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BASES

FARMACOLÓGICAS
E INTERAÇÕES
MEDICAMENTOSAS
NA ESTÉTICA

Patricia Garcia Ferreira


Fármacos e coagulação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Listar as classes de medicamentos que causam distúrbios na


coagulação.
 Descrever o mecanismo de ação dos fármacos anticoagulantes.
 Identificar o mecanismo de ação dos fármacos antiplaquetários.

Introdução
Neste capítulo, você vai compreender os fármacos que atuam na cascata
de coagulação, nas plaquetas e na fibrinólise, que são de extrema impor-
tância na clínica médica. Adicionalmente, você vai estudar os medica-
mentos de diferentes classes farmacológicas que causam distúrbios na
coagulação sanguínea e que podem alterar a hemostasia.

1 Medicamentos e distúrbios da coagulação


A hemostasia consiste em um processo fisiológico que promove a integri-
dade vascular e a circulação do sangue, sendo capaz, a partir de mecanismos
moleculares, de realizar a manutenção da fluidez do sangue para a perfusão
adequada dos órgãos e dos tecidos e o reparo de lesões. Esses mecanismos
envolvem respostas fisiológicas como vasoconstrição, vasodilatação, respostas
celulares (endotélio, plaquetas e hemácias) e interações bioquímicas (fatores de
coagulação, anticoagulação e fibrinólise), conforme lecionam Rang et al. (2012).
A formação desnecessária de um coágulo intravascular poderá causar
danos como:

 infarto do miocárdio, caso esse coágulo se forme na artéria coronária;


 trombo formado em uma artéria profunda, caso haja rompimento e seja
carreado para uma artéria pulmonar, ocasionando embolia pulmonar; e
2 Fármacos e coagulação

 acidente vascular cerebral (AVC), a partir de trombos que podem ocorrer


na fibrilação atrial e que, caso sejam desprendidos, podem alcançar
artérias cerebrais.

É importante ressaltar que a fisiologia humana possui mecanismos anti-


coagulantes naturais. O organismo humano possui mecanismos reguladores
responsáveis por impedir a formação da trombose. Porém, isso requer um
endotélio vascular íntegro, isto é, sem patologias. Pode-se destacar alguns
reguladores (RANG et al., 2012):

 a prostaciclina, que é sintetizada por células endoteliais e inibe a agre-


gação e secreção plaquetária;
 a antitrombina, uma proteína plasmática que inibe os fatores de coagu-
lação das vias intrínsecas da cascata de coagulação; e
 os proteoglicanos do sulfato de heparina, que são sintetizados por células
endoteliais e estimulam a atividade da antitrombina.

Os fármacos anticoagulantes e antiplaquetários (Figura 1) atuam em di-


ferentes etapas na cascata de coagulação. Os anticoagulantes podem ser inje-
táveis (heparina) e orais (varfarina). Os antiplaquetários são classificados de
acordo com o mecanismo de ação. Os fármacos mais usuais na clínica médica
são: aspirina, dipiridamol, clopidogrel, abciximabe, tirofibana e eptifibatida
(LÜLLMANN; MOHR; HEIN, 2010). Os fibrinolíticos (estreptoquinase,
alteplase e tenecteplase) atuam na lise da fibrina.

Fármacos e coagulação Fibrinolíticos

Anticoagulantes Antiplaquetários
Estreptoquinase
Alteplase
Tenecteplase
Injetáveis Orais
Aspirina
Dipiridamol
Clopidogrel
Heparina Inibidores direto da Varfarina Abciximabe
trombina Tirofibana
Eptifibatida
Heparina Heparina
de baixo não
peso fracionada
molecular
Lepirudina
Bivalirudina

Figura 1. Esquema representativo das três principais classes farmacológicas que atuam
na coagulação sanguínea.
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Vitamina K
A vitamina K é lipossolúvel e essencial para a formação dos fatores de coa-
gulação, principalmente os fatores II, VII, IX e X. Ocorre naturalmente em
vegetais e também é formada no intestino. A administração da vitamina K
é realizada por via oral — porém, necessita de sais biliares para a absorção
— ou parenteral. O mercado farmacêutico disponibiliza o fosfato sódico de
menadiol, um composto sintético hidrossolúvel, que, portanto, não requer sais
biliares para a absorção. Entretanto, esse composto possui um início de ação
mais demorado (LÜLLMANN; MOHR; HEIN, 2010).
É importante ressaltar que a vitamina K é metabolizada rapidamente e
eliminada na urina e na bile, sendo que o seu estoque no organismo é mí-
nimo. Segundo Lüllmann, Mohr e Hein (2010), os principais usos clínicos da
vitamina K são:

 prevenção e tratamento de sangramento, por exemplo, pelo uso excessivo


de anticoagulantes orais;
 deficiências de vitamina K.

