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Última entrevista de Savimbi

Estamos prontos para o diálogo(..) pois não haverá paz nem eleições, sem a UNITA?

O Presidente da UNITA, Jonas Savimbi, rompeu hoje um silêncio de 18 meses, parar


afirmar que é urgente promover a reconciliação. 

Aparentemente animado pelo que chama de ?debate que está a ter lugar em Angola?,
Savimbi telefonou à Voz da América para dizer que a UNITA está ao lado de todos aqueles
que têm levantado os grandes problemas: ?Os jornalistas, os religiosos, os políticos ou
mesmo os cidadãos comuns?. Ainda assim , Savimbi entende que não se pode fazer o
debate pelo debate. ?As discussões têm que produzir um formato para o diálogo? . Com
Paulo Lukamba Gato, secretário geral da UNITA ao seu lado, Savimbi disse que a
reconciliação é a prioridade dos nossos dias, porque Angola tem problemas muito sérios. 

Voz da América: Faz tempo que o senhor não falava. O que o levou a interromper o
silêncio? 

Jonas Savimbi: Queria encorajar aqueles que estão a organizar o debate sobre a paz em
Angola. Nós estamos totalmente solidários. O debate pode ser crítico, contraditório, nós
não somos contra esta posição, pelo contrário. Mas também queriamos encorajar os
partidos políticos da oposição, a Igreja, os jornalistas independentes, a sociedade civil, que
não deixemos os factos de lado para sermos frontais, e trabalharmos para um diálogo.
Que não seja o debate pelo debate. Que o debate tenha o objectivo de dar formato e
substância ao diálogo. A seguir tem-se que se trabalhar fortemente para a reconciliação
nacional. Angola vive ainda uma fractura profunda, pois considero, neste momento, que
temos um passivo muito grande, incluindo na Igreja, e este passivo tem de ser aceite, de
forma a pudermos um dia, quando for oportuno, debatermos este passivo. Fico muito
preocupado quando escuto nos fóruns da Igreja, ou na casa que faz a lei ,que é o
parlamento, termos como ?matumbismo,? ?matumbos,? porque concerteza que isso não
cria a tal abertura, a tal disposição, mas torna a situação mais acirrada. Gostariamos que
entrassemos para a fase da reconciliação nacional, em paz, com maior calma, com
disposição para aceitarmos que nos apontem os erros.Que os angolanos deixem de pensar
em angolanos de primeira e de segunda. 

VOA: Dr.Savimbi, parte daquilo que pode ser a reconciliação dos angolanos depende
daquilo que a UNITA vier a fazer, daquilo que o senhor vier a fazer. O senhor não falava,
pelo menos à Voz da América há muito tempo. As coisas mudaram substancialmente
desde a última vez que o fez, do Andulo se a memória não me atraiçoa. A UNITA perdeu o
Bailundo, perdeu o Andulo, perdeu uma série de posições. Hoje, que proposta concreta
pode fazer a bem da reconciliação dos angolanos? 

JS: O diálogo! Nós somos pelo diálogo, e estamos de acordo que se organize e que se
estruture este diálogo. Também eu queria que os angolanos não se esquecessem que
podemos aproveitar a conjuntura internacional.Os americanos começam a pensar
também que o diálogo é a via para a solução do conflicto. Sermos parte disto tudo. 

VOA: Há aqui uma questão concreta. Nas últimas semanas, o governo respondeu de
alguma forma ao que vem acontecendo com o lançamento do Fundo para a Paz e
Reconciliação. O senhor tem as suas fontes, ouve as rádios, sabe o que se está a passar,
está a UNITA, está o senhor disposto a abraçar aquilo que o governo oferece neste Fundo
para a Paz e Reconciliação Nacional? 

