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Sentidos de Vitória/Derrota
para os Pais Segundo Atletas
do Alto Rendimento
http://dx.doi.org/10.1590/1982-3703000132014
Artigo
Abstract: This study examined the social representations of victory and defeat held by parents of teenage
athletes who participated in a high performance sports in the city of Recife. The developmental stage of
adolescence is understood based on sociohistorical psychology, while the social representations theory
constituted the frame of reference for approaching individuals from different social-cultural contexts,
places, experiences, beliefs, knowledge, and shared feelings. A multi-methodological orientation
was employed with a wide range of resources for the collection and progressive analysis of data. In
this study, participants involved 101 teenager athletes, who participated in a high performance sport,
either swimming or volleyball. The tools utilized included a free association questionnaire and semi-
structured interviews. EVOC 2000 and Bardin’s thematic content analysis were used for data analysis.
Representations of victory were identified from the parents for the following dimensions: personal and
motivational and affective–emotional. In addition to those two dimensions, the technical dimension
was also identified for the parental representation of defeat. The victory meaning for parents was not
restricted just to the sport area, it was extended to other contexts such as education level, professional
and personal growth. The value of defeat for parents was represented as an opportunity for learning
and overcoming situations to the teenage athlete. However, they also showed the need for affective
support from their families to deal with self-blame in the event of failure.
Keywords: Social representations. High performance sport. Victory. Defeat.
Resumen: Este estudio comprendió las representaciones sociales de la victoria/derrota para los padres
según adolescentes atletas de deporte de alto rendimiento en la ciudad de Recife. La Adolescencia
comprendida a partir de la Psicología Socio Histórica y la base teórico- metodológica de la Teoría
de las Representaciones Sociales abordó los sujetos en diferentes contextos socioculturales, lugares
de origen, experiencias, creencias, saberes y sentimientos compartidos. Se adoptó una perspectiva
plurimetodológica con variados recursos de recolección de análisis progresivo de datos. Participaron
101 atletas adolescentes de deporte de alto rendimiento en las modalidades de natación y volibol.
Los instrumentos utilizados fueron cuestionarios de asociación libre y entrevistas semi-dirigidas. En
el análisis de los datos, se usó el software EVOC y las técnicas de análisis temático del contenido de
Bardin. Identificamos las representaciones de victoria para los padres en las dimensiones: personal-
motivacional y afectivo-emocional y, en las representaciones sociales de la derrota para los padres,
además de éstas, se consideró la dimensión técnica. El sentido de victoria para los padres apareció
ampliado: el contexto deportivo, la escolarización y el crecimiento personal y profesional en la vida.
La derrota para los padres es representada como oportunidad de aprendizaje y superación para el
atleta adolescente, sin embargo, ellos demostraron que necesitan apoyo afectivo de su familia para
lidiar con la auto culpabilidad en las situaciones de fracaso.
Palabras clave: Representaciones sociales. Deporte de alto rendimiento. Victoria. Derrota.
Por muito tempo, os adolescentes foram Segundo Santos (2005), tal teoria do senso
tipificados pela Psicologia Clássica, padro- comum é um modelo teórico de compreen-
nizados como portadores de uma síndrome de são e explicação de conhecimentos leigos,
“anormalidades” temporárias, na passagem isto é, o fenômeno das RS. Entretanto, nem
para a vida adulta; em seguida, foram mar- todos os conhecimentos do senso comum são
cados por traços de rebeldia e transgressão denominados RS, pois precisam se apresentar
que, também transitórios, justificariam os como um objeto de relevância cultural para
processos na direção da autonomia. Mais o grupo, polissêmico e polimorfo, o que
recentemente, a perspectiva sócio-histórica lhe confere distintos sentidos. Assim, as RS
demarca a adolescência, a partir dos contex- constituem-se em um “[...] meio pelo qual
tos locais, e conforme os estudos de Bock, os seres humanos representam objetos de
Furtado e Teixeira (2001), bem como o de seu mundo” (Lalhou, 2011, p. 66).
