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BASES

FARMACOLÓGICAS
E INTERAÇÕES
MEDICAMENTOSAS
NA ESTÉTICA

Patricia Garcia Ferreira


Fármacos e eritema
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Descrever o mecanismo e os sinais e sintomas do eritema induzido


por antibióticos.
 Identificar os processos envolvidos no eritema induzido pelos anti-
-inflamatórios não esteroidais.
 Explicar por que anticonvulsivantes causam eritema.

Introdução
As reações adversas aos medicamentos podem ocorrer em doses habi-
tuais, empregadas na prevenção, no diagnóstico ou no tratamento de
patologias, sendo consideradas como qualquer reação indesejável e não
intencional resultante da administração de um medicamento em doses
normalmente utilizadas. A reação cutânea mais comum é o eritema,
que é um sinal clínico caracterizado pela vermelhidão na pele devido à
vasodilatação. Porém, existem outras manifestações clínicas cutâneas,
dependendo do grau de reação.
Neste capítulo, você vai estudar o mecanismo e os sinais e sintomas do
eritema induzido por antibióticos, por anti-inflamatórios não esteroidais
(AINEs) e por anticonvulsivantes.

1 Reações de hipersensibilidade associadas aos


antibióticos
As reações adversas aos medicamentos podem ser classificadas como previsí-
veis (tipo A) ou imprevisíveis (tipo B), conforme lecionam Rang et al. (2012).
As reações do tipo A estão relacionadas à farmacodinâmica do fármaco e,
na maioria das vezes, são dose-dependentes. Já as reações do tipo B são
mediadas imunologicamente e não estão relacionadas à farmacodinâmica
do fármaco — por exemplo, a alergia aos medicamentos. As reações do tipo
2 Fármacos e eritema

B são consideradas totalmente inesperadas e imprevisíveis e ocorrem com


menor frequência, correspondendo a apenas 25% das reações adversas aos
medicamentos. Nas reações do tipo A, diversos mecanismos estão envolvidos,
como: ativação de vias metabólicas, sobredosagem, toxicidade cumulativa,
efeitos colaterais, interações medicamentosas e exacerbação de doenças cutâ-
neas preexistentes (RANG et al., 2012). Nas reações do tipo B, destacam-se
as reações de hipersensibilidade, as mais comuns entre os indivíduos (RANG
et al., 2012).
Os antibióticos são capazes de induzir diferentes tipos de reações imuno-
lógicas. As reações mais comuns são (RANG et al., 2012):

 reações mediadas por imunoglobulina E (IgE);


 reações mediadas por linfócitos T.

A Figura 1 esquematiza os diferentes tipos de reações adversas aos


medicamentos.
As reações de hipersensibilidade imediatas são mediadas por anticorpos
IgE, isto é, resultam da síntese de IgE específico contra o antibiótico (antí-
geno). A interação anticorpo IgE/antígeno leva à liberação de mediadores,
como histamina, triptase, prostaglandinas, leucotrienos, entre outros. Esses
mediadores estimulam uma resposta inflamatória (alérgica) em minutos.
Já as reações de hipersensibilidade mais tardias geralmente ocorrem 1 hora
após o uso do fármaco e são mediadas por anticorpos sensibilizantes cutâneos
específicos. Essas reações tardias são frequentemente associadas a mecanis-
mos imunológicos associados aos linfócitos T. Os linfócitos T reconhecem o
antígeno (no caso, o antibiótico), desencadeando a liberação de citocinas e o
recrutamento de outras células, resultando em inflamação.
Fármacos e eritema 3

REAÇÃO ADVERSA
AO MEDICAMENTO

REAÇÕES REAÇÕES
IMPREVISÍVEIS PREVISÍVEIS

MEDIDAS FARMACODINÃMICA
IMUNOLOGICAMENTE DO FÁRMACO

REAÇÃO REAÇÃO
IMEDIATA TARDIA

REAÇÕES MEDIADAS REAÇÕES MEDIADAS


POR IgE POR LINFÓCITOS T

Figura 1. Classificação das reações farmacológicas previsíveis e não previsíveis.