JS: Não.... Até porque o Filomeno Vieira Lopes respondeu dizendo que aquele fundo não
era para a paz. Que era o Fundo para os rendidos e para os fugidos das fileiras da UNITA.
Não está ali a resposta. A resposta está na nossa própria história. Quando falo do passivo
pesado, estou a falar de como é que fizemos os acordos, e quais foram as garantias. Tudo
para não repetirmos o mesmo caminho. 

VOA: Suponho que o senhor tem reparado do lado do governo uma incidência na questão
da validade do acordo, numa disponibilidade até para se conversar com a UNITA, se a
UNITA se desarmar. Como é que o senhor toma todas essas afirmações? 

JS: Com muita prudência. Porque se fomos penalizados pelas sanções até aqui, é porque
se dizia que nós nos armamos contra o protocolo, mas a verdade hoje é o que se esta a
ver com o ?Angolagte? em Paris, isto é 93-94 o governo estava a comprar armas. Não era
preciso o ?Angolagate? porque os nossos representantes em Luanda nos dizam
constantemente que o MPLA estava a comprar armas. Desarmar-se e apresentar-se já
muitos fizeram e a situação não tem mudado. Do lado do governo, ou do regime,
continuam a enviar indivíduos para capturarem, para matarem, portanto o que dizem
dum lado, desdizem pela acção prática. 

VOA: Em todo o caso, o Fundo pode ser o ponto de partida para um entendimento. Não
pode? 

JS: Precisamos do dinheiro para darmos às populações cativas, que são capturadas todos
os dias, e que se encontram nos municípios, nas comunas, e que não têm condições
nenhumas. Porque é que vão dar aos políticos, e não dão às populações? Nós estamos
com a mão estendida à caridade internacional! 

VOA: Isso será um caso para se ver mais adiante. Há outras questões concretas que são
abordadas no âmbito do Fundo. É a questão da reconciliação em si, do desarmamento, do
diálogo e a questão da amnistia. 

JS: Bom a amnistia...esta amnistia está discutida...nós estamos a seguir...mesmo os


partidos políticos da oposição que se encontram em Luanda, discordam com esse
procedimento. O regime aceite uma abertura real e demos os passos para que a situação
seja decantada, as pessoas possam participar, senão tem um Fundo, têm um nome, mas
nós não temos a paz. E o perigo é: que não queremos a paz em Angola sem a UNITA, não
queremos eleições em 2002. E por exemplo, os americanos que agora pensam no diálogo,
podem de uma forma ou de outra decepcionados e abandonam a partida. 

VOA: Suponho que o Dr.Savimbi ouviu o Ministro do Interior, Dias dos Santos Nandó,
falar, digamos, de uma condição que seria um cessar-fogo unilateral da UNITA. O senhor
alguma vez pensou nessa hipótese como um gesto de boa von tade? 

JS: Bom vejam como é que se pode fazer isso...Hoje se decidi falar para si, para a Voz da
América, é porque tenho uma relativa segurança, mas custou-me quase dois anos. Não
temos acesso fácil sem precauções, e também não teria vontade de reconciliação se o
regime fosse a ditar o que temos que fazer. Comecemos, falemos, restabelecemos os
contactos. Porque não fomos nós que rompemos os contactos, foi o regime. Quando
forem restabelecidos, mesmo com as Nações Unidas -- foram elas que aplicaram as
sanções -- nós estamos dispostos a retomar os contactos e começarmos outra vez a
prever passos subsequentes. 

VOA: O Dr.Savimbi e a UNITA iniciaram alguma diligência com vista ao restabelecimento


dos contactos com o governo? 

JS: Sim senhora. Num momento dado instruímos os nossos representantes no exterior, -
quando nós fomos surpreendidos pela proposta do embaixador Gambari- para que nós
pudessemos chegarmos também ao governo. O embaixador Gambari sabe que a direcção
da UNITA deu instruções para que não retomassemos só o contacto com as Nações
Unidas, mas também com o próprio regime. Podemos ser críticos aqui e acolá, como toda
a gente é crítica, mas como disse no princípio, nós temos um passivo muito grande. Os
angolanos têm de ter coragem e vontade, nós estamos dispostos a restabelecer esse
contacto. 