Aléssio e Santos (2005), os adolescentes têm
autonomia suficiente para desenvolver-se, Os fenômenos na sociedade são, assim,
inclusive, por meio do trabalho. Portanto, processados nos grupos em particular, e nas
adotamos a perspectiva de que os significados influências desses, na medida em que “[...]
atribuídos à adolescência variam nas práticas o homem se expressa na comunicação e na
socioculturais em que se inserem. conduta, e as respostas que encontra a essa
desde aquelas casuais, do cotidiano e treinos, exigências para crianças e jovens. Korsakas
àquelas que são reservadas às competições. e De Rose Junior (2002) relatam ser cada vez
Neste sentido, criam-se padrões hegemô- mais frequente a reprodução do modelo de
nicos relativos: “As roupas, os hábitos, as treinamento esportivo, destinado ao esporte
gírias, as grifes são agora ‘universais’. Os profissional, nos programas que envolvem
grupos de jovens nas comunidades locais crianças e adolescentes, o que é bastante
recebem quase de imediato a informação preocupante ao seu desenvolvimento, tendo
sobre as referências americanas e européias. em vista as consequências de níveis físicos,
As culturas locais são desvalorizadas” (Bock psicológicos, motrizes e esportivos que a
& Liebesny, 2003, p. 212). especialização esportiva precoce possibilita.
Para os atletas-adolescentes, há uma gama Para Corsaro (2011), a família tem importante
de possibilidades, e ao mesmo tempo de papel no processo de desenvolvimento, por
impedimentos, e a prática de um esporte exercer influências na vida da criança e do
competitivo é percebida como uma unidade adolescente. Assim, a estrutura e o cotidiano
integradora de experiências, emoções e ati- familiar podem contaminar, contagiar e afetar
vidades. Desta forma, o esporte de alto ren- negativamente a vida desses sujeitos. Os pais
dimento circunscreve o desenvolvimento de apresentam a função social de segurança,
seus praticantes, pois traz ora ampliação das apoio e cuidado para o atleta-adolescente,
atitudes e comportamentos, e ora restrição. como um suporte estruturante, contudo, na
atualidade, esta prática torna-se coerente com
Fazendo um paralelo às modalidades de os valores da sociedade competitiva, na busca
vivência da infância e da adolescência no dos lugares de sucesso para os seus filhos.
Brasil, Sampaio (2000) considera que a ado-
lescência atrelada ao cotidiano do esporte Este é um desafio adicional para os pais,
de alto rendimento se define como “infância pois, nas práticas esportivas, os riscos físicos
e adolescência públicas”, ou seja, uma vida envolvem lesões ósseas, articulares, muscu-
pública precoce por tais sujeitos assumirem lares e cardíacas; nos aspectos psicológicos,
relações de trabalho, responsabilidades. altos níveis de ansiedade, estresse, frustração,
Assim, é “[...] uma adolescência glamourosa, sofrimento psíquico devido às derrotas e desi-
cercada de aplausos, fama e dinheiro, mas lusões; e, ainda, formação escolar deficiente.
também, de muita competição, disputa,
trabalho, compromissos, desgaste físico e A prática intensa de uma modalidade
emocional” (Sampaio, 2000, p. 162). No con- específica ainda pode causar limitação de
texto de vida esportiva, o atleta-adolescente determinados movimentos e exercícios, bem
é essencialmente disciplinado, meticuloso, como o burnout, que levaria ao abandono
e o esporte é um marcador fundamental na do esporte como uma reação ao estresse e
dinâmica e construção da adolescência, que às situações vivenciadas cujas recompensas
traz repercussões nas práticas sociais e no são inferiores aos gastos físicos e psicológicos
âmbito da família. dos participantes (Samulski, 2002). Entre-
tanto, quando realizada de modo adequado,
Adolescência, famílias e práticas esportivas a prática esportiva apresenta contribuição
efetiva na formação de seus atletas, afinal,
A preocupação com resultados se aplica a relações interpessoais são possíveis mediante
busca incessante pelo sucesso, seja este na a sua realização.