Sulfonamidas
O mecanismo de ação das sulfonamidas (Figura 2), que representam um grupo
de antibióticos sintéticos, interfere em uma reação bioquímica específica, a
síntese de ácido fólico (essencial para o crescimento bacteriano), a partir da
inibição competitiva da enzima bacteriana dihidroperoato sintetase. Essa en-
zima é responsável pela transformação do ácido p-aminobenzoico (PABA) em
ácido fólico, comprometendo a síntese de bases nitrogenadas. Dessa forma, as
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sulfonamidas são inibidores competitivos da enzima bacteriana dihidroperoato


sintetase, conforme Brunton et al. (2010).
Os principais fármacos dessa classe são:

 sulfadiazina (administração oral);


 sulfadiazina de prata (administração tópica);
 sulfametoxazol (administração oral);
 sulfisoxazol (administração oral);
 sulfacetamida (administração tópica);
 sulfadoxina.

As sulfonamidas estão relacionadas a algumas reações cutâneas atribuídas


à sensibilidade a sulfonamidas, podendo-se destacar diferentes tipos de eri-
tema — por exemplo, nodoso e multiforme. Em indivíduos pré-sensibilizados,
a reação ocorre imediatamente. No entanto, é mais comum o aparecimento
depois da primeira semana de tratamento. O sulfisoxazol é o fármaco dessa
classe que desencadeia com maior frequência as reações de hipersensibilidade
(BRUNTON et al., 2010).

dihidroperoato sintetase

PABA Ácido fólico Ácido folínico

Sulfonamidas
Bases nitrogenadas
Compete com o PABA

DNA
bacteriano

Figura 2. Mecanismo de ação das sulfonamidas a partir da inibição do ácido fólico, essen-
cial para o crescimento bacteriano. As sulfonamidas são inibidoras da enzima bacteriana
dihidroperoato sintetase. Essa classe de medicamento é análoga ao substrato PABA. A
enzima bacteriana dihidroperoato sintetase catalisa reações para a síntese de ácido folínico,
essencial para a síntese das bases nitrogenadas, que, por sua vez, são responsáveis pela
síntese do DNA bacteriano.
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Antibióticos β-lactâmicos
Os antibióticos β-lactâmicos possuem ação na parede celular bacteriana, inter-
ferindo na síntese do peptidoglicano, polímero responsável por estabilizar de
forma mecânica a parede celular das bactérias. O determinante do mecanismo
de ação é a presença do anel β-lactâmico em sua estrutura (BRUNTON et al.,
2010). Existem quatro subclasses de β-lactâmicos empregados no tratamento de
infecções; destacam-se as penicilinas e as cefalosporinas, apresentadas a seguir.

Penicilinas

As penicilinas foram os primeiros antibióticos desenvolvidos e, até hoje, são


consideradas as mais importantes na terapêutica. Esse grupo é classificado
de acordo com seus espectros de atividade antimicrobiana, e, de uma forma
geral, sua administração pode ser por via oral ou parenteral. Os grupos a seguir
categorizam as principais penicilinas (BRUNTON et al., 2010).

 Grupo 1 — penicilinas sensíveis à penicilinase:


■ penicilina cristalina ou aquosa — restrita ao uso parenteral;
■ penicilina G (benzilpenicilina) — uso intramuscular;
■ penicilina V — apenas para uso oral.
 Grupo 2 — penicilinas que resistem à penicilinase:
■ meticilina — não é utilizada por via oral;
■ nafcilina;
■ oxacilina.

A penicilinase é uma enzima produzida por bactérias com atuação no anel β-lactâmico
da penicilina, por meio de um mecanismo denominado hidrólise. As penicilinases são
responsáveis pela resistência da bactéria às penicilinas (BRUNTON et al., 2010).

