe de 16/12/2016).
Outrossim, a gravidade concreta do crime e especificidades do ―modus operandi‖ podem ser considerados como
fundamento da prisão preventiva, desde que vislumbrada a possibilidade de reiteração delituosa e, portanto,
com observância da finalidade acautelatória que lhe é própria.
O cenário fático delineado nos autos revela a periculosidade concreta do paciente, circunstância que evidencia o
fundado receio de prática de futuras infrações, ainda que não inseridas no exato contexto em que os fatos
pretéritos teriam se desenrolado. Registre-se, inclusive, que parte dos recursos supostamente objeto de lavagem
de dinheiro não foi recuperada.
Por outro lado, não se verifica a alegada duração desarrazoada da prisão processual em análise. Isso porque a
jurisprudência da Corte é firme no sentido de que não procede a alegação de excesso de prazo quando a
complexidade do feito, as peculiaridades da causa ou a defesa contribuem para eventual dilação do prazo (HC
139.430, DJe de 22/06/2017).
O trâmite processual na origem revela-se compatível com a duração razoável do processo, em face da
complexidade dos fatos, das características processuais da controvérsia e das nuanças probatórias da ação
penal.
Vencidos os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio, que concederam a
ordem de ―habeas corpus‖ de ofício.

Tempestividade e recurso interposto antes da publicação do acórdão

Não é extemporâneo recurso interposto antes da publicação do acórdão.


Com base nesse entendimento, a Primeira Turma concedeu, em parte, ―habeas corpus‖ para afastar a
intempestividade de recurso especial e determinar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) continue a apreciar o
referido recurso.
No caso, o STJ não conheceu do recurso especial por ter sido ele protocolado antes da publicação de acordão do
tribunal de justiça.
HC 113826, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 10.4.2018. (HC-113826)

Regalias e transferência para outra unidade da federação

A Segunda Turma, por maioria, concedeu ―habeas corpus‖ para determinar o retorno de preso preventivo a
estabelecimento penal no juízo de origem, diante da manifesta ilegalidade de sua transferência para presídio em
outra unidade da federação.
A mudança foi determinada com fundamento em supostas regalias que o paciente teria recebido no ambiente
carcerário, em atendimento a requisição do Ministério Público Federal.
Para o Colegiado, no entanto, é inviável a remoção de apenado para outro Estado com fundamento em suposto
tratamento privilegiado. Apenas razões excepcionalíssimas e devidamente fundamentadas poderiam legitimar
essa medida.
O art. 5º, LXIII, da Constituição Federal (CF) (1) assegura o direito do preso à assistência da família, bem como
o art. 103 da Lei de Execução Penal (LEP) prevê que o recolhimento deve ocorrer ―em local próximo ao seu meio
social e familiar‖ (2). O interesse da instrução processual, ainda assim, recomenda a permanência do recolhido
no local onde responde ação penal em fase de instrução.
Ademais, o Código de Processo Penal (CPP) dispõe que, ―ressalvados os casos de urgência ou de perigo de
ineficácia da medida‖, o juiz deve estabelecer contraditório prévio em relação a requerimentos de medida
cautelar pessoal (art. 282, § 3º) (3).
A determinação, no entanto, teve amparo fático em apurações realizadas unilateralmente pela acusação e, a
despeito de inexistir urgência, a defesa não foi previamente ouvida. O paciente não está sequer sofrendo
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procedimento disciplinar em decorrência de seu comportamento carcerário. Não houve, assim, respeito ao
devido processo legal nem ao contraditório (art. 5º, LIV e LV, da CF) (4).
Por fim, a Turma ressaltou que, durante o transporte, o paciente foi exibido às câmeras de televisão algemado
por pés e mãos, a despeito de sua aparente passividade, em afronta ao Enunciado 11 da Súmula Vinculante (5).
O uso infundado de algemas é causa suficiente para invalidar o ato processual.
Considerou, ainda, que o abuso no uso de algemas também enseja a responsabilidade disciplinar, civil e penal
do agente ou da autoridade. Por essa razão, determinou a instauração de inquérito no Supremo Tribunal Federal
(STF) para apurar eventual abuso de autoridade (art. 4º, ―b‖, da Lei 4.898/1965) (6). O ―éthos‖ da jurisdição
constitucional é impedir que se cometam violações contra os direitos humanos.
Vencido o ministro Edson Fachin, que denegava a ordem, por considerar demonstrada a excepcionalidade que
justificaria o afastamento do direito do preso ao recolhimento em local próximo ao seu meio social e familiar.

896
Execução provisória da pena e trânsito em julgado de sentença condenatória - 2

O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, denegou a ordem em ―habeas corpus‖ no qual se
pleiteava a vedação do início da execução provisória da pena de condenado em primeiro e segundo graus de
jurisdição pela prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro (Informativo 895).
Prevaleceu o voto proferido pelo Ministro Edson Fachin (relator), que denegou a ordem, por reputar inexistente
qualquer ilegalidade, abusividade ou teratologia no ato apontado como coator.
Inicialmente, o relator registrou que o ―writ‖ trata tão somente da análise da higidez de ato concreto tido como
configurador de ilegalidade ou abuso de poder, qual seja, decisão denegatória de ―habeas corpus‖ proferida no
âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Por isso, a matéria a ser analisada fica circunscrita e ostenta
menor amplitude em relação às ações objetivas (ADC 43/DF e ADC 44/DF), ainda pendentes de julgamento pelo
Plenário, nas quais se discute a temática relativa à possibilidade de execução provisória da pena em segunda
instância. Ou seja, não é a hipótese de implementar, nesse julgamento específico, uma revisita ao tema.
Cabe, então, ao Supremo Tribunal Federal (STF) verificar apenas a existência de ilegalidade ou abuso de poder
na decisão proferida pelo STJ, levando-se em consideração a configuração constitucional do ―habeas corpus‖
[CF, art. 5º, LXVIII (1)] e a jurisprudência do STF.
Fixadas essas premissas, destacou que o STJ, ao denegar a ordem, aduziu que a execução provisória de acórdão
penal condenatório proferido em grau de apelação não compromete o princípio constitucional da presunção de
inocência afirmado pelo art. 5º, LVII (2), da Constituição Federal, ainda que sujeito a recurso especial ou
extraordinário, na linha de recente jurisprudência do STF (HC 126.292/SP e ARE 964.246/SP).
A decisão impugnada, portanto, se encontrava em sintonia, ao tempo em que proferida, com a compreensão
majoritária do Plenário do STF. Até o presente momento, não houve revisão desse entendimento em sede de
controle abstrato de constitucionalidade.
Nessa medida, o STJ, ao chancelar a determinação emanada do TRF 4ª, limitou-se a proferir decisão compatível
com a jurisprudência da Suprema Corte, a qual deve manter-se íntegra, estável e coerente, por expressa
imposição legal [CPC, art. 926 (3)].
Ademais, não procede a alegação de que os citados precedentes seriam destituídos de força obrigatória. Na
verdade, é forçoso registrar que o CPC/2015 consolidou cenário processual caracterizado por ferramentas de
gestão de litigiosidade voltadas a conferir eficácia obrigatória a determinados precedentes, valendo registrar o
que disposto no art. 988, § 5º, II (4).
Nesse âmbito, mesmo que sob a perspectiva dos direitos fundamentais, não se verifica alteração no panorama
jurídico que autorize considerar o ato coator como revelador de ilegalidade ou abuso de poder. Isso porque a
busca pela racionalidade do sistema penal também passa pela compreensão dos direitos humanos pela
perspectiva da proibição de proteção deficiente, devendo as condutas violadoras de direitos humanos ser
investigadas e punidas.
O Ministro Alexandre de Moraes também refutou a existência de ilegalidade e abuso de poder no ato atacado, na
linha do entendimento exarado pelo relator. A seu ver, é necessário proceder a uma análise da interligação e
complementariedade entre o princípio da presunção de inocência e os demais princípios constitucionais penais e
processuais penais, em especial, o da efetividade da tutela judicial, do juiz natural, do devido processo legal, da
ampla defesa e do contraditório. A interpretação conjunta e teleológica desses princípios leva o intérprete à
superação de aparentes contradições.
Nessa medida, o princípio da presunção de inocência não será desrespeitado ante a execução provisória da pena
privativa de liberdade, desde que a decisão condenatória tenha observado os demais princípios constitucionais.
Ou seja, o juízo de culpabilidade do acusado deve ser firmado com absoluta independência pelo juízo natural, as
provas devem ser valoradas sob o enfoque do devido processo legal e a condenação criminal deve ser imposta
em decisão colegiada, devidamente motivada, de Tribunal de segundo grau, quando esgotada a possibilidade
recursal de cognição plena. Observados tais parâmetros, será possível o início do cumprimento provisório da
pena, em respeito ao princípio da tutela penal efetiva.
O Ministro Roberto Barroso reiterou que a questão cinge-se à existência ou não de ilegalidade ou abuso de
poder no acórdão do STJ. O cumprimento de precedente do STF, por evidente, não se enquadraria nessas
hipóteses.
Ao avançar sobre a matéria de fundo, afirmou que ocorreu uma mutação constitucional relativamente ao art. 5º,
LVII, da Constituição Federal, a justificar a modificação da interpretação do princípio da presunção de inocência
pelo STF.
39

É certo que a mutação constitucional pode ocorrer em três hipóteses: a) mudança relevante na realidade social;
b) mudança na compreensão do Direito; e c) ocorrência de impactos negativos decorrentes de determinada
interpretação. Nesse contexto, a decisão tomada pelo STF, em 2009, no julgamento do HC 84.078/MG — no
qual se vedou a execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da sentença condenatória
— produziu três impactos negativos: a) incentivo à interposição infindável de recursos procrastinatórios; b)
incremento à seletividade do sistema punitivo brasileiro; e c) geração de descrédito do sistema de Justiça penal
junto à sociedade.
Ressaltou, ademais, que a ordem constitucional brasileira não exige o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória como condição para a decretação de prisão. O que se exige é a ordem escrita da autoridade
competente, na forma do art. 5º, LXI, da CF. Assim, o pressuposto para a decretação da prisão no sistema
constitucional brasileiro não é o esgotamento dos recursos com o trânsito em julgado, mas a ordem escrita e
fundamentada da autoridade competente.
A Ministra Rosa Weber, ao também denegar a ordem, destacou questão que antecede o próprio
dimensionamento do art. 5º, LVII, da Constituição Federal. A segurança jurídica, para além de ser um princípio,
consiste em valor ínsito à democracia, ao estado de direito e ao próprio conceito de justiça, além de traduzir, na
ordem constitucional, uma garantia dos jurisdicionados. Nesse enfoque, a imprevisibilidade, por si só, qualifica-
se como elemento capaz de transformar o Direito em arbítrio.
Nessa medida, compreendido o STF como instituição, a simples mudança de composição não constitui fator
suficiente para legitimar a alteração da jurisprudência, como tampouco o são razões de natureza pragmática ou
conjuntural. Em realidade, a consistência e a coerência no desenvolvimento judicial do Direito são virtudes do
sistema normativo enquanto virtudes do próprio Estado de Direito. Assim, as instituições do Estado devem
proteger os cidadãos de incertezas desnecessárias referentes aos seus direitos.
O respeito ao precedente judicial baseia-se na premissa fundamental de que decidir casos similares de modo
semelhante integra o próprio conceito de justiça, na dimensão da equidade. A relação do Tribunal com o
precedente se dá em permanente tensão entre estabilidade e continuidade, de um lado, e os imperativos de
adequação, evolução e aperfeiçoamento do Direito, de outro.
Outrossim, o princípio da colegialidade mostra-se imprescindível para o sistema, porquanto a individualidade
dentro do Tribunal, no processo decisório, tem um momento delimitado, a partir do qual cede espaço para a
razão institucional revelada no voto majoritário da Corte.
Ressalvado o seu entendimento pessoal, a Ministra asseverou que o dever de equidade e o princípio da
colegialidade devem nortear a prestação jurisdicional, de modo a justificar a obediência da orientação hoje
prevalecente no âmbito do STF.
Nessa linha de raciocínio, afirmou não reputar ilegal, abusivo ou teratológico o acórdão impugnado, ao
fundamento de que prevalece nesse Tribunal o entendimento de que a execução provisória de acórdão penal
condenatório proferido em julgamento de apelação — ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário —
não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência.
O Ministro Luiz Fux registrou ser um grande equívoco a interpretação literal que se faz do art. 5º LVII, da CF.
Esse dispositivo nada tem a ver com prisão, ausente qualquer relação com a execução provisória da pena. A
interpretação literal desse dispositivo representaria a negação do direito do Estado de impor a sua ordem penal.
Vencidos, em menor extensão, os Ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que deferiam a ordem de ―habeas
corpus‖ para fixar a possibilidade de execução provisória da pena somente a partir do julgamento de recurso
especial no STJ.
Vencidos, em maior extensão, os Ministros Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello, que deferiam a
ordem para que o paciente permanecesse em liberdade até o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória.
Em seguida, o Tribunal, por unanimidade, rejeitou questão de ordem, suscitada da tribuna pelo advogado do
paciente, no sentido de que, havendo empate na votação, a Presidente do Tribunal deveria se abster de votar.
Ao final, o Tribunal indeferiu novo pedido de medida liminar suscitado da tribuna, vencidos os Ministros Ricardo
Lewandowski e Marco Aurélio, bem como cassou o salvo-conduto anteriormente concedido.