VOA: Para além da instrução que deu aos seus representantes no exterior, houve algum
contacto com um terceiro governo, com uma terceira parte com vista ao estabelecimento
do diálogo com o governo de Angola? 

JS: Quero esperar que agora o ambiente melhore. É por isso que não podemos falar contra
tudo e contra todos. A opinião americana pode ajudar, a opinião europeia pode ajudar, a
opinião africana pode ajudar. Há países africanos que estão em contacto connosco, que
aceitam a nossa posição, que estão dispostos a aproximar o regime com esta mensagem.
Apenas tenho encontrado receios porque acham que o regime não está preparado para
falar connosco. Se der sinal que está, esses amigos vão-nos passar o recado. 

VOA: Dr.Savimbi, todas as instituições e governos que o senhor que o senhor referiu aqui ,
União Europeia, Nações Unidas, comunidade internacional,etc etce parecem estar de
acordo num ponto:qualquer que seja o caminho a seguir, a UNITA terá que se desarmar, e
a UNITA tem parecido irredutível neste ponto. 
JS: Não somos, não somos absolutamente. Entedamos: politicamente queremos fazer o
que? Mas isto passa por um diálogo. Fala-se de desarmamento, mas vamos para onde? É
por isso que nós temos que retomar o contacto, o diálogo, a consideração, para que os
angolanos se sintam à vontade na sua própria pátria. Eu não posso falar quando tenho um
mandato de captura. 

VOA: O governo diz que a Amnistia está em vigor. 

JS: Não é verdade. Agora mesmo há uma grande ofensiva nas áreas das Lundas, de
Malange etcetc. Mas o objectivo primário é apanharem o Savimbi. Isto não é sabido lá
fora. O governo quando der sinais que quer dialogar, sabe que nós podemos dialogar. 

VOA: O governo continua a fazer fé no Protocolo de Lusaka. O senhor também continua a


fazer fé no Protocolo de Lusaka? 

JS: O protocolo de Lusaka estava manco e hoje, de entre os representantes da UNITA no


exterior, estão aqueles que participaram na feitura do acordo. Potanto houve logro. Mas
se for como quadro de discussão pode servir. Mas esvaziou-se Lusaca quando o regime
procurou um outro parceiro. Hoje a bandeira da UNITA é reclamada por vários grupos.
Esvaziou-se! Mesmo assim se quadro for o espírito, podemos levá-lo mais adiante. 

VOA: Quando o senhor diz que a bandeira da UNITA é reclamada por vários grupos, creio
que se está a refeir a Eugénio Manuvakola e à Renovada. 

JS: Bom é isso que dizem. 

VOA: Em todo o caso, há um segmento da UNITA no parlamento, que não comunga das
posições de Eugénio Manuvakola, mas que também não perfilha de algumas posições, que
o senhor defende. 

JS: Concerteza. Mas que considero que a maior parte dos deputados da UNITA que estão
no parlamento, estão de acordo com o programa do Muangai. Porém estando em Luanda
podem recear um bocado aqui um bocado acolá. Na essência pugnam mais pelo nosso
programa, do que nós do que do programa do senhor que mencionou há instantes. 

VOA: Manuvakola é? Tem algum problema em repetir o nome? 

JS: Não tenho interesse. 

VOA: Em todo o caso esta descrição que fez para os deputados, também abrange Abel
Chivukuvuku? 

JS: Vejamos. O discurso do Abel tem sido muito difícil de interpretar aqui nas matas. Umas
vezes está com a Renovada, outras vezes não está, umas vezes está com a terceira via --
que eu considero que seria a pior aventura, porque a terceira via não teria pernas para
andar --.... e é difícil. Os dirigentes que estão comigo acham que cedo ou tarde o Abel será
do CRU. 

VOA: O que é o CRU? 

