NEPOMUCENO, Valério; RECH, Ilírio José. Capitalismo na Europa Medieval: a
Contabilidade Impulsionou o Genuíno Espírito Capitalista?. Revista Contemporânea de Contabilidade, [S.L.], v. 19, n. 50, p. 03-16, 27 jan. 2022.
O objetivo do artigo é analisar se a contabilidade contribuiu para a prática
capitalista medieval na Europa. A metodologia usada foi a lógica historial dialética como instrumento de condução da análise das ideias e da historialidade, pesquisando sobre a Antiguidade até o surgimento do método das partidas dobradas. A primeira análise dos autores é a publicação Der Moderne Kapitalismus (1902), de Sombart, a primeira obra que fala sobre a dupla entrada da escrituração contábil sendo relacionada com o capitalismo medieval. O autor em diversas passagens de sua obra, busca explicar o que é o lucro por meio de fatos históricos, por exemplo, quando os produtos do Oriente eram vendidos com grandes margens de lucros. Porém, na época, não havia um método para controlar as finanças do comércio e para determinar os valores exatos para um negócio. Essa técnica foi a base para o desenvolvimento da matemática entre os séculos XIII e XV. Sombart (1902) foi o primeiro a associar os conceitos instrumentais da contabilidade com a formação do capitalismo. Ele afirma que a evolução dos sistemas evolui em 1340, com a partida dobrada, o que foi fundamental para o capitalismo na Europa alcançar um significado diferente. Um dos primeiros a ser contra as ideias de Sombart foi Yamey (1949,1964, 2004). Ele afirma que a partida dobrada não é importante, pois acredita que os comerciantes na época não tinham conhecimentos e praticavam a partida simples, por ser mais fácil. Continuando o ensaio, Nepomuceno e Rech (2022) estudam o escrito de Leonardo Fibonacci, o Liber Abaci (1202), uma das obras que vai permitir o avanço do capitalismo. Os sete primeiros capítulos tratam das numerações, de como utilizá- los e como técnicas podem ser aplicadas para solucionar problemas na prática. A outra parte do livro é dedicado à especulação matemática (Gies, 1969, p.58). As viagens ao Oriente de Fibonacci resultaram no livro dos ábacos. Essa obra foi importante para o homem europeu, pois eles estavam conhecendo matemáticas diferentes, haja vista que a Igreja Católica só permitia cálculos avançados por serem limitados, só o conhecimento dos números romanos. A aritmética e a contabilidade são as bases sobre as quais o capitalismo é construído (Swetz, 1989). Esse conhecimento matemático, trazido dos árabes por Fibonacci, marcou o início de uma nova era na Europa medieval, associada à urbanização e à criação de universidades e corporações, dando origem ao capitalismo comercial e, posteriormente, ao capitalismo industrial. 1 Trabalho realizado pela aluna Ananda K. R. P. de Souza, como requisito da avaliação semestral da disciplina Produção Textual Acadêmica, ministrada pelo professor Dr. Atílio Butturi Junior, do curso de Ciências Contábeis, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 2
A partir desses estudos, os autores fazem uma análise do significado do
abacistas e do algoristas para o objetivo do artigo, pois determinam a distinção entre cálculo unitário e abstrato, este último tendo um impacto muito maior no campo da contabilidade do que o pensamento e significativamente. Um abacista é uma pessoa que faz aritmética comercial com base em ábaco; enquanto quem faz aritmética comercial com base em algarismos hindu-arábicos é um algorista. Por exemplo, os ábacos não reconhecem números irracionais, zero (criptografia) ou números negativos. O algoritmo visualizava os números com notação de valor posicional, reconhece números irracionais, usa zero como notação de valor posicional e aceita números negativos para "dívida", por outro lado, números positivos para ativo. Essa percepção de números negativos em termos de “dívida” é reconhecida como o oposto de um ativo, mantendo a contabilidade no contexto da aritmética, como se a escrituração das partidas dobradas fizesse parte da matemática. Adiante, discutem