895
Execução provisória da pena e trânsito em julgado de sentença condenatória

O Plenário iniciou julgamento de ―habeas corpus‖ no qual se pleiteia a vedação do início da execução provisória
da pena de condenado em primeiro e segundo graus de jurisdição pela prática dos crimes de corrupção passiva
e lavagem de dinheiro.
Inicialmente, o Tribunal, por maioria, rejeitou preliminar de inadmissibilidade do ―writ‖, ante o suposto
cabimento, na espécie, de recurso ordinário constitucional, na forma do art. 102, II, ―a‖, da Constituição Federal.
No ponto, o Colegiado ressaltou que o remédio constitucional do ―habeas corpus‖ sempre mereceu reverente
tratamento por parte do Supremo Tribunal Federal, devendo-se considerar, inclusive, que foi precisamente nessa
Corte que floresceu, sob a égide da Constituição Republicana de 1891, a doutrina brasileira do ―habeas corpus‖.
Não seria o caso de reviver referida doutrina, mas, tão somente, de conferir expressão concreta ao direito
inalienável de qualquer pessoa à proteção judicial efetiva, a qual, além de se qualificar como prerrogativa de
índole constitucional, encontra suporte em diversos documentos internacionais.
Por outro lado, não obstante o cabimento, no caso em comento, de recurso próprio — o recurso ordinário
constitucional, a ser ajuizado em face da decisão denegatória exarada pelo Superior Tribunal de Justiça —, a
40

Constituição vislumbra dupla possibilidade. Isso porque, ao mesmo tempo que prevê o referido recurso, a
Constituição Federal, no art. 102, I, "i", assenta a competência do STF para o processo e o julgamento de
―habeas corpus‖ quando a autoridade coatora for Tribunal Superior. Há, portanto, uma opção aberta ao paciente
para interpor o recurso ordinário ou mesmo ajuizar, diretamente, a ação constitucional de ―habeas corpus‖
perante o STF.
Vencidos, no ponto, os Ministros Edson Fachin (relator), Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia (Presidente),
que não conheciam do ―writ‖.
Em seguida, o Tribunal, por maioria, decidiu pela suspensão do julgamento, vencidos os Ministros Edson Fachin
(relator), Alexandre de Moraes, Roberto Barroso e Cármen Lúcia (Presidente).
Outrossim, tendo em vista requerimento feito da tribuna pelo advogado do paciente, a Corte, por maioria,
deferiu liminar para que fosse expedido salvo-conduto ao paciente até o julgamento do ―habeas corpus‖, o que
se dará na sessão de 4.4.2018, vencidos os Ministros Edson Fachin (relator), Alexandre de Moraes, Roberto
Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia (Presidente).

HC 152752/PR, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 22.3.2018. (HC-152752)

Colaboração premiada: prerrogativa de foro e competência

A 2ª Turma, por maioria, concedeu a ordem de ―habeas corpus‖ para determinar o trancamento de inquérito
instaurado perante o STJ em desfavor de governador. A investigação foi instaurada para apurar a suposta
prática de crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica eleitoral.
O procedimento investigatório foi inaugurado com base em depoimentos colhidos em sede de colaboração
premiada celebrada com o Ministério Público estadual e homologada pelo respectivo juízo.
A defesa sustentou que houve usurpação de competência e de jurisdição da Procuradoria-Geral da República e
do STJ, o que teria acarretado a nulidade das provas dele derivadas.
A Turma asseverou que, nos termos da lei, o acordo de colaboração premiada deve ser remetido ao juiz para
homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade. Muito embora a lei fale
apenas em juiz, é possível que a homologação de delações seja da competência de tribunal.
O colaborador admite seus próprios delitos e delata outros crimes. Assim, quanto à prerrogativa de função, será
competente o juízo mais graduado, observadas as prerrogativas de função do delator e dos delatados. Essa
prática vem sendo observada no STF.
No caso, o investigado celebrou acordo de colaboração com o Ministério Público estadual, o qual foi homologado
pelo juiz. O acordo foi rescindido e outro foi firmado e homologado, com os mesmos sujeitos. O colaborador
imputou delitos ao governador. Sustentou que um grupo de auditores da Receita estadual cobrava de
empresários vantagem indevida para deixar de apurar ou reduzir tributos. Durante o período eleitoral de 2014,
parte dos recursos teria sido repassada à campanha do paciente para o cargo de governador. Como
corroboração, o colaborador apresentou nota de compra de compensados, com endereço de entrega na sede do
comitê eleitoral da campanha do paciente. A despeito de terem sido imputados delitos ao governador, a
colaboração não foi realizada pela Procuradoria-Geral da República, tampouco foi submetida à homologação pelo
STJ.
Posteriormente, o STJ analisou a validade do acordo, em sede de reclamação. Reconheceu a usurpação da
própria competência, mas apenas após a homologação do acordo. Conforme a decisão, até os depoimentos do
colaborador, não havia elementos contra autoridades com prerrogativa de foro. Como os elementos que
atraíram a competência do STJ teriam surgido com o acordo, teria sido correto homologar o acordo e, em
seguida, remeter os autos ao STJ.
Essa interpretação, contudo, está em descompasso com o entendimento do STF, segundo o qual a delação de
autoridade com prerrogativa de foro atrai a competência do tribunal competente para a respectiva homologação
e, em consequência, do órgão do Ministério Público respectivo.
Após a instauração do inquérito, a defesa do paciente impugnou a utilização das declarações do colaborador. O
STJ decidiu, então, que o paciente não tinha legitimidade para impugnar o acordo.
O STF entende que o delatado não tem legitimidade para impugnar o acordo, por se tratar de negócio jurídico
personalíssimo. O contraditório em relação aos delatados seria estabelecido nas ações penais instruídas com as
provas produzidas pelo colaborador. A impugnação quanto à competência para homologação do acordo, porém,
diz respeito às disposições constitucionais quanto à prerrogativa de foro. Assim, ainda que seja negada ao
delatado a possibilidade de impugnar o acordo, esse entendimento não se aplica em caso de homologação sem
respeito à prerrogativa de foro. Portanto, o caso é de reconhecimento da ineficácia, em relação ao governador,
dos atos de colaboração premiada, decorrentes de acordo de colaboração homologado em usurpação de
competência do STJ. Por essa razão, as provas devem ser excluídas do inquérito. Tento em vista que a
instauração se deu com base exclusivamente nos atos de colaboração, o inquérito deve ser trancado.
O Colegiado enfatizou, ainda, a necessidade de estrito cumprimento da lei quanto aos benefícios passíveis de
negociação e quanto à competência jurisdicional para dosar a sanção premial. O estabelecimento de balizas
legais para o acordo é uma opção do nosso sistema jurídico, para assegurar a isonomia e evitar a corrupção dos
imputados, mediante incentivos desmesurados à colaboração, e dos próprios agentes públicos, aos quais se
daria um poder sem limite sobre a vida dos imputados. As sanções premiais previstas na lei para acordos fixados
até a sentença são o perdão judicial, a redução da pena privativa de liberdade e sua substituição por restritiva
de direito. Além disso, a lei prevê que, mesmo que não acordado, o perdão pode ser requerido ao juiz,
considerando a relevância da colaboração prestada. O perdão pode ser instrumentalizado por dispensa de ação
penal, se o colaborador não for o líder da organização criminosa e for o primeiro a prestar a efetiva colaboração.
41

Na colaboração posterior à sentença, a lei prevê a redução da pena até a metade e a relevação de requisitos
objetivos para a progressão do regime prisional.
De toda forma, compete ao STJ ratificar ou não a homologação dos acordos, avaliando a validade de suas
cláusulas. Eventual juízo sobre a validade dos acordos deverá ser baseado na decisão do STJ.
Vencido, em parte, o ministro Edson Fachin, que não determinou o trancamento do inquérito, por considerar
competir ao STJ a deliberação a respeito, uma vez avaliado o acordo por aquele tribunal.
HC 151605/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 20.3.2018. (HC-151605)

Recurso exclusivo da defesa e “reformatio in pejus”

A Segunda Turma, por maioria, denegou a ordem em ―habeas corpus‖, no qual se discutia a existência de
―reformatio in pejus‖ em recurso exclusivo da defesa.
O juízo ―a quo‖ condenou os pacientes às penas do art. 4º, ―caput‖, da Lei 7.492/1986 (1) e do art. 1º, VI, da
Lei 9.613/1998 (2). O Ministério Público Federal não recorreu da decisão. Entretanto, o Tribunal Regional Federal
da 4ª Região, em recurso exclusivo da defesa, reclassificou a conduta para os artigos 16 (3) e 22, parágrafo
único (4), da Lei 7.492/1986. O Superior Tribunal de Justiça endossou o acórdão do TRF 4ª, concluiu que não
houve ―reformatio in pejus‖, pois aquela Corte Regional teria apenas adequado a imputação ao quadro fático dos
autos, em típica situação de ―emendatio libelli‖.
O Colegiado afirmou que o Supremo Tribunal Federal considera possível a realização de ―emendatio libelli‖ em
segunda instância mediante recurso exclusivo da defesa, contanto que não gere ―reformatio in pejus‖, nos
termos do art. 617 do CPP (5).
No caso, o acórdão do TRF 4ª não agravou a situação dos pacientes, tendo em vista que o ―quantum‖ de pena
aplicado em 1º grau teria sido respeitado. Ademais, a reclassificação jurídica dos fatos imputados e a redução
operada nas suas reprimendas deram causa à extinção da punibilidade dos pacientes no que se refere ao delito
do art. 16 da Lei 7.492/1986, tendo em vista à consumação da prescrição, reconhecida em sede de embargos.
Vencido o Ministro Celso de Mello, que deferia o pedido de ―habeas corpus‖ por entender que houve ofensa à
autoridade da coisa julgada, bem como ―reformatio in pejus‖.

Delitos eleitorais conexos com crimes comuns

A Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental interposto contra decisão que havia determinado a
cisão de investigações com a remessa de declarações prestadas em colaboração premiada às Seções Judiciárias
do Distrito Federal e do Paraná.
O caso versa sobre fatos imputados a diretor de empresa de comunicação que teria recebido supostos
pagamentos irregulares no contexto de campanha eleitoral de candidato ao cargo de governador de estado.
O Colegiado asseverou que a matéria em questão é única e exclusivamente eleitoral, e, por se tratar de delitos
eleitorais conexos com crimes comuns, seu processamento é da competência da justiça especializada. (1) (2).
Com base nesse entendimento, determinou o envio dos termos de depoimento dos colaboradores e de eventual
documentação correlata à Justiça Eleitoral.
Vencido o Min. Edson Fachin, que negou provimento ao agravo, por considerar que a Suprema Corte, nos autos
do INQ 4.130-QO (Informativo 800), atestou a competência territorial da Seção Judiciária do Distrito Federal
com relação a fatos insertos nos mesmos termos de depoimento em referência, por se tratar de circunstâncias
fáticas assemelhadas.
PET 7319/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 27.3.2018. (PET - 7319)

Prisão Domiciliar Humanitária e Súmula 691/STF

A Turma, por maioria, conheceu da impetração e concedeu a ordem de habeas corpus para converter a custódia
preventiva do paciente em prisão domiciliar humanitária, na forma do art. 318, II, do Código de Processo Penal
(CPP). Determinou, ainda, que a prisão domiciliar deferida seja reavaliada pelo juízo processante a cada dois
meses, enquanto perdurar a necessidade da custódia preventiva decretada (CPP, art. 312).
Os impetrantes sustentaram que as circunstancias do caso autorizam a mitigação do Enunciado 691 da Súmula
do Supremo Tribunal Federal (STF), tendo em vista que o paciente foi operado de tumor maligno e carece de
tratamento pós-operatório adequado, circunstância incompatível com a condição de preso preventivo.
O Colegiado reconheceu a possibilidade de superação excepcional do Enunciado 691 para assegurar ao paciente
a prisão domiciliar humanitária (CPP, art. 318, inciso II).
Enfatizou que, tendo em vista o alto risco de saúde, a grande possibilidade de desenvolver infecções no cárcere
e a impossibilidade de tratamento médico adequado na unidade prisional ou em estabelecimento hospitalar —
tudo demostrado satisfatoriamente no laudo pericial —, a concessão do ―writ‖ se faz necessária para preservar a
integridade física e moral do paciente, em respeito à dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III).
Vencido o ministro Edson Fachin, que denegava a ordem. Considerou incabível o habeas corpus, pois constava
do laudo pericial que o preso estava em bom estado geral, nutricional e psicológico, embora levemente
deprimido.
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894
Execução provisória da pena e trânsito em julgado

A Segunda turma, em conclusão de julgamento, resolveu questão de ordem para julgar prejudicada a
impetração em face de pedido de desistência do impetrante (Informativos 872 e 891).
HC 136720/PB, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 13.3.2018. (HC - 136720)

893
Terras indígenas e conflito de competência - 3

A Segunda Turma, em conclusão de julgamento, acolheu questão de ordem para julgar prejudicado recurso, no
qual se discutia conflito de competência entre a Justiça Federal e a Justiça Comum para julgar delito
supostamente praticado por indígena em área reservada (Informativos 650 e 655).
RE 541737/SC, rel. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ ac. Min. Edson Fachin, julgamento em 6.3.2018.
(RE - 541737)

892
Prazo decadencial e direito de representação - 2

A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, denegou a ordem e revogou a liminar
anteriormente deferida em ―habeas corpus‖ que postulava a extinção de processo criminal com base
essencialmente na alegação de desconsideração do prazo decadencial do direito de representação em crime de
atentado violento ao pudor [CP, art. 214 (1)] (Informativo 878).
No caso, a denúncia do paciente foi realizada em 2012, quando já estava em vigor a Lei 12.015/2009, que
alterou o disposto no art. 225 do Código Penal (2), e mais de cinco anos após a ocorrência do delito.
A Turma asseverou que as instâncias ordinárias concluíram que o crime foi praticado mediante violência real.
Incide, portanto, o Enunciado 608 da Súmula do STF (3), mesmo após o advento da Lei 12.015/2009. Com
efeito, rejeitou a alegação de decadência ao fundamento de que a ação penal é pública incondicionada, na linha
do que decidido no HC 102.683/RS (DJe de 7.2.2011).
Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deferiu a ordem para declarar extinto o processo ante a
decadência.
Decisão judicial transitada em julgado e “habeas corpus”

A Segunda Turma negou provimento a recurso ordinário em ―habeas corpus‖ no qual se pleiteava a anulação de
sentença penal condenatória transitada em julgado.
Preliminarmente, a Turma conheceu do ―habeas corpus‖. Considerou o ―writ‖ cabível, na espécie, por ser mais
célere e benéfico ao paciente, além de sua impetração estar autorizada no art. 648, VI, do CPP (1). Ademais, a
negativa de conhecimento do remédio constitucional dificultaria a defesa do direito das pessoas privadas de
liberdade por condenação alegadamente injusta.
No mérito, a Turma ressaltou que, apesar de parte das alegações da defesa não terem sido expressamente
enfrentadas quando do julgamento da apelação interposta na origem — o que ensejaria a nulidade ora apontada
—, cabia à parte interessada opor embargos de declaração, o que não ocorreu. Por outro lado, as referidas
alegações foram apresentadas de forma lacônica, em dois parágrafos das razões de apelação, sem demonstrar
conecção com o ponto de interesse. Concluiu não haver nulidade a ser reconhecida no acórdão condenatório
impugnado.

