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Culturais e Esportivas:
Esportes Individuais
Esportes Individuais: Temas Interdisciplinares
Revisão Textual:
Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro
Esportes Individuais:
Temas Interdisciplinares
• Introdução;
• Talento Esportivo;
• Tecnologia em Esportes Individuais.
OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Conhecer os conceitos que envolvem os esportes individuais, como talento esportivo, tecnologia,
doping e ética.
UNIDADE Esportes Individuais: Temas Interdisciplinares
Introdução
Há um elevado número de fatores que contribuem para a performance atlética em
determinados esportes, e muitos desses fatores estão relacionados às estruturas (antro-
pometria) e à capacidade funcional dos músculos. Identificar de forma correta crianças e
adolescentes com características potenciais para determinado esporte é uma tarefa que
exige conhecimento sobre os fatores que afetam a performance nesses grupos.
Tanto a tecnologia quanto o uso de recursos ergogênicos (sendo alguns dopings) são
baseados em achados da fisiologia e biomecânica para o exercício, assim como para sele-
ção de talentos esportivos. Esses avanços, baseados em evidência científica, são pensados
em como o atleta pode se destacar em determinados esportes. Um atleta de sucesso tem
que ter talento, além de ter um bom técnico/treinador, deve ser assistido pela tecnologia.
Recursos ergogênicos: o termo ergogênico tem origem grega, onde ergon refere-se a tra-
balho e gennan significa gerar ou produzir. Nesse sentido, no esporte, recurso ergogênico
é qualquer coisa que lancemos mão para que o nosso atleta aumente a sua capacidade de
trabalho (no caso, melhorar a performance). No esporte, podemos melhorar a performance
por cinco vias diferentes (fisiológica, psicológica, biomecânica, nutricional e farmacológica).
O exercício físico (ou seja, o treinamento físico), sem dúvidas, é o principal recurso ergogê-
nico que podemos utilizar para aumento da performance atlética (promove profundas alte-
rações fisiológicas em todo o organismo preparando-o para produzir mais trabalho); o trei-
namento mental também tem se mostrado um recurso bastante utilizado por psicólogos
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do esporte (melhora aspectos emocionais, de autoconfiança e de foco direcionado à prática
esportiva); o desenvolvimento tecnológico de equipamentos e de análise de movimento
podem melhorar a performance atlética por meio da otimização da biomecânica dos mo-
vimentos; a estratégia da nutrição (suplementação, dietas especiais, e práticas dietética)
também é um método que pode otimizar a performance; fármacos e drogas são substân-
cias químicas que foram desenvolvidas para outros objetivos (por exemplo, tratamento de
doenças), mas muitos fármacos (como testosterona sintética, EPO e efedrinas) têm sido uti-
lizados na prática esportiva e se mostrado como um potente e perigoso recurso ergogênico.
Nesta unidade, iremos discutir o que é ter talento esportivo (como detectar, selecionar
e promover esses atletas), o que é tecnologia no esporte e inevitavelmente iremos falar
de doping e as implicações éticas nesse processo (pois tecnologia para melhora da per-
formance, em muitos casos, resulta em doping).
Talento Esportivo
O termo talento se refere a uma moeda da antiguidade greco-latina, refere-se também
a algo que tem um valor inato. Esse valor é um potencial (no caso da moeda, para adqui-
rir bens). Além disso, o termo talento é usado para descrever um valor inato de pessoas.