escola, como o melhor aluno da turma; no
vestibular, com a concorrida vaga; ou no Segundo Epiphanio (2002), podem ocorrer
trabalho, com o salário mais alto (Korsakas, ganhos cognitivos quando o adolescente
2002). Desse modo, a prática dos esportes assimila informações evocadas por meio
sofre severas influências do modelo social de uma orientação, desenvolvendo, assim,
produtivista, bem como a infância e ado- a sua capacidade de abstração e ampliando
lescência também, agora com múltiplas o seu vocabulário. No aspecto psicológico,
que denotam sentidos de infelicidade e na sua família. Este achado confirma Ama-
insatisfação com a derrota dos filhos e, por zonas (2010), quando discute que a profis-
conseguinte, descontentamento que gera sionalização permite a inserção dos sujeitos
reclamações, críticas e conflitos. no mundo do trabalho, embora todas as suas
conquistas revelem o sentido do adolescente
Segundo Bock et al. (2001), a família é em construir a sua família.
idealizada como um lugar de proteção e
cuidado. Nesse sentido, as práticas dos Na dimensão pessoal e motivacional, o sentido
pais, relacionadas ao esporte de alto ren- da vitória é de dever cumprido, pois vencer,
dimento, são compreendidas pelos filhos se relaciona ao sucesso, ícone do esporte de
(atletas-adolescentes) como cuidado natural alto rendimento reforçado pelos treinadores,
da função parental cotidiana, e não como uma mídia e público em geral. Segundo Rúbio
valorização da prática esportiva. Todavia, os (2001), desde a Grécia Antiga era dado
atletas-adolescentes começaram a expressar a valor diferenciado àqueles que ali venciam
crença de que o sucesso nos esportes não é um e, nos dias de hoje, também não é diferente,
valor para os pais, pois a preocupação deles pois com a competitividade exacerbada, os
seria relacionada ao futuro, isto é, aos estudos campeões são muito exaltados, assumem um
e a vida profissional dos filhos. Vale salientar lugar de superioridade, e a vitória parece
que, no cotidiano, esses pais demonstraram
ser, de fato, o que há de mais importante.
práticas de cuidado afetivo, percebidas no
Na derrota, os atletas-adolescentes atribuem
campo de pesquisa, por meio do acompa-
que seus pais a designam como: preguiça,
nhamento em treinamentos e competições,
falta de vontade, irresponsabilidade, inse-
bem como mediante a preocupação com
gurança, falta de estímulo, corpo mole e
a bebida e alimentação antes e depois dos
distração, sinônimas de reprovação, não
treinos, embora estas sejam secundarizadas
estudar, ser um péssimo aluno e falhar na
em seu valor, por serem transitórias, quando
vida acadêmica. Nesse sentido, a derrota
comparadas com os estudos, interpretados
como base para toda a vida dos filhos. é também ampliada para outras situações,
além do esporte, relacionadas à vida escolar
e características pessoais.
Vale salientar, que o caráter do filho apareceu
como vitória para os pais, pois está relacio-
nado à educação que recebeu e seus princí- Nesta dimensão, os atletas-adolescentes
pios morais. Segundo os atletas-adolescentes, descreveram a vitória com entusiasmo, e
os pais esperam que se eles tornem boas acreditam que ela é compartilhada por seus
pessoas, que estejam fora das drogas, dispos- pais, objetivada na concretude do afeto com
tos a ajudar os outros. Ou seja, os esportes carinho e abraços. Os pais reconhecem a
contribuiriam na formação dos filhos, como conquista, o esforço, o comprometimento,
proteção aos perigos externos e aprendizagem a dedicação e determinação durante o
de valores solidários, vistos, então, como treinamento. Na derrota, os pais também
vitória, em uma sociedade tão competitiva, expressam afeto, prestam apoio e consolo
como explicitado na entrevista: “Acho que aos filhos, no sentido de ajudá-los e aco-
eles se sentem vitoriosos no caráter porque lhê-los, incentivando-os a não perder a fé,
veem que tem uma boa criação, veem que erguer a cabeça, dar a volta por cima e agir
o filho tem bom pensamento, e procura ser com positividade, pois acreditam que eles
uma pessoa de caráter bom” (Vôlei Feminino). certamente terão novas chances para vencer.