 Grupo 3 — penicilinas com atividade antimicrobiana aumentada:


■ ampicilina;
■ amoxicilina.
 Grupo 4 — penicilinas antipseudomonas:
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■ piperacilina — não é utilizada por via oral.

As reações de hipersensibilidade ocorrem frequentemente, principalmente


em indivíduos que fazem uso de outro fármaco do mesmo grupo. A reação pode
ser amena e desaparecer; porém, em outros casos, é necessária a suspensão do
fármaco de imediato, além de ser contraindicado o uso subsequente de penici-
linas, devido ao risco de morte. O tratamento para indivíduos com reações de
hipersensibilidade à penicilina, na maioria das situações, é feito com outras
classes de antibiótico. Em casos específicos, é indicada a dessensibilização em
indivíduos que necessitam fazer uso da penicilina, sendo esse procedimento
realizado na terapia intensiva (BRUNTON et al., 2010).

A penicilina, um antibiótico β-lactâmico, é o fármaco responsável pelo maior número


de casos de reações imunofarmacológicas, entre as diferentes classes de antibióticos.
A dessensibilização à penicilina apenas é indicada caso não haja opções terapêuticas
disponíveis. Esse procedimento é de risco, realizado apenas na terapia intensiva, com
consentimento livre esclarecido. O protocolo para a dessensibilização oral é sugerido
pelo Ministério da Saúde (CAETANO, 2013).

Cefalosporinas

O mecanismo de ação das cefalosporinas é semelhante ao das penicilinas,


inibindo a síntese da parede celular bacteriana. As cefalosporinas são classi-
ficadas por geração. No Quadro 1, destacam-se as principais cefalosporinas
e as suas respectivas características (KATZUNG, 2005).
Fármacos e eritema 7

Quadro 1. Classificação das cefalosporinas por geração e suas respectivas características

Geração Composto Característica

Primeira geração  Cefazolina  Administração


intravenosa

 Cefalexina  Administração oral

 Cefadroxila  Administração oral

Segunda geração  Cefoxitina  Administração


intravenosa

 Cefaclor  Administração oral

 Cefuroxima  Administração
intravenosa

 Cefotetana  Administração
intravenosa

Terceira geração  Cefotaxima  Administração


intravenosa

 Ceftriaxona  Administração
intravenosa

 Cefoperazona  Administração
intravenosa

 Ceftazidima  Administração
intravenosa

Quarta geração  Cefepima  Administração


intravenosa

Quinta geração  Ceftarolina  Administração


intravenosa

 Ceftobiprole  Administração
intravenosa

Fonte: Adaptado de Katzung (2005).

Inibidores da síntese bacteriana das proteínas


Os fármacos dessa classe inibem a síntese proteica das bactérias. Podem
causar reações de hipersensibilidade, porém, em menores proporções, quando
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comparados às classes descritas anteriormente. Essa classe abrange os fármacos


descritos a seguir, com base em Katzung (2005).

 Tetraciclinas: o uso das tetraciclinas pode causar diversas reações cutâ-


neas, que podem persistir durante meses após a interrupção da terapia.
 Cloranfenicol: é comum o aparecimento de reações de hipersensibilidade
simultaneamente com febre.
 Macrolídeos:
■ eritromicina — dificilmente produz efeitos colaterais graves; as
reações incluem eritema, porém, essa manifestação cutânea desa-
parece após a interrupção da terapia;
■ claritromicina;
■ azitromicina.

Vancomicina
O fármaco vancomicina é inibidor da síntese da parede celular. A sua ad-
ministração pode ser por via oral — no entanto, é pouca absorvida — e
por via intravenosa, na terapia parenteral. As reações de hipersensibilidade
mais comuns são eritemas e anafilaxia. A infusão intravenosa rápida pode
ocasionar o extremo rubor, denominado síndrome do pescoço vermelho. Essa
manifestação se deve ao efeito tóxico da vancomicina sobre os mastócitos,
induzindo a liberação de histamina (KATZUNG, 2005).