No senso comum, refere-se a uma capacidade/aptidão inata para desempenhar uma ativi-
dade. Por exemplo, um jovem que gosta muito de estudar matemática e é bom em resolver
problemas nessa área, geralmente, é rotulado como um talento da matemática. Um jovem
que gosta de jogar futebol e se mostra habilidoso também é chamado de talento. Um jo-
vem alto, geralmente, é rotulado de talento para o basquete ou voleibol. No entanto, para
se manter como um talento (ou seja, sair da infância como um talento e se manter na idade
adulta como um talento), é necessária a convergência de diversos fatores, ou seja, para
que um(a) garoto(a) que é rotulado(a) pelo senso comum como talento venha a se manter
como talento no esporte até o nível profissional, é caminho difícil (é possível ouvir colegas
de profissão dizerem: “já fui considerado um talento do futebol, sabia?”, ou seja, ele quis
dizer: “não consegui permanecer ou progredir no futebol profissional”). De fato, vários
garotos que foram rotulados de talentos tiveram o seu valor (talento) “perdido” ao longo
da carreira esportiva. Não que isso tenha ocorrido por má intenção de alguém, mas, em
muitos casos, por incompetência dos profissionais que detectam, selecionam e promovem
os talentos. Em resumo, ser talento esportivo na infância é o jovem que apresenta alguma
vantagem (que lhe confere um valor), esse valor é uma característica que tem o potencial
de permitir que ele desempenhe uma performance melhor que o resto da população. Mas
como manter um talento da infância até a vida adulta (como fazer uma criança ser um pro-
fissional do esporte quando adulto)? Não existe uma fórmula exata, mas a literatura cien-
tífica (que pesquisou o percurso de vida de diversos de sucesso, ou seja, de vários talentos
esportivos consolidados) nos dá um norte para minimizarmos os erros e aumentarmos as
chances de detectar, selecionar e promover o talento esportivo.
Para que uma criança que é considerada um talento possa se desenvolver no esporte, é
preciso convergência de diversos fatores para que, assim, ele se consolide como um talento.
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não quer dizer que quem nasce no início do ano será um melhor atleta na idade adulta,
quer dizer que os treinadores dispensam uma enorme quantidade de potenciais talentos
(os atletas nascidos de abril a dezembro). Veja um exemplo na Figura 1A.
Figura 1
Fonte Adaptado de MARQUES, 2019 | BÖHME, 1995
Nascer no início do ano, além de trazer benefícios físicos em relação aos colegas da
mesma idade com nascimento próximo ao fim do ano, traz benefícios psicológicos (senti-
mento de autoeficácia/competência). Isso leva à manutenção de atletas que nasceram no
início do ano no esporte: pois o sentimento de competência é extremamente importante
para o atleta se manter engajado no esporte. Mas existem inúmeros jogadores extraordi-
nários, como Pelé (nascimento em outubro), Messi (nascimento em junho), que superaram
o efeito da idade relativa, provavelmente devido às suas incomparáveis qualidades técnica/
tática (que lhes conferem também os benefícios do sentimento de autoeficácia/competên-
cia). No entanto, potenciais ótimos atletas, em muitos casos, podem ter suas capacidades
técnico/tática superados pelo efeito da idade relativa (ou seja, isso irá induzi-los a ter baixos
resultados de performance, quando comparados aos colegas de equipe meses mais velhos,
mas nascidos no mesmo ano) e, assim, o sentimento de autoeficácia é invertido (sentimen-
to de incompetência), e isso leva um potencial talento esportivo a abandonar o esporte,
pois uma lei universal do comportamento humano é: “nós fugimos de atividades ou aban-
donamos as atividades as quais sentimos que somos ruins, ou seja, incompetentes”. Você
lembra que discutimos anteriormente como aumentar o sentimento de autoeficácia do
aluno? Lembra? (...foi durante a discussão sobre a teoria da autodeterminação).
Você deve estar se perguntando: “Professor, como posso evitar o efeito da idade relati-
va?”. Simples, seja um bom profissional (ou seja, é necessário conhecer a fundo a influên-
cia da idade relativa). Sabendo disso, no caso da idade relativa, os níveis de performance
devem ser comparados aos dos colegas nascidos em meses próximos. Por exemplo, como
sugerido na Figura 1, atletas que nasceram em janeiro devem ser comparados no máximo
com atletas mais novos que nasceram em março; atletas que nasceram em junho devem
ser comparados com atletas que nasceram em abril ou agosto; atletas que nasceram em
dezembro devem ser comparados, no máximo, com atletas que nasceram em outubro
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do mesmo ano ou com atletas que nasceram em fevereiro do ano seguinte, ou seja, dois
meses mais velhos ou dois meses mais novos. Assim você minimizará o efeito da idade
relativa, não selecionando atletas que se sobressaem pelo efeito da idade no momento da
seleção, mas sim os jogadores mais promissores em longo prazo. Veja a reflexão de um
caso relacionado à idade relativa e detecção, seleção e promoção de talentos esportivos.