891
Execução provisória da pena e trânsito em julgado

A Segunda Turma afetou ao Plenário o julgamento de ―habeas corpus‖ em que se discute a possibilidade de
execução provisória da pena após o julgamento de recurso em segundo grau de jurisdição.

Gestantes e mães presas preventivamente e “habeas corpus” coletivo

A Segunda Turma, por maioria, concedeu a ordem em ―habeas corpus‖ coletivo, impetrado em favor de todas as
mulheres presas preventivamente que ostentem a condição de gestantes, de puérperas ou de mães de crianças
sob sua responsabilidade.
Determinou a substituição da prisão preventiva pela domiciliar — sem prejuízo da aplicação concomitante das
medidas alternativas previstas no art. 319 do CPP (1) — de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas, ou
mães de crianças e deficientes sob sua guarda, nos termos do art. 2º do ECA (2) e da Convenção sobre Direitos
das Pessoas com Deficiência (Decreto Legislativo 186/2008 e Lei 13.146/2015), relacionadas nesse processo
pelo DEPEN e outras autoridades estaduais, enquanto perdurar tal condição, excetuados os casos de crimes
praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou, ainda, em situações
excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício.
Estendeu a ordem, de ofício, às demais mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e de
pessoas com deficiência, bem assim às adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas em idêntica situação no
43

território nacional, observadas as restrições previstas acima.

Quando a detida for tecnicamente reincidente, o juiz deverá proceder em atenção às circunstâncias do caso
concreto, mas sempre tendo por norte os princípios e as regras acima enunciadas, observando, ademais, a
diretriz de excepcionalidade da prisão. Se o juiz entender que a prisão domiciliar se mostra inviável ou
inadequada em determinadas situações, poderá substituí-la por medidas alternativas arroladas no já mencionado
art. 319 do CPP. Para apurar a situação de guardiã dos filhos da mulher presa, dever-se-á dar credibilidade à
palavra da mãe.
Faculta-se ao juiz, sem prejuízo de cumprir, desde logo, a presente determinação, requisitar a elaboração de
laudo social para eventual reanálise do benefício. Caso se constate a suspensão ou destituição do poder familiar
por outros motivos que não a prisão, a presente ordem não se aplicará.
A fim de se dar cumprimento imediato a esta decisão, deverão ser comunicados os Presidentes dos Tribunais
Estaduais e Federais, inclusive da Justiça Militar Estadual e Federal, para que prestem informações e, no prazo
máximo de 60 dias a contar de sua publicação, implementem de modo integral as determinações estabelecidas
no presente julgamento, à luz dos parâmetros ora enunciados. Com vistas a conferir maior agilidade, e sem
prejuízo da medida determinada acima, também deverá ser oficiado ao DEPEN para que comunique aos
estabelecimentos prisionais a decisão, cabendo a estes, independentemente de outra provocação, informar aos
respectivos juízos a condição de gestante ou mãe das presas preventivas sob sua custódia.
Deverá ser oficiado, igualmente, ao Conselho Nacional de Justiça — CNJ, para que, no âmbito de atuação do
Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas
Socioeducativas, avalie o cabimento de intervenção nos termos preconizados no art. 1º, § 1º, II, da Lei
12.106/2009 (3), sem prejuízo de outras medidas de reinserção social para as beneficiárias desta decisão. O CNJ
poderá ainda, no contexto do Projeto Saúde Prisional, atuar junto às esferas competentes para que o protocolo
de entrada no ambiente prisional seja precedido de exame apto a verificar a situação de gestante da mulher. Tal
diretriz está de acordo com o Eixo 2 do referido programa, que prioriza a saúde das mulheres privadas de
liberdade.
Os juízes responsáveis pela realização das audiências de custódia, bem como aqueles perante os quais se
processam ações penais em que há mulheres presas preventivamente, deverão proceder à análise do cabimento
da prisão, à luz das diretrizes ora firmadas, de ofício.
Embora a provocação por meio de advogado não seja vedada para o cumprimento desta decisão, ela é
dispensável, pois o que se almeja é, justamente, suprir falhas estruturais de acesso à Justiça da população
presa. Cabe ao Judiciário adotar postura ativa ao dar pleno cumprimento a esta ordem judicial. Nas hipóteses de
descumprimento da presente decisão, a ferramenta a ser utilizada é o recurso, e não a reclamação, como já
explicitado na ADPF 347 MC/DF (DJE de 19.2.2016).
Preliminarmente, a Turma entendeu cabível a impetração coletiva e, por maioria, conheceu do ―habeas corpus‖.
Destacou a ação coletiva como um dos únicos instrumentos capazes de garantir o acesso à justiça dos grupos
mais vulneráveis socioeconomicamente. Nesse sentido, o STF tem admitido com maior amplitude a utilização da
ADPF e do mandado de injunção coletivo.
O ―habeas corpus‖, por sua vez, se presta a salvaguardar a liberdade. Assim, se o bem jurídico ofendido é o
direito de ir e vir, quer pessoal, quer de um grupo determinado de pessoas, o instrumento processual para
resgatá-lo é o ―habeas corpus‖, individual ou coletivo.
Esse remédio constitucional é notadamente maleável diante de lesões a direitos fundamentais, e existem
dispositivos legais que encorajam o cabimento do ―writ‖ na forma coletiva, como o art. 654, § 2º (4), do CPP,
que preconiza a competência de juízes e tribunais para expedir ordem de ―habeas corpus‖ de ofício. O art. 580
(5) do mesmo diploma, por sua vez, permite que a ordem concedida em determinado ―writ‖ seja estendida para
todos que se encontram na mesma situação.
Além disso, a existência de outras ferramentas disponíveis para suscitar a defesa coletiva de direitos não deve
obstar o conhecimento desta ação, pois o rol de legitimados não é o mesmo, mas consideravelmente mais
restrito na ADPF, por exemplo. Além disso, o acesso à justiça, sobretudo de mulheres presas e pobres, diante de
sua notória deficiência, não pode prescindir da atuação dos diversos segmentos da sociedade civil em sua
defesa.
Ademais, as autoridades estaduais apresentaram listas contendo nomes e demais dados das mulheres presas
preventivamente, de modo que fica superada qualquer alegação no sentido de as pacientes serem
indeterminadas ou indetermináveis. O fato de a ordem, se concedida, poder se estender a outras mulheres em
idêntica situação não representa novidade, ao contrário, constitui uma das consequências normais do
instrumento.
Fundamental, ainda, que a decisão do STF, no caso, contribua para imprimir maior isonomia às partes
envolvidas, para permitir que lesões a direitos potenciais ou atuais sejam sanadas com mais celeridade e para
descongestionar o acervo de processos em trâmite no país.
Essas razões, somadas ao reconhecimento do estado de coisas inconstitucional do sistema prisional, bem assim
à existência de decisões dissonantes sobre o alcance da redação do art. 318, IV e V, do CPP (6), impõem o
reconhecimento da competência do STF para o julgamento do ―writ‖, sobretudo tendo em conta a relevância
constitucional da matéria.
O ministro Dias Toffoli acresceu que, nos termos da Constituição, o mandado de segurança é cabível quando
não cabe o ―habeas corpus‖; e é admissível o mandado de segurança coletivo. Por dedução, está prevista a
possibilidade do ―habeas corpus‖ coletivo. Entretanto, conheceu em parte da impetração, apenas no tocante a
atos coatores advindos do STJ, sem prejuízo de eventual concessão da ordem de ofício, se o ato coator houver
se originado nos demais juízos.
44

O ministro Edson Fachin também conheceu em parte da ação, para obstar a impetração ―per saltum‖.
No mérito, o Colegiado entendeu haver grave deficiência estrutural no sistema carcerário, que faz com que
mulheres grávidas e mães de crianças, bem como as próprias crianças, sejam submetidas a situações
degradantes, resultantes da privação de cuidados pré-natal e pós-parto e da carência de berçários e creches.
A respeito, apenas o STF se revela capaz, ante a situação descrita, de superar os bloqueios políticos e
institucionais que vêm impedindo o avanço de soluções, o que significa cumprir à Corte o papel de retirar os
demais Poderes da inércia, catalisar os debates e novas políticas públicas, coordenar ações e monitorar os
resultados.
Além disso, existe a cultura do encarceramento, que se revela pela imposição exagerada de prisões provisórias a
mulheres pobres e vulneráveis, e que resulta em situações que ferem a dignidade de gestantes e mães, com
prejuízos para as respectivas crianças.
Ressalte-se que o país não tem conseguido garantir sequer o bem-estar de gestantes e mães que não estão
inseridas no sistema prisional, ainda que o cuidado com a saúde maternal, de acordo com a ONU, seja prioritário
no que concerne à promoção de desenvolvimento.
Assim, a atuação do Tribunal no sentido de coibir o descumprimento sistemático de regras constitucionais e
infraconstitucionais referentes aos direitos das presas e de seus filhos é condizente com os textos normativos
que integram o patrimônio mundial de salvaguarda dos indivíduos colocados sob a custódia do Estado.
As crianças, notadamente, sofrem as consequências desse quadro em flagrante violação aos arts. 227 (7) e 5º,
XLV (8), da CF, o que resulta em impactos ao seu bem-estar físico e psíquico e em danos ao seu
desenvolvimento.
Portanto, diante desse panorama, é de se evitar a arbitrariedade judicial e a supressão de direitos, típicas de
sistemas jurídicos que não dispõem de soluções coletivas para problemas estruturais. Nesse sentido, cabe ao
STF estabelecer os parâmetros a serem observados pelos juízes quando se depararem com a possibilidade de
substituir a prisão preventiva pela domiciliar.
Vencido, em parte, o ministro Edson Fachin, que concedeu a ordem para conferir interpretação conforme à
Constituição aos incisos IV, V e VI do art. 318 do CPP, de modo que a substituição da prisão preventiva pela
domiciliar esteja submetida à análise do caso concreto, para que se observe o melhor interesse da criança, sem
revisão automática das medidas já decretadas.

890
Quebra de sigilo telefônico e telemático

A Segunda Turma negou provimento a recurso ordinário em ―habeas corpus‖ no qual se discutia a ilicitude das
interceptações telefônicas e telemáticas e das demais provas que delas decorreram.
No caso, a recorrente foi denunciada em razão de desvios de verbas públicas federais mediante utilização de
expedientes fraudulentos, a caracterizar, em tese, os crimes de peculato, corrupção, fraude em licitações,
falsidade ideológica e formação de quadrilha.
A defesa sustentava que a recorrente estaria submetida a constrangimento ilegal, tendo em vista que sua
condenação teria sido fundamentada em provas ilícitas derivadas de sucessivas interceptações telefônicas que
perduraram por prazo excessivo. A recorrente alegava, ainda, nulidade da interceptação de e-mails no decorrer
das investigações. Ressaltava que as provas foram baseadas em denúncia anônima, sem qualquer investigação
preliminar por parte da autoridade policial.
A Turma assinalou que as interceptações não foram baseadas em uma denúncia propriamente anônima, haja
vista que, embora apócrifo o documento que noticia as ilicitudes, este indica o seu autor.
Destacou que a autoridade policial realizou as interceptações com base em diligência preliminar e informações
recebidas pelo Ministério da Justiça, bem como pelos dados fornecidos pela Controladoria-Geral da União (CGU).
Registrou que a decisão proferida pelo juízo processante que autorizou a interceptação telefônica está
devidamente fundamentada, de modo que os elementos constantes dos autos são suficientes para afastar os
argumentos da defesa de que não haveria indícios razoáveis de autoria e materialidade delitiva para se
determinar a medida invasiva ou de que as provas pudessem ser colhidas por outros meios disponíveis.
Afirmou que o Supremo Tribunal Federal reconheceu, já sob a égide do ordenamento constitucional vigente, que
o sigilo de correspondência não é absoluto.
Ademais, a exceção constitucional ao sigilo alcança as comunicações de dados telemáticos, razão pela qual não
há nenhum tipo de vício.
RHC 132115/PR, rel. Min. Dias Tóffoli, julgamento em 6.2.2018. (RHC-132115)

889 – X

STF JURISPRUDÊNCIA PENAL 2018 1º SEMESTRE:

908
Configuração de crime militar e licenciamento
45

907
Atentado violento ao pudor e lei das contravenções penais

906 x
905 x

904
Descaminho e crédito tributário
Incidência de segunda deserção e extinção do processo - 2
Remição ficta e omissão do Estado - 2

903
Falsidade ideológica para fins eleitorais e omissão de recursos de campanha

902 x

901
Furto e responsabilidade civil de concessionária de serviços públicos
Princípio da insignificância e pesca no período de defeso

900 X

899
Roubo e extorsão e a continuidade delitiva

898
Descaminho e princípio da insignificância

897
Descaminho e princípio da insignificância
Furto e configuração de crime impossível

896
Progressão de regime e Súmula 715/STF

895 X

894
Desacato praticado por civil contra militar e constitucionalidade

893
Incitação à discriminação religiosa e liberdade de expressão

892 X

891
Inexigibilidade de licitação e tipicidade da conduta

890
Prescrição da pretensão punitiva e execução imediata da pena
46

STJ JURISPRUDÊNCIA PROCESSUAL PENAL

2018 1º SEMESTRE:
627

Crime tributário. Constituição definitiva do crédito. Justa causa presente.


Súmula vinculante 24. Juntada do procedimento tributário.
Desnecessidade. Eventuais irregularidades. Discussão na sede própria.

Para o início da ação penal, basta a prova da constituição definitiva do crédito


tributário (Súmula Vinculante 24), sendo desnecessária a juntada integral do
Procedimento Administrativo Fiscal correspondente.