JS: É o comité Renovador, porque quando apareceu a Renovada, apareceu o CRU. 

VOA: Vejamos outra coisa Dr.Savimbi. Quando o senhor ouve os partidos, VOU usar uma
expressão sua ?os partidecos?, uma expressão que o senhor introduziu em 1992, quando
ouve organizações não governamentais fazerem o que fazem em Luanda, manifestações,
apelos, provocarem o debate, não lhe ocorre que, se a UNITA tivesse feito outras opções,
o senhor poderia estar em Luanda a participar deste tipo de debate? 

JS: Concerteza, mas não fomos nós que declaramos guerra ao regime. Foi o chefe do
regime que declarou a guerra à UNITA, a 5 de Dezembro de 1998. Logo, não tinhamos
uma outra escolha. Nós poderiamos continuar o debate, e talvez três, ou quatro meses
mais tarde, tivessemos conseguido uma plataforma que evitasse a guerra ao povo
angolano. Mas o regime não nos deu essa alternativa. 

VOA: Que opinião é que o senhor tem, e eu repito é expressão é sua, daquilo que os ?
partidecos? fazem em Luanda? Cresceram substancialmente? Qual é a sua opinião? 

JS: Eu não sei quem é que é autor da expressão. Insiste-se que fui eu...nao sei em todo o
caso, não penso que hajam partidos e partidecos. É verdade os partidos têm força
diferente, mas não é por isso que nós vamos chamar a um partido, partideco. até porque
em Angola há indivíduos que não fazem parte de nenhum partido, mas são patriotas
angolanos e nós nos batemos por eles. Em todo o caso , estariamos também associados a
eles, a fazer as manifestações que eles fazem, mas é preciso sabermos qual é o objectivo
final. Democratização do país. Mas o regime faz passar todos os seus programas por causa
da maioria parlamentar. Esta maioria parlamentar fez passar o orçamento geral do estado
sem a aprovação dos partidos. Vai fazer a revisão da Constituição, vai fazer a lei eleitoral,
há alguma coisa que nós temos que começar a rectificar agora para que não haja
ambiguidades, e depois responsabilidades. 

VOA: Dr.Savimbi falou aqui mais do que uma vez da posição norte-americana em relação
ao conflicto. É sua convicção que há alguma coisa de diferente entre aquilo que fazia a
admnistração democrata, e aquilo que faz a admnistração do presidente George W.Bush? 

JS: Absolutamente! Mesmo se for o princípio! A administração Clinton aceitava a guerra


como uma forma de acabar com a guerra. Desde que a administração Bush diga que o
diálogo deve ser a forma mais capaz de se atingir a paz, eu quero crer que a diferença é
monumental. 
VOA: Passemos às questões militares: a última vez que falou, o senhor disse textualmente
que ?o MPLA j?já não tinha capacidade de derrotar a UNITA.? O senhor disse também que
se atacassem o Andulo e o Bailundo, subiria mais bocadinho para lá de Catete. O que se
passou depois disso foi, digamos a queda em catadupa das principais posições. Afinal
como é que houve esse desiquilíbrio? 

JS: Nós tinhamos uma estratégia, e quando se desiquilibra um ponto na estratégia, é


muito difícil se recompôr. As tácticas reparam-se muito mais rapidamente. Também não
estamos muito longe de Luanda. Perdemos o Bailundo e o Andulo e ninguém pode dizer
que não foi com bastante mágoa. Mas, empurrados para a guerra, tivemos de refazer as
nossas vontades e as nossas estructuras, e agora estamos a 100kms a sul de Luanda,
estamos em toda a parte. Por isso, considero que perdemos os bastiões, mas ganhamos a
liberdade de movimento, porque agora, já não sabem qual é o alvo. O alvo é todo o país. 

VOA: Há dois anos o senhor podia dizer que estava a falar do Andulo ou do Bailundo. Hoje
não pode dizer de onde está a falar. 