Saiba mais sobre diferenças de performance devido ao efeito da idade relativa e como mi-
nimizar esses efeitos. Disponível em: https://bit.ly/37057d0
Na detecção de talento esportivo, quando você identifica que um atleta tem um porte
físico avantajado (desenvolvimento físico acima da média em comparação com os colegas
da mesma idade, ou seja, um atleta de 13 anos com corpo de uma atleta de 18 anos), é im-
portante identificar se ele não é um a adolescente com desenvolvimento precoce (ou seja o
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desenvolvimento biológico está à frente da sua idade cronológica). Ao contrário, também
é verdade, é provável que você identifique um atleta com uma habilidade acima da média,
por outro lado, ele não tem a parte física tão desenvolvida (ou seja, tem 13 anos, mas tem
um corpo de 10 anos). Nesse caso, é importante identificar se ele pode ser um atleta com
um desenvolvimento físico tardio (a sua idade biológica está atrasada em relação à sua ida-
de cronológica), veja exemplo, na Figura 1b, das diferenças de força em atletas da mesma
idade cronológica, mas com diferentes estágios do desenvolvimento biológico.
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• Dedicação e persistência;
• Apoio da família e amigos;
• Excelentes treinadores;
• Amor ao esporte;
• Excelentes programas de treinamento e facilidades;
Fatores para o sucesso • Talento natural;
• Competitividade;
• Foco;
• Trabalho ético;
• Suporte financeiro.
A Figura 2 ilustra que as condições sociopolíticas e culturais são mais importantes que
as técnicas e táticas na detecção e seleção do talento esportivo (Fase A). Lógico, o treina-
dor consegue desenvolver os aspectos técnicos e táticos dos atletas desde que, é claro, que
haja condições sociais, políticas e cultural para isso. Perceba que os três fatores (técnica,
tática e sócio-político-cultural) têm pesos iguais na Fase B (durante o processo de seleção
e promoção). Teoricamente, na Fase C, momento da consolidação do talento esportivo,
técnica e tática têm pesos importantes na manutenção do talento na carreira profissional.
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A promoção do Talento Esportivo é dependente
de um Programa de Treinamento em Longo Prazo
O talento esportivo deve passar por um programa de treinamento em longo prazo
(TLP, discutido em unidades anteriores). O TLP deve ter uma intervenção pedagógica
sistemática e planejamento adequados da infância à adolescência (isso dura, em média,
de 6 a 10 anos (dependendo da modalidade esportiva). Como discutido anteriormente (e
ilustrado na Figura 3), o TLP deve ter três níveis: 1–formação básica geral (na primeira
infância em escolinhas de esporte), 2–treinamento específico (em escolinhas ou clubes)
e 3–treinamento de alto nível (em clubes). No entanto, na prática, ocorre a sobreposição,
onde a iniciação ocorre em idades avançadas, o que leva a deficiências técnicas na for-
mação; para mais detalhes, veja Böhme (2010). Por isso sugerimos a leitura dos artigos
abaixo para complementar as ideias expostas aqui e anterioemente.
Até este ponto da unidade, fizemos uma breve discussão sobre as principais variáveis a se-
rem consideras na seleção, detecção e promoção de talento esportivo. Caso você vá para a
área de treinamento com crianças e adolescentes, além da videoaula do professor Marcelo
Massa (link anterior), sugerimos fortemente a leitura dos dois artigos que tratam de:
• Determinação de talentos esportivos II: Determinação de talentos esortivos.
Disponível em: https://bit.ly/3aPDofX
• Treinamento em longo prazo para o desenvolvimento de talento esportivo.
Disponível em: https://bit.ly/3tGr2PT
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O que é tecnologia?
A definição de tecnologia segundo a Infopédia é “conjunto dos instrumentos, métodos e
processos específicos de qualquer arte, ofício ou técnica”. Nesse sentido, métodos de trei-
nos, dieta (e suplementos nutricionais) e equipamentos criados especificamente para o es-
porte são tecnologia do esporte.