Cumpre informar, de início, que a materialidade dos crimes listados no art. 1º,
inciso I a IV, da Lei n. 8.137/1990 apenas se verifica com a constituição definitiva
do crédito tributário, situação que ocorre por meio do procedimento tributário
devidamente instaurado. Assim, o direito penal apenas passa a ter lugar após
verificada a adequada tipicidade da conduta imputada. Nesse contexto, não se
revela indispensável a juntada dos documentos tributários, mas apenas a
comprovação da constituição definitiva do crédito tributário. Eventual
desconstituição do que foi averiguado tributariamente não pode ser feito no juízo
criminal, cabendo ao recorrente se valer dos meios próprios para tanto. Em suma:
a) para o início da ação penal, basta a prova da constituição definitiva do crédito
tributário (Súmula Vinculante 24), não sendo necessária a juntada integral do
Procedimento Administrativo Fiscal – PAF correspondente; b) a validade do crédito
fiscal deve ser examinada no Juízo cível, não cabendo à esfera penal qualquer
tentativa de sua desconstituição; c) caso a defesa entenda que a documentação
apresentada pelo Parquet é insuficiente e queira esmiuçar a dívida, pode apresentar
cópia do referido PAF ou dizer de eventuais obstáculos administrativos; e d) se
houver qualquer obstáculo administrativo para o acesso ao procedimento
administrativo fiscal respectivo, a parte pode sugerir ao Juiz sua atuação até
mesmo de ofício, desde que aponte qualquer prejuízo à defesa, que possa interferir
na formação do livre convencimento do julgador.

Apelação julgada por maioria. Nova técnica de complementação de


julgamento. Aplicação do art. 942 do CPC/2015. Possibilidade. Art. 198 do
ECA.

Admite-se a incidência do art. 942 do novo Código de Processo Civil para


complementar o julgamento da apelação julgada por maioria nos procedimentos
relativos ao estatuto do menor.

Segundo o art. 198 do ECA, nos procedimentos afetos à Justiça da Infância e da


Juventude, inclusive os relativos à execução das medidas socioeducativas, deve ser
adotado o sistema do Código de Processo Civil, que prevê, atualmente, em caso de
decisão por maioria, nova técnica de complementação de julgamento, com a
tomada de outros votos em sessão subsequente ou na mesma sessão. O
procedimento, em tese, nada tem de prejudicial ao menor. Ao contrário,
dependendo da situação, como em caso de voto vencido favorável à tese defensiva,
47

pode lhe ser benéfico. Não se trata, portanto, de reformatio in pejus indireta, uma
vez que estamos diante da implementação de regra técnica de julgamento, que
pode ou não resultar em decisão desfavorável à defesa. Assim, considerando os
termos do art. 198 do ECA, não há, em princípio, ilegalidade no procedimento que
impeça sua aplicação.

Tribunal do Júri. Sustentação oral em plenário. Tempo reduzido.


Deficiência de defesa. Nulidade. Ausência. Imprescindibilidade de
demonstração do prejuízo.

A sustentação oral realizada em tempo reduzido no Tribunal do Júri não caracteriza,


necessariamente, deficiência de defesa técnica.

Na hipótese, busca-se a invalidação da Sessão do Plenário do Júri sob a alegação


de que o causídico constituído à época não desempenhou fielmente a defesa do
paciente em plenário tendo em vista que a sua sustentação oral, descontados os
cumprimentos iniciais, durou apenas 7 minutos, tempo esse que se mostraria
exíguo, irrisório e ineficaz. Ressalta-se que, diante das peculiaridades do Tribunal
do Júri, o fato de ter havido sustentação oral em plenário por tempo reduzido não
implica, necessariamente, a conclusão de que o réu esteve indefeso. Principalmente
quando se verifica a ausência de recursos das partes ou de alguns resultados
concretos, a sugerir a conformidade entre acusação e defesa. A própria alegação da
nulidade, sem a sua efetiva demonstração, e por meio de habeas corpus – meio
impugnativo de cognoscibilidade estreita –, inviabiliza aferir se houve ou não a
inquinada deficiência defensiva, que não pode ser reconhecida apenas porque a
sustentação oral foi sucinta e o julgamento culminou em resultado contrário aos
interesses do réu.

626

Competência. Marinheiro militar licenciado do serviço ativo. Medida de


segurança imposta pela Justiça Militar. Execução. Competência da Justiça
Estadual.

Compete à Justiça Estadual a execução de medida de segurança imposta a militar


licenciado.

Cuida-se de execução de medida de segurança imposta a marinheiro que veio a ser


licenciado do serviço ativo. De acordo com o art. 62 do Código Penal Militar, "o civil
cumpre a pena aplicada pela Justiça Militar, em estabelecimento prisional civil,
ficando ele sujeito ao regime conforme a legislação penal comum, de cujos
benefícios e concessões, também, poderá gozar". Assim, constatado que não há
mais vínculo com a Justiça Militar, a pena imposta deve ser executada pela Justiça
Estadual. Não há que se excepcionar, desta regra, a execução da medida de
segurança imposta. Isto porque a execução da medida estabelecida se dará em
estabelecimento estadual, ante a inexistência de estabelecimentos penais federais
próprios para essa finalidade. Inafastável, portanto, o enunciado da Súmula 192
desta Corte, segundo o qual: "compete ao Juízo das Execuções Penais do Estado a
execução das penas impostas a sentenciados pela Justiça Federal, Militar ou
Eleitoral, quando recolhidos a estabelecimentos sujeitos a administração estadual".
48

Extinção de medida socioeducativa de liberdade assistida e prestação de


serviço à comunidade. Decisão favorável ao menor infrator. Não unânime.
Complementação de julgamento. Artigo 942 do CPC/2015.
Inaplicabilidade. Procedimento mais gravoso que o adotado no processo
criminal. Afronta às normas protetivas que regem o ECA.

É inaplicável a técnica de julgamento prevista no artigo 942 do Código de Processo


Civil de 2015 nos procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude
quando a decisão não unânime for favorável ao adolescente.

A questão posta em deslinde está em definir se a técnica de complementação de


julgamento nas decisões colegiadas não unânimes de segunda instância, prevista
no art. 942 do CPC/2015, é cabível nos casos em que o decisum for favorável ao
menor, tendo em vista o princípio do favor rei. Inicialmente, cumpre afirmar que o
sistema recursal da lei processual civil é aplicável aos procedimentos afetos à
Justiça da Infância e da Juventude, inclusive os relativos à execução das medidas
socioeducativas, nos termos do artigo 198 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
E, no caso de decisão não unânime em segunda instância, a lei processual civil
vigente ao tempo da edição do Estatuto Menorista previa o cabimento de embargos
infringentes, medida processual que também era induvidosamente aplicável aos
procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude. Com o advento da Lei
nº 13.105/2015, foi editado novo Código de Processo Civil que, no artigo 942, ao
tempo em que extinguiu os embargos infringentes, adotou técnica de
complementação de julgamento nas decisões colegiadas não unânimes de segunda
instância com o propósito de atender aos reclamos de maior efetividade e
celeridade no processo. É cediço que doutrina e jurisprudência são unívocos em
assegurar ao menor infrator os mesmos direitos de que gozam os penalmente
responsáveis perante a justiça criminal, admitindo, inclusive, a aplicação subsidiária
do Código de Processo Penal, nos termos do artigo 152 do Estatuto da Criança e do
Adolescente. Registre-se, também, que nos procedimentos afetos à Justiça da
Infância e da Juventude não há pretensão punitiva estatal, nem reprimenda de
natureza criminal, mas a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça vem
admitindo uma inegável natureza sancionatória das medidas socioeducativas.
Assim, ainda que não se trate de processo criminal regido pela proibição
de reformatio in pejus e, conquanto que não se cuide de recurso ou meio autônomo
de impugnação, em estando o menor infrator sujeito a medida socioeducativa de
natureza inegavelmente sancionatória, é incabível a complementação do
julgamento segundo a técnica do artigo 942 do novo Código de Processo Civil
quando em prejuízo do menor. Se a decisão não unânime for favorável ao menor
infrator, a complementação do julgamento nos termos analisados, com a eventual
modificação do julgado em prejuízo do menor implicaria, em última análise, em
impingir ao menor infrator tratamento mais gravoso que o atribuído ao réu
penalmente imputável já que os embargos infringentes e de nulidade previstos na
legislação processual penal (art. 609, Código de Processo Penal) somente são
cabíveis na hipótese de o julgamento tomado por maioria prejudicar o réu, por se
tratar de recurso exclusivo da defesa. Dessa forma, se não se admite revisão pelo
mesmo colegiado de acórdão não unânime favorável ao réu punido com pena de
natureza repressiva e punitiva, com maior razão não se pode admitir incidente
processual que produz efeitos semelhantes ao menor cuja reprimenda, apesar da
carga sancionatória, possui natureza preventiva e reeducativa.
49

625

Crimes ambientais. Termo de ajustamento de conduta. Denúncia. Justa


causa. Recebimento.

A assinatura do termo de ajustamento de conduta com órgão ambiental não


impede a instauração de ação penal.

As Turmas especializadas em matéria penal do STJ adotam a orientação de que, em


razão da independência das instâncias penal e administrativa, a celebração de
termo de ajustamento de conduta é incapaz de impedir a persecução penal,
repercutindo apenas, em hipótese de condenação, na dosimetria da pena. Nesse
sentido: AgRg no AREsp 984.920-BA, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma,
DJe 31/08/2017 e HC 160.525-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe
14/03/2013. Assim, "mostra-se irrelevante o fato de o recorrente haver celebrado
termo de ajustamento de conduta, [...] razão pela qual o Parquet, dispondo de
elementos mínimos para oferecer a denúncia, pode fazê-lo, ainda que as condutas
tenham sido objeto de acordo extrajudicial " (RHC 41.003-PI, Rel. Min. Jorge Mussi,
Quinta Turma, DJe 03/02/2014). Desse modo, a assinatura do termo de
ajustamento de conduta, firmado entre denunciado e o Estado, representado pela
Secretaria de Estado do Meio Ambiente, não impede a instauração da ação penal,
pois não elide a tipicidade formal das condutas imputadas ao acusado.

Homicídio qualificado. Qualificadoras com naturezas diversas. Subjetiva e


objetiva. Possibilidade. Motivo torpe e feminicídio. Bis in idem. Ausência.

Não caracteriza bis in idem o reconhecimento das qualificadoras de motivo torpe e


de feminicídio no crime de homicídio praticado contra mulher em situação de
violência doméstica e familiar.

Observe-se, inicialmente, que, conforme determina o art. 121, § 2º-A, I, do CP, a


qualificadora do feminicídio deve ser reconhecida nos casos em que o delito é
cometido em face de mulher em violência doméstica e familiar. Assim,
"considerando as circunstâncias subjetivas e objetivas, temos a possibilidade de
coexistência entre as qualificadoras do motivo torpe e do feminicídio. Isso porque a
natureza do motivo torpe é subjetiva, porquanto de caráter pessoal, enquanto o
feminicídio possui natureza objetiva, pois incide nos crimes praticados contra a
mulher por razão do seu gênero feminino e/ou sempre que o crime estiver atrelado
à violência doméstica e familiar propriamente dita, assim o animus do agente não é
objeto de análise" (Ministro Felix Fischer, REsp 1.707.113-MG, publicado em
07/12/2017).

Tribunal do Júri. Interrogatório do réu. Conduta do juiz. Firmeza. Quebra


da imparcialidade. Ausência. Nulidade. Não ocorrência.

A condução do interrogatório do réu de forma firme durante o júri não importa,


necessariamente, em quebra da imparcialidade do magistrado e em influência
negativa nos jurados.

No caso analisado, verifica-se que o tribunal de origem reconheceu a imparcialidade


do magistrado, deixando assente que Sua Excelência, embora tenha sido "firme"
com o réu, não desbordou seu comportamento, conduzindo o julgamento com a
50

isenção que é esperada do togado em um plenário do Júri. Agir com firmeza não é
motivo para imputar ao magistrado a pecha da falta de imparcialidade. O juiz não é
mero espectador do julgamento e tem, não só o direito, mas o dever (art. 497 do
Código de Processo Penal) de conduzi-lo. A quebra da imparcialidade tem de estar
atrelada a alguma conduta do magistrado que possa desequilibrar a balança do
contraditório, ou seja, favorecer, para qualquer dos lados, a atuação das partes.

Execução penal. Remição. Trabalho em período anterior ao início da


execução. Possibilidade se posterior à prática do delito.

É possível a remição do tempo de trabalho realizado antes do início da execução da


pena, desde que em data posterior à prática do delito.

Inicialmente cumpre salientar que a impetrante pretende que se faça uma


analogia in bonam partem, aplicando-se, no caso em apreço - relativo ao instituto
da remição -, o entendimento adotado quanto à detração, aproveitando-se, na
execução em curso, o período trabalhado no cumprimento da pena de processo
anterior. Sabe-se que este Superior Tribunal de Justiça firmou orientação quanto à
impossibilidade de remição por trabalho executado em momento anterior à prática
do delito referente à pena a ser remida. No caso denota-se que o trabalho em
questão foi realizado em momento posterior à prática de um dos delitos cuja
condenação se executa, de modo que, nesta hipótese, ainda que anterior ao início
da execução, é possível a remição da pena pelo trabalho relativamente ao delito
praticado anteriormente. Embora haja a possibilidade de o condenado remir o
tempo de cumprimento da reprimenda pelo exercício do trabalho, como forma de
implementar o objetivo ressocializador da pena, integrando-o, gradativamente, ao
convívio social, a concessão de benefícios não pode favorecer o estímulo à prática
de novas infrações penais. Por isso, entende-se não ser possível a detração ou a
remição em processo distinto, dos dias trabalhados durante a execução de pena já
extinta. O que se pretende evitar é o estímulo à prática de novos delitos, ou seja,
que, em razão de eventual "crédito" já constante em seu favor, o apenado cometa
uma nova infração, sobre a qual pretenderia eventual abatimento em razão do
trabalho já realizado, o que, com efeito, não pode ser admitido. Todavia, observa-
se que, não se trata de fato praticado após o trabalho realizado pelo apenado, mas
de delito anterior ao labor, de modo que não há falar em estímulo ou em "crédito",
pois a infração já havia sido praticada. Por essa razão, não se verifica similitude
entre as hipóteses de vedação de incidência do instituto da remição, devendo,
nesse contexto, ser dado o mesmo tratamento utilizado para a detração.

624

Nomeação do Núcleo de Prática Jurídica em juízo. Procuração. Juntada.


Desnecessidade. Inaplicabilidade da Súmula 115/STJ.

A nomeação judicial de Núcleo de Prática Jurídica para patrocinar a defesa de réu


dispensa a juntada de procuração.