Outros atributos também foram relacionados:
Dentre os projetos de vida que os filhos confiança, coragem, concentração, garra,
acreditam que os seus pais constroem para metas. Emergiu, ainda, uma imagem de
eles, como vitórias na vida, destacam-se a atleta ideal, com características individuais,
construção da família e a conquista de inde- habilidades e comportamentos. Tais requisitos
pendência, o que também pode expressar o parecem disseminados no senso comum, e
próprio desejo destes adolescentes projetado contribuem na construção da ideia de qual
É verdade que as instituições têm grande rele- Nas entrevistas, as palavras associadas à expres-
vância na concretização desse aprendizado, são indutora vitória para os pais fortaleceram
entretanto, podemos afirmar que, nesse con- em intensidade os sentimentos positivados.
texto, os filhos apareceram recebendo o apoio A palavra felicidade, foi quantitativamente
constante dos pais. O núcleo central apareceu mais representativa e expressa a conquista e
protegido de mudanças nas RS, no sentido a vibração junto com os filhos, como recom-
de esforço, superação, motivação, dedicação, pensa pelo esforço, conforme se interpretou
determinação e força de vontade, que sinalizam na fala de uma atleta-adolescente: “Eles ficam
o comprometimento dos atletas-adolescentes felizes em saber que os filhos conseguiram
na garantia da vitória para os seus pais. aquilo que queriam, se esforçaram... e eles
ficam felizes com isso” (Natação Feminino).
Segundo os atletas-adolescentes, sucesso para Nessa passagem da entrevista, a felicidade
a vida do filho não está restrito apenas ao dos pais parece diretamente relacionada à
esporte, pois, como vimos no QAL, os estudos felicidade do filho. Contudo, os próprios
se relacionam ao crescimento na vida pessoal atletas-adolescentes veem o valor diferenciado
e profissional: “Sucesso é bom também, os dado à conquista que resulta em medalhas,
seus pais ficam super orgulhosos porque o seu símbolos das vitórias: “Pros pais é sempre
filho vai ter o que? Sucesso. Tá ali, tá vendo... uma felicidade ver o filho vitorioso, chegar
poxa, tá vendo que tá crescendo, crescendo com uma medalha em casa. Poxa, é bom...
na vida” (Vôlei Feminino). Assim, vida escolar é a maior felicidade” (Natação Masculino).
filho poderia ter sido melhor caso este tivesse Nas entrevistas, os atletas-adolescentes
demonstrado mais empenho, conforme uma dizem que a derrota é partilhada entre pais e
atleta-adolescente afirmou em sua entrevista: filhos, como uma experiência de sentimentos
“A preguiça de treinar né? É o que os pais mais negativados, como tristeza, raiva e decepção.
reclamam... depois, a desculpa é que você Entretanto, o papel social dos pais fica muito
perdeu porque você tava com preguiça, aí claro, na medida em que deles são esperadas
é um problema” (Vôlei Feminino). Assim, os condutas de apoio e suporte, como referen-
pais teriam uma idealização de atleta como dado por Bock et al. (2001), em momentos
projeção do filho ideal, cuja dedicação nos difíceis. Um atleta-adolescente diz:
treinamentos o faria vitorioso. O sentido de
sucesso, por um lado, está relacionado a Meu filho sempre treinou, sempre
vida esportiva e, por outro, traz um sentido nadou, sempre se dedicou... quando
mais amplo, que se relaciona à situação de chega agora, meu filho não consegue
atingir o que queria. Uau, isso é real-
esforço e empenho nas competições, bem
mente ruim, entende? E é também...
como a realização do filho idealizado. eles se entristecem com isso, entende?