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Figura 4 – Atletas de sprint de 100 m, com diferentes vestimentas
para as quais são creditadas melhoria da performance em 4%
Fonte: Adaptado de weforum.org | Wikipedia
Também, como pode ser observado na Figura 5, outros esportes que alteram a tec-
nologia para tirar proveito da aerodinâmica, como a corrida de sprint de 100m, tiveram
importantes ganhos em performance atlética. Por exemplo, alguns esportes como salto
com vara têm melhoria de 27% devido ao material usado na vara (outros 59% foram
relacionados a outros fatores), lançamentos de dardos teve melhoria de 35% depois de
alterações nas regras que melhoram a aerodinâmica de lançamento de dardos. Em cor-
ridas de bike de 1h, por exemplo, houve uma melhora total de 221% (101% devido a
alterações aerodinâmicas).
Conhecimento em biomecânica não serve somente para o esporte de elite e para melhoria
em aerodinâmica. Se você for preparador físico de atleta profissional ou do “tiozinho” que foi
direcionado pelo médico para praticar atividade física supervisionada, é importante ter conhe-
cimentos biomecânicos para prescrever exercício com eficiência e segurança. Por exemplo, não
saber como funcionam os vetores de força durante um exercício de agachamento pode levar
ao desenvolvimento de problemas na articulação do joelho do seu aluno. Sugerimos o livro
da Susan Hall (HALL, S. J. Biomecânica Básica. Rio de Janeiro, RJ: Guanabara Koogan, 2005).
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Pistas de Corrida
Semelhante ao que ocorreu com a evolução da piscina, as pistas de corridas foram dese-
nhadas para maximizar a velocidade, mas diminuir as lesões dos atletas. Por exemplo, em
Havard (em 1977), foi desenvolvida uma pista de corrida chamada de tuned track ou faixa
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sintonizada, que diminui a incidência de lesão em 50% devido à diminuição do impacto arti-
cular durante a corrida. Também a pista diminuiu o tempo de contato do pé do atleta com o
solo, além disso, a pista tinha efeito mola (semelhante à mecânica de corrida), que jogava o
atleta para frente. Então essa pista causava menos lesões, diminuía o tempo de contato, que
aumenta a velocidade, pois em sprinter o tempo de contato é inversamente proporcional à
velocidade e aumentava o tamanho da passada (isso fazia a performance melhorar em 2% a
3%. Para se ter uma ideia do avanço tecnológico dessa pista, essa melhora na performance
de 2-3%, para atletas olímpicos atuais seria a diferença do 1º ao último lugar, na prova de
100m, na Olímpiada do Rio 2016. Por exemplo: tempo de, Usain Bolt foi de 9,81s, como
medalha de ouro, sendo Trayvon Bromell com tempo de 10,06s, ficando como último co-
locado; caso Trayvon Bromell melhorasse 3%, o tempo cairia para impressionantes 9,75s.