Os recém-nascidos são mais suscetíveis à doença hemorrágica causada pela ausência


de vitamina K, uma vez que apresentam níveis mínimos dos fatores de coagulação,
as reservas de vitamina K são baixas, além de terem um aporte pequeno quando
alimentados com o leite materno. A fim de prevenir a doença hemorrágica do recém-
-nascido, algumas crianças necessitam da suplementação de vitamina K, por via
intramuscular. Em casos graves, utiliza-se a via intravenosa. Já é recomendada em
alguns países a administração de vitamina K profilática intramuscular ou oral, conforme
lecionam Vaz et al. (2017).
Leia mais sobre esse assunto no link a seguir.

https://qrgo.page.link/xMsbf
4 Fármacos e coagulação

Distúrbios da coagulação
A fase celular da coagulação é caracterizada pela ativação plaquetária em
resposta a qualquer dano vascular. Após uma lesão vascular, o sistema de
coagulação é ativado, ocorrendo inicialmente a vasoconstrição local e, conse-
quentemente, a redução do fluxo sanguíneo. Então, ocorre a adesão plaquetária,
isto é, as plaquetas circulantes e as moléculas de fibrina vão formar um tampão
plaquetário, que, por sua vez, vai fechar a lesão e interromper o sangramento. A
adesão plaquetária resulta da ligação do complexo de superfície glicoproteína
presente nas plaquetas ao fator de von Willebrand (FVW), presente no suben-
dotélio vascular. Por último, ocorre a etapa denominada fase plasmática, que
resulta na geração de trombina e na formação da fibrina (proteína que fixa o
tampão plaquetário). Posteriormente, o coágulo de fibrina será digerido pela
plasmina (proteína ativa do sistema fibrinolítico endógeno).
É importante destacar que a plasmina é uma protease inespecífica, ou
seja, digere tanto os coágulos de fibrina quanto outras proteínas plasmáticas
(por exemplo, proteínas envolvidas na cascata de coagulação). Portanto, o
tratamento com fármacos trombolíticos é capaz de dissolver trombos patoló-
gicos e, também, depósitos de fibrina em locais de lesão vascular, induzindo
hemorragias (RANG et al., 2012).
Os fármacos fibrinolíticos atuam no plasminogênio, convertendo-o em
plasmina, que, por sua vez, possui ação lítica (de quebra) sobre a fibrina,
sendo, então, capazes de desfazer o trombo. Os fibrinolíticos são classifi-
cados de acordo com a especificidade à fibrina e a sua geração. O fármaco
fibrinolítico de primeira geração é a estreptoquinase, capaz de ativar (con-
verter) o plasminogênio circulante e ligado à molécula de fibrina. No entanto,
esse fármaco não é específico e atua em diferentes fatores de coagulação.
O fármaco de segunda geração é a alteplase, molécula de síntese genética e
fibrino-específica. O fármaco de terceira geração é a tenecteplase, que é um
fármaco aprimorado da molécula da alteplase, resultando em um fármaco com
maior tempo de meia-vida e com maior especificidade à fibrina (BARUZZI;
STEFANNI; MANZO, 2018).
Alguns fármacos das mais diversas classes possuem como efeitos adversos
o potencial de causar alterações na coagulação, entre elas, as hemorragias
(RANG et al., 2012). No Quadro 1, destacam-se os principais fármacos e
as classes que atuam nas plaquetas e são capazes de aumentar o tempo de
sangramento e, com isso, ocasionar distúrbios na coagulação.
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Quadro 1. Fármacos que causam alargamento do tempo de sangramento

Fármacos que alargam o


tempo de sangramento Classe farmacológica

Aspirina Anti-inflamatório não esteroidal

Dipiridamol Antitrombótico

Indometacina Anti-inflamatório não esteroidal

Penicilinas Antibiótico

Clorpromazina Antipsicótico

Hidroxicloroquina Antimalárico

Fenilbutazona Anti-inflamatório não salicilato

Nitrofurantoína Antibiótico

Antidepressivos tricíclicos (imipramina, Antidepressivo


amitriptilina e clomipramina)

Fonte: Adaptado de Rang et al. (2012).

