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UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA

CAMPINA GRANDE – CAMPUS I


CENTRO DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
COMPONENTE CURRICULAR: História do Brasil I
DOCENTE: Prof. Cleófas Júnior
DISCENTES: Emanuelly Tenório Costa

Avaliação de História do Brasil I (2ª Unidade)

1. A formação do estado patrimonialista português:

A península ibérica formou, plasmou e constituiu a sociedade sob o império da


guerra. Despertou, na história, com as lutas contra o domínio romano, foi o teatro das
investidas dos exércitos de Aníbal, viveu a ocupação germânica, contestada
vitoriosamente pelos mouros. A singular história portuguesa, sulcada interiormente com
a marcha da supremacia do rei, fixou o leito e a moldura das relações políticas, das
relações entre o rei e os súditos. Os dois caracteres conjugados — o rei senhor da guerra
e o rei senhor de terras imensas — imprimiram a feição indelével à história do reino
nascente. A crise de 1383-85, de onde nascerá uma nova dinastia, a dinastia de Avis,
dará a fisionomia definitiva aos elementos ainda dispersos, vagos, em crescimento.
Entre o esquema, traçado pela lógica da história, e a realidade, convulsionada por forças
em tumulto, há um salto e muitas discordâncias. O laço de subordinação entre o rei e a
nobreza territorial e o clero não se fixou sem muitas escaramuças e muitas resistências.
A exacerbação dos privilégios da nobreza territorial e do clero, responderam os
reis com o incremento de uma instituição, pretensamente recebida da velha, e em alguns
momentos influente, ordem romana. O município, arma comum à estratégia política da
realeza na Europa, mereceu especial estímulo, na mesma medida em que se
ensoberbeciam os potentados rurais. O rei, na verdade, era o senhor de tudo — tudo
haveria dele a legitimidade para existir —, como expressão de sua autoridade
incontestável, bebida vorazmente da tradição visigótica e do sistema militar. Discernir e
especificar a fonte dos ingressos da realeza será trabalho de revelação da própria
estrutura econômica do reino. Mostrará a análise a base do poder supremo, sua estrutura
e profundidade, fonte das remunerações aos guerreiros, funcionários em embrião,
homens da corte, letrados em flor. O conteúdo do estado, capaz de ajustar juridicamente
as relações entre o soberano e os súditos, formou-se de muitos fragmentos, colhidos
numa longa tradição. Fixados os dois marcos — a organização política e o conjunto de
regras jurídicas — não se presume uma continuidade sem quebra, no curso de sete
séculos. A sequência se funda no aproveitamento, ao sabor das circunstâncias sociais,
de retalhos e restos vivos, conjugados para estruturar uma ideologia, só está coerente. O
trabalho de reconstrução espiritual deformará muitas realidades, roubadas de sua
significação íntima, transfiguradas em corpos diferentes, de cor diversa, com outra
fisionomia. O domínio do clero e da nobreza, empreendido pelo rei, encontrou, nesse
instrumento, os meios espirituais de justificação. A obra dos juristas e imperadores
romanos serviu, vê-se logo, a fins opostos aos previstos pelo clero, num movimento que
dá conteúdo novo às formações ideológicas. As duas fases dessa luta obedecem aos
padrões, acabados e perfeitos, do jurismo justinianeu.
A sociedade urbana e popular tinha um rei — feito da revolução burguesa, da
espada improvisada e dos argumentos dos juristas. Burgueses e legistas velavam para
que a monarquia, duramente construída, não se extraviasse numa confederação de
magnatas territoriais, enriquecidos com as doações de terras, outorgadas para
recompensar serviços e lealdades. Nuno Alvares, dono da metade do país, sofreu dura
restrição ao gozo de suas propriedades, restrição que o cronista atribui, sem
compreendê-la, só à inveja. Inspirava o jurista, ao recomendar a tomada dos territórios
distribuídos no calor da guerra, o propósito de que ninguém, salvo o rei, tivesse
vassalos, alvitre que o soberano aceitou indiretamente, ao adquirir parte das terras
doadas. A realidade do estado patrimonial, afastada a situação feudal, que ensejaria uma
confederação política, amadureceu num quadro administrativo, de caráter precocemente
ministerial. A direção dos negócios da Coroa exigia o trato da empresa econômica,
definida em direção ao mar, requeria um grupo de conselheiros c executores, ao lado do
rei, sob a incontestável supremacia do soberano. Há não apenas tributos a colher, onde
quer que haja movimento de bens, senão receitas a arrecadar, como participação do
príncipe em todos os negócios, senhor ele próprio de todas as transações, lucros e
vantagens.
Esta corporação de poder se estrutura numa comunidade: o estamento. Para a
compreensão do fenômeno, observe-se, desde logo, que a ordem social, ao se afirmar
nas classes, estamentos e castas, compreende uma distribuição de poder, em sentido
amplo — a imposição de uma vontade sobre a conduta alheia, a classe e seus membros,
por mais poderosa que seja, pode não dispor de poder político — pode até ocorrer o
contrário, uma classe rica é repelida pela sociedade, marcada de prestígio negativo,
como os usurários e banqueiros judeus dos séculos XV e XVI de Portugal. Além disso,
significa esta realidade — o Estado patrimonial de estamento — que a forma de
domínio, ao contrário da dinâmica da sociedade de classes, se projeta de cima para
baixo. Todas as camadas, os artesãos e os jornaleiros, os lavradores e os senhores de
terras, os comerciantes e os armadores, orientam suas atividades dentro das raias
permitidas, respeitam os campos subtraídos ao controle superior, submetem-se a regras
convencionalmente fixadas.