sobre o surgimento do método da partida dobrada como uma ferramenta de linguagem de comunicação contábil que permite a geração de informações contábeis. Sem dúvida, o método se adaptou e evoluiu ao longo do tempo, mas sempre manteve essencialmente a mesma lógica, definida por Mattessich (1995) como o princípio da dualidade. Sanandaji (2018a, 2018b) afirma que a ideia da contabilidade de dupla entrada não importa, ou parece não haver uma conexão entre capitalismo e contabilidade, exceto na era moderna. Nesse sentido, destaca Sombart, para estabelecer o capitalismo na Europa medieval, foi necessário a partida dobrada. Most (1966, p. 24), por outro lado, argumenta que isso seria fatal para o argumento de Sombart se fosse demonstrado que esse método existia antes da Idade Média. Em resumo, a proposta de Mattessich é considerar o princípio da dualidade, pelo qual a dupla entrada, de alguma forma, existe desde que as sociedades humanas desenvolveram "trocas de interesse”, assim dito por Tinker (1985, pp. 92-93). Portanto, a contabilidade de partida dobrada é um divisor de águas porque sempre tornou o capitalismo possível. Antes de concluir, Nepomuceno e Rech (2022) discutem que do ponto de vista econômico, político, social ou cultural, a partir do século XIII, tanto a Inglaterra quanto a França tiveram um ambiente diferente da Itália. O contato veneziano com a cultura, matemática e contabilidade desenvolvidos na China e no Oriente levou ao florescimento do capitalismo na Itália, muito antes da Inglaterra e da França. Lemarchand (1994) afirma que “Este tipo de contabilidade não deve ser visto simplesmente como contabilidade de caixa” (p. 135). Littleton (1946, p. 61) argumenta que "o processo de 'anglicização' do conceito italiano de manutenção de registros ocorreu". Winjum (1971) tentou fornecer uma visão contábil mais conceitual da partida de dupla entrada. No entanto, apesar da nota de Mattessich, deve-se considerar que se trata de uma tecnologia nova, ainda não adotada, e mais difundida, que promete maior estabilidade, resultados de aplicação de capital mais seguros. Eles estudam o Guazi, escrito por Guan Zhong, no ano 600 a.C., que aborda sobre política, economia e ensaios filosóficos. Traduzido para o inglês por W. Allyn Rickett, em dois volumes. Um dos aspectos relevantes das lições de Guanzi é a 3
estabilidade econômica do país. A Ciropédia é um clássico romance político escrito
pelo grego Xenofonte (430-355 a.C.) que, além da educação de Ciro, também trata de suas aventuras militares. Esses escritos de Xenofonte são relevantes porque tratam do sistema econômico persa estruturado em torno de mercados especializados e negócios privados (Sanandaji, 2018b). O livro Arthaśāstra, de Kautilya, revela os impressionantes procedimentos contábeis e detalhes do comportamento administrativo e econômico da época. Portanto, pode-se inferir que pelo menos essas três importantes obras escritas na Antiguidade, Guanzi, Cyropédia e Arthaśāstra revelam comportamentos voltados ao controle, alto QI e a existência de capitalismo de livre mercado ou intervenção estatal A primeira conclusão feita pelos autores é pensar que houve um "espírito" capitalista europeu na Idade Média, mas nunca deve ser considerado "real", pois no mundo antigo existia o mesmo espírito do capitalismo e tinha as mesmas ferramentas de apoio. A este respeito, a Europa não parece ter sido pioneira no capitalismo, mas copiou o padrão dos antigos pelos mesmos meios. Outra conclusão diz respeito ao nascimento do conceito de lucro. Nesse caso, também é possível que os europeus medievais não tenham inventado lucros por causa de transações interessantes. Até certo ponto, o raciocínio de Sombart e Yamey é aceitável se assumirmos que nem a documentação nem a pesquisa arqueológica significativa ocorreram no momento em que prepararam sua dissertação. Por fim, percebem que a evolução da contabilidade e dos métodos contábeis, por meio da escrituração de partidas dobradas, foi se adaptando aos mais diversos ambientes culturais (Mattessich, 1995).