Os eventos tromboembolísticos, como a trombose venosa profunda, podem


ser classificados nos dois tipos descritos a seguir (SOUSA; ÁLVARES, 2018).

1. Hereditários/idiopáticos: entre eles, estão a resistência à proteína C


ativada, a mutação do gene da protrombina G20210A, a deficiência
de antitrombina, a deficiência de proteína C, a deficiência de proteína
S, a hiperhomocisteinemia, o aumento do fator VIII e o aumento do
fibrinogênio.
2. Adquiridos/provocados: como síndrome do anticorpo antifosfolipídio,
câncer, idade > 65 anos, obesidade, gravidez, puerpério, síndrome
nefrótica, trauma, cirurgias, imobilização e terapia estrogênica.

Os eventos tromboembolísticos também podem acontecer como reações


adversas a alguns medicamentos, sendo bastante relatados na terapia estro-
gênica. Dentro desse contexto, estudos comprovam que estrogênio e proges-
terona, presentes em alguns contraceptivos, podem desencadear alterações
significativas na homeostase, devido à ação androgênica, podendo ocasionar
a formação de fibrina, que pode progredir para a formação de coágulos.
Portanto, o uso contínuo de anticoncepcionais deve ser analisado com cautela,
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sempre por um profissional ginecologista, a fim de obter a opção que ofereça


o melhor benefício com o menor risco possível (SOUSA; ÁLVARES, 2018).
Os anticoncepcionais orais podem ser classificados de acordo com a dose
de estrogênio (SOUSA; ÁLVARES, 2018), conforme descrito a seguir.

 Primeira geração: 0,150 mg de etinilestradiol.


 Segunda geração: 0,050 mg de etinilestradiol.
 Terceira geração: 0,030 mg de etinilestradiol.
 Quarta geração: 0,020 mg de etinilestradiol.

Adicionalmente, podem ser classificados de acordo com a sua composição


(SOUSA; ÁLVARES, 2018).

 Monofásico: mesma composição, com etinilestradiol e um progestágeno


na mesma dose.
 Bifásico: mesma composição, porém, as doses são divididas em dois
blocos distintos.
 Trifásico: mesma composição, porém, as doses são divididas em três
blocos distintos.

2 Fármacos anticoagulantes
Os fármacos anticoagulantes são caracterizados por sua atuação na cascata
de coagulação em duas situações: na coagulação indesejada e nos distúrbios
na cascata de coagulação. O distúrbio na cascata de coagulação é incomum e
pode ser originado por deficiências genéticas de fatores de coagulação. Nesse
contexto, destaca-se a hemofilia clássica, devido à ausência do fator VIII.
Em contrapartida, os distúrbios adquiridos ocorrem com maior frequência
e compreendem: deficiência de vitamina K, excesso de anticoagulante oral,
doença hepática, entre outros (RANG et al., 2012).

Anticoagulantes injetáveis
Os anticoagulantes injetáveis são heparina e novos inibidores de trombina. A
heparina e os novos inibidores de trombina possuem ação imediata.
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Heparina