2. As crianças e o adestramento pela educação:

Descobriram os primeiros missionários que andavam nus e à-toa pelos matos


meninos quase brancos, descendentes de normandos e portugueses. E procuram recolher
aos seus colégios esses joões-felpudos. Foi uma heterogênea população infantil a que se
reuniu nos colégios dos padres nos séculos XVI e XVII: filhos de caboclos arrancados
aos pais; filhos de normandos encontrados nos matos; filhos de portugueses;
mamelucos; meninos órfãos vindos de Lisboa. Meninos louros sardentos, pardos
morenos, cor de canela. Só negros e moleques parecem ter sido barrados nas primeiras
escolas jesuíticas. Negros e moleques retintos. Assim, tem-se dado pouca atenção para o
fato de que os filhos dos escravos pertencentes aos missionários-fazendeiros também
foram educados nas escolas concebidas pelo Ratio studiorum. Evidentemente, a
educação de crianças negras no Brasil Colonial foi um fenômeno residual. Constituiu-se
uma exceção da regra geral que caracteriza os grandes traços explicativos da história da
educação do período em tela, ou seja, a exclusão da ampla maioria do povo brasileiro.
Entretanto, mesmo tendo se constituído uma exceção, merece registro.
Os colégios das primeiras letras ocupavam um espaço físico central nas fazendas
da Companhia de Jesus. Essas escolas do bê-á-bá eram importantes no ritual de
realização da catequese, ou seja, da conversão dos "gentios" ao cristianismo. Assim, em
função da catequese, os filhos das famílias escravas também foram submetidos à
escolarização. Investigar o fenômeno da educação infantil no período colonial, portanto,
significa desvelar aspectos importantes da própria formação socioeconômica brasileira.
Esta afirmação ganha a sua verdadeira dimensão quando nos deparamos com o papel
econômico, cultural e político que a Companhia de Jesus desempenhou no processo de
consolidação do sistema colonial português, pois, em 500 anos de nossa história, os
jesuítas detiveram o monopólio. Os jesuítas empregaram largamente as relações
escravistas de produção nas suas propriedades, utilizando os negros desafricanizados. A
tentativa de escravização dos índios pelo sistema colonial português no Brasil esbarrou,
entre outros, em dois fatores importantes: de um lado, porque "resultou inviável na
escala requerida pelas empresas agrícolas de grande envergadura que eram os engenhos
de açúcar", a Companhia de Jesus já era proprietária de muitas fazendas de
cana-de-açúcar e criação de gado. Ela havia acumulado, segundo Serafim Leite (1950,
p. 88- 93), um total de 359 fazendas até 1759, quando da expulsão dos jesuítas do
Brasil.
Desde o início ficou muito claro para o fundador da missão jesuítica no Brasil,
padre Manuel de Nóbrega, que seria impossível à empresa evangelizadora idealizada
por Santo Inácio de Loyola lograr êxito sem a existência de uma base econômica que
desse sustentação às escolas do bê-á-bá, aquelas que serviam de suporte à catequese dos
"gentios". Assim, o esforço para a fundação de fazendas de açúcar e gado, como
resultado da iniciativa do primeiro Provincial do Brasil (1553- 1560), estava
organicamente vinculado ao projeto educacional desenvolvido pela Companhia de Jesus
no Brasil Colonial. Portanto, com o passar do tempo, basicamente todos os colégios
jesuíticos do ensino elementar tinham uma fazenda.

