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1.

(UNICAMP 2009) Leia, abaixo, a letra de uma canção de Chico Buarque inspirada no romance de José
de Alencar,

Iracema - uma lenda do Ceará:

Iracema voou

Iracema voou

Para a América

Leva roupa de lã

E anda lépida

Vê um filme de quando em vez

Não domina o idioma inglês

Lava chão numa casa de chá

Tem saído ao luar

Com um mímico

Ambiciona estudar

Canto lírico

Não dá mole pra polícia

Se puder, vai ficando por lá

Tem saudade do Ceará

Mas não muita

Uns dias, afoita

Me liga a cobrar:

É Iracema da América

(Chico Buarque, As Cidades. Rio de Janeiro: Marola Edições Musicais Ltda.,1998.)

a) Que papel desempenha Iracema no romance de José de Alencar? E na canção de Chico Buarque? No
romance de José de Alencar, Iracema desempenha papel de heroína indígena do amor, ao mesmo tempo
que expressa a naturalidade e genuinidade do país do Brasil, da natureza. Já na canção, Iracema
representa a figura cidadã brasileira que é exilada do país e tenta a sorte na região norte do continente.
b) Uma das interpretações para o nome da heroína do romance de José de Alencar é de que seja um
anagrama de América. Isto é, o nome da heroína possui as mesmas letras de América dispostas em outra
ordem. Partindo dessa interpretação, explique o que distingue a referência à América no romance
daquela que é feita na canção. Na obra de José de Alencar Iracema de América é uma referência direta
ao país brasileiro, localizado na América do Sul, em contraposição à canção, que utiliza América, o
mesmo termo, para fazer referência à América do Norte, Estados Unidos.

2. (UNICAMP 2010) No excerto abaixo, o romance Iracema é aproximado da narrativa bíblica:

Em Iracema, (...) a paisagem do Ceará fornece o cenário edênico para uma adaptação do mito da
Gênese. Alencar

aproveitou até o máximo as similaridades entre as tradições indígenas e a mitologia bíblica (...). Seu
romance indianista

(...) resumia a narrativa do casamento interracial, porém (...) dentro de um quadro estrutural pseudo-
histórico mais

sofisticado, derivado de todo um complexo de mitos bíblicos, desde a Queda Edênica ao nascimento de
um novo

redentor.

(David Treece, Exilados, aliados, rebeldes: o movimento indianista, a política indigenista e o Estado-
Nação imperial. São Paulo: Nankin/Edusp, 2008: p. 226, 258-259.)

Partindo desse comentário, responda às questões:

a) Que associação se pode estabelecer entre os protagonistas do romance e o mito da Queda com a
consequente expulsão do Paraíso? No mito da Queda, Adão e Eva, habitantes do Éden, teriam comido o
fruto proibido. Por causa disso, teriam tido como castigo a expulsão da morada paradisíaca e o mergulho
dos seus descendentes na dor e sofrimento . Iracema aproveita vários elementos desse mito: o vinho da
jurema assemelhase ao fruto proibido; a perda da inocência de Adão e Eva equivale à união carnal entre
Martim e Iracema; a descida que a protagonista faz do território tabajara para o pitiguara identifica-se
com a perda do Paraíso. O caminho para baixo é percorrido após o sexto dia, que lembra o dia da criação
do homem; a dor da heroína ao ver seus conterrâneos mortos em combate e, mais adiante, durante o
seu parto, estabelece proximidade com os sofrimentos profetizados por Deus à espécie humana.

b) Comente em um trecho de 10 linhas a seguinte afirmação. Caso você concorde ou discorde, justifique
sua escrita:

A afirmação apresentada descreve uma interpretação do personagem de Iracema no contexto


do romance de José de Alencar. Segundo essa interpretação, Iracema é vista como uma figura que
representa a união entre o homem branco europeu e a mulher indígena, com o objetivo de "aprimorar"
o sangue local e superar a suposta "ineficiência" da origem primitiva.
Nesse sentido, é importante destacar que essa visão reflete a perspectiva eurocêntrica e
colonialista predominante na época em que o romance foi escrito. José de Alencar era influenciado pelas
ideias do movimento literário indianista, que buscava valorizar a cultura e a história indígena, mas ainda
assim perpetuava estereótipos e visões idealizadas da relação entre colonizadores e indígenas.

No entanto, é essencial ressaltar que essa interpretação é problemática e perpetua um discurso


de superioridade e dominação. Ela se baseia em conceitos ultrapassados de eugenia e hierarquia racial,
que não devem ser endossados ou validados. É fundamental compreender que as relações interculturais
são complexas e multifacetadas, e a união entre diferentes etnias não deve ser vista como um processo
de "aprimoramento" ou superioridade de um sobre o outro.

Portanto, concordar com essa afirmação seria reforçar uma visão excludente e prejudicial. É
importante analisar e criticar as obras literárias à luz de perspectivas mais atualizadas, que promovam a
igualdade, o respeito mútuo e a valorização das diversas culturas que compõem a sociedade brasileira.

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