Ciclismo
No ciclismo, o arrasto aerodinâmico é responsável por 90% das forças resistivas que o
ciclista deve superar. Sabendo disso, o desenvolvimento tecnológico no ciclismo tem focado
na redução do arrasto aerodinâmico para conseguir aumentar a velocidade. As inovações na
aerodinâmica dos equipamentos de ciclismo geraram polêmicas na comunidade do ciclismo,
ou seja: será que a melhora de performance reflete a habilidade e capacidade dos ciclistas ou
são resultados exclusivamente dos projetos de engenharia? O aumento na performance é ar-
tificial? Antes de 1984, não era permitido nenhum equipamento nas bikes que objetivassem
diminuir a resistência do ar. Entretanto, inovações em equipamentos que atendiam a fins
funcionais ou estruturais (como posições de pilotagem, material de acabamento, desenho da
bike, capacete, roupa e tipo de pista) fizeram com que houvesse melhora na performance
e que muitos recordes fossem quebrados. A literatura tem creditado que 60% da melhora
no recorde mundial de corrida na bike em 1h (modalidade de cobrir, em 1h, a maior distân-
cia possível na bike numa superfície plana), no período de 1967 a 1996, foram devido à
melhora aerodinâmica (aumento artificial), sendo 40% creditados à fisiologia, ou seja, 40%
de aumento real (NEPTUNE; MCGOWAN; FIANDT, 2009). Essas espantosas alterações
levaram a novas regras no ciclismo. Para essa modalidade, atualmente, é exigido que os
equipamentos dos ciclistas sejam semelhantes aos usados no recorde de 1h estabelecido, em
1972 (isso foi um esforço para evitar que os recordes de 1h não sejam mais influenciados
pela tecnologia do que pelos atletas em si). Os recordes de 1h na bike no período de 1972
a 2000 foram rebaixados de recorde mundial para “melhores performances”. Outras mo-
dalidades do ciclismo ainda não foram afetadas por essas regras. Avanços em equipamento
continuam em busca de melhorar a performance no ciclismo, alterando vários aspectos do
movimento de pedalada por meio de novos mecanismos de pedal e formas de anel de cor-
rente não circular – veja exemplos em ZAMPARO et al., 2002).
Por exemplo, na fisiologia do exercício, foi identificado que atividades como correr ou
pular têm ações musculares de contração excêntricas seguidas de fases concêntricas, ou
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O treino pliométrico é uma técnica de treinamento eficaz para desenvolver força e potência
muscular para esportes nos quais a velocidade e a explosão são essenciais (por exemplo, corri-
da, ginástica, ciclismo em pista). A pliometria utiliza o CAE, que envolve alterações mecânicas
(como altas forças excêntricas, armazenamento e liberação de energia elástica) e neurológicas
(ativação do reflexo do alongamento) que aumentam o recrutamento de fibras e fazem au-
mentar a força e a produção de potência muscular. Um elemento-chave dos exercícios plio-
métricos é a fase de amortização, que é o tempo entre as fases excêntrica e concêntrica. Se
essa fase for muito longa, o benefício do armazenamento de energia elástica e da resposta do
reflexo de estiramento é perdido. É consenso na literatura científica que treino pliométrico é
um método eficaz para aumentar a força e a produção de potência; no entanto, os mecanismos
específicos que contribuem para esse aumento ainda não são bem compreendidos. Estudos
sugerem que o aumento do impulso neural, a melhoria da coordenação e as mudanças nas
características de rigidez muscular podem desempenhar papéis importantes.
Também foi descoberto que as ações excêntricas são responsáveis por dissipar ener-
gia e proteger músculos e articulações para que não ultrapassem seus limites biomecâ-
nicos e anatômicos, respectivamente. Também por meio de estudos que descobriram a
contribuição das ações excêntricas no tecido muscular, foi proposto o treino excêntrico
como ferramenta efetiva para prevenir lesões no esporte – veja a revisão de Van Dyk
& Whiteley, 2009. As figuras a seguir ilustram um exercício puramente excêntrico atu-
almente utilizado por treinadores e fisioterapeutas (atualizados), como ferramenta para
diminuir lesões no posterior de coxa. Esse mesmo conceito (exercício puramente excên-
trico) pode ser utilizado em qualquer músculo suscetível de lesão no esporte.
Cristiane da seleção de futebol (BRA) do Brasil após uma lesão no posterior de coxa nas
Olimpíadas do Rio 2016. Disponível em: https://bit.ly/3juG1I8
Um exercício excêntrico para o posterior de coxa (nordic hamstring) implementado na prática
esportiva a partir de estudos científicos para premir lesões no posterior de coxa.
Disponível em: https://bit.ly/3rvhHsv
Alguns esportes são dependentes das ações concêntricas, como o ciclismo. Assim,
organizar a bicicleta e as proporções antropométricas do ciclista pode maximizar a contri-
buição das ações concêntricas (ou seja, otimizar o braço de força nas ações concêntricas).