3. A religiosidade indígena como resistência:

Aspecto dos mais notáveis da colonização ibérica, a "extirpação das


idolatrias" figurou, para desgraça dos índios, entre as maiores prioridades do poder
colonialista no século XVI. Jean Delumeau viu na obsessão dos extirpadores -
verdadeiros demonólogos do Novo Mundo - a versão americana da “caça às bruxas"
que tomou conta da Europa na mesma época, prolongando-se, como nas colônias,
até pelo menos o século XVII. Utilizando-se quer de métodos violentos, a exemplo
da ação inquisitorial dos bispos, quer de métodos persuasivos, como foi a catequese
jesuítica ou Úllnciscana, a Igreja Colonial mobilizou o máximo de recursos a seu
dispor para erradicar os "cultos diabólicos" que julgava existir no mundo indígena.
Na América Hispânica, entre o rigor da ação inquisitorial e a disciplina pedagógica
das missões, instaurou-se a prática de enviar "visitadores" encarregados de inquirir
os índios sobre os seus costumes. . Os visitadores agiam como evangelizadores e
inquisidores a um só tempo, pois acrescentavam a tarefas propriamente pastorais a
função de indicar os "feiticeiros" mais afamados.
Perseguida implacavelmente pelos vice-reis e arcebispos, identificada com
pactos diabólicos ou, quando menos, com superstições pagãs, as idolatrias pareciam
espalhadas por toda a América, a corroer, para desespero dos colonizadores, a ordem
social e espiritual imposta pela conquista. Assim, se foram os europeus que
rotularam de "idolatrias" as atitudes indígenas de apego às suas tradições -
reiterando com isso o estigma judaico. Antes de tudo utilizou a expressão para
caracterizar, de forma abrangente, o universo cultural nativo, isto é, o domínio de
suas relações com o real. "A idolatria pré-hispânica - afirmou - antes de ser uma
expressão 'religiosa', traduzia uma aproximação especificamente indígena do
mundo"; tecia uma rede densa e coerente, consciente ou não, implícita ou explícita
de práticas e saberes nos quais se inscrevia e se desenvolvia a totalidade do
cotidiano.