Mas, no final das contas, o certo seria
Na estrutura das RS apareceram, apoio e dar apoio e dizer: meu filho, não se
estímulo, como elementos do núcleo central, preocupe, na próxima você consegue
o que confere ambivalência às condutas dos (Natação Masculino).
pais, segundo os filhos, pois, ao mesmo tempo
em que estes se sentem decepcionados, infe- Deste modo, os pais continuam a dar apoio,
lizes e insatisfeitos mediante a derrota dos incentivando-os a investir mais nos treina-
atletas-adolescentes, eles os apoiam nesses mentos para conquistar o resultado esperado,
momentos e lhes dão estímulos para que em outra oportunidade. O fato de o filho ter
consigam superar tal situação. Na realidade, treinado tanto e os pais, de certo modo, o
a ambivalência diz respeito ao cuidado dos terem acompanhado nesse processo, faz com
pais em um sentido mais ampliado, pois, ao que julguem o atleta-adolescente merecedor
repassar os valores culturais e hegemônicos de uma vitória, como se refere um dos entre-
de nossa sociedade, prezam que os filhos vistados: “É que os pais ficam tristes também
os sigam (Bock, Furtado & Teixeira, 2001), né, em saber... seu filho treinou tanto né, e
e, no esporte de alto rendimento, este valor não conseguiu” (Natação Masculino).
é a vitória.
A raiva também apareceu como sinônimo de
Na representação da derrota, a palavra tris- derrota para os pais, entretanto, percebemos
teza aparece juntamente à raiva e consolo, ambivalência nos sentidos compartilhados
palavras com frequência muito significativa, pelos atletas-adolescentes, na medida em
mostrando que a derrota, é uma experiên- que abordam esse sentimento por um viés
cia também difícil e sofrida para os pais. O de inconformismo, devido à dedicação que o
núcleo central sugere coerência sentido de filho teve para conquistar uma vitória, como no
apoio afetivo-emocional, com as palavras: trecho de entrevista: “Raiva porque o filho se
conselho e carinho. dedicou, se dedicou, e não conseguiu aquilo,
aí acho que sente meio raiva porque não
A dimensão técnica revelou nas RS da derrota conseguiu... mas... depois passa, depois eles
um sentido positivado, de superação, a partir superam” (Natação Feminino). Além disso, a
do qual os atletas-adolescentes revelam a raiva se faz presente no discurso dos entrevis-
necessidade de mais determinação, com- tados quando eles abordaram a insatisfação
promisso, vontade de crescer, treinar mais dos pais com os seus resultados, que deveriam
e coragem para melhorar. Ou seja, precisam ter sido distintos, como analisamos nas falas:
demonstrar comportamentos resilientes nas “É... seu pai lhe dá um esporro né, porque
situações de derrota, superação, extraindo você perdeu, que era pra você se esforçar
ganhos positivos dessas experiências (Cas- mais... é isso” (Natação Masculino). Deste
telar-Perim, 2011). modo, eles explicitaram a imagem de atleta
idealizado para continuar pertencendo a este o que circula no senso comum, por intermé-
grupo, por isso não se permitem experimentar dio dos processos comunicativos. O senso
raiva, e a deslocam para os pais. comum não apareceu fragmentado e sugere,
ainda, que não é possível pensar apenas na
Tamanha preocupação em dar “respostas” construção de um objeto social em particu-
aos pais, certamente, pressiona e tensiona o lar, e sim, que os objetos sociais envolvidos
atleta-adolescente, “[...] alguns pais botam em uma mesma temática formam redes de
muita pressão, não é o meu caso, mas eu significados, e nestes, encontram sentidos
conheço atletas assim... amigos meus que o pai para atribuir às suas condutas.
põe muita pressa em cima dele, pra ele vencer”
(Vôlei Masculino), afinal, ele precisa mostrar, No caso do presente estudo, o foco voltou-
por meio de seus resultados, que “é bom” e, se ao atleta-adolescente do esporte de alto
assim, satisfazê-los. Em casos de derrota, o rendimento, exemplos de comprometimento,
atleta-adolescente percebe desapontamento disciplina e responsabilidade na prática
e se responsabiliza, experimentando culpa. esportiva. O referencial teórico da TRS nos
possibilitou analisar que o pensamento
Destacamos, portanto, que, embora os pais, social compartilhado neste grupo específico
por vezes, exerçam a dupla função parental de é pensamento classificatório, competitivo,
cuidado e cobrança, os atletas-adolescentes disseminado no senso comum, no entanto,
se veem cobrados e/ou apoiados. Pareceu- o sucesso não significa ser o melhor, vencer,
nos, que a ancoragem do atleta-adolescente, e sim, ultrapassar os próprios obstáculos no
“devedor aos pais”, revela um movimento de sentido de autossuperação.