A principal causa da síndrome do pescoço vermelho é a administração intravenosa


rápida da vancomicina. Logo, o uso desse fármaco requer alguns cuidados:
 a velocidade máxima de infusão, que deve ser exclusivamente endovenosa, é de
10 mg/min;
 mesmo em soluções diluídas ou doses menores do que 500 mg, a administração
da vancomicina deve levar pelo menos 120 minutos;
 a administração por via intramuscular pode causar necrose nos tecidos;
 a vancomicina não pode ser administrada por via endovenosa direta;
 a vancomicina apresenta instabilidade quando outros medicamentos são adicio-
nados na mesma solução, portanto, é inviável misturar a vancomicina com outros
fármacos.
Fármacos e eritema 9

2 Reações cutâneas induzidas por anti-


inflamatórios não esteroidais (AINEs)
Os AINEs são fármacos que inibem a enzima ciclo-oxigenase (COX). De
uma forma geral, a ação farmacológica desse grupo é atuar primariamente
na inibição da enzima COX de ácidos graxos. Dessa forma, os AINEs inibem
a produção de prostaglandinas e tromboxanos, principais mediadores da
inflamação (MONTEIRO et al., 2008).
Os AINEs são capazes de inibir, de forma variável, as duas isoformas da en-
zima COX: COX-1 e COX-2. Essas isoformas apresentam algumas diferenças,
resultando, assim, em funções diferentes. A COX-1, também denominada de
enzima constitutiva, está presente em praticamente todos os tecidos, inclusive
nas plaquetas do sangue. A principal função da COX-1 está relacionada com
a homeostase dos tecidos e está associada à produção de prostaglandinas com
diferentes funções: citoproteção gástrica, agregação plaquetária, manutenção
do fluxo sanguíneo renal e início do parto. Em contrapartida, a COX-2, tam-
bém denominada de enzima indutiva, é expressa nas células inflamatórias,
no momento de uma infecção ou lesão, por exemplo. Essa isoforma é ativada
principalmente por citocinas inflamatórias (interleucina 1 e fator de necrose
tumoral). Embora seja induzida, é considerada constitutiva no sistema nervoso
central (SNC), conforme apontam Monteiro et al. (2008).
Os efeitos terapêuticos dos AINEs envolvem a redução dos componentes
das respostas inflamatórias e imunológicas. Nesse sentido, as prostaglandinas,
principalmente as originadas da COX-2, desempenham um papel fundamental.
Suas principais ações são (MONTEIRO et al., 2008):

 redução da vasodilatação;
 redução de edema por ação indireta.

O controle da temperatura corporal é realizado pelo hipotálamo. A elevação


da temperatura corporal (febre) ocorre quando há um desequilíbrio de perda
e ganho de calor no hipotálamo. O efeito antipirético dos AINEs é dado pelo
reajuste desse desequilíbrio, a partir da inibição da produção de prostaglandinas
no hipotálamo (MONTEIRO et al., 2008).
Os fármacos classificados como AINEs apresentam três efeitos principais,
destacados na Figura 3, com base em Lüllmann, Mohr e Hein (2010).
10 Fármacos e eritema

INIBIDORES DA COX

EFEITO ANTI-
EFEITO ANALGÉSICO EFEITO ANTIPIRÉTICO
-INFLAMATÓRIO

Diminuição da A febre é regulada pelo SNC a


Diminuição da geração de
prostaglandina E2 e da partir da liberação da interleucina 1,
prostaglandinas
prostaciclina que controla as prostaglandinas

Redução da vasodilatação, Redução da sensibilização


e então , redução de edema das terminações nervosas

Figura 3. Ação farmacológica dos inibidores da COX, com destaque para os AINEs.

O Quadro 2 a seguir apresenta uma lista de AINEs de uso comum na


clínica médica, com sua respectiva seletividade.