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento que


encontrava dissonância no âmbito das Turmas que a compõe. A Quinta Turma
firmou entendimento de que "o advogado integrante do Núcleo de Prática Jurídica
não está dispensado de apresentar a procuração ou ato de nomeação judicial, por
ausência de previsão legal, visto que somente é equiparado à Defensoria Pública no
51

tocante à intimação pessoal dos atos processuais", em contraposição ao


entendimento da Sexta Turma, que se pronunciou pela desnecessidade da juntada
de procuração quando se trata de defensor dativo, nos autos do AgRg nos EDcl no
Ag 1.420.710-SC. O Núcleo de Prática Jurídica, por não se tratar de entidade de
direito público, não se exime da apresentação de instrumento de mandato quando
constituído pelo réu hipossuficiente a quem cabe a livre escolha do seu defensor,
em consonância com o princípio da confiança. A nomeação judicial do Núcleo de
Prática Jurídica para patrocinar a defesa do réu, todavia, dispensa a juntada de
procuração, por não haver atuação provocada pelo assistido, mas sim exercício
domunus público por determinação judicial, sendo, portanto, afastada a incidência
da Súmula 115/STJ. Além disso, não se mostra admissível a exigência de
procuração, porquanto não raras as vezes sequer há contato do advogado dativo
com o acusado, sendo certo que manter a exigência de mandato acarretaria
gravosos prejuízos à defesa da população necessitada, inviabilizando o acesso à
Justiça.

623

Homicídio. Embriaguez ao volante. Dolo eventual. Ausência de


circunstâncias excedentes ao tipo. Desclassificação. Homicídio culposo.

A embriaguez do agente condutor do automóvel, por si só, não pode servir de


premissa bastante para a afirmação do dolo eventual em acidente de trânsito com
resultado morte.

De início, pontua-se que considerar que a embriaguez ao volante, de per si, já


configuraria a existência de dolo eventual equivale admitir que todo e qualquer
indivíduo que venha a conduzir veículo automotor em via pública com a capacidade
psicomotora alterada em razão da influência de álcool responderá por homicídio
doloso, ao causar, por violação a regra de trânsito, a morte de alguém. Não se
descura que a embriaguez ao volante é circunstância negativa que deve contribuir
para a análise do elemento anímico que move o agente. Todavia, não é a melhor
solução estabelecer-se, como premissa aplicável a qualquer caso relativo a delito
viário, no qual o condutor esteja sob efeito de bebida alcóolica, que a presença do
dolo eventual é o elemento subjetivo ínsito ao comportamento, a ponto de
determinar que o agente seja submetido a Júri Popular mesmo que não se
indiquem quaisquer outras circunstâncias que confiram lastro à ilação de que o
acusado anuiu ao resultado lesivo. O estabelecimento de modelos extraídos
da praxis que se mostrem rígidos e impliquem maior certeza da adequação típica
por simples subsunção, a despeito da facilidade que ocasionam no exame dos casos
cotidianos, podem suscitar desapego do magistrado aos fatos sobre os quais recairá
a imputação delituosa, afastando, nessa medida, a incidência do impositivo direito
penal do fato. Diferente seria a conclusão se, por exemplo, estivesse o condutor do
automóvel dirigindo em velocidade muito acima do permitido, ou fazendo,
propopitalmente, zigue-zague na pista, ou fazendo sucessivas ultrapassagens
perigosas, ou desrespeitando semáforos com sinal vermelho, postando seu veículo
em rota de colisão com os demais apenas para assustá-los, ou passando por outros
automóveis "tirando fino" e freando logo em seguida etc. Enfim, situações que
permitissem ao menos suscitar a possível presença de um estado anímico
compatível com o de quem anui com o resultado morte. Assim, não se afigura
razoável atribuir a mesma reprovação a quem ingere uma dose de bebida alcoólica
52

e em seguida dirige em veículo automotor, comparativamente àquele que, após


embriagar-se completamente, conduz automóvel na via.

Homicídio na direção de veículo após suposta ingestão de bebida alcoólica.


Dolo eventual versus culpa consciente. Aferição. Juiz togado. Pronúncia.
Filtro processual.

Na primeira fase do Tribunal do Júri, ao juiz togado cabe apreciar a existência de


dolo eventual ou culpa consciente do condutor do veículo que, após a ingestão de
bebida alcoólica, ocasiona acidente de trânsito com resultado morte.

Observe-se, inicialmente a indagação a respeito da presença do dolo eventual: se o


conceito jurídico-penal acerca do que é dolo eventual já produz enormes
dificuldades ao julgador togado, que emite juízos técnicos, apoiados em séculos de
estudos das ciências penais, o que se pode esperar de um julgamento realizado por
pessoas que não possuem esse saber e que julgam a partir de suas íntimas
convicções, sem explicitação dos fundamentos e razões que definem seus
julgamentos? O legislador criou um procedimento bifásico para o julgamento dos
crimes dolosos contra a vida, em que a primeira fase se encerra com uma avaliação
técnica, empreendida por um juiz togado, o qual se socorre da dogmática penal e
da prova dos autos, e mediante devida fundamentação, portanto, não se pode
desprezar esse "filtro de proteção para o acusado" e submetê-lo ao julgamento
popular sem que se façam presentes as condições necessárias e suficientes para
tanto. Note-se que a primeira etapa do procedimento bifásico do Tribunal do Júri
tem o objetivo principal de avaliar a suficiência ou não de razões (justa causa) para
levar o acusado ao seu juízo natural. O juízo da acusação (iudicium accusationis)
funciona como um filtro pelo qual somente passam as acusações fundadas, viáveis,
plausíveis e idôneas a serem objeto de decisão pelo juízo da causa (iudicium
causae). Deste modo, não é consentâneo, aos objetivos a que representa na
dinâmica do procedimento bifásico do Tribunal do Júri, a decisão de pronúncia
relegar a juízes leigos, com a cômoda invocação da questionável regra do in dubio
pro societate, a tarefa de decidir sobre a ocorrência de um estado anímico cuja
verificação demanda complexo e técnico exame de conceitos jurídico-penais.

Crime contra a ordem tributária. Dados bancários obtidos pela Receita


Federal. Compartilhamento com o Ministério Público. Licitude da prova.

É possível a utilização de dados obtidos pela Secretaria da Receita Federal, em


regular procedimento administrativo fiscal, para fins de instrução processual penal.

O plenário do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o RE 601.314-SP, Rel. Min.


Edson Fachin, DJe 16/09/2016, e após reconhecer a repercussão geral da matéria,
assentou a constitucionalidade do art. 6º da Lei Complementar n. 105/2001, que
autoriza o fornecimento de informações sobre movimentações financeiras
diretamente ao Fisco, sem autorização judicial. Por seu turno, há reiteradas
decisões do STF, afirmando que deve ser estendida a compreensão fixada no
julgamento do RE 601.314-SP à esfera criminal, sendo legítimos "[...] os meios de
obtenção da prova material e sua utilização no processo Administrativo fiscal,
mostra-se lícita sua utilização para fins da persecução criminal. Sobretudo, quando
se observa que a omissão da informação revelou a efetiva supressão de tributos,
demonstrando a materialidade exigida para configuração do crime previso no art.
53

12, inciso I, da Lei n. 8.137/1990, não existindo qualquer abuso por parte da
Administração Fiscal em encaminhar as informações ao Parquet" (ARE n. 953.058-
SP, Ministro Gilmar Mendes). Com isso, o entendimento de que é incabível o uso da
chamada prova emprestada do procedimento fiscal em processo penal, tendo em
vista que a obtenção da prova (a quebra do sigilo bancário) não conta com
autorização judicial, contraria a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal
Federal de que é possível a utilização de dados obtidos pela Secretaria da Receita
Federal, em regular procedimento administrativo fiscal, para fins de instrução
processual penal. Nesse sentido, não há falar em ilicitude das provas que embasam
a denúncia em processo penal obtidas por meio de compartilhamento pelo Fisco de
informações sobre movimentação bancária obtidos sem autorização judicial,
porquanto, assim como o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da
instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para cobrança do
crédito tributário, também o é ao Ministério Público, sempre que, no curso de ação
fiscal de que resulte lavratura de auto de infração de exigência de crédito de
tributos e contribuições, se constate fato que configure, em tese, crime contra a
ordem tributária.

622

SÚMULA N. 607

A majorante do tráfico transnacional de drogas (art. 40, I, da Lei n. 11.343/2006)


configura-se com a prova da destinação internacional das drogas, ainda que não
consumada a transposição de fronteiras. Terceira Seção, julgado em 11/04/2018,
DJe 17/04/2018.

Tráfico ilícito de drogas. Causa de aumento da pena. Art. 40, inciso III, da
lei n. 11.343/2006. Infração cometida nas imediações de estabelecimento
de ensino em uma madrugada de domingo. Ausência de exposição de uma
aglomeração de pessoas à atividade criminosa. Interpretação teleológica.
Afastamento da majorante.

Não incide a causa de aumento de pena prevista no art. 40, inciso III, da Lei n.
11.343/2006, se a prática de narcotraficância ocorrer em dia e horário em que não
facilite a prática criminosa e a disseminação de drogas em área de maior
aglomeração de pessoas.

Consoante entendimento firmado por este Superior Tribunal de Justiça, a causa de


aumento de pena prevista no art. 40, inciso III, da Lei n. 11.343/2006 tem
natureza objetiva, não sendo necessária a efetiva comprovação de mercancia na
respectiva entidade de ensino, ou mesmo de que o comércio visa a atingir os
estudantes, sendo suficiente que a prática ilícita tenha ocorrido em locais próximos,
ou seja, nas imediações do estabelecimento. Na espécie em exame, contudo,
verifica-se a presença de particularidade que, mediante uma interpretação
teleológica do disposto no artigo 40, inciso III, da Lei de Drogas, permite o
afastamento da referida causa de aumento de pena, uma vez que o delito de tráfico
ilícito de drogas foi praticado em local próximo a estabelecimento de ensino, tendo
o crime ocorrido no período da madrugada, em um domingo, horário em que a
escola não estava em funcionamento. A proximidade da escola, neste caso, tratou-
se de elemento meramente circunstancial, sem relação real e efetiva com a
54

traficância realizada. Nesse contexto, observe-se que a razão de ser da norma é


punir de forma mais severa quem, por traficar nas dependências ou na proximidade
de estabelecimento de ensino, tem maior proveito e facilidade na difusão e no
comércio de drogas em região de grande circulação de pessoas, expondo os
frequentadores do local a um risco inerente à atividade criminosa da
narcotraficância. Conclui-se, por fim, que, diante da prática do delito em dia e
horário (domingo de madrugada) em que o estabelecimento de ensino não estava
em funcionamento, de modo a facilitar a prática criminosa e a disseminação de
drogas em área de maior aglomeração de pessoas, não há falar em incidência da
majorante prevista no artigo 40, inciso III, da Lei n. 11.343/2006, pois ausente
a ratio legis da norma em tela.

621

Violência doméstica e familiar contra a mulher. Danos morais. Indenização


mínima. Art. 387, IV, do CPP. Pedido necessário. Produção de prova
específica dispensável. Dano in re ipsa.

Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é


possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que
haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada
a quantia, e independentemente de instrução probatória.

Cinge-se a controvérsia a definir a necessidade ou não de indicação de um


montante mínimo pelo postulante, bem como a necessidade ou não da produção de
prova, durante a instrução criminal, para a fixação, em sentença condenatória, da
indenização por danos morais sofridos pela vítima de violência doméstica. Em
relação à primeira questão, cumpre salientar que ambas as Turmas desta Corte
Superior já firmaram o entendimento de que a imposição, na sentença
condenatória, de indenização, a título de danos morais, para a vítima de violência
doméstica, requer a dedução de um pedido específico, em respeito às garantias do
contraditório e da ampla defesa. Entretanto, a Quinta Turma possui julgados no
sentido de ser necessária a indicação do valor pretendido para a reparação do dano
sofrido. Já a Sexta Turma considera que o juízo deve apenas arbitrar um valor
mínimo, mediante a prudente ponderação das circunstâncias do caso concreto.
Nesse sentido, a fim de uniformizar o entendimento, conclui-se que o pedido
expresso por parte do Ministério Público ou da ofendida, na exordial acusatória, é,
de fato, suficiente, ainda que desprovido de indicação do seu quantum, de sorte a
permitir ao juízo sentenciante fixar o valor mínimo a título de reparação pelos
danos morais, sem prejuízo, evidentemente, de que a pessoa interessada promova,
no juízo cível, pedido complementar, onde, então, será necessário produzir prova
para a demonstração do valor dos danos sofridos. Já em relação à segunda
questão, é importante destacar que no âmbito da reparação dos danos morais, a
Lei Maria da Penha, complementada pela reforma do Código de Processo Penal
através da Lei n. 11.719/2008, passou a permitir que o juízo único – o criminal –
possa decidir sobre um montante que, relacionado à dor, ao sofrimento, à
humilhação da vítima, de difícil mensuração, deriva da própria prática criminosa
experimentada. Assim, não há razoabilidade na exigência de instrução probatória
acerca do dano psíquico, do grau de humilhação, da diminuição da autoestima, etc,
se a própria conduta criminosa empregada pelo agressor já está imbuída de
desonra, descrédito e menosprezo ao valor da mulher como pessoa e à sua própria
55

dignidade. O que se há de exigir como prova, mediante o respeito às regras do


devido processo penal – notadamente as que derivam dos princípios do
contraditório e da ampla defesa –, é a própria imputação criminosa – sob a regra,
decorrente da presunção de inocência, de que o onus probandi é integralmente do
órgão de acusação –, porque, uma vez demonstrada a agressão à mulher, os danos
psíquicos dela resultantes são evidentes e nem têm mesmo como ser
demonstrados. Diante desse quadro, a simples relevância de haver pedido expresso
na denúncia, a fim de garantir o exercício do contraditório e da ampla defesa, é
bastante para que o Juiz sentenciante, a partir dos elementos de prova que o
levaram à condenação, fixe o valor mínimo a título de reparação dos danos morais
causados pela infração perpetrada, não sendo exigível produção de prova específica
para aferição da profundidade e/ou extensão do dano. O merecimento à
indenização é ínsito à própria condição de vítima de violência doméstica e familiar.
O dano, pois, é in re ipsa.

Furto nas depedências de local sujeito à administração militar. Militar em


serviço. Res furtivasob administração militar. Competência do juízo
castrense.

Compete à Justiça Militar processar e julgar o crime de furto, praticado por civil, de
patrimônio que, sob administração militar, encontra-se nas dependências desta.