4. O enquadramento do corpo feminino e o Santo Ofício:

O perfil das mulheres que habitavam o Brasil colonial manteve-se prisioneiro,


por várias décadas, de um sem-número de imagens, parte delas verossímil, outra parte
estereotipada. Dentre os vários autores que delas falaram, talvez o melhor tenha sido
Gilberto Freyre, mestre incomparável na arte das generalizações nem sempre exatas.
Várias mulheres povoam, com efeito, as belas páginas de Casa-grande e senzala, da
mulher submissa e aterrorizada com o castigo masculino até a mulher fogosa, sempre
pronta a dar prazer aos machos, a requebrar-se dengosa pelas ruas desalinhadas das vilas
coloniais, a seduzir com doçura nos caminhos, à beira do rio, à sombra de uma árvore,
no meio do mato. Faça-se, no entanto, alguma justiça a Gilberto Freyre: ele viu como
ninguém diferenças entre as mulheres, atento à diversidade de culturas ou, como querem
alguns, de cor e de raça.
As mulheres brancas, em pequeno número no acanhado litoral do século XVI,
teriam vivido em completa sujeição, primeiro aos pais, os todo-poderosos senhores de
engenho, depois aos maridos. Teriam vivido, como escreveu Gilberto Freyre, num
“isolamento árabe”, idealizando uma estrutura de serralho à moda tropical, quer no
tocante à submissão, quer às eventuais “solturas” de sinhás e sinhazinhas, todas
invariavelmente punidas, em caso de falta grave, com o rigor da lei patriarcal. As
mulheres índias, essas sim, foram amantes dos portugueses desde o início e Freyre
sugere que o foram até por razões priápicas. Mal desembarcavam no Brasil e os
lusitanos já “tropeçavam em carne”, ele escreveu. As índias eram as “negras da terra”,
nuas e lânguidas, futuras mães de Ramalhos e Caramurus, todas a desafiar, com seus
parceiros lascivos, a paciência e o rigorismo dos jesuítas. A mesma fama tinha as negras
da Guiné, as crioulas, especialmente as da casa-grande, amantes de sinhôs e
sinhozinhos. Essas eram também as vítimas prediletas de sinhás tirânicas que não
hesitavam em supliciá-las por ciúme ou simples inveja “de seus belos dentes e rijos
peitos”. E a predominar sobre todas em matéria de paixão e ardor, lá estava a mulata,
exemplo recorrente de beleza e sedução no imaginário masculino relacionado à terra
brasílica. Muitos homens cantaram em prosa e verso as virtudes da mulata e a ela se
vergaram, a começar pelo célebre Gregório de Matos, o Boca do Inferno da Bahia
seiscentista.
As dúvidas e os dilemas inquisitoriais no julgamento do crime de sodomia eram,
antes de tudo, de ordem conceitual, questões de princípio que marcavam decisivamente
a ação do Tribunal nos processos. Descobrir e interrogar os acusados de sodomia
significava, de um lado, proceder contra suspeitos de praticar um ato sexual específico –
a penetração anal com ejaculação consumada, fosse entre homens (“sodomia perfeita”),
fosse entre homens e mulheres (“sodomia imperfeita”) – e, de outro lado, implicava,
conforme diziam os escolásticos, a descoberta de pecados entre indivíduos do mesmo
sexo. Isso fazia a noção de sodomia tangenciar o domínio do homoerotismo. O
Regimento de 1640, que tratou exaustivamente do assunto, sugere com absoluta nitidez
que o Santo Ofício visava sobretudo os homens que praticavam sodomia. E,
acrescente-se, tinha como alvo não qualquer praticante eventual desses atos e relações,
senão os contumazes e escandalosos, isto é, aqueles que em sua conduta pública
ostentavam a preferência sexual proibida, desafiando os valores da comunidade e as
ameaças do Santo Ofício. É o que se pode depreender da tolerância regimental diante
dos sodomitas menores de 25 anos, diante dos que confessavam espontaneamente, dos
que só haviam praticado o pecado eventualmente, dos que tinham sido por alguma razão
forçados a cometê-lo. Vários tipos de casos são previstos no Regimento de 1640 com o
objetivo de orientar a investigação da vida sexual dos acusados de práticas sodomíticas.
Alguns fatores levados em consideração eram: a publicidade das atitudes, os possíveis
dramas de consciência, a disposição de colaborar com os inquisidores, a convicção no
erro. O Santo Ofício queria chegar, em suma, aos sodomitas assumidos, mesmo que não
ostentassem o vício no cotidiano, ou então aos que, na gíria da época, eram chamados
de fanchonos – homens que, por seus hábitos femininos (cor nos beiços, meneios, trajes
de mulher), desacatavam os mores sociais e, supostamente, as coisas da fé.

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