As moléculas de heparina são cadeias de aminoaçúcares que contêm grupos −


COO- e − SO3-. A heparina é um glicosaminoglicano encontrado nos grânulos
secretórios dos mastócitos, e sua origem é dada pela extração da mucosa
intestinal suína ou do pulmão de bovinos. As numerosas cargas negativas
auxiliam para a formação do complexo com a antitrombina III, que é a base
do efeito anticoagulante, e conferem baixa permeabilidade pelas membranas
biológicas, obrigando o seu uso parenteral (via intravenosa ou subcutânea)
(BRUNTON et al., 2010).
A antitrombina III é uma glicoproteína circulante sintetizada no fígado,
responsável por inibir fatores de coagulação ativados das vias intrínsecas e
comum da coagulação, como trombina, Xa e IXa. A heparina inibe a coagu-
lação, acelerando a ligação da antitrombina ao fator de coagulação em pelo
menos mil vezes. A ligação da heparina induz uma alteração conformacional
na antitrombina, resultando em uma maior reatividade à protease. Para inibir
a trombina, é essencial a formação da ligação heparina-fator Xa e heparina-
-antitrombina III, simultaneamente (BRUNTON et al., 2010).
As heparinas podem ser classificadas em dois tipos: de baixo peso molecular
e não fracionada. As heparinas de baixo peso molecular são pequenas para
realizar simultaneamente a ligação heparina-fator Xa e heparina-antitrombina
III. Logo, só potencializam a ação da antitrombina III sobre o fator Xa, ao
contrário da heparina não fracionada, suficientemente grande para interagir
com ambas as sustâncias (fator Xa e antitrombina III) (BRUNTON et al., 2010).
As heparinas de baixo peso molecular são administradas por via subcutânea
e possuem uma meia-vida de eliminação longa. Dessa forma, os intervalos
entre as doses são maiores, e os efeitos, mais previsíveis. Em contrapartida,
a heparina não fracionada age imediatamente após o uso, uma vez que a sua
administração é intravenosa e a sua meia-vida de eliminação é rápida (40–90
min). Sendo assim, é mais utilizada em casos de urgência (RANG et al., 2012).
O principal efeito adverso é a hemorragia, o qual é tratado com a interrup-
ção da heparina. Caso seja necessário, é administrado sulfato de protamina,
antagonista da heparina, administrado por via intravenosa. O seu mecanismo
de ação é baseado na inativação da heparina, dada pela formação de um
complexo (RANG et al., 2012).
8 Fármacos e coagulação

Inibidores diretos da trombina

Inibidoras diretas da trombina, as hirudinas não dependem da ativação da


antitrombina, sendo essa a sua principal diferença em relação às heparinas. O
mecanismo de ação dessa classe é dado por meio de uma ligação irreversível
com a trombina, em ambos os sítios — ou seja, no sítio catalítico e no sítio
ligante de fibrina.
Os inibidores diretos da trombina administrados por via intravenosa são
a lepirudina e a bivalirudina, descritas a seguir.

 Lepirudina: a sua dose é ajustada de acordo com o tempo de protrombina.


Pode causar sangramento e reações de hipersensibilidade (RANG et
al., 2012).
 Bivalirudina: é utilizada em pacientes submetidos a intervenções coro-
narianas. O tratamento é iniciado em bolo e, em seguida, com infusão
até 4 horas após o procedimento cirúrgico. Pode causar sangramento
e reações de hipersensibilidade (RANG et al., 2012).

Anticoagulantes orais
O anticoagulante oral mais importante é a varfarina, antagonista da vitamina
K, muito utilizada na profilaxia de doenças tromboembólicas. A varfarina
possui ação não imediata, ou seja, requer alguns dias para iniciar o efeito.
Dessa forma, em alguns casos, é necessária a administração de um fármaco
de ação imediata, inicialmente.
O mecanismo de ação anticoagulante da varfarina funciona por meio da
interferência na regeneração da vitamina K, a partir da inibição de redutases,
particularmente, a enzima vitamina K epóxido-redutase. Isso resulta na inibição
da γ-carboxilação dos fatores de coagulação dependentes de vitamina K e de
alguns inibidores fisiológicos da coagulação sanguínea. A hidroquinona, isto
é, a vitamina K na forma reduzida, é cofator da enzima γ-glutamil carboxilase
(o sistema da γ-carboxilação é responsável pela carboxilação dos fatores de
coagulação, deixando estes funcionais). A interferência da varfarina conduz
a conversão da vitamina K na forma reduzida (ativa) para sua forma oxidada
(inativa) (KATZUNG, 2005). A Figura 2 mostra o mecanismo de ação da
varfarina.
Fármacos e coagulação 9

Forma ativa VARFARINA

Vitamina K
reduzida
Forma inativa

Vitamina K
oxidada

Fatores de Fatores de
coagulação Carboxilação coagulação
hipofuncional funcional

Enzima Y-glutamil
carboxílase

Figura 2. Mecanismo de ação da varfarina. A varfarina interfere no ciclo da vitamina K,


inibindo a redução da vitamina K (forma ativa), resultando na inibição da carboxilação dos
fatores de coagulação.