Preliminarmente, importante consignar que não se desconhece a tramitação da


ADPF n. 289 perante a Suprema Corte, na qual a Procuradoria-Geral da República
pretende o reconhecimento da incompetência da Justiça Militar da União para
julgamento de civis em tempo de paz. Contudo, inexistindo pronunciamento com
efeito erga omnesnesse sentido, ou edição de Súmula Vinculante, permanece o
entendimento firmado no sentido de se considerar crime militar o furto praticado
em local sujeito à administração militar em detrimento de patrimônio sob
administração militar. Na hipótese analisada, ainda que praticado por civil, extrai-se
dos autos que o furto ocorreu nas dependências do Parque de Material Aeronáutico,
a res furtiva estava na posse de soldado da Aeronáutica em serviço e pertence ao
material bélico das Forças Armadas. Por esse motivo, restou configurado o crime
militar, nos termos do art. 9º, inciso III, alínea I, "a", do Código Penal Militar. No
mesmo sentido, observa-se precedente no qual é possível verificar a competência
da Justiça Estadual quando o objeto material do delito é de propriedade privada,
nos levando à conclusão que, se pertencesse à administração militar, a
competência seria da Justiça Castrense. (CC 115.311-PA, Rel. Min. Maria Thereza
de Assis Moura, Terceira Seção, DJe 21/03/2011).

Execução penal. Unificação das penas. Superveniência do trânsito em


julgado de sentença condenatória. Termo a quo para concessão de novos
benefícios. Ausência de previsão legal para alteração da data-base.

A alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios, em razão


da unificação das penas, não encontra respaldo legal.

As Turmas que compõem a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em


consonância com a compreensão do Supremo Tribunal Federal acerca do tema,
possuíam o entendimento pacificado de que, sobrevindo condenação definitiva ao
apenado, por fato anterior ou posterior ao início da execução penal, a contagem do
56

prazo para concessão de futuros benefícios seria interrompida, de modo que o novo
cálculo, realizado com base no somatório das penas, teria como termo a quo a data
do trânsito em julgado da última sentença condenatória. Entretanto, da leitura dos
artigos 111, parágrafo único, e 118, II, da Lei de Execução Penal, invocados para
sustentar o posicionamento mencionado, apenas se conclui que, diante da
superveniência do trânsito em julgado de sentença condenatória, caso
o quantum de pena obtido após o somatório não permita a preservação do regime
atual de cumprimento da pena, o novo regime será então determinado por meio do
resultado da soma, de forma que estará o sentenciado sujeito à regressão. Assim,
sequer a regressão de regime é consectário necessário da unificação das penas,
porquanto será forçosa a regressão de regime somente quando a pena da nova
execução, somada à reprimenda ainda não cumprida, torne incabível o regime
atualmente imposto. Portanto, da leitura dos artigos supra, não se infere que,
efetuada a soma das reprimendas impostas ao sentenciado, é mister a alteração da
data-base para concessão de novos benefícios. Por conseguinte, deduz-se que a
alteração do termo a quo referente à concessão de novos benefícios no bojo da
execução da pena constitui afronta ao princípio da legalidade e ofensa à
individualização da pena, motivo pelo qual se faz necessária a preservação do
marco interruptivo anterior à unificação das penas. Ainda que assim não fosse, o
reinício do marco temporal permanece sem guarida se analisados seus efeitos na
avaliação do comportamento do reeducando. Caso o crime cometido no curso da
execução tenha sido registrado como infração disciplinar, seus efeitos já
repercutiram no bojo do cumprimento da pena, pois, segundo a jurisprudência
consolidada desta Corte Superior, a prática de falta grave interrompe a data-base
para concessão de novas benesses, à exceção do livramento condicional, da
comutação de penas e do indulto. Portanto, a superveniência do trânsito em
julgado da sentença condenatória não poderia servir de parâmetro para análise do
mérito do apenado, sob pena de flagrante bis in idem. No mesmo caminho, o delito
praticado antes do início da execução da pena não constitui parâmetro idôneo de
avaliação do mérito do apenado, porquanto evento anterior ao início do resgate das
reprimendas impostas não desmerece hodiernamente o comportamento do
sentenciado e não se presta a macular sua avaliação, visto que é estranho ao
processo de resgate da pena. A unificação de nova condenação definitiva já possui
o condão de recrudescer o quantum de pena restante a ser cumprido pelo
reeducando, logo, a alteração da data-base para concessão de novos benefícios, a
despeito da ausência de previsão legal, configura excesso de execução, baseado
apenas em argumentos extrajurídicos.

620

Conflito negativo de competência. Compartilhamento de sinal de TV por


assinatura, via satélite ou cabo. Card Sharing. Convenção de Berna.
Transnacionalidade da conduta. Competência da Justiça Federal.

Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes de violação de direito


autoral e contra a lei de softwaredecorrentes do compartilhamento ilícito de sinal de
TV por assinatura, via satélite ou cabo, por meio de serviços de card sharing.

A conduta assinalada consiste no compartilhamento ilícito de sinal de TV, por meio


de um cartão no qual são armazenadas chaves criptografadas que carregam, de
forma cifrada, o conteúdo audiovisual. Tais cartões são inseridos em equipamentos
57

que viabilizam a captação do sinal, via cabo ou satélite, e sua adequada


decodificação, conhecidos como AZBox, Duosat, AzAmérica, entre outros. Ao que
consta dos autos, uma das formas de quebra das chaves criptográficas é feita por
fornecedores situados na Ásia e Leste Europeu, que enviam, via internet, a pessoas
que as distribuem, também via internet, aos usuários dos decodificadores ilegais,
assim permitindo que o sinal de TV seja irregularmente captado. Nesse sentido, de
acordo com o art. 109, V, da Constituição Federal, a competência da jurisdição
federal se dá pela presença concomitante da transnacionalidade do delito e da
assunção de compromisso internacional de repressão, constante de tratados ou
convenções internacionais. A previsão normativa internacional, na hipótese, é a
Convenção de Berna, integrada ao ordenamento jurídico nacional através do
Decreto n. 75.699/1975, e reiterada na Organização Mundial do Comércio – OMC
por acordos como o TRIPS (Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights) -
Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao
Comércio (AADPIC), incorporado pelo Decreto n. 1.355/1994, com a previsão dos
princípios de proteção ao direitos dos criadores. O outro requisito constitucional, de
tratar-se de crime à distância, com parcela do crime no Brasil e outra parcela
do iter criminis fora do país, é constatado pela inicial prova da atuação
transnacional dos agentes, por meio da internet. Nesse contexto, tem-se por
evidenciados os requisitos da previsão das condutas criminosas em tratado ou
convenção internacional e do caráter de internacionalidade dos delitos objeto de
investigação, constatando-se, à luz do normativo constitucional, a competência da
jurisdição federal para o processamento do feito.

619

SÚMULA N. 604

O mandado de segurança não se presta para atribuir efeito suspensivo a recurso


criminal interposto pelo Ministério Público.

Tráfico de drogas. Causa especial de diminuição de pena. Art. 33, § 4º, da


Lei n. 11.343/2006. Reincidência. Reconhecimento equivocado.

É inviável o reconhecimento de reincidência com base em único processo anterior


em desfavor do réu, no qual – após desclassificar o delito de tráfico para porte de
substância entorpecente para consumo próprio – o juízo extinguiu a punibilidade
por considerar que o tempo da prisão provisória seria mais que suficiente para
compensar eventual condenação.

Trata-se de habeas corpus em que o impetrante sustenta a ocorrência de


constrangimento ilegal, ao argumento de que a reincidência foi considerada de
maneira equivocada. Vale salientar que o paciente – condenado por tráfico de
drogas – não obteve a redução da pena inerente à figura privilegiada do tipo penal,
em face do reconhecimento da reincidência, com base em única ação penal anterior
constante em sua vida pregressa. Na oportunidade da referida primeira e única
condenação, o Juiz desclassificou o delito pelo qual respondia, atribuindo-lhe o
crime de porte de substância entorpecente para consumo próprio, e, ato contínuo,
extinguiu a punibilidade por considerar o tempo da prisão provisória mais do que
suficiente para compensar eventual medida a lhe ser imposta. De fato, as
instâncias ordinárias deixaram de reconhecer a incidência da causa especial de
58

diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, porque concluíram


que a extinção da punibilidade, nesses casos, se assemelharia à extinção do
processo executivo pelo cumprimento de pena e, por conseguinte, seria apta a
gerar a reincidência. Todavia, não há como desprezar que o tempo de constrição
considerado para a extinção da punibilidade se deu no âmbito exclusivo da prisão
preventiva, sendo inconcebível compreender, em nítida interpretação prejudicial ao
réu, que o tempo de prisão provisória seja o mesmo que o tempo de prisão no
cumprimento de pena, haja vista tratar-se de institutos absolutamente distintos em
todos os seus aspectos e objetivos. Nessa linha de raciocínio, a decisão de extinção
da punibilidade, na hipótese, aproxima-se muito mais do exaurimento do direito de
exercício da pretensão punitiva como forma de reconhecimento, pelo Estado, da
prática de coerção cautelar desproporcional no curso do único processo em
desfavor do paciente – citado anteriormente – do que com o esgotamento de
processo executivo pelo cumprimento de pena. Acrescente-se, ainda, que, se o
paciente não houvesse ficado preso preventivamente – prisão que, posteriormente,
se mostrou ilegal, dada a desclassificação do primeiro delito a ele imputado –, teria
feito jus à transação penal, benefício que, como é sabido, não é apto a configurar
nem maus antecedentes nem reincidência. Nesse sentido, o único processo anterior
existente em desfavor do réu não pode ser considerado para fins de reincidência,
devendo a Corte de origem reanalisar o preenchimento dos demais requisitos
necessários à aplicação da minorante prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas.

Omissão cartorária. Dúvida em relação ao recebimento da sentença. Art.


389 do CPP. Mero lançamento de movimentação processual na internet.
Requisitos não atendidos. Presunção prejudicial ao réu. Extinção da
punibilidade pela prescrição retroativa. Ocorrência.

Havendo dúvida resultante da omissão cartória em certificar a data de recebimento


da sentença conforme o art. 389 do CPP, não se pode presumir a data de
publicação com o mero lançamento de movimentação dos autos na internet, a fim
de se verificar a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva.

Inicialmente, cumpre ressaltar que, conforme dispõe o art. 389 do Código de


Processo Penal, a publicação da sentença é ato complexo que se compraz com o
recebimento da sentença pelo escrivão, com a lavratura nos autos do respectivo
termo e com o registro em livro especialmente destinado para esse fim.Nesse
sentido, a publicidade da sentença se apresenta como requisito indispensável à
própria existência do ato, retirando-lhe o caráter eminentemente particular e
privado, para que possa ser adjetivado como um autêntico ato processual. Na
hipótese, as formalidades não foram adequadamente cumpridas, porquanto não há
registros quanto à certificação da publicação da sentença. O que existe é, apenas e
tão somente, o lançamento do andamento processual "Mandado Expeça-sentença",
registrado junto ao sistema eletrônico de gerenciamento de processos (eJUD) do
Tribunal. Com efeito, o registro em comento não pode ser caracterizado como ato
processual, por tratar-se, efetivamente, de uma facilidade oferecida aos
jurisdicionados para que possam acompanhar com maior comodidade o andamento
dos feitos judiciais. Nesse diapasão, não desponta qualquer efeito legal do simples
registro de movimentação dos autos físicos na internet, de cunho meramente
informativo e não vinculativo. Via de consequência, sob a óptica do direito penal,
tal evento não possui o condão de interromper o lapso prescricional, na forma do
art. 117, IV, do CP. Portanto, em havendo dúvida resultante da omissão do cartório
59

em certificar a data de recebimento da sentença, deve-se considerar a data de


publicação do primeiro ato que demonstrou, de maneira inconteste, a ciência da
sentença pelas partes e não a data do mero lançamento de movimentação dos
autos na internet, haja vista que esta solução prejudica o réu. Ademais, no caso em
tela, deve-se declarar extinta a punibilidade, uma vez que, em decorrência da falta
de cumprimento dos requisitos elencados no art. 389 do CPP, a prescrição não pode
ser interrompida.

618

Medida cautelar penal diversa da prisão. Diplomata. Imunidade à jurisdição


executiva. Proibição de ausentar-se do Brasil sem autorização judicial.
Ilegalidade.

A cautelar fixada de proibição para que agente diplomático acusado de homicídio se


ausente do país sem autorização judicial não é adequada na hipótese em que o
Estado de origem do réu tenha renunciado à imunidade de jurisdição cognitiva, mas
mantenha a competência para o cumprimento de eventual pena criminal a ele
imposta.

Na origem, trata-se de recurso em habeas corpus impetrado por agente diplomático


por meio do qual se insurge contra a medida cautelar fixada em seu desfavor, que
lhe proibiu de se ausentar do país sem autorização judicial. Sobre o tema, convém
salientar que a imunidade dos integrantes de corpo diplomático dos Estados
estrangeiros é pela via da imunidade de jurisdição cognitiva, isto é, imunidade ao
processo de conhecimento, ou pela imunidade à jurisdição executiva, referente ao
cumprimento da pena. Ambas as imunidades derivam, ordinariamente, do básico
princípio "comitas gentium", consagrado pela prática consuetudinária internacional
e assentado em premissas teóricas e em concepções políticas que, fundadas na
essencial igualdade entre as soberanias estatais, legitima o reconhecimento de "par
in parem non habet imperium vel judicium", conforme entende a doutrina do
Direito Internacional Público. Na hipótese em exame, o Estado estrangeiro
renunciou à imunidade de jurisdição, mas reservou-se a imunidade de execução, ou
seja, o impetrante pode ser processado no Brasil e eventualmente condenado, mas
a execução da pena se dará apenas no país de origem. Nesse contexto, o relevante
fundamento esposado na fixação da cautelar no sentido de se assegurar a aplicação
da lei penal carece de razoabilidade, porquanto ao Brasil não é cabível a execução
de eventual pena. Ademais, embora tenha sido apontado o interesse na proteção à
instrução criminal, o impedimento do acusado à saída do país em nada afeta a
colheita de provas, cabendo ressaltar, ainda, que eventual intento de não
comparecer a atos do processo é reserva de autodefesa a ele plenamente possível
(nova redação do art. 475 do CPP). Falta à cautelar fixada, assim, adequação aos
riscos que se pretendia com ela evitar, de modo que é de se reputar indevida a
proibição do impetrante ausentar-se do país sem autorização judicial.