Veja o exemplo da Figura 7a, que dos 0° aos 180° graus há uma contribuição de ações
concêntricas do quadríceps e dos músculos extensores do quadril, a partir dos 180°, há
uma ação excêntrica desses músculos e sua contribuição de força na ação excêntrica (em
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vermelho). A Figura 7b demonstra que a otimização do braço de força, em 10 e 20%, nas
ações concêntricas dos extensores do quadril e do joelho resultou em ganhos de perfor-
mance de 2,4 e 3,4%, respectivamente.
Figura 7
Fonte: NEPTUNE; MGOWAN; FIANDT, 2009
Existem ótimos ângulos (relação entre força e comprimento) para execução de mo-
vimentos para melhorar a participação concêntrica, como o bloco de corrida no sprint,
exercício de musculação para potencializar e eficiência (relação força-comprimento) das
ações concêntricas. Todas essas abordagens são descobertas recentes e servem como
base para prescrição de novos exercícios (são as novas tecnologias do esporte!).
A fisiologia do exercício também tem identificado que atletas podem adquirir diferentes
tipos de fibras musculares devido ao treinamento. Além disso, esses diferentes tipos de fibras
musculares podem ser de herança genética. Esses dois fatores são utilizados para escolher o
tipo de treino a ser aplicado (qual o tipo de fibra precisamos para essa modalidade?) ou para
seleção de talentos esportivos. A Figura 8 demonstra que existe uma relação do tipo de fibra
com a performance atlética. Fibras lentas, apesar de gerarem pouca força e a velocidade
de contração ser lenta, são ótimas para esportes de endurance como corridas e ciclismo
de longas distâncias (pois elas são difíceis de entrar em fadiga). Já as fibras rápidas fadigam
rapidamente, mas são rápidas e produzem uma alta taxa de força, por isso são ótimas para
esportes de explosão ou força, mas de curta duração como sprint, levantamento de peso.
A proporção de fibras musculares de contração rápida e lenta pode variar entre os indiví-
duos e tem sido associada ao desempenho atlético. Por exemplo, em músculos com fibras
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mistas, um velocista pode ter até 75% de fibras de contração rápida, enquanto um corredor
de longa distância pode ter 75% de fibras de contração lenta no mesmo músculo. Embora
muitos esportes exijam potência e endurance e, portanto, um equilíbrio entre as fibras de
contração lenta e rápida, nesse sentido, treinar seletivamente os músculos para um tipo de
fibra preferencial é benéfico para esportes com tarefas específicas.
Figura 8
Curvas de força-velocidade e potência para fibras musculares rápidas (linha
tracejada) e lentas (linha sólida). Fibras musculares rápidas geram forças iso-
métricas mais altas e produzem mais força do que as fibras musculares lentas.
A fisiologia do exercício também tem identificado que esportes nos quais o enduran-
ce é um componente importante para a performance (por exemplo, corrida de longa
distância e ciclismo), por exemplo, os atletas de elite têm um VO2máximo que é quase o
dobro de indivíduos não treinados. VO2máximo tem menos influência para atletas com-
petindo em eventos de curta duração, como sprinters ou levantadores de peso, em que a
energia é fornecida quase inteiramente por meio do metabolismo anaeróbio. Portanto, é
necessário conhecer a demanda de energia da modalidade, que está relacionada ao tipo
de fibra muscular (especializada em produção de anergia aeróbia ou anaeróbia). Para
saber o tipo de treinamento a ser prescrito para o atleta, veja o exemplo na Figura 9.
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I). À medida que a intensidade do exercício aumenta, as fibras do tipo I atin-
gem sua capacidade máxima de produzir energia (vermelho) e as fibras do tipo
II e IIb (x) mais rápidas são então recrutadas.
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Essas alterações são só possíveis por meio da utilização de robustos bancos de dados
(armazenamento de dados de vários anos) e de ferramentas da medicina direcionadas
para o estudo do esporte que permitem análise do tecido muscular e do consumo de
oxigênio de atletas.
Doping no esporte
São consideradas doping as estratégias que aumentam artificialmente e injustamente
a performance de um atleta. Geralmente, as substâncias que são consideradas como
doping são aquelas que fazem mal à saúde do atleta ou de seus adversários e que vai
contra o espírito esportivo.