A varfarina é monitorada pelo tempo de protrombina (TP), expresso por uma relação
normalizada internacional. O TP é o tempo necessário para coagular o sangue após a
adição de cálcio e tromboplastina (padrões de referências). Os indivíduos que fazem
uso de anticoagulantes orais tendem a ter o TP aumentado. Quanto maior o TP, mais
o sangue está anticoagulado. Na maioria das indicações, o TP está entre 2 e 3 (RANG
et al., 2012; DANTAS et al., 2013).
Para saber mais, leia o artigo disponível no link a seguir.

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10 Fármacos e coagulação

Em relação aos aspectos farmacocinéticos da varfarina, após a administração


oral, ela é absorvida de forma rápida e completa no intestino. O seu volume de
distribuição é mínimo, uma vez que se encontra fortemente ligada à albumina.
O pico de concentração não coincide com o pico farmacológico, visto que, em
aproximadamente 1 hora, a sua concentração é máxima, e o efeito farmacoló-
gico só ocorre após 48 horas. É metabolizada pela CYP2C, e a sua meia-vida
é variável — em torno de 40 horas, na maioria dos indivíduos. Na gravidez, a
varfarina atravessa a barreira placentária. Além disso, é teratogênica; logo, não
é administrada no início da gravidez. Pode causar hemorragia intracraniana no
feto durante o parto; logo, também não é administrada no final da gestação.
Também é passada para o bebê pela amamentação (RANG et al., 2012).

A classe farmacológica dos anticoagulantes é responsável por inúmeras interações


medicamentosas, de forma a potencializar a ação anticoagulante, contribuindo signi-
ficativamente para a morbidade e a mortalidade. Nessa classe, destaca-se a varfarina,
um anticoagulante de uso oral; os principais fármacos responsáveis pela interação
são os antidepressivos, com destaque para a paroxetina, a venlafaxina, a fluoxetina e
a duloxetina, em ordem decrescente (TELES; FUKUDA; FEDER, 2012).

3 Fármacos antiplaquetários
Os fármacos antiplaquetários, isto é, que inibem a função plaquetária, desem-
penham um papel fundamental no tratamento de doenças tromboembólicas.

Aspirina (ácido acetilsalicílico)


A aspirina é um anti-inflamatório não esteroidal, que, em dose baixa, inibe a
síntese de tromboxanos A2, mediadores endógenos responsáveis pela agregação
plaquetária. A inibição ocorre devido à acetilação irreversível no sítio catalítico
da enzima ciclo-oxigenase 1 (COX-1), inibindo a formação de prostaglandinas
(PGE2, PGD2, PGF2α) e tromboxano A2 (Figura 3). Os efeitos adversos são
principalmente no trato gastrointestinal, porém, relacionados com a dose
(KATZUNG, 2005).
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Ácido aracdônico

COX-1 Acetilação
COX-2 irreversível

Prostaciclina Tromboxano A2
PGE2

PGD2 PGF2α

Figura 3. Via de ação da aspirina, indicando as suas propriedades analgésicas, antitérmicas


e anti-inflamatórias.

A aspirina possui absorção rápida após a administração oral, com pico de


concentração plasmática em aproximadamente 30 minutos. O efeito inibitório
plaquetário é significativo, em torno de 60 minutos após a ingestão. Após a
absorção, ela é convertida em ácido salicílico, principal metabólito ativo. Sua
meia-vida plasmática é de aproximadamente 20 minutos (KATZUNG, 2005).

O ácido acetilsalicílico é recomendado regularmente por profissionais da clínica


médica para prevenção de trombos e para tratamento de coágulos formados. A
farmacodinâmica da aspirina é dada primeiramente pela inativação da COX-1, a partir
da acetilação de forma irreversível da prostaglandina sintase, enzima responsável por
catalisar a síntese de prostaglandinas. Dessa forma, a administração de aspirina resulta
na inibição da síntese de prostaglandinas, associada a dor, febre e inflamação. A ação
antiplaquetária da aspirina está relacionada com a inibição da COX-1, resultando no
bloqueio da conversão do ácido aracdônico em tromboxanos A2, que, por sua vez,
têm ação de induzir a agregação plaquetária e a vasoconstrição.
Portanto, a aspirina tem sido utilizada na prática clínica para a prevenção secundária
de eventos cardíacos, e, de forma geral, benefícios são observados. No entanto, vale
ressaltar que o seu uso deve ser criteriosamente avaliado por um profissional habilitado
(BRUNTON et al., 2010; RANG et al., 2012).
12 Fármacos e coagulação

Dipiridamol
O dipiridamol possui ação plaquetária por ação em diferentes mecanismos,
conforme descrito a seguir.