617

Medida cautelar de afastamento das funções públicas de vereador e


presidente de câmara municipal. ADI n. 5.526/DF. Parlamentares
municipais. Não incidência.
60

É possível que o Juiz de primeiro grau, fundamentadamente, imponha a


parlamentares municipais as medidas cautelares de afastamento de suas funções
legislativas sem necessidade de remessa à Casa respectiva para deliberação.

A insurgência suscitada em questão de ordem limitou a examinar a legalidade de


decisão tomada por Câmara de Vereadores pela revogação das medidas cautelares
de afastamento das funções de vereador e de presidente da Casa em substituição à
prisão preventiva impostas por juiz de primeiro grau. Ressalte-se que a situação
jurídica dos autos permanece hígida, a despeito do julgamento proferido pelo
Supremo Tribunal Federal nos autos da ADI 5.526-DF que fixou o entendimento de
que compete ao Poder Judiciário impor, por autoridade própria, as medidas
cautelares a que se refere o artigo 319 do CPP a parlamentares, devendo, contudo,
ser encaminhada à Casa Legislativa respectiva a que pertencer o parlamentar para
os fins do disposto no art. 53, § 2º, da Constituição Federal quando a medida
cautelar aplicada impossibilite, direta ou indiretamente, o exercício regular do
mandato parlamentar. O referido artigo dispõe acerca de imunidade formal
conferida à deputados federais e senadores, sendo, pois, uma prerrogativa
constitucional conferida aos parlamentares do Congresso Nacional e, justamente
por se tratar de norma de exceção, deve ser interpretada restritivamente. A Corte
Suprema, tendo por fundamento tal parâmetro, já sufragou, em julgados
anteriores, entendimento no sentido de que a incoercibilidade pessoal relativa
prevista no artigo 53, § 2º, da CF/88 é aplicável, conforme disposição expressa,
aos deputados federais e senadores e, por incidência do princípio da simetria, aos
deputados estaduais independentemente de previsão nas respectivas Constituições
estaduais, previsão, todavia, não incidente sobre parlamentares municipais. Nesses
termos, torna-se sem efeito a decisão tomada pela Câmara de Vereadores em
sessão realizada no dia 25/10/2017, na qual os seus pares haviam, alegando
incidência do entendimento externado pelo STF na ADI 5.526-DF, votado pelo
retorno imediato do vereador aos cargos dos quais se encontra por ora afastado.

Dados e conversas registradas no whatsapp. Aparelho de propriedade da


vítima falecida. Validade da prova. Autorização judicial. Desnecessidade.
Constrangimento ilegal. Inexistência.

Não há ilegalidade na perícia de aparelho de telefonia celular pela polícia, sem


prévia autorização judicial, na hipótese em que seu proprietário – a vítima – foi
morto, tendo o referido telefone sido entregue à autoridade policial por sua esposa.

Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus em que se discute, entre outras


questões, a validade da quebra de sigilo de conversações via
aplicativo whatsapp sem prévia autorização judicial. Sobre o tema, vale salientar
que a Sexta Turma desta Corte Superior vem reconhecendo a ilicitude da referida
prova nos casos em que dizem respeito à interceptação de celular do acusado, cujo
conteúdo vem a ser devassado sem autorização judicial. Na hipótese em exame,
todavia, a situação é oposta, visto que houve um homicídio em que o telefone – de
propriedade da vítima – teria sido, inclusive, um veículo para a prática do crime;
sendo entregue à polícia por sua esposa após o cometimento do ilícito. Portanto, se
o detentor de eventual direito ao sigilo estava morto, não havia mais sigilo algum a
proteger do titular daquele direito. Sendo assim, não há sequer necessidade de
uma ordem judicial porque, frise-se, no processo penal, o que se protege são os
interesses do acusado. Logo, soa como impróprio proteger-se a intimidade de quem
61

foi vítima do homicídio, sendo que o objeto da apreensão e da investigação é


esclarecer o homicídio e punir aquele que, teoricamente, foi o responsável pela
morte.

616

Imputação do mesmo fato delituoso em ações penais diversas que


tramitaram em juízos diferentes. Ocorrência de coisa julgada. Prevalência
da condenação mais favorável ao agente.

Diante do trânsito em julgado de duas sentenças condenatórias por fatos idênticos,


deve prevalecer a condenação mais favorável ao réu.

Cinge-se a controvérsia a definir qual decisum com trânsito em julgado deve


prevalecer na hipótese de dupla condenação por fato equivalente, imputado ao
mesmo acusado, em duas ações penais que tramitaram em juízos diversos. No
caso, uma primeira ação penal foi proposta em 10/3/2010, tendo a condenação à
pena de 7 anos, 1 mês e 10 dias de reclusão transitado em julgado em
26/11/2012. Por sua vez, em uma segunda ação penal intentada em 31/3/2010, o
réu restou condenado pelos mesmos fatos delituosos à pena de 7 anos, 3 meses e
3 dias de reclusão, com a condenação transitando em julgado em 10/9/2012. No
caso, não se nega que, em determinado momento, a segunda ação penal proposta
encontrava-se eivada de vício, tendo em vista a ocorrência da litispendência, já que
ajuizada quando em trâmite outra ação penal, em razão dos mesmos fatos. Ocorre
que, quando da confirmação da condenação proferida na primeira ação penal pelo
Tribunal local (em 26/9/2012), já havia o trânsito em julgado da condenação
proferida na segunda ação penal (10/9/2012), donde se infere que, na ocasião
daquela condenação, já se havia operado o instituto da coisa julgada. Em que pese
a referida conclusão justifique a anulação da primeira ação penal, tendo em vista
que esta pena é a menos grave, em comparação com a pena aplicada na ação
penal que transitou em julgado primeiro, deve prevalecer a situação mais favorável
ao paciente. Com efeito, diante do trânsito em julgado de duas sentenças
condenatórias contra o mesmo paciente, por fatos idênticos, deve prevalecer o
critério mais favorável em detrimento do critério temporal (de precedência), ante a
observância dos princípios do favor rei e favor libertatis.
62

Gabarito Questões

1ª Questão:

Canotilho (1941 – 77 anos) e Paulo Castro Rangel (1968 – 50 anos). Canotilho: “a rejeição
constitucional à justiça privada (próprias mãos) exige que os conflitos sejam resolvidos por
órgãos imparciais e qualificados. Tais órgãos detém o monopólio da jurisdição. Corolário do
Princípio da Separação dos Poderes. Canotilho conclui que a doutrina distingue dois tipos de
monopólio: O da primeira e o da última palavra.

Paulo Castro Rangel, por sua vez, fala em critério das duas palavras para se referir a dois níveis
de reserva de jurisdição: Absoluto e relativo

Muitos autores (Alberto Silva Franco, por exemplo) equiparam essa figura à garantia da
inafastabilidade do controle jurisdicional (Art. 5º XXXV CF).

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

Relativa:

Seria, portanto, a presença de um interesse público de viés administrativo que legitime a


intervenção decisória de autoridade não jurisdicional para a solução de questão jurídica.

Absoluta ou Monopólio da Primeira Palavra:

Juiz não só a última palavra, mas também o monopólio da primeira palavra, impedindo
qualquer intervenção de outra autoridade.

2ª Questão:

1 Sim, existe diferença entre a condução coercitiva de testemunha e a de acusado ou


investigado no sistema jurídico brasileiro. 2 A condução coercitiva de testemunha tem amparo
no ordenamento jurídico, em razão dos arts. 330 (desobedecer a ordem legal de funcionário
público) e 342 (negar ou calar a verdade) do CP e dos arts. 202, 206, 218 e 219 do CPP
(possibilidade e obrigação de toda pessoa ser testemunha, salvo as causas de dispensa;
requisição de sua apresentação à autoridade policial pelo juiz ou determinação de sua
condução por oficial de justiça com auxílio de força policial). 3 A condução coercitiva do
acusado ou investigado viola o direito fundamental ao silêncio não incriminador (art. 5.º, LXIII,
da CF), vertente do nemo tenetur se detegere, e viola o princípio da inocência (art. 5.º, LVII, da
CF) como parâmetro de tratamento do acusado ou investigado, sujeito de direitos
constitucionais e titular de garantias fundamentais, não objeto de acusação ou investigação,
até o eventual trânsito em julgado de decisão condenatória.

3ª Questão:
63

1 Momento do procedimento para a realização do interrogatório, como instituto de


autodefesa: o final. 2 A sistemática procedimental do CPPM, art. 302, prevê que o
interrogatório ocorra no início do procedimento. O CPP sofreu radical alteração (arts. 394 a
400) com a edição da Lei n.º 11.719/2008, tendo sido transferido o interrogatório para o final
do procedimento. 3 O STM defende defendia que o interrogatório no procedimento penal
militar ocorra ocorresse no início (enunciado cancelado da Súmula n.º 15), enquanto o STF
entende que deva ocorrer ao final (HC 127.900, STF). O STM passou a adotar o posicionamento
do STF após 2016. 4 O procedimento do CPPM e o procedimento revogado no CPP violam os
princípios do devido processo, do contraditório, da ampla defesa (autodefesa) e da isonomia
(art. 5.º, LIV e LV, da CF).

4ª Questão:

Espera-se que o candidato desenvolva sua resposta com base no que se apresenta a seguir.
João cometeu o crime de calúnia (delito tipificado no art. 138 do Código Penal) contra o
advogado da União ao imputarlhe falsamente fato definido como crime. O fato imputado a
Marcelo consiste no crime de advocacia administrativa, previsto no art. 321 do Código Penal.
Sobre o referido tipo penal, ensina Bitencourt (2012, p. 623) que o bem jurídico protegido pela
tipificação do crime de calúnia, para aqueles que adotam essa divisão, é a honra objetiva, isto
é, a reputação do indivíduo, o conceito que os demais membros da sociedade têm a respeito
do indivíduo, relativamente a seus atributos morais, éticos, culturais, intelectuais, físicos ou
profissionais; é, em outros termos, o sentimento do outro que incide sobre as nossas
qualidades ou nossos atributos. Os requisitos para a configuração do crime são: a) a imputação
de fato determinado qualificado como crime; b) a falsidade da imputação; c) o elemento
subjetivo — animus caluniandi. A ausência de qualquer desses elementos impede que se possa
falar em fato definido como crime de calúnia. O parágrafo único do art. 145 do Código Penal
dispõe que, em se tratando de crimes contra a honra de funcionário público em razão de suas
funções, a ação penal será pública condicionada à representação. Contudo, o STF, na Súmula
n.º 714, passou a entender que, por violar o interesse individual do funcionário público, “é
concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público,
condicionada à representação do ofendido, para ação penal por crime contra a honra de
servidor público em razão do exercício de suas funções”. Embora o STF afirme tratar-se de
legitimação concorrente, a doutrina tem entendido que a hipótese aventada na súmula é de
legitimação alternativa. Essa conclusão é retirada de entendimento da própria Corte Suprema,
que entende que, “se o funcionário público ofendido em sua honra apresenta representação,
estaria preclusa a instauração penal de iniciativa privada, já que, em tal hipótese, o Ministério
Público estaria definitivamente investido na legitimação para a causa”. (STF, Pleno, Inq.
1.939/BA, rel. min. Sepúlveda Pertence, j. 3/3/2004.) Ensina Oliveira (2009, p. 127) que, se o
próprio Supremo entende que, uma vez oferecida a representação pelo ofendido, autorizando
o Ministério Público a agir, não será mais possível o oferecimento da queixa-crime, forçoso é
concluir que a legitimação, nesse caso, da Súmula n.º 714, não é concorrente, mas sim
alternativa. Na verdade, sendo condicionada à representação, o Ministério Público jamais
estaria legitimado a agir de ofício; caberia, portanto, ao ofendido fazer a opção entre a
representação, escolhendo a via da ação penal pública, ou oferecer queixa-crime, optando
pela ação penal de iniciativa privada. Para que fosse efetivamente concorrente, o ofendido
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deveria poder discordar da manifestação do Ministério Público — no sentido de arquivamento


— e ingressar com a ação privada.

5ª Questão:

É possível a entrada domiciliar, no período noturno, sem mandado judicial, nas hipóteses
permitidas pela Constituição Federal: flagrante delito, desastre, para prestar socorro ou com o
consentimento do morador. Art. 5.º, XI, CF/1988 – a casa é asilo inviolável do indivíduo,
ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante
delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. O
STF, por meio do Tribunal Pleno, ao julgar o RE 603616/RO, em Repercussão Geral, asseverou
que a Constituição dispensa o mandado judicial para ingresso forçado em residência em caso
de flagrante delito, asseverando, ainda, que, no crime permanente, a situação de flagrância se
protrai no tempo, como é o caso do tráfico de drogas. 2 É possível a busca e apreensão no
período noturno, sem mandado judicial, quando há situação de flagrante delito, conforme
disposto no art. 5º, inciso XI, da CF. Destarte, em Repercussão Geral, o STF já asseverou, in
casu, quanto à necessidade de controle judicial posterior à execução da medida, ocasião em
que os agentes estatais demonstrarão a existência dos elementos mínimos a caracterizar as
fundadas razões (justa causa) da referida medida. 3 Se a ação for considerada ilícita, o agente
ou autoridade poderá ser responsabilizado disciplinar, civil e penalmente. Ademais, ressalta-
se, ainda, a possibilidade de nulidade de todos os atos praticados pelo agente e eventual
responsabilização cível do Estado pelos danos causados por seus agentes. Inviolabilidade de
domicílio – art. 5.º, XI, da CF. Busca e apreensão domiciliar sem mandado judicial em caso de
crime permanente. (...) Fixada a interpretação de que a entrada forçada em domicílio sem
mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas
razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre
situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente
ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados. (RE 603.616, relator ministro Gilmar
Mendes, j. 5/11/2015, P, DJe de 10/5/2016, com repercussão geral.)