JS: Absolutamente. Mas esta é uma vantagem, e não uma desvantagem. Já não podem
bombardear-me com a certeza de que já não estou lá. 

VOA: Correram nos últimos dois anos, notícias sobre a eminente captura do Presidente da
UNITA. Alguma vez sentiu que as FAA estivessem no seu encalço? 

JS: Como eu dizia, a ordem é oficial, e mantém-se, e nós temos contactos também nas
cidades, não estamos só nas matas. Portanto o que sefoi passando, é o seguinte: têm
força para capturarem e combaterem e capturarem as populações para as tais eleições-
eu considero as populações captivas- mas também há o objectivo permanente que é a
minha captura. Mas na verdade nunca estiveram perto! Porque senão teriam mais dados,
mas continua esta perseguição. Em todo o caso não estou muito preocupado. Depois de
um ano e mais, considero que nós encontrámos métodos capazes de evitarmos esta
catástrofe. 

VOA- Por outras palavras, o senhor está a dizer que do ponto de vista militar , não poderá
haver um desequilíbrio maior do aquele que se regista hoje? 

JS- Aboslutamente. O que se passou connosco, foi o pior. Agora as forças armadas da
UNITA estão a subir. Já não estámos a passar pelo trauma que vivems em 1998, 1998. 

VOA- Por falar em trauma, dois dos seus filhos foram parar a Luanda. Um, Araújo Sakaita,
a partir de Abidjan, e outro, Ulile, suponho que a partir de Lomé, mas levado pelo outro.
Como que o senhor, ai onde está, recebeu a notícia, ouviu os seus filhos falarem de si,
contra si, e contra o projecto da UNITA. JS- Até elementos não próximos da UNITA ou de
mim, e que são mesmo do MLPA, talvez mais radicais reprovaram a atitude. Utilizar as
crianças fazer a po?tica, isto é que é perigoso. A UNITA não faz isto. Talvez pudesse
molestar também alguém pelo mundo fora, mas não fazemos isto. E não o fazemos
porque isto não nos dignifica. Não se fala com crianças de 16 anos, até com um desprimor,
dizendo que este miúdo de 16 anos, agora é pai. Concerteza que nós sentimos que
estávamos a brincar com a dignidade do próprio angolano, com os nossos valores. É isto
que nós defendemos. Que o angolano seja a referência em tudo o que estamos a fazer. A
nossa cultura, para que neste mundo da globalização, tenhamos identidade própria. Esta
questão de capturar as crianças foi um mau passo dado pelo regime.. VOA- Por
conseguinte o senhor não considera, não valoriza, o que eles disseram.. JS- Até porque o
último, primeiro mandou uma mensagem para os meus parentes que se encontram no
exterior, a dizer uma coisa. Depois de trabalhado, disse outra coisa. Mas mesmo na sua
posição como angolano, e eu falo aqui de poucos grandes ricos..por causa do dinheiro- há
corrupção e não sou eu que o digo-, dizia por causa do dinheiro vamos perder os nossos
valores? Os nossos antanhos nunca nos ensinaram que utilizássemos crianças contra os
pais. Pelo contrário, ensinaram-nos a respeitar os pais, a idade, e a terra. 

VOA: Outra questão muito em voga há uns tempos, atrás foi o desparecimento, ou
provável morte do General Bock. Suponho que como eu, ouviu muitos desertores , alguns
dos quais da segurança da UNITA darem como certa a execução do General Bock. Apesar
das promessas que fez , a UNITA nunca esteve em condições, ou pelo menos não fez
esforços para provar que o General Bock estava vivo... 

JS: Eu penso que ele já falou uma vez consigo, creio que em 1999.. 

VOA: Foi antes de todos estes rumores. 