Existe o doping biomecânico (já demos exemplos anteriormente, como design de maiôs
e bicicletas) e o doping fisiológico, ambos aumentam artificialmente a performance atlética.
O doping biomecânico é específico para cada modalidade. Nesse caso, são listados
pelas próprias federações que organizam as modalidades. Já o doping fisiológico per-
meia por várias modalidades que têm demandas fisiológicas semelhantes. Existe uma
organização mundial conhecida como WADA (Word Antidoping Agency), que trabalha
para coibir o uso de substâncias fisiológicas que são consideradas doping no espor-
te (todas as modalidades olímpicas são submetidas ao código de doping da WADA).
É importante ter em mente também que o controle da WADA sobre o uso de substâncias
que alteram a fisiologia e a bioquímica do organismo para provocar aumento suprafi-
siológico da performance visa não só preservar o espírito esportivo, mas sim o mais
importante, que é preservar a saúde dos atletas (nenhuma vitória vale a saúde ou a vida).
Anualmente, é publicada uma lista de substâncias proibidas.
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Site da WADA (Word Antidoping Agency). Disponível em: https://bit.ly/2LCJUOM
Lista de substâncias proibidas. Disponível em: https://bit.ly/3p4J7Uq
A WADA segue três critérios para considerar uma substância como doping:
• Evidência médica ou outra evidência científica, efeito farmacológico ou experiência
de que a substância ou o método, sozinho ou em combinação com outras substâncias
ou métodos, melhore ou tenha o potencial de melhorar o desempenho esportivo;
• Evidência médica ou outra evidência científica, efeito farmacológico ou experiência
de que o uso da substância ou do método representa um risco real ou potencial
para a saúde do atleta;
• Evidência médica ou outra evidência científica, efeito farmacológico ou experiência
de que o uso da substância ou do método viola o espírito esportivo descrito na in-
trodução do Código.
Para uma substância (ou equipamento) ser considerada doping, basta ela preencher
somente dois dos três requisitos mencionados acima. Portanto, a política antidopagem
visa preservar a saúde do atleta e o espírito esportivo.
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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
Biomecânica Básica
HALL, S. J. Biomecânica Básica. Rio de Janeiro, RJ: Guanabara Koogan, 2005.
Conhecimento em biomecânica para poder entender e como criar tecnologia para
melhora da performance esportiva.
Suplementação Nutricional no Esporte
ROGERI, P. S.; CAPERUTO, E. C. Suplementação Nutricional no Esporte –
Capítulo 13. Doping. 2. ed. São Paulo: Guanabara Koogan, 2019. v. 1. 296p.
Capítulo de livro que conta a história do doping fisiológico e de métodos de dectenção.
Leitura
Talento esportivo II: determinação de talentos esportivos
Como detectar um talento esportivo.
https://bit.ly/3cX0N1G
Treinamento a longo prazo e o processo de detecção, seleção e promoção de talentos esportivos
Treinamento para promoção do talento esportivo.
https://bit.ly/36WyrB3
The influence of muscle physiology and advanced technology on sports performance
Avanços em tecnologia do esporte.
https://bit.ly/3p6rGCK
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Referências
BÖHME, M. T. S. Treinamento a longo prazo e o processo de detecção, seleção e promo-
ção de talentos esportivos. Revista Brasileira de ciências do esporte, v. 21, n. 2, 2010.
KNUTTGEN, H. G. Strength training and aerobic exercise: comparison and contrast. The
Journal of Strength & Conditioning Research, v. 21, n. 3, p. 973-978, 2007.
MARQUES, P. R. R.; DOS SANTOS PINHEIRO, E.; COSWIG, V. S. Efeito da idade rela-
tiva sobre a seleção de atletas para as categorias de base de um clube de futebol. Revista
Brasileira de Ciências do Esporte, v. 41, n. 2, p. 157-162, 2019.
VAN DYK, N.; BEHAN, F. P.; WHITELEY, R. Including the Nordic hamstring exercise in
injury prevention programmes halves the rate of hamstring injuries: a systematic review
and meta-analysis of 8459 athletes. British journal of sports medicine, v. 53, n. 21,
p. 1362-1370, 2019.
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