 Inibição da fosfodiesterase. A família das enzimas fosfodiesterases


atua na hidrólise do monofosfato de guanosina cíclico e do monofosfato
de adenosina cíclico, que são mensageiros celulares responsáveis por
mediar respostas a diversos hormônios e neurotransmissores. Dessa
forma, são importantes por regularem diversos mecanismos fisiológicos
(KATZUNG, 2005).
 Bloqueio da captação de adenosina pelas hemácias.
 Inibição da síntese de tromboxanos A2.

Possui ação benéfica quando administrado concomitantemente com a aspi-


rina em pacientes com AVC ou isquemia cerebral transitória. Diferentemente
da aspirina, o dipiridamol não causa sangramentos (KATZUNG, 2005). Após
a administração oral, ele é rapidamente absorvido (10 a 15 minutos), e a sua
concentração plasmática máxima é de aproximadamente uma hora. Devido à
sua lipofilicidade, o dipiridamol é altamente distribuído em diversos órgãos.
O metabolismo ocorre no fígado, por conjugação com o ácido glicurônico, e
a meia-vida plasmática varia de duas a três horas (BRUNTON et al., 2010).

Antagonistas do receptor de adenosina (tienopiridinas)

O primeiro fármaco da classe das tienopiridinas introduzido no mercado


farmacêutico foi a ticlopidina. Entretanto, ela é responsável por causar neutro-
penia e trombocitopenia, logo, quase não é mais utilizada na clínica. Assim,
o principal agente dessa classe é o clopidogrel, uma vez que possui um perfil
de toxicidade menor relacionado à neutropenia e à trombocitopenia.
O clopidogrel é um pró-fármaco, isto é, é convertido em seu metabólito
ativo pelas enzimas CYP no fígado. Possui ação sinérgica com a aspirina
(KATZUNG, 2005). O seu mecanismo de ação é a inibição da agregação
plaquetária induzida pela adenosina difosfato. É um fármaco que possui rápida
absorção e é extensamente metabolizado no fígado em um derivado do ácido
carboxílico. A eliminação é de aproximadamente 50% na urina e 46% nas
fezes, no intervalo de 120 horas após a dose (BRUNTON et al., 2010).
Fármacos e coagulação 13

Antagonistas do receptor da glicoproteína IIB/IIIA

A glicoproteína é um receptor do fibrinogênio e do FVW, responsáveis pela


fixação das plaquetas entre si, resultando na agregação plaquetária. Os anta-
gonistas do receptor da glicoproteína IIB/IIIA bloqueiam a via final comum
da agregação e adesão plaquetária (KATZUNG, 2005). Os receptores podem
ser bloqueados ou antagonizados por vários fármacos, como os descritos a
seguir (BRUNTON et al., 2010).

 Abciximabe — anticorpo monoclonal. Principal indicação: intervenção


coronariana percutânea.
 Tirofibana — não peptídico. Principal indicação: síndromes corona-
rianas agudas.
 Eptifibatida — heptapeptídeo sintético. Principal indicação: intervenção
coronariana percutânea e síndromes coronarianas agudas.

Esses fármacos são administrados por via intravenosa. O resumo de seus


aspectos farmacocinéticos é apresentado no Quadro 2 a seguir, com base em
Afonso et al. (2016).

Quadro 2. Aspectos farmacocinéticos dos antagonistas do receptor da glicoproteína IIB/IIIA

Restauração
Dose de Dose de Tempo de da função
Fármacos carga manutenção meia vida plaquetária Clearance

Abciximabe 0,25 mg/kg 0,125 mg/ 10–15 min 12 h Ligação às


kg/min plaquetas,
degradação
da protease

Tirofibana 0,4 µg/kg 0,2 µg/kg/min 2h 2–4 h Renal e biliar

Eptifibatida 180 µg/kg 0,2 µg/kg/min 2,5 h 2–4 h Renal

Fonte: Adaptado de Afonso et al. (2016).


14 Fármacos e coagulação

AFONSO, A. et al. A terapêutica antitrombótica: atual e em desenvolvimento. Angiologia


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DANTAS, A. G. et al. Controle da anticoagulação com varfarina realizada em ambulatório
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KATZUNG, B. G.; Farmacologia básica e clínica. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
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