Quadro 2. Inibidores da enzima ciclo-oxigenase com sua respectiva seletividade para a


isoforma da COX

Seletividade para a
Fármaco isoforma da COX

Ácido mefenâmico –

Aceclofenaco –

Ácido acetilsalicílico (aspirina) Fracamente seletivo para COX-1

Celecoxibe Moderadamente seletivo para COX-2

Cetoprofeno –

Cetorolaco Altamente seletivo para COX-1

Diclofenaco Fracamente seletivo para COX-2

Etoricoxibe Altamente seletivo para COX-2

(Continua)
Fármacos e eritema 11

(Continuação)

Quadro 2. Inibidores da enzima ciclo-oxigenase com sua respectiva seletividade para a


isoforma da COX

Seletividade para a
Fármaco isoforma da COX

Flurbiprofeno Altamente seletivo para COX-1

Ibuprofeno Fracamente seletivo para COX-1

Indometacina Fracamente seletivo para COX-1

Naproxeno Fracamente seletivo para COX-1

Piroxicam Fracamente seletivo para COX-2

Sulindaco Fracamente seletivo para COX-2

Paracetamol –

As principais funções das prostaglandinas estão relacionadas à proteção


gástrica, à agregação plaquetária, à regulação do fluxo sanguíneo renal, entre
outros. Portanto, os efeitos colaterais compartilham um efeito semelhante,
dependente do mecanismo de ação. O efeito colateral mais comum dos AINEs
é o distúrbio gastrintestinal, principalmente pela inibição da COX-1 no es-
tômago. A síntese de prostaglandinas no estômago inibe a produção de suco
gástrico; consequentemente, ocorre perda da proteção gástrica. Outros efeitos
indesejáveis são (BRUNTON et al., 2010):

 efeitos adversos renais;


 efeitos adversos cardiovasculares;
 reações cutâneas.

O mecanismo das reações cutâneas causadas por AINEs ainda é incerto.


São mais comuns com o ácido mefenâmico e o sulindaco. Os efeitos indese-
jáveis podem ser eritemas leves, urticárias e fotossensibilidade. As doenças
mais graves, até mesmo fatais, incluem a síndrome de Stevens-Johnson e a
necrólise epidérmica tóxica. Alguns indivíduos apresentam hipersensibilidade
ao ácido acetilsalicílico (AAS) e aos AINEs, sendo que a intolerância ao
AAS é contraindicada ao tratamento com qualquer AINE. Essa associação
pode ocasionar uma reação cruzada, que, consequentemente, pode ser fatal.
12 Fármacos e eritema

A hipersensibilidade pode ocorrer em doses relativamente baixas e, aparen-


temente, envolve o mecanismo de inibição da COX (SILVARES et al., 2008).

3 Eritema e anticonvulsivantes
Segundo Lüllmann, Mohr e Hein (2010), os fármacos anticonvulsivantes,
também denominados antiepilépticos, incluem:

 fenitoína;
 carbamazepina;
 valproato;
 fenobarbital.

Também fazem parte dessa classe os benzodiazepínicos, como:

 diazepam;
 clonazepam;
 clobazam.

Os fármacos mais modernos apresentam menos efeitos adversos e incluem:

 vigabatrina;
 gabapentina;
 pregabalina;
 lamotrigina;
 tiagabina;
 topiramato;
 levetiracetam;
 oxcarbazepina;
 zonisamida;
 rufinamida.
Fármacos e eritema 13

Os fármacos anticonvulsivantes apresentam três mecanismos de ação


principais (Figura 4):

1. potencialização da ação do ácido gama-aminobutírico (GABA), principal


neurotransmissor inibitório do SNC;
2. inibição da função dos canais de sódio;
3. inibição dos canais de cálcio.
MECANISMOS DE AÇÃO DOS
ANTICONVULSIVANTES

FENOBARBITAL
POTENCIALIZAÇÃO
BENZODIAZEPÍNICOS
DA AÇÃO DO GABA
ÁCIDO VALPROICO

FENITOÍNA
INIBIÇÃO DAS FUNÇÕES CARBAMAZEPINA
DOS CANAIS DE SÓDIO ÁCIDO VALPRÓICO
LAMOTRIGINA

ETOSSUXIMIDA
INIBIÇÃO DAS FUNÇÕES
ÁCIDO VALPRÓICO
DOS CANAIS DE CÁLCIO
GABAPENTINA

Figura 4. Mecanismos de ação e exemplos dos anticonvulsivantes utilizados na clínica


médica.