6ª Questão:

A interceptação telefônica é a captação de conversa feita por terceiro, sem o conhecimento


dos interlocutores (interceptação telefônica stricto sensu); a escuta telefônica é a captação de
conversa feita por terceiro com o conhecimento de um dos interlocutores; a gravação
telefônica é a captação da conversa telefônica realizada por um dos comunicadores, sem o
conhecimento do outro, inexistindo a figura do terceiro interceptador. A Lei n.º 9.296/1996,
conforme entendimento compartilhado pelo STF e pelo STJ, abrange tanto a interceptação
telefônica stricto sensu quanto a escuta telefônica, pois ambas constituem procedimentos de
captação da comunicação alheia, por terceiro interceptador, exigindo determinação judicial. Já
a gravação telefônica, em que a captação da conversa é feita pelo próprio interlocutor, não se
submete ao regime da referida lei, não dependendo de autorização judicial para ser realizada.
A quebra do sigilo de dados telefônicos significa o acesso à relação de ligações telefônicas
originadas e recebidas por determinada linha telefônica, cujo fornecimento fica a cargo da
operadora de telefonia celular. Não se confunde com a interceptação da comunicação
telefônica e, portanto, a ela não se aplica o regramento da Lei n.º 9.296/1996. Nesse sentido,
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decisão proferida pelo STF: Não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos,
que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo
5.º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A
proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados. (Supremo Tribunal
Federal, Habeas Corpus n.º 91.867/PA, rel. ministro Gilmar Mendes, Brasília/DF: DJ
24/4/2012.) Quanto ao acesso ao detalhamento das chamadas recebidas e realizadas por
telefone, com a informação de número, data, horário e duração, registrados na memória do
aparelho regularmente apreendido pela autoridade policial, o STF já decidiu pela legalidade da
medida, uma vez que a diligência policial, em casos tais, não caracteriza interceptação de
comunicação telefônica, não sendo necessária, portanto, de autorização judicial. Suposta
ilegalidade decorrente do fato de os policiais, após a prisão em flagrante do corréu, terem
realizado a análise dos últimos registros telefônicos dos dois aparelhos celulares apreendidos.
Não ocorrência. Não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que
recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. A proteção constitucional é da comunicação de
dados e não dos dados. Ao proceder à pesquisa na agenda eletrônica dos aparelhos
devidamente apreendidos, meio material indireto de prova, a autoridade policial, cumprindo o
seu mister, buscou, unicamente, colher elementos de informação hábeis a esclarecer a autoria
e a materialidade do delito. (Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus n.º 91.867/PA, rel.
ministro Gilmar Mendes, Brasília/DF: DJ 24/4/2012.) Vale destacar, no entanto, que o
entendimento corroborado pela atual jurisprudência do STJ se mostrou discordante no sentido
de que, salvo por autorização judicial, decorrente de decisão motivada, as mensagens de
WhatsApp, Facebook Messenger ou qualquer outro aplicativo, bem como os arquivos e os
dados contidos num celular não podem ser averiguados pela polícia e nem utilizados contra
um réu no processo penal ou em qualquer outro processo administrativo ou cível.

7ª Questão:

Mesmo com a alteração do art. 310 do CPP pela Lei n.º 12.403/2011, parte da doutrina
continua a sustentar a prisão em flagrante como medida cautelar, que se perfaz como ato
jurídico com a atuação de dois órgãos estatais distintos (autoridade policial e juiz). Defendem
os doutrinadores que os pressupostos gerais das cautelares (fumus boni iuris e periculum in
mora) estão presentes desde o momento da prisão em flagrante, assim como as características
das medidas cautelares, como a jurisdicionalidade, acessoriedade, preventividade e
provisoriedade. Além disso, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5.º, LXI, prevê que os
cidadãos podem ser presos em flagrante ou por ordem judicial, o que fundamenta a prisão em
flagrante como medida autônoma e cautelar, até a sua conversão em prisão preventiva ou a
concessão de liberdade provisória. O próprio CPP, após as alterações legislativas, ainda intitula
a prisão em flagrante como medida cautelar, no art. 283, § 1.º, in verbis: Art. 283. Ninguém
poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da
autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em
julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou
prisão preventiva. § 1.º As medidas cautelares previstas neste título não se aplicam à infração
a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade.
Alguns autores, no entanto, atribuem pré-cautelaridade à prisão em flagrante em razão de
esta ser realizada por autoridade administrativa, não tendo o condão de servir de título
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autônomo da prisão, sendo necessário que ela seja homologada pela autoridade judiciária e
convertida em prisão preventiva, quando presentes os seus pressupostos legais ou a sua
substituição por medidas cautelares diversas (arts. 310, II, parte final, e 319 do CPP). Assim, se
a prisão em flagrante deve ser homologada pelo juiz e convertida em prisão preventiva, fica
claro que, uma vez realizada a prisão em flagrante, esta deve ser desconstituída ou substituída
por outra medida (a própria preventiva ou medida cautelar diversa), não mais persistindo a
sua natureza cautelar. É mero ato jurídico de natureza administrativa, porquanto antecede
uma medida cautelar principal e porque cessará com a decisão judicial que a converterá em
preventiva, caso se entenda pela sua manutenção, ou pela concessão de liberdade provisória,
caso sua manutenção seja desnecessária. Autores que defendem a cautelaridade: Fernando da
Costa Tourinho Filho, Guilherme de Souza Nucci, Paulo Rangel, Eugenio Pacelli e Douglas
Fisher, entre outros. Autores que defendem a pré-cautelaridade: Aury Lopes Júnior, Luiz Flávio
Gomes, Fernando Capez, Afrânio Jardim.

8ª Questão:

1 O indiciamento é ato privativo de delegado de polícia, que se dá por ato fundamentado, nos
termos da Lei n.º 12.830/2013: Art. 2.º As funções de polícia judiciária e a apuração de
infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e
exclusivas de Estado. (...) § 6.º O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por
ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria,
materialidade e suas circunstâncias. 2 Delegado de polícia não pode, de ofício, indiciar
parlamentar; ele só pode fazê-lo mediante autorização prévia, conforme decisão do STF,
transcrita a seguir. Inq 2411 QO / MT – MATO GROSSO QUESTÃO DE ORDEM NO INQUÉRITO
Rel. ministro Gilmar Mendes Julgamento: 10/10/2007 — Órgão Julgador: Tribunal Pleno
EMENTA: Questão de Ordem em Inquérito. 1. Trata-se de questão de ordem suscitada pela
defesa de senador da República, em sede de inquérito originário promovido pelo Ministério
Público Federal (MPF), para que o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) defina a
legitimidade, ou não, da instauração do inquérito e do indiciamento realizado diretamente
pela Polícia Federal (PF). 2. Apuração do envolvimento do parlamentar quanto à ocorrência
das supostas práticas delituosas sob investigação na denominada “Operação Sanguessuga”. 3.
Antes da intimação para prestar depoimento sobre os fatos objeto deste inquérito, o senador
foi previamente indiciado por ato da autoridade policial encarregada do cumprimento da
diligência. 4. Considerações doutrinárias e jurisprudenciais acerca do tema da instauração de
inquéritos em geral e dos inquéritos originários de competência do STF: i) a jurisprudência do
STF é pacífica no sentido de que, nos inquéritos policiais em geral, não cabe a juiz ou a Tribunal
investigar, de ofício, o titular de prerrogativa de foro; ii) qualquer pessoa que, na condição
exclusiva de cidadão, apresente notitia criminis, diretamente a este Tribunal é parte
manifestamente ilegítima para a formulação de pedido de recebimento de denúncia para a
apuração de crimes de ação penal pública incondicionada. Precedentes: INQ no 149/DF, rel.
ministro Rafael Mayer, Pleno, DJ 27/10/1983; INQ (AgR) n.º 1.793/DF, rel. ministra Ellen
Gracie, Pleno, maioria, DJ 14/6/2002; PET – AgR – ED n.º 1.104/DF, rel. ministro Sydney
Sanches, Pleno, DJ 23/5/2003; PET n.º 1.954/DF, rel. ministro Maurício Corrêa, Pleno, maioria,
DJ 1.º/8/2003; PET (AgR) n.º 2.805/DF, rel. ministro Nelson Jobim, Pleno, maioria, DJ
27/2/2004; PET no 3.248/DF, rel. ministra Ellen Gracie, decisão monocrática, DJ 23/11/2004;
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INQ n.º 2.285/DF, rel. ministro Gilmar Mendes, decisão monocrática, DJ 13/3/2006 e PET (AgR)
n.º 2.998/MG, Segunda Turma, unânime, DJ 6/11/2006; iii) diferenças entre a regra geral, o
inquérito policial disciplinado no Código de Processo Penal e o inquérito originário de
competência do STF regido pelo art. 102, I, b, da CF e pelo RI/STF. A prerrogativa de foro é uma
garantia voltada não exatamente para os interesses dos titulares de cargos relevantes, mas,
sobretudo, para a própria regularidade das instituições. Se a Constituição estabelece que os
agentes políticos respondem, por crime comum, perante o STF (CF, art. 102, I, B), não há razão
constitucional plausível para que as atividades diretamente relacionadas à supervisão judicial
(abertura de procedimento investigatório) sejam retiradas do controle judicial do STF. A
iniciativa do procedimento investigatório deve ser confiada ao MPF contando com a
supervisão do Ministro-Relator do STF. 5. A Polícia Federal não está autorizada a abrir de ofício
inquérito policial para apurar a conduta de parlamentares federais ou do próprio presidente
da República (no caso do STF). No exercício de competência penal originária do STF (CF, art.
102, I, b c/c Lei n.º 8.038/1990, art. 2.º e RI/STF, arts. 230 a 234), a atividade de supervisão
judicial deve ser constitucionalmente desempenhada durante toda a tramitação das
investigações desde a abertura dos procedimentos investigatórios até o eventual
oferecimento, ou não, de denúncia pelo dominus litis. 6. Questão de ordem resolvida no
sentido de anular o ato formal de indiciamento promovido pela autoridade policial em face do
parlamentar investigado. 3 O ato de indiciamento deve ser anulado, pois não houve necessária
autorização prévia do STF para o procedimento.

9ª Questão:

1 Como meio processual de prova, eminentemente formal, conforme Aury Lopes Júnior, “o
reconhecimento é um ato através do qual alguém é levado a analisar alguma pessoa ou coisa
e, recordando o que havia percebido em um determinado contexto, compara as duas
experiências”. O reconhecimento de pessoas tem por finalidade identificar o acusado, o
ofendido ou as testemunhas. Determina o Código de Processo Penal que, havendo
necessidade do reconhecimento de pessoa, aquele que tiver de fazê-lo, normalmente vítima
ou testemunha, deve, primeiramente, descrever as características físicas da pessoa a ser
reconhecida, que será, em seguida, se possível, colocada ao lado de outras pessoas com
características assemelhadas. Logo após, a testemunha - ou a vítima - é convidada a apontá-la.
Havendo razão para recear que a vítima - ou a testemunha -, em razão de intimidação sofrida
ou outra influência qualquer, possa não falar a verdade à frente da pessoa a ser reconhecida, a
autoridade providenciará para que o suspeito não veja quem o está reconhecendo. Essa regra
não será aplicada quando o reconhecimento for realizado durante a fase da instrução criminal
ou em plenário do júri. 2 O reconhecimento de pessoa pode ocorrer na fase do inquérito
policial, por iniciativa da autoridade policial, ou durante a instrução do processo, a
requerimento das partes ou por determinação do juiz. 3 Apesar da clareza da lei e da crítica de
muitos doutrinadores, o STJ tem decidido reiteradamente que as regras estabelecidas no CPP
configuram recomendação legal, e não uma exigência absoluta, não se cuidando, portanto, de
nulidade quando praticado o ato processual de reconhecimento pessoal de forma diversa da
prevista em lei. Portanto, não poderá haver nulidade no auto de reconhecimento de pessoa na
hipótese, nem a anulação do processo penal instaurado com base nesse inquérito policial.
JUSTIFICATIVA CPP, Art. 226.
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10ª Questão:

1 O STF, na ADI n.º 4.424/DF, Rel. Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, firmou a orientação
de que a natureza da ação do crime de lesões corporais praticadas no âmbito doméstico é
sempre pública incondicionada, sem possibilidade de retratação da vítima, não importando a
extensão da lesão (leve, grave ou gravíssima, dolosa ou culposa). De igual forma, o STJ
publicou a Súmula 542, nos seguintes termos: “A ação penal relativa ao crime de lesão
corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada” Em
casos tais, o delegado de polícia, de ofício, deverá instaurar o inquérito policial, sendo
irrelevante a representação da vítima ou a sua posterior retratação, visto que incabível em
qualque r esfera. Com relação aos crimes de ameaça e injúria, estes são de ação penal pública
condicionada ou ação penal privada, conforme os dispositivos próprios do Código Penal. Esse
entendimento foi destacado pelo STF, no julgamento da ADI n.º 4.424/DF, afirmando-se a
permanência da necessidade de “representação” para o processo e julgamento desses crimes.
A Lei Maria da Penha estabelece que todo caso de violência doméstica e intrafamiliar deve ser
apurado por meio de inquérito policial e ser remetido ao Ministério Público. À vista disso,
independentemente da pena prevista para os crimes de ameaça e injúria, que, de regra, são
alcançados pela Lei n.º 9.099/1995, tais delitos, no âmbito da violência doméstica, devem ser
apurados por meio de inquérito policial, tendo como condição de procedibilidade a
representação da ofendida. 2 Uma vez instaurado o inquérito policial, é incabível, no âmbito
policial, a retratação da ofendida, o que somente pode ocorrer perante a autoridade judiciária
competente, nos exatos termos do art. 16 da Lei n.º 11.340/2006, que dispôs que, nas ações
penais públicas condicionadas à representação da ofendida (crimes de ameaça e injúria), só
será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.
No caso da lesão corporal leve, precisamente por ser um crime apurado por ação pública
incondicionada, não cabe o instituto da retratação. De acordo com a Lei Maria da Penha — art.
16: nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei,
só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.
3 Quanto à aplicabilidade da Lei n.º 9.099/1995 e, por consequência, de seus institutos
despenalizadores, a própria Lei Maria da Penha, em seu art. 41, veda a aplicação da Lei n.º
9.099/1995 às hipóteses de violência contra a mulher, o que alcança toda e qualquer prática
delituosa, a exemplo dos delitos e das contravenções que, em razão das penas aplicadas,
seriam abrangidos pelo procedimento especial. Por consequência, ao suposto ofensor não
serão conferidos os institutos da suspensão condicional do processo, da transação penal e da
composição civil dos danos. Na Lei Maria da Penha, art. 41, se encontra a determinação
seguinte: “aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher,
independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei n.º 9.099/1995, de 26 de setembro
de 1995.” Acerca do tema, vide STF - ADI 4424 DF, Rel. Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno,
DJe 1/8/2014. A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência
doméstica contra a mulher é pública incondicionada, e os crimes de ameaça e injúria podem
ser de ação penal pública condicionada ou de ação penal privada, nos termos do Código Penal.

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