JS: Mas os rumores continuaram. Até ontem recebemos uma mensagem que dizia que o
General Bock e o General Numa estavam mortos. Isto não é verdade. E ele está-me a
escutar. Nós fizemos um debate aberto, sobre as circunstâncias,em que a nossa estratégia
bascula. Fizemo-lo em Novembro, Dezembro, Janeiro e Fevereiro do ano 2000, e
chegamos todos à conclusão que o general Bock acarretava maior responsabilidade nesta
mudança trágica da nossa estratégia. Como disse, ele está-me a escutar, e sabe que é
assim que nós pensamos. A partir daí , já não aceitamos que fizesse parte dos quadros
militares. O camarada Numa que estão associar ao desaparecimento do Bock, não teve
problemas connosco. É ele quem dirige as operações das forças armadas. Tudo isso é
propaganda. Cada um lança um bocadinho. Primeiro , eles próprios coibem-se de falar.
Sofrem de um certo isolamento, não falta um outro que em circunstância difícil repita que
o Bock é culpado disto ou daquilo. Logo, quando vem outra vez a terreiro e a voz está lá ,
os próprios não se sentem muito à vontade. 

VOA- É por esta razão que o general Bock não fala? JS- Ele não fala, porque é preciso
convencê-lo. Vi-o a última vez em Abril do ano passado, quando nos separamos. Ele
trabalhava, como trabalha com o Vice-Presidente. Nós descentralizamos a nossa direcção,
primeiro para pudermos ser mais eficazes, lá onde temos de rectificar o comportamento,
mas também para mantermos a situação da segurança. Isto não significa que aquele que
não fale tenha desparecido. Fala aquele que estiver junto do telefone, ou quem tiver uma
mensagem a passar. Este camarada tem problemas, os outros ainda apontam-lhe o dedo,
e ele não quer que se fale mais do caso dele. E eu simpatizo-me com ele. 

VOA: Até que ponto vai a sua responsabilidade em toda a estratégia na UNITA. Pessoas da
sua intimidade disseram por mais de uma vez, que não se faz nada na UNITA sem a sua
aquiescência ou melhor, sem a sua decisão. 

JS: Isto seria considerar-me como um ser super-humano, e isto não é verdade. 

VOA: Em todo o caso até onde vai a sua responsabilidade, em todas estas derrocadas que
a UNITA sofreu? 

JS: Não só derrocadas. Mas nós resistimos, a dificuldades émuito maiores do que aquilo
que as pessoas pensavam. Há um grupo de dirigentes que provou que se pode resistir ao
infortúnio, pois a vida não é feita só de rosas. E temos gente que nos apoia. Como é que
se ataca em Calomboloca, se eu não estou lá? Deve haver um responsável que decide em
toda a consciência e assume a responsabilidade. Logo, eu tenho uma parte das minhas
funções, mas os outros desempenham as suas funções. É assim que a UNITA se expande. 

VOA: Há muita dificuldade em entender porque é que a UNITA atinge muitos civis nos
seus ataques, sobretudo em Catete.. 

JS: Nós reprovamos esta atitude, porque o regime faz isto. Eles estão a evacuar as zonas
rurais, estão a mutilar. É isto que eu considero o passivo do regime. Quando os nossos
cometem as mesmas atrocidades, ou mesmo quando apanham padres e cometem
atentados contra a Igreja, somos os primeiros a reprovar, somos os primeiros a dizer a
eles, para que reponham a verdade sobre a nossa política, sobre o que é o angolano. 

VOA: Já não está do outro lado o general João de Matos com quem o senhor travou
algumas batalhas. Como foi que recebeu a notícia do seu afastamento? 

JS: Bom, se eu fosse a dizer que tive a pena, estaria a ser cínico, e eu não preciso de ser
cínico. Foi um general que se dedicou à construção das FAA e que fez a guerra pelo
MPLA...Os servidores do regime terminam sempre assim. 

Luis Costa 

Nota: A conserva terminou neste ponto, porque a qualidade do som caiu drasticamente .
Jonas Savimbi ainda voltou à linha três vezes, mas não havia condições para continuação
da gravação.  

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