Principais fármacos anticonvulsivantes relacionados às


reações cutâneas
A fenitoína é um fármaco anticonvulsivante não sedativo. O seu mecanismo de
ação é a alteração da condutância de sódio, potássio e cálcio, isto é, os potenciais
de membrana. Também altera a concentração dos neurotransmissores: adrenalina,
acetilcolina e GABA. Assim como os diversos anticonvulsivantes, o mecanismo de
ação da fenitoína envolve uma variedade de combinações de ações em diferentes
níveis. No entanto, a atuação ocorre principalmente no bloqueio de canais de sódio.
As reações cutâneas são idiossincráticas, ou seja, são resultados de mecanismos
que não são compreendidos. O surgimento de eritema e erupções cutâneas pode
ser um indicativo de hipersensibilidade ao fármaco. Algumas lesões podem ser
graves, com características esfoliativas (BRUNTON et al., 2010).
14 Fármacos e eritema

A carbamazepina possui mecanismo de ação semelhante ao da fenitoína, a


partir do bloqueio de canais de sódio. Também atua na inibição de recaptação
e liberação de noradrenalina; entretanto, não influencia na captação de GABA
no cérebro. Apresenta diversas reações idiossincráticas; porém, a mais comum
consiste em erupção cutânea eritematosa (BRUNTON et al., 2010).
O fenobarbital é derivado do ácido barbitúrico, e o seu mecanismo de
ação ainda é desconhecido. Porém, é de conhecimento que sua atuação está
baseada na ligação a componentes moleculares do receptor GABA presentes
nas membranas dos neurônios no SNC. O distúrbio cutâneo mais comum é a
presença de eritemas. Os mais graves e raros são: necrólise epidérmica tóxica,
síndrome de Steves-Johnson e dermatite esfoliativa (BRUNTON et al., 2010).
Este capítulo teve como foco principal os antibióticos, os AINEs e os
anticonvulsivantes. No entanto, é importante ressaltar que outros fárma-
cos de diferentes classes podem causar algum tipo de reação cutânea. No
Quadro 3, estão listadas diferentes lesões cutâneas relacionadas a diferentes
medicamentos (BRUNTON et al., 2010):

Quadro 3. Lesões cutâneas relacionadas a diferentes medicamentos

Tipos de lesões cutâneas Medicamentos

Necrólise epidérmica tóxica  Antibióticos: sulfonamidas e associações


 Anticonvulsivantes: fenobarbital, fenitoína e
carbamazepina
 Anti-inflamatórios não esteroidais: alopurinol
 Paracetamol

Síndrome de  Antibióticos: sulfonamidas e associações


hipersensibilidade  Anticonvulsivantes: fenobarbital, fenitoína e
a fármacos carbamazepina
 Anti-inflamatórios não esteroidais: alopurinol
 Outros: minociclina, lamotrigina, ranitidina e
diltiazem

Eritema pigmentado fixo  Antibióticos: sulfamidas e tetraciclinas


 Anti-inflamatórios não esteroidais
 Barbitúricos

Fonte: Adaptado de Brunton (2010).