autoria, na reorganização da identidade, que
necessita do outro, os pais, para lhe apoiar. A abordagem plurimetodológica nos permitiu
Embora Oliveira (2010), tenha encontrado a utilização de recursos distintos para a coleta
negatividade da família em relação aos cuida- e análise dos dados (Almeida, 2005; Cruz,
dos com seus filhos, os atletas-adolescentes, 2006), o acesso aos elementos centrais e peri-
desse estudo, nos apresentaram uma posição féricos das RS, e a compreensão dos sentidos
contrária: pais cuidadosos, preocupados, e compartilhados pelos atletas-adolescentes.
com expectativas positivas sobre os filhos, Ressaltamos que, embora o estudo seja de
tanto nos aspectos desportivos quanto na natureza qualitativa, realizamos procedimen-
vida escolar. tos quantitativos, para que os achados fossem
consolidados. Nesta direção, destacamos,
ainda, o significativo quantitativo de parti-
Considerações finais cipantes (101), que fortaleceu, ainda mais,
os resultados apresentados. A escolha das
Nesta pesquisa, investigamos as RS de expressões indutoras que compuseram os
vitória/derrota para os pais, segundo QAL foi pensada, para identificar como os
atletas-adolescentes do esporte de alto atletas-adolescentes representam o que os
rendimento. Entendemos a adolescência seus pais constroem acerca da vitória/derrota,
circunstanciada aos grupos de pertença espe- elementos explicativos de construção da
cíficos, tendo em vista as suas experiências autoimagem de sucesso/fracasso.
diferenciadas, pelo meio sociocultural com
o qual estão envolvidos (Bock & Liebesny, No estudo empírico, compreendemos que as
2003; Menandro et al., 2010). RS de vitória/derrota para os pais apresentam
sentidos múltiplos e se relacionam tanto à
A partir dos resultados, vimos que as RS subjetividade, quanto à dimensão técnica do
compõem sistemas que se relacionam, pois, treinamento. O sentido de vitória é ampliado,
ao investigarmos as RS de vitória/derrota não apenas no contexto esportivo, mas na
para os pais, apareceram RS de filho e de escolarização, e no crescimento pessoal
atleta idealizados, o que corrobora a ideia para a vida. Na interpretação dos dados,
de Moscovici (2009), de que as RS refletem constatamos fragilidade na autonomia em
A relevância desta pesquisa se justifica pela Por fim, salientamos que os cuidados
carência de trabalhos que relacionem o fenô- dos pais dos atletas-adolescentes de alto
meno do esporte de alto rendimento ao grupo rendimento, na contextualização de uma
social de atletas-adolescentes, sobretudo sociedade competitiva e meritocrática, são
quando analisados pela TRS, além do impacto reformulados, afinal, lhes é exigido uma
que o esporte de alto rendimento pareceu-nos gama de investimentos: financeiro, de tempo
repercutir na vida dos atletas-adolescentes. e de equilíbrio emocional, para lidar com
as situações cotidianas de vitória/derrota de
Para o desenvolvimento humano, e no caso dos seus filhos, iniciadas na infância. Portanto,
atletas-adolescentes, a autonomia tem valor nas RS de vitória/derrota para os pais, os
diferenciado quando relacionada à disciplina atletas-adolescentes dizem que o esporte de
exigida pelo esporte de alto rendimento, pois, alto rendimento amplia as funções materna e
certamente, trará repercussões na disciplina paterna, pois exige cuidados e investimentos
da vida acadêmica, bem como nas atitudes adicionais, para além daqueles atribuídos
dos sujeitos em outros espaços públicos, que, tradicionalmente aos pais.
Isabela Amblard
Doutoranda pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife – PE. Brasil.
Email: isabela.amblard@gmail.com