(Continua)
Fármacos e eritema 15

(Continuação)

Quadro 3. Lesões cutâneas relacionadas a diferentes medicamentos

Tipos de lesões cutâneas Medicamentos

Pustulose exantemática  Antibióticos: β-lactâmicos e macrolídeos


aguda generalizada  Anticonvulsivantes: carbamazepina
 Antagonistas de canais de cálcio

Eritema multiforme  Antibióticos: sulfonamidas e β-lactâmicos


(penicilina)
 Anticonvulsivantes: fenitoína
 Anti-inflamatórios não esteroidais:
fenilbutazona

Vasculite  Antibióticos: β-lactâmicos


 Anticonvulsivantes: fenitoína
 Anti-inflamatórios não esteroidais: alopurinol
 Diuréticos: tiazidas

Erupções vesículo-bolhosas  Antibióticos: sulfonamidas e β-lactâmicos


(penicilina), ácido nalidíxico
 Diuréticos: furosemida
 Clonidina (agonista adrenérgico de ação
direta do receptor adrenérgico α2)

Reações liquenoides  Anticonvulsivantes: carbamazepina


 Outros: antimaláricos, diuréticos,
bloqueadores dos canais de cálcio e metais
pesados

Alteração da pigmentação  Anticonvulsivantes: derivados da hidantoína


 Antibióticos: clofazimina
 Antimaláricos
 Contraceptivos orais
 Hormônio adrenocorticotrófico exógeno

Reações de  Antibióticos: dimetilclortetraciclina e ácido


fotossensibilidade nalidíxico, sulfonamidas
 Antidepressivos: protriptilina
 Antiarrítmicos: amiodarona
 Anti-inflamatórios não esteroidais:
azapropazona, piroxicam
 Antipsicótico: cloropromazina
 Diuréticos: tiazidas

(Continua)
16 Fármacos e eritema

(Continuação)

Quadro 3. Lesões cutâneas relacionadas a diferentes medicamentos

Tipos de lesões cutâneas Medicamentos

Urticária  Antibióticos: β-lactâmicos


 Anti-inflamatórios não esteroidais: ácido
acetilsalicílico

Eritema maculopapular  Antibióticos: β-lactâmicos


(áreas vermelhas com
pápulas pequenas)

Fonte: Adaptado de Brunton (2010).

A exposição à radiação ultravioleta pode intensificar os eritemas causados por alguns


medicamentos, tornando-se indispensável a fotoproteção. A radiação UVA apresenta
maior capacidade de penetração na pele, sendo responsável por intensificar a vermelhi-
dão e o escurecimento da pele. Portanto, como nem sempre é viável suspender o uso
de certos medicamentos, é essencial proteger a pele da luz solar (SILVARES et al., 2008).

BRUNTON, L. L. et al. (ed.). Goodman & Gilman: as bases farmacológicas da terapêutica.


11. ed. Porto Alegre: AMGH, 2010.
CAETANO, R. Dessensibilização nos casos confirmados de hipersensibilidade à penicilina:
algumas notas. Boletim Fármaco Terapêutica, p. 10-13, 2013. Disponível em: http://www.
revistas.cff.org.br/?journal=boletimfarmacoterapeutica&page=article&op=viewFile&
path[]=1135&path[]=887. Acesso em: 7 fev. 2020.
KATZUNG, B. G.; Farmacologia básica e clínica. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2005.
LÜLLMANN, H.: MOHR, K.; HEIN, L. Farmacologia: texto e atlas. 6. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2010.
Fármacos e eritema 17

MONTEIRO, E. C. A. et al. Os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs). Temas de reu-


matologia clínica. v. 9, n. 2, p. 53-63, 2008
RANG, H. P. et al. Farmacologia. 7. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.
SILVARES, M. R. C. et al. Reações cutâneas desencadeadas por drogas. Anais Brasileiros
de Dermatologia, v. 83, n. 3, p. 227-232, 2008.

Leituras recomendadas
ENSINA, L. F. et al. Reações de hipersensibilidade a medicamentos. Revista Brasileira de
Alergia e Imunopatologia, v. 32, n. 2, p. 42-47, 2009.
MONTEIRO, E. C. A. et al. Os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs). Temas De Reu-
matologia Clínica, v. 9, n. 2, p. 5